Extensivo 2013 Epidemiologia Volume 2

Page 1

Vo l ume 2

EPIDEMIOLOGIA

PRINCIPAIS TEMAS PARA PROVAS DE RESIDÊNCIA MÉDICA


AUTORIA E COLABORAÇÃO Alex Jones Flores Cassenote Graduado em biomedicina pelas Faculdades Integradas de Fernandópolis da Fundação Educacional de Fernandópolis (FEF). Mestre e doutorando em Ciências pelo Programa de Pós-Graduação em Doenças Infecciosas e Parasitárias da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Epidemiologista responsável por diversos projetos de pesquisa na FMUSP e na Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Epidemiologista do Centro de Dados e Assessor da Diretoria de Comunicação do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (CREMESP). Colaborador do Laboratório de Epidemiologia e Estatística do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia (LEE). Marília Louvison Graduada em medicina pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Especialista em Medicina Preventiva e Social pela UNIFESP. Mestre e doutora em Epidemiologia pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP/USP). Médica da SES/SP - Coordenadora Estadual da Área Técnica de Saúde da Pessoa Idosa 2008. Aline Gil Alves Guilloux Graduada em Medicina Veterinária pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Mestre em Ciências pelo Programa de Epidemiologia Experimental e colaboradora de projetos do Laboratório de Epidemiologia e Bioestatística da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo (FMVZ/USP). Augusto César Ferreira de Moraes Graduado em Educação Física pelo Centro Universitário de Maringá (CESUMAR). Especialista em Fisiologia pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Mestre em Ciências pelo Programa de Pediatria e doutorando em Ciências pelo Programa de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Professor de Epidemiologia das Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU). Nathalia Carvalho de Andrada Graduada em medicina pela Universidade de Mogi das Cruzes (UMC). Especialista em Cardiologia Clínica pela Real e Benemérita Sociedade Portuguesa Beneficente de São Paulo. Título de especialista em Cardiologia pela Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC). Thaís Minett Graduada em medicina pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Especialista em Clínica Médica e em Neurologia e doutora em Neurologia/Neurociências pela UNIFESP, onde é professora adjunta ao Departamento de Medicina Preventiva. Valéria Troncoso Baltar Graduada em Estatística pelo Instituto de Matemática, Estatística e Computação Científica da Universidade de Campinas (UNICAMP). Especialista em Demografia pelo Centro Latino-Americano e Caribenho de Demografia (CELADE). Mestre em Ciências pelo Instituto de Matemática e Estatística da Universidade de São Paulo (IME-USP). Doutora em Epidemiologia pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP-USP).


APRESENTAÇÃO

Após anos de dedicação intensa, numa árdua rotina de aulas teóricas e plantões nos mais diversos blocos, o estudante de Medicina depara com mais um desafio, o qual determinará toda a sua carreira: a busca por uma especialização bem fundamentada e que lhe traga a garantia de uma preparação a mais abrangente possível. Talvez a maior dificuldade enfrentada pelo futuro médico nessa etapa seja o ingresso nos principais centros e programas de Residência Médica, devido ao número expressivo de formandos, a cada ano, superior ao de vagas disponíveis. Contudo, essa barreira pode ser vencida quando se conta com o apoio de um material didático direcionado e que transmita total confiança ao candidato. Considerando essa realidade, foi desenvolvida a Coleção SIC Principais Temas para Provas de Residência Médica 2013, com capítulos baseados nos temas cobrados nas provas dos principais concursos do Brasil, casos clínicos e questões, dessas mesmas instituições, selecionadas e comentadas de maneira a oferecer uma compreensão mais completa das respostas. São 31 volumes preparados para que o candidato obtenha êxito no processo seletivo e, consequentemente, em sua carreira. Bons estudos!

Direção Medcel A medicina evoluiu, sua preparação para residência médica também.


ÍNDICE

Capítulo 1 - Bioestatística aplicada à análise de estudos epidemiológicos...........................19

4. Postulados de Henle-Koch-Evans................................. 68

1. Introdução ................................................................... 19 2. A natureza das variáveis .............................................. 20

Capítulo 5 - Medicina baseada em evidências, revisão sistemática e meta-análise ............... 71

3. Medidas de ocorrência ................................................ 20

1. Introdução ................................................................... 71

4. Medidas de associação em estudos epidemiológicos.... 24

2. Medicina baseada em evidências ................................ 72

5. Variáveis de confusão .................................................. 28

3. Revisão sistemática ..................................................... 76

6. Aplicação da estatística em estudos epidemiológicos ... 29

4. Meta-análise ................................................................ 77

7. Erros sistemáticos ........................................................ 33

5. Considerações finais .................................................... 78

8. Amostragem em estudos epidemiológicos ................. 34

6. Resumo ........................................................................ 78

9. Resumo ........................................................................ 34

Glossário .........................................................79

Capítulo 2 - Métodos diagnósticos ................ 37

5. Resumo ........................................................................ 69

Casos clínicos ..................................................85

1. Introdução ................................................................... 37 2. Possibilidades em um teste diagnóstico .................... 37 3. Parâmetros ................................................................. 38 4. Curva ROC.................................................................... 40 5. Testes diagnósticos e predições clínicas ...................... 40 6. Testes de rastreamento de doenças na população ..... 41 7. Resumo ........................................................................ 43

Capítulo 3 - Estudos epidemiológicos ...........45 1. Introdução ................................................................... 45 2. Classificação ................................................................ 46 3. Tipos de delineamentos epidemiológicos ................... 47 4. Estudos qualitativos..................................................... 60

QUESTÕES Capítulo 1 - Bioestatística aplicada à análise de estudos epidemiológicos ......................................... 105 Capítulo 2 - Métodos diagnósticos ................................ 121 Capítulo 3 - Estudos epidemiológicos............................ 138 Capítulo 4 - Causalidade em Epidemiologia .................. 155 Capítulo 5 - Medicina baseada em evidências, revisão sistemática e meta-análise ......................... 157

COMENTÁRIOS

5. Novas abordagens ....................................................... 61

Capítulo 1 - Bioestatística aplicada à análise de estudos epidemiológicos ......................................... 167

6. Resumo ........................................................................ 61

Capítulo 2 - Métodos diagnósticos ................................ 179

Capítulo 4 - Causalidade em Epidemiologia ...65 1. Introdução ................................................................... 65 2. Postulados de Henle-Koch ........................................... 66 3. Critérios de Bradford Hill ............................................. 66

Capítulo 3 - Estudos epidemiológicos............................ 196 Capítulo 4 - Causalidade em Epidemiologia .................. 209 Capítulo 5 - Medicina baseada em evidências, revisão sistemática e meta-análise ......................... 211

Referências bibliográficas ............................219


EPIDEMIOLOGIA CAPÍTULO

1

Bioestatística aplicada à análise de estudos epidemiológicos

1. Introdução Várias vezes você já deve ter deparado com a seguinte frase: “fumar causa câncer de pulmão”. Embora a sentença tenha forte impacto, sabe-se que, do ponto de vista epidemiológico, essa relação é falsa, uma vez que existem pessoas que fumam e que nunca desenvolverão o câncer de pulmão ou qualquer outra doença relacionada a tal hábito. Apesar de existirem críticas à afirmação citada, você sabe, desde antes de entrar na faculdade, que existe certa “verdade” na afirmação. De fato, essa relação começou a ser demonstrada a partir da década de 1950 pelos famosos trabalhos de Doll e Hill (1950, 1954). Esses estudos, além de deixarem evidente a íntima relação tabaco versus câncer de pulmão, demonstraram a correspondência entre o aparecimento da neoplasia do pulmão e a quantidade de tabaco nos pacientes. O pressuposto primordial para entender a discussão que será iniciada é que a doença não surge ao acaso (aleatoriamente). Existem alguns fatores associados à maior ou menor frequência, alguns que contribuem para o seu surgimento (fatores de risco) e outros cujo caráter protege o indivíduo (fatores de proteção). Nesse sentido, surgem as pesquisas de Doll e Hill, conhecidos pesquisadores que observaram e analisaram fatores relacionados com o câncer de pulmão, concluindo que a doença é significativamente mais frequente entre os indivíduos com hábito de fumar. Para os procedimentos de análise, a Epidemiologia é servida por uma disciplina chamada Estatística, ou mais precisamente a Bioestatística. Segundo Pereira (2010), a Estatística é uma disciplina das ciências formais (despida de objeto, tratando apenas de estrutura conceitual, lógica e epistemológica do conhecimento) à qual diferentes ciências empíricas (com objeto definido) recorrem para melhor conhecer os assuntos de seu interesse. O prefixo “bio” para Bioestatística busca apenas dar-lhe o sentido de aplicação às ciências biológicas e da saúde, não havendo nada de conceitualmente diferente.

Valéria T. Baltar / Alex Jones F. Cassenote / Marília Louvison

Em Epidemiologia, os assuntos nos quais se busca maior entendimento são as relações que diversas variáveis do indivíduo, do tempo e do espaço estabelecem com determinados desfechos, que muitas vezes são as doenças de interesse do pesquisador, ficando explícito que o ponto central de uma avaliação está alocado na investigação da associação e efeito de variáveis independentes (fatores) sobre variável dependente (desfecho). Para ilustrar essa situação, imagine o seguinte: choveu muito durante a noite toda, e o nível dos rios estará elevado. Existe uma relação direta entre as águas das chuvas e as dos rios, ou seja, elas estão associadas. Nesse caso, poderia ser possível ainda medir a influência da variável independente (chuva) sobre a variável dependente (nível dos rios) e, de certo modo, conhecer a influência que a variabilidade de uma exerce sobre a variabilidade da outra. A associação, muitas vezes, indica que uma variável pode estar no caminho da causalidade de um determinado desfecho, contudo essa relação pode existir pelo simples acaso ou por alguma distorção como o efeito de confusão, por exemplo. Existem, na atualidade, tratamentos adequados que possibilitam ao pesquisador fazer essas considerações, embora outras questões também sejam importantes para se falar em inferência causal. Tendo em vista que a Bioestatística está servindo a Epidemiologia como uma ferramenta aplicada, faz-se necessária a utilização de uma estrutura didática para direcionar o leitor. Almeida Filho e Rouquay (2002) sugerem que as seguintes perguntas sejam realizadas pelos interessados neste momento: - “Em que medida (com que intensidade) ocorre a doença ‘Y’”?; - “Na presença de quais condições/fatores a doença ‘Y’ se manifesta?”; - “Qual a possibilidade de que a associação entre a doença ‘Y’ e o fator ‘X’ se deva ao acaso?”.

19


BIOESTATÍSTICA APLICADA À ANÁLISE DE ESTUDOS EPIDEMIOLÓGICOS

A organização dessas perguntas, segundo os autores, permite uma discussão que pode ser sintetizada em 3 etapas: as medidas de ocorrência; as medidas de associação; e as medidas de significância estatística.

2. A natureza das variáveis Antes de prosseguir com a questão da análise estatística, é preciso conhecer a natureza das variáveis consideradas, ou seja, como é feita a codificação dos eventos observados. Quando muitos indivíduos são avaliados, como no caso dos estudos epidemiológicos, é obrigatório seguir um padrão que facilite a manipulação e a interpretação dos dados. Segundo Rouquayrol (1994), o termo “variável” pode ser definido como a propriedade que determina a maneira pela qual os elementos de qualquer conjunto são diferentes entre si. Além da classificação metodológica em “dependente” e “independente”, já discutida, Pereira (2010) explica que existem 2 tipos de variáveis, as qualitativas e as quantitativas (Figura 1). Existem medidas que designam qualidade de coisas, entre elas: aquelas cujas categorias não têm relação de ordem uma com a outra e que são chamadas qualitativas nominais (nomes, rótulos – com estes atributos, as coisas podem ser avaliadas apenas como iguais ou diferentes); e aquelas cujas categorias têm alguma relação uma com a outra e que são chamadas qualitativas ordinais (hierarquia do tipo 1º, 2º etc. – com estes atributos, as coisas podem ser avaliadas como iguais, diferentes, maiores ou menores).

Existem outras que designam quantidade ou intensidade de predicados, e, entre essas, aquelas cujos predicados são quânticos, que variam por unidade definida, e que são chamadas de quantitativas discretas (multitude: contagens, como em idade em anos completos – com estes predicados, as coisas podem ser comparadas como iguais, diferentes, maiores ou menores até o limite em que a tal unidade permita distinção); e aquelas cujos predicados são contínuos, cuja unidade pode ser indefinidamente redefinida para níveis menores e que são chamadas quantitativas contínuas (magnitude, como quilômetro que pode ser redefinido em metros, centímetros etc. – com esses predicados as coisas podem, ainda que teoricamente, já que haverá um limite físico para a divisão, ser comparadas até o nível de minúcia que possa distinguir perfeitamente coisas iguais, diferentes, maiores ou menores). As distinções entre as variáveis são menos rígidas do que a descrição insinua. Por exemplo, pode-se tratar a idade como uma variável contínua, mas, se for registrada pelo ano mais próximo, poderá ser vista como variável discreta. Idade poderia ainda ser dividida em grupos etários, como “crianças”, “adultos jovens”, “idade média” ou “idosos”, podendo ser tratada também como uma variável categórica ordinal.

3. Medidas de ocorrência Medidas de ocorrência, ou frequências, são utilizadas para descrever variáveis qualitativas. A frequência simples é a contagem das ocorrências de uma das categorias. Para facilitar a interpretação dos resultados, as frequências relativas (proporção de elementos que pertencem a uma categoria em relação ao conjunto) são calculadas em termos de percentuais, assim torna-se possível a comparação dos dados. No tratamento de variáveis quantitativas, o cálculo de frequências pode não ser viável, visto que o número de categorias pode ser muito elevado. É possível obter medidas de frequência quando o dado quantitativo é agrupado em categorias. Outras medidas, como as de tendência central e dispersão, são úteis para resumir os dados. Um banco de dados proveniente de uma pesquisa hipotética servirá para exemplificar a utilização dessas medidas de maneira prática. Imagine que esses dados são oriundos de pacientes que foram selecionados no serviço ambulatorial de um hospital, sendo que o objetivo dos pesquisadores era estudar a frequência de certa lesão cardíaca. Foram avaliadas algumas variáveis do indivíduo e realizados alguns exames laboratoriais. A presença ou ausência da doença foi definida por uma avaliação clínica e um exame de imagem (Tabela 1).

Figura 1 - Tipos de variáveis exploradas nos estudos epidemiológicos Fonte: PEREIRA, 2010; com modificações.

20

Lesão?

Colesterol (mg/dL)

Triglicerídeos (mg/dL)

Glicose (mg/dL)

Fumante?

Idade (anos)

Sexo

Nomes

Tabela 1 - Banco de dados hipotético com diferentes tipos de variáveis

Maria

Feminino

47

Sim

120

120

311

Sim

Fátima

Feminino

52

Não

264

205,11

185

Não


EPIDEMIOLOGIA CAPÍTULO

5

Medicina baseada em evidências, revisão sistemática e meta-análise Augusto César F. de Moraes / Alex Jones F. Cassenote / Marília Louvison

1. Introdução Este capítulo propõe a apresentação de um dos conteúdos mais recentes discutidos em Epidemiologia e nas ciências médicas: a Medicina Baseada em Evidências (MBE), as revisões sistemáticas e a meta-análise. O médico que conhecer essas ferramentas estará apto para a atualização contínua independentemente de sua área de atuação ou especialidade, podendo lidar com a vastidão de informações que surgem no dia a dia. Tradicionalmente, a prática médica era, em muito, baseada na experiência de cada profissional. As provas científicas tinham pouco peso quando um médico tinha que tomar determinada decisão clínica. Por mais contraditório que possa parecer, tal situação era ainda mais presente no mundo acadêmico, quando o argumento de autoridade, ex cathedra, prevalecia sobre qualquer outra coisa. No entanto, setores importantes da classe médica, lentamente, começaram a perceber que as decisões clínicas eram tão mais apropriadas quanto mais embasamento encontravam em conhecimentos provenientes de estudos científicos. Apesar da grande resistência encontrada em determinados meios médicos, o movimento favorável às decisões clínicas baseadas em evidências científicas começou a ganhar corpo, especialmente a partir da década de 1980 (CORDEIRO et al., 2012). Foi nesse cenário que David Sackett e seu grupo da Universidade de McMaster no Canadá cunharam o termo “Medicina Baseada em Evidências”. A ideia central era a de que os médicos utilizassem de modo consciencioso, explícito e judicioso da melhor evidência científica atual quando tomassem decisões em seu trabalho de cuidado individual dos pacientes. Obviamente, a MBE não nega o valor da experiência pessoal de cada profissional, propondo apenas

que esta esteja alicerçada em evidências científicas, o que, além de tudo, confere também um caráter ético à prática profissional (CORDEIRO et al., 2012). Nas últimas 2 décadas, a produção científica apresentou um crescimento exponencial de artigos publicados em todas as áreas das ciências da saúde. Utilizando um assunto relacionado à especialidade de Cardiologia, a Figura 1 ilustra esse crescimento em um espaço de tempo de 9 anos (2001 a 2010). Os termos-chave utilizados para esta pesquisa realizada junto ao PubMed foram: risk cardiovascular disease, adult e original study. Observe que existe um crescimento médio elevado de mais ou menos 113 artigos por ano.

Figura 1 - Número de artigos publicados entre 2001 e 2010 indexados no PubMed, relacionados com fatores de risco cardiovascular em adultos

Essa evidência mostra a necessidade de sintetizar o conhecimento científico para gerar atendimento melhor e mais próximo do mundo “real” do paciente por meio de provas obtidas das pesquisas básicas e aplicadas. Contudo, a MBE deve respeitar algumas etapas para a síntese do conhecimento desenvolvido:

71


MEDICINA BASEADA EM EVIDÊNCIAS, REVISÃO SISTEMÁTICA E META-ANÁLISE

- Transformar necessidade de informação em perguntas

passíveis de resposta; - Buscar com máxima eficiência a melhor evidência para responder a questão; - Avaliar criticamente as evidências quanto à sua validade e utilidade; - Implementar os resultados na prática clínica; - Avaliar o desempenho. As principais metodologias que a MBE tem utilizado para a síntese do conhecimento são revisão sistemática e meta-análise, que estão descritas metodologicamente a seguir.

Passos

Objetivos

O que fazer?

3

Analisar criticamente a evidência em relação à validade, impacto e aplicabilidade

Qual a validade interna e externa dos estudos? Os resultados são aplicáveis na minha prática?

4

Integrar o conhecimento adquirido com a experiência clínica e com os aspectos do paciente

Os resultados são aplicáveis com meus pacientes?

5

Avaliar a efetividade e a eficácia na execução dos passos 1 a 4

--

2. Medicina baseada em evidências

Fonte: BENSEÑOR; LOTUFO, 2005; com modificações.

A MBE refere-se ao aperfeiçoamento das competências tradicionais do médico no diagnóstico, tratamento, prevenção e áreas correlatas por meio do processamento sistemático de questões relevantes e passíveis de resposta, e do uso de estatísticas matemáticas de probabilidade e risco (GREENHALGH, 2001). Em outras palavras, a MBE utiliza provas científicas existentes e disponíveis no momento, com boa validade interna e externa, para a aplicação de seus resultados na prática médica (DIB, 2010).

A - Passo 1

A MBE se tornou factível, pois houve:

- O desenvolvimento das estratégias para uma busca e

avaliação das evidências; - A criação das revisões sistemáticas das intervenções em saúde; - O surgimento dos periódicos secundários baseados em evidências; - A criação dos sistemas de informação que trazem até nós as melhores evidências; - A identificação e a aplicação das estratégias efetivas para um aprendizado em longo prazo e para a melhora da performance clínica (GUIMARÃES, 2009). Para que a MBE seja desenvolvida na prática médica, alguns autores estabeleceram passos para a busca de evidências que podem ser vistos na Tabela 1 (BENSEÑOR; LOTUFO, 2005). Tabela 1 - Passos para realizar a busca de evidências

Passos

Objetivos

O que fazer?

1

Converter a informação necessária sobre o(a) paciente em uma pergunta

Quero saber sobre um recurso diagnóstico? Prognóstico? Terapêutico? Preventivo?

Buscar as melhores evidências para responder a essa pergunta

Preciso localizar estudos de sensibilidade, especificidade? Coortes? Ensaios clínicos? Revisões sistemáticas?

2

72

Inicialmente, é preciso converter a informação necessária sobre o(a) paciente em uma pergunta. Sackett, Richardson e Rosemberg (1997) colocam que esse passo é o mais difícil para a busca de melhores evidências para abordar problemas clínicos. Para muitos(as) médicos(as), os esforços para fazer perguntas e procurar respostas são tão grandes que, somados à limitação de tempo para leitura, impossibilitam que as necessidades de informação sejam satisfeitas. O mesmo autor aponta os tópicos centrais do trabalho clínico em que surgem frequentemente as perguntas clínicas. São eles: achados clínicos, etiologia, manifestações clínicas das doenças, diagnóstico diferencial, exames diagnósticos, prognósticos, tratamento, prevenção, experiência e significado e automelhora. Nobre, Bernardo e Jatene (2003) apontam no 1º de seus 3 artigos sobre a MBE que a forma preconizada para a elaboração de uma pergunta clínica é conhecida pela sigla PICO (Tabela 2), formada por P de Paciente ou População, I de Intervenção ou Indicador, C de Comparação ou Controle e O de Outcome, que significa desfecho clínico, resultado, ou, por fim, a resposta que se espera encontrar nas fontes de informação científica. Tabela 2 - PICO: como formular bem uma questão na MBE

Siglas

Significados

Exemplos

P

Paciente ou população

Pessoas idosas com diabetes tipo 2 e hipertensão arterial não complicadas

I

Intervenções ou indicador

Tratamento antihipertensivo

C

Comparação ou controle

Não tratar a hipertensão e a informação

O

Outcome ou desfecho clínico

Benefício para a saúde da paciente em questão

Lopes (2000) sugere a alternativa a seguir: a questão deve ser enunciada da forma mais clara possível para facili-


EPIDEMIOLOGIA CASOS CLÍNICOS


2012 - FMUSP

1. O uso de estatinas na prevenção primária de doença

coronariana, em indivíduos assintomáticos com risco baixo para doenças cardiovasculares, pode ter importantes implicações para a saúde pública. Os resultados de ensaios

clínicos comparando estatinas com placebo são apresentados em investigação publicada recentemente, parcialmente apresentados a seguir e adaptados de Brugts et al. BMJ 2009. Considere que em todos os estudos o erro alfa é de 5%.

Números de pacientes/número de eventos Grupos

Risco relativo

Controle

WOSCOPSw9

3.302/174

3.293/248

0.68 (0.56 a 0.83)

AFCAPS/TexCapsw8

3.304/57*

3.301/95*

0.61 (0.45 a 0.83)

PROSPER

1.585/126

1.654/145

0.90 (0.70 a 1.15)

ALLHAT-LLTw7

5.170/380

5.185/421

0.90 (0.78 a 1.04)

ASCOT-LLA

5.168/163

5.137/249

0.64 (0.52 a 0.78)

HPSw5

1.455/NA

1.457/NA

0.57 (0.41 a 0.79)

w6

w10

1.428/43

1.410/65

0.65 (0.44 a 0.97)

MEGAw2

3.866/23†

3.966/43†

0.55 (0.33 a 0.91)

Total

23.823/966

23.946/1266

0.70 (061 a 0.81)

CARDS

w4

Q statistic P = 0.02, I² = 60%

0.25

0.5

1

Favorece estatinas

Favorece controles

2

CASOS CLÍNICOS

Experimental

--

a) Cite o tipo de estudo apresentado:

2012 - FMUSP

2.

b) Cite a medida de efeito utilizada, incluindo o valor das estimativas pontual e intervalar:

c) Interprete quantitativamente o resultado principal, indicando a conclusão do estudo em relação ao efeito da estatina:

A intervenção multifatorial intensificada, com rígida regulação da glicose e uso de bloqueadores do sistema renina-angiotensina, aspirina e agentes hipolipemiantes, tem sido indicada para reduzir o risco de doença cardiovascular não fatal em pacientes com Diabetes Mellitus (DM) tipo 2 com microalbuminúria. Um estudo procurou avaliar se essa conduta terapêutica teria efeito também sobre a mortalidade. Um total de 160 indivíduos com DM tipo 2 e microalbuminúria persistente foi alocado aleatoriamente para receber esse tratamento multifatorial intensivo (80) ou convencional (80). Após um período mediano de seguimento de 7,8 anos, ocorreram 24 óbitos no grupo de tratamento intensivo e 40 no convencional. a) Qual o tipo de estudo realizado no presente trabalho?

87


Caso 10

b) - Média para a variável idade: x = 32 + 54 + 43 + 44 + 43 + 59 + 60 + 43 + 36 + 39 = 453/10 = 45,3 anos. O ponto médio da distribuição da variável idade é de 45,3 anos. - Mediana para a variável peso: PP50%= 10 + 1/2 = 11/2 = 5,5. A mediana é um valor entre a 5ª e a 6ª posições (5,5). Ordena-se a variável (células cinzas): Peso (kg) 67 58 60 65 68 70 74 84 95 102

- Média entre os valores de posição 5 e 6: 68 + 70/2 = 69kg é o valor da mediana. Assim, pode-se dizer que, de um grupo de 10 indivíduos, 50% deles têm peso menor do que 69kg. - Moda da variável creatinina: Valor que mais se repete na distribuição da variável (0,73mg/dL). c) - Variável “triglicérides”: é do tipo quantitativa discreta, assim uma estratégia de resumo seria a descrição de sua média de desvio-padrão, uma que leve a dar ideia do ponto central da variável e outra referente à dispersão desta; - Média: poderá ser obtida dividindo a soma das observações pelo número delas, sendo representada pela seguinte fórmula:

- Desvio-padrão: é a medida mais comum da dispersão estatística. O desvio-padrão define-se como a raiz quadrada da variância e pode ser assim expresso:

Os cálculos ficam mais simples de serem desenvolvidos quando feito por partes, como na Tabela a seguir: Triglicérides (mg/dL)

(Xi – média aritmética)

(Xi – média aritmética)2

167 132 189 230 194 158 129 186 154 157 Média = 169,6

-2,6 -37,6 19,4 60,4 24,4 -11,6 -40,6 16,4 -15,6 -12,6 Soma Variância (s2) Desvio-padrão (√s2)

6,76 1.413,76 376,36 3.648,16 595,36 134,56 1.648,36 268,96 243,36 158,76 8.494,4 943,82 30,72

CASOS CLÍNICOS

a) De acordo com os valores que as variáveis podem assumir, elas se dividem em qualitativas (nominal e ordinal) e quantitativas (categóricas e contínuas): - Sexo: variável qualitativa nominal; - Idade em anos: variável quantitativa discreta; - Peso: variável quantitativa discreta; - Altura: variável quantitativa discreta; - Circ. abdominal: variável quantitativa discreta; - Creatinina sérica: variável quantitativa contínua; - Triglicérides (mg/dL): variável quantitativa discreta. Conhecer os tipos de variáveis é fundamental em um estudo epidemiológico, pois os cálculos estatísticos aplicados dependerão dos tipos de variáveis que estão sendo avaliadas.

A média de triglicérides resultou em 169,6mg/dL com desvio-padrão de 30,72mg/dL. Pode-se dizer, então, que o ponto médio da distribuição da variável “triglicérides” é de 169,6 e que é padrão (comum) uma variação de 30,92 para além ou aquém dessa média. Repare que os valores-resumo têm uma semântica interessante. É possível que se faça algum julgamento sobre as características desse grupo mesmo sem conhecer nenhum indivíduo se apenas os valores de média e de desvio-padrão estivessem disponíveis. A variável “sexo” é do tipo qualitativa nominal; as estratégias mais simples de apresentação desse tipo de variável referem-se à proporção de cada uma das categorias. Por exemplo, nos dados disponíveis, verifica-se que 60% (6) do grupo são compostos por mulheres e 40% (4) por homens. Como existem apenas 2 categorias, toda a ocorrência possível foi descrita. d) Esta é uma questão que causa confusão, até mesmo para muitos pesquisadores. Para um estudo ter boa qualidade inferencial, deverá contar com uma amostra que represente a população de origem. Geralmente, nessa amostragem os indivíduos são sorteados, além de contarem com a mesma probabilidade de pertencerem à amostra (grupo que será avaliado). É necessário pensar que amostras selecionadas em hospital devem, por si só, apresentar maior variabilidade de

99


EPIDEMIOLOGIA QUESTÕES


2013 - UFF 1. Em relação às medidas de associação usadas nos estudos epidemiológicos, escolha a opção correta: a) nos desenhos longitudinais prospectivos, tanto o RR (Risco Relativo) quanto a RT (Razão de Taxas) são medidas mais precisas do risco do desfecho b) o OR (Odds Ratio) não pode ser usado quando o desenho do estudo é coorte, pois essa medida de associação é exclusiva de estudos caso-controle c) em estudos de coorte, a melhor medida é o RR, o qual, nos ensaios clínicos randomizados ou nos estudos caso-controle, não pode ser calculado d) caso utilizada, a análise de sobrevida possibilitaria o cálculo do OR ou do HR (Hazard Ratio) e) o RR é a melhor medida de associação somente nos estudos em que a medida de frequência trabalha com pessoa-tempo  Tenho domínio do assunto  Refazer essa questão  Reler o comentário  Encontrei dificuldade para responder

2013 - SANTA CASA DE BH 2. Considere um estudo realizado em uma amostra de alunos ingressantes nas escolas públicas de um determinado município no ano de 1991. Realizou-se a avaliação antropométrica, e a ocorrência de desnutrição foi associada com sexo, idade, local de residência e escolaridade do pai. Essa modalidade de estudo pode ser classificada como: a) estudo transversal b) estudo de coorte c) estudo de caso controle d) ensaio clínico  Tenho domínio do assunto  Refazer essa questão  Reler o comentário  Encontrei dificuldade para responder

2013 - AMP 3. Com relação à possibilidade de erros (vieses) nos estudos clínicos, assinale a correta: a) o viés de confusão pode ocorrer quando o fator de confusão está distribuído de maneira igual entre os grupos b) o viés de aferição acontece quando o processo de coleta das variáveis do estudo é sistematicamente igual nos 2 grupos c) o viés de seleção distorce os resultados pelo modo com que os participantes são recrutados d) o erro tipo I ou alfa acontece quando o teste não mostra significância quando na verdade existe e) o erro tipo II ou beta quando o teste estatístico mostra diferença quando na verdade ele não existe  Tenho domínio do assunto  Refazer essa questão  Reler o comentário  Encontrei dificuldade para responder

2012 - UNICAMP 4. Analise a Figura – Estimativa do número de casos de câncer segundo estadiamento, Direção Regional de Saúde 7, 2011 – e assinale a alternativa correta:

Fonte: Base de cálculo IBGE 2010 e INCA 2009. a) os casos de estadio 0, 1 e 2 mostram a eficácia das ações de prevenção e promoção da saúde que vêm sendo implementadas na região b) os tumores evidenciados por TY mostram que é necessário melhorar as ações de rastreamento dos tumores sólidos c) pode-se inferir que os municípios da região de Campinas estão investindo em diagnósticos mais precoces d) em torno de 50% dos casos são diagnosticados nas fases avançadas da doença, comprometendo as chances de cura e sobrevida por câncer na região  Tenho domínio do assunto  Refazer essa questão  Reler o comentário  Encontrei dificuldade para responder

2012 - SANTA CASA-SP 5. Após a leitura e a interpretação da Tabela a seguir, é possível inferir, exceto: % de casos Risco de Percentual de síndrome Idade síndrome de partos por de Down em materna de Down grupo etário cada faixa (anos) por 1.000 (% por todas etária manascidos as idades) terna <30 30 a 34 35 a 39 40 a 44 >45 Todas as idades

0,7 1,3 3,7 13,1 34,6

78 16 5 0,95 0,05

51 20 16 11 2

1,5

100

100

Fonte: ROSE, 1985. a) gestantes <30 anos apresentam baixo risco de terem filhos com síndrome de Down b) gestantes <30 anos geram mais da metade dos casos de síndrome de Down c) gestantes >40 anos apresentam maior risco de terem filhos com síndrome de Down

105

QUESTÕES

Bioestatística aplicada à análise de estudos epidemiológicos


EPIDEMIOLOGIA COMENTÁRIOS


EPIDEMIOLOGIA - COMENTÁRIOS

Questão 22. A alternativa correta é “a”; seguem as outras representações: b) Representação do estudo de meta-análise

c) Histograma de variância

d) Representação de estudo transversal (curva ROC)

e) Distribuição binomial simples e variada

Gabarito = A

170

Questão 23. Erro tipo II ou erro beta ou aleatório relaciona-se com o poder da amostra, que não conseguiu detectar benefício. A alternativa “a” está incorreta, pois viés de confusão é corrigido no planejamento do ensaio clínico, através da realização da randomização. A alternativa “b” está incorreta, pois efeito Hawthorne decorre do comportamento do paciente que recebe intervenção num ensaio clínico, querendo agradar ao pesquisador, e relata somente “bons” resultados com a intervenção. A alternativa “c” está incorreta, pois o mascaramento ou cegamento não interfere na detecção do benefício, ao contrário. A alternativa “a” está incorreta, pois erro tipo I (ou erro alfa, ou sistemático) é sempre tolerável (5%) e não levaria a falha na detecção do benefício. Gabarito = E Questão 24. I - A precisão do estudo depende do tamanho amostral (representativa), e essa precisão pode falhar por 2 tipos de erros: aleatórios ou sistemáticos. II - A validação interna não depende da validação externa. III - Existe validação interna quando os resultados encontrados são válidos para a população-alvo. Gabarito = C Questão 25. A chance de câncer de esôfago no grupo de fumantes é calculada da seguinte forma: 47 / 77 = 0,61. A chance dos não fumantes é de 0,24 (8 / 33). Portanto, a razão de chances ou Odds Ratio (OR) é de 0,61 / 0,24 = 2,5. O OR é uma medida utilizada para estudos do tipo caso-controle em que não há uma “população” sob risco de desfecho, uma vez que o grupo controle é estabelecido a partir do conceito de não doença. Geralmente, o cálculo da chance aumenta a associação entre exposição e efeito, e a chance deve ser considerada hipótese. Gabarito = A Questão 26. O Intervalo de Confiança (IC), uma das formas objetivas de expressar os erros aleatórios (ao acaso) que podem estar envolvidos nas observações de um estudo epidemiológico, quantifica a incerteza na mensuração, pois permite a avaliação direta da faixa de valores possíveis para uma estimativa. Habitualmente, ele é relatado como sendo de 95%, ou seja, expressa a variação de valores em que há 95% de certeza de que o valor verdadeiro para a população como um todo está incluído. Caso o IC inclua a unidade (valor 1), significa que há chance de a associação entre exposição e desfecho ter ocorrido por acaso (hipótese nula). A vantagem desse método estatístico é que ele reflete o tamanho da amostra. Um IC 95% “estreito” (IC 95% = 2 - 2,5), obtido, em geral, em amostras grandes, mostra maior confiança e maior precisão. Os cálculos para os IC são feitos pelos pacotes estatísticos que valorizam se o IC será para avaliar diferença entre médias (variáveis quantitativas) ou entre proporções (variáveis qualitativas). Esses testes podem ser teste t-student (testa hipóteses que envolvem 2 médias), teste Z, ANOVA, teste qui-quadrado (trabalha com proporções calculadas), índice kappa (comparação entre os resultados observados por 2 profissionais diferentes). Gabarito = B


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.