Ética de Stuart Mill

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II.3.1.3. A necessidade de fundamentação da moral – análise comparativa de duas perspetivas filosóficas: John Stuart Mill e Immanuel Kant

John Stuart Mill e o UTILITARISMO J. STUART MILL (1806-1873) Filosofia - Marina Santos

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Onde reside a moralidade de um ato? Nas consequências que resultam do próprio ato

Na intenção de quem o realiza

Éticas deontológicas - éticas formais: éticas do dever

Éticas teleológicas - éticas materiais: Utilitarismo; Hedonismo John Stuart MILL

Immanuel KANT

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Tipos de utilitarismo

Utilit. ClĂĄssico

Utilit. de PreferĂŞncias

Consequencialismo PrincĂ­pio da maior felicidade Regra da utilidade esperada Hedonismo Hedonismo Quantitativo de Bentham Hedonismo Qualitativo de Mill

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Utilitaristas clássicos  Jeremy BENTHAM (1748-1832)  John STUART MILL (1806-1873) Ética teleológica (de “télos”= finalidade): a moralidade resulta da perspetiva de alcançar determinados objetivos/ finalidades. Consequencialista: as ações são moralmente corretas se o seu objetivo visar a promoção imparcial da felicidade ou do bem-estar para a maioria das pessoas por elas afetadas, i.e., tiver em conta as consequências da ação. Hedonista: a felicidade, entendida como prazer, é intrinsecamente valiosa e constitui o bem supremo a alcançar.  as coisas são boas porque nos fazem sentir bem, proporcionam prazer ou diminuição da dor. Filosofia - Marina Santos

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Ética utilitarista O princípio da utilidade como critério da moralidade: Uma ação deve ser realizada somente se dela resultar a máxima felicidade possível para as pessoas que por ela são afetadas (também denominado princípio da maior felicidade). «A doutrina utilitarista consiste nisto: a felicidade é desejável, e a única coisa desejável, enquanto finalidade; todas as outras coisas são desejáveis como meios para esse fim.» (Stuart Mill, Utilitarismo, 1861)

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HEDONISMO IMPARCIALIDADE

1. As ações são moralmente certas ou erradas somente em função das suas consequências. (nada mais importa, pois “De boas intenções está o inferno cheio”) 2. Ao avaliar as suas consequências, só importa a felicidade/ prazer ou infelicidade/dor criada. (tudo o mais é irrelevante: intenção, virtude, caridade...) 3. A felicidade de cada pessoa conta da mesma maneira. => as boas ações são as que maximizam a felicidade dos agentes ou produzem o maior equilíbrio possível entre felicidade e infelicidade, sendo que a felicidade de cada pessoa conta como igualmente importante.

CONSEQUEN CIALISMO

Utilitarismo clássico: teses

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O Utilitarismo clássico como hedonismo Em que consiste o bem-estar ou felicidade de uma pessoa? Hedonismo: O bem-estar consiste unicamente no prazer e na ausência de dor. As experiências aprazíveis são boas apenas pelo facto de proporcionarem prazer. Hedonismo quantitativo de Bentham: Cada um dos diversos prazeres e dores da vida das pessoas tem um certo valor que, em última análise, é determinado apenas pela sua duração e intensidade => cálculo da felicidade Hedonismo qualitativo de Mill: Alguns tipos de prazeres são, em virtude da sua natureza, intrinsecamente superiores a outros. Para vivermos melhor, deveremos dar uma forte preferência aos prazeres superiores (prazeres que resultam do exercício das nossas capacidades intelectuais), recusando-nos a trocá-los por uma quantidade idêntica ou mesmo maior de prazeres inferiores (corporais).  Há graus de prazer =>hierarquização dos valores e dos atos a realizar. Filosofia - Marina Santos

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O Utilitarismo clรกssico como hedonismo

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Utilitarismo clássico Critério da moralidade: Utilidade ou Princípio da Maior Felicidade.

«A doutrina utilitarista consiste nisto: a felicidade é desejável, e a única coisa desejável, enquanto finalidade; todas as outras coisas são desejáveis como meios para esse fim.» « Quanto à escolha entre a sua própria felicidade e a felicidade dos outros, o utilitarismo exige que o agente seja tão estritamente imparcial como um espetador desinteressado e benévolo» «É melhor ser um ser humano insatisfeito do que um porco satisfeito; é melhor ser Sócrates insatisfeito do que imbecil satisfeito» (John Stuart Mill, Utilitarismo, 1861) Filosofia - Marina Santos

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a) O princípio utilitarista da maior felicidade: O utilitarismo, tal como o egoísmo ético, é uma perspetiva consequencialista => agir moralmente é apenas uma questão de produzir bons resultados, isto é, consequências desejáveis: «As ações estão certas na medida em que tendem a promover a felicidade; erradas, na medida em que tendem a produzir o reverso da felicidade.» Mas enquanto um egoísta defende que o agente deve produzir bons resultados apenas para si próprio, um utilitarista considera que o agente deve produzir bons resultados para todos aqueles que poderão ser afetados pela sua conduta: «Devo repetir aquilo que os críticos do utilitarismo raramente têm a justiça de reconhecer: que a felicidade que forma o padrão utilitarista sobre o que está certo na conduta não é a felicidade do próprio agente, mas a de todos os envolvidos.» (J. S. Mill) Filosofia - Marina Santos

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b) O princípio utilitarista da utilidade esperada* Muitos utilitaristas defendem que o melhor curso de ação é aquele que apresentada a maior utilidade esperada: Para determiná-la, tem de se pensar nas várias consequências possíveis decorrentes de um ato planeado e na probabilidade de essas consequências se verificarem. Assim, os utilitaristas pressupõem que é possível medir o bem-estar dos indivíduos, bem como calcular a utilidade esperada associada a cada situação (multiplicando o bemestar produzido em caso de sucesso pela probabilidade do seu sucesso). Portanto, as melhores opções são aquelas que apresentam a maior utilidade esperada numa perspetiva imparcial. Filosofia - Marina Santos

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Utilidade esperada: exemplo O Dr. Zacarias é um cirurgião que está prestes a operar a Maria, que tem uma doença muito grave (e não está em condições de decidir). Se fizer a operação A, Maria ficará completamente curada, mas apenas 10% dos pacientes sobrevivem a este tipo de intervenção. Se optar pela operação B, em que as estatísticas mostram que 90% dos pacientes sobrevivem, Maria não ficará completamente curada, mas poderá fazer uma vida normal à base de medicamentos.  O Dr. Zacarias opta pela operação A. Maria tem a sorte de sobreviver e fica totalmente curada. MAS um utilitarista reprovaria a decisão, uma vez que a utilidade esperada é muito superior para a operação B. Filosofia - Marina Santos

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Utilitarismo de Mill: síntese Princípio da Maior Felicidade como critério da moralidade

Qual é o bem último? A felicidade. A felicidade de quem? Geral/ do maior número. A minha felicidade conta tanto como a de outro? Sim. Em que consiste a felicidade? Na maximização do prazer (ou minimização da dor). Que tipos de prazeres há? Superiores e inferiores. As pessoas têm direitos ou deveres absolutos? Não. O que é correto fazer? O que tiver como consequência a maior felicidade para o maior número de pessoas. Filosofia - Marina Santos

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Críticas ao utilitarismo CRÍTICAS AO UTILITARISMO CLÁSSICO O argumento da máquina de experiências

Outras Objeções

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A) Crítica ao Utilitarismo: o argumento da máquina de experiências «Suponhamos que havia uma máquina de experiências que proporcionaria ao leitor a experiência que desejasse. Neuropsicólogos superfixes podiam estimular o seu cérebro de maneira a pensar e sentir que escrevia um grande romance, fazia um amigo, ou lia um livro interessante. Durante todo este tempo, estaria a flutuar numa cuba, com elétrodos ligados ao cérebro. Dever-se-ia ligar a esta máquina durante toda a vida, pré-programando as suas experiências de vida? Se está preocupado com a perda de experiências desejáveis, podemos supor que as empresas investigaram exaustivamente a vida de muitos outros. O leitor pode escolher a partir da um imenso catálogo, selecionando as suas experiências de vida para, digamos, os dois anos seguintes. (…) Evidentemente, enquanto está na cuba não saberá que ali está; pensará que tudo aquilo acontece efetivamente. Os outros podem também ligar-se e ter as experiências que quiserem, pelo que não há necessidade de estar desligado para os servir. (...) Ligar-se-ia? O que mais pode ter importância para nós, além do modo como são as nossas vidas a partir de dentro? (…) O que tem para nós importância, além das nossas experiências?» (Robert Nozick, Anarquia, Estado e Utopia) Filosofia - Marina Santos

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A) Crítica ao Utilitarismo: o argumento da máquina de experiências https://youtu.be/yJ1dsNauhGE

«O que é importante para nós para além das nossas experiências? 1º Queremos fazer certas coisas e não apenas ter a experiência disso; 2º Queremos ser alguém com certas características, ser uma pessoa; 3º Queremos um contacto efetivo com qualquer realidade mais profunda.» Se o hedonismo é verdadeiro (o nosso bem-estar é determinado apenas pelas experiências que vivemos), então seria melhor ligarmo-nos para sempre à máquina (a nossa vida seria muito mais rica em prazeres). Mas nós cremos que é melhor não nos ligarmos (pois essa vida seria uma farsa) e continuarmos a ter uma vida real. Logo, o hedonismo é falso. Filosofia - Marina Santos

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B) Objeções adicionais ao Utilitarismo A) O utilitarismo exige demasiado do agente moral, ao insistir na promoção da felicidade geral em detrimento da própria felicidade do agente: a minha felicidade não conta? B) O utilitarismo não funciona na prática, pois exige que estejamos sempre a prever as consequências dos nossos atos – e é difícil prevê-las a longo prazo: não é o futuro incerto? C) O utilitarismo, como não leva em conta as normas ou regras morais comuns, predispõe-nos a fazer coisas erradas como mentir, roubar ou matar: o senso comum não conta? D) O utilitarismo não tem em conta a dignidade humana e a inviolabilidade desta: como é possível aceitar que duas vidas valem mais do que uma? Filosofia - Marina Santos

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2 perspetivas sobre a fundamentação da moral A. O que torna as nossas ações certas ou erradas? UTILITARISMO: Apenas as consequências das nossas ações as tornam certas ou erradas. Estas são boas apenas em virtude de promoverem imparcialmente o bem-estar. DEONTOLOGIA: Muitas ações são intrinsecamente erradas, ou seja, independentemente das suas consequências. Poderemos mesmo afirmar que todos devemos respeitar certos deveres que proíbem a realização de determinados atos.

B. Quando é que as ações estão certas ou erradas? UTILITARISMO: Uma ação é boa apenas quando maximiza o bemestar, ou seja, quando promove tanto quanto possível a felicidade do maior número. Qualquer ação que não maximize o bem-estar é errada. DEONTOLOGIA: Uma ação é errada quando com ela infringimos intencionalmente os nossos deveres. Ambos: o comportamento moral deve fundamentar-se em princípios éticos imparciais Filosofia - Marina Santos

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Exercícios

1. Imagine a seguinte situação: Jorge, um engenheiro competente com uma família para sustentar, está desempregado e com grandes dificuldades em encontrar um emprego. Um amigo propõe-lhe que aceite um emprego bastante bem pago num laboratório que desenvolve armas químicas e biológicas. Jorge considera profundamente errado o tipo de investigação desenvolvido nesse laboratório e, por isso, tem como primeira recção recusar a proposta de emprego. Mas o seu amigo faz-lhe notar que, se ele não aceitar o emprego, outra pessoa qualquer o aceitará. O que deve então Jorge fazer? • Avalie a situação do Jorge, raciocinando como um utilitarista. • Concorda com o raciocínio do utilitarista? Porquê? 2. «As consequências das nossas ações prolongam-se indefinidamente pelo futuro, e, como nunca poderemos saber ao certo quais serão as consequências remotas das nossas ações, nunca poderemos saber que ações acabarão por ter melhores consequências. E isto, para um utilitarista, é o mesmo que dizer que nunca poderemos saber o que devemos fazer. Mas é óbvio que às vezes sabemos o que devemos fazer! Logo, o utilitarismo é falso.» Concorda com este argumento? Porquê? Filosofia - Marina Santos

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