ARTIGO COMENTADO
Gastroenterology
2002, 123:10611069
Adherence to Combination Therapy Enhances Sustained Response in Genotype-1 Infected Patients With Chronic Hepatitis C McHUTCHISON et al Gastroenterology 2002,123:1061-1069.
RESUMO INTRODUÇÃO: Nos últimos anos, tem se observado que a aderência ao tratamento antiviral aumenta a resposta virológica nos pacientes com infecção pelo vírus da imunodeficiência adquirida. Os esquemas terapêuticos utilizados nesta infecção são complexos e associados a consideráveis efeitos colaterais. Isto também acontece no tratamento dos pacientes com hepatite C que recebem repetidas aplicações subcutâneas de interferon, ingerem 4-5 comprimidos de ribavirina diariamente, realizam repetidas coletas de sangue para os exames laboratoriais do seguimento e ainda convivem com os consideráveis efeitos colaterais da terapia. Este desconforto é ainda mais pronunciado nos pacientes infectados pelo genótipo 1 do vírus C, pela maior duração do tratamento. OBJETIVO: Avaliar o impacto da aderência na resposta virológica sustentada (RVS) à terapia combinada de interferon alfa-2b ou Peg-inteferon α-2b mais ribavirina em pacientes com hepatite C crônica. CASUÍSTICA E MÉTODOS: Foram analisados retrospectivamente os dados de 3 estudos multicêntricos, previamente publicados, nos quais se utilizou interferon α-2b mais ribavirina (n=1010) ou Peg-inteferon α-2b 1,5 µg/ kg/semana mais ribavirina (n=511) para o tratamento de pacientes com hepatite C crônica. Foram computados os dados referentes à aplicação das drogas, fichas de retornos
e diários dos pacientes. A partir disto 2 grupos foram definidos. O grupo 1 foi constituído por pacientes que receberam um número de doses >= 80% do total das doses prescritas de interferon e ribavirina por um tempo >= 80% da duração esperada do tratamento. O grupo 2 foi constituído por pacientes que receberam doses reduzidas (< 80% do número total projetado de ambas as drogas por um tempo >= 80% da duração esperada do tratamento). RESULTADOS: A maioria dos pacientes tomou pelo menos 80% das doses prescritas de interferon α-2b mais ribavirina ou Peg-inteferon α-2b mais ribavirina e apresentou taxas de RVS de 52% e 63%,respectivamente para os 2 esquemas. Isto foi mais aparente para os pacientes infectados pelo genótipo 1 do vírus C. CONCLUSÕES: Pacientes infectados pelo genótipo 1 do VHC que conseguiram manter o tratamento com interferon ou Peg-inteferon α-2b mais ribavirina tanto em termos de doses ou tempo de duração apresentaram melhores taxas de resposta virológica sustentada. Os resultados sugerem que a aderência aumenta a probabilidade de obter-se uma resposta virológica precoce que se correlaciona com maiores taxas de resposta virológica sustentada.
ARTIGO COMENTADO
Gastroenterology
COMENTÁRIOS Dr. Fernando Lopes Gonçales Jr Professor Associado de Doenças Infecciosas e Parasitárias. Grupo de Estudo das Hepatites Virais Disciplina de Moléstias Infecciosas / FCM /UNICAMP
A
infecção pelo VHC afeta aproximadamente 300 milhões de pessoas no mundo sendo a causa mais comum de doença hepática crônica. Até recentemente a melhor abordagem terapêutica era a associação de IFN alfa ( 3 M.U, sub-cutânea, 3 vezes/semana) mais Ribavirina (1000 - 1250 mg/dia). Esta terapia produz cerca de 41% de resposta virológica sustentada (traduzida pela negativação do RNA do VHC no teste de PCR, realizado 6 meses após o termino do tratamento). Esta resposta é durável e produz benefícios a longo prazo. Ensaios multicêntricos recentemente realizados, do qual os autores deste artigo participaram, mostraram que a combinação de Peg-inteferon α-2b mais Ribavirina é capaz de produzir taxas de 54% de resposta virológica sustentada em pacientes com hepatite C crônica. Esta resposta virológica pode chegar a 61% quando as doses de PegIFN α-2b mais Ribavirina são otimizadas de acordo com o peso dos pacientes.
ingestão diária de vários comprimidos. Há a necessidade, também, de um controle laboratorial que requer a realização de repetidas coletas de sangue para a execução dos exames de seguimento. Para completar, podem surgir diversos efeitos colaterais que geralmente alteram o ritmo e a qualidade de vida dos pacientes. Como resultado muitos pacientes não completam o tratamento proposto ou o fazem de forma não satisfatória.
Todas as análises demonstraram que a aderência aumenta substancialmente a taxa de resposta sustentada principalmente nos pacientes com hepatite C crônica causadas pelo genótipo 1
O tratamento da hepatite C, feito com a associação de interferon convencional ou Peg-inteferon mais a Ribavirina produz graus variados de desconforto para os pacientes, tanto pela aplicação de injeções sub-cutâneas repetidas,quanto pela
Estes mesmos problemas já haviam sido observados em outras doenças infecciosas crônicas que requerem, também, tratamentos prolongados e participação do paciente e seus familiares. A experiência de tratar infecções causadas pelo virus da imunodeficiência humana (aids) e micobacterioses (tuberculose) ensinou-nos que quanto maior a aderência do paciente aos esquemas terapêuticos maior o porcentual de bons resultados observados durante e ao final dos mesmos. A aderência tem sido tão valorizada no tratamento destas infecções que muitos serviços de referência em tratamento de aids e tuberculose incorporaram outros profissionais (enfermeiras, assistentes sociais, psicólogos) para uma melhor abordagem destes doentes. Estes serviços espe-
ARTIGO COMENTADO
Gastroenterology
cializados no tratamento de aids e tuberculose, treinam os pacientes para reconhecer os vários comprimidos quanto a sua forma e sequência de administração. Este tipo de administração supervisionada de medicações tem sido empregada em serviços de oncologia, em pacientes submetidos à soroterapia e em setores de pediatria. Procedimentos dialíticos também requerem repetidas idas semanais dos pacientes aos serviços de saúde, muitas vezes, por muitos anos. Neste sentido, todos os esforços para que se obtenham os melhores resultados de um tratamento devem ser tentados, principalmente em casos de hepatite C. Como se sabe, esta é uma doença crônica, disseminada na nossa população e com um tratamento muito caro que, infelizmente produz resultados apenas razoáveis e que para piorar, conta com um diminuto arsenal terapêutico.
to da hepatite C crônica. Foram revisadas as respostas virológicas sustentadas obtidas em 3 grandes estudos multicêntricos. A análise do banco de dados permitiu comparar a RVS dos pacientes aderentes com a da população não aderente em cada estudo. Assim, no estudo de Mchutchison et al e Poynard et al, os pacientes aderentes tratados com interferon convencional mais Ribavirina apresentaram RVS de 52% contra 47% de RVS observada entre os não-aderentes.No estudo de Manns et al os pacientes aderentes tratados com PegIFN alfa-2b mais Ribavirina apresentaram RVS de 63% contra os 52% de RVS observada entre os não aderentes. Entre pacientes aderentes q u e re c e b e r am doses otimizadas de PegIFN α-2b (1,5 ug/Kg) mais Ribavirina (>10,6 mg/kg) observouse 72% de RVS contra 57% de RVS entre os não aderentes.
Observou-se 63% de Resposta Virológica Sustentada em pacientes com G1 que receberam dose de 1,5 mcg/kg/sem de PegIFN α-2b e dose otimizada de Ribavirina > 10,6 mg/kg
É fundamental por isto buscar-se obter os melhores resultados possíveis. Neste sentido, todas as medidas institucionais que busquem controlar a distribuição e otimizar a administração dos remédios e, em conseqüência, produzir maior aderência devem ser incentivadas e progressivamente melhoradas. Neste caso estão os Polos de Aplicação Assistida de Interferon Peguilado regulamentados pelo Ministério da Saúde e já em funcionamento em várias regiões, inclusive no Estado de São Paulo, que podem e devem ser parte da matriz terapêutica. Este trabalho destaca e discute os vários aspectos relacionados com a aderência ao tratamen-
Observou-se 63% de Resposta Virológica Sustentada em pacientes com G1 que receberam dose de 1,5 mcg/kg/sem de PegIFN α-2b e dose otimizada de Ribavirina > 10,6 mg/kg. Todas as análises demonstraram que a aderência aumenta substancialmente a taxa de resposta sustentada principalmente nos pacientes com hepatite C crônica causadas pelo genótipo 1. Promover uma maior aderência dos pacientes, buscar obter maior porcentual de cura e otimizar os gastos públicos na hepatite C é dever do médico e das instituições comprometidas com a saúde coletiva.