Extensivo Aplicado Volume 1
AUTORES
Felipe Augusto de Oliveira Souza Graduado em medicina pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Especialista em Clínica Médica, Cardiologia Clínica e Arritmia Clínica e Invasiva e mestre em Ciências da Saúde pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP).
Kelly Roveran Genga Graduada pela Faculdade de Medicina do ABC (FMABC). Especialista em Clínica Médica pela Casa de Saúde Santa Marcelina, em Hematologia pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) e em Terapia Intensiva pelo Hospital do Servidor Público Estadual (HSPE).
Fabrício Martins Valois Graduado em medicina pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Especialista em Clínica Médica no Conjunto Hospitalar do Mandaqui. Especialista em Pneumologia e Doutorando em Pneumologia pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), onde é pneumologista do Grupo de Transplante Pulmonar. Professor da disciplina de Semiologia da UFMA.
Ana Cristina Martins Del Santo Graduada pela Faculdade de Medicina de Alfenas. Especialista em Clínica Médica pela Faculdade de Medicina de Jundiaí (FMJ) e em Nefrologia pela Real e Benemérita Sociedade de Beneficência Portuguesa de São Paulo. Mestre em Nefrologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Médica do corpo clínico dos Hospitais A. C. Camargo e São Camilo. Médica nefrologista do Hospital São Luiz.
APRESENTAÇÃO
Sabe-se que o estudante de Medicina que opta pela especialização tem enfrentado, a cada ano, maior dificuldade no ingresso em um programa de Residência Médica de qualidade. Também é notável que a garantia de êxito desse desafio depende, quase exclusivamente, de um material direcionado e que traga segurança ao candidato. E essa garantia se reforça apenas quando o estudo conta com um apoio didático ainda mais objetivo e de maior complexidade. A Coleção Extensivo Aplicado foi idealizada justamente para preencher essa lacuna. Os casos abordados retratam situações reais, estimulando assim o raciocínio e habilidades em anamnese e condutas. Os 7 livros da coleção são compostos por casos clínicos das 5 áreas básicas da Medicina. Ou seja, são dirigidos tanto a formados quanto a recém-formados que visem ao aprimoramento constante e ao sucesso no processo seletivo e na especialidade desejada.
Direção Medcel A medicina evoluiu, sua preparação para residência médica também.
ÍNDICE
Casos Clínicos - Cardiologia Respostas - Cardiologia
17 39
Casos Clínicos - Medicina Intensiva Respostas - Medicina Intensiva
57 87
Casos Clínicos - Pneumologia Respostas - Pneumologia
113 132
Casos Clínicos - Nefrologia Respostas - Nefrologia
145 170
Cardiologia
Cardiologia
Cardiologia
1.
Um paciente de 48 anos consultou o cardiologista para fazer um checkup, apresenta-se assintomático e nega Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) e diabetes mellitus. É ex-tabagista e, ao exame físico, apresenta peso = 82kg, altura = 1,90m e PA = 134x78mmHg. Eletrocardiograma normal (Figura). Foram solicitados exames para a estratificação de risco, com os seguintes resultados: teste ergométrico negativo para isquemia, colesterol LDL = 180mg/dL, colesterol HDL = 48mg/dL, triglicerídeos = 552mg/dL e glicemia de jejum = 102mg/dL.
a) Qual o diagnóstico e a conduta inicial para o paciente?
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Extensivo aplicado Caso 6 a) Pelo eletrocardiograma, verifica-se um ritmo de Fibrilação Atrial (FA) com alta resposta ventricular. A FA é uma arritmia originada por mecanismos de reentrada atrial, em que estímulos provenientes de uma única extrassístole podem gerar vários pequenos circuitos. As alterações eletrocardiográficas presentes podem ser frequência atrial >350bpm, batimentos irregulares, presença de onda f (linha de base irregular), ausência de onda P visível, intervalos R-R irregulares. Pode ocorrer aberrância ventricular, com QRS alargado, quando a frequência ventricular está elevada (>140bpm). b) Síndrome do “holiday heart” ou coração do fim de semana. Caracteriza-se por um período agudo de libação alcoólica associado ao desenvolvimento de taquiarritmias supraventriculares, geralmente fibrilação atrial, entre indivíduos com coração estruturalmente normal e ausência de outras comorbidades. Os pacientes podem apresentar diversos sintomas, sendo as palpitações taquicárdicas o mais comum. Outros como dispneia, lipotimia ou até mesmo síncope, pela alta resposta ventricular, podem estar relacionados ao quadro clínico. c) Devido às alterações agudas e tóxicas causadas pelo álcool no tecido cardíaco serem transitórias, o quadro clínico geralmente é autolimitado, e a reversão espontânea se faz dentro das primeiras 24 horas. O tratamento pauta-se nos seguintes aspectos: - Abstinência do álcool; - Controle da frequência ventricular na sala de emergência ou unidade de terapia intensiva: uso de betabloqueadores (exemplo: esmolol, atenolol, metoprolol) ou de antagonistas de canais de cálcio (exemplo: verapamil ou diltiazem); - O uso de antiarrítmicos não está indicado nesta fase; - Caso a duração da FA se aproxime de 24 a 48 horas e/ou apresente algum critério de instabilidade hemodinâmica, a cardioversão elétrica sincronizada deve ser realizada; - Caso o episódio de FA persista por mais de 48 horas, a anticoagulação oral deve ser considerada; - Entre os pacientes jovens sem evidência de doença cardíaca estrutural, não é necessário seguimento específico decorrente da fibrilação atrial; - O aconselhamento para a cessação do álcool, bem como o acompanhamento especializado, deve ser proposto ao paciente.
Caso 7 a) As medidas iniciais que devem ser realizadas neste paciente são: - Monitorização cardíaca e oximetria de pulso; - Oxigênio por cânula nasal; - Acesso venoso periférico. b) Ritmo regular com complexos QRS largos, frequência cardíaca em torno de 200bpm, onda R pura em V1 complexos QS em V5 e V6 e eixo cardíaco entre -90° e -180°, que sugerem o diagnóstico de taquicardia ventricular monomórfica sustentada.
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Medicina Intensiva
Extensivo aplicado
2.
Um paciente de 30 anos deu entrada no pronto-socorro referindo início, há 5 dias, de desconforto respiratório progressivo, febre não aferida e tosse seca. Referia ser HIV positivo, nunca tendo feito qualquer acompanhamento médico, e também negava uso de drogas ilícitas, fazendo uso regular apenas de polivitamínicos. Ao exame: REG, taquidispneico (FR = 32irpm), com tiragem intercostal e uso de musculatura acessória, cianose labial e ungueal, FC = 120bpm, Tax = 37,8°C, PA = 100x60mmHg; ausculta pulmonar revelou estertores nos 2 terços inferiores bilateralmente, enquanto a ausculta cardíaca se mostrou normal. Foram solicitados exames laboratoriais, incluindo gasometria arterial e radiografia de tórax em PA:
Hb = 11,2g/dL, Ht = 32%, L = 4.500/mm3 (segm. = 75%; linfócitos = 10%; monócitos = 10%), plaquetas = 150.000/mm3, ureia = 38mg/dL, creatinina = 0,8mg/dL, sódio = 142mEq/L, potássio = 4,3mEq/L, pH = 7,50, paO2 = 54mmHg, paCO2 = 21mmHg, HCO3 = 22mEq/L e SatO2 = 86% (colhida em ar ambiente, ou seja, com fração inspiratória de O2 = 21%). a) O paciente preenche critérios para insuficiência respiratória aguda?
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RESPOSTAS
a) O diagnóstico é de tromboembolismo pulmonar (TEP). A tomografia descrita corresponde, na verdade, a um corte coronal de uma angiotomografia de tórax que evidencia claramente trombos nas artérias pulmonares bilateralmente, mais evidentes à direita (observar a Figura). É importante ressaltar que a paciente está no pós-operatório de cirurgia ortopédica, que aumenta o risco de tromboembolismo venoso em 5 a 20 vezes. Além disso, a ocorrência de TEP pode resultar em disfunção aguda de câmaras direitas, explicando, dessa forma, o achado de turgência jugular; de modo semelhante, a ocorrência de hipertensão pulmonar decorrente do próprio TEP pode resultar em desdobramento fixo da 2ª bulha.
b) Apesar de possível, é incomum TEP com valores gasométricos (paO2, paCO2 e gradiente alveoloarterial) inteiramente normais. Ou seja, em pacientes com TEP é comum o achado de alcalose respiratória com hipoxemia, configurando uma forma de insuficiência respiratória hipoxêmica (efeito espaço-morto). O gradiente alveoloarterial, em vista do desequilíbrio da relação V/Q, encontra-se tipicamente alargado. c) Os achados à radiografia de tórax raramente são conclusivos para o diagnóstico de TEP aguda, sendo mais importantes para o diagnóstico diferencial e para a avaliação da cintilografia de perfusão. Podem ser normais e, na presença de dispneia de causa não definida, reforçam a suspeita de TEP aguda. Os achados mais comuns são atelectasias laminares nas bases, elevação da cúpula diafragmática e derrame pleural, geralmente pequeno. Podem-se observar sinais clássicos de oligoemia regional, aumento das artérias pulmonares centrais e opacidade periférica em cunha (cunha de Hampton).
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MEDICINA INTENSIVA
Caso 1
Pneumologia
7.
PNEUMOLOGIA
Um paciente de 52 anos procura auxílio médico por queixa de tosse há cerca de 4 meses. Refere que a tosse é produtiva, com expectoração mucoide, e eventualmente há chiado no peito. Os sintomas são mais proeminentes no período vespertino. Sem dispneia. Sem queixas nasais ou dispépticas. Não tem antecedente de atopia. Tem antecedente de tuberculose pulmonar tratada há cerca de 6 anos. Nunca fumou. Antes desempregado, trabalha há cerca de 6 meses em uma oficina para automóveis. Sem exposição a pássaros ou mofo. Ao exame físico, apresenta-se em bom estado geral, sem cianose. Inexistem estigmas patológicos ao exame cardiopulmonar. Trouxe consigo uma radiografia de tórax.
a) Qual é a sua interpretação da radiografia de tórax?
b) Qual é a sua hipótese diagnóstica? Necessita de algum dado complementar na história clínica?
125
Caso 3 a) A principal hipótese é Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC). O paciente apresenta dispneia progressiva aos esforços, associada à presença do principal fator de risco para DPOC, o tabagismo. A possibilidade de asma brônquica é remota pela ausência de atopia e do caráter episódico dos sintomas. Doenças intersticiais teriam a ausculta pulmonar mais exuberante, embora não seja possível afastá-las com o exame clínico apenas. O tempo prolongado de evolução é contrário às possibilidades de neoplasia e doença infecciosa. b) A radiografia de tórax está normal. Em um paciente com DPOC, uma radiografia normal não modifica o raciocínio diagnóstico, principalmente em fases menos avançadas da doença. Sinais que poderiam estar presentes seriam os indicativos de hiperinsuflação: - Retificação de cúpulas diafragmáticas; - Visualização de mais de 7 arcos costais anteriores por completo; - Estreitamento da área cardíaca (<11,5cm); - Aumento do espaço retroesternal (>4,4cm).
d) A espirometria demonstra distúrbio ventilatório obstrutivo moderado, sem resposta ao broncodilatador. O distúrbio ventilatório obstrutivo é definido pela presença da relação VEF1/CVF inferior a 0,7; a presença de resposta ao broncodilatador necessita de variação de mais de 200mL do VEF1 ou mais que 7% de modificação percentual. O paciente apresentou aumento de 120mL e 4%. A espirometria, juntamente com o quadro clínico, corrobora a hipótese de DPOC. Com base em orientações consensuais, o melhor VEF1 deve ser utilizado como parâmetro para estimar a gravidade. Sendo assim, o paciente deve ser considerado portador de DPOC grau II. GOLD, 2004
Espirometria
Característica adicional
I - Leve
VEF1/CVF <0,7 e VEF1 ≥80%
--
II - Moderado
VEF1/CVF 0,7 e 50% ≤VEF1 ≤80%
--
III - Grave
VEF1/CVF 0,7 e 30% ≤VEF1 ≤50%
Dispneia MRC 2 ou 3 ou hipoxemia (pO2<60mmHg)
IV - Muito grave
VEF1/CVF 0,7. VEF1 <30% ou um VEF1 <50% + falência
Dispneia MRC 4, cor pulmonale ou hipercapnia (pCO2> 50mmHg)
e) As medidas terapêuticas envolvem tanto medidas medicamentosas quanto não farmacológicas. Medidas não farmacológicas: reabilitação pulmonar, cessação do tabagismo e vacinação anti-influenza e antipneumocócica. A saturação normal demonstra a ausência de necessidade de oxigenoterapia domiciliar no momento.
135
PNEUMOLOGIA
c) A espirometria é o exame fundamental para o diagnóstico de DPOC. Ademais, é útil para estimar a gravidade da doença.
Nefrologia
e) Haja vista as alterações laboratoriais, quais medidas você tomaria?
7. Considere uma paciente de 25 anos, branca, casada, natural e procedente de São Paulo. Pro-
cura o pronto-socorro com quadro de astenia, fadiga generalizada, edema generalizado, urina espumosa há 2 meses, com piora há 2 dias. Refere artralgias nas mãos, principalmente quando está frio, por isso usa esporadicamente anti-inflamatórios não hormonais. Já apresentou 1 gestação, porém com aborto ainda no 1º trimestre. Exame físico: REG, hipocorada, em anasarca, com rash malar. PA = 180x110mmHg, FC = 110bpm, ACV: RCR em 2 tempos, BNF sem sopros, MVF sem RA e abdome sem alterações. Extremidades: edema (3+/4+). Exames laboratoriais: Admissão
3 dias de internação
56mg/dL 1,6mg/dL 8,5g/dL 3.500/mL 62.000/mL 78mg/dL 10mg/dL 1:1280 480UI/mL 5,1g 1,9
98mg/dL 2,8mg/dL ----------
NEFROLOGIA
Ureia Creatinina Hemoglobina Leucócitos Plaquetas C3 (referência 90 a 180mg/dL) C4 (referência 10 a 40mg/dL) FAN Anti-DNA (normal <5UI/mL) Proteinúria de 24 horas Albumina
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Extensivo aplicado Caso 9 a) O diagnóstico é hipertensão arterial secundária a estenose de artéria renal (ou hipertensão renovascular). É considerada uma das causas mais frequentes de hipertensão secundária e sua prevalência é estimada entre 1 e 5% da população geral de hipertensos. A principal etiologia é aterosclerose que predomina em pacientes >50 anos, principalmente do sexo masculino. b) Paciente com idade >55 anos, com hipertensão refratária, achado de sopro abdominal, insuficiência renal aguda após administração de IECA ou bloqueador de receptor de angiotensina ou inibidor de renina e assimetria renal >1,5cm. c) O exame padrão-ouro é a arteriografia renal intrarrenal, porém é invasiva e exige a utilização de contrastes nefrotóxicos. Outros exames menos específicos são: a ultrassonografia com Doppler de artérias renais, angiorressonância magnética, tomografia helicoidal, renina periférica estimulada com captopril, renograma com captopril, renina das veias renais.
d) O tratamento da estenose de artéria renal tem como objetivo o tratamento clínico para controle de fatores de risco aterosclerótico e consideração para revascularização renal. No paciente, o LDL está acima do alvo, portanto uma estatina deverá ser introduzida. Como apresentava alteração da função renal, foi suspenso o enalapril, e introduzida outra classe de anti-hipertensivos (betabloqueadores). A orientação consiste em cessação do tabagismo e controle de peso. e) Uma das indicações clínicas para a correção da estenose de artéria renal por via percutânea ou por revascularização cirúrgica são perda da função renal com estenose bilateral, então, neste caso, seria indicado tratamento cirúrgico.
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