Coleção Extensivo 2014 - Cirurgia Geral Vol.2

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VOLUME

2


AUTORIA E COLABORAÇÃO

Eduardo Bertolli Graduado pela Faculdade de Medicina da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Residente de Cirurgia Geral pela PUC-SP. Título de Especialista em Cirurgia Geral pelo Colégio Brasileiro de Cirurgiões (CBC). Especialista em Cirurgia Oncológica pelo Hospital do Câncer A. C. Camargo, onde atua como médico titular do Serviço de Emergência e do Núcleo de Câncer de Pele. Título de Especialista em Cancerologia Cirúrgica pela Sociedade Brasileira de Cancerologia. Membro titular do CBC e da Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica (SBCO). Instrutor de ATLS® pelo Núcleo da Santa Casa de São Paulo. José Américo Bacchi Hora Graduado pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Especialista em Cirurgia Geral e em Cirurgia do Aparelho Digestivo pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP), onde foi preceptor da disciplina de Coloproctologia. Marcelo Simas de Lima Graduado pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Especialista em Cirurgia Geral, em Cirurgia do Aparelho Digestivo e em Endoscopia Digestiva pelo HC-FMUSP. Membro titular do Colégio Brasileiro de Cirurgia Digestiva (CBCD) e da Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva (SOBED). Rogério Bagietto Graduado pela Faculdade de Medicina do ABC (FMABC). Especialista em Cirurgia Geral pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) e em Cirurgia Oncológica pelo Hospital do Câncer de São Paulo. Fábio Carvalheiro Graduado pela Faculdade de Medicina da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Especialista em Cirurgia Oncológica pelo Instituto do Câncer Dr. Arnaldo Vieira de Carvalho (IAVC) e em Cirurgia Geral pela Santa Casa de São Paulo.

ATUALIZAÇÃO 2014 Eduardo Bertolli José Américo Bacchi Hora


APRESENTAÇÃO

S

e a árdua rotina de aulas teóricas e de plantões em diversos blocos é só o

primeiro dos desafios que o estudante de Medicina deve enfrentar na carreira, o seguinte é ainda mais determinante: a escolha de uma especialização que lhe traga satisfação profissional em uma instituição que lhe ofereça a melhor preparação possível. Essa etapa, entretanto, é marcada pelo difícil ingresso nos principais centros e programas de Residência Médica, conquistado apenas com o apoio de um material didático objetivo e que transmita confiança ao candidato. A Coleção SIC Principais Temas para Provas de Residência Médica 2014, da qual fazem parte os 31 volumes da Coleção SIC Extensivo, foi desenvolvida a partir dessa realidade. Os capítulos são baseados nos temas exigidos nas provas dos principais concursos do Brasil, enquanto os casos clínicos e as questões são comentados de modo a oferecer a interpretação mais segura possível das respostas.

Bons estudos!

Direção Medcel A medicina evoluiu, sua preparação para residência médica também.


ÍNDICE

Capítulo 1 - Resposta metabólica ao trauma .............................................................19 Pontos essenciais............................................................. 19 1. Introdução ................................................................... 19 2. Definições .................................................................... 19

6. Complicações .............................................................. 47 7. Prognóstico .................................................................. 47 8. Resumo ........................................................................ 48

Capítulo 5 - Hemorragia digestiva alta ..........49

4. Utilização de substratos energéticos .......................... 21

Pontos essenciais............................................................. 49

5. Implicações clínicas e a resposta metabólica no paciente cirúrgico ....................................................... 22

Parte I - Introdução à hemorragia digestiva alta............. 49

Capítulo 2 - Hérnias ........................................25 Pontos essenciais............................................................. 25 1. Introdução ................................................................... 25 2. Hérnia umbilical........................................................... 25 3. Hérnia epigástrica ........................................................ 26 4. Hérnia ventrolateral de Spiegel ................................... 26 5. Hérnias inguinais ......................................................... 27 6. Hérnia femoral............................................................. 30 7. Hérnia incisional .......................................................... 31 8. Outros tipos ................................................................ 32 9. Telas ............................................................................. 33 10. Resumo ...................................................................... 33

1. Definição...................................................................... 49 2. Quadro clínico ............................................................. 49 3. Conduta ...................................................................... 50 Parte II - Hemorragia digestiva alta varicosa ................... 51 1. Epidemiologia .............................................................. 51 2. Fisiopatologia .............................................................. 51 3. Quadro clínico ............................................................. 52 4. Conduta ....................................................................... 52 5. Tratamento da hepatopatia ......................................... 52 6. Tratamento da hemorragia .......................................... 53 Parte III - Hemorragia digestiva alta não varicosa.............. 55 1. Epidemiologia .............................................................. 55 2. Quadro clínico ............................................................. 55 3. Conduta ....................................................................... 55 4. Causas raras ................................................................ 57

Capítulo 3 - Abdome agudo ............................35

5. Resumo ........................................................................ 58

Pontos essenciais............................................................. 35

Capítulo 6 - Hemorragia digestiva baixa .......59

1. Introdução ................................................................... 35

Pontos essenciais............................................................. 59

2. Avaliação ..................................................................... 35

1. Definição...................................................................... 59

3. Classificação ................................................................ 36

2. Etiologia ....................................................................... 59

4. Resumo ........................................................................ 42

3. Diagnóstico .................................................................. 60

Capítulo 4 - Apendicite aguda ........................43

4. Conduta ....................................................................... 61

Pontos essenciais............................................................. 43

lugar!

5. Conduta ....................................................................... 46

3. Iniciadores e propagadores ........................................ 20

6. Resumo ........................................................................ 23

r s O 0

4. Apendicite durante a gestação .................................... 46

5. Resumo ........................................................................ 61

1. Epidemiologia .............................................................. 43

Capítulo 7 - Bases da cirurgia oncológica .....63

2. Anatomia e fisiopatologia ............................................ 43

Pontos essenciais............................................................. 63

3. Diagnóstico .................................................................. 44

1. Introdução ................................................................... 63


2. Tratamento do tumor primário ................................... 63 3. Sarcomas de partes moles ........................................... 65 4. Melanoma maligno ..................................................... 66 5. Resumo ........................................................................ 68

Capítulo 8 - Bases da cirurgia videolaparoscópica .........................................69 Pontos essenciais............................................................. 69 1. Introdução ................................................................... 69 2. Aspectos técnicos ........................................................ 70 3. Aplicações.................................................................... 71 4. Complicações............................................................... 71 5. Resumo ........................................................................ 71

Casos Clínicos .................................................73

QUESTÕES Cap. 1 - Resposta metabólica ao trauma ......................... 91 Cap. 2 - Hérnias ............................................................... 92 Cap. 3 - Abdome agudo ................................................. 104 Cap. 4 - Apendicite aguda ............................................. 118 Cap. 5 - Hemorragia digestiva alta................................. 124 Cap. 6 - Hemorragia digestiva baixa .............................. 130 Cap. 7 - Bases da cirurgia oncológica ............................ 132 Cap. 8 - Bases da cirurgia videolaparoscópica ............... 135 Outros temas ................................................................ 138

COMENTÁRIOS Cap. 1 - Resposta metabólica ao trauma ....................... 143 Cap. 2 - Hérnias ............................................................. 145 Cap. 3 - Abdome agudo ................................................. 154 Cap. 4 - Apendicite aguda ............................................. 164 Cap. 5 - Hemorragia digestiva alta................................. 168 Cap. 6 - Hemorragia digestiva baixa .............................. 172 Cap. 7 - Bases da cirurgia oncológica ............................ 174 Cap. 8 - Bases da cirurgia videolaparoscópica ............... 176 Outros temas ................................................................ 178

Referências bibliográficas ............................181


CIRURGIA GERAL CAPÍTULO

1

Resposta metabólica ao trauma Eduardo Bertolli

Pontos essenciais - Iniciadores e propagadores da resposta metabólica; - Utilização de substratos energéticos; - Implicações clínicas.

1. Introdução Traumas, infecções e condições que deflagram respostas inflamatórias constituem a base das doenças cirúrgicas de maior gravidade. A mobilização e a utilização dos substratos energéticos, como ácidos graxos, aminoácidos e glicose representam a mudança metabólica resultante desses eventos. Os reservatórios energéticos (lipídico, no tecido adiposo, e proteico, no sistema musculoesquelético) garantem o fornecimento de energia para a manutenção das funções essenciais à vida após o trauma, como ação dos órgãos viscerais, regulação e ativação do sistema imunológico e reparo de tecidos e órgãos lesados. É por meio de hormônios e mediadores inflamatórios que ocorrem o transporte e a distribuição dos substratos energéticos para os órgãos viscerais. Adicionalmente, eventos concomitantes à resposta ao trauma, como imobilização, jejum, intervenções terapêuticas (ação de drogas anestésicas, reposição maciça de hemoderivados etc.), isquemia regional e hipoperfusão tecidual global amplificam e prolongam as mudanças metabólicas que resultam em hipercatabolismo. Uma resposta metabólica efetiva é capaz de reparar, de forma adequada, as lesões teciduais e atender as demandas do processo inflamatório até a sua resolução. Entretanto, não apenas a gordura é prontamente utilizada para essa proposta, mas também substratos contendo nitrogênio derivado da degradação proteica do sistema musculoesquelético. Estes servem para a síntese de proteínas da fase aguda e a recons-

trução dos tecidos lesados, além de serem precursores da gliconeogênese. Como prejuízo, pode ocorrer déficit na função locomotora e na ação dos músculos da caixa torácica, o que induz convalescença prolongada e potencial morbidade ao paciente, como na dificuldade de deambulação precoce ou no desmame da ventilação mecânica. Caso a resposta metabólica não esteja à altura das exigências do reparo tecidual e do processo inflamatório, o indivíduo sucumbe a esse insulto. Se o paciente o superar, passará para um período de convalescença, em que predomina o anabolismo (restauração da massa magra e dos estoques de gordura). Didaticamente, todo esse processo pode ser dividido em 3 fases: fase catabólica inicial, seguida das fases anabólica inicial e tardia.

2. Definições A resposta inflamatória pode evoluir em diversos estágios, dependendo do estímulo desencadeante. Os sinais cardinais que apontam para evento inflamatório são dor, rubor, calor, tumor e perda de função (Figura 1). Considera-se como Síndrome da Resposta Inflamatória Sistêmica (SRIS) todo paciente que apresenta ao menos 2 itens dos seguintes: FC >90bpm, FR >20irpm, Tax >38 ou <36°C, leucócitos >12.000, <4.000 ou >10% bastões.

Figura 1 - Sinais da inflamação

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Tabela 1 - Definições Sepse

Foco infeccioso comprovado com cultura.

Sepse grave

Sepse acompanhada de choque circulatório.

Choque séptico

Instabilidade hemodinâmica não revertida com volume, e necessidade de droga vasoativa.

negativo, independentemente da oferta de glicose, quebra de proteínas e de triglicérides que acabam alimentando a gliconeogênese hepática e a formação de corpos cetônicos. O catabolismo lipídico é mediado pelas catecolaminas, principalmente as que exercem atividade beta; as de atividade alfa levam à inibição da reutilização de ácidos graxos.

- FC >90bpm; SRIS (pelo - FR >20irpm; menos 2) - Tax >38 ou <36°C; - Leucócitos >12.000, <4.000 ou >10% bastões.

Uma vez do evento desencadeante, inicia-se uma série de alterações neuroendócrinas com a ativação do eixo hipotalâmico-hipofisário-suprarrenal (Figura 2). A partir daí, ocorre o estímulo ou a inibição à produção de determinados hormônios, cujo objetivo final será o aumento da oferta de nutrientes (hiperglicemia) e a vasoconstrição. Figura 3 - Atuação do glucagon e da insulina: na fase catabólica inicial, predomina o glucagon, consequentemente ocorre maior gliconeogênese hepática

Figura 2 - Resposta neuroendócrina ao trauma

3. Iniciadores e propagadores O aumento da demanda metabólica varia de acordo com a gravidade do trauma imposto, e a resposta metabólica pode ser notada por vários dias. O sítio da infecção ou a região anatômica traumatizada representa o arco aferente da resposta metabólica, sendo essencial o papel do sistema nervoso. A manutenção dessa resposta metabólica é decorrente da descarga sistêmica dos hormônios contrarreguladores que representam o arco eferente. O sistema nervoso central é responsável pela iniciação da resposta metabólica diante do insulto. Já o sistema nervoso periférico (SNP) atua na transmissão dos sinais aferentes. Observam-se aumento dos hormônios contrarreguladores (glicocorticoides, glucagon e catecolaminas), amplificação e manutenção da resposta metabólica pela ação de citocinas pró-inflamatórias (TNF, interleucinas 1 e 6 – IL-1 e IL-6) e aumento da atividade oxidante. Por outro lado, há diminuição da secreção de insulina e aumento da resistência insulínica. Na fase catabólica inicial, predominam catecolaminas, corticosteroides e glucagon, com queda significativa da insulinemia (Figura 3). Nesse ambiente, há balanço nitrogenado

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Também pode ser observada, na resposta hipermetabólica, redução da atividade endógena de agentes anabólicos (insulina, testosterona e hormônios tireoidianos) que, somada à ação dos hormônios contrarreguladores, resulta em maior perda proteica. Além da ação dos hormônios contrarreguladores, ocorrem amplificação e manutenção da resposta metabólica pela ação das citocinas pró-inflamatórias (TNF, IL-6, IL-1 e IL-8), e aumento da atividade oxidante, pela ação dos radicais livres e pela participação dos metabólitos do ácido araquidônico, ambos causando aumento da degradação proteica. Os mediadores pró-inflamatórios merecem atenção especial, pelo seu papel na propagação da resposta metabólica. Infusões de TNF (caquexina) em hospedeiros causam anorexia, ativam o eixo hipotalâmico-pituitário-suprarrenal e aumentam o catabolismo proteico, a lipólise e a gliconeogênese. Em altas doses, levam à disfunção de diversos órgãos e sistemas, resultando até em óbito (Tabela 2). Tabela 2 - Efeito do TNF na resposta do hospedeiro

TNF (pg/mL) 1

2

>500

>620

Respostas Redução nos estoques de ferro, mialgia, cefaleia e anorexia Febre, taquicardia, hormônios contrarreguladores e proteínas de fase aguda Retenção líquida, linfopenia e hipotensão Diminuição do nível de consciência, hipotensão grave, edema de pulmão e oligúria

Correlações clínicas Infecções subclínicas e influenza Apendicite aguda e abscessos intra-abdominais Grande queimado Sepse grave, pancreatite aguda necrosante e grande queimado séptico


CIRURGIA GERAL CAPÍTULO

8

Bases da cirurgia videolaparoscópica Eduardo Bertolli

Pontos essenciais - Aspectos técnicos; - Alterações fisiológicas; - Complicações do método.

1. Introdução Com o advento das fibras ópticas de iluminação, conjugado com o desenho de instrumentais cirúrgicos que possibilitavam a manipulação dos órgãos internos com menores áreas de dissecção, surgiram os primeiros procedimentos videolaparoscópicos. Na década de 1960, Semm substituiu 75% das operações ginecológicas abertas pela laparoscopia com baixo índice de complicações. Na Cirurgia Geral, a laparoscopia foi utilizada inicialmente para realizar biópsias hepáticas sob visão direta. Em 1977, De Kok realizou apendicectomias videoassistidas. A 1ª colecistectomia videolaparoscópica foi realizada por Mouret, em 1987. Inicialmente, a cirurgia laparoscópica aumenta o custo inicial do procedimento em termos de equipamentos e manutenção (Figuras 1 e 2), bem como no treinamento do cirurgião. No entanto, as vantagens da laparoscopia ultrapassam os custos de muitos procedimentos, tornando-a vantajosa nesses casos. Entre as principais vantagens, há menor permanência hospitalar com retorno precoce às atividades normais, menor trauma cirúrgico, menos dor pós-operatória e efeito estético superior.

Figura 1 - Rack básico de videolaparoscopia com (A) monitor; (B) cassete ou DVD; (C) entrada para câmera; (D) fonte de luz e (E) fonte de CO2 para o pneumoperitônio

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Figura 2 - Instrumentais videolaparoscópicos: (A) tesoura e pinça de preensão; (B) pinça tipo Maryland; (C) trocartes de 5 e 10mm (com mandril) e (D) pinça tipo Grasper

2. Aspectos técnicos A preparação pré-operatória permanece a mesma dos procedimentos tradicionais no que diz respeito ao preparo do paciente, à compensação clínica e à avaliação pré-anestésica. Existem situações em que o cirurgião terá de converter a cirurgia laparoscópica para a via aberta, de modo que todo paciente precisa estar ciente disso no pré-operatório. A cirurgia deve sempre ser realizada sob anestesia geral, e é prudente a passagem de sondas nasogástrica e vesical de demora para evitar distensão e minimizar a presença desses órgãos no campo operatório. O pneumoperitônio é necessário para proporcionar espaço intra-abdominal e permitir a visualização da anatomia. É feito com insuflação de CO2 e pode ser obtido pela técnica fechada, pela punção com agulha de Veress, ou aberto, pela técnica de Hasson (Figura 3). A pressão inicial para insuflação após a punção deve estar entre 6 e 8mmHg. O fluxo ideal deve ser de 1L/min, e a pressão durante a cirurgia deve manter-se entre 12 e 15mmHg para evitar o quadro de síndrome compartimental abdominal.

Figura 3 - (A) Punção com agulha de Veress e (B) técnica de Hasson

Com a óptica inserida, realiza-se um inventário da cavidade. São, então, introduzidos os outros trocartes necessários para afastamento e dissecção, colocados sob visão direta. O número e a localização dos trocartes variam com a cirurgia.

A - Alterações fisiológicas do pneumoperitônio Logo no início da insuflação, ocorre a liberação de mediadores neuroendócrinos, o que justifica a necessidade de uma indução lenta e gradual do pneumoperitônio. Do ponto de vista ventilatório, a função respiratória fica comprometida pela diminuição da complacência pulmonar. Podem ocorrer hipercapnia e acidose, rapidamente reversíveis com a desinsuflação do CO2. O pneumoperitônio (como o consequente aumento da pressão intra-abdominal) aumenta a pressão venosa central, a pressão capilar pulmonar em cunha (pré-carga), a pressão arterial média e a resistência vascular sistêmica (pós-carga). Essas alterações apresentam efeito duplo: o aumento da pré-carga eleva o débito cardíaco, ao passo que o aumento da pós-carga o reduz, mas aumenta o trabalho cardíaco.

B - Contraindicações Não há nenhuma contraindicação absoluta ao método. Do ponto de vista técnico, a presença de cirurgias abdominais prévias e a consequente formação de aderências podem impedir a introdução dos trocartes. Algumas aderências podem ser liberadas laparoscopicamente, mas múltiplas cirurgias anteriores prejudicam essa técnica. Pacientes com obesidade mórbida podem apresentar panículo adiposo muito grande, dificultando a colocação dos trocartes. O útero aumentado na gestante pode impedir a formação de espaço intra-abdominal suficiente. Pacientes com doença cardiopulmonar grave podem piorar com a diminuição do retorno venoso pelo pneumoperitônio, enquanto doentes com coagulopatias devem ser compensados e transfundidos antes do procedimento. Em

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2 VOLUME

CASOS CLÍNICOS


CIRURGIA GERAL 2013 - FMUSP

1.

Hb

14g/dL

Leucócitos

16.000/mm3; 86% neutrófilos, 15% bastões e 71% segmentados, 10% linfócitos, 2% eosinófilos, 2% monócitos

Ureia

56mg/dL

Creatinina

1,1mg/dL

Ht

45%

Plaquetas

366.000mm3

Glicemia

130mg/dL

Tomografia de abdome com contraste retal

Espessamento da gordura perimesocólica e pequena quantidade de líquido junto à parede do sigmoide

CASOS CLÍNICOS

Uma mulher de 56 anos, parda, vem ao pronto-socorro por dor em cólica, localizada no epigástrio e no flanco esquerdo, há 6 dias. Refere também inapetência, náuseas, com episódio de vômito, de conteúdo bilioso no período. Não evacua há 2 dias, e, há 1 dia, a dor se tornou constante e de maior intensidade. Antecedente pessoal: hipertensão arterial sistêmica tratada com hidroclorotiazida. No exame clínico, regular estado geral, corada, hidratada, afebril, com fácies dolorosa; pulso = 98bpm, FR = 24irpm, PA = 160x110mmHg e temperatura axilar = 37,7°C. Semiologias cardíaca e pulmonar sem alterações; abdome globoso, flácido e doloroso à palpação no hemiabdome esquerdo (principalmente no flanco esquerdo). A ausculta abdominal evidencia ruídos hidroaéreos presentes e normais. Exames complementares realizados na entrada do pronto-socorro:

a) Cite a principal hipótese diagnóstica para o quadro agudo.

c) Cite 3 achados anormais presentes nas radiografias.

b) Cite a conduta terapêutica indicada nesse momento.

Após 2 dias do tratamento adequado, a paciente apresentou piora do estado geral e da dor abdominal. Durante a investigação do quadro, foram realizadas as radiografias a seguir:

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CIRURGIA GERAL

a) Abdome agudo inflamatório por apendicite aguda. b) A dor à descompressão brusca na fossa ilíaca direita recebe o nome de sinal de Blumberg. Outras manobras são o sinal de Rovsing (dor na fossa ilíaca direita quando se palpa a fossa ilíaca esquerda induzindo a retorno gasoso com distensão do ceco), Lennander (dissociação entre temperatura retal e axilar >1°C), Summer (hiperestesia na fossa ilíaca direita), Lapinski (dor à compressão da fossa ilíaca direita enquanto se solicita ao paciente para elevar o membro inferior direito) e dor na fossa ilíaca direita à punho-percussão do calcâneo. c) Nenhum. A apendicite aguda constitui o quadro mais comum de abdome agudo cirúrgico não traumático, especialmente entre crianças, adolescentes e adultos jovens, e o diagnóstico é eminentemente clínico. No caso descrito, a história é típica, e os achados de exame físico não deixam dúvida diagnóstica. Dessa maneira, é possível indicar a cirurgia sem outros exames. d) 1 - Identificação do apêndice cecal e ligadura do mesoapêndice. 2 - Sepultamento do coto apendicular pela técnica de Ochsner (ou “bolsa de tabaco”).

Caso 11 a) Técnica fechada ou punção de Veress. A complicação mais comum é punção iatrogênica de vasos ou vísceras abdominais. b) Menor permanência hospitalar e retorno precoce às atividades normais, trauma cirúrgico menor, menos dor pós-operatória e efeito estético superior. c) O pneumoperitônio (como o consequente aumento da pressão intra-abdominal) aumenta a pressão venosa central, a pressão capilar pulmonar “em cunha” (pré-carga), a pressão arterial média e a resistência vascular sistêmica (pós-carga). Essas alterações apresentam efeito duplo: o aumento da pré-carga eleva o débito cardíaco, ao passo que o aumento da pós-carga o reduz, mas aumenta o trabalho cardíaco.

dratação adequada e controle dos distúrbios eletrolíticos. Nessa fase, não são necessários antibióticos. Após essas medidas, a paciente deve ser mantida em observação por um período de aproximadamente 48 horas. Se houver piora da dor, da distensão ou dos exames, deve-se cogitar conduta cirúrgica. A não resolução do quadro nesse período também é indicativa da necessidade de cirurgia. c) Trata-se de um raio x de abdome em posição ortostática após ingesta de contraste oral, numa fase tardia (7 horas, segundo a identificação do exame). Observa-se que o contraste está todo acumulado no intestino delgado e não progrediu ao cólon. Provavelmente há obstrução do delgado por bridas, o que causa a parada do contraste e o quadro de oclusão intestinal da paciente. d) Como não houve melhora com o tratamento clínico, está indicada laparotomia exploradora para correção do fator obstrutivo.

Caso 13 a) Sim. Trata-se de um quadro de abdome agudo obstrutivo, cujo raio x mostra provável causa mecânica para a obstrução, haja vista não haver progressão de ar após o cólon esquerdo. Com a história de síndrome consumptiva associada, a hipótese de neoplasia é a principal etiologia do quadro e o tratamento clínico não irá resolver a obstrução. b) Consiste na retossigmoidectomia abdominal com colostomia terminal e no sepultamento do coto retal no nível do promontório. c) Trata-se de um fio sintético, absorvível, multifilamentar; força tênsil de 3 a 4 semanas, com hidrólise completa em 60 dias. d) T3 significa invasão do tumor até a subserosa ou nos tecidos pericólicos não peritonizados ou perirretais. Nx significa que não foi possível avaliar linfonodos na peça cirúrgica. Mx, por sua vez, significa que não foi possível avaliar a presença ou não de metástases.

d) Lesão iatrogênica de vias biliares. O uso de colangiografia intraoperatória minimiza esse tipo de intercorrência.

Caso 12 a) Abdome agudo obstrutivo por bridas. b) O tratamento do abdome agudo obstrutivo inicialmente é clínico. A paciente deve ser mantida em jejum e com sonda nasogástrica aberta. A prescrição deve conter hi-

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CASOS CLÍNICOS

Caso 10


2 VOLUME

QUESTÕES


CIRURGIA GERAL - QUESTÕES

2012 - UFPE

2011 - FMUSP - RIBEIRÃO PRETO

60. Sobre a hérnia de Spiegel, é incorreto afirmar que: a) obesidade mórbida, múltiplas gestações e constipação crônica são alguns dos fatores predisponentes b) é usualmente uma hérnia interparietal c) quase sempre se desenvolve na linha arqueada ou abaixo dela d) o risco de encarceramento é raro

64. Um homem de 59 anos, assintomático, exceto por ter apresentado 3 episódios de síncope, nega história prévia de trauma. Ao exame, apresenta-se em bom estado geral. Na investigação dessa queixa, detectou a anormalidade visualizada na seriografia apresentada a seguir:

 Tenho domínio do assunto  Refazer essa questão  Reler o comentário  Encontrei dificuldade para responder

2012 - UERN 61. Com relação às hérnias inguinais congênitas em crianças, é correto afirmar que: a) são muito raras b) incidem predominantemente no sexo feminino e no lado direito c) nos casos de encarceramento, o risco de envolvimento e sofrimento gonadal está ausente d) decorrem da reabsorção incompleta do processo vaginal ou do conduto peritoneovaginal  Tenho domínio do assunto  Refazer essa questão  Reler o comentário  Encontrei dificuldade para responder

62. Com relação ao estudo das hérnias, é verdadeiro afirmar que: a) a maioria das hérnias estranguladas é direta b) as hérnias femorais apresentam baixas taxas de estrangulamento e recomenda-se que todas as hérnias femorais sejam reparadas no momento de seu diagnóstico c) o ligamento de Cooper é formado pelo periósteo e pela fáscia ao longo do ramo superior do púbis d) na classificação de Nyhus, a hérnia tipo IIIa é uma hérnia inguinal indireta e com destruição da parede posterior e) lesão do nervo genitofemoral é causa importante de orquite isquêmica  Tenho domínio do assunto  Refazer essa questão  Reler o comentário  Encontrei dificuldade para responder

2012 - UFPI 63. Como consequência do retorno das vísceras à cavidade abdominal, nas herniorrafias incisionais, podem ocorrer todas as situações a seguir, exceto: a) síndrome compartimental b) insuficiência respiratória aguda c) maior propensão à infecção do sítio cirúrgico d) maior propensão à ocorrência de pirose e) maior pressão abdominal  Tenho domínio do assunto  Refazer essa questão  Reler o comentário  Encontrei dificuldade para responder

Quais são o diagnóstico e a abordagem terapêutica recomendados? a) hérnia diafragmática traumática e abordagem cirúrgica por toracoscopia b) hérnia hiatal mista e abordagem cirúrgica por laparoscopia c) hérnia hiatal por deslizamento e tratamento clínico com inibidores de bomba de prótons d) hérnia hiatal paraesofágica e abordagem cirúrgica por laparotomia  Tenho domínio do assunto  Refazer essa questão  Reler o comentário  Encontrei dificuldade para responder

2011 - HSPE-SP (BASEADA NA PROVA) 65. Sobre as herniorrafias inguinais com colocação de telas, é incorreto afirmar que: a) justifica-se o uso de antibiótico profilático, ainda que seja cirurgia limpa b) o uso de drenos pode aumentar o risco de infecção c) deve-se realizar a tricotomia na véspera d) a preferência é pela tricotomia com barbeador ao invés de lâmina

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QUESTÕES

2012 - HC-ICC


2 VOLUME

COMENTÁRIOS


CIRURGIA GERAL - COMENTÁRIOS

Questão 1. Na 1ª fase da resposta metabólica ao trauma, observa-se aumento da secreção de quase todos os hormônios do organismo, exceto insulina, testosterona e hormônios tireoidianos. A aldosterona estimula a retenção de sódio e a excreção de potássio. A vasopressina estimula a reabsorção de água nos túbulos renais. O período de catabolismo mais intenso normalmente ocorre na 1ª semana após o estresse cirúrgico ou traumático. Gabarito = D Questão 2. As principais alterações hormonais no pós-operatório estão resumidas na Figura a seguir:

Gabarito = E Questão 3. Na fase inicial de resposta ao trauma, ocorre oligúria pela diminuição da perfusão renal em detrimento à perfusão cardíaca e cerebral. Além disso, ocorre aumento da secreção de aldosterona e, consequentemente, excreção aumentada de potássio, com retenção de sódio. Gabarito = B Questão 4. A resposta orgânica ao estresse grave é complexa e integrada e sua finalidade básica é a restauração da homeostase. Para isso, ocorrem diversas alterações endócrinas/metabólicas, às quais se pode citar a ação do hormônio antidiurético, que se encontra elevada, causando retenção de água. A aldosterona também se encontra elevada, com retenção de sódio e aumento da excreção de potássio. Gabarito = C Questão 5. Na fase inicial da resposta metabólica ao trauma, ocorre aumento na liberação de todos os hormônios, exceto insulina, testosterona e tiroxina. Gabarito = A

Questão 6. Na fase catabólica da resposta ao trauma, o organismo lança diversos mecanismos para converter glicose em energia. Na indisponibilidade de glicose, outros substratos são utilizados com esse fim. Um deles é a conversão dos aminoácidos das proteínas em glicose pelo mecanismo de gliconeogênese hepático; cuja principal fonte é a musculatura esquelética. A oferta adequada de glicose evita o consumo da musculatura com finalidade energética. Gabarito = C Questão 7. O cortisol, que aumenta após o trauma, tem como função principal estimular a proteólise, gerando substratos para a gliconeogênese hepática. A liberação de ACTH aumenta, mas por estimulação direta do eixo hipotálamo-hipófise. Gabarito = C Questão 8. O estado de hipoperfusão tecidual do paciente grave, normalmente pelo estado de choque, leva o organismo a lançar mão do metabolismo anaeróbio para obtenção de energia e, consequentemente, aumentar o ácido láctico e diminuir o pH do meio interno. Quando o organismo não consegue, por meio de seus mecanismos compensadores, corrigir essa acidose metabólica, pode ser necessário o uso de bicarbonato. A respiração também interfere no equilíbrio acidobásico. A hiperventilação pode ser usada como mecanismo para compensar quadros de acidose respiratória. Entretanto, pacientes com doença pulmonar restritiva normalmente são retentores crônicos de CO2 e a hiperventilação não conseguirá suprir essa condição. Gabarito = C Questão 9. O principal estímulo é a agressão tecidual do trauma, seja pelo agente contundente (trauma direto) ou por um agente cortante (bisturi, arma branca, arma de fogo). Esse é o 1º passo (gatilho) para se iniciar todas as respostas complexas neuro-hormonais que causaram fenômenos sistêmicos generalizados para se voltar a homeostasia. Gabarito = B Questão 10. Na resposta metabólica e fisiológica ao trauma, o evento inicial é a liberação de adrenalina com vasoconstrição periférica (alternativa “a” incorreta). Quando ocorre hipoperfusão tecidual, a situação já não pode mais ser considerada fisiológica, passa a ser patológica, pois o trauma superou a capacidade adaptativa fisiológica e provavelmente haverá sequelas (alternativa “b” incorreta). A resposta ao trauma envolve hiperglicemia e é necessário que haja glicose disponível para que a reação de fuga não falhe por falta de energia (alternativa “d” incorreta). Fisiolo-

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Resposta metabólica ao trauma


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