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MEDICINA HOJE - Suplemento especial Chiesi • janeiro de 2007
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I Simpósio Internacional de Insuficiência Respiratória Neonatal
Prof. Dr. Ola D. Saugstad (Noruega)
“É possível ressuscitar o recém-nascido apenas com ar ambiente.”
Novos protocolos para o uso do oxigênio em neonatalogia
página 2
Prof. Dr. Henry L. Halliday (Reino Unido)
“Corticoesteróides em pós-natal devem ser usados na dose mais baixa pelo menor período possível, e evitados nos quatro primeiros dias de vida.” página 6
Prof. Dr. Christian Speer (Alemanha)
“A recomendação agora é manter a saturação de oxigênio entre 85 e 92% durante as primeiras semanas de vida, evitar flutuações do O2 e fazer ressuscitações de urgência.”
página 3
Da esquerda à direita: Prof. Dr. Rangasamy Ramanathan (Estados Unidos), Prof. Dr. Christian Speer (Alemanha), Profa. Dra. Edna Diniz (Brasil), Prof. Dr. Ola D. Saugstad (Noruega), Prof. Dr. Renato Fiori (Brasil), Prof. Dr. Henry L. Halliday (Reino Unido), Prof. Dr. Tore Curstedt (Suécia).
O I Simpósio Internacional de Insuficiência Respiratória Neonatal, realizado no Rio de Janeiro nos dias 3 e 4 de novembro, reuniu alguns dos mais renomados pesquisadores do mundo inteiro da área de medicina intensiva neonatal. O grande destaque do evento girou em torno das questões sobre o uso do oxigênio, método mais usado na ressuscitação de recém-nascido, bem como a terapia com uso de surfactantes, mais indicada, de acordo com estudos controlados, em
crianças com menos de 27 ou 28 semanas, sempre nas primeiras horas de vida. Os especialistas ainda não obtiveram resultados satisfatórios sobre a produção de novos surfactantes sintéticos, necessitando ainda de novos estudos controlados. Os recentes resultados obtidos nessa “jovem” disciplina mostra as rápidas mudanças ocorridas nos últimos 20 anos. O evento foi organizado pelo laboratório farmacêutico Chiesi e contou com os patrocínios da Fiocruz, UFRJ e UERJ.
Mais de 200 pediatras e especialistas de medicina intensiva neonatal participaram do evento.
Prevenção e tratamento da Um teste simples para avaliar displasia pulmonar crônica a maturidade pulmonar Prof. Dr. Renato Fiori (PUCRS, Porto Alegre) desenvolveu um teste simples, rápido e pouco oneroso, o teste das microbolhas estáveis, para avaliar a maturidade pulmonar do bebê prematuro e decidir sobre a administração do surfactante.
Prof. Dr. Tore Curstedt (Suécia)
”Mutações genéticas raras são responsáveis por deficiências graves e geralmente fatais de surfactante.”
página 5
página 7
Novas indicações do surfactante Prof. Dr. Rangasamy Ramanathan (Estados Unidos)
“Entre 400 a 600 bebês ficam cegos, por ano, devido a retinopatia da prematuridade, nos Estados Unidos.” página 4
Para o Prof. Dr. José Luiz Muniz Duarte Bandeira (Hospital universitário Pedro Ernesto, Rio de Janeiro), evitar a infecção, a desnutrição e respeitar um ambiente sem estresse são primordiais na prevenção da BPD.
Profa. Dra. Edna Diniz (USP, São Paulo) estudou o uso dos surfactantes em várias doenças do récem-nascido como na síndrome de aspiração de mecônio, nas infecções pulmonares ou na hérnia diafragmática congênita.
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Ressuscitação
Usando ar ambiente Para o Prof. Dr. Ola Saugstad, o ar ambiente é a melhor solução no início, e, no caso de uso de oxigênio, as concentrações não devem ultrapassar 21 a 40%. Ao contrário dos 100% recomendados nas principais diretrizes. Ao contrário do que preconizavam as diretrizes anteriores para ressuscitação do recém-nascido, que recomendavam uma concentração de 100% de oxigênio, a diretriz atual dá margem ao médico para escolher qual medida utilizar. Se tal mudança já pode ser considerada um avanço, e indica uma tendência à utilização de taxas menores da substância, na opinião do Prof. Dr. Ola Saugstad, do Department of Pediatric Research da University of Oslo, Noruega, não há sequer necessidade de utilizar oxigênio extra no início do procedimento de ressuscitação. “Na maioria dos casos, é possível ressuscitar o recém-nascido com ar
Diferenças entre países Na opinião do Prof. Dr. Ola Saugstad, um dos desafios agora é realmente descobrir com que concentração a ressuscitação deve ser iniciada, no caso de não ser utilizado ar ambiente. “Muitos estudos têm apostado em uma concentração entre 21% e 40%. Entretanto, parece-me que mesmo 40% é um pouco alto demais. Eu estou convencido de que as diretrizes vão mudar para concentrações cada vez menores. E talvez a próxima diretriz recomende o uso de ar ambiente no início e, se necessário, oxigênio extra – o que eu
“
Na maioria dos casos, é possível ressuscitar o recémnascido com ar ambiente.
ambiente”, defendeu o especialista norueguês. Na opinião do Prof. Dr. Ola Saugstad, tudo indica que a utilização apenas do ar ambiente está relacionada a uma mortalidade mais baixa e a uma recuperação mais rápida. “Eles começam a respirar mais rapidamente quando nós os ressuscitamos com ar ambiente. E nós também sabemos que o oxigênio induz a inflamação não apenas no pulmão, mas também no coração e no cérebro”, afirmou.
considero a melhor recomendação”, disse, durante o seminário. Ele explicou que em seu país, a Noruega, não existem diretrizes sobre o assunto, mas que é muito rara a utilização de oxigênio atualmente. “E se o oxigênio é utilizado, isto é feito muito rapidamente e em uma concentração o mais próxima possível daquela encontrada no ar ambiente. Na Suécia, país vizinho ao meu, eles decidiram, como no Cana-
dá, que se deve começar utilizando o ar ambiente”, pontuou. Para Prof. Dr. Ola Saugstad, a principal vantagem da nova recomendação é que ela permite ao médico a utilização de concentrações inferiores a 100%. Essa mudança foi fundamental principalmente para que os médicos dos Estados Unidos pudessem escolher que concentração utilizar, já que antes todos se viam obrigados a utilizar oxigênio puro com receio de enfrentarem questões legais caso não o fizessem – a despeito dos inúmeros estudos que já haviam sido publicados que indicavam o contrário. “E, agora, há cada vez mais neonatologistas começando a ressuscitação com ar ambiente ou com uma concentração inferior a 100% de oxigênio”, destacou. Vidas poupadas De acordo com o especialista, os últimos estudos experimentais, realizados entre 2000 e 2006, mostram que a utilização de oxigênio puro aumenta o estresse oxidativo no cérebro, pulmão e intestino e os danos no pulmão, no coração e no cérebro; causa necrose relativa à lesão cerebral; aumenta a ativação dos fatores de transcrição, de MMPs e das citocinas pró-inflamatórias; leva a danos no DNA e na regulação dos genes.
Prof. Dr. Ola Saugstad, Noruega: “O bebê prematuro começa a respirar mais rapidamente quando nós os ressuscitamos com ar ambiente”.
O pesquisador destacou que estudos anteriores com hipoxemia global, realizados entre 1990 e 1999, já haviam mostrado que o ar ambiente restaura tão eficientemente quanto o oxigênio puro o metabolismo, a pressão sangüínea, o débito cardíaco e o fluxo sangüíneo pulmonar e cerebral. Os resultados de uma meta-análise envolvendo cinco estudos realizados entre 1993 e 2003, conduzida por Prof. Dr. Ola Saugstad e colegas, mostram, ainda, que a mortalidade caiu de 13% para 8% na média, chegando a uma redução de 3,5% para 0,5% em um estudo espanhol. Ao todo, as cinco pesquisas incluídas na análise estudaram 1.737 crianças. Prof. Dr. Ola Saugstad salientou que “uma redução de apenas 5% na mortalidade entre os cerca de 4 milhões de recém-nascidos que necessitam de ressuscitação em todo o mundo representaria 200 mil vidas poupadas por ano”. Em outro estudo, publicado em 2003 na revista Pediatrics, o pesquisador analisou os resultados de 91 crianças ressuscitadas com ar ambiente comparados aos daquelas que
Estresse oxidativo
Oxigenação versus antioxidantes Embora o estresse oxidativo seja uma categoria ligada a uma série de patologias do recém nascido “não existem provas definitivas de sua importância patogênica ou da eficácia terapêutica do uso de antioxidantes, apesar dos 25 anos de pesquisa sobre o assunto”, disse o Prof. Dr. Ola Didrik Saugstad, do departamento de pesquisa em pediatria da University of Oslo, Noruega. De qualquer forma, a compreensão do mecanismo do estresse oxidativo do recém nascido reveste-se de dados que vêm embasando as pesquisas que buscam respostas etiológicas ou mesmo terapêuticas para o problema. Por outro lado, o nascimento, por si só, é um processo de entrada, para o bebê, em um ambiente de maior oferta de oxigênio, comparada à que ele dispunha na vida intra-uterina e com a qual ele terá de lidar. Na verdade, “trata-se do momento da maior descarga hiperóxica que o ser humano recebe ao longo de toda a sua vida”, disse o Prof. Dr. Ola. Ele afirmou que “nós precisamos de oxigênio para gerar energia e, por conta dos radicais de oxigênio gerados nesta quebra energética, necessitamos de enzimas antioxidantes que, no feto, só amadurecem ao final da gestação”, portanto, no
caso de bebês prematuros a situação fica mais complicada, ”já que sua defesa antioxidante é mais baixa”. Além disso, marcadores de estresse oxidativo são maiores em mulheres grávidas do que em não grávidas e parecem estar associados a doenças da gravidez como eclâmpsia e ao baixo peso do bebê. “Os marcadores F2-isoprostanos têm sido inversamente correlacionados com o peso ao nascimento sendo que crianças a termo pequenas para a idade gestacional mostram MDA (malondialdeído) elevado no cordão umbilical e glutationa reduzida, sendo esta considerada o nosso principal antioxidante”. Ele também acrescentou que é possível que o estresse oxidativo exerça algum papel na “programação fetal” da doença adulta. Aliado a isto, ferro livre elevado e inflamação também favorecem a liberação de substâncias oxigênio-reativas, e podem estar em condições elevadas no pré-termo. Isto soma-se ao fato de, nele, ao contrário, os fatores antioxidantes estarem baixos tais como o SOD (superóxido dismutase), catalase, glutationa, bilirrubina, ácido ascórbico, tocoferol e ácido úrico, entre outros. Segundo artigos de Suzuki, Saugstad e Jankov, publicados respectivamente na Free Radical Bio-
logical Medicine em 1997, na Current Opinion in Obstetrics Gynecology em 2001 e na Pediatrics Research em 2001, “o estresse oxidativo estaria implicado nos processos de inflamação, lesão por hipóxia-reoxigenação, persistência de ducto arterial e outras, carcinogênese, aterosclerose, transdução de sinal, crescimento e diferenciação celular, apoptose e expressão genética”, disse Prof. Dr. Ola Saugstad.
“
Os prematuros apresentam a chamada “doença do radical oxigênio”, responsável por lesões em olhos, pulmões, intestinos e no cérebro.
veis por várias lesões no prematuro, inclusive a displasia pulmonar. Doença do radical oxigênio “Prematuros tendem a apresentar lesões em olhos, pulmões, intestinos e especialmente no cérebro. Será que que isto não representa facetas de uma mesma doença?”,
Tenho me dedicado a estudar a hipoxantina que se apresenta elevada durante a hipóxia.
Hiperoxigenção na ressucitação Outra questão bastante estudada pelo Prof. Dr. Ola Saugstad diz respeito à hiperoxigenção que se processa no ato da ressucitação cardíaca em bebês prematuros seguido à hipóxia da parada cardíaca. “Tenho me dedicado a estudar a hipoxantina que se apresenta elevada durante a hipóxia”, disse, acresentando que “em cães ela também mostra um aumento rápido na parada cardíaca e na ressuscitação”. Estando em concentração elevada por ter sido estimulada sua liberação sob a hipóxia da parada, no ambiente hiperóxido que normalmente se oferece na ressuscitação, a hipoxantina é catabolizada pela xantina-oxidase transformando a grande quantidade de oxigênio em radicais livres que seriam responsá-
questionou o pesquisador. “Eu a denomino doença do radical oxigênio no recém nascido”, respondeu, mostrando um trabalho publicado no JAMA em 2003 por Schmidt et al que quantificaram o prognóstico ruim (35%) para morte tardia ou incapacidade de prematuros com displasia pulmonar crônica, lesão cerebral e retinopatia da prematuridade, síndromes que, segundo o professor, fariam parte da mesma doença, sendo, em último caso, causa ou mesmo consequência da peroxidação. Em suma, grosso modo, do ponto de vista terapêutico, diante das dificuldades geradas em um bebê pelo aumento de radicais livres de oxigênio, “o melhor é reduzir a oxigenação do que fornecer antioxidantes”, afirmou no evento.
receberam oxigênio. Segundo ele, não foram identificadas diferenças no que tange ao crescimento somático ou ao desenvolvimento psicomotor. Faltam dados Levando em consideração os estudos desenvolvidos até o momento, Saugstad destacou algumas das conclusões a que se pôde chegar no manejo do recém-nascido. A principal delas, segundo o pesquisador, é de que “não há dados suficientes para especificar a concentração de oxigênio no início da ressuscitação”. Outra mudança citada pelo especialista é “que a sucção orofaríngea e nasofaringea intrapartum para crianças nascidas com líquido meconiado não é mais recomendada”. Apesar da falta de dados em humanos, Prof. Dr. Ola Saugstad afirmou considerar razoável continuar a utilizar a epinefrina/adrenalina quando a ventilação e a massagem tiverem falhado no sentido de aumentar a freqüência cardíaca a níveis superiores a 60 bpm. “A dose recomendada é de 0,01-0,03mg/kg. Não dê doses mais altas de epinefrina. A segurança de doses endotraqueais mais altas não foi estudada”, defendeu. Sobre a colocação do tubo traqueal, ele lembrou que deve ser avaliada, especialmente em crianças com uma baixa freqüência cardíaca que não esteja aumentando com as outras medidas. “A detecção de exalação de CO2 é útil para verificar a colocação do tubo traqueal”, ressaltou. O especialista chamou a atenção para o fato de que 10% dos recémnascidos exigem alguma assistência para começar a respirar no nascimento, o que representa cerca de 13,5 milhões por ano em todo o mundo, e em torno de 1%, 1,4 milhão, necessitam de intervenção extensiva.
Redação e administração: Atlântica Editora, Rua Teodoro Sampaio, 2550, cj.15 Pinheiros 05406-200, São Paulo, SP, Tel: (11) 3816-6192, E-mail: atlantica@atlanticaeditora.com.br Editor: Dr. Jean-Louis Peytavin Coordenação editorial: René Delpy Redação deste suplemento: Dra. Ilana Polistchuck, Gustavo Oliveira (Agencia Notisa), Cecília Marques (reportagem e tradução) Publicidade: Mauricio Galvão Anderson, Exalta Camargo Direção-arte: Cristiana Ribas Medicina Hoje é uma parceria entre Medicine Today International (MTI) e Atlântica Editora. MTI edita Dagens Medicin (Suécia), Dagens Medicin (Dinamarca), MediUutiset (Finlândia), Dagens Medisin (Noruega), Puls Medycyny (Polônia).
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Complicações pulmonares
Prevenção e tratamento da displasia pulmonar crônica do prematuro A prevenção das complicações pulmonares exige um conjunto de cuidados, da luta contra a infecção e a desnutrição até a administração adequada de oxigênio e de surfactante. O Prof. Dr. Christian Speer do University Children’s Hospital, de Würzburg, Alemanha e José Luiz Muniz Duarte Bandeira do Hospital universitário Pedro Ernesto da UERJ, Rio de Janeiro, discutiram as pesquisas e as diferentes realidades entre os países com relação ao tratamento e prevenção de prematuros com BPD (displasia pulmonar crônica). Em um ponto houve concordância absoluta: o oxigênio precisa ser administrado com critério e cuidado, seja na terapêutica da síndrome, seja para evitar ou minimizar sua instalação. Também houve unanimidade com relação ao uso do surfactante: “Nas três primeiras horas de vida o surfactante pulmonar deve ser administrado”, disse José Luiz Bandeira. O Prof. Dr. Christian Speer recordou para a platéia a fisiopatologia dos eventos intra-uterinos e do pósnascimento que contribuem para a instalação da denominada nova BPD, lembrando que são os mesmos que devem ser inibidos para que se faça a profilaxia da doença. Antes de nascer, a corioamnionite e, no pós-natal, ressuscitação, toxicidade do oxigênio, ventilação mecânica, infecção pulmonar ou sistêmica e persistência de ducto arterial (PDA) levam à nova BPD, que é caracterizada patologicamente pela seqüência de resposta inflamatória pulmonar e cicatrização anormal das lesões, com inibição da alveolarização e do crescimento vascular. De qualquer forma, o tratamento da doença instalada se confunde com as tentativas profiláticas, já que a incidência de displasia em bebês prematuros – sua patologia mais comum – aumenta quanto menor o peso e a idade gestacional. Diante disto, o Prof. Dr. Christian Speer e José Luiz Bandeira analisaram as possibilidades terapêuticas segundo pesquisas e evidências, salientando as diferenças geográficas. “Quando encontrei apenas 5% de BPD nos registros dos recém nascidos do serviço de neonatologia que chefio, comparados aos 10 a 15% da literatura mundial, estranhei números tão baixos em comparação aos centros mais desenvolvidos”, disse Bandeira. A explicação é objetiva: “Isto se deve aqui à alta mortalidade dos bebês prematuros com baixo peso, pois eles nem chegam a desenvolver a BPD”. Evitar a infecção e a desnutrição dos prematuros é, para o professor da UERJ, a questão central da prevenção da BPD em nosso país. “Prematuros precisam ser manipulados apenas uma vez em conjunto para todos os procedimentos de médicos, fisioterapeutas e enfermeiros, ao contrário do que acontece. Além disso, é necessário evitar colocar a criança em um tubo de ventilador, buscando o CPAP nasal. Por outro lado, é preciso prolongar ao máximo a gestação para possibilitar o maior ganho ponderal possível. Uma vez nascido o bebê, nosso cuidado precisa estar focado em sua nutrição, sendo esta estabelecida através do leite materno com
fortificante, fórmula de prematuro e substâncias antioxidantes como vitamina A, E, selênio e zinco”, disse. De acordo com Bandeira, é a própria infecção que, algumas vezes, contribui para a abertura do PDA que, segundo Speer, em prematuros muito pequenos e com insuficiência respiratória grave “chega a mostrar 80% de incidência”, como visto em estudo publicado por Bancalari et al na Biology of the Neonate. O trabalho, segundo o palestrante alemão, investigou a incidência de PDA em crianças com peso muito baixo ao nascer e aquelas com displasia severa nascidas entre 1996 e 2002. “Tratar o canal, inclusive farmacologicamente, é então condição básica para estas crianças já que quanto maior a demora terapêutica, pior o quadro de BPD”, disse. Outra pesquisa apresentada pelo professor, de dez anos atrás, publicada no Journal of Pediatrics por González et al já mostrava infecção e PDA como fatores condicionantes de displasia grave em recém natos. Oxigênio: limites mais baixos Grande alvo de todo o Simpósio, o oxigênio é o gradiente abrupto que se instala na concentração sanguínea do bebê quando o mesmo é submetido a altas concentrações ambientais ou por cateter nasal ou ainda no respirador artificial, levou o Prof. Dr. Christian Speer a apresentar os dados de estudo observacional feito no norte da Inglaterra com 295 bebês, com menos de 28 semanas de gestação, que sobreviveram no primeiro ano. A intenção da pesquisa, publicada nos Archives of Disease in Childhood em 2001, foi investigar se diferenças nas políticas de controle da saturação de oxigênio teriam algum impacto no desenvolvimento de retinopatia. “O que foi visto é que no intervalo de saturação entre 88 e 98%, o prejuízo das crianças com menos de 28 semanas se apresentou muito maior, comparado ao intervalo com saturação entre 70 e 90%, alterando a ventilação artificial de 27 dias, no primeiro caso e 14 dias, no segundo”, disse. Além disso, no intervalo com números menores, os bebês foram submetidos a uma média de 44 dias de oxigênio e no intervalo maior, a média foi de 78 dias. Entretanto, vale atentar para o fato de que, segundo Speer, os pesquisadores afirmaram que “tentativas de manter saturação em níveis fisiológicos pode causar mais prejuízos do que benefícios para bebês nascidos antes das 28 semanas e que seriam necessários estudos controlados sobre o assunto”. Outro estudo, o BOOST, este controlado, duplo-cego e randomizado mostrou, também de acordo com o Prof. Dr. Christian Speer, que a saturação de oxigênio menor ou igual a 95% comparada à maior que 95% resultou em 46% e 64% de displasia pulmonar, respectivamente. Finalmente, “resultados de cinco estudos
Além da vitamina A que, em pesquisas, mostrou uma redução – considerada diminuta por alguns pediatras para indicação de seu uso – de 7% em BPD com relação ao controle, indometacina (não previne BPD, segundo estudos), diuréticos (seu uso seria controverso, com indicações precisas), eritromicina e outras substâncias antiinflamatórias também foram apresentadas mais como vias de pesquisa. Um dado interessante, relatado por Speer, foi Prof. Dr. José Luiz Muniz Duarte Bandeira (Brasil) (esq.) e Prof. Dr. Christian Speer (Alemanha). o da cafeína. Estudo publicado na revista Recent Advances in Neonaobservacionais indicaram que saturatal Medicine em 2005 por Schmidt Potencial terapêutico da cafeína ções de oxigênio maiores que 92% aumostrou os resultados de trabalho mentam o risco de retinopatia e disfeito com a substância e placebo. A Ambos os médicos concordam plasia em prematuros de muito baixo dose de ataque de 20mg/kg de citraque o uso de óxido nítrico ainda peso, e sugerem como recomendação to de cafeína e de manutenção de 5 pode ser útil em alguns casos de ina saturação entre 85 e 92% durante a 10mg/kg de peso a cada 24 horas suficiência severa, sendo que Speer as primeiras semanas de vida, evitar reduziram BPD, PDA, mas também o indica para BPD com hipertensão flutuações do oxigênio e fazer resdiminuíram o ganho de peso nas pulmonar severa. Por outro lado, ensuscitações de urgência”. Cauteloso, primeiras três semanas. “Entretanto, quanto o pesquisador alemão critiBandeira estende a saturação até 95% Schmidt alerta que uma avaliação de cou a dexametasona, afirmando que e chamou a atenção para as rotinas de longo prazo dos efeitos da cafeína é o medicamento “perdeu sua função trabalho: “O mais difícil é conseguir necessária antes que a cafeína poscom relação às crianças muito preque as pessoas que trabalham no sesa ser rotineiramente recomendada maturas”, Bandeira utiliza o corticóitor de neonatologia mantenham os para prevenir a displasia pulmonar”, de em doses de 6 dias “para desmalimites de oxigênio inalterados”. ponderou Speer. mar o prematurinho do ventilador”.
Mecanismos inflamatórios na displasia broncopulmonar Fatores pré-natais como a corioamnionite e fatores pós-natais como a ventilação prolongada e a infecção desencadeiam uma grave reação inflamatória devastadora resultando em doença pulmonar. A displasia broncopulmonar (BPD) na criança prematura resulta de um desequilíbrio entre mecanismos pró-inflamatórios e antiinflamatórios, favorecendo os mecanismos pró-inflamatórios, explica o Prof. Dr. Christian Speer, Professor de pediatria e Presidente do University Children´s Hospital de Würzburg, Alemanha. As pesquisas efetuadas nos últimos anos permitem entender melhor a cascata dos eventos complexos que resulta em BPD, mas, reconhece o Prof. Dr. Christian Speer, a seqüência patogênica exata da inflamação pulmonar crônica e aguda não está clara e, por enquanto, só foi parcialmente elucidada. A primeira evidência é que vários fatores inflamatórios são presentes nos fluidos broncoalveolares de crianças pré-termos com BPD, como TNF-α, TGF-β1, interleucinas 1 e 8 (IL-1 e IL-8), mediadores de lípides, radicais de oxigênio, fibronectina, fragmentos de elastina, etc. Inúmeros estudos sobre o animal comprovaram a relação entre alguns fatores pós-natais, como a ventilação e o uso do oxigênio com o aumento dos fatores inflamatórios no pulmão. O oxigênio, por exemplo, em estudos sobre o rato pré-termo, provoco uma elevação das taxas de TNF-α, MCP-1, IL-6, a ventilação e a exposição ao oxigênio são responsáveis também de o aumento do número de macrófagos. A CPAP a 4cmH2O (continuous Positive Airway Pressure) é significativamente responsável
por lesões pulmonares em modelo de rato, segundo um estudo de Tsuchida et al. (Am J Physiol Lung Cell 2005). A distensão pulmonar provocada por volumes que excedem a capacidade pulmonar total induz a “quebra” de elementos estruturais alveolares e vasculares, um influx de leucócitos, aumenta a permeabilidade intersticial e alveolar, resultando assim em edema. A criança é exposta a fatores prénatais, como sepse, SIRS (Síndrome de Resposta Inflamatória Sistêmica), e principalmente a corioamnionite, infecção das membranas de origem feto-materno, comprometendo a membrana corioamniótica, o liquido amniótico e o cordão umbilical. Uma das conseqüências desta infecção é a elevação de citocinas pró-inflamatórias no líquido amniótico. Terapia gênica A estes eventos pré-natais se acrescentam os eventos pós-natais como a ressuscitação, a toxicidade própria do oxigênio, a ventilação mecânica e as eventuais infecções pulmonares. Esta conjunção é responsável pela resposta inflamatória pulmonar, inibição da alveolarização e do desenvolvimento vascular. Segundo Prof. Dr. Christian Speer, a corioamnionite, a ventilação mecânica e a infecção pós-natal são os principais fatores da doença pulmonar. A exposição à corioamnionite
Prof. Dr. Christian Speer
e a ventilação mecânica superior a 7 dias ou a infecção pós-natal são suficientes para definir o que ele chama de “nova” BPD. Estes eventos são responsáveis pela cadeia de reação inflamatória, com características próprias da criança prematura: apesar de alguns déficits bem definidos no fornecimento de neutrófilos e na função fagocítica, “as crianças prematuras são aparentemente capazes de apresentar uma resposta neutrófila considerável e sustentada para uma variedade de mediadores inflamatórios,” explica Prof. Dr. Christian Speer. A sobrevida prolongada de neutrófilos neonatais em áreas de inflamação pode contribuir para os efeitos devastadores e prejudiciais destas células para os tecidos pulmonares e vias aéreas. Novas perspectivas terapêuticas existem com a terapia gênica: a administração pós-natal do fator VEGF (fator de crescimento vascular), mediado por adenovírus, demonstrou melhora na sobrevida, na formação de capilares vasculares, e no desenvolvimento alveolar, em modelo de BPD de rato induzida por hipoxia.
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Retinopatia da prematuridade
Importância da diminuição da saturação de oxigênio A retinopatia e o risco de cegueira aumentam com o uso de oxigênio. O número de casos cresce atualmente com a sobrevida de pré-termos de muito baixo peso, justificando o restrito controle da administração de oxigênio.
Estudos na Inglaterra Portanto, ROP, cujo primeiro relato, segundo o Prof. Dr. Rangasamy Ramanathan, foi de Terry, em 1942, teve sua primeira epidemia relacionada à hiperóxia. “A segunda epidemia foi causada também por hiperoxia e normoxia em bebês extremamente prematuros e a epidemia atual diz respeito ao fato de termos bebês extremamente pequenos que sobrevivem mais e são submetidos a todos estes fatores”, afirmou. A incidência de ROP em uma cidade da Inglater-
ra entre 1990 e 1999, apontada por Hameed e colegas em 2004 na Pediatrics mostra que entre 1990 e 1994, de 203 prematuros com menos de 1250 g, nove (4,4%) desenvolveram ROP em estágio igual ou maior que III. Já no intervalo seguinte, entre 1995 e 1999, entre 302 prematuros, a percentagem aumentou para 11,9%. “Existe uma forte evidência que a severidade de ROP em crianças com menos de 1250 g esteja aumentando e isto é independente do aumento da sobrevida”, disse o professor norte-americano acrescentando que “entre 400 e 600 bebês ficam cegos, por ano, devido a ROP, nos Estados Unidos”. Além disso, bebês maduros, nascidos a termo, estão desenvolvendo ROP, “o que é particularmente problemático nos países do Terceiro Mundo, se comparados aos países desenvolvidos”.
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Há história de três epidemias da retinopatia da prematuridade (ROP): a primeira vai de 1942 a 1950, a segunda de 1970 a 2000 e daí até o momento atual estamos vivendo a terceira epidemia ROP. Na apresentação da palestra intitulada “Saturação de oxigênio e retinopatia da prematuridade”, o Prof. Dr. Rangasamy Ramanathan, pesquisador e professor de pediatria da University of Southern Califórnia, Los Angeles, mostrou que no primeiro estudo multicêntrico, randomizado e controlado sobre oxigênio e ROP, os prematuros que sobreviveram e que foram submetidos à menor quantidade de oxigênio desenvolveram menos ROP e menos cegueira. “Os dados publicados por Klynney et al no Archives of Ophthalmology de 1956 mostraram naquela época que de 22% de prematuros com menos de 1500g que sobreviveram e foram submetidos a oxigênio convencional, 72% desenvolveram ROP, 23% entre os estágios III e IV e 11% tiveram cegueira”, disse o professor. Por outro lado, entre os 25% que sobreviveram tendo feito uso de quantidade reduzida de oxigênio, 33%, 6% e 2% tiveram respectivamente ROP, estágios III e IV e cegueira.
do Peru, seu companheiro na segunda faixa IDH”, completou. Os dados relatados pelo palestrante são de Gilbert e colegas, do International No-ROP Group, publicados na Pediatrics de maio de 2005. Fatores causais: IGF-1 e VEGF De qualquer forma, a verdade é que nos Estados Unidos, especificamente na Califórnia, outro trabalho, de Tomkins, publicado em 2001 na Pediatrics, mostra percentuais praticamente crescentes de cegueira por ROP entre 1995 e 1999. Os nascidos em 1995, 1996, 1997, 1998 e 1999 apresentaram, respectivamente 12%, 8%, 14%, 15% e 22% da patologia. O que preocupa é que nos EUA, “12,3% dos nascidos são prematuros, sendo que 40.000 por ano com peso abaixo de 1220g,
Cada ano, nos Estados Unidos, de 400 a 600 bebês ficam cegos, devido a ROP.
Países em desenvolvimento: risco superior de ROP Nas Américas, Argentina, Cuba, Paraguai e Colômbia, situados entre 31 e 100 no índice de desenvolvimento humano (IDH), mostram os percentuais de 60%, 38,6%, 33,3% e 23,9% de cegueira por ROP comparados com os 13% dos Estados Unidos. O percentual norte-americano ainda assim está bastante acima dos 3% do Reino Unido e dos 4% da Suécia, países que compõem, junto com os Estados Unidos, a nobre faixa entre 1 e 30 do IDH. “A percentagem de cegueira no Brasil, por ROP, neste estudo é de 14,2% próximos aos 16%
2.000 desenvolvem, ao ano, ROP cicatricial, 400 a 600 ficam cegos, e 2000 mostram seqüelas como miopia, ambliopia, estrabismo e descolamento tardio de retina”, alertou o Prof. Dr. Rangasamy. O pesquisador relembrou na palestra os principais fatores fisiopatológicos do ROP. “Na fase 1 da doença há cessação do crescimento vascular e perda vascular, com conseqüente hipóxia da retina avascular; na segunda fase há neovascularização”, disse. Em termos fisiológicos normais, há ativação da proteína kinase B (fator crítico para o crescimento da célula endotelial) sob a ação de VEGF (fator de crescimento regulado por oxigênio)
Prof. Dr. Rangasamy Ramanathan (Estados Unidos): “Um protocolo de oxigênio baixo fisiológico reduz significativamente o início da retinopatia da prematuridade em prétermos com peso de nascimento excessivamente baixo.”
sob o comando de IGF-1 (fator de crescimento não regulado por oxigênio assim como o são o COX2 – que é induzido por citocinas e mediadores inflamatórios – e o hormônio de crescimento). “VEGF é induzido por hipóxia, portanto, se houver hiperóxia, VEGF é suprimido, o que causa a fase 1 de ROP”, disse Prof. Dr. Rangasamy. Na fase 2 a superprodução de VEGF é importante para a neovascularização da retina e, obviamente, é estimulada pela hipóxia que se estabelece na mesma. Por outro lado, prematuros apresentam IGF-1 baixa, o que é agravado por desnutrição e infecção, portanto, “crianças pré-termo e com desnutrição e infecção têm IGF-1 baixa, segundo dados publicados por Smith em maio de 2001 nos Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), disse o palestrante, remetendo a platéia, inclusive, para a reflexão da etiologia principal, para ele, do ROP em paises mais pobres, que apresentam graves problemas de desnutrição e infecção neonatal. Síntese dos fatores de risco Finalmente, afirmou o professor, uma série de trabalhos mostra que os fatores de risco para o desenvolvimento da retinopatia da prematuridade são “baixo peso (menor que
1000 g), hiperóxia, hipóxia, sepsis (infecções fúngicas), PDA, NEC (enterocolite necrotizante), IVH (hemorragia intra-ventricular), insu ficiênciarenal, cateteres arteriais (endotelina), selênio baixo, luz ambiente, transfusões, esteróides, baixa quantidade de antioxidantes e, principalmente, oxigênio”. Diante disto e após anos de pesquisas, o palestrante e seus colegas do Good Samaritan Hospital, do Cedar-Sinai Medical Center e do Singapore National University Hospital propõem em artigo publicado na Biology Neonato em 2006 que “um protocolo de oxigênio fisiológico reduz significativamente o início da retinopatia da prematuridade em pré-termos com peso ao nascer excessivamente baixo”. Em seu serviço no hospital, Prof. Dr. Rangasamy criou um quadro que é pendurado próximo ao bebê com os seguintes dizeres: “Meu peso é menor ou igual a 1000g e nasci após 28 semanas ou menos de gestação. Por favor, deixe saturação de oxigênio entre 85% e 89% até que eu complete 33 semanas pós-menstruais. Deixeme fora dos 90%! Se você acha que eu estou com PPHN (hipertensão pulmonar persistente do recém nascido), pergunte ao Prof. Dr. Rangasamy sobre meus limites de saturação”. Fica aqui a sugestão para os neonatologistas.
Outros usos da terapia com surfactante exógeno A terapia com surfactante tem resultados positivos em casos de pneumonia bacteriana ou viral do recém-nascido. A hérnia diafragmática congênita poderia ser outra indicação.
Profa. Dra. Edna Maria de Albuquerque Diniz, USP.
A terapia de reposição de surfactante na Síndrome de Angústia Respiratória (RDS/ SAR) faz parte da rotina clínica no tratamento de recém-nascidos com pulmões imaturos. Existem muitos estudos randomizados e controlados sobre o uso de surfactante e a meta-análise demonstrou claramente que a administração de surfactante
reduz significativamente o pneumotórax e a mortalidade perinatal. A diminuição da doença pulmonar crônica e da hemorragia intracranial é menos significativa, exigindo estudos de comparação entre os diferentes surfactantes, explica Profa. Dra. Edna Maria de Albuquerque Diniz, USP, Faculdade de Medicina, Departamento de Pediatria, Divisão de Neonatalogia. A deficiência de surfactante pode ou não coexistir com outras doenças pulmonares. O surfactante pode ser inativado ou deficiente em outras doenças de que a SAR, por exemplo em síndrome de aspiração do mecônio, pneumonia difusa bacteriana ou viral, sepse, asfixia perinatal, hipoplasia pulmonar (hérnia diafragmática congênita), deficiência congênita de SP-B, hemorragia pulmonar, trauma. Proteínas plasmáticas (em particular fibrinogênio, hemoglobina e
albumina) e mecônio, são as principais substâncias biológicas que podem inibir o surfactante. O mecônio é responsável de atelectasias, distensão das vias aéreas e pneumonite química, mas estudos mostram que ele pode ter uma ação específica de inativação do surfactante. Para o sucesso do tratamento é importante que o surfactante administrado resista à inativação por diferentes substâncias. Em modelo animal (coelho) estudos de Herting et al. mostraram que animais infectados que receberam surfactante apresentaram significativamente menos crescimento bacteriano de que os animais que receberam placebo. Também, ratos adultos com pneumonia a E. Coli melhoraram a PaO2 após administração de Curosurf®. Ao contrário, animais com deficiência de SP-A e SP-D apresentaram um aumento dos signos de inflamação e células
inflamatórias no pulmão após infecção. Estudo de Diniz et al. (International Workshop on Surfactante Replacement, 2004), em 26 crianças com pneumonia severa, bacteriana ou viral, mostrou uma melhora significativa após administração endotraqueal de surfactante (Curosurf®). A maioria dos recém-nascidos recebeu somente uma dose e a melhora foi mantida durante as 6 a 12 horas seguintes. A terapia por surfactante foi também usada em casos de hérnia diafragmática congênita, onde se encontra geralmente deficiência de surfactante, apesar de que o número de estudos em crianças está ainda limitado. Segundo a Profa. Dra. Edna Diniz, “qualquer doença pulmonar neonatal que ocorra com disfunção de surfactante constitui um alvo em potencial para a terapia com surfactante.”
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Óxido nítrico é controverso O óxido nítrico inalado não deve ser utilizado em bebês pré-termo com menos de 34 semanas ou com complicações. Um tratamento caro não necessariamente é uma boa opção, o que inclui o uso de óxido nítrico em bebês pré-termo. Pelo menos essa é a opinião do Prof. Dr. Rangasamy Ramanathan, professor de pediatria da University of Southern Califórnia, Los Angeles. “Há vários estudos com animais que mostram que óxido nítrico pode ser útil na promoção do desenvolvimento pulmonar e na diminuição da pressão e da inflamação pulmonares e esta é a razão de clínicos e cientistas em todos os centros terapêuticos tentarem utilizar óxido nítrico em bebês pré-termos. Mas nós não encontramos os mesmos bons resultados que são detectados em modelos animais, quando aplicamos a substância em bebês humanos”, afirmou o Prof. Dr. Rangasamy Ramanathan durante sua palestra. Para o pesquisador, o óxido nítrico inalado (iNO) não deve ser utilizado nos seguintes casos: bebês prétermo com menos de 34 semanas; pacientes com doença pulmonar veno-oclusiva; dependentes de shunt sangüíneo da direita para a esquerda; com insuficiência ventricular esquerda severa; com significativa diátese hemorrágica; com trombocitopenia severa; ou com hemorragia intraventricular severa conhecida.
comparadas ao grupo placebo, a terapia com iNO reduziu a incidência de displasia broncopulmonar (29,8% vs. 59,6%), no total não foram identificadas diferenças significativas na incidência de morte ou de displasia broncopulmonar entre os pacientes recebendo iNO ou placebo (71,6% vs. 75,3%, P = 0,24). “Se o bebê tem menos de um quilo, parece que não faz diferença”, afirmou o Prof. Dr. Rangasamy Ramanathan, que conclui, ainda, que o risco global de lesão cerebral não foi reduzido. Sobre o segundo estudo, realizado por Roberta Ballard e colegas, do Children’s Hospital of Philadelphia, o Prof. Dr. Rangasamy Ramanathan destacou a diferença nos resultados quando comparado o dia em que se iniciou a terapia e a etnia do bebê. Quando a terapia com iNO foi iniciada entre os dias 7 e 14 de vida, em bebês sem displasia broncopulmonar (BPD), a sobrevivência foi de 49,1%, frente a 27,8% no grupo placebo – números que variaram para 40,7% e 42,8%, respectivamente, quando a terapia era iniciada entre os dias 15 e 21. No que diz respeito ao grupo étnico, o pesquisador salientou a diferença encontrada também na sobrevida nas crianças sem BPD. “Enquanto entre os afroamericanos e hispânicos as taxas foram, respectivamente, de 56,6% e
“
Os bons resultados em modelos animais não foram encontrados em humanos.
O Prof. Dr. Rangasamy Ramanathan disse, entretanto, que o iNO parece ser eficaz em crianças menos doentes, não-caucasianas e naquelas mais maduras (com mais de 1000g) e que a substância pode ser um neuroprotetor em um subgrupo de bebês pré-termo. Resultados positivos em afroamericanos e hispânicos As afirmações do pesquisador encontram amparo em inúmeros estudos, dois deles publicados em julho deste ano no New England Journal of Medicine. Segundo Prof. Dr. Rangasamy Ramanathan, a pesquisa desenvolvida por John Kinsella e colegas, da University of Colorado School of Medicine, analisou 793 recém-nascidos com 34 semanas de idade gestacional ou menos e que apresentavam falência respiratória, exigindo ventilação mecânica. O ensaio multicêntrico distribuiu aleatoriamente os participantes em grupos que receberiam iNO (5ppm) ou gás placebo por 21 dias ou até a extubação, com estratificação em acordo com o peso ao nascer (500g a 749g, 750g a 999g ou 1000g a 1250g). De acordo com os resultados, se para crianças com um peso ao nascer entre 1000g e 1250g, quando
de 65,6% no grupo recebendo iNO frente aos 35,6% e 39,5% no grupo placebo, os números nas crianças brancas quase não diferiram em ambos os grupos: 34,7% (iNO) e 34,5% (placebo)”, disse. Insuficiência respiratória hipoxêmica O Prof. Dr. Rangasamy Ramanathan destacou também que sete estudos randomizados realizados anteriormente não encontraram diferenças na BPD ou na mortalidade e na melhora de curto prazo na oxigenação em crianças pré-termo que receberam iNO para insuficiência respiratória (Cochrane Reviews, 2006). Finalmente, outro estudo randomizado e duplo-cego envolveu 80 neonatos prematuros com idade gestacional de 34 semanas ou menos, atendidos em 12 centros perinatais de atendimento terciário. Foi também conduzido por John Kinsella e publicado em 1999 na Lancet (354:1061-5). “Tendo analisado a utilização de iNO precoce para insuficiência respiratória hipoxêmica severa em bebês pré-termo não identificou melhora na sobrevivência – as taxas encontradas foram de 52% entre os que receberam iNO e de 47% no grupo placebo”, conclui o professor.
Microbolhas estáveis
Um teste simples para avaliar a maturidade pulmonar Prof. Dr. Renato Fiori, professor titular da Faculdade de Medicina da PUCRS, departamento de pediatria, especialista de medicina intensiva neonatal, desenvolveu um teste simples, rápido e pouco oneroso para avaliar a maturidade pulmonar do bebê prematuro e decidir para a administração do surfactante.
Prof. Dr. Renato Fiori (Brasil) (esq.) e Prof. Dr. Christian Speer (Alemanha).
O surfactante, quando necessário, deve ser administrado o mais rápido possível após o nascimento para prevenir a Síndrome do Desconforto Respiratório do recém-nascido (SDR). Por isso, vários testes foram desenvolvidos nas últimas décadas, e especialmente desde a introdução da terapia por surfactante. Os primeiros testes foram os testes bioquímicos, como a relação lecitina/esfingomielina, a dosagem do fosfatidilglicerol, da fosfatidilcolina saturada, da proteína surfactante A, ou ainda dos fosfolipídios totais. Todos esses testes são demorados, caros e não são adequados para serem realizados na beira do leito. Os testes biofísicos, pela praticidade, velocidade de execução e baixo custo são mais promissores: os mais usados são o teste do clique, o teste das microbolhas estáveis e a contagem de corpos lamelares. O surfactante é administrado na modalidade de resgate, ou terapêutica, após diagnóstico de SDR, e na modalidade profilática, geralmente em prematuros abaixo de 28-32 semanas, nos quais o surfactante é utilizado imediatamente após o nascimento. O uso de surfactante ajuda a prevenir pneumotórax, enfisema intersticial e mortalidade. Portanto, nesta última modalidade, existe o risco de uso desnecessário do remédio em prematuros que não desenvolveram a doença, ainda mais que há a necessidade de intubação e ventilação, com os riscos associados.
ter, principalmente quando o bebê é transferido, e o líquido gástrico pode ter problemas ligados à viscosidade e falta de homogeneidade. O teste do clique baseia-se em um fenômeno que ocorre com as bolhas formadas na presença de surfactante pulmonar. As bolhas achatam o seu formato progressivamente até que, subitamente, retornam à forma esférica repetidamente (fenômeno do clique). Este processo pode ser observado no microscópio e indica a presença de substância tensoativa (surfactante). Segundo estudos, como de Osborn et al., o teste do clique reduz o tempo para administração de surfactante e o número de prematuros tratados. Após teste do clique, a administração do surfactante ocorreu em 50 minutos, contra 159 minutos em caso de diagnóstico baseado em critérios clínicos e radiológicos. O teste das microbolhas estáveis correlaciona o número de bolhas de menos de 15 micrômetros com a presença de surfactante no fluido
(aspirado gástrico ou aspirado traqueal, que é melhor mas necessita intubação). O teste é bem simples e de rápida execução: basta colocar uma gota de fluido no vidro, agitar com uma pipeta de Pasteur e contar as microbolhas no microscópio. A presença de muitas bolhas significa a presença de muito surfactante na secreção. Em Porto Alegre esse teste é executado rotineiramente pelos plantonistas na unidade neonatal do hospital São Lucas. No hospital, o teste é aplicado sobre aspirado gástrico em pacientes de 23 a 32 semanas, na unidade de terapia intensiva neonatal. Se o número de bolhas está inferior a 25/ mm2, é aplicado o tratamento profilático com surfactante. Caso contrário, é aplicada a terapia de resgate, dependendo dos sinais clínicos e radiológicos (Figura 1). No estudo publicado recentemente por Fiori et al. (J. Perinatal Medicine, Jan 2006) foi utilizado um ponto de corte de 25 microbolhas/mm2, correspondendo à sensibilidade maior que 90%. Com um ponto de corte de 10 a 15 microbolhas/mm2, a acurácia está em torno de 80-85%, similar à de testes bioquímicos como a relação lecitina/esfingomielina. Neste estudo sobre 98 prematuros, 55% destes tiveram uma contagem inferior a 25 microbolhas/mm2 e receberam surfactante imediatamente. Somente 3 bebês com contagem alta desenvolveram a doença da membrana hialina. A mediana do tempo para administração de surfactante foi de 20 minutos. Em comparação, nos Estados Unidos, 80% dos bebês de menos de 30 semanas recebem o surfactante, e a mediana de tempo para utilização é de 50 minutos. Em conclusão, dispomos de um teste rápido, barato, permitindo selecionar o subgrupo de prematuros com maior risco de SDR e administrar o surfactante, quando precisar, em menos de 30 minutos após o nascimento.
Teste do clique O ideal, explica o Prof. Dr. Renato Fiori, “é fazer profilaxia seletiva, somente nos bebês prematuros de alto risco com evidências de imaturidade pulmonar”. Por isso, os testes mais praticados hoje são, por exemplo, a contagem dos corpos lamelares, presentes em vários fluidos como o líquido amniótico, ou no aspirado gástrico. A contagem é simples e pode ser feita por aparelho de hemograma. O líquido amniótico é difícil de se ob-
Figura 1 – As microbolhas vistas no microscópio. Fonte: Renato Fiori.
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Novas tendências
Ainda há uma função para esteróides pós-natal na displasia broncopulmonar?
Segundo Prof. Dr. Henry Halliday, os corticosteróides têm hoje uma função muito limitada e devem ser utilizados com o máximo de precauções.
Os corticosteróides possuem uma função limitada no período neonatal, devem ser evitados nos 4 primeiros dias e reservados para bebês com alto risco de desenvolver uma doença pulmonar crônica. O uso de corticosteróides em recém-nascidos era aceito com muito entusiasmo e pouco crítica dez anos atrás, até que as Diretrizes da Ame-
rican Association of Pediatrics começam a questionar os seus efeitos. Para o Prof. Dr. Henry Halliday, diretor da Unidade Neonatal do Royal Maternity
Hospital de Belfast, Irlanda do Norte, e editor da revista Biology of the Neonate, os corticosteróides têm hoje uma função muito limitada e devem ser utilizados com o máximo de precauções. Ainda mais, não devem ser usados nos primeiros dias de vida – os quatro primeiros dias – e somente em crianças com elevado risco de desenvolvimento de displasia broncopulmonar. A opinião do Prof. Dr. Henry Halliday apóia-se em meta-análises de vários estudos recentes, utilizadas para o desenvolvimento de diretrizes baseadas em evidências para a terapia pós-natal com corticosteróides em crianças prematuras com risco de desenvolver doença pulmonar crônica. Os resultados mostram que corticosteróides administrados em qualquer momento no período neo-natal reduzem o risco de displasia broncopulmonar, especialmente antes das 36 semanas, mas, em contrapartida, os riscos de efeitos adversos sobre o sistema nervoso central são elevados. A paralisia cerebral é mas freqüente em crianças tratadas antes de 4 dias. Resultados da meta-análise de estudos em mais de 4000 crianças mostram que o uso de corticosteróides
em crianças que apresentam um risco pouco elevado de doença pulmonar aumenta significativamente o risco de paralisia cerebral. De fato, diz o Prof. Dr. Henry Halliday, “isso explica o motivo do risco de a paralisia cerebral estar aumentado somente em crianças prematuras que foram tratados precocemente, e, por esta razão, apresentam risco reduzido de desenvolverem a displasia broncopulmonar.” Em conclusão, os corticosteróides devem ser evitados em crianças de menos de 4 dias, e reservados para os que apresentam risco elevado de displasia ou que já a tinham. Devem ser utilizados na menor dose pelo menor período de duração possível. Os corticosteróides têm um efeito tóxico direto sobre os neurônios, fatores de crescimento, migração neuronal, mielinização e diminuem a eficácia dos mecanismos de proteção contra hipoxia, hipoglicemia, hiperoxia e hipocarbia. O corticosteróide mais usado é a dexametasona na dose de 0,5mg/ kg/dia durante 3 dias, depois uma diminuição da dose, com duração total de 12 dias. A dexametasona foi comparada a metilprednisolona, que
aparentemente é tão eficaz quanto a dexametasona, mais não existem ainda estudos controlados. Pequenas doses de hidrocortisona (1mg/kg/dia) diminuíram o risco de displasia, mas dois estudos mostraram risco elevado de perfurações gastrintestinais que justificaram a interrupção do estudo. Estudos foram realizados por Halliday e colegas para comparar a eficácia da dexametasona sistêmica (iniciada a 0,5mg/kg/dia) e da budesonide inalada (800µg/kg/dia) (Halliday et al., OSECT trial. Pediatrics 2001). Resultados concluíram em eficácia semelhante, apesar de efeitos adversos um pouco maior no caso da budesonide. Em 100 récem-nascidos recebendo corticosteróides nas primeiras 96 horas de vida, 9 estarão prevenidos contra a displasia broncopulmonar, porém 6 poderão sofrer uma hemorragia gastrintestinal e 6 uma paralisia cerebral. No futuro próximo, precisamos de estudos de acompanhamento, e de estudos permitindo observar melhor os efeitos de doses menores, em período curto, comparar diferentes produtos e estudar melhor os efeitos dos corticosteróides inalados.
poractante vs. beractante
Surfactantes naturais versus surfactantes sintéticos Estudos com grande número de crianças são necessários para comprovar o interesse da nova classe de surfactances sintéticos. Neonatologistas buscam desenvolver um protocolo que servirá na orientação de terapias no tratamento da Síndrome do Desconforto respiratório com o uso de surfactantes. O relatório, segundo Prof. Dr. Henry Halliday (Queen´s University, Belfast), terá como base dados obtidos de revisões sistemáticas dos estudos randomizados controlados, realizados desde 1980 quando foi relatado a primeira experiência bem-sucedida de terapia com o uso de surfactante. Os estudos visam avaliar a eficácia, velocidade/ritmo, número de doses, métodos de administração, tipos de surfactante e outros aspectos da terapia com surfactante. Surfactantes testados em estudos controlados Os surfactantes naturais e os sintéticos usados como substitutos em tratamentos da Síndrome do Desconforto Respirátorio se dividem em 4 grupos: os sintéticos antigos sem proteínas, o novos sintéticos com proteína análoga, o natural feito do extratos do pulmão moído (minced lung lavage) e o natural do extrato do pulmão lavado (lung lavage extracts). Um terceiro surfactante da categoria dos naturais, o extrato do fluido amniótico, foi abolido por causa do risco de contaminação com vírus da AIDS. As revisões sistemáticas de estudos randomizados controlados, obtidos da Biblioteca Cochrane e PubMed, comparando os surfactantes sintéticos e naturais tanto para a modalidade profilática
como terapêutica, revelam que os surfactantes naturais são mais eficazes que os sintéticos na redução do extravasamento do ar, da mortalidade e morte combinada com displasia broncopulmonar. Estudos com base nos critérios de riscos relativos (RR), números necessários para tratar NNT e intervalos de confiança (IC) de 95% mostram que doses múltiplas (até 3) são melhores que uma dose única para crianças que apresentam recidiva. Os surfactantes naturais não são semelhantes, apresentam composições diferentes e muitos estudos comparativos foram realizados. Estudos comparando os surfactantes Curosurf®, Infasurf®, Alveofact® e Survanta® foram realizados entre 1995 e 2004 com mais de 3000 crianças. Em um estudo realizado pelo Prof. Dr. Rangasamy Ramanathan comparando 200mg/kg de Curosurf® (Poractante), 100mg/kg de Curosurf® e 100mg/kg de Survanta® (Beractante) em recém-nascidos com desconforto respiratório estabelecido, verificou-se uma redução na mortalidade neonatal e, também, uma melhora na oxigenação em crianças tratadas com Poractante, especialmente na dosagem de 200mg/kg (3% contra 8% de beractante). Isto poderá significar um benefício em termos de sobrevivência na administração da dosagem inicial de 200mg/kg em estudos de resgate. Estudos de profilaxia comparativos com estes surfactantes não foram realizados até o momento. Para a profilaxia, o tratamento an-
terior ao desenvolvimento de RDS/ SAR, 100mg/kg pode ser suficiente já que a inativação do surfactante é improvável nesta situação. A revista Pediatrics, no ano passado, publicou dois estudos prospectivos randomizados controlados comparando calafactante (Infasurf®, 105mg/kg) e beractante (Survanta®, 100mg/kg) na modalidade de profilaxia com crianças de 23 a 29 semanas de gestação e de tratamento utilizando como critério recém-nascidos pesando de 401 a 2000g, com o uso de ventilação mecânica e uma concentração de oxigênio maior que 40%. Podiam ser administrados no máximo três tratamentos a intervalos de pelo menos 6 horas caso a criança necessite de uma concentração de oxigênio maior que 30% e ainda intubada. O resultado primário para ambos os estudos foi uma sobrevivência até 36 semanas sem oxigênio. Com o calafactante houve um rápido declínio do oxigênio inspirado comparado com beractante. Não houve continuidade do estudo por falta de um número suficiente de bebês que pudessem mostrar as diferenças entre esses surfactantes e, segundo os autores desses estudos, questões relativas a segurança e eficácia ficarão em suspenso até que pesquisadores clínicos se envolvam mais seriamente em tarefas complicadas relativas aos estudos clínicos randomizados em larga-escala. O problema de estudos com surfactantes que são igualmente eficazes é que é preciso de um grande número de crianças envolvidas para se obter resultados substanciais.
O estudo combinando surfactante e CPAP tem revelado uma eficácia na redução da duração e necessidade de ventilação mecânica e deve portanto reduzir CLD, mas um estudo prospectivo é fundamental para a obtenção de dados mais conclusivos. Uma nova geração de surfactantes sintéticos contendo análogos das proteínas SP-B ou SP-C vem sendo estudada mas não existe nenhuma evidência de que hajam superado em eficácia os surfactantes existentes. Um protocolo, com base em evidências para terapia com surfactante, segundo Halliday, deveria ter como proposta a profilaxia para crianças com menos de 27 ou 28 semanas, o resgate prematuro para idade gesta-
cional entre 28 e 31 semanas e acima de 31 semanas o CPAP no caso de desconforto respiratório. As evidências favorecem o uso de surfactantes naturais e quanto aos sintéticos ainda não existem dados suficientes conclusivos. A dosagem dependerá da escolha do momento e do uso pré-natal de corticosteróide. Os futuros estudos devem ter em vista o uso prematuro do CPAP e profilaxia com surfactante, estudos comparativos de novos surfactantes sintéticos, disponibilidade de surfactantes em países em desenvolvimento, evitar intubação (inalação ou nebulização, máscara laringal e deposição faringal), ampla indicação de surfactantes sob medida e prevenção de CLD (budesonide e Survanta®).
CUROSURF® vs. SURVANTA® Effect on neonatal mortality 10% 9% 8% 7% 6% 5% 4% 3% 2% 1% 0%
CUROSURF® 200mg/kg
CUROSURF® 100mg/kg
SURVANTA®
Figura 2 – Estudo comparativo com 2 dosagem de Curosurf® contra 1 dosagem de Survanta® em recém-nascidos com Síndrome de Desconforto Respiratório, seriamente doentes com uma necessidade de uma concentração de 40% de oxigênio. Há um benefício maior com o uso de Curosurf®, principalmente com o uso de uma dose maior. Fonte: Ross Laboratories, Columbus, OH.
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Oxigênio
Especialistas defendem ar ambiente na ressuscitação De esquerda a direita: Prof. Dr. José Roberto de Morais Ramos (Fiocruz), Prof. Dr. José Maria de A. Lopes (maternidade de Laranjeiras, Rio de Janeiro), Prof. Dr. José Luiz Muniz D. Bandeira (UERJ).
Neonatalogistas brasileiros e estrangeiros concordam em promover o ar ambiente na medicina intensiva neonatal para diminuir a incidência da displasia pulmonar crônica e da retinopatia do prematuro. Próximo ao encerramento do evento, o título da palestra “Oxigênio: 50 anos de incerteza”, do Prof. Dr. José Maria de Andrade Lopes, diretor da Clínica Perinatal Laranjeiras, do Rio de Janeiro, deu uma dimensão histórica correta da realidade que tem acompanhado os neonatologistas, em todo o mundo, com relação ao emprego do oxigênio para o prematuro. José Maria de Andrade Lopes, que é pós-doutor pela McGill University, Canadá, e também médico pesquisador do Instituto Fernandes Figueira da Fiocruz, refletiu sobre a relação entre a saturação de oxigênio e a PaO2, ou seja, a relação entre o que se mede na hemoglobina periférica e a concentração real de oxigênio que existe, naquele momento, no sangue arterial e as escolhas que se faz na
UTI neonatal com relação ao oxigênio que se oferece ao prematuro. Junto a isso, o pesquisador mostrou a experiência que existe com ressuscitação feita sob o ar ambiente, com a oferta de oxigênio e as incidências da displasia pulmonar crônica e da retinopatia do prematuro. Ar ambiente Lembrando que a terapia intensiva neonatal vem se beneficiando de possibilidades de dosagem do oxigênio no bebê, na mistura e no ambiente, Lopes citou a dosagem arterial contínua de oxigênio, o monitor transcutâneo e os saturímetros, como artefatos importantes de boa qualidade de prestação de serviços de saúde e a possibilidade de se ter o acompanha-
mento da PaO2 com relação a SaO2. Por outro lado, trouxe novamente à baila a discussão da ressuscitação em ar ambiente. Segundo ele, estudos europeus randomizados de ressuscitação de 134 recém nascidos com Apgar médio de 3,4, com ar ambiente ou oferta de oxigênio, “mostraram que a ressuscitação com ar levou à recuperação mais rápida da freqüência cardíaca e necessitou menos ventilação com ambú e máscara do que a ressuscitação com O2 a 100%”. Outro estudo citado por Lopes foi exatamente um coordenado (e anteriormente apresentado) pelo palestrante norueguês Prof. Dr. Ola Saugstad, que comparou em 110 recém natos a ressuscitação com O2 a 20% e a 100%, com um follow-up entre 18 e 24 meses. Na investigação, por exemplo, do crescimento somático e desenvolvimento dos bebês no follow-up, os dados foram absolutamente equiparados, sugerindo que o oxigênio a 100% é desnecessário. Segurança na asfixia Outra pesquisa apresentada pelo Prof. Dr. José Lopes, feita pela Universidade de Valência, de autoria de Maximo Vento e colegas, investigou 1.315 recém nascidos que foram ressuscitados entre 1993 e 2004. A conclusão do resumo dos médicos espanhóis disponibilizada pelo palestrante informa que “o ar da sala é seguro para a ressuscitação de recém nascidos com asfixia. Assim, isso diminui o tempo de recuperação e baixa a mortalidade”, adicionando que “o estresse oxidativo derivado do ar ambiente é pequeno e de curta duração. Isto também causa um dano menor
aos tecidos”. Os resultados mostraram Apgar melhor, choro e recuperação mais rápidos, exames laboratoriais melhores e mortalidade menor no ar ambiente, se comparado à oferta de 100% de oxigênio. “O trabalho indica 11,1% versus 29,0% de mortalidade no ar ambiente e oxigênio a 100%, respectivamente”, disse Lopes, que lamentou que embora haja quatro meta-análises que mostram os benefícios da ressuscitação sob ar ambiente, “até agora a Associação Americana de Pediatria ainda não mudou as recomendações sobre o procedimento”. Rotina e conduta Lembrando, por outro lado, que é preciso se ter uma rotina definida e cuidado ao se avaliar a saturação de oxigênio, visto que ela não revela fielmente a concentração de O2 no sangue arterial, José Maria corroborou com os colegas brasileiros e estrangeiros presentes ao simpósio sobre a possibilidade de se manter níveis de saturação variando entre 85 e 95% para profilaxia da displasia pulmonar e da retinopatia da prematuridade. O médico apresentou rotinas baseadas na experiência de seu serviço e uma tabela comparativa dos resultados da Perinatal com a Vermont Oxford Network 20022003 que são bastante satisfatórios. Entretanto, o pesquisador ainda não está satisfeito com a sua incidência. “Em meninos com menos de 1,5kg existem serviços internacionais que mostram resultados de 1%, 2% de retinopatia da prematuridade, menos que os 6% da minha unidade; tenho que saber o que fazer para reduzir os meus números”, disse.
genética
Mutações e falta de surfactante Um estudo, citado por Curstedt, do departamento de pediatria da Washington University identificou 33 crianças deficientes em SP-B entre 1993 e 2005 e concluiu que os resultados de longo prazo após o transplante de pulmão infantil para crianças deficientes em SP-B são similares àqueles de crianças transplantadas por outras indicações. Segundo o artigo, publicado no Journal of Pediatrics em outubro deste ano (149[4]: 548-53), os resultados são importantes na decisão de adotar o transplante de pulmão para crianças com desordens na homeostase alveo lar. Curstedt ressaltou que, em geral, a deficiência de SP-B acomete recém-nascidos a termo e que a idade média destes, quando do óbito, é de 3 meses. Sobre a deficiência de SP-C o pesquisador afirmou que ela ainda é compreendida de maneira incompleta, tendo sido já identificadas mais de 25 mutações. Ele lembrou que a doença, em geral, manifestase apenas entre a infância e a vida adulta. Para o pesquisador, uma das vantagens possíveis com o desenvolvimento dos estudos seria a identificação de marcadores genéticos para o desconforto respiratório, “que poderiam ser utilizados na clínica médica e que permitiriam o desenvolvimento de estratégias para o tratamento das desordens pulmonares genéticas”.
Surfactante sintético ainda não é eficaz pídeos mais complicados, não apenas dois ou três (como atualmente). Seria uma substância mais complexa do que os sintéticos atualmente disponíveis”, disse. O Prof. Dr. Tore Curstedt ressaltou que não há relatos de surfactantes com análogos reais de SP-B. Na opinião do especialista, para que resultados mais positivos sejam alcançados, é fundamental que a estabilidade alveolar seja levada em consideração. “O surfactante sintético deve prevenir o colapso alveolar durante a expiração, o que os atualmente existentes não fazem”, ressaltou. Curstedt afirmou que os dados disponíveis sugerem que inclusive, no caso do uso do fármaco sintético, PEEP é necessário para manter uma estabilidade alveolar adequada. Ele explicou que como os alvéolos têm uma área muito grande, quando o surfactante é aplicado ele deve se espalhar rapidamente. “Durante a inspiração, a área dos alvéolos aumenta e há uma área maior a ser coberta. É impor-
Composição dos fosfolipídeos Para o especialista, “tentar produzir um surfactante sintético é tentar simplificar sua composição”. “A composição ideal de um surfactante sintético seria a mesma do natural, mas a composição dos fosfolipídeos deste último é muito complexa”, reforçou.
e outros com diferentes fragmentos de SP-B. Segundo ele, os resultados mais promissores foram obtidos com o peptídeo mini-B, formado por 34 resíduos, correspondendo ao SP-B8-25 mais SP-B63-78. Por outro lado, além da estabilidade alveolar, ele chamou a atenção, também, para algumas das características oferecidas pelo surfactante, como a atividade da superfície – entre elas a baixa tensão superficial e o
Eu acredito, que entre três e cinco anos, nós já teremos um bom surfactante sintético. Segundo ele, os surfactantes sintéticos com peptídeos, atualmente disponíveis, procuram imitar o SP-B, mas sua composição é por demais simples. Ele citou como exemplo o KL4 (do lucinactant), cuja composição conta apenas com 21 resíduos de aminoácidos enquanto o SP-B possui 158. Ele destacou, ainda, que o lucinactant deve ser aquecido até 44º antes de ser aplicado no bebê e possui alta viscosidade, pois é um gel. Curstedt destacou quatro diferentes surfactantes com fragmentos de SP-B: o SP-B1-25 monomérico; o SP-B1-25 dimérico; o Mini-B;
rápido respreading após a compressão – e sua resistência à inativação. Na opinião de Curstedt, ainda vai levar alguns anos até que surfactantes sintéticos satisfatórios estejam disponíveis no mercado. “Há muitos anos eu achava que no final da década de 90 surgiria um surfactante sintético no mercado, o que não ocorreu devido à série de dificuldades encontradas”, afirmou. Entretanto, o pesquisador se mostra otimista: “Eu acredito, que entre três e cinco anos, nós já teremos um bom surfactante sintético”, disse.
09010758-H-MED HOJE SIMP NEO 2007
Prof. Dr. Tore Curstedt (Suécia), foi um dos pesquisadores que desenvolveram nos anos 80 o surfactante de origem animal, poractant alfa, que já foi utilizado no tratamento de 600.000 récemnascidos no mundo.
O surfactante de origem animal tem que ser submetido a um longo processo de purificação antes do uso em humanos. A criação de um similar sintético, que poderia reduzir os custos e aumentar a oferta, entretanto, esbarra em dificuldades objetivas: como reproduzir a complexidade, mesmo que parcialmente, da substância natural alcançando os mesmos resultados? “A obtenção de um surfactante sintético é muito difícil porque a composição dos fosfolipídeos (igual ao natural) é muito complexa e suas proteínas não são estáveis”, sintetizou o Prof. Dr. Tore Curstedt, do departamento de química clínica do Karolinska University Hospital, Estocolmo, Suécia. Segundo Curstedt, para que o fármaco sintético seja tão eficaz quanto o de origem animal, hoje utilizado, o mais importante é que ele tenha mais de um peptídeo. “Eu acho que eles devem ser análogos às proteínas hidrofóbicas SP-C e SP-B. E talvez fosfoli-
tante estabilizar os alvéolos durante a expiração”, pontuou.
“
Os surfactantes naturais, de origem animal, são eficientes no tratamento do prematuro, mas a produção é limitada e com custo elevado. O desenvolvimento de uma nova geração de produtos sintéticos, programada desde os anos 90, é mais complicado do que esperado, e necessita ainda de estudos controlados.