Chamuças de Bacalhau 22

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Chamuças de Bacalhau Quando se percebe porque é que a Cock’s Town se chama Cock’s Town. O camoniano despertar da praia. Mudar para casa do porquinho mais velho. Fazer a praia em espreguiçadeiras é desporto, sim senhor. 40 graus de testa e overdose de rebuçados das freiras dos Himalaias.

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XXII Sun Fever Passámos a noite em branco. Depois das 4 da manha, quando a música finalmente se calou percebemos que o casal da cabana ao lado (algo excitados pelo calor goês) estava praticamente na cama connosco, visto a insonorização entre habitações ser coisa absolutamente impossível. A Rita tossia que se fartava e os mosquitos picavam a valer (dentro do mosquiteiro). Levei a noite a encharcar-me em repelente, em vão. Como se não bastasse, estava um calor dos diabos e quando se tentou ligar a ventoinha do tecto, a cabana começou toda a abanar, assustadoramente, por isso desistimos do plano. Como tinha perdido um dos tampões, tinha partido o que sobrou ao meio e tentava dormir com aquilo. O efeito era nulo. Às seis da manhã finalmente percebi porque é que o “resort” se chamava Cock’s Town. Era uma franca homenagem aos galos que rondavam aquele hemisfério e que tinham acabado de começar um chinfrim de cocórócócós tão insistente, que só me apetecia levantar e começar a torcer pescoços. Ainda aguentei até às 7 quando começou a clarear e aí enrolei-me na manta e fui até à beira mar ter um momento-Camões, como só um português pode ter, ao olhar um mar que não é o seu (imaginem só o meu estado de inspiração para escrever tamanho adágio). Passei a manhã a ver a praia a acordar. Ao princípio não se via vivalma, mas com o tempo foram chegando os pescadores que empurravam as barcaças para o mar, por cima dos troncos, as vendedoras que passavam com cestos de fruta à cabeça e os cães à Jorge Amado, que andavam em matilha e ladravam às vacas e aos indianos. O rapaz do restaurante veio trazer-me o pequeno-almoço: torradas com nada, bananas e chá preto. Senti-me a própria da Rainha do Sabá, apesar da pobre dieta. Seguiram-se duas horas de descansada leitura até a Rita vir ter comigo com uma cara de mau dormir. Percebi logo o plano: banho revigorante e procurar nova casa (fora da praia). Tínhamos muita pena mas estávamos a precisar de uma casa à porquinho mais velho. Escolhemos um quarto azul-sonazol numa pequena guest-house mesmo à porta da praia. E estávamos tão cansadas que lá assentimos pagar 400 Rs por uma noite! Tínhamos perdido a cabeça.

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Depois de um almoço que consistiu só e apenas em arroz, no qual tive enxotar o israelita que tinha “aproveitado o facto de eu estar sozinha para me vir conhecer, porque eu parecia tão israelita como a sua mãe quando era nova, o seu maior fetiche”, (Rita nunca mais me deixes), decidimos ir fazer a praia em espreguiçadeiras. Este desporto mundial consiste em andar kms e ir descansando nas palhotas enquanto se bebe coca-colas. E lá fomos nós. A praia ia ficando cada vez mais bonita e deserta. Havia rios que se juntavam ao mar e tinha que se nadar para se conseguir continuar pela areia. Às tantas, deixei a Rita a ler o “Holly Cow” e decidi andar “só ali até à curva” foi uma espécie de “vou ali e já venho” que demorou três maravilhosas horas, nas quais andei armada em sereia a bronzear em andamento. Havia uma brisa fresca que me dava nós no cabelo e que empurrava miúdas anorécticas a tentar fazer kite surf. Estava-se mesmo bem! Lanchámos na ponta oposta a ver o melhor por do sol do mundo. O repasto foi sandes de banana. No comments. Com o sol a desaparecer comecei a perceber que estava com a garganta um bocado arranhada. Por isso fomos a uma espécie de drogaria e, como não arrisquei o xarope, saí de lá com os bolsos a rebentar de rebuçados para a tosse, feitos desde 1930 por sei lá que freiras dos Himalaias, e fora da validade, claro! Decidimos jantar num restaurante que tinha um ecrã gigante a passar filmes. Foi assim que eu pedi arroz e a Rita, um ovo estrelado, para grande espanto do empregado, e ficamos a ver o “Ghost Rider” e “O Melga” com um poste à frente. Os filmes eram uma desgraça, as legendas estavam em Esperanto e só havia russos a jogar bilhar à nossa volta. Lá para as onze decidimos ir para cama. A minha garganta tinha piorado e estava a arder em febre. A Rita dormia pesadamente e eu passei a noite a assoar-me e a molhar meias para pôr na testa. Sentia-me cansada, escaldada, ranhosa, com fome, com dor de garganta e com calafrios. Rezei a Ganesh para melhorar e passei o resto da noite a delirar com elefantes bêbados, como no sonho do Dumbo, mesmo a sério! Ia jurar que foi da overdose de rebuçados das freiras!

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