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Marisa da Camara

A vida como ela é O inverno dos desabrigados

Marisa da Camara Terapeuta Energética Radiestesista

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Em 1979, quando eu saí de Santos para viver e trabalhar em SP, precisei adaptar meu guarda-roupa para sobreviver ao frio da tradicional cidade da garoa. Saía cedo de casa, para o trabalho, bem agasalhada, com ar quente ligado no carro, pois meu organismo ainda não havia se adaptado ao frio da cidade. Já no primeiro semáforo, meu coração partia-se ao ver um menino descalço, com uma camisetinha fina e rasgada, nariz escorrendo, pedindo dinheiro, muitas vezes, sob um chuvisco congelador. Foi um período de adaptação muito sofrido, pois em Santos não tinha frio pesado, nem pedintes. O contraste era grande. Eu, saindo de casa para o trabalho, alimentada e de banho tomado, com uma bagagem estudantil, em busca de um futuro promissor. Do lado de fora do carro, um menino com olhar desesperançoso, fome e frio, a quem o futuro não lhe sorria e nem lhe prometia segurança, aconchego, amor ou mesa farta. Custei a ‘congelar’ meu coração, de forma a suportar aquelas cenas matinais indigestas. Eu haveria de sobreviver àquelas cenas que dilaceravam meu coração, logo pela manhã, fazendo-me chegar ao trabalho em prantos. À noite não era diferente. Ao deitar a cabeça no travesseiro, com 2 ou 3 cobertores e meias nos pés, meu coração não aquecia, pensando nas pessoas que estavam nas ruas. Certos dias, logo pela manhã, os jornais escritos ou falados anunciavam o número de mortos pelo frio. Saindo para o trabalho, eu me perguntava se ainda veria, pelo caminho, aqueles mesmos olhares tristes e famintos do dia anterior. 43 anos se passaram, meus cabelos branquearam e o inverno dos desabrigados continua severo e implacável. E eu deixo a pergunta: “até quando?”

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