Prisma12

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blocos de concreto soluções construtivas com Revista trimestral no 12 - setembro - 2004 R$ 10,00

www.revistaprisma.com.br

PAISAGISMO Uma casa feita com blocos e pré-fabricados de concreto conquista o Prêmio Jovens Arquitetos A durabilidade do paver nas ruas e avenidas da Riviera de São Lourenço,

Mar, praia e cidade

Projeto Nova Orla urbaniza Praia do Janga, em Paulista-PE

em Bertioga-SP Germán Madrid mostra os caminhos para o concreto colorido

Intertravados fazem o requinte da Vila Mercedes, em Campos do Jordão-SP


blocos de concreto soluções construtivas com

Ao leitor Urbanizar uma praia é sempre uma intervenção contra a natureza. Assim, o cuidado ambiental e uma certa delicadeza de projeto são fundamentais para o sucesso de um projeto desse tipo. Um bom exemplo é o trabalho realizado na Praia do Janga, em Paulista, bem perto do Recife-PE, que ganhou um caminho para pedestres, mobiliário urbano e equipamentos de lazer. Nas calçadas, de belo desenho, foi aplicado um piso intertravado de altíssima qualidade. Também são de intertravados os pisos da charmosa Vila Mercedes, implantada em Campos de Jordão-SP durante o inverno passado, e os caminhos do condomínio Royal Park, em Londrina-PR, este último realizado com um tipo de paver especial. Uma saudável troca de estímulos entre a arquitetura e a indústria. Na área de alvenaria, destacamos a Casa Yamada, uma obra impecável, construída com blocos e pré-fabricados de concreto e merecedora do prêmio Jovens Arquitetos 2004. Destaque também para o arquiteto Carlos Alberto Tauil, um entusiasta do sistema construtivo da alvenaria estrutural com blocos de concreto. Veja ainda nesta edição o encarte especial sobre o ESPAÇO PRISMA, evento que realizamos durante a Fehab - Feira Internacional de Materiais de Construção, de 21 a 25 de setembro. 6

NESTA EDIÇÃO

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Prisma é uma publicação trimestral da

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Marketing Fábio Martins marketing@revistaprisma.com.br Equipe técnica Abdo Hallack, Davidson Figueiredo Deana, Germán Madrid (Colômbia), Glecia R.S. Vieira, Hugo da Costa Rodrigues, Marcio Santos Faria, Marcio Rocha Pitta, Marcos Dutra de Carvalho, Paulo Sérgio Grossi e Ronaldo Vizzoni Colaboradores Éride Moura, Cláudia Bochille, Silvério Rocha, Sofia Mattos e Yeda Costa Bezzera de Mello Projeto gráfico e diagramação Act Design Gráfico (Vinicius G. Rocha) Impressão Linha d Água Viva Tiragem desta edição: 10 mil exemplares Redação Editora Mandarim rua Marquês de Itu, 503 conj. 22 São Paulo-SP - CEP 01223-001 tel. (11) 3337-5633 fax. (11) 3362-2585 redacao@revistaprisma.com.br Assinaturas tel. (11) 3337-5366 Publicidade Act Comunicação Rubens Campo / Ricardo Campo Tel. (11) 9975-6257 / 5573-6037 comercial@revistaprisma.com.br Capa: Urbanização da praia do Janga, em Paulista-PE. Foto: Yeda Costa Bezzera de Mello Apoio institucional ABCP BlocoBrasil ISSN: 1677-2482

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SEÇÕES

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CURTAS

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CARTAS

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PRODUTOS

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AGENDA

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BLOCOS ON-LINE

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BLOCO DE DÚVIDAS

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PERSONAGEM Carlos Alberto Tauil e a história da alvenaria de blocos no país ARQUITETURA Jovens arquitetos fazem uma casa com blocos e pré-fabricados e ganham premiação nacional PAISAGISMO Novo tipo de paver viabiliza passeios curvilíneos em Londrina-PR PISO INTERTRAVADO Blocos compõem a charmosa Vila Mercedes, em Campos do Jordão-SP URBANISMO Beleza e muita qualidade na urbanização da Praia do Janga, em Paulista-PE PAVIMENTAÇÃO A prova dos anos na pavimentação da Riviera de São Lourenço, em Bertioga-SP DESTAQUE Hector Vigliecca projeta habitação para idosos em São Paulo-SP ESQUINA A seção de Germán Madrid mostra os caminhos para o uso do concreto colorido na urbanização das cidades

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curtas

Pulo do gato em SP A Prefeitura de São Paulo está concluindo a primeira fase das obras do Parque do Gato, complexo de habitação e lazer localizado no encontro dos rios Tietê e Tamanduateí. No conjunto irão residir os moradores da antiga Favela do Gato. No total, serão nove edifícios de cinco pavimentos, projetados com uma arquitetura elegante e sóbria, e executados com alvenaria estrutural de blocos de concreto. As vias internas do condomínio receberam pavimentação intertravada. Na segunda fase, a prefeitura implantará um parque, com uma grande área verde e pistas de cooper e de skate, trilhas, quadras esportivas e parque infantil, além de equipamentos como posto policial, de primeiros socorros, fraldário e apoio à lactante.

Passeios em Montes Claros A cidade de Montes Claros-MG iniciou um projeto para a padronização das calçadas e ruas do município com a utilização de blocos intertravados. O Projeto Centro Vivo, como é chamado, tem apoio do IAB Instituto dos Arquitetos do Brasil e já viabilizou a recuperação de 5 mil m2 de piso da praça Doutor Chaves, no centro da cidade mineira. Pavers na fronteira A prefeitura da cidade paranaense entregou as obras de renovação da praça de acesso ao Teatro Barracão, com bancos, floreiras, lixeiras, nova iluminação e piso intertravado colorido. Antes a Praça das Nações já havia recebido um novo piso, que foi aprovado pela população da cidade fronteiriça.


Casas em Vitória A prefeitura da capital capixaba está implantando uma série conjuntos habitacionais para a população carente da cidade. As unidades são construídas com alvenaria estrutural de blocos de concreto, a partir de projetos desenvolvidos pela Secretaria de Habitação do município.

Praia em Maceió A praia de Pajuçara, na capital alagoana, ganhou mais de 14 mil m2 de passeios pavimentados com piso intertravado de concreto nas cores terracota e ocre. O projeto é da arquiteta Rosa Elena Nogueira e a obra foi realizada pelas construtoras Arquitec e Telesil Engenharia.

Alvenaria e arquitetura Dois cursos de arquitetura, nos Estados do Rio de Janeiro e Espírito Santo, incluíram o estudo da alvenaria estrutural com blocos de concreto nas disciplinas de Projeto e Tecnologia da Construção. Na Faculdade de Ciências Humanas de Aracruz-ES, planeja-se também um prêmio para o melhor projeto com blocos de concreto em habitações de interesse social. O objetivo das ações, que foram estimuladas pela ABCP, é potencializar o uso do sistema construtivo em projetos inovadores, especialmente na área de habitação. No campus da UFRJ pretende-se construir uma casa 1.0 projetada pelos estudantes.

Reurbanização com pavers A praça Ferreira Pires, em Formiga-MG, voltou a ser o ponto de encontro dos jovens locais após os trabalhos de reurbanização realizados pela prefeitura da cidade. Novas árvores, como ipês e quaresmeiras, contracenam com um piso vermelho e cinza, com blocos de concreto.


cartas Vimos a entrevista com o engenheiro José Luiz Pereira, sobre alvenaria estrutural (Prisma 3), e gostaríamos de um contato com este profissional visando a aplicação desse método construtivo em obra de nossa empresa. Romão Carvalho Resposta: O engenheiro José Luiz Pereira é diretor da JLP Engenharia, tel. (11) 5011-1312, e-mail: jlp@jlpengenharia.com.br. Sou arquiteta da Superintendência de Limpeza Urbana de Belo Horizonte e atualmente trabalho no projeto para elaboração da Política Municipal para Resíduos de Construção Civil. Dentro deste projeto estou pesquisando a viabilidade de utilização do agregado originado a partir do entulho reciclado na produção de blocos estruturais. Gostaria de conhecer experiências ou pesquisas de aproveitamento deste material em blocos estruturais. Sandra Machado Fiuza Resposta: Há sim algumas experiências de reciclagem dos resíduos para uso em concreto estrutural. Um exemplo interessante foi posto em prática numa obra em Guarulhos-SP: um

piso industrial foi demolido e transformado em brita e finos para a confecção de radiers, lajes pré-fabricadas e blocos estruturais. O processo foi orientado pela empresa Obra Limpa, especializada na gestão de resíduos da construção, tel. (11) 4362-5497.

Estou orçando a construção de quatro apartamentos com dois quartos, sala, cozinha, banheiro e area serviço. Gostaria de obter informações sobre algum projeto pronto, em blocos de concreto, se possível com indicação das quantidades de materiais. Paulo Rocha Resposta: Não recomendamos a adoção de projetos prontos em qualquer contrução. É sempre necessário (e vantajoso) consultar um arquiteto ou engenheiro para a concepção do melhor projeto para cada obra. Uma boa referência para localizar profissionais especializados em alvenaria estrutural é a seção Clube da Qualidade no site da revista Prisma (www.revistaprisma.com.br). Outra alternativa é um contato com a equipe de especialistas em alvenaria de blocos de concreto da ABCP - Associação Brasileira de Cimento Portland pelo tel. (11) 3760-5300.

Na edição 10 da Prisma, na reportagem Construir novos lares , vi que existe uma estrutura de transição no primeiro pavimento do edifício fotografado. Pergunto: Abaixo desta estrutura é necessário que os blocos também sejam estruturais? Rodrigo S. Perdigão Resposta: O pavimento térreo da obra foi construído com concreto, da forma convencional, para propiciar total liberdade de planta nas áreas de acesso, festas e lazer. Nesse piso, a alvenaria cumpre apenas a função de vedação. A torre apóia-se sobre a estrutura convencional, que funciona como uma fundação elevada para a alvenaria estrutural. Para mais detalhes, contate o eng. Alexandre Oliveira, da DMO Engenharia (www.dmoeng.com.br). Gostaria de saber como enviar trabalhos para publicação na revista Prisma. Prof. Ronaldo Sérgio de Araújo Coêlho Resposta: Propostas para publicação podem ser enviadas para a Editora Mandarim e serão submetidas ao Conselho Consultivo da revista, que inclui profissionais da ABCP, fabricantes de blocos, de insumos e jornalistas. Por favor, encaminhe as sugestões para o e-mail: redacao@revistaprisma.com.br


produtos

Tudo sobre tubos de concreto A Menegotti Equipamentos está patrocinando o livro Tubos de Concreto, primeira publicação brasileira especializada no assunto. Elaborado pelo eng. Pedro Jorge Chama Neto, com apoio da ABTC - Associação Brasileira dos Fabricantes de Tubos de Concreto, o livro traz um pouco da história deste componente, desde sua criação na Europa, informações sobre normas técnicas, equipamentos de produção e dados para projeto e aplicação de tubos de concreto em obras. Informações: www.abtc.org.br, tel (11) 3763-3637

Arte & Paisagem, de Burle Marx Uma edição da editora Studio Nobel traz de volta ao mercado o livro Arte & Paisagem , do paisagista Roberto Burle Marx. O livro contém textos inéditos que revelam o pensamento de Roberto Burle Marx e primorosas imagens de renomados fotógrafos como Marcel Gautherot, Luiz Claudio Marigo e Andrés Otero entre outros. As fotos são acompanhadas de legendas que ilustram seus conceitos, articulados com fatores históricos e informações adicionais do organizador José Tabacow. Informações: www.livrarianobel.com.br

Dosagem em peso ao alcance de todos A Cibi lançou um acessório para facilitar dosagens mais precisas de concreto, mesmo em obras de pequeno porte. A solução incorpora uma caçamba elevatória de pesagem aos misturadores planetários e turbos já produzidos pela empresa, de forma a permitir a dosagem por peso de agregados, cimento, água e aditivos. Informações: www.cibi.com.br ou pelo tel. (12) 227-4000



agenda 76o Enic - Encontro Nacional da Indústria da Construção 7 e 8 de outubro Local: Centro de Convenções de Vitória-ES Informações: www.sindicon-es.com.br Nutau 2004 - Seminário Internacional do Núcleo de Tecnologia da Arquitetura e Urbanismo da USP 11 a 15 de outubro, em São Paulo Informações: www.nutau.org.br 35a RAPv - 35a Reunião Anual de Pavimentação 19 a 21 de outubro, no Rio de Janeiro-RJ Informações: www.abpv.org.br 4o Seminário Internacional de Conservação Urbana 23 a 25 de novembro, em Recife-PE O seminário é organizado pelo Centro de Estudos Avançados em Conservação Integrada da Universidade Federal de Pernambuco (Ceci-Ufpe). O objetivo é discutir novos instrumentos que possam estabelecer relações entre as disciplinas que compõem a conservação e o patrimônio. Informações: www.ceci-br.org/4seminar

Seminário da Associação Internacional de Urbanistas 17 a 19 de novembro, no Rio de Janeiro O seminário vai discutir o tema Instrumentos Legais de Gestão e Política Urbana ­ Uma visão internacional . Informações: www.isocarp.org Cursos ABCP Processo Construtivo de Alvenaria Estrutural com Blocos de Concreto - Porto Alegre-RS, 8 de novembro - São José dos Campos, 11 de novembro - Bauru-SP, 25 de novembro Carga horária: 8 horas (um dia) Inscrição: R$ 50,00 Curso Básico sobre Pavimentos Intertravados Carga horária: 16 horas (dois dias) Inscrição: R$ 100,00 Informações: ABCP - Associação Brasileira de Cimento Portland www.abcp.org.br tel. (11) 3760-5404 / 5405 fax: (11) 3760-5400

Cursos YCON A Concepção Estrutural na Arquitetura Palestrante: prof. Dr. Yopanan C. P. Rebello 4 de outubro a 30 de novembro Gerenciamento de Obras Palestrante: Prof. Arq. Walter Maffei 24 a 25 de setembro Fundações - Escolha, Comportamento e Pré Dimensionamento Palestrante: Prof. Dr. Yopanan C. P. Rebello 1 e 2 de outubro Interligação Projeto-Obra Palestrante: Prof. Arq. Breno Silva Barbosa Ramos 29 e 30 de outubro Projetando com modelos e maquetes reais Palestrante: Prof. Arq. Artur Rozestraten 4 de novembro a 9 de dezembro Informações: Ycon - Educação Continuada www.ycon.com.br -tel. (11) 3816-0441


Foto: Sofia Mattos

personagem

O pai da matéria Arquiteto formado pela FAU-USP em 1967, Carlos Alberto Tauil é um dos mais entusiasmados pioneiros da alvenaria estrutural de blocos de concreto no Brasil. No percurso de quase quarenta anos de vida profissional, ele vem acompanhando ativamente o desenvolvimento desse sistema construtivo racionalizado, que ajudou a difundir e normatizar Como foi o início de sua vida profissional, nos anos 1960? Comecei projetando habitações populares para a Ribeiro Franco, uma construtora que trabalhava para a COHABSP, sob concorrência. Na época, o segmento de habitação popular era o grande mercado da construção e inúmeras tecnologias novas estavam sendo testadas. Meu interesse por essas novidades era muito grande, principalmente pelas que procuravam a racionalização dos sistemas. Em 1971, concorri e ganhei uma bolsa de estudos de cinco meses na fundação Bowucentrum, na Holanda. Lá, fiquei conhecendo a metodologia de projeto desenvolvida pelo professor N.J. Habraken, da Universidade de Eindhoven, que utilizava a coordenação modular tanto com relação ao componente, quanto com relação ao edifício e à urbanização. Para a habitação popular, Habraken sugeria

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dois domínios, o externo, da estrutura acabada, de interface com a comunidade, e o de domínio interno, em que o próprio morador podia escolher divisórias, cores e acabamentos para seu apartamento. Como eu tinha experiência profissional com habitação popular, achei a idéia muito interessante, porque era uma forma de trabalhar com a construção em massa sem ser repetitivo. O contato com as novas idéias sobre habitação popular e com a metodologia de projeto de Habrakem, que poderiam ser aplicadas em qualquer sistema construtivo, foi fundamental para minha formação. Seu interesse pela alvenaria estrutural data desta época? Bem, no final do curso, fiz a tese sobre a metodologia de projeto do Habraken aplicada à construção no Brasil, utilizando a alvenaria de tijolo, que

na época era a mais comum. O trabalho foi enviado pelo pessoal do Bowucentrum para diversas instituições nacionais e internacionais. De volta ao Brasil, tentei desenvolver esses estudos em São Paulo, no IPT - Instituto de Pesquisas Tecnológicas, mas na época não havia verba. Comecei então a escrever artigos sobre o assunto para a revista A Construção, da editora PINI. Foi quando a construtora Zarvos se interessou pelo assunto e me chamou, pois queria construir sobrados e pequenos prédios com blocos de concreto, utilizando a modulação. Achei ótimo, porque os blocos se encaixavam como uma luva ao sistema de modulação. A partir de quando o bloco de concreto começou a ser difundido mais largamente no Brasil? O início foi com a construção das usinas de Jupiá e Ilha Solteira, em São Paulo, pela Camargo Corrêa, na década de 1960. Eu ainda era estudante, mas participei desses projetos, que foram coordenados pelos professores Ernest Mange e Ariaki Kato. A Camargo Corrêa importou as máquinas especiais da marca Besser, norte-americanas, para a fabricação dos blocos de concreto utilizados na construção da cidade, que hoje é um centro de excelência na pesquisa de alvenaria estrutural. No final dos trabalhos, a construtora transferiu as máquinas para a pedreira que tinha em São Paulo, e com os resíduos, começou a fabricação dos blocos aqui. Essa é a origem da Reago. E na Zarvos, como era seu trabalho? Começamos em 1972, desenvolvendo projetos padronizados de prédios para habitação de baixo custo, de alvenaria estrutural e já com o conceito da modulação. Apesar da redução dos custos proporcionada pelo sistema, o padrão dos prédios da Zarvos era bem superior ao dos edifícios da COHAB, e


eram comercializados no mercado. Na época, a unidade monetária utilizada era a UPC, e as construtoras que faziam prédios como os nossos conseguiam vender cada apartamento por até 1400 UPCs. A Zarvos, no entanto, com a mesma lucratividade, vendia por 1000 UPCs, o que equivale hoje a cerca de R$ 45 mil. Isso, em bairros como Vila Leopoldina, Penha, Vila Guilherme, sempre a uma distância de 13 a 14 km da Praça da Sé. Depois, com o novo zoneamento da cidade de São Paulo, passamos a construir conjuntos habitacionais de três ou quatro prédios, com quadras esportivas e garagens. Ao todo, foram 35 prédios construídos para o chamado Projeto Caracol , utilizando o princípio da alvenaria estrutural e o conceito da modulação, em que cada proprietário poderia ir melhorando seu apartamento aos poucos. Os conjuntos eram todos do mesmo tipo, mas construídos em bairros diferentes. Em função desse trabalho, me empolguei com o uso do bloco e vi que teria condições de fazer edifícios bem mais altos. Estava cansado de projetar prédios de quatro pavimentos. Saí da Zarvos e fui trabalhar numa outra empresa, a Construtora Balbo, que em 1975 construiu uma torre de 12 pavimentos em Diadema. Na época, a alvenaria estrutural já produzia edifícios altos? Estava iniciando. A pioneira foi a Construtora Regional São Paulo, na Lapa, que em 1971 lançou o conjunto Central Parque Lapa, de alvenaria estrutural, sem revestimento e com 12 pavimentos. Ainda hoje a construção está lá, logo depois do viaduto da Lapa. O Fuad Jorge Cury foi o arquiteto do projeto, e o calculista, o eng. José Luis Pereira. A verificação do vento foi efetuada pelo Greer Fever, que veio da Califórnia, a convite da Reago, para fazer palestras e análise de vento, uma

vez que o Brasil ainda não tinha normas para alvenaria estrutural de blocos de concreto. Quando as normas surgiram? Eu estava trabalhando na Reago, fazendo a divulgação da alvenaria estrutural entre as construtoras, quando me animei para desenvolver as normas técnicas para o sistema. Reuni um grupo de pesquisadores e calculistas da USP e

O sistema é um jogo de montagem muito racional. O bloco, elemento principal da obra, deve ser de boa qualidade, porque sozinho ele vai resolver toda questão da parede

do IPT, o pessoal da Cohab e de empresas particulares, e conseguimos redigir um texto que foi apresentado na ABNT. Montamos em seguida uma comissão de estudos e, finalmente, realizamos um grande seminário de estudos de engenharia. A comissão da norma foi instalada sob minha presidência, e consegui atrair para ela mais de cem técnicos de diversas áreas, além dos fabricantes de blocos. Todo esse pessoal participava da redação, especificação, métodos de ensaio, normas de execução, ensaio de prisma, ensaio de parede e normas de cálculo. Na fase de normas de cálculo, em 1986, o Nelson Gomes, do IPT, que mexia com estruturas, assumiu a presidência da comissão, e em 1989 conseguiu liberar a norma de cálculo e de dimensionamento do projeto. Essa norma de projeto está em vigor até hoje e só agora deverá ser revisada. Como será a revisão? Quando a norma foi elaborada, usouse o mesmo coeficiente de segurança do concreto, que levava em conta o dimensionamento das tensões admissíveis. Hoje, no entanto, com o conheci-

mento acumulado sobre o sistema de alvenaria estrutural, o coeficiente de segurança já é calculado, em todo o mundo, levando-se em conta o estado de limite útil de ruptura . Assim, ao se fazer ensaios de resistência de paredes, no ponto em que ela romper, seu coeficiente de majoração deverá ser aquele valor multiplicado por 1,5 e não cinco vezes maior como é atualmente. Portanto, vamos trabalhar com um coeficiente de segurança menor, mas suficiente. As obras continuarão a ter limites de segurança, só que resultarão bem mais econômicas. Pelo menos é o que se espera. A partir de 1976, o senhor deixou a área de projeto e passou a atuar na difusão do uso de blocos de concreto. Como foi essa experiência? Na época, fui convidado pela Reago para ser gerente de produto, e passei a desenvolver um trabalho muito intenso, fazendo boletins técnicos, filmes, slides, fotografando obras e visitando construtoras para apresentar o sistema. Esses trabalhos culminaram com a apresentação de um projeto especial para a Cohab de São Paulo, que não estava conseguindo viabilizar suas concorrências pelo preço que queria pagar. Tive a idéia de fazer um projeto estrutural modulado para o tipo bloco de concreto usado pela Cohab, e utilizando o mesmo conceito arquitetônico. A Cohab concordou e passou o projeto para as construtoras que participaram da licitação. A construtora Beter venceu a concorrência e conseguiu viabilizar a obra no preço estabelecido pela Cohab. Essa mesma construtora ganhou depois várias concorrências para a construção dos conjuntos de Itaquera, e fez um total de 14 mil unidades em sete anos. Quais as principais vantagens que o senhor aponta na alvenaria estrutural?

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personagem

O sistema é um jogo de montagem muito racional. O bloco, elemento principal da obra, deve ser de boa qualidade, porque sozinho ele vai resolver toda questão da parede. Já a laje, pode ser moldada no local, ou pré-moldada, da mesma forma que outros elementos, como peitoris, fachadas e escadas, o que aumenta a racionalização. Geralmente os construtores procuram tirar partido da rapidez com que se levanta a parede, utilizando lajes e outros elementos pré-moldados. Evitam assim o madeiramento no interior da obra, que fica mais limpa. Outra vantagem importante é a redução de peso proporcionada pelo sistema. Cada metro quadrado de um edifício executado em alvenaria estrutural pesa 800 kg, contra 1200 kg do sistema convencional, com alvenaria de tijolos maciços. A razão da diferença é que o bloco de concreto recebe apenas uma camada leve de gesso como acabamento, enquanto a alvenaria de tijolo convencional precisa ser revestida por grossas camadas de argamassa. A parede de bloco estrutural deixa ainda de prescindir de todo o peso da estrutura do concreto que as paredes convencionais suportam. E, sem dúvida, a quantidade de aço da alvenaria de concreto é bem menor do que a usada na alvenaria convencional. Depois de todo o sucesso nos anos 1970, no entanto, a alvenaria estrutural não foi muito utilizada nos anos seguintes. Porque isso ocorreu? Na década de 1980, todo o setor da construção enfrentou o grave problema da falta de financiamento. Mas o sistema nunca parou realmente, esteve sempre evoluindo. Ainda na década de 1980, a vedação de tijolos de cerâmica das estruturas de concreto foi sendo substituída pelos blocos de concreto, exatamente pela exatidão de suas medidas. Como reação, a indústria de

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blocos cerâmicos começou a desenvolver um produto melhor para poder competir com os blocos de concreto. No entanto, os blocos cerâmicos não

conseguiram competir com os de concreto na construção de prédios altos. Enquanto as construções com alvenaria estrutural cerâmica permitem edifícios de até sete pavimentos, o sistema com blocos de concreto permite chegar até a 25 andares. Mas essas torres são viáveis economicamente? A partir de 25 andares não é recomendado, porque a vantagem econômica passa a diminuir. Então é mais negócio fazer uma estrutura de concreto. Porque o sistema ficou tanto tempo associado a projetos de construção popular? No início, houve um trabalho de marketing dos fabricantes direcionado para esse segmento da construção que, na época, era o que absorvia os maiores volumes de trabalho. Assim, ficou meio afastado da construção tradicional, que continuou a utilizar o concreto. Mas esse tipo de alvenaria sempre se prestou para qualquer tipo de obra. A ABCP abriu seus espaços para eventos sobre o sistema e, na medida que ele ia evoluindo, mais calculistas eram informa-

dos sobre suas normas através de palestras e cursos. Para se ter uma idéia, de todos os sistemas construtivos introduzidos na década de 1970, o de alvenaria estrutural foi um dos poucos a permanecer e a evoluir. O número de fabricantes de blocos de concreto foi aumentando, e para fazer frente aos produtos de baixa qualidade, a ABCP resolveu instituir o Selo de Qualidade. Atualmente, qual é o recorde de altura para os prédios de alvenaria estrutural? O edifício mais alto do mundo tem 28 andares e fica em Las Vegas, EUA. Aqui em São Paulo, foi executado em 1993, um prédio de 21 pavimentos, no bairro da Penha. Mas temos dezenas de edifícios construídos com até 20 pavimentos por toda a cidade. Recentemente, a CDHU construiu na Radial Leste, em São Paulo, um conjunto de prédios para habitação popular com até 17 andares. Hoje, o sistema de alvenaria estrutural de blocos de concreto já pode oferecer aos arquitetos, a versatilidade tão ambicionada nos anos 1970. E aos construtores e incorporadores, permite que atinjam seus objetivos de construir ao menor custo e com a melhor qualidade. A mão-de-obra para esse tipo de construção exige especialização? Como em qualquer lugar do mundo, a mão-de-obra brasileira se adaptou perfeitamente ao sistema. Falavam mal da nossa mão-de-obra porque o pedreiro tinha de trabalhar, muitas vezes, com tijolos de dimensões irregulares. Como os blocos de concreto são produzidos industrialmente, com medidas corretas e uma tolerância dimensional de apenas dois ou três milímetros, o problema não existe. Além disso, o Senai vem realizando cursos de excelente qualidade para formação de pedreiros.


Fotos: Sofia Mattos

alvenaria

Arquitetura + blocos + lajes = casa Esta casa, primeira experiência construtiva do Estúdio 6 Arquitetos, foi um dos projetos vencedores do concurso nacional Jovens Arquitetos 2004, promovido pelo IAB-SP. Além de atender plenamente à organização do programa, a solução adotada garantiu a obediência das duas exigências do projeto: propiciar privacidade e abrir vistas para um lago próximo

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ituado no topo de uma elevação, o lote exigia cuidados especiais com a privacidade. Após vários estudos, optou-se pela solução de fechar o volume lateralmente com paredes estruturais, que delimitassem não só o volume, mas também o próprio lote. Quase toda a área do terreno foi assim ocupada; deixou-se nas laterais apenas os espaços exigidos pela legislação. Praticamente fechadas, as paredes laterais se contrapõem às faces voltadas para a rua e para o lago, que receberam generosas aberturas. O programa, simples e compacto com salas de jantar e estar integradas,

Fachada principal: pureza de formas

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A obra resultou numa coisa mais de montar que de moldar três quartos e dois banheiros, cozinha e área de serviço -, foi organizado em dois volumes, no interior das paredes divisas . O ponto mais alto do terreno, de frente para a rua, abriga os ambientes de estar, e em um nível 3,8 metros abaixo, o outro volume, com os dormitórios de frente para o lago. Os espaços sociais prolongam-se por um grande terraço, implantado sobre a laje de cobertura dos quartos. No alto desse pátio descoberto, uma grande laje delimita o volume e proporciona área sombreada. A inclinação da rua possibilitou a execução de um acesso para visitantes, e um outro, separado, para a entrada de veículos. Ao usar paredes estruturais como elementos que delimitam o volume e o próprio lote, os autores do projeto fizeram uma referência à Casa Bitencourt, obra de Vilanova Artigas, projetada em 1959. Na verdade - explica o arquiteto César Shundi Iwamizu -, essa referência estava no inconsciente, pois só nos demos conta dela depois da obra terminada. Artigas usou o concreto moldado in loco como sistema construtivo e a organização espacial era bem diferente. A referência foi só quanto ao uso das paredes como muros para proteção da privacidade dos moradores . Execução rápida e eficiente Depois de pensar em algumas alternativas, a solução de lajes pré-moldadas e blocos estruturais de concreto nos pareceu a mais adequada, pois tinha tudo a ver com o projeto , explica César Shundi. E o arquiteto Alexandre Mirandez de Almeida, também da equipe do Grupo 6, acrescenta: Não se trata de preconceito com relação ao concreto

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Etapas da construção: das fundações à cobertura em 18 meses, na seqüência de fotos realizadas pelos arquitetos


Terraço superior: laje para sombrear

armado, o fato é que, para esse projeto, o uso de lajes pré-moldadas e blocos estruturais nos pareceu mais interessante. Até porque era conveniente, pois seu custo era compatível com o que o cliente tinha para investir na casa. No final a obra, a obra resultou numa coisa mais de montar do que de moldar . E o arquiteto descreve: Levanta-se a parede estrutural de blocos de concreto até determinado ponto e, em seguida, vai-se colocando, lado a lado, encaixadas, as lajes de concreto prémoldado, respeitando-se rigorosamente as linhas dos blocos. Utilizamos os

Lajes e blocos à vista: linguagem do concreto

Corredor lateral

Escola premiada

O

utro trabalho do Estúdio 6 Arquitetos foi premiado no concurso nacional Jovens Arquitetos 2004, na categoria projetos. Trata-se

de uma escola no bairro Jardim Umuarama em São Paulo-SP, projetada

em 2003 por iniciativa da FDE - Fundação para o Desenvolvimento da Educação, organismo ligado ao governo estadual paulista. O partido do projeto, explicam os arquitetos, prevê a ocupação do platô principal, cota 100, com um único volume de quatro pavimentos que é acessado por dois pontos distintos, seguindo a declividade da rua que contorna o terreno destinado à escola. No térreo se localizam as salas de aula. No pavimento seguinte, cota 103.40, está o setor administrativo com acesso direto da rua, seguido dos laboratórios de uso coletivo e as salas restantes. No segundo andar, cota 106.80, a quadra coberta, o refeitório e os sanitários. No último pavimento, o acesso principal da escola, com galpão e a cantina, espaço de convívio dos alunos e dos eventos imprevistos ligados à comunidade. Essa disposição inverte a lógica tradicional das escolas ao colocar os espaços comuns na cobertura e as salas de aula em baixo. A estrutura, em pré-fabricados de concreto, foi projetada pelo eng. Zamarion Diniz.

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Implantação: vista para o lago ao fundo

Equipe fez o teste de carga nas lajes Pavimento inferior 1. passarela de acesso 2. rampa de acesso de veículos 3. área de serviço interna 4. sala de estar 5. sala de jantar

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cozinha terraço garagem escritório dormitórios área de serviço externa

FICHA TÉCNICA Casa Yamada Local: Aldeia da Serra, Barueri-SP Ano do projeto: 2002 Conclusão da obra: 2004 Terreno: 450 m2 Área construída: 328 m2 Arquitetura: Estúdio 6 Arquitetos César Shundi Iwamizu (autor), Alexandre Mirandez de Almeida, César Shundi Iwamizu, Marcelo Pontes de Carvalho e Ricardo Bellio Colaboradores: Eduardo Crafig e Marcio Henrique Guarnieri

Pavimento térreo

Estagiários: Carolina Farias e Tiago Natal Paisagismo: SOMA Arquitetos

blocos de 40 cm, e como lajes, painéis de concreto protendido que chegam da fábrica com 10,80 m de vão e 1,20 m de largura. Depois de colocada a primeira laje, sobe-se novamente a parede com os blocos de concreto até o ponto de colocação da segunda laje. Concluída essa parte, vai-se fazendo as alvenarias das divisões internas, os fechamentos com panos de caixilhos,

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as impermeabilizações. As paredes divisórias, de tijolos cerâmicos comuns, foram rebocadas e pintadas, mas as estruturais, de blocos de concreto, permaneceram aparentes e receberam apenas um produto impermeabilizante. A obra pôde ser concluída de uma maneira racional, rápida e limpa em apenas 18 meses , conclui Almeida.

Estrutura: Eng. Genuíno Dionigi Instalações: Sandretec Construção: Estúdio 6 Arquitetos e João de Oliveira (mestre de obras) Fornecedores: Prensil (blocos de concreto); Spitaletti (lajes pré-moldadas); Wolf e Hacker (impermeabilização); Casa Francesa (piso granilite); Concrefit (piso elevado de concreto); Pau Pau (piso de madeira); Janos Biezok e Almarco (caixilhos); Clacci (vidros), Cavoá (forro de gesso)


Fotos: divulgação

Park Royal: vegetação nativa, ruas e calçadas curvilíneas

paisagismo

Curvas para passear Condomínio estimula a inovação no mercado de pisos intertravados no sul do país

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á dois anos, quando trabalhava no planejamento de alguns condomínios na cidade de Londrina, norte do Paraná, o empresário Marcos Holzmann imaginou um lugar com ruas curvilíneas, que permitissem uma implantação diferenciada das residências e oferecessem a sensação de bem-es-

tar aos futuros moradores. Depois de várias pesquisas, notamos que as ruas curvas, com horizonte mais fechado, são mais gostosas para caminhar, tranqüilizam as pessoas quando chegam em casa. Daí adotamos esse padrão em todos os condomínios Park Royal, aqui em Londrina , lembra o engenheiro,

que é diretor da Teixeira Holzmann. Ato contínuo, nasceu a idéia de construir passeios também curvos para os pedestres e de pavimentá-los com pisos intertravados de concreto. Além das vantagens na construção e manutenção, acreditamos que o intertravado empresta uma imagem mais contem-

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O piso intertravado traz uma imagem contemporânea ao condomínio

Vista do condomínio: no detalhe, o passeio na área de mata

porânea ao condomínio , pondera Holzmann. Mas, como diferencial, desejava-se um produto novo, que permitisse a montagem das curvas sem cortes nas peças ou irregularidades no desenho do piso. Após meses de trabalho, várias reuniões e negociações com uma fabricante local de blocos, foi possível chegar a uma seqüência de desenhos em formato trapezoidal que viabilizaria a idéia. São nove peças diferentes, na cor canela, para a confecção da curva e que

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permitem - se necessário - o desenho de um círculo completo. Uma outra peça, na cor marrom, foi criada para as bordas do calçamento, criando um jogo de cores, texturas e formas que agradou ao empreendedor e encantou os moradores do local. Para facilitar a montagem, as nove peças ostentam uma marcação discreta, nas faces laterais, facilmente identificáveis pelos operários que trabalham na aplicação do piso. Marcos Holzmann lembra que o piso

intertravado adaptou-se muito bem à necessidade de montagem e desmontagem das calçadas, especialmente durante a construção das casas. Se fizéssemos uma calçada comum, ela se romperia com a passagem dos caminhões com materiais de construção. Com o paver, basta desmontar um trecho e refazê-lo ao final da construção . Como homenagem, o novo tipo de piso recebeu o nome de paver royal e já está sendo aplicado em outras obras na cidade de Londrina. A iniciativa, que reuniu cliente, arquitetos, fabricante de blocos e uma indústria cimenteira, é um ótimo exemplo para a evolução do setor de blocos de concreto no Brasil. FICHA TÉCNICA Obra: Condomínio Park Royal Local: Londrina - PR Projeto e construção: Teixeira Holzmann Área pavimentada: 40 mil m2 Fornecedor de blocos: Blocomix


Fotos: divulgação DaimlerChrysler

destaque

Vila Mercedes, em Campos do Jordão: pavers em ambiente requintado

Cena de cinema Piso intertravado compõe exposição de carros de luxo

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ma cidade cenográfica com três mil m2 de área foi montada pela DaimlerChrysler do Brasil em Campos de Jordão-SP. Construída para a temporada de inverno, quando milhares de turistas de todo o Brasil visitam a estância serrana, a Vila Mercedes mostrou a luxuosa linha de veículos Mercedes e Chrysler sobre um tapete colorido inteiramente feito com blocos intertravados de concreto. A obra foi construída no bairro de Capivari, o mais charmoso e sofisticado da cidade, tomando como referência os tradicionais vilarejos alemães, com suas construções em estilo enxaimel. Além da exposição de carros na área externa, a vila contava com um espaço vip, várias lojas, restaurante e

um estúdio de rádio. O projeto foi desenvolvido pelo arquiteto Sérgio de Oliveira, que decidiu usar o piso intertravado pela facilidade e rapidez na colocação e retirada das peças , já que o espaço teria que ser desmontado no início de agosto. O arquiteto lembra também que os blocos intertravados são antiderrapantes e permitem a passagem da água da chuva. Outras obras A prefeitura da cidade já tem um projeto para modernização do bairro de Capivari, com desenho da arquiteta Lica Richieri, que prevê a reforma completa da praça, das ruas e calçadas com intertravados. Outras áreas de Campos do Jordão, como condomínios e hotéis

FICHA TÉCNICA Vila Mercedes Local: Campos do Jordão-SP Arquitetura: Sérgio de Oliveira Projeto e obra: 2004 Fornecedor de blocos: Bloco Renger

também já estão recebendo pavimentação com blocos intertravados. Bom exemplo é o condomínio Village du Soleil, no Alto da Boa Vista, que adotou a técnica para manter a permeabilidade do solo e evitar danos ambientais.

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urbanismo

Nova Orla: piso intertravado embeleza a praia do Janga

Até o final de 2004, a praia do Janga, no município de Paulista, Região Metropolitana do Recife, terá 4 km de sua orla inteiramente urbanizada e pavimentada com blocos intertravados de concreto. Numa segunda fase a urbanização somará 8 km de praias


Fotos: Yeda de Mello

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aulista é um importante pólo industrial e turístico de Pernambuco. A cidade fica a 17 km do Recife e abriga as mais belas praias do litoral norte do Estado: Janga, Pau Amarelo, Maria Farinha, da Conceição e do Ó, famosas por suas águas límpidas e mornas, areias brancas e densos coqueirais. No entanto, em algumas épocas do ano, esse paraíso tropical sofre com a violência dos ventos que agitam o oceano, e as águas do mar passam a invadir as praias e as casas de veraneio construídas à beira-mar. Para solucionar esse problema e, também, organizar definitivamente a orla da praia do Janga - a mais procurada da região -, a prefeitura está implantando o projeto Nova Orla há quatro anos. O estado de degradação era grande; a via beiramar não tinha pavimentação e os carros circulavam pela praia , explica o arquiteto Adeildo Barbosa Júnior, do escritório Colméia Arquitetura e Engenharia. Assim, antes de iniciar a urbanização da área, a prefeitura executou um sério trabalho de proteção de todos os

Equipamentos de lazer e novos passeios atraem turistas

pontos críticos do litoral, onde foram construídos espigões (quebra-mar de pedra) para solucionar os problemas de erosão. A praia, por sua vez, foi toda reconstituída com as areias provenientes das dragagens feitas no mar. Quando concluído, o projeto Nova Orla deverá atingir os 8 km da orla, somando um total de 65 mil m2 de área urbanizada. Na primeira fase de im-

plantação estão sendo entregues, além dos primeiros 4 km, mais 19 ruas de acesso à praia. Os projetos de urbanização e paisagismo foram realizados pelo escritório Colméia Arquitetura e Engenharia. O calçadão terá tratamento paisagístico, módulos comerciais, chuveiros, deques de madeira, playgrounds, equipamentos de ginástica, quadras poliesportivas e ainda pista de

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Desenho curvilĂ­neo toma partido das cores no piso intertravado

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cooper. Em obediência ao Projeto de Acessibilidade para Portadores de Deficiências, estabelecido pelo Crea-PE, o projeto incluirá acessos para os portadores de necessidades especiais. Uma escolha criteriosa Na pavimentação das ruas de acesso ao mar, foram utilizados blocos intertravados na cor grafite. Já na beira-mar, a pista de tráfego receberá blocos na cor grafite, e o calçadão, peças nas tonalidades ocre, vermelho e natural. A pista de cooper será pavimentada com concreto pré-misturado pigmentado. Antes de decidir o tipo de pavimentação a ser utilizado na área do projeto, o prefeito de Paulista esteve em Blumenau-SC (leia mais em Prisma 11), onde constatou o sucesso do piso intertravado nas vias da cidade. No retorno, fez contato com a ABCP - Associação Brasileira de Cimento Portland para conhecer as vantagens técnicas

que os elementos de concreto proporcionam. Na ocasião, a associação procurou fazer uma comparação entre o calçamento de pedras e o de blocos intertravados de concreto, duas das opções possíveis para área. E, segundo o engenheiro Martônio Francelino, da

ABCP, a diferença de preço em favor da pedra importou menos na decisão municipal do que a durabilidade, a racionalidade e rapidez na colocação, a valorização estética, e o conforto térmico proporcionados pelo sistema intertravado .

Projeto: prioridade ao pedestre

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Sinalização e rampas garantem acessibilidade

A orla para os pedestres O projeto de urbanismo - de acordo com o arquiteto Adeildo Barbosa Júnior, do escritório de arquitetura e engenharia Colméia -, privilegiou o uso dos espaços pelos pedestres e, por conta disso, optou por não criar uma via de fluxo intenso de veículos junto à praia,

como acontece nas demais cidades litorâneas. Na verdade, a praia do Janga já tem uma via de tráfego intenso paralela à praia - a rodovia PE-01 -, mas que não passa junto à beira-mar. Para evitar o grande fluxo na nova via, ela será descontínua e sua calha terá apenas 5 m de largura, com alguns pontos

de estacionamento. A idéia é que seja usada apenas pelo trânsito local e pelos banhistas que utilizam aquele trecho da praia. As vias perpendiculares, já concluídas, contam com amplos espaços de estacionamento. O projeto paisagístico apóia-se numa paginação especial para os blocos de concreto intertravados, com um desenho orgânico, cujas linhas lembram a sinuosidade da costa nordestina. As cores escolhidas foram o vermelho, o amarelo e o marrom. O uso dos elementos de concreto, na opinião do arquiteto, possibilita uma execução rápida e prática e, apesar do seu custo maior, é mais vantajoso a longo prazo, por conta da durabilidade e facilidade de manutenção. FICHA TÉCNICA Projeto Nova Orla Local: Praia do Janga, Paulista-PE Arquitetura: Colméia Arquitetura e Engenharia

Bancos delimitam a área urbanizada

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Construção: Bracel


pavimentação

Entre a mata e o mar Fotos: divulgação Bloco Renger

Preocupação ambiental e qualidade de vida são os pilares na urbanização do condomínio litorâneo Riviera de São Lourenço, em Bertioga-SP. Desde 1977 as ruas do empreendimento recebem pavimentação de blocos intertravados

Pista recém-construída: tráfego intenso e pesado

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á pouco mais de 20 anos, a região de São Lourenço, em Bertioga, litoral norte de São Paulo, era marcada por uma extensa praia deserta, freqüentada por surfistas, pescadores e campistas. Ao fundo da praia apenas a vegetação típica da Mata Atlântica e a Serra do Mar, ao fundo. No início dos anos 1980, a área começou a ser ocupada pelo condomínio Riviera de São Lourenço, hoje com cerca de 900 hectares de área, marcado por edi-

fícios de 5 a 9 pavimentos, centros de compras e uma infra-estrutura exemplar baseada no uso sustentável dos recursos naturais: água captada e tratada no local, tratamento próprio de esgotos e amplas áreas de vegetação nativa. A qualidade paisagística do condomínio foi comprovada pelo título Hors Concours recebido pelo Riviera de São Lourenço no premiação Master Imobiliário 2003. O prêmio foi concedido à empreendedora, Sobloco Construtora, pela qualida-

de na implantação e manutenção do projeto urbanístico . Desde o início das obras, a pavimentação das ruas tem sido realizada com peças pré-moldadas de concreto - avós do piso intertravado - que há 20 anos comprovam sua durabilidade e adequação ambiental. No momento, a construtora está concluindo os módulos 7 e 8 do empreendimento, que incluem mais de 35 mil m2 de ruas, inteiramente realizadas com pavimento intertravado e guias pré-moldadas de concreto. Durante as obras, ocorreu um pico de 19 edifícios executados ao mesmo tempo, ocasionando um alto tráfego de caminhões, perfeitamente suportado pelo pavimento , lembra o engenheiro Nagib Anderáos Neto, diretor técnico da Sobloco. Além da durabilidade e facilidade de manutenção, a escolha desse pavimento para a urbanização da área apóia-se no conceito de intervir o mínimo possível no ambiente e não prejudicar o ecossistema local. O pavimento intertravado permite a drenagem de parte da água da chuva, recarregando o lençol freático e reduzindo o escoamento superficial , exemplifica Nagib. O emprego dos blocos evita concretagens in loco, evitando que a nata de cimento possa chegar aos cursos fluviais e ao mar. O engenheiro lembra que o uso de tons claros na pavimentação também ajuda na economia de energia elétrica para refrigeração: Com o uso do asfalto, haveria uma grande irradiação de calor que traria uma sensação de temperatura mais alta. Deve-se também considerar que as pessoas às vezes andam descalças nessas áreas lito-

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Traço inicial

A urbanização da área começou quando a Companhia Fazenda Carau, proprietária da área, contratou os arquitetos Benno Perelmuter e Oswaldo Correa Gonçalves, sócios na época, Avenida e portão de condomínio: blocos de concreto suportam o tráfego há 20 anos

para traçarem a implantação da área da Riviera de São Lourenço, entre os anos de 1977 a 1980. O primeiro conceito adotado foi não desenhar lotes quadrados, em quadrículas ortogo-

râneas e podem queimar os pés em dias de verão. E nós verificamos que a temperatura média do piso intertravado de concreto é 4 a 6 oC inferior à do asfalto , afirma o diretor técnico da Sobloco. Outro apelo para o uso desses blocos é a composição paisagística: A cor clara dos blocos é neutra e emoldura o cenário natural , avalia Vitor Arbore, arquiteto da Sobloco. Evolução contínua A evolução técnica do setor de blocos para pavimentação pode ser observada nas diferentes etapas de construção da Riviera de São Lourenço. De acordo com Antônio Sérgio Ramunno Reganati, diretor técnico da Renger,

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empresa responsável pela pavimentação, os antigos blocos sextavados de grandes dimensões que pavimentam muitas avenidas do condomìnio ainda têm mais de 30 anos de vida útil para o futuro. Esses blocos não eram intertravados, mas mesmo assim o pavimento não apresenta ondulações provocadas por sobrecarga, pois a base foi bem executada na época , observa Reganati. Na etapa atual da obra, empregamse blocos de 16 faces. Quanto mais faces e menor sua dimensão, maior o atrito entre as peças e mais eficiente a distribuição das cargas no pavimento , explica João Batista Neto de Campos, engenheiro coordenador da obra.

nais e monótonas. Para isto, basta alguém reticular um papel... não precisa do trabalho de um arquiteto , observa Benno Perelmuter. Projetar mini-bairros que conformam um bairro maior foi a segunda premissa. Outra seria intervir o menos possível na natureza e micro-clima local. O traçado dos córregos foi respeitado e procurou-se um desenho sinuoso para as ruas e, conseqüentemente, para a implantação dos futuros edifícios, de forma a garantir ventilação adequada em toda a área. Esse traçado gerou uma redução da área comercializável, mas trouxe grandes ganhos ambientais.


Ilustração: Hector Vigliecca

destaque

Vista da área interna: alvenaria e pintura branca

Idosos conquistam habitação moderna O

arquiteto Hector Vigliecca entregou à Prefeitura de São Paulo o projeto para a construção do primeiro conjunto residencial voltado exclusivamente à população idosa de baixa renda da cidade. A proposta nasceu há dez anos, a partir de reivindicações do Grupo de Articulação para Conquista de Moradia dos Idosos da Capital. O emprendimento, um único edifício horizontalizado, localiza-se no bairro do Pari, integrado a uma biblioteca pública e área verde. Para a construção, o projeto prevê o uso da alvenaria estrutural com blocos de concreto, revestimento de argamassa e pintura branca. Nas áreas de acesso, as vedações serão feitas com elementos vazados pré-fabricados de concreto. No total, serão 145 unidades, sendo 9 apartamentos e 16 quitinetes adaptados para deficientes no pavimento

térreo, e 48 apartamentos e 72 quitinetes distribuídos pelos 3 pavimentos superiores. O conjunto apresenta ainda 3 halls de acesso com área de estar, escada e elevador, administração, portaria, três salas para TV e jogos, quatro salas de uso múltiplo e um salão comunitário com cozinha e sanitários. A área externa é composta por horta comunitária, quadra de bocha, área verde, praça externa e espelho d água que somam quase 5 mil m2. Na concepção do projeto, Vigliecca imaginou que os corredores internos funcionem com ruas de convívio entre os moradores. Além disso, imagina o arquiteto, a proximidade com o centro da cidade vai estimular a interação dos idosos com a população do bairro e criar novos laços de amizade. O condomínio, que será construído com recursos do Fundo Municipal de

Habitação de São Paulo, faz parte do Programa de Locação Social, em que o beneficiado não se torna proprietário, mas paga aluguel à Prefeitura. O programa beneficia pessoas que ganham

entre um e três salários mínimos. O valor do aluguel corresponderá a 10% da renda mensal e assim os condôminos irão pagar, em média, R$ 26,00 de aluguel, mais água e luz. O custo da obra total será de R$ 4.630.000 ou R$ 32 mil por unidade habitacional.

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esquina

Muito além do cinza A cor nos pré-fabricados de concreto

Três perguntas Porque concreto colorido? Por sua natureza pétrea, o concreto de cimento portland ostenta uma coloração rochosa, cinzenta, mas com uma grande (mas não absoluta) uniformidade, dada à natureza industrial de seu processo de produção. Assim, o seu uso massivo, em todo o mundo, fez com que as cidades modernas ganhassem, em maior ou menor grau, essa cor cinzenta, pejorativamente associada à monotonia, tristeza e desumanização. Mas, continuando com os adjetivos, como seria uma cidade amarelo-canário ou vermelho-carmim, em vez do cinza do concreto? A verdade é que o cinza do concreto proporciona uma tela neutra, sobre a qual as demais intervenções podem ser ressaltadas. É uma cor serena, que não molesta o observador. Nessa perspectiva de um espaço neutro, os toques de cor, contrastantes, são um dos grandes desafios do arquiteto em seu trabalho de dar vida ao espaço urbano. Então, o concreto em cores pode ser um ótimo recurso arquitetônico, desde que seja possível produzilo com qualidade. A cor acrescenta uma novidade ao

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concreto, o torna diferente do concreto cinza. Sim, diferente . Quando qualquer objeto, um automóvel, por exemplo, ganha um diferencial, ele se torna mais complexo, talvez mais delicado . Pode trazer mais prazer a seu proprietário, por suas características estéticas, de conforto, de bem estar. Assim também ocorre com o concreto. Porque pré-fabricados de concreto colorido? Uma pré-fabricador é um profissional em seu especialidade e assim deve ter uma instalação (a planta de produção), na qual pode medir e ajustar as variáveis que intervêm na elaboração do produto, e reduzir seu impacto, até onde seja possível. E esta atividade não é eventual (como ocorre num canteiro de obras, onde as condições de produção variam a todo momento) e sim sistemática, aplicando todos os princípios de produção industrial. Assim, uma empresa de pré-fabricados consegue produzir e entregar produtos de concreto colorido muito mais uniformes que os que se seriam obtidos em uma obra corrente. Com isto, a pré-fabricação não ape-

Germán G. Madrid Engenheiro civil, diretor da Segmenta Consultoria, de Medellín, Colômbia. segmenta@epm.net.co

nas confere à obra mais uniformidade, disponibilidade imediata e otimização de custos, como também a possibilidade de contar com produtos coloridos de forma tão fácil e rápida como se obtêm peças de concreto cinza. Porque pré-fabricados de concreto colorido no espaço público? Quem perambula pela cidade em geral não tem consciência das cores que o rodeiam: são infinitos tons, do cinza claro ao cinza escuro, com várias texturas, inclusões, pátinas de envelhecimento, tudo isso coberto pela cor da poluição, limos e outros depósitos. Mas tudo isso é percebido como o cinza do cimento . O senso comum entende que um produto industrial deve ser uniforme em todos os seus aspectos. Assim, se um préfabricado de concreto é cinza, ele deveria ser sempre do mesmo cinza. Nesse sentido, a indústria do concreto, em especial a de pré-fabricados, não tem sido suficientemente ousada para mostrar como seu produto, apesar de ser industrializado, tem variações, que são intrínsecas ao processo. Isso foi feito, com sucesso pela indústria da cerâmica vermelha, que transformou um defeito


num argumento estético de venda: a variação da cor pela queima da argila . Por último, vale lembrar o tema do envelhecimento e da manutenção do material. Para isso, vamos retomar a analogia com o automóvel: quem adquire um veículo de luxo, caro, provavelmente irá cuidá-lo melhor do que se tivesse adquirido um carro popular. No caso do concreto, se um arquiteto renomado propõe um projeto usando cores, talvez o impacto dessa escolha seja ínfima no preço final (em geral menos de 5%), mas exigirá um investimento futuro na manutenção para evitar que a obra vá perdendo as cores com o tempo. Desta forma, o projetista deve considerar esse custo de longo prazo ao optar por fazer, por exemplo, uma calçada colorida. Cores: a influência das variáveis de produção Para início de conversa, vamos lembrar que o cinza também é uma cor, assim como o branco e o preto, que são casos extremos de cor. O cinza e o branco colocam menos desafios ao processo de produção, pois reduzem uma das variáveis para o controle de qualidade do concreto, a dosagem de pigmento. A percepção da cor A cor do concreto somente existe quando é percebida pelo observador. Desta forma, não importa a cor no in-

terior da peça, mas apenas em sua superfície. Por sua vez, a cor da superfície é definida não apenas pelos materiais constituintes, mas também pelo processo de construção da peça, pelas condições de exposição (luz, sombra, intempéries etc.), e pelas condições de manutenção da superfície pigmentada. Na percepção da cor superficial, deve-se ter em conta os efeitos de escala e de aproximação. A escala está associada ao tamanho dos elementos (tanto de massa como dos componentes dessa massa) e à distância de percepção, ou seja, se a visão humana está ou não em condições de apreciar variações na superfície. Por exemplo, a observação de peças pré-fabricadas de fachada não é a mesma, no térreo, e no quinto andar, ou no décimo ou vigésimo andares, onde muitos detalhes de geometria já não podem ser apreciados. Da mesma forma, em nível micro, o tamanho dos componentes de concreto também influi sobre a aparência da cor superficial. O efeito de aproximação refere-se às características da visão humana: dependendo da possibilidade de focar detalhes ou pontos, tratando-se tanto de uma visão saudável como deteriorada, o cérebro constrói uma média das cores presentes em uma superfície e as percebe como uma série de matizes, não como valores individuais.

Envelhecimento Um concreto que só tenha um acabamento primário (resultado da superfície da fôrma), terá uma superfície totalmente coberta com a pasta de argamassa. Neste caso, as cores do cimento e do pigmento são as dominantes. Se este mesmo concreto é submetido a um acabamento secundário (basicamente um desgaste de superfície para expor os agregados) a cor dominante passa a ser a cor do agregado, miúdo ou graúdo. Algumas partículas de areia ou de pedra podem ter a mesmo cor da pasta, mas certamente haverá grãos de cor ligeiramente diferente. Exatamente este mesmo fenômeno ocorre em produtos para piso, devido ao desgaste por abrasão, originado pelo tráfego de pessoas ou veículos, e também pelo intemperismo, o que também ocorre em superfícies verticais, em fachadas. Em função da natureza plural dos componentes do concreto e pela diversidade da sua aparência, um concreto nunca permanece igual. Ele sempre sofre um envelhecimento que pode ressaltar, ou minorar a presença e percepção da cor. Eflorescência Outro fenômeno que marca a percepção da cor no concreto são as eflorescências. Como se sabe, a hidratação do cimento gera, como subprodutos, água e cal, independen-

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temente da relação água/cimento da mistura. A cal migra, junto com a água, através dos capilares gerados pela saída da água residual. Uma vez em contato com a atmosfera, a água evapora e o hidróxido de cálcio (Ca(OH)2) reage com o dióxido de carbono (CO2) do ar, para formar carbonato de cálcio, de cor branca. Este material se acumula em forma de pequenos depósitos, na saída dos capilares. De forma prática, acontece o seguinte: depois da desmoldagem, à medida que o concreto vai secando, aparecem pequenas partículas de cor branca sobre a superfície da peça, que aparecem à primeira vista como uma mancha. Efeito similar é provocado por depósitos de sulfato de cálcio, sais, gesso e outras substâncias alcalinas. Embora a eflorescência seja inócua para o desempenho do concreto como material estrutural, ela altera a coloração do concreto, clareia o tom de cada cor. Por isto é fundamental que todo o processo de produção do concreto seja feito de forma a evitar o aparecimento das eflorescências. Constituintes Cimento - Seja cinza ou branco, o cimento incorpora as variações decorrentes do minério de origem ou do processo de queima. Por isso, o controle de cor do cimento é fundamental, tomando como base toda a quantidade que vá ser utilizada num projeto específico. Maior conteúdo de cimento na mistura dá, como resultado, cores mais firmes no tempo, em função de uma maior capacidade de fixação dos pigmentos. Além disso, uma relação água/cimento menor resulta numa pasta mais densa, que oferece uma superfície refletiva de luz (e cor). Da mesma forma os cimentos com menores conteúdos de cal livre geram menos eflorescência. Água - Também a água pode trazer algum conteúdo de sólidos ou sujeiras

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(sais, por exemplo) que podem afetar a cor pura do concreto ou provocar eflorescências. Pigmento - Este talvez seja o componente da pasta que gera menos problemas. Os pigmentos minerais (inorgânicos) são cristais estáveis, que não reagem com o cimento e, de maneira limitada, com outras substâncias. Outro fator associado ao pigmento é o rendimento, que também depende da natureza física (forma) das partículas. Tradicionalmente, os pigmentos são produzidos na forma de pó, que dada sua alta finura, são de difícil manejo e tendem a formar grumos na mistura; por isto, é necessário atenção especial no processo de mistura e homogeneização. Uma saída para este problema é fazer uma mistura prévia do pigmento com água, que permite uma dosagem precisa e maior rendimento, mas que pode ser inconveniente quando se trabalha com mistura secas , para blocos de concreto ou peças de pisos intertravados. Pela finura de seus cristais, o pigmento recobre todas as partículas, incluindo as de cimento. Conseqüentemente, um aumento desmesurado de pigmento só acumula cristal sobre cristal, sem maior poder pigmentante. Daí que, acima de um conteúdo de pigmento equivalente a 8% ou 10% da massa de cimento, seja muito difícil avaliar visualmente qualquer incremento na intensidade da cor. As práticas indicam uma pigmentação do concreto em torno de 4%, por economia, como suficientes para atender às exigências de mercado. Mas até cerca de 6% percebe-se um ligeiro aumento na intensidade da cor. Acima disso, a maior taxa de pigmento será útil para assegurar a maior permanência da cor. Isto significa que trabalhar entre 6% e 8% não é um desperdício de material. Pasta - Todos esses componentes formam a pasta, que é o agente de pig-

mentação da peça de concreto. Como a pasta é o componente que define a permeabilidade do concreto (para agregados comuns), um conteúdo menor de pasta representará menor possibilidade de eflorescência, mas aumentará a exposição do agregado, deixando transparecer sua cor logo que o concreto sofra qualquer abrasão. Uma pasta mais pobre gera, por outro lado, misturas mais ásperas, que resultarão em superfícies mais rugosas e portanto mais sujeitas à acumulação de sujeira, material biológico e outras pátinas. Quando as peças recebem um acabamento secundário, a participação do agregado na cor resultante pode ser, talvez, mais importante que a pasta em si. Desta forma, a influência da pasta na superfície final pode ser quase desprezível, desde que a dosagem e a compactação da mistura sejam bem controladas. Em alguns países, ante a falta de cimento branco, os concretos brancos ou coloridos, têm sido produzidos com dosagens muito precisas de agregados de vários tons e quantidades mínimas de pasta de cimento cinza. A tendência atual em produtos para pisos em espaços públicos, calçadas ou vias de veículos é produzi-los com algum tipo de acabamento secundário, de forma a expor, total ou parcialmente, os agregados, de forma a que a cor média se mantenha ao longo do tempo. Esse acabamento secundário implica um custo adicional, que se poderia comparar a uma pintura especial num automóvel de luxo. Assim também trabalham os fabricantes de mobiliário urbano de concreto, que submetem seus produtos a uma leve decapagem química ou física, como forma de estimular a saída da eflorescência de uma vez só. Deste tema falaremos num próximo artigo. (continua na próxima edição)


mundo em blocos

Blocos on-line Links interessantes no Brasil e mundo afora

Jardins de Burle Marx www.klcc.com.my O uso de pavers de concreto no projeto de Roberto Burle Marx para os jardins que circundam os edifícios da Petronas Towers, em Kuala Lumpur, pode ser conferido no site do KLCC, a organização que administra o empreendimento. O site apresenta fotos e desenhos, que permitem compreender como o piso intertravado reproduziu os desenhos do paisagista brasileiro. Trata-se de um belo espaço de lazer, no centro da capital da Malásia, com toda a pavimentação feita com peças coloridas.

Concrete Network w w w. c o n c r e t e n e t w o r k . c o m / concrete/pavers O site organiza vasta informação sobre tecnologia, aplicações, projeto, fornecedores e construtores na área de concreto. A seção de pavers traz uma incrível variedade de produtos e técnicas disponíveis no mercado norte-americano.

Instituto Eduardo Torroja www.ietcc.csic.es O instituto espanhol de construção civil é um dos mais importantes centros mundiais de pesquisa e apoio à indústria da construção. Seu site tem um link para pesquisa na biblioteca, com milhares de títulos de interesse para quem projeta, constrói ou pesquisa.

PCA - Alvenaria www.cement.org/masonry O link alvenaria (masonry) da Portland Cement Association reúne normas, produtos, livros, exemplos de arquitetura e suporte técnico para os profissionais que atuam na área de alvenaria de blocos de concreto. Há inúmeros exemplos de edifícios e residências executadas com blocos em várias cores e texturas.



bloco de dúvidas Envie sua pergunta para o e-mail: duvidas@revistaprisma.com.br Sua questão será respondida por especialistas e as perguntas mais interessantes serão publicadas nesta seção.

Segundo a norma NBR 10837 (Cálculo de alvenaria estrutural de blocos vazados de concreto), o cálculo da tensão admissível na alvenaria armada ou não armada depende do parâmetro fp (resistência média do prisma). Que valor de fp máximo devo usar nesta fórmula, já que estou solicitando um bloco estrutural de fbk (resistência característica do bloco) = 4,5 MPa? Existe alguma relação entre esses elementos, que eu possa usar para outros fbk? Não encontrei na norma nenhuma relação entre esses dois parâmetros. Para blocos de concreto a razão entre o valor a resistência à compressão

média do prisma pelo valor da resistência característica do bloco, ambas referidas à área bruta, pode ser considerada igual a 0,75. Esse parâmetro deve ser considerado para blocos de concreto com resistência característica à compressão de até 10 MPa. Para assentamento de blocos estruturais, qual deverá ser a relação entre a resistência do bloco e a resistência da argamassa? As normas atuais que regulamentam a execução e os critérios para elaboração do projeto estrutural, indicam diferentes valores mínimos para a resistência da argamassa de assentamento. Isso, de fato, colabora para gerar uma grande confusão e insegurança para quem faz uso do sistema construtivo. Com base nas investigações já realizadas a respeito, sugerimos o critério abai-

xo, até que sejam feitas as devidas revisões nas normas: Resistência característima à compressão mínima = 5 MPa; Resistência característima à compressão = 60% da resistência característica do bloco. No entanto, cabe lembrar que quem estabelece os valores das resistências dos materiais é o projetista responsável pelo projeto. Para uma construção de seis pavimentos que utiliza blocos de concreto de 6 MPa nos dois primeiros pavimentos e de 4,5 MPa nos quatro últimos, qual deverá ser a resistência da argamassa para o assentamento dos blocos? Conforme o critério sugerido na dúvida anterior, deve-se utilizar 5 MPa de resistência característica à compressão.

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bloco de dúvidas Estamos executando uma obra na cidade de Guarulhos-SP e optamos pela fabricação in-loco das peças de piso intertravado de concreto. Grande parte das peças já foram fabricadas e, numa segunda etapa, precisariamos de umas 10 mil peças na cor vermelha. Nossa duvida é a seguinte: como pigmentar as peças na cor vermelha sem comprometer a resistência mecanica, já que fizemos alguns testes e o resultado não foi muito satisfatório? Há algum procedimento especial ? Há algum pigmento específico para esse tipo de peça? Nesta edição, o engenheiro Germán Madrid (pág. 28) inicia um artigo sobre a produção de pré-fabricados de concreto coloridos que traz uma série de dicas para minimizar os problemas com a pigmentação do concreto. No entanto, não recomendamos a produção em canteiro de blocos ou peças para

piso intertravado. O melhor caminho é buscar um fabricante que tenha o Selo de Qualidade ABCP, que tem pessoal treinado e equipamentos adequados e poderá fabricar as peças com o melhor padrão de qualidade possível. Qual a espessura adequada da camada de areia para assentamento de pavers? Essa camada deve ter de 3 cm a 4 cm, após a compactação do piso. A espessura pode ser controlada, por exemplo, através de comparações entre o nível das sarjetas e o nível do pavimento, antes e depois da compactação. Como evitar problemas durante a colocação dos terminais para pontos de água, em obras com blocos de concreto? Em obras racionalizadas, as instalações hidráulicas devem ser encaminhadas em shafts, que são nichos de pas-

sagem, especialmente projetados. Essas tubulações não devem ser sejam concretadas ou argamassadas, para que não se tenha que quebrar a parede, no caso de um eventual reparo. Existe uma inclinação máxima para aplicação do piso intertravado? Neste caso, a resistência das peças deve ser maior? Não há norma que defina inclinação máxima, mas na prática para rampas com mais de 10%, deve-se estudar a utilização de contenção transversais para as peças. Independentemente da inclinação da pista, a resistência mecânica dos blocos para pavimentação deve ser maior ou igual a 35 MPa para as solicitações de veículos comerciais de linha, ou maior ou igual a 50 MPa, quando houver tráfego de veículos especiais ou solicitações capazes de produzir acentuados efeitos de abrasão (veja a norma NBR 9781/87).






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