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outubro de 2008

Dor: da neuroimagem à prática clínica 19 de agosto de 2008, Glasgow, Escócia 12th World Congress on Pain

Prof. Dr. Anthony Dickenson

Medicamentos no tratamento da dor

Prof. Dr. Gordon Irving

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Mecanismos da dor e novas abordagens terapêuticas

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Prof. Dr. Sean Mackey

O que a neuroimagem revela sobre a dor

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Prof. Dr. Anthony Dickenson

O conceito da associação de medicamentos no tratamento da dor Os eventos do sistema nervoso central que podem aliviar a dor atuam em conjunto, o que justifica a associação de tratamentos. Professor de neurofarmacologia, University College London, Londres, Reino Unido.

Se um fármaco isoladamente não apresenta os resultados esperados, é fundamental que se utilize mais de um medicamento. Esta é a idéia-base da terapêutica multidrogas, cujo objetivo principal é atingir múltiplos mecanismos ao mesmo tempo de maneira a intervir nos diferentes caminhos da dor, em diferentes níveis. Nesse contexto, ao delinear um tratamento, o médico deve ter sempre em mente a provável existência de comorbidades associadas à dor e que o tratamento desta reduz significativamente os quadros associados. “Pacientes com dor crônica apresentam comorbidades dramáticas e, para eles, sempre perturbadoras”, alertou. Entre os principais sintomas da dor neuropática, podem ser destacados: formigamento e perda sensorial, dor penetrante, hiperalgesia e alodinia. Segundo ele, trata-se de sintomas com os quais, obviamente, os médicos têm que lidar quando o paciente apresenta o quadro e que, em geral, relacionamse também com estados alterados de 2

atenção e humor, que nem sempre aparecem de forma claramente explícita. “A noradrenalina (NA) e a serotonina (5-HT) contribuem no mecanismo das alterações no humor, medo, ansiedade, raiva, pânico entre outros. Por isso, nós acreditamos que a utilização de drogas que interferem na recaptação dessas substâncias ajuda a restabelecer o estado modulador normal”, pontuou. Tal fato assume particular importância quando se leva em consideração a literatura disponível. Dickenson citou estudo de Meyer-Rosberg K et al. [1] que analisou 126 pacientes com dor neuropática e identificou que o grupo apresentava problemas como insônia (60%), astenia (55%), sonolência (39%), dificuldade de concentração (36%), depressão (33%), ansiedade (27%) e anorexia (18%). Além disso, os autores do estudo destacam que a situação empregatícia de 52% dos pacientes foi prejudicada devido à dor e que a descontinuação de tratamentos anteriores foi altamente associada à falta de

eficácia e/ou graves efeitos colaterais dos medicamentos utilizados. Canais iônicos

Segundo Dickenson, o grande desafio no tratamento da dor é o fato de que os eventos do sistema nervoso central que podem melhorá-la atuam em conjunto. Ele chamou atenção para as mutações nos canais iônicos, responsáveis por patologias e, geralmente, caracterizadas como produtoras de hiper ou hipoexcitabilidade. Uma única mutação gênica, por exemplo, pode produzir fenótipos opostos (hiper ou hipoexcitabilidade) nos diferentes tipos de células nos quais o canal de sódio é expresso, de acordo com estudo de Rush et al. [2]. Os autores da pesquisa analisaram os efeitos funcionais de uma mutação do canal de sódio Nav1.7 associada a uma síndrome neuropática dolorosa, a eritermalgia, e identificaram que ela resulta em neurônios sensoriais hiperexcitados e em neurônios simpáticos hipoexcitados, embora o potencial de MH Report • outubro de 2008


Figura 1 – A ação dos antálgicos na transmissão sináptica.

repouso da membrana em ambos os tipos de neurônios seja despolarizado. Outro exemplo da importância dos canais iônicos é um estudo de Cox et al. [3], que sugeriu que o gene SCN9A, responsável pela codificação da subunidade alfa dos canais de sódio voltagem-dependentes Nav1.7, é uma exigência essencial e não redundante da nocicepção em humanos. Os pesquisadores chegaram a tal conclusão após análise da seqüência do gene em indivíduos totalmente incapazes de sentir dor, de resto saudáveis, com uma herança autossômica recessiva do cromossomo 2q24.3. Os resultados revelaram três mutações nonsense homozigóticas distintas (S459X, I767X e W897X), todas associadas à perda da função de Nav1.7 pela co-expressão de um tipo selvagem ou humano mutante desta subunidade com as 1 e 2 do canal de sódio em células HEK293. Estes achados devem estimular a busca por novos analgésicos que, seletivamente, tenham como alvo esta subunidade do canal de sódio. MH Report • outubro de 2008

Referências 1. Meyer-Rosberg K, Kvarnström A, Kinnman E, Gordh T, Nordfors LO, Kristofferson A. peripheral neuropathic pain – a multidimensional burden of patients. Eur J Pain 2001;5:379–89. 2. Rush AM, Did-Hajj SD, Liu S, Cummins TR, Black JA, Waxman SG.

A single sodium channel mutation produces hyper- or hypoexcitability in different types of neurons. PNAS 2006;103(21):8245-50. 3. Cox JJ, Reimann F, Nicholas AK, Thornton G, Roberts E et al. Na SCN9A channelopathy causes congenital inability to experience pain. Nature 2006;444;894-8.

Figura 2 – As associações possíveis de medicamentos, entre o nível periférico e o nível central.

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Prof. Dr. Gordon Irving

Mecanismos da dor e novas abordagens terapêuticas No sistema nervoso periférico e no corno dorsal da medula espinhal podem existir múltiplos mecanismos celulares, incluído nas células gliais, que são alterados e contribuem para a manifestação da dor Diretor médico do Swedish Pain and Headache Center, Professor associado da University of Washington School of Medicine.

De acordo com as estimativas do CDC (Centers for Disease Control and Prevention), 1 em cada 3 crianças nascidas nos Estados Unidos no ano 2000 vai desenvolver diabetes tipo 2. Atualmente, mais de 18 milhões de adultos têm a doença no país, dos quais pelo

a 6ª entre os homens como também está entre as 10 principais razões que levam um paciente a procurar um médico. Sobram números para comprovar a necessidade premente de que medidas sejam tomadas para prevenir, identificar e tratar os fato-

“O tratamento da dor neuropática é complicado, visto que os sintomas como a dor espontânea podem ser causados por alterações funcionais no sistema nervoso central ou periférico” menos 5,2 milhões não estão diagnosticados e, conseqüentemente, não têm ciência do elevado risco que apresentam de complicações. O diabetes não só é a 5ª principal causa de morte entre as mulheres e 4

res de risco, realizar triagens adequadas e oferecer um tratamento agressivo da doença. Sob tal perspectiva, a neuropatia periférica diabética (NPD) vem ganhando cada vez mais destaque. O

impacto da NPD nos mais variados aspectos da vida do paciente é considerável. Estudo de Tölle et al. [1] analisou 140 pacientes em seis países europeus e identificou interferência (efeitos negativos) na funcionalidade, apesar de 91% estarem recebendo medicação adequada. Além disso, quanto mais intensa a dor, maiores eram os escores de interferência, o prejuízo no emprego e o número de visitas ao médico e piores as avaliações do estado de saúde. Mudanças no estilo de vida são definitivamente uma das medidas mais eficazes para a redução do risco do paciente, algo entre 45% e 58%, de acordo com a literatura médica. Por outro lado, a terapêutica está entre as mais difíceis de serem implantadas. Esta certeza, contudo, não pode fazer com que o médico simplesmente abdique de tentar. Para o especialista, uma abordagem que pode dar certo é conversar com o paciente sobre os riscos de um determinado hábito – fuMH Report • outubro de 2008


mar, por exemplo – e fazer com que ele próprio progressivamente defina pequenas metas – reduzir o número de cigarros – de maneira a incluí-las na implementação do tratamento e contornar uma possível rejeição imediata relacionada a uma meta rígida – como parar completamente de fumar de uma só vez. Neuroplasticidade na periferia

Gordon Irving destacou que as mudanças nos nociceptores periféricos podem contribuir para a transmissão de sinal no sistema nervoso central. Há múltiplos mecanismos na periferia que delimitam a sensibilização e a hiperexcitabilidade do nociceptor e, possivelmente, contribuem para a dor neuropática, em particular, a periférica diabética. “O tratamento da dor neuropática é, freqüentemente, complicado, visto que os mesmos sintomas, como a dor espontânea, podem ser causados por alterações funcionais no sistema nervoso central ou periférico”, afirmou. Além disso, tanto no nociceptor periférico ou como no corno dorsal da medula espinhal podem existir múltiplos mecanismos celulares que são alterados e contribuem para a manifestação da dor, isto é, receptores mu opióides e as subunidades ����������������������� α���������������������� 2-�������������������� δ������������������� dos canais de cálcio no corno dorsal.

das terapias farmacológicas na medida em que se trata de uma área onde o estímulo nociceptivo pode ser modificado por um estímulo descendente a partir do cérebro, células gliais e interneurônios”, disse.

de outros. Irving afirmou que alguns estudos têm sugerido que as fibras Aβ inibem a descarga dos neurônios do corno dorsal em lâmina V pela ativação dos interneurônios inibitórios em lâmina II. De modo inverso, os neu-

“O corno dorsal da medula espinhal surge como um potencial alvo na medida em que se trata de uma área onde o estímulo nociceptivo pode ser odificado por um estímulo descendente a partir do cérebro, células gliais e interneurônios” Há diversos tipos de neurônios que fazem sinapses com neurônios da região, entre eles: nociceptores, aferentes descendentes do cérebro, interneurônios gabaérgicos, e também as células gliais. Cabe acrescentar que a atividade de uns pode afetar os efeitos

rônios nociceptivos (C, Aδ) parecem inibir os neurônios inibitórios. “Evidências recentes sugerem que as células microgliais da espinha participam ativamente em resposta à dor. A visão tradicional das células gliais postula que elas seriam principalmente célu-

Figura 1 – Objetivos potenciais na transmissão periférica da dor.

Medula espinhal

Os neurônios no corno dorsal da medula espinhal colhem informação transmitida a eles tanto pelos nociceptores periféricos (ascendentes) quanto por diversas regiões cerebrais (descendentes). Conseqüentemente, essa área é crucial para a modulação dos sinais da dor. O processamento neural da dor envolve o sistema nervoso periférico, a medula espinhal e o cérebro. Nesse contexto, “o corno dorsal da medula espinhal surge como um potencial alvo MH Report • outubro de 2008

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las de sustentação para os neurônios e quiescentes durante uma resposta neuronal. Entretanto, as células gliais têm receptores que são capazes de responder à atividade neuronal”, pontuou. Somado a isso, as células gliais têm diversos mediadores moleculares que são neuroativos (citocinas pró-inflamatórias e fatores de crescimento). Diversas horas após a lesão do nervo, marcadores como CD11b, TLR4 e CD14 podem ser liberados da microglia. Os receptores microgliais também são superexpressados após a lesão do nervo (e.g., receptor da quimiocina CX3CR1, receptor de ATP P2X4). O bloqueio ou a supressão destes receptores, por sua vez, parece diminuir a dor neuropática. De modo similar, a injeção intratecal de microglia ativada por ATP induz a alodinia mecânica (resposta nociceptiva a uma estimulação normalmente inócua). Estes dados sugerem, de acordo com o palestrante, que as microglias estão envolvidas na mediação da hipersensibilidade à dor.

Figura 2 – Objetivos potenciais na medula espinhal.

Ambas as substâncias são parte do sistema analgésico endógeno do corpo, que inibe a transmissão dos sinais

“Os receptores de NMDA desempenham um papel importante na plasticidade sináptica e estão implicados na facilitação do sistema nervoso central no processamento da dor” Modulação da transmissão

É preciso levar em conta na compreensão e no tratamento da dor a questão da modulação da transmissão da dor, mais especificamente, o envolvimento da serotonina (5-HT) e da noradrenalina (NA) no processamento da dor, em particular no caminho descendente inibidor da dor. 6

de dor ascendentes da periferia, e estão envolvidas na dor modulada diretamente em nível do corno dorsal na medula espinhal. Especificamente a 5-HT tanto inibe quanto facilita a percepção da dor. Por um lado, a substância inibe a dor via o braço inibitório descendente do caminho modulatório descendente, por outro, ela facilita a percepção

da dor via o braço facilitador descendente do caminho modulatório descendente. Já a NA inibe a percepção da dor via o braço inibitório descendente do caminho modulatório descendente, mas não parece estar envolvida no aspecto facilitador da percepção da dor no caminho modulatório descencente. Os caminhos inibitórios descendentes recebem contribuições de múltiplas regiões do cérebro, incluindo a matéria cinzenta pariaquedutal (PAG), a medula rostro-ventral (RVM) e o pontine tegmentum dorsolateral (DLPT). Neste caso, podem existir também contribuições do córtex pré-frontal e do sistema límbico, e estes caminhos podem ser responsáveis pela liberação de opióides endógenos, 5-HT e NA. Neurotransmissores-chave

Gordon Irving destacou, ainda, alguns dos principais mecanismos envolvidos na transmissão central. MH Report • outubro de 2008


Transmissão da dor periférica Diversos neuroquímicos podem ser liberados após a lesão do tecido, muitos dos quais aumentam a sensibilidade do nociceptor sem ativá-lo diretamente – em outras palavras, pela redução do limiar de ativação. Gordon Irving citou como exemplos a bradicinina e a expressão de seu receptor, B1, juntamente com a prostanglandina E2 e seu receptor. Nesse contexto, cabe ressaltar que os prostanóides são componenteschave da resposta inflamatória e são sintetizados a partir do ácido araquidônico (AA) via cicloxigenase (COX-2), que, por sua vez é ativada pelo fator de necrose tumoral e pela interleucina 1β. Uma vez tendo ocorrido uma lesão, o dano pode provocar a expressão dos canais de Na+ nas fibras C e a liberação de substâncias como o fator de crescimento do nervo (NGF), o ácido araquidônico (AA), a bradicinina (BK), as prostaglandinas (PGE2) e as citocinas (interleucinas), o que acaba por provocar adaptações no nociceptor periférico que servem para aumentar a excitabilidade do nociceptor. A liberação e as ações subseqüentes destes neuroquímicos podem resultar em sensibilização periférica, que é um estado de hiperexcitabilidade do nociceptor, e cuja conseqüência é o aumento da sensibilidade à dor no local da lesão ou inflamação Outro mecanismo que poderia resultar em hiperexcitabilidade é a superexpressão de canais de sódio após uma lesão; alternativamente, um mecanismo indireto levando à hiperexcitabilidade é a liberação do fator de crescimento do nervo (NGF) proveniente das fibras C lesionadas. Já as citocinas podem ser liberadas pelas células antiinflamatórias ativadas (macrófagos) localizadas nas fibras nervosas. Assim como as quimiocinas, elas podem agir nos neurônios e células gliais de suporte para alterar as propriedades delas ou os padrões de expressão do gene. Por fim, as proteinas kinases possuem diversas ações. No nociceptor, considera-se que elas fosforilam os canais de sódios para torná-los mais excitáveis e/ou reduzir o limiar de ativação deles.

A dor mediada por não nociceptores é causada por estímulos sensoriais que, geralmente, produzem uma sensação suave e revelam uma mudança no funcionamento dos neurônios centrais. Além disso, a sensibilização central imediata é um aumento dependente de atividade na eficácia sináptica devido à fosforilação e ao tráfico de canais iônicos para a membrana e, eventualmente, a resposta aos normalmente estímulos subliminares é elevada. MH Report • outubro de 2008

A sensibilização central na medula espinhal pode ser mediada por neurotransmissores, neuropeptídeos, tipos de receptores e mecanismos sinalizadores intracelulares. As endomorfinas 1 e 2 são dois peptídeos opióides endógenos com afinidade e seletividade para o receptor mu opióide. Essas endomorfinas afetam a percepção da dor assim como os processos autonômicos e cognitivos. Já os receptores de glutamato, especificamente os receptores de NMDA, desempenham um papel

importante na plasticidade sináptica e estão implicados na facilitação do sistema nervoso central no processamento da dor. Referência 1. Tölle T, Xu X, Sadovsky AB. Painful diabetic neuropathy: a cross-sectional survey of health state impairment and treatment patterns. J Diabetes Complications 2006;20:26-33.

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Prof. Dr. Sean Mackey

O que a neuroimagem revela sobre a dor Estudos de imagens cerebrais de pacientes portadores de neuropatia, de síndrome dolorosa complexa regional (SDCR) ou de síndrome do membro fantasma mostram a variabilidade dos circuitos e dos centros envolvidos na representação da dor. Diretor da divisão Pain Management, Stanford Systems Neuroscience and Pain Lab, Stanford University, California, EUA.

Segundo dados da IASP (International Association for the Study of Pain), cerca de um quinto da população mundial sofre de dor crônica, com graves efeitos na qualidade de vida dos indivíduos afetados e altos custos para os sistemas de saúde. Isto é um dos principais problemas a serem enfrentados por toda a sociedade, com destaque para os profissionais de saúde e a comunidade científica.

plexo que é feito de elementos interconectados múltiplos e diversos. O primeiro passo para compreender e tratar a dor crônica em geral (e a dor neuropática, em particular) é ter em mente que a típica abordagem biológica reducionista não funciona neste caso. É preciso levar em consideração as questões colocadas pelo avanço da neurociência e integrar todas as informações disponíveis, desde os avanços

“Seis regiões cerebrais são normalmente associadas ao processamento e à percepção da dor aguda e compõem o que pode ser considerado a matriz álgica” O desafio central no tratamento da dor é a complexidade de sua natureza: trata-se de um sintoma resultante de um sistema neural adaptativo com8

no campo da genética até o conhecimento acumulado sobre o comportamento humano.

Matriz álgica

A síntese dos estudos de neuroimagem mostra quais são as áreas cerebrais que parecem estar envolvidas no processamento dos sinais da dor. Tudo indica que seis regiões cerebrais são normalmente associadas ao processamento e à percepção da dor aguda e compõem o que pode ser considerado a “matriz da dor”. São elas: córtex préfrontal (CPF), córtex insular, córtex cingulado anterior (CCA), córtex sensório-motor, córtex somatossensorial (S1) – córtices primário e secundário – e tálamo. O conhecimento de tais regiões, entretanto, não simplifica o problema. Há diversos fatores que influenciam uma região cerebral no sentido de ela estar ou não envolvida no processamento da dor, tais como genética, gênero e diferenças individuais, e que afetam a detecção da atividade nos estudos com PET ou IRM. As próprias regiões envolvidas parecem depender do tipo de dor expeMH Report • outubro de 2008


rimentada (temperatura extrema, descarga elétrica, visceral), e os estados de atenção (ou distração), emocionais, de antecipação e de expectativa também exercem influência nesse contexto. Outro ponto a ser levado em conta é que as regiões cerebrais que são envolvidas na interpretação dos estados de dor crônica parecem ser ativadas diferentemente nas dores crônica e aguda. “Comparando a reação à dor em indivíduos normais àquela de sujeitos com dor clínica, foi observado que a diferença no grau de ativação destas regiões, excetuando-se o tálamo, foi estatisticamente significativa”, disse Sean Mackey.

resultados mostraram que, na maioria dos estudos, tal matriz não era inteiramente ativada. Os dois primeiros estudos coletados, um envolvendo nove pacientes com dor central unilateral devido a infarto medular lateral (síndrome de Wallenberg), e outro que analisou cinco pacientes com lesão traumática do nervo

Ativação diversificada

da dor (tálamo lateral, S1, S2) mais do que ao sistema medial”

O estudo de Moisset et al. [1] (Figura 2) combinou todos os resultados relacionados a neuroimagem de sete estudos que buscaram determinar exatamente se diferentes sintomas da dor neuropática envolvem estruturas similares e se estas estruturas estão relacionadas à “matriz da dor” fisiológica. Os

“A alodinia dinâmica foi predominantemente associada a mudanças no sistema lateral relacionado aos aspectos discriminativos sensoriais

periférico, concluíram que a alodinia dinâmica foi predominantemente associada a mudanças no sistema lateral relacionado aos aspectos discrimina-

Figura 1 – As regiões do cérebro envolvidas na “Matriz álgica” da percepção da dor.

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tivos sensoriais da dor (tálamo lateral, S1, S2) mais do que ao sistema medial, que tem relação com a dimensão emocional-afetiva da dor (tálamo medial, córtex cingulado anterior e ínsula). A conclusão do primeiro estudo foi baseada na observação de uma redução da atividade do córtex cingulado anterior durante a alodinia em pacien-

tes com a síndrome de Wallenberg. Em contraste, o segundo estudo não observou mudanças significativas no córtex cingulado anterior ou na ínsula em pacientes com lesão periférica, mas encontraram uma correlação entre rCBF (fluxo sanguíneo cerebral regional) no córtex cingulado anterior e córtex insular anterior e a intensidade da dor. “Entretanto, como essa correlação levou em consideração tanto a intensidade da dor contínua quanto a intensidade da alodinia, é difícil delinear uma conclusão firme concernente ao envolvimento específico desses elementos na alodinia”, afirmou Sean Mackey. Mais recentemente, dois outros estudos relataram uma falta de ativação no córtex cingulado anterior durante a alodinia induzida por estímulo suave e superficial. Witting et al. [apud 1] estudaram nove pacientes com lesão traumática do nervo e observaram um aumento significativo em rCBF bilateralmente em S2, na ínsula anterior bilateral, no córtex órbito-frontal contralateral (BA 11) e no cerebelo, mas não no córtex cingulado anterior. De ma9


neira surpreendente, não foi observada nenhuma ativação em S1 ou no tálamo neste estudo. Já Ducreux et al. [apud 1] relataram um aumento significativo na atividade bilateralmente em S1, S2 e no córtex pré-frontal (CPF) e no tálamo contralateral ao lado do estímulo, mas não no córtex cingulado anterior, em seis pacientes com siringomielia. Além disso, em consonância com os resultados obtidos por Petrovic et al. [apud 1], os pesquisadores não observaram ativação significativa na ínsula em pacientes com alodinia associada a siringomielia.

Neuroplasticidade

Sean Mackey destacou a importância, no estudo da dor neuropática, de se levar em consideração a neuroplasticidade – a capacidade natural de o cérebro formar novas conexões de maneira a compensar lesões ou mudanças em um determinado ambiente. Um estudo de Lotze et al. [2] investigou 14 indivíduos que haviam sofrido amputação do membro superior e sete controles saudáveis, utilizando a fMRI, que foram solicitados a executar movimentos com o lábio e com os membros superiores (fantasmas ou não).

“Mudanças adaptativas substanciais no sistema nervoso central podem contribuir para os sintomas motores na síndrome dolorosa complexa regional” “A questão agora é confirmar se tais resultados foram conseqüência de um possível erro tipo II. Em outras palavras, se os estudos simplesmente não apresentavam poder estatístico devido ao número reduzido de indivíduos analisados”, questionou Sean Mackey.

Os autores identificaram que apenas os sete pacientes que apresentavam dor no membro fantasma mostravam uma mudança na representação cerebral do movimento do lábio, que passara a ativar a região antes representada pela mão agora decepada, sugerindo uma co-ati-

vação seletiva das áreas corticais da mão e da boca em pacientes com o quadro. Tal reorganização pode ser o correlato neural da dor no membro fantasma. “Este é um belo exemplo da plasticidade cortical”, pontuou Sean Mackey. Síndrome dolorosa complexa regional

Outro foco dos estudos sobre a plasticidade neural na dor neuropática abrange a síndrome dolorosa complexa regional (SDCR), um grupo complexo de transtornos que geralmente se desenvolvem após trauma e que afetam os membros de maneira mais proeminente, com ou sem uma lesão do nervo e que também pode se desenvolver após doenças viscerais, lesões no sistema central ou, mais raramente, até mesmo sem um óbvio evento antecedente. Além de associado a reduções de substância cinzenta em regiões como o cingulado posterior médio, S2, ínsula posterior e S1 esquerdo, o quadro parece estar ligado a uma reorganização dos circuitos motores centrais de pacientes que o apresentam. Estudo de Maihöfner et al. [3] concluiu que este grupo apresenta atividade elevada das áreas motoras primária e suplementar, entre outros resultados, sugerindo que “mudanças adaptativas substanciais no sistema ner-

Figura 2 – Metánalise dos estudos sobre alodinia em pacientes com dor neuropática: 7 estudos de (a) Petrovic et al. (1999), (b) Witting et al. (2006,(c) Becerra et al. (2006), (d) Schweinhardt et al. (2006), (e) Peyron et al. (1998), (f) Ducreux et al. (2006), (g) Peyron et al. (2004).

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voso central podem contribuir para os sintomas motores na SDCR”. Ao todo, a pesquisa analisou 12 pacientes e o mesmo número de indivíduos saudáveis. Até recentemente, acreditava-se não ser possível simplesmente colocar um paciente em um scanner e mensurar sua dor crônica. Agora, entretanto, os pesquisadores acreditam ser possível fazê-lo sem a necessidade de se recorrer a tarefas específicas, com o cérebro em repouso. A atividade cerebral é mantida mesmo na ausência de uma tarefa estimulada externamente, conseqüentemente, qualquer região cerebral tem flutuações espontâneas no sinal, dependente da oxigenação do sangue (BOLD), visto que o cérebro em repouso (mesmo durante o sono) nunca está realmente repousando. Em vez de utilizar tarefas e medir

os efeitos, as flutuações espontâneas do sinal BOLD em regiões particulares do cérebro podem ser isoladas, e isto pode ser utilizado como regressor com o objetivo de identificar outras regiões cujos tempos de flutuação seriam intimamente ligados a região de interesse. Vale acentuar, entretanto, que o principal desafio dos estudos de imagem é compreender as diferenças individuais e combinar os dados que vêm sendo acumulados aos tratamentos de maneira que, no final das contas, seja possível identificar as regiões do cérebro associadas à eficácia de uma terapia e aos seus eventuais efeitos colaterais.

report Realização Medicina Hoje Tel.: 11 8115-3636 - mg_a.com@uol.com.br

Referências 1. Moisset X, Bouhassira D. Brain imaging of neuropathic pain. NeuroImage 2007;37:S80-8. 2. Lotze M, Flor H, Grodd W, Larbig W, Birbaumer N. Phantom movements and pain. An fMRI study in upper limb amputees. Brain 2001;124:2268-77. 3. Maihöfner M, Baron R, DeCol R, Binder A, Birklein F, Deuschl G, Handwerker HO, Schattschneider J. The motor system shows adaptive changes in complex regional pain syndrome. Brain 2007;130:2671-87.

Editor: Dr. Jean-Louis Peytavin Comercial: Mauricio Galvão An­­­­derson Direção-arte: Cristiana Ribas

A matriz da dor Estudo publicado em 2005 no European Journal of Pain analisou 98 estudos envolvendo indivíduos normais (68) e com dor clínica (30), definida através de imagem por métodos hemodinâmicos incluindo tomografia por emissão de pósitrons (PET) e ressonância magnética funcional (fMRI), e identificou 4 regiões envolvidas na dor aguda (Figura 1): • Córtex pré-frontal (CPF): O córtex pré-frontal lateral foi ativado em condições clínicas tais como dor neuropática contínua, dor visceral, cefaléias em salvas e alodinia ao frio em pacientes com dor neuropática. O cortex pré-frontal inferior (orbital) pode ser ativado por estímulos sensoriais tanto dolorosos quanto prazerosos, mas não por neutros, e é, conseqüentemente, considerado como estando envolvido no processamento de aspectos afetivos da estimulação sensorial. Estudos também documentaram o envolvimento em funções executivas tais como a memória de trabalho, a tomada de decisão, o planejamento e o julgamento. • Córtex insular: É a estrutura cerebral com o maior espectro de conexões corticais. A estimulação dolorosa ativa duas áreas distintas no córtex insular, uma na parte ântero-inferior e outra na parte pósterosuperior. Esta região cerebral também processa informação convergente para produzir um contexto emocionalmente relevante para a experiência sensorial. • Córtex cingulado anterior (CCA): Uma das áreas mais freqüentemente ativadas nos estudos de imagem sobre dor. Exerce múltiplas funções no processamento da dor e é mais freqüentemente associada ao seu componente afetivo. O ACC está também envolvido na antecipação da dor, respostas de cognição e atenção (especificamente porções do cingulado médio) e respostas motoras à dor. • Amígdala: realiza o papel primário no processamento e memória de reações emocionais.

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