O futuro das profissões

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sociedade

martina cavalcanti daniel@cidadenova.org.br Valores e desafios da convivência social

O futuro

das profissões trabalho Novas carreiras devem surgir para responder a necessidades contemporâneas, enquanto profissões atuais correm o risco de desaparecer. Para garantir um lugar no mercado de trabalho, é preciso inovar

P

iloto de drones, mecânico de robôs pessoais, mentor de mindfulness, reciclador de urânio, arqueólogo de lixo espacial, agente de memes, gestor de big data e fazendeiro urbano. Essas são algumas das profissões apontadas por diversas pesquisas que tentam adivinhar o futuro. A miscelânea de novos nomes desperta não só curiosidade, mas também a apreensão de que diver­ sas profissões tais como as conhece­ mos hoje possam desaparecer. Apesar de concordar com a exis­ tência de mudanças e de novas profissões, alguns especialistas des­ confiam dos nomes mirabolantes e ponderam: haverá transformação dos cargos existentes e os profissio­ nais que se atualizarem poderão ga­ rantir seu lugar.

Um olho no presente, o outro lá na frente É ponto pacífico que as novas pro­ fissões tentarão responder a proble­ mas que começam a ser formulados agora. Sustentabilidade, aumento da qualidade de vida e da expecta­ tiva de vida – tudo isso permeado 18

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por muita tecnologia – devem ser os principais motores de configuração das próximas carreiras. “Sem dúvida, o meio digital é onde mais surgirão oportunida­ des. Isso já é uma realidade”, diz Andrea Greca Krueger, especialista em Coolhunting (pesquisa e análise de tendências) e diretora da Berlin, agência de pesquisas qualitativas de mercado. Alguns profissionais em ascensão na área são cientistas de dados, programadores, designers de interação e especialistas em games, segundo ela. A tecnologia é essencial, mas os profissionais de humanas também terão importância, opina Marcelo­ . “O pessoal de tecnologia tem li­ mitações, já que não pensa na ri­ queza da aplicação tecnológica no mundo real. Já os formados em humanidades possuem essa habilidade”, explica. Um bom exemplo é o Chatbot, sistema de inteligência artificial que permite o atendimento a clientes como uma experiência de comunica­ ção quase natural. Apesar de substi­ tuir a força de trabalho nos call cen­ ters por robôs, esse sistema deve criar novas demandas por profissionais.

Psicólogos deverão ajustar o aten­ dimento à imagem da empresa e às diferentes personalidades dos clien­ tes. “Daí poderá surgir um novo profissional para auxiliar a equipe de programação: um especialista em personalidades virtuais”, vis­ lumbra Marcelo Chamarelli, idea­ lizador do Movimento Pró-Futuro. Para que as máquinas apren­ dam as sutilezas da voz humana, fonoau­ diólogos serão imprescindí­ veis, acrescenta o consultor Sidnei Oliveira, especialista em Conflitos de Gerações e Desenvolvimento de Jovens Potenciais. E isso não apenas para o Chatbot, mas para todos os sistemas baseados em comando de voz, a cada dia mais populares. E os atendentes de telemarketing e outros trabalhadores de menor qualificação ficarão sem emprego? Para os especialistas, esse risco exis­ te e a baixa qualidade da educação brasileira é uma questão que precisa ser resolvida. “Se tenho parcela da população sem acesso à tecnologia – e esse é nosso maior problema –, a turma com acesso à educação mais elabora­ da estará melhor preparada”, afirma Irene Azevedoh, diretora de Transi­ ção de Carreira e Gestão da Mudança da Consultoria Global LHH. “Como permitir que essa turma sem edu­ cação adequada desenvolva novas


© industrieblick | Fotolia.com

­ abilidades? Este é um problema so­ h cial que o Brasil tem que enfrentar.” Outra forte tendência é a trans­ formação de algumas profissões em prestação de serviço de conveniên­ cia, à moda Uber. “As pessoas já não querem mais possuir o produto, elas querem o serviço oferecido por ele”, explica o consultor Sidnei Oliveira. Dessa forma, a Volkswagen dei­ xaria de ser uma montadora para se tornar uma prestadora de serviço de mobilidade, alugando seus carros no horário e no lugar que melhor atendam às necessidades de seus clientes, aposta o analista. Para ele, os operários serão substituídos por robôs, mas devem ser mantidos na empresa prestando serviços.

Adeus, profissão velha Com a criação de novas carrei­ ras e o avanço da automatização, espera-se que muitos trabalhadores sejam substituídos por robôs ou que simplesmente seus cargos percam o sentido no futuro. De acordo com pesquisa da Ernst & Young, uma série de profissões pode desaparecer por completo até 2025, ou seja, em menos de dez anos. Qualquer operação que pode ser realizada diretamente por máqui­ nas, seja manual ou intelectual, está ameaçada, aponta Marcelo Chama­

relli. “Todas as profissões atuais vão acabar”, sentencia. “Não é da noi­ te para o dia, mas é inevitável que empregos atuais mudem completa­ mente ou desapareçam.” Mesmo as profissões clássicas correm risco. “Até médico que fica sentado fazendo diagnóstico está fora, pois já há robôs que fazem isso e com mais precisão”, afirma o futurólogo. Mas não precisa se desesperar. Algumas pessoas vão perder suas posições, mas outras vagas serão criadas e certas carreiras serão refor­ muladas, acredita Irene Azevedoh. “Algumas profissões continua­ rão a ser demandadas. Vendas, ges­ tão, atenção ao cliente. Mas, dentro dessas profissões, a tecnologia vai exigir outro tipo de perfil. Mais voltado à base tecnológica para ajudar na produtividade”, afirma a especialista. Ou seja, os profis­ sionais poderão garantir seu espa­ ço no mercado de trabalho desde que se mantenham atualizados. Os médicos, por exemplo, terão a chance de reconstruir seu trabalho direcionando-o à nanotecnologia e outras inovações, aponta Sidnei Oliveira. Eles também devem con­ tinuar sendo imprescindíveis para garantir uma cirurgia bem-sucedida – ainda que esta possa ser realizada por braços mecânicos e à distância.

No caso de engenheiros civis, os sistemas de inteligência já fazem to­ dos os cálculos pelos quais eles se responsabilizavam antes, deixando a este profissional o desafio de se re­ pensar como designer e construtor de soluções, algo que uma máquina não é capaz de fazer. A tecnologia também já domi­ na o trabalho burocrático realiza­ do por um advogado, que poderá se concentrar nos direitos digital e internacional, ambos em ascensão. Mesmo com toda essa expecta­ tiva por inovações, demandas da sociedade podem fazer com que profissões hoje vistas como ultra­ passadas voltem a ter força. Por exem­ plo, os trabalhadores rurais são substituídos pela agricultura meca­ nizada, mas a demanda por agricul­ tura orgânica, livre de agrotóxicos e mais humanizada gera uma nova demanda por produtos manejados por esses trabalhadores. “Existe uma tendência do resga­ te de velhas habilidades e valores, que já está trazendo essa realidade à tona”, opina Andrea Krueger. Hoje, podemos ver isso na tendência vintage ou de simplesmente abrir mão de um produto automatizado por algo mais personalizado e artesanal – algo que será muito difícil de se en­ contrar no futuro e, portanto, poderá ganhar ares de exclusividade. Cidade Nova • Maio 2017 • nº 5

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