SUMÁRIO
EDITORIAL Caro Leitor,
2 Atualizações patológicas Vacina contra o HPV
6 Profissionais de destaque Perfil: Ademar Lopes
10 HOSPITAIS
Hospital de Câncer de Barretos é referência mundial
16 ACONTECE 20 CONHECIMENTOS ALIADOS 21 MEDICINA E RELIGIÃO A Medicina nos Tribunais
Sabemos que a Medicina é um campo em constante atualização, exigindo do profissional dedicação, eficiência e um alto grau de especialização. Conhecemos, também, o longo processo de formação de um grande profissional, que supera a faculdade de Medicina e o período de Residência Médica. Com seis anos de experiência na área médica, o portal MedAtual apresenta cursos voltados à democratização do ensino, levando renomados professores e as mais recentes condutas médicas e terapêuticas a todo o território nacional. Nesse contexto, surge a Revista MedAtual, uma nova proposta, em que o objetivo é informar, trazendo novidades, conceitos, tendências, sugestões e dicas, gerando ainda aprendizado, mediante matérias bem estruturadas e com temas importantes aos médicos. Esta edição de lançamento traz como tema principal as dificuldades e os desafios enfrentados pelos Residentes durante a fase de especialização e aprendizado, mostrando os aspectos que influenciam esse período de estudos e apresentando dicas para os residentes. Boa leitura! Editores
Medicina e Direito
EXPEDIENTE
Rezar ajuda a resolver problemas de saúde?
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MATÉRIA DE CAPA Residência Médica ou Resistência Diária?
29 MERCADO DE TRABALHO
Dermatologia: mercado em ascenção atrai mais candidatos à residência
32 ENTREVISTA 33 GOOGLE MED
Médico sabe ser paciente?
Atuação na web também deve ser pautada pela ética médica
36 ALÉM DA MEDICINA
Médicos artistas e esportistas dão exemplos de disposição e boa forma
40 CASOS CLÍNICOS
Relato de um ferimento transfixante de mediastino e diafragma por projétil de arma de fogo
43 VERDADES E MITOS 46 FOTOS E EVENTOS 48 CRÔNICA A obturação
Diretores: Atílio Barbosa e Sandriani Caldeira Produção Editorial: Fátima Rodrigues Morais Conselho Editorial: Dra Flávia Fairbanks Lima de Oliveira Marino - mestre em Ginecologia e especialista em Endometriose e Sexualidade Humana pelo HC-FMUSP; Dr Marcos Laercio Pontes Reis - especialista em Hematologia pela Casa de Saúde Santa Marcelina e mestrando em Transplante de Medula Óssea pela UNIFESP; Dr Eduardo Bertolli - especialista em Cirurgia Geral pela PUC-SP e em Cirurgia Oncológica pelo Hospital do Câncer A. C. Camargo; Dra Denize Borges Pedretti - residente em Clínica Médica pela UNIFESP. Colaboração: Dr Leandro Faustino, Laísa de Moura e Dr Antonio Bomfim Marçal Avertano Rocha Jornalista Responsável: Fátima Rodrigues Morais - MTB 48447 Repórter: Caroline Pellegrino Revisão: Alessandra Barbosa Valença, Denis de Jesus Souza, Henrique Tadeu Malfará de Souza e Tatiana Takiuti Projeto Gráfico e Diagramação: Jorlandi Ribeiro Artes: Martha N. F. Leite, Luciane Sturaro e Marcelo Sales Criação de Capa: R2 Criações Fotos: Marcelo Sales, Reinaldo Luiz Canato e Martha N. F. Leite Marketing e Publicidade: Camila Miquelim Eventos: Murilo Munhoz e Caroline Alves Tiragem: 100.000 exemplares Periodicidade: Semestral Circulação: Nacional Distribuição: Gratuita MedAtual Avenida Paulista, 1776 - 2º andar www.medatual.com.br medatual@medatual.com.br
A Revista MedAtual é gratuita. Solicite seu exemplar, cadastrando-se em nosso site: www.medatual.com.br. Envie suas opiniões e sugestões pelo e-mail medatual@medatual.com.br
ATUALIZAÇÕES PATOLÓGICAS ATUALIZAÇÕES PATOLÓGICAS
Vacina contra o HPV Estudos mostram que a vacina é eficaz na prevenção de infecções persistentes e lesões de alto grau
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ados da Organização Mundial de Saúde (OMS) estimam em 20 a 40% a prevalência global do HPV na população de mulheres sexualmente ativas, sendo esperado um aumento anual de 300 milhões no número de portadoras do vírus ao redor do mundo. Nos Estados Unidos, algumas bases de dados sugerem que 3 em cada 4 mulheres apresentarão a infecção pelo HPV em algum momento da vida. No Brasil, pesquisas mostraram que 12 a 20% das mulheres adultas com citologia cervical normal, sem sintomas nem lesões visíveis, são portadoras do vírus, facilitando a transmissão sexual do agente. Uma vez que não existem técnicas para erradicar o vírus do organismo humano, as tentativas de evitar a progressão das lesões incluem desde ressecções cirúrgicas de parte ou de todo o colo uterino até cirurgias amplas com a retirada do útero, tubas, paramétrios e parte da vagina, no caso de o carcinoma já ter-se disseminado localmente. Logo, estra-
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tégias preventivas sobre o vírus e sua forma de transmissão parecem ser a maneira menos agressiva e mais custo-efetiva de abordar o problema. No Brasil, o Ministério da Saúde recomenda a realização da colpocitologia oncótica (Papanicolau) anualmente a mulheres sexualmente ativas. Além disso, executa programas educacionais em nível nacional sobre a necessidade de consultas regulares ao ginecologista e práticas sexuais seguras e disponibiliza informações sobre o câncer de colo do útero, o HPV e outras DSTs. Porém, o governo brasileiro ainda não oferece a vacina contra o HPV na rede pública, deixando a estratégia preventiva sem um de seus componentes mais importantes. Atualmente, existem duas vacinas comercialmente disponíveis: a quadrivalente Gardasil® (HPVs 6, 11, 16 e 18), da gigante farmacêutica Merck Sharp & Dohme, e a bivalente
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Cervarix® (HPVs 16 e18), da Glaxo Smith Klein. Ambas já foram aprovadas para uso, em mulheres de 9 a 26 anos, em diversos países, por agências de vigilância à saúde, como o FDA (Food and Drug Administration) americano e a ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) brasileira. Com o potencial de reduzir 70% dos casos de câncer de colo uterino e 90% das verrugas genitais, essas vacinas são produzidas a partir de partículas chamadas VLPs (Virus Like Particles), obtidas por técnicas de engenharia biomolecular e cuja estrutura tridimensional é semelhante à cápsula do vírus, fato que deflagra a resposta imunológica pretendida. Estudo recente com 27 mil mulheres de 33 países mostrou que a vacina quadrivalente é eficaz em prevenir 99% das infecções persistentes e lesões de alto grau causadas pelos HPVs 16 e 18, os subtipos mais cancerígenos. Pesquisa envolvendo 18.700 mulheres com idade entre 15 e 25 anos mostrou eficácia semelhante da vacina bivalente. A proteção mostrou-se eficaz por 4 a 5 anos após a aplicação de 3 doses (0, 2 e 6 meses) em mulheres que ainda não tinham iniciado a vida sexual, e os efeitos colaterais têm sido relatados em menos de 1% dos casos e incluem dor discreta no local da aplicação e febre baixa. Embora vários estudos tenham demonstrado eficácia e segurança, as vacinas contra o HPV não serão tão facilmente
incluídas no Calendário Oficial de Vacinação do Ministério da Saúde. “Elas têm um custo alto, o que dificulta o acesso universal”, diz a especialista em Doenças Infecciosas e Parasitárias, Tânia Mara Varejão Strabelli, da Universidade de São Paulo. De fato, uma única dose chega a custar U$S 140,00 junto aos fabricantes. No Brasil, clínicas particulares chegam a cobrar R$ 500,00 por uma única aplicação. Ainda assim, a procura tem aumentado progressivamente em clínicas e laboratórios desde seu lançamento, garante Strabelli. Além do custo, outras questões parecem acalorar os debates entre os especialistas. Em abril de 2007, o Grupo de Trabalho de Vacinas do Ministério da Saúde deu parecer contrário à incorporação das vacinas ao Programa Nacional de Imunização, alegando alto custo e ausência de informações consistentes, como a duração da imunidade conferida e a necessidade de vacinação de reforço. A proteção cruzada também tem sido discutida, já que as vacinas atuais parecem não conferir imunidade a outros subtipos de HPV: 30% dos casos de câncer de colo uterino podem estar relacionados aos HPVs 31, 33 e 58, não cobertos pelas vacinas. Além disso, uma campanha de vacinação relacionada a uma DST, direcionada a mulheres jovens e sexualmente inativas, pode ter pouca aceitação caso não venha acompanhada de muita informação sobre o HPV e sua relação com doenças graves. Parece inegável que tais tópicos tenham sido objetos de bastante discussão, não só nas esferas públicas, mas também em congressos e entidades especializadas. Em termos técnicos, as vacinas contra o HPV são seguras e eficazes e, portanto, necessárias. Do ponto de vista do contribuinte brasileiro, elas passam a ser um dever do Estado, já que este deve prover saúde a toda a população. Mas, da perspectiva do Ministério da Saúde, disponibilizar as vacinas na rede pública requer um cálculo preciso: custos de tratamento com lesões associadas ao HPV versus o custo em rede nacional. Tendo em vista a conduta atual do poder público, o segundo fator desta conta parece estar se sobressaindo, e, assim, novas pesquisas serão necessárias para diminuir o custo até que as vacinas sejam disponibilizadas na rede pública. Enquanto isso não acontece, milhares de mulheres brasileiras deverão, por conta própria, procurar proteção contra o vírus, por meio tanto das vacinas no setor privado quanto da adoção de práticas sexuais seguras.
Leandro Faustino Médico graduado pela Escola Paulista de Medicina (UNIFESP).
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PROFISSIONAIS DE DESTAQUE PROFISSIONAIS DE DESTAQUE
Perfil: Ademar Lopes
Dedicação e conhecimento fazem do cirurgião oncológico referência em sua área. Com mais de 30 anos de profissão, já participou de milhares de cirurgias, entre elas a do vice-presidente da República, José de Alencar
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cirurgião oncológico Ademar Lopes é um dos mais renomados no país e no mundo, devido à competência e à personalidade singular. Com mais de 30 anos de carreira, o profissional leva no currículo a experiência de cerca de oito mil cirurgias de médio e grande porte, realizadas no Hospital A. C. Camargo, situado na região central da cidade de São Paulo, entre elas, a operação do vice-presidente do Brasil, José de Alencar. Essa trajetória de sucesso é resultado de horas diárias de estudo e dedicação a uma das especialidades que mais crescem no Brasil, a Oncologia.
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Natural do Triângulo Mineiro, o cirurgião cresceu na propriedade rural dos pais, na cidade de Delfinópolis (MG). E foi neste cenário bucólico que Ademar Lopes decidiu a profissão que seguiria por toda a vida: “Felizmente, desde muito cedo, com sete anos de idade, eu já tinha certeza que seria cirurgião. Como era filho de agricultores, eu observava os animais sendo abatidos para fins alimentícios e achava os órgãos deles muito bonitos. Tive a certeza de que só poderia entender o funcionamento dos órgãos em um ser humano e interferir em possíveis erros, se estudasse medicina e fizesse cirurgia”.
PROFISSIONAIS DE DESTAQUE
O estudante de escolas públicas ingressou na Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Triângulo Mineiro, sem curso preparatório para o vestibular. Mas foi durante a graduação que o fascínio pela cirurgia oncológica veio à tona: “Eu tive alguns professores que eram cirurgiões oncológicos e operavam de forma muito mais cuidadosa e experiente do que os outros generalistas”. Em 1974, Ademar Lopes iniciou a residência médica no Hospital A. C. Camargo, em São Paulo. Instituição pioneira na formação de cirurgiões oncológicos, é responsável pela educação de um terço dos especialistas atuantes no país. O lugar onde o cirurgião cursou Cirurgia Geral e Oncologia é também onde ele atualmente realiza atendimentos e cirurgias e é diretor de cirurgia pélvica. “O A. C. Camargo é a minha casa. Opero aqui pela excelente estrutura tecnológica e pelo enfoque multidisciplinar para diagnóstico e tratamento do câncer, com nota ´A´ no exame da Capes por três anos consecutivos. A qualidade do local é extremamente importante para obter bons resultados de sobrevida e cura”. Segundo maior grupo de causa de morte no Brasil, o câncer só fica atrás das doenças cardiovasculares. Segundo o
Instituto Nacional de Câncer (Inca), estima-se que em 2010 haverá 375.420 novos casos, sendo a idade o maior fator de risco. Cerca de 10% dos cânceres são determinados por fatores hereditários. Os outros 90% dos casos são decorrentes da qualidade de vida. Porém, segundo Lopes, ele pode ser curado em até 90% dos casos: “A doença é perfeitamente curável, desde que seja feito diagnóstico precoce e tratamento correto”. A cirurgia ainda é a principal forma de tratamento do câncer, e o cirurgião tem um papel fundamental no tratamento. De acordo com Ademar Lopes, o médico que procura a Oncologia como especialidade deve gostar muito da área, dedicar-se para atingir boa habilidade técnica, além de ser um conhecedor profundo dos tipos de tumor e ter uma visão ampla da importância do enfoque multidisciplinar do diagnóstico e tratamento. Vários fatores fizeram do garoto simples do interior de Minas Gerais um dos cirurgiões mais consagrados do país. Além do constante estudo, Ademar Lopes destaca-se por sua preocupação com a saúde pública, pelo conhecimento profundo em cirurgia oncológica e pelo enfoque multidisciplinar dado ao diagnóstico e ao tratamento do câncer.
Prevenção - O preconceito é um dos fatores apontados por Ademar Lopes como prejudiciais à prevenção do câncer. Esse entrave seria eliminado com a divulgação de informações sobre o assunto, com a reestruturação do sistema de saúde e por meio de médicos preparados. Educação - A cada ano são formados cerca de 50 cirurgiões oncológicos, no Brasil, quantidade insuficiente para as 500 mil novas ocorrências anuais. A carência de profissionais treinados para combater a doença é também causada pela falta de incentivo das escolas médicas. “Cerca de seis instituições de ensino médico têm Oncologia como disciplina obrigatória na grade curricular. Creio que deveríamos quadruplicar a quantidade desses profissionais”, afirma o oncologista. Evolução da cirurgia oncológica no Brasil - O progresso da cirurgia oncológica nos últimos anos é bastante expressivo. Os tratamentos são menos agressivos, mas consequentemente se tornam mais complexos. Para a diminuição das mutilações são necessárias técnicas muito mais minuciosas. “Até a década de 1980, era feita, em mulheres com câncer, a linfadenectomia axilar, um procedimento bastante agressivo. Hoje esse método acontece somente em pacientes que tiverem linfonodos positivos, o que evita a ocorrência de edema e traz uma maior qualidade de vida”, explica o cirurgião. Outra evolução importante ocorre em caso de melanoma maligno, onde atualmente só é realizada a biópsia em casos de linfonodo sentinela positivo. Em outro exemplo está o tumor ósseo mais comum em crianças, o osteossarcoma, que, na década de 1980, era tratado mediante a amputação, e cerca de 85% dos pacientes morriam de metástase pulmonar. Hoje o resultado é invertido e até 70% dessas crianças são curadas, além de serem preservados os membros, por meio da associação de quimioterapia e cirurgia setorial. Da redação
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hospitais hospitais
Hospital de Câncer de Barretos é referência mundial Reconhecido por ter a maior rede de atendimento do SUS, torna-se campo fértil de aprendizado para residentes e especialistas
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o alto da cidade de Barretos, localizada a 424 km da cidade de São Paulo, situa-se o maior centro de atendimento oncológico e gratuito do Brasil. O Hospital de Câncer de Barretos tornou-se conhecido em todo o país e no mundo, não somente por ter a maior quantidade de atendimentos diários, mas também pela gestão única de humanização e prevenção. Milhares de paulistas, gaúchos, rondonienses, goianos e até estrangeiros procuram, diariamente, tratamentos, considerados os mais avançados na luta contra o câncer, e a dignidade, oferecida de forma singular pelo hospital. Além de ser a única instituição médica a permitir o acompanhamento em UTI (Unidade de Tratamento Intensivo) 24 horas, o hospital, que recebe cerca de três mil
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pessoas por dia, tem um déficit de cerca de aproximadamente R$ 5 milhões mensais e necessita da iniciativa da sociedade para continuar oferecendo os melhores métodos oncológicos. Ivete Sangalo, Xuxa, Chitãozinho e Xororó, João Paulo e Daniel e Sergio Reis são alguns dos nomes dos pavilhões, que homenageiam os artistas doadores e mantenedores da instituição. Fundado na década de 1960 pelo médico Paulo Prata, graduado pela Universidade de São Paulo, o HC de Barretos trouxe desenvolvimento humano para a região, como explica o filho do fundador, o gestor Henrique Prata: “Meu pai percebeu que 50% das pessoas enviadas para serem tratadas na capital tinham muita dificuldade e medo de viajar. Então, ele criou o primeiro hospital oncológico no interior do país. E para
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assegurar a humanização, ele desenvolveu essa gestão de respeito e dignidade que é impar hoje”. Alojamentos com refeitórios de alta qualidade, transporte para qualquer local da cidade e alimentação em todos os turnos são oferecidos diariamente em abundância para os pacientes e acompanhantes. Os 206 leitos e os 13 alojamentos têm capacidade para comportar 650 pessoas internadas. A prioridade de atendimento, pela manhã, é para os pacientes que moram numa distância maior de 200 quilômetros de Barretos. O período da tarde é para os residentes de menos de 200 km e à noite são tratados aqueles que vivem ou estão na cidade. Aparelhos, como o de ressonância magnética, de alto custo, difícil acesso e extrema importância para a Oncologia, podem ser encontrados no Hospital de Câncer de Barretos. Além de t odos os instrumentos cirúrgicos e clínicos necessários para proporcionar acompanhamento com a mais alta tecnologia médica, o hospital conta com 1.800 funcionários e chega a fazer até 600 radioterapias e 170 quimioterapias por dia. São feitos também, com frequência, cirurgias, transplantes de medula óssea, internações e cuidados paliativos. HUMANIZAÇÃO - No início de 2009, a comerciante goiana Sirlei Silva, 37 anos, descobriu que a filha de quatro anos tinha um tumor cerebral. Hoje, a pequena esbanja saúde e faz acompanhamento no Hospital de Barretos. “Iniciamos o tratamento no Hospital de Brasília, onde ela fez quimioterapia e a cirurgia e, então, nos encaminharam pra cá, pois é um dos poucos lugares que oferece radioterapia conformacional em crianças. Quando conheci o diferencial do HC de Barretos, não quis voltar para o DF. Pelo que conheço dos outros lugares, este é muito bom e nem vejo onde precisa melhorar, não só pelos equipamentos, mas pelo respeito e pela atenção que só encontro aqui”.
tratada aqui, quando tive suspeita de câncer no útero. Eles fizeram acompanhamento comigo por dois anos, realizaram exames repetidamente até que constataram que eu não tinha nada. Enquanto eles não têm a certeza, não te liberam. Meu sogro também foi tratado. Ele teve câncer nos rins e fez tratamento durante três anos. Só temos elogios às instalações, Iracema Guimarães elogia o à higiene e aos equipamentratamento recebido no hospital tos”. O lugar onde as pessoas são tratadas pelo nome e recebem atendimento totalmente personalizado é também um espaço de reflexão e de troca de experiências. E é este cenário que, todas as quintas-feiras, é transformado em palco para o grupo Princípio Ativo, uma iniciativa de jovens estudantes e de religiosos, que leva esperança, por meio de brincadeiras, para aqueles que muitas vezes só encontram solidão. “O nosso princípio ativo é o amor, nós fazemos aquilo que gostaríamos que fizessem por nós, se estivéssemos no mesmo lugar. Quando está doente, a pessoa fica muito carente e sozinha, então nós levamos conforto para elas”, conta a estudante de pedagogia, que já fez tratamento de câncer, Telma Lira Assunção, 33 anos.
Por meio de brincadeiras, grupo Princípio Ativo leva esperança e conforto aos pacientes
Radioterapia conformacional em crianças conduziu Sirlei Silva a Barretos
A taxista Iracema Aparecida de Freitas Guimarães, 42 anos, que diariamente realiza corridas para o Hospital, compartilha da própria experiência de ter sido tratada num dos maiores centros de referência oncológica mundial. “Já fui
Sonia Aparecida Michelan Palma, 49 anos, moradora da cidade de Paraíso, no interior de São Paulo, elogia o tratamento e a estrutura do Hospital. “Há um mês faço acompanhamento e o atendimento aqui é ótimo. Não existe diferença entre ricos e pobres. As instalações, a alimentação e os funcionários são maravilhosos, sem falar nos equipamentos de alta tecnologia e na possibilidade de ficar o tempo todo com um acompanhante”.
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Hospital é referência em tecnologia, tratamento de qualidade e humaninazação. Sua filosofia de atendimento personalizado garante credibilidade e reconhecimento
Um dos pontos diferenciais da instituição é o atendimento ao paciente, visando à qualidade de vida, humanização e medidas de diagnóstico precoce do câncer. “O ponto importante é responder perguntas ou situações clínicas dos pacientes e, a partir desse momento, procurar saídas que melhorem a qualidade de vida, humanizando o tratamento. Demonstrada efetividade e melhora de qualidade de vida e/ ou melhora no diagnóstico precoce do câncer, elevam-se as publicações institucionais. O novo passo será a criação do laboratório de biologia molecular. Sendo concluído e encontrando-se em fase de projetos e aquisição de equipamentos, elevará o número de publicações”, conta o mastologista René Aloisio da Costa Vieira.
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O médico residente em cirurgia oncológica José Vieira Barretos, 28 anos, mudou-se de Sergipe para a capital nacional do rodeio e afirma que a experiência no Hospital de Barretos é bastante positiva: “Escolhi vir para Barretos por ser um hospital com um número muito grande de investimento tecnológico, como, por exemplo, em próteses de esôfago, cirurgia por videolaparoscopia, entre outros. Nesses dois anos de residência, tive um aprendizado que não se pode comparar com os outros anos. O trabalho aqui tem hora pra começar, mas não para terminar”. GESTÃO - Apesar do reconhecimento internacional, o Hospital de Câncer de Barretos tem um déficit de cerca de R$ 5 milhões mensais: “Quanto mais o hospital recebe pa-
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cientes, maior é a nossa dívida. Atendemos todos os estados do país. Em 2009, foram 1.342 localidades brasileiras, além dos atendimentos a brasileiros que moram no exterior e são encaminhados para Barretos”, comenta o diretor de desenvolvimento e marketing, Luiz Antonio Zardini. Para isso, a captação de recursos deve ser multimídia e abrangente, o que inclui parcerias com hospitais internacionais dos EUA, da França e da Suécia. A primeira fonte de renda é a arrecadação em eventos, cerca de 232 shows por ano. Outras fontes são a assinatura da revista bimestral, os CDs, as subvenções de prefeituras, os cofrinhos e as doações feitas, no próprio hospital, por aqueles que desejam retribuir o carinho recebido. Segundo Prata, o segredo da gestão de humanização é a unificação dos setores: “Eu acredito que a única maneira de ter moral com a sociedade é mostrando que se pode tratar as pessoas por igual e pensando na instituição como um todo. É essencial que todos os departamentos tenham a mesma filosofia. Tudo só funciona tão bem porque a opção de gestão não é comum, por oferecer uma medicina multidisciplinar. Aqui todos os médicos recebem por igual e tudo está relacionado com uma filosofia do amor, assim conseguimos conquistar a sociedade e a credibilidade dos governos estadual, municipal e federal”. O caráter filantrópico da instituição demonstra a importância que as doações têm, visto que os recursos do SUS não aumentam: “A gestão de saúde deveria ser divida em três partes: governo, iniciativa social e gestões municipal e estadual. O gestor aqui é o Estado. Cinquenta por cento do déficit operacional do Hospital é pago pelo tesouro do estado de São Paulo. Existe uma pequena ajuda de alguns municípios (0,5%) e uma participação do Governo Federal, que complementa a tabela do SUS com cerca de 20% do nosso déficit. O restante é por conta da sociedade”, afirma Prata.
As doações podem ser feitas por meio de repasse do imposto de renda e também da nota fiscal paulista. Com o recolhimento de 2009, estão sendo construídos três laboratórios de biologia molecular. “Precisamos de empresários que invistam na prevenção. Só para colocar um mamógrafo em uma das carretas de prevenção, que percorrem o país, o gasto é de US$ 387 mil”, finaliza Prata.
Henrique Prata dá sequência ao trabalho de gestão humanitária e unificação dos setores, idealizado por seu pai na criação do hospital
Pacientes de todo o país são recebidos no Hospital de Câncer de Barretos
Serviço - doações podem ser feitas pelo site: www.hcancerbarretos.com.br ou pelos telefones (17) 3321-6612 e (11) 7809-2477. Da redação
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ACONTECE ACONTECE
A Medicina nos Tribunais Com pacientes mais conscientes dos seus direitos, crescem os processos contra médicos
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em todo resultado ruim constitui erro médico, mas, a ausência de definição acerca do termo “erro” assombra os médicos e instiga os pacientes sempre que algo não esperado ocorre durante um tratamento clínico ou procedimento cirúrgico. Dados divulgados pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) concedem uma ideia mais objetiva da importância do assunto: nos últimos seis anos, a quantidade de processos que discutem erros médicos aumentou 200%. Durante o ano de 2002, o STJ julgou 120 casos. No ano de 2009, até o final do mês de outubro, os casos já somavam 360. Cada vez mais os médicos deparam com uma realidade que pouco conhecem: a da responsabilização jurídica de sua própria prática profissional. O assunto é bastante atual, mas a falha na conduta existe há muito tempo. O primeiro documento histórico que trata do erro médico é o Código de Hamurabi (1770 a.C.). Tal declaração exigia expressamente a máxima atenção e perícia no exercício da profissão médica, cominando penas que variavam desde o ressarcimento do prejuízo até a amputação da mão de um cirurgião desafortunado, caso o paciente
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viesse a falecer. A Lex Aquilia, na Roma antiga, estipulava o exílio do médico imperito e, no início do século XIX, a Constituição Francesa já colocava o problema no Código Civil. Com a criação dos Conselhos Regionais de Medicina, em meados do século XX, a responsabilização do médico foi ampliada às esferas disciplinares, fundamentadas nos Códigos de Ética e de Processo Ético-Disciplinar. De fato, a análise da responsabilidade jurídica do médico é vista, pelos Tribunais, de forma específica, pois a função por ele exercida, nos dizeres de Geraldo Veloso França (em seu livro “Direito Médico”), mostra-se “transcendente e grave”, não devendo a medicina “ser comparada a nenhuma profissão, pois ninguém tem nas mãos, ao mesmo tempo, a vida e a honra das pessoas”. Atualmente, no Brasil, a responsabilidade do médico em razão de danos causados ao paciente deve ser analisada de acordo com o Código Penal, Civil, de Defesa do Consumidor e, ainda, sob o enfoque administrativo, conforme o Código de Ética Médica e o Código de Processo Ético-Disciplinar. Trata-se, portanto, de uma responsabilidade diferenciada.
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Ainda no âmbito da responsabilidade civil, o médico acusado de erro terá que responder não somente por danos materiais, mas também por danos morais, conforme expressa orientação inserida na Constituição Federal de 1988, além dos danos estéticos. Os danos materiais referem-se ao que o doente gastou no tratamento ineficaz e ao que deixou de receber por conta do erro médico, como, por exemplo, os dias de trabalho perdidos. O dano moral corresponde à violação do direito à dignidade e à imagem da vítima, assim como ao sofrimento, à aflição e à angústia a que foi submetida. O estético decorre da modificação da estrutura corporal do lesado, enfim, da deformidade a ele causada. Nota-se, também, a questão da possibilidade de cumulação de pedidos de indenização em razão de danos morais e estéticos sofridos em verbas separadas, entendimento hoje sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça. Sob o ponto de vista das sanções disciplinares, convém destacar alguns aspectos do Código de Ética Médica e do Código de Processo Ético-Disciplinar. Revisado e atualizado em setembro de 2009 pelo Conselho Federal de Medicina, o Código de Ética Médica, que entrou em vigor em 13 de abril de 2010, define que qualquer dano ao paciente, causado por ação ou omissão do médico, caracterizável como imperícia, imprudência ou negligência, é passível de punição ético-disciplinar. Após a denúncia, é instaurada uma sindicância (que apura a existência ou não de indícios de infração ética), que pode ou não seguir-se do julgamento propriamente dito. As decisões finais do Conselho podem ser advertências profissionais ou censura confidencial, as quais serão registradas no documento profissional do médico. As mais graves, todavia, consistem na censura pública, na suspensão do exercício profissional por até 30 dias ou até a cassação do registro necessário ao exercício da medicina. Em resposta ao aumento de demandas nos Tribunais envolvendo a relação médico-paciente e à ampliação da responsabilização do médico, verifica-se o fenômeno da “medicina defensiva”, praticada tanto pelos médicos - mediante solicitação de diversos exames, muitas vezes não tão necessários ao fechamento do diagnóstico – quanto por hospitais e clínicas – mediante declarações de ausência de responsabilidade. Tais práticas defensivas podem resguardar eventual responsabilização e não configuram infração disciplinar, uma vez que o Código de Ética Médica veda aos médicos “Deixar de usar todos os meios disponíveis de diagnóstico e tratamento, cientificamente reconhecidos e a seu alcance, em favor do paciente” (art. 32). Mas, por outro lado, não condiz com a prática médica ideal, fundamentada no conhecimento, no raciocínio clínico e na experiência do médico. Para o especialista em Bioética Reynaldo Ayer de Oliveira, coordenador da Câmara Técnica Interdisciplinar de Bioética do Conselho Regional de Medicina de São Paulo (CREMESP),
a chamada “medicina defensiva” não é uma solução viável para o aumento na quantidade de processos que discutem erros médicos. “Em primeiro lugar, é importante estabelecer uma boa relação médico-paciente; em segundo, o médico deve ser competente”, diz Ayer. Questionado sobre as razões desse fenômeno, Ayer acredita que a proliferação de escolas médicas pode estar relacionada ao aumento de processos. Na esfera jurídica, o aumento significativo das demandas parece estar relacionado à aplicação do Código de Defesa do Consumidor às causas que discutem erro médico: os pacientes se mostram cada vez mais integrados aos direitos que possuem na qualidade de consumidores, cobram resultados e se sentem mais à vontade para levar a discussão à Justiça. A relação, portanto, embora ainda pautada na confiança, passou a ter um espectro de consumo. Outro fator que certamente contribui são desenvolvimento da medicina e a disponibilização de diversos métodos para o tratamento dos enfermos, sem contar o acesso à informação acerca dos riscos envolvidos em determinados tratamentos. Importante salientar, também, que a omissão do Estado com relação ao seu dever constitucional de garantir a saúde, em especial no que diz respeito ao fornecimento de medicamentos, ocasionou um aumento significativo de demandas nas quais os cidadãos pleiteiam o resguardo ao seu direito fundamental à saúde, à dignidade humana e à vida. A consolidação da relação de consumo e o acesso a informação por parte da população parecem causas prováveis para o aumento na quantidade de processos que discutem falha médica, e, de fato, este fenômeno vem modificando a prática profissional de maneira inquestionável. Porém, a base da atividade do médico, desde os primórdios, sempre foi a confiança desenvolvida com o paciente, sem esquecer a consciência dos atos e escolhas entre os diversos tratamentos a seu alcance, buscando a competência e a conduta ética. Quando algum desses elementos é excluído da prática diária, os resultados de um tratamento podem ser comprometidos, instigando a discussão acerca do termo “erro médico”. Assim, qualquer solução que não seja fundamentada no conhecimento, na competência e na atitude ética do médico não só deixará de resolver o problema como promete incendiar as discussões, aumentando ainda mais o número de processos contra esse profissional. Laísa de Moura Advogada, especialista em Responsabilidade Civil pela Fundação Getúlio Vargas (GVLaw) e mestranda em Direito Civil pela PUC-SP. Leandro Faustino Médico graduado pela Escola Paulista de Medicina (UNIFESP).
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professora de Obstetrícia da Universidade de São Paulo, Roseli Nomura, concluiu a graduação em medicina em 1987, na mesma instituição onde leciona atualmente. Catorze anos mais tarde, ela iniciou o curso de direito na Universidade do Grande ABC, onde se tornou bacharel. Casos como o de Roseli, que buscou no estudo jurídico ferramentas para as vidas profissional e pessoal, são cada vez mais comuns, nas sociedades da informação, em que uma segunda graduação pode alavancar a carreira e ser um diferencial. Mas o estudo das leis vai além do âmbito acadêmico e traz ainda ensinamentos preciosos tanto para o médico como para o cidadão. O fato de adquirir informações sobre direitos e deveres é o motivo principal, apontado pelos médicos que ousaram desbravar este outro ramo do conhecimento, que exige dedicação e muitas horas de estudo. “O curso de direito oferece um aprendizado amplo em vários aspectos, culturais, sociais, filosóficos, políticos e outros. Quando iniciei a graduação em medicina, era nova e tive poucos ensinamentos relacionados às áreas de humanidades. Com o curso de direito, pude apri-
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morar minhas habilidades nessas áreas”, afirma Roseli, também especializada em direito médico. A relação entre medicina e direito é bastante estreita, visto que o médico é pautado em direitos e deveres, com o paciente e com a sociedade. “O mundo do direito está no nosso dia-a-dia, como cidadãos. Todo ato médico tem repercussão no mundo jurídico”, explica o médico legista e bacharel em direito, André Morrone. No entanto, não é possível afirmar que a medicina defensiva seja um fator que aumente o interesse dos médicos pela advocacia, mas o domínio do direito pode oferecer a eles maior compreensão das leis e, consequentemente, favorecê-los, em caso de possíveis demandas judiciais. Apesar das vantagens de obter as duas titulações, há uma grande exigência de dedicação para acompanhar as funções, como relatam aqueles que experimentaram o desafio de concluir uma graduação e manter os atendimentos médicos. “É difícil conciliar as atividades de médico com qualquer curso superior. O curso de direito exige muito tempo de leitura, e também a realização de estágios ou atividades de prática judiciária. Com certeza, para aqueles que gostam da área jurídica e que tenham interesse em mudar sua área de atuação profissional, o curso de direito é uma boa opção”, alerta Roseli. Entretanto, mesmo com desgaste e abdicação de horas de lazer, a experiência é apontada como positiva. “Sempre recomendo aos colegas que façam a faculdade de direito, principalmente para aqueles que exercem funções de gerenciamento ou perícia. Nessas áreas, é de fundamental importância o conhecimento jurídico com profundidade, pois o direito é um dos instrumentos de trabalho tanto para o perito quanto para o gestor”, relata Morrone. Da redação
mEDICINA E RELIGIÃO MEDICINA E RELIGIÃO
Rezar ajuda a resolver problemas de saúde? A
relação entre medicina e religião acompanha a hu manidade desde os primórdios. O debate se estende também à literatura médica, em que é possível encontrar trabalhos que evidenciam interferências favoráveis e desfavoráveis da religiosidade, durante tratamentos, e podem influenciar muito as decisões dos pacientes. No Brasil, há cerca de 140 grupos religiosos, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2000). Além desses grupos, devem ser consideradas as pessoas que não seguem nenhuma orientação religiosa, mas apresentam sua fé e confiam em suas orações. Para alguns psicólogos, crença, em especial nos momentos de doença, é encarada como um apoio, um fortalecimento espiritual que atenua incertezas, dores e conflitos. Para o professor de bioética da Universidade de São Paulo (USP) e conselheiro do Cremesp, Dr. Reinaldo Ayer, do ponto de vista da ética médica, deve ser levada em consideração a preservação da vida: “O médico, com toda a autonomia, propõe medidas terapêuticas a seus pacientes. A aceitação do tratamento depende de vários fatores, entre eles as crenças culturais e religiosas. Frente a isso, surge o processo de escolha. Porém, em casos de risco de vida, os procedimentos tradicionais deverão ser feitos”. O respeito ao culto religioso é preservado não só pela Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, como também pela Constituição Federal, de 1988. Para o vice-presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM), Carlos Vidal, “O médico tem que respeitar a autonomia do paciente até o ponto de risco iminente de morte. O profissional é obrigado a tratar se há de risco de morte, e nesse caso há instrumentos legais que o asseguram”.
No que diz respeito à literatura médica, existem indícios contraditórios sobre a evolução de pacientes enfermos e suas crenças. Em “Rezar Resolve”?, de Maass (2000), existe a tese de que orações podem ajudar a curar doentes. A obra relata que preces intercessoras dirigidas antes das intervenções, a pacientes que se submeteriam a angioplastias, trouxeram resultados positivos, fato que fortalece o elo entre medicina e religiosidade. Por outro lado, em Prolegomena to the Psychological Study of Religion de Beit-Hallahmi (2000), fica evidenciado que a religião contém fontes potenciais ao desenvolvimento de certas patologias. Por exemplo, as crenças fanáticas podem gerar problemas psicossociais. Observa-se que os benefícios da religiosidade no desenvolvimento da medicina dependem da crença de cada paciente. Ao médico, cabem o conhecimento das diversas manifestações e o devido respeito a cada uma delas. “Nenhuma crença é absurda, é uma questão cultural e deve ser percebida pelo médico”, afirma o Dr. Reinaldo Ayer. A questão de a fé influenciar positivamente os tratamentos é também defendida por outros médicos, que veem na crença uma possibilidade de melhor aceitação e resposta aos procedimentos terapêuticos. “A fé e a confiança dos pacientes são essenciais para atingir bons resultados durante os tratamentos. Com certeza, aqueles que acreditam ou têm uma religião podem se curar com maior facilidade do que aqueles que não creem”, conta Eugênio Ferreira, cirurgião geral e doutor em medicina pela USP. Da redação
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Residência Médica ou Resistência Diária? A excessiva carga horária, repleta de situações inesperadas e passíveis de estresse, pode causar desgastes físico e emocional
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edicação e perseverança são os pré-requisitos do curso de Residência Médica (RM). A especialização é considerada o padrão-ouro para a inclusão de novos médicos na profissão, por ser um treinamento prático com supervisão de profissionais mais experientes. Durante essa fase, o médico residente tem a oportunidade de praticar o conteúdo da graduação e de obter experiência, com reconhecimento mundial. Contudo, também neste período, é necessário abdicar de atividades e adiar planos, devido à grande exigência nos estudos e à escassez de tempo. Instituída no Brasil em 1977, a RM é reconhecida pelo Ministério da Educação como pós-graduação, em caráter lato sensu. Embora existam outros cursos de especialização, eles não oferecem ao profissional o mesmo reconhecimento que o título de RM. Esses outros cursos, semelhantes à residência, não permitem ao médico obter o registro de especialista juntamente aos Conselhos Regionais de Medicina (CRMs), tampouco acessar a pontuação em alguns concursos públicos. A duração do curso de RM depende da especialidade e pode ser de dois a cinco anos, como são os casos de acupuntura e neurocirurgia, respectivamente. A carga horária prevista na lei 6.932 é de 60 horas semanais, sendo incluídas 24 horas de plantão. Neste período, considerado de extrema importância para o crescimento profissional do médico, deve haver grande preparo físico e psicológico, além de persistência e muito estudo. Raquel Volpato Bedone, 25 anos, residente de Geriatria, acredita ser necessário maior empenho dos residentes de medicina do que de especialistas de outras áreas. “Há disciplinas que exigem mais, como pronto-socorro, e outras que são mais tranquilas, como enfermaria. Mas, sem dúvida, a residência é muito mais difícil do que especialidades de outras profissões. Tenho um irmão advogado e outro engenheiro e sei que eles se dedicam aos estudos com maior flexibilidade”.
Para Raquel Bedone, o empenho dos residentes é maior do que o de estudantes em outras áreas
Apesar de não ser obrigatória para o exercício da profissão, é durante a residência que o médico, recém-aprovado no internato, adquire mais segurança e experiência. A responsabilidade nessa etapa é maior do que na graduação, pois o profissional já tem registro no CRM e autonomia para prescrever, além de acompanhar o progresso dos pacientes. De acordo com a secretária executiva da Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM), Maria do Patrocínio Tenório Nunes, a
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rotina de um residente é variável. “O treinamento varia de acordo com o programa que ele cumpre. Mas o trabalho é prático, prestando serviço à população, sob supervisão. De 10 a 20% do tempo devem ser destinados à atividade de reflexão teórica, fundamental para o embasamento e a atualização de condutas e procedimentos, bem como de ética e bioética”. Além da responsabilidade de estudar e praticar a teoria durante a semana, os residentes, muitas vezes, precisam fazer horas extras de trabalho devido à demanda de serviço ou à necessidade de complementar a renda. “O valor da bolsaresidência, no Brasil, é muito baixo, e acabamos fazendo plantões em outros hospitais. Isso é o que é mais opressivo. Eu chego a fazer uma média de 100 horas de trabalho, por semana, para complementar o salário. Para mim, a residência é, sim, uma resistência”, conta a residente Luciana Bivanco de Lima. Viviane Coelho, residente de Cirurgia Plástica, acredita que, mesmo com as dificuldades encontradas na residência, ela é essencial à formação do médico. “É o momento de aprendermos na prática. Embora o internato já tenha essa função, precisamos adquirir responsabilidade sob o paciente e compromisso com os familiares. Saímos muito imaturos da faculdade e precisamos de vivência supervisionada. Em algumas especialidades, como a minha, principalmente por ser intervencionista, a residência é mais importante ainda”. PROCESSO SELETIVO - No Brasil, segundo a CNRM, estimam-se cerca de 27 mil vagas para RM nos programas regularmente credenciados e mais de 50 especialidades diferentes. Ou seja, a concorrência é sempre acirrada, pois o número de vagas ainda é insuficiente para atender a quantidade de candidatos. O ano de preparação para o processo seletivo também costuma ser estressante e rígido para aqueles que pretendem ingressar nessa etapa: horas excessivas de estudo, análise de provas anteriores, cursos extras e atividades complementares são rotinas comuns e exaustivas a todos eles.
FOTO MONTAGEM - RESIDENTE CANSADO
A fase de RM pode vir cercada de inseguranças e incertezas
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DESAFIOS - O volume de trabalho e a infraestrutura de atendimento à população são considerados alguns dos entraves do bom funcionamento da RM no país. “A desorganização dos serviços de saúde que sobrecarregam as instituições e comprometem com sobrecarga de horas de serviço, a inexistência de supervisão, ou a precariedade desta, são as grandes dificuldades enfrentadas pelo residente. Além da defasagem na estrutura, a diversidade socioeconômica muitas vezes interfere na adequada evolução clínica, tendo em vista que os problemas sociais antecedem e agravam as condições de saúde”, enfatiza Maria do Patrocínio. A rotina de mais de 60 horas semanais de dedicação à medicina compromete as horas para dedicar-se à vida pessoal, com prejuízos de desenvolvimento social e emocional. Contudo, Edison Ferreira de Paiva, professor-colaborador da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), acredita que o custo-benefício seja válido, mesmo em meio ao desgaste. “É difícil o residente ter uma vida além do trabalho. A profissão exige uma grande preparação, mas esta é uma fase extremamente produtiva da formação do médico. O aprendizado está relacionado com a rotina de ler muito e de ter contato com o paciente. Fazer uma boa faculdade e depois uma boa residência faz toda a diferença”.
Edison Paiva considera o desgaste do período de residência um fator válido diante do aprendizado dessa fase
PSICOLÓGICO - O treinamento na RM é considerado bastante estressante, pelos psicólogos, principalmente durante o primeiro ano. “É um período de imersão com muitas horas de trabalho acompanhadas de experiências assistenciais habitualmente complexas, e existe o constante contato com situações novas. É também um momento de construção da identidade pessoal e profissional com muitas dúvidas, inseguranças e incertezas. Como, para ingressar em bons programas, há um concorrido e disputado exame de seleção, com alguma frequência se observam residentes com altas expectativas sobre o treinamento experimentarem vivências de decepção, revolta, frustração e depressão; além disso, o ofício é lidar com dor, sofrimento e morte, o que pode produzir fadiga e depressão”, analisa o psiquiatra e coordenador do Núcleo de Assistência e Pesquisa em Residência Médica (NAPREME), da Universidade Federal de São Paulo, Luiz Antonio Nogueira Martins.
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Autor do livro Residência Médica – Estresse e Crescimento, Luiz Martins acredita que os residentes precisam se ouvir e ser ouvidos
Existem várias medidas, apontadas pelo NAPREME, que podem e devem ser implementadas para melhorar o treinamento na RM. São exemplos: garantia da supervisão diuturna; extinção do regime de 36 horas contínuas de trabalho; instituição da folga pós-plantão; adequação do número de residentes à carga assistencial; valorização da preceptoria/ criação de programas de tutoria; garantia institucional de suporte de corpo auxiliar e equipamentos para o trabalho assistencial; criação de programas de atenção à saúde e qualidade de vida dos residentes; criação de serviços de assistência psicológica e psiquiátrica aos residentes; realização pela Comissão de Residência Médica (COREME) de cada instituição de fóruns internos permanentes de avaliação dos programas de residência. A questão da carga horária ideal é um tema extensamente debatido e estudado. Estudos realizados nos Estados Unidos têm mostrado que, havendo a garantia da implantação de várias das medidas já citadas, a carga horária semanal ideal para assegurar a excelência na capacitação profissional seria de 80 horas; esse valor é uma cifra de referência, porque sabe-se que há variações quanto ao número de horas dedicadas nas várias especialidades, como a necessidade de um treinamento mais extenso e intenso nas especialidades cirúrgicas. Apesar de todo o período de dificuldade, horas de vigília e problemas de ordem estrutural, a RM no Brasil ainda é apontada como complementação da formação médica e considerada um instrumento procurado, em seleções anuais, por médicos recém-graduados em todo o país.
Residentes do Hospital Sírio-Libanês em uma das aulas do curso
O estudo supervisionado é fundamental para a aprendizagem e a formação do residente
Equipamentos de qualidade e boa estrutura garantem eficácia ao treinamento
DICAS - O primeiro ano de residência, em especial, tende a ser uma experiência muito desgastante. Os residentes devem, portanto, ser alertados sobre as dificuldades que encontrarão ao longo desse ano e estimulados a buscar ajuda junto aos preceptores, professores e coordenadores dos Programas. Cumpre salientar a importância de que os futuros residentes sejam conscientizados e orientados no sentido de controlar sua voracidade. Habitualmente, o não-controle pode levá-los a tentar aproveitar ao máximo o tempo se sobrecarregando ainda mais com aulas, cursos, plantões e outras atividades; essas ações podem ter um efeito deletério para a saúde física e mental do residente e comprometer o aproveitamento e o desempenho das atividades na residência. Tanto a natureza como a magnitude do estresse na RM têm sido amplamente estudadas na literatura internacional, destacando-se, em especial, sobretudo, o estresse psicológico. Aach e cols. (1988) descreveram o conjunto de estados ou fases psicológicas que um residente vive ao longo do primeiro ano de treinamento: - Estágio inicial de euforia e excitação, que está associado ao estado de tensão vivido em relação à expectativa de iniciar o treinamento e ao desafio de ser um profissional (duração: cerca de 1 mês).
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- Após esse estágio inicial, prossegue um período de insegurança, quando o treinando começa a vivenciar frustrações e perceber suas limitações (duração: mais ou menos 2 meses). - A seguir, há uma fase de depressão, que se mostra tanto mais intensa quanto mais atuam os seguintes fatores: sobrecarga de trabalho, privação do sono e falta de apoio emocional institucional e/ou social. - Em seguida, há um período de tédio. No período entre o quarto e o sexto mês de treinamento, o residente tende a experimentar um estado de quiescência, com estabilidade no exercício das atividades e um estado de tédio e desinteresse, realizando suas tarefas de uma forma automática. - A esse estado de tédio, segue-se uma outra fase de depressão. A rotina torna-se insuportável, e o trabalho parece sem fim. Essa fase tende a ser mais intensa que a fase depressiva anterior, atingindo seu ápice no oitavo mês. - Gradativamente, o residente começa a sair do estado de depressão, entrando em um período de elação, com o reconhecimento de conquistas e realizações. O estado de elação pode, eventualmente, conduzir a excesso de confiança.
- Fase de autoconfiança e competência profissional. Ao final do ano, o R1 vive uma fase de segurança, com sensação de competência profissional para tomar decisões quanto ao tratamento dos pacientes; sente-se em condições de ensinar e supervisionar os estudantes. Embora essa sequência de estágios ou fases seja observada na maioria dos residentes no primeiro ano do treinamento, uma ampla gama de sensações – positivas, gratificantes, negativas, frustrantes – acompanha todos os momentos do treinamento. De maneira geral, os sentimentos disfóricos atingem seu ápice em torno do oitavo mês do treinamento. A partir desse período, começa a prevalecer uma lenta e gradual sensação de autoconfiança e competência profissional. O segundo ano de residência tende a ser menos tumultuoso do que o primeiro e mais estressante do que o terceiro. A tendência deste último é ser mais estável e gratificante, quando a maioria das dificuldades adaptativas vinculadas ao treinamento estão resolvidas. Ao final do terceiro ano, os residentes expressam satisfação com a decisão de ser médico e se sentem profissionalmente competentes (Girard e cols., 1986; 1991).
Como contribuição para que o treinamento seja mais bem aproveitado, é apresentada a seguir uma relação de recomendações e medidas de natureza pessoal – os Dez Mandamentos do Residente – que podem servir de guia aos jovens iniciantes.
Os Dez Mandamentos do Residente (pela Escola Paulista de Medicina - UNIFESP)
I. II. III. IV. V. VI.
Aproveite este período da sua vida para aprender (a RM é a melhor forma de capacitação profissional em medicina); Exija supervisão diuturna (o treinamento em serviço sob supervisão é a chave do sucesso da RM); Faça uma lista diária das prioridades no trabalho (suprima tarefas importantes, mas não essenciais); Evite assumir outros compromissos profissionais; dedique-se somente à residência (em especial no R1); Lembre-se de que o R1 é o período mais difícil e estressante (não assuma plantões fora durante o R1!); Tenha claro que o treinamento é estressante e não sobrecarregue mais ainda a sua agenda (não dá para fazer tudo ao mesmo tempo; adie alguns projetos e planos); VII. Conheça os seus direitos e deveres; participe das atividades da COREME e da Associação de Médicos Residentes (diretamente ou por meio dos representantes eleitos); VIII. Converse com residentes mais experientes, preceptores e professores sobre problemas e dificuldades que você tenha; IX. Procure se alimentar de forma saudável e faça atividades físicas; X. Peça ajuda profissional se estiver se sentindo estressado, deprimido, angustiado (a UNIFESP tem um serviço de assistência psicológica e psiquiátrica aos residentes – NAPREME).
Da redação
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mERCADO DE TRABALHO MERCADO DE TRABALHO
Dermatologia: mercado em ascensão atrai mais candidatos à residência
A
especialidade é uma das mais procuradas e pode ser considerada uma área promissora para aqueles que desejam entrar no mercado em ascensão da estética. Por outro lado, o curso requer do profissional a mesma dedicação que qualquer outra especialização médica e representa alto custo para aqueles que pretendem montar o próprio consultório. O médico que optar por essa área deve também conhecer bem os desafios que os dermatologistas enfrentam no dia-a-dia da profissão. No Brasil, quando se fala em Dermatologia, a disputa por uma vaga para a residência médica, nos programas credenciados, é altamente acirrada. No processo de seleção para residência médica 2010 da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), por exemplo, foram 150 inscritos para seis vagas de bolsas de estudo, o que gerou uma relação candidato/bolsa de 25. “O número de vagas pra esta formação é limitado, nem todos que almejam a área conseguem”, comenta o dermatologista Luiz Fernando Paschoal, membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) e professor da Faculdade de Medicina do ABC, na Grande São Paulo. Para obter o título de dermatologista, o médico deve passar o primeiro ano da especialização na clínica médica e, então, iniciará estudos em pronto-socorro, Hematologia, Reumatologia, entre outras experiências. Nos segundo e terceiro anos, o residente terá um programa específico e disciplinas como dermatologia sanitária, micologia, dermatopatologia, imunologia, entre outras. No perfil deste profissional, vale lembrar a grande presença do sexo feminino, como define Paschoal. “Há cerca de 70% de mulheres nesta profissão. Elas são atraídas não somente pela flexibilidade de horário, mas também pela possibilidade de ganhos, devido à grande procura por tratamentos estéticos”, comenta. Segundo a SBD, aproximadamente 85% dos dermatologistas trabalham com convênios e coorporativas. Eles podem exercer a função em consultórios, em setores públicos ou privados. A atuação é bem diversificada, podendo ser em hospitais, consultórios particulares, clínicas de operadoras de saúde, entre outras.
De acordo com a dermatologista e esteticista Isabel Cristina Martinez, há maior divulgação na sociedade de assuntos relacionados à saúde da pele, o que gera uma procura por Dermatologia. Ela ainda alerta sobre a importância de ter afinidade com a área: “Hoje em dia, há um aumento de diagnóstico de doenças como câncer de pele, vitiligo e hanseníase. As pessoas procuram se cuidar mais e olhar para si. Mas vale lembrar que a Dermatologia não é uma especialidade fácil, o profissional tem que se aprofundar constantemente no assunto e por isso deve amar esta área”. Muito trabalho em consultório e, muitas vezes, a realização de procedimentos cirúrgicos, como biópsias e retiradas de nevos, fazem parte do dia-a-dia agitado do especialista. “Fazemos também os procedimentos avançados, como cirurgia de câncer de pele, e os estéticos, que incluem uso de toxina botulínica, laser, preenchimentos entre outros”, relata o dermatologista e professor-assistente da Universidade de Taubaté, Alexandre Zeni. No entanto, há casos de dermatologistas que aproveitam a flexibilidade nos horários da consulta para atender um número excessivo de pacientes e acabam fugindo das orientações da SBD. “Recomendam-se, para um bom atendimento dermatológico, consultas com duração de 15 a 30 minutos, o que atinge um total de 12 pacientes por período. Mas, muitos especialistas chegam a atender até 50 pessoas em quatro horas”, conta Paschoal. Além dos cursos oficiais de residência médica em Dermatologia, que oferecem uma especialização reconhecida, há uma proliferação de cursos menores de estética que muitas vezes não exigem prova para o ingresso e não têm a aprovação da Sociedade Brasileira de Dermatologia. Esse tipo de especialidade não segue padrõess de qualidade, o que resulta em especialistas mal preparados que concorrem com os especialistas da residência médica. Portanto, o médico que almeja ser um dermatologista deve atentar para a grade curricular e o reconhecimento do curso, ao escolher a especialidade que se tornou uma das mais procuradas no país. Da Redação
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ENTREVISTA ENTREVISTA
Médico sabe ser paciente? O Prof. Dr. Eugênio Américo Bueno Ferreira, premiado cirurgião geral e professor da Universidade de São Paulo, conta a experiência de estar do outro lado do conhecimento médico.
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xemplos de superação e confiança podem ser um grande estímulo a profissionais da área de saúde que já viveram histórias parecidas e a pacientes que, vez ou outra, fazem palpites durante os tratamentos médicos – atitude que pode atrapalhar a evolução das enfermidades. Em 2009, o doutor em Cirurgia Geral pela USP e atuante nos Hospitais das Clínicas e Sírio-Libanês enfrentou a maior batalha médica de sua vida, devido a uma grave isquemia do miocárdio, e foi submetido a uma cirurgia, área em que se especializou. Como o senhor se comportou ao descobrir a doença? Houve alguma intervenção de sua parte na decisão do tratamento? Em 2009 vivi uma situação muito marcante, quando fui submetido a uma revascularização por causa de uma isquemia miocárdica. Mas eu sempre agi como paciente. A vantagem é que pude confiar nos médicos que estavam me tratando. Eu procuro me colocar na posição de doente, e não na de médico. Esse é o conselho que dou: assumir a situação de paciente. A pior coisa é um médico, aflito, querer saber de tudo. Por que alguns médicos se recusam a aceitar os tratamentos quando estão na situação de pacientes? O médico não é isento de problemas de saúde. Alguns não deixam o título de fora quando recebem tratamento. Porém, acho que o principal é manter o equilíbrio emocional, procurar ser um paciente e ter paciência. Ficar doente é uma situação normal da vida e pode acontecer com qualquer pessoa. O senhor escolheu alguns procedimentos ou profissionais para atuar na cirurgia? Eu escolhi toda a equipe cirúrgica, o local da cirurgia foi o Hospital Sírio-Libanês, onde trabalho, e tive todo o apoio e solidariedade dos meus amigos.
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Como foi detectado o problema de saúde? Tive uma dor torácica e então procurei o pronto atendimento do Sírio-Libanês, onde foi verificada a isquemia do miocárdio. No dia seguinte, fui submetido a uma coronariografia através de cateterismo. Foram então revelados alguns pontos de dificuldade circulatória em razão de suboclusões das artérias. Dois dias depois, foi feita a cirurgia. Durante o pós-operatório, o senhor permaneceu paciente ou interferiu na recomendação médica? Como eu tinha total confiança e respeito pelos médicos que me atenderam, em nenhum momento tentei intervir. Tive um pós-operatório tranquilo, apenas com dores torácicas, fui pra casa, onde permaneci por duas semanas, e depois voltei às atividades normais. Quais fatores são atribuídos à sua recuperação? Além de ter recebido um tratamento excelente num ambiente exemplar, fui atendido por médicos e paramédicos de alto nível, tendo podido ser submetido a um tratamento bem elaborado. No período em que estive internado, fui um paciente internado em busca de um tratamento, como qualquer outro. A exposição a ambientes hospitalares facilita o aparecimento de doenças em médicos? Embora o médico viva em um ambiente de mais tensão, não está mais exposto às doenças, a não ser no contato com doenças infectocontagiosas, e mesmo nesses casos ele se previne. O contato com o meio hospitalar não constitui regra geral para o médico ter alguma doença. Existem outras profissões em que a presença do indivíduo em determinado meio também possibilita o acometimento de alguma doença. Da redação
GOOGLE MED GOOGLE MED
Atuação na web também deve ser pautada pela ética médica O
s benefícios das ferramentas da internet e das novas tecnologias são inquestionáveis, porém é fundamental que seja observada a orientação sugerida pelo Conselho Federal de Medicina para manter a ética médica também na web. Médicos como o pediatra nova-iorquino Jay Parkinson, conhecido como Dr. Future por utilizar as variadas possibilidades de comunicação para facilitar o atendimento, são cada vez mais comuns. Os cuidados para utilizar páginas pessoais devem ser os mesmos tomados nos consultórios. O profissional ainda precisa estar atento às particularidades do meio virtual. Segundo o Manual de Princípios Éticos para Sites de Medicina e Saúde na Internet, publicado pelo Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp) em 2001, a veiculação de informações, a oferta de serviços e a venda de produtos médicos na internet têm o potencial de promover a saúde, mas também podem causar danos aos internautas, usuários e consumidores. Por esse motivo, os responsáveis pela criação e manutenção dos sites de medicina devem oferecer conteúdo correto e respeitar as normas regulamentadoras do exercício ético profissional da medicina. Ainda de acordo com a cartilha, é obrigatória a identificação dos médicos que atuam na web, com nome e registro no CRM. A utilização da internet, por outro lado, para contatar e informar os pacientes, é considerada benéfica pela Associação Médica Brasileira (AMB), quando complementar ao contato pessoal. “Eu não vejo nenhum inconveniente no uso de sites, mas a comunicação presencial é essencial. Os meios de comunicação são ferramentas fundamentais para complementar o atendimento e contribuem para o exercício da boa medicina, como, por exemplo, quando uma mãe
contata o pediatra, pela internet, e pede orientação de medicamento para uma criança febril”, comenta o presidente da AMB, Dr. José Luiz Gomes do Amaral. De acordo com a AMB, os médicos que desejam possuir site próprio e queiram realizar divulgações devem procurar a Comissão de Divulgação de Assuntos Médicos (Codame), por meio dos Conselhos Regionais das jurisdições competentes. Os profissionais ou mantenedores das mídias precisam apresentar o layout e solicitar aprovação do Conselho. O Manual do Cremesp lembra que, se uma ação, omissão, conduta inadequada, imperícia, negligência ou imprudência de um médico, via internet, produzir dano à vida, o profissional responderá pela infração ética junto ao Conselho de Medicina. A AMB afirma também que tanto o paciente quanto o médico devem estar atentos às informações errôneas. “É sempre bom que o paciente obtenha conteúdo por diversas fontes. O problema é que nem todos são precisos, corretos; alguns apresentam distorções e desvios. O paciente deve saber escolher as fontes e tomar decisões equilibradas. Nada como procurar o médico e balancear as informações”, esclarece Gomes do Amaral. O Código de Ética Médica orienta, ainda, no Art. 114, que “consultar, diagnosticar ou prescrever por qualquer meio de comunicação de massa são vetados”. Como cada vez mais a internet ocupa lugar na vida das pessoas e na área médica, fica explícito que ela pode ser usada para auxiliar os atendimentos médicos. “Não há razões para não acrescentar informações através de ferramentas como webcam, mas não se pode substituir a comunicação corporal por esse meio”, enfatiza Amaral. Da redação MedAtual
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aLÉM DA MEDICINA ALÉM DA MEDICINA
Médicos artistas e esportistas dão exemplos de disposição e boa forma Desenvolvimento e conquista pessoal são alguns dos benefícios das práticas de outras atividades
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hematologista e doutora em transplante de medula óssea pela Escola Paulista de Medicina (UNIFESP), Fabiana Aidar, conciliou o curso de artes cênicas com a tese de doutorado. Já o ortopedista e tutor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), Daniel Dellaquila, foi pentacampeão do campeonato brasileiro de judô profis-
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sional, além de ter recebido diversas medalhas enquanto exercia a Ortopedia. Histórias como a desses profissionais revelam que é possível exercer outras atividades fora da medicina e organizar o tempo para manter um hobby e levar uma vida mais agradável. Por outro lado, os “supermédicos” alertam: o cansaço faz parte dessa maratona, apesar de a experiência ser imensamente compensatória.
ALÉM DA MEDICINA
A prática de uma atividade fora dos consultórios e hospitais é considerada também uma forma de aprendizado e de relaxamento. “Você fica com uma visão menos restrita, aprende a ver, de forma diferente, o dia-a-dia do médico e muda a maneira de encarar algumas coisas. Costumamos nos concentrar muito em doenças, medicamentos etc. Quando conseguimos incluir em nossa própria vida algumas visões diferentes, podemos ajudar o paciente”, relata Fabiana.
não fosse pelo teatro, ficaria cansativo por outros motivos, pois ocuparia o tempo com coisas diferentes”, justifica Fabiana. Ainda segundo a médica, a prática do teatro pode ser, por vezes, exaustiva, mas não é impeditiva, servindo, em algumas ocasiões, até como uma forma de descanso. O desenvolvimento pessoal, as superações física e mental são apontados como os principais benefícios por aqueles que experimentam se dedicar a outra profissão além da medicina. “O retorno econômico e a possibilidade de conhecer outras pessoas e países promove intenso intercâmbio cultural e também funciona como uma conquista pessoal. Em 2007, eu já era médico assistente da USP e, na presença de meus familiares e amigos, me sagrei campeão mundial master de judô, após vencer cinco adversários. Foi quando experimentei uma emoção que não sentia desde o início da minha carreira esportiva, quando ainda era criança”, afirma Dellaquila.
Vivências proporcionadas pelo teatro são utilizadas por Fabiana Aidar no atendimento aos pacientes
As vantagens de conciliar a prática de um esporte ou de uma atividade cultural são inúmeras. Elas podem ser percebidas tanto no humor como na aparência dos praticantes. “É possível ter mais resistência, diminuição do estresse e melhora na qualidade do sono. Além de o corpo ficar em forma, o sistema imunológico fica fortalecido”, explica a fisioterapeuta e especialista em Fisiologia do Exercício e Acupuntura, Luciana de Jesus. A disposição também é fator essencial para suprir as exigências profissionais e as do hobby. “Durante os dez anos nos quais estive na seleção brasileira de judô, treinávamos uma média de nove a 12 períodos por semana, sendo praticamente um treino físico de manhã ou na hora do almoço e outro à noite, totalizando aproximadamente quatro horas diárias”, conta Dellaquila, que acumula vitórias nos campeonatos sulamericanos, jogos panamericanos e mundiais. A rotina que faz parte da profissão dos médicos não exclui a possibilidade de estabelecer horários alternativos para a prática de atividades fora da medicina, como afirma a médica e atriz Fabiana. “Ao final do curso de teatro, montamos um grupo, sendo o diretor um dos professores. Esse grupo já existe há quase dois anos e já montou duas peças. Como todos os membros têm outras profissões, as reuniões e ensaios geralmente acontecem aos domingos”. O cansaço apontado pelos médicos que praticam outras atividades é compensado. “Às vezes é cansativo conciliar meu trabalho como médica e o teatro, que é meu hobby, mas se
Desenvolvimento e estímulo do indivíduo são benefícios apontados por Daniel Dellaquila na prática do judô
Disposição, prazer e incentivo da família foram decisivos na conquista do mundial master de judô
Da redação
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CASOS CLÍNICOS CASOS CLÍNICOS
Relato de um ferimento transfixante de mediastino e diafragma por projétil de arma de fogo
O
caso aqui apresentado é de um paciente do sexo masculino, de 30 anos, vítima de ferimento por arma de fogo em uma cidade do interior de São Paulo. Foi atendido inicialmente no pronto-socorro da cidade de origem, em serviço de caráter primário de atendimento, sendo prontamente transferido para o hospital terciário, referência da região. O paciente foi admitido no serviço de referência duas horas após o evento traumático e queixava-se apenas de discreta dor na região do tiro. Sua avaliação inicial foi realizada seguindo os algoritmos do Suporte Avançado de Vida no Trauma do Colégio Americano de Cirurgiões (ATLS®): A – Vias aéreas pérvias, trazido sem colar cervical
B – Murmúrio vesicular diminuído à esquerda, saturando 94% em ar ambiente C – Frequência cardíaca de 124bpm, pressão arterial de 130x80mmHg D – Escala de Coma de Glasgow 15, sem déficits motores, sem perda de consciência E – Orifício de entrada no 4º espaço intercostal esquerdo, na linha axilar anterior, sem orifício de saída O atendimento inicial também seguiu as prioridades propostas pelo ATLS®. O paciente recebeu oxigênio a 12L/ min em máscara facial e teve o tórax drenado à esquerda
Figura 1: A) Raio x de tórax pós-drenagem. Observar no hemitórax esquerdo a marcação com eletrodo cardíaco sobre o orifício de entrada e, no hipocôndrio direito, o projétil alojado; B) Tomografia de tórax evidenciando hemotórax à direita; C) Tomografia de tórax evidenciando, além do hemotórax à direita, lesão de parênquima pulmonar e derrame pericárdico; D) Tomografia de abdome evidenciando líquido livre peri-hepático, provável hemoperitônio
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CASOS CLÍNICOS
Figura 2: A) Lesão diafragmática; B) Lesão transfixante hepática; C) Lesão em ventrículo direito com sangramento ativo; D) Aspecto do coração após a sutura da lesão
com saída imediata de 400mL de sangue. Foram obtidos dois acessos venosos calibrosos para coleta de exames e tipagem sanguínea, e para expansão volêmica, inicialmente com cristaloides. O paciente foi ainda submetido à sondagem vesical de demora com saída de diurese clara. Após as medidas iniciais, foi realizado um raio x de tórax na incidência anteroposterior (Figura 1A). Com base no exame radiológico, constatou-se que o projétil havia cruzado o mediastino e, provavelmente, transfixado o diafragma. Com esse trajeto, as principais hipóteses diagnósticas foram lesão cardíaca e/ou de vasos da base, pulmão e árvore respiratória, esôfago e lesões intra-abdominais. Como o paciente permanecia estável hemodinamicamente durante todo o atendimento, sem queixas álgicas ou respiratórias, optou-se por investigar a presença dessas lesões por meio de exames complementares. O primeiro exame foi a endoscopia digestiva alta, pois o médico responsável pela análise encontrava-se no hospital avaliando outro paciente. O exame foi normal. Em seguida, o paciente foi encaminhado para realizar tomografia computadorizada de tórax e abdome (Figuras 1B, C e D). Ao término do exame tomográfico, o paciente começou a se queixar de dor torácica. Exame físico revelava abafamento e bulhas. Nesse momento, foi indicada cirurgia com hipótese diagnóstica de lesão cardíaca e perfuração do diafragma. A via de acesso inicial foi a laparotomia mediana. Realizada a janela pericárdica transdiafragmática que confirmou hemopericárdio. Optou-se então por esternotomia. Ainda
no inventário da cavidade abdominal, foi encontrada perfuração do diafragma à direita e lesão transfixante no fígado, já sem sinais de sangramento ativo (Figuras 2A e B). No tórax foi encontrada lesão de ventrículo direito que permanecera tamponada durante todo o transporte e atendimento. Foi realizada ráfia primária da lesão (Figuras 2C e D). O paciente fez todo o seu pós-operatório em enfermaria. Evoluiu sem intercorrências e teve alta em ótimo estado geral no quinto dia após a cirurgia. Esse caso aconteceu em maio de 2005, e o paciente fez acompanhamento ambulatorial por mais um ano, até receber alta para continuar o seguimento na cidade de origem. Referências yy Colégio Americano de Cirurgiões. Suporte Avançado de Vida no Trauma (ATLS®). 8ª edição. 2009. yy Bertolli E; Figueira O; Sato CFM; Palma DP; Martins II A; Barakat M; Oliveira Jr S; Rodrigues JMS. Lesão Cardíaca em Ferimento Transfixante de Mediastino por Projétil de Arma de Fogo – Anais do VII Congresso da SBAIT, 2006.
Eduardo Bertolli Cirurgião pela PUC-SP e Cirurgião Oncológico pelo Hospital do Câncer A. C. Camargo.
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VERDADES E MITOS VERDADES E MITOS
1 - Cirurgia de miopia antecipa presbiopia
6 - Uso de celular causa câncer no cérebro
Mito. A presbiopia (dificuldade para enxergar de perto) surge, na maioria das pessoas, a partir dos 40 anos. Grande parte dos pacientes míopes não desenvolve presbiopia, mas esse fato não significa que a cirurgia antecipe a deficiência de ver os detalhes a pequenas distâncias.
Mito. Que os telefones celulares emitem radiação capaz
Dr. Daniel Nogueira - Oftalmologista
2 - Desodorante aerossol causa câncer de pulmão Mito. O câncer de pulmão está diretamente relacionado às variadas formas de tabagismo e à exposição à poluição atmosférica e ao histórico familiar. Não há estudos concretos que indiquem que os desodorantes são fatores causadores da doença. Dra. Maria Del Pilar Estevez - Oncologista
de agitar as moléculas e causar um aquecimento no local todos já ouviram falar ou sentiram na própria pele, mas daí ser causador de câncer cerebral é um exagero popular. Cientistas ainda se contradizem sobre os efeitos dos celulares, mas não existe nenhuma comprovação científica de que é prejudicial à saúde humana. A única comprovação dos efeitos da radiação eletromagnética que está na faixa de micro-ondas é o aquecimento de corpos que contêm molécula de água, o que é feito em fornos de micro-ondas. A diferença é que, no caso de celulares, a intensidade é baixíssima, ao passo que, no forno, é altíssima. Dra. Emico Okuno - Física
7 - Criança que começa a ter a saída dos dentes tem diarreia
3 - Quanto mais a criança dorme, mais ela Verdade. Pesquisas mostram que existe a liberação de vácresce rias citocinas (mediadores inflamatórios) durante a erupção Verdade. O sono (especialmente nas fases mais profun- dentária que podem causar diarreia. das, sono REM) leva à liberação de hormônio do crescimento, conduzindo a um maior estímulo ao crescimento. Dr. Marcos Laercio Pontes Reis - Hematologista
4 - É proibido subir escada no pós-operatório
Mito. No pós-operatório de cirurgias abdominais, não é recomendado que a pessoa execute esforços físicos que possam comprometer a integrida de da cicatrização, da incisão operatória, por romper os fios de sutura. Os esforços devem ser evitados até que os tecidos estejam cicatrizados com recuperação de sua resistência e elasticidade, o que se apresenta, aproximadamente, após o terceiro mês de cirurgia. Dra. Márcia Araújo - Ginecologista e Mastologista
5 - Bronzeamento artificial causa câncer de pele Verdade. Que o bronzeamento artificial causa melanoma não há mais dúvida. Um estudo do IARC feito em conjunto com vários centros europeus mostrou que uma única sessão aumenta em 15% a chance de melanoma. Realizado antes dos 30 anos, o aumento é de 50%. A incidência de melanoma na população geral é baixa, cerca de cinco por 100 mil pessoas. Dr. João Pedreira Duprat Neto - Oncologista
Dr. Marcos Laercio Pontes Reis - Hematologista
8 - Não se pode tingir o cabelo quando se tem câncer de mama
Mito. O tingimento dos cabelos não tem relação com o câncer de mama. A doença surge por fatores como histórico familiar, menarca precoce, menopausa tardia, terapia de reposição hormonal, estresse e sobrepeso. Ações externas não podem aumentar as chances de obter câncer de mama. Dra. Márcia Araújo - Ginecologista e Mastologista
9 - A exposição aos raios UV acontece em ambientes fechados Mito. A luz possui raios ultravioleta, mas em locais isolados a quantidade é muito pequena e incapaz de prejudicar a saúde. Desde que não seja uma luz direta na pele, não há risco. O risco acontece em caso de estar embaixo de guardasol comum, pois a radiação atravessa o tecido. Toldos claros são melhores porque refletem a luz, já os coloridos a absorvem. Por isso, já é possível encontrar chapéus, roupas e acessórios resistentes aos raios UV. Dr. Luiz Henrique Pascoal - Dermatologista
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fotos e eventos fotos e eventos Veja as fotos dos eventos que marcaram o meio acadêmico no primeiro semestre de 2010.
Atendimento Gratuito - ITPAC
Dia Internacional do Rim - Araguaiana-TO
Jornada Acadêmica
(UNIGRANRIO) - Rio de Janeiro-RJ
Churrasco dos Calouros
(FEPAR Evangélica) - Curitiba-PR
Churrasco dos Calouros
Medicina Federal (UFPR) - Curitiba-PR
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fotos e eventos
Ambulatório Social - Hospital Santa Casa (FMSCSP - Santa Casa) - São Paulo-SP
Macarronada - Santa Cecília
(FMSCSP - Santa Casa) - São Paulo-SP
Pedágio Saudável
(FMSCSP - Santa Casa) - São Paulo-SP
Plantação de Árvores
(FMSCSP - Santa Casa) - São Paulo-SP
Envie as fotos e um resumo do seu evento para medatual@medatual.com.br. O próximo evento publicado pode ser o seu! Fotos: Edson Pedroza dos Santos Júnior, Felipe Rosa da Silva, Joberto de Andrade Silva, Yasmim Cavalcante
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CRÔNICA CRÔNICA
A obturação
Q
uando você se submete a ser plantonista em um prontosocorro, necessariamente você se perguntará inúmeras vezes: o que é que estou fazendo aqui? A quantidade de pessoas que se deslocam de suas casas para ir ao hospital sem um motivo realmente digno é impressionante. Gosto de imaginar as horas que antecedem a chegada de determinados pacientes, ainda no aconchego de seus lares: - (Marido, às 11 horas da noite) Meu amor, se apronte, temos que ir ao pronto-socorro! - O que houve, querido? - Acabo de ter um episódio de evacuação pastosa! Precisamos ir para que eu possa saber o que está ocorrendo! - É, minha vida, realmente deve ser grave! Imagine se todas as pessoas, ao perceberem que as fezes amoleceram, resolvessem ir ao hospital no primeiro (e muitas vezes único) episódio evacuatório! Não haveria pronto-socorro que chegasse no mundo. Porém, no exemplo acima (verídico, diga-se de passagem), ainda apresentava uma queixa orgânica. O caso que relatarei agora é interessante, tanto pela queixa principal, quanto pelo método investigatório utilizado pelo paciente em questão. Eu trabalhava em um hospital privado altamente conceituado na cidade de São Paulo, local de atendimento apenas para pacientes de alto poder aquisitivo, que possuem excelentes con vênios ou que têm capital suficiente para arcar com uma consulta particular. Nesse ínterim, estava eu de plantão em um sábado à tarde, quando me deparei com a seguinte ficha de atendimento: * Carlos Afonso, 60 anos, PARTICULAR * Chamei o paciente no consultório. Adentrou um senhor de quase 1,90m, grisalho, perfumado, trajando camisa da Lacoste, voz grave e bem empostada, como a de um comentarista de finanças do Jornal da Globo. Iniciamos o diálogo: - Boa tarde, seu Carlos. Tudo bom com o senhor? - Boa tarde, Dr. Bomfim. É um prazer conhecê-lo. - O que traz o senhor aqui? Iniciou-se então um dos diálogos mais bizarros que eu já participei: - Doutor, é o seguinte: engoli a minha obturação. Isso já faz cinco dias. O problema é que ela não sai, e eu quero saber onde ela está! - Mas o seu intestino parou de funcionar? - Não doutor, evacuo duas vezes ao dia fezes bem formadas, em quantidade mediana, de consistência normal (juro que a descrição do bolo fecal foi elaborada com tal riqueza de detalhes!). É nessas horas que é melhor não ser curioso, mas isso não combina com a profissão.
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- Mas seu Carlos, como o senhor sabe que a obturação ainda não saiu? - Muito simples: desde que eu engoli a obturação, comecei a evacuar no chuveiro. Aí eu deixo a água morna cair nas fezes, e as desfaço com os pés, com todo o cuidado. Não deixei passar nada, e tenho certeza de que ela não saiu. Então quero fazer o exame mais sofisticado que for necessário, porque eu quero a obturação de volta! - Mas homem, essa obturação com certeza não vai trazer problemas ao senhor! Pra que tanta mão de obra? - É porque ela é muito cara, e eu quero colocá-la de volta. - Como assim, de volta no dente? - nessa hora eu devo ter feito uma cara de nojo muito evidente, pois ele indagou: - Que cara é essa, doutor, por que eu teria nojo? Isso sai do meu corpo, que tipo de preconceito é esse? Nessa hora preferi não comentar que não me relaciono tão bem assim com os meus dejetos. Preferi apenas solicitar um raio x de tórax e de abdome. Realizadas as radiografias, o veredicto – nem sinal de obturação. Mostrei os exames para o paciente, que desconfiado me indagou: - Muito bem, vamos fazer uma tomografia então? - Meu caro – respondi – o dinheiro é seu e você faz dele o que bem entender, mas não posso concordar com isso! A distância entre os cortes de uma tomografia é de 7mm, e a sua obturação não deve ter nem 5mm. É praticamente impossível achar esse troço, além de inútil, pois ninguém vai abrir o senhor atrás de uma obturação, a não ser que ela cause alguma complicação! - Então o senhor me garante que ela não está mais dentro de mim? - Garanto que ela não é visível nos raios x realizados, e possivelmente já foi expelida! - Pois bem – respondeu visivelmente contrariado – vou continuar procurando em casa. Se eu encontrá-la meus advogados entrarão em contato com o senhor. Passar bem – virou as costas e foi embora. Não sei por quanto tempo seu Carlos Afonso permaneceu com seu estranho ritual de tamisar fezes durante o banho atrás de um reparo de dente. Sei apenas que até hoje não fui acionado judicialmente para prestar esclarecimentos. Só rezo até hoje para que ele não resolva colocar um piercing de diamante em algum dente.
Antonio Bomfim Marçal Avertano Rocha Cirurgião Oncológico do Hospital Saúde da Mulher – Belém, PA.