Petródólares Porque são mais os que ‘desconseguem’ do que os que se desenvolvem? absa Rui Barros fala das perspectivas do banco um ano após mudar de marca Inovação a evolução ao nível dos grandes eventos — Do digital ao híbrido
dar gás ao emprego
A E&M analisa a (in)capacidade do País em transformar o potencial económico em mais postos de trabalho. E como será com as oportunidades que em breve chegarão do Rovuma? DEZEMBRO 2020 • Janeiro 2021 ano 03 • no 31 • 15/12 - 15/01 Preço 250 MZN
moçambique
2020 os principais momentos que marcaram um ano ‘exasperante’
Sumário 6
Observação
Covid-19 A tão ansiada vacina já é uma realidade no mundo mas só chega a Moçambique no próximo ano
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Radar
Panorama Economia, Banca, Finanças, Infra-estruturas, Investimento, País
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57 ócio
58 Escape Uma viagem até à Ponta do Ouro, província de Maputo 60 Gourmet À descoberta das boas vistas do Fiamma 61 Adega Um brinde aos vinhos que se destacaram em 2020 63 Arte “Nyimba Art”, a habilidade de imortalizar a gestação através da fotografia 64 Ao volante Conheça o futurista “Never Charge” movido a energia solar
Especial 2020
Balanço Os principais acontecimentos que marcaram o País no domínio económico, social e político
24 nação emprego 24 Dar gás ao emprego Desafios e oportunidades da economia moçambicana para criar novos empregos 30 Mercado africano Falhas e acertos na transformação do sector do oil & gas em mais postos de trabalho 34 Entrevista Michael Sambo sugere priorização da indústria transformadora ao reinvestir receitas do gás
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mercado e FinanÇas
Absa Bank Tudo o que mudou um ano após a alteração da marca e o que o mercado deve esperar do banco no futuro
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esPECIAL INOVAÇÃO
Tecnologia As grandes tendências da Inovação em Moçambique, no continente Africano e no mundo
www.economiaemercado.co.mz | Julho 2020
54 lÁ fora Mundo Nações Unidas alertam para a iminência da pior crise humanitária das últimas décadas já no próximo ano
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Editorial
A esperança envolta em mau presságio
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Celso Chambisso • Editor da Economia & Mercado ica para trás um ano que mudou a ordem habitual de tudo e em todos, infelizmente, com danos irreversíveis: mais de 1,6 milhão de pessoas que não resistiram ao novo Coronavírus em todo o mundo. Não sendo possível restituir vidas que ainda se perdem, o final deste terrível 2020 tem reservado à sociedade global uma espécie de prémio de consolação, traduzido em notícias encorajadoras para o ano que já vai começar. A mais importante de todas as boas novas, particularmente para Moçambique, é a vacina contra o novo Coronavírus. Com um orçamento apertado, o Executivo não teria grande margem para concorrer às poucas doses da vacina que todas as economias se preparam para disputar, não fosse uma iniciativa global denominada COVAX, comprometida em defender a inclusão de países com fraco poder financeiro nesta corrida. Com efeito, e à luz desta determinação, devem chegar ao País, já em 2021, seis milhões de doses, que cobrem 20% da população. Trata-se de um tema não muito aprofundado nesta edição, mas que se reveste de relevância inquestionável, sendo destaque apenas na secção do “Observação”. Ao mesmo tempo que a humanidade suspira de alívio pela vacina, é confrontada com avisos inquietantes: A ONU alerta para o recrudescer da crise humanitária que deve afectar cerca de 235 milhões de pessoas principalmente em África, Ásia e Médio Oriente, um crescimento de 40% face ao que se assistiu no presente ano, em parte, como herança dos efeitos negativos do novo Coronavírus. Isto deve ocorrer numa altura de elevada pressão à capacidade de resposta, já que a generalidade dos governos, incluindo os dos países desenvolvidos, focalizam esforços na reparação dos danos provocados pela pandemia, com o agravante de a ONU não dispor de capacidade financeira suficiente para assistir aos novos casos de fome, pobreza extrema e crescente número de deslocados, incluindo em Moçambique. Por ser a última edição do ano, a E&M também traz à memória do leitor os principais acontecimentos de âmbito económico, social e até político, mas definiu como tema central a capacidade que a economia moçambicana tem, e poderá alcançar, de produzir novos postos de trabalho dentro e fora da esfera da indústria extractiva, particularmente a produção e exportação do gás, que em princípio deve começar já em 2022. Uma sequência de artigos ajuda a perceber as dinâmicas da criação de postos de trabalho noutras realidades em África e as práticas que devem ser replicadas cá no País. Chegados ao fim de mais um ano que teve a particularidade de ser difícil a todos os níveis, a Media4Development, de um modo geral, e em particular a E&M, agradece a todos os leitores e parceiros comerciais e institucionais por consigo terem caminhado e enfrentado as barreiras conjunturais. Desejamos a todos festas felizes e próspero 2021!
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MÊS ano • Nº 01 dezEMBRO 2020 • Nº 32 propriedade Executive Mocambique DIRECTOR EXECUTIVO Pedro Liquatis nienis doluptae velit etCativelos magnis pedro.cativelos@media4development.com enis necatin nam fuga. Henet exceatem EDITOR EXECUTIVO Celso Chambisso seque cus, sum nis nam iu Qui te nullant JORNALISTAS, Cristina Elmano adis destiosse iusci re in Freire, prae voles Madaíl, Ricardo David sant laborendae nihilibLopes, usciusRogério sinusam Macambize, Trindade, Yana de Almeida rehentius eosRui resti dolumqui dolorep PAGINAÇÃO José Mundundo reprem vendipid que ea et eumque non FOTOGRAFIA Mariano Silva nonsent qui officiasi REVISÃO Manuela Rodrigues dos Santos lorem ipsum Executive Mocambique área Comercial Nádia Pene Liquatis nienis doluptae velit et magnis nadia.pene@media4development.com enis necatin nam fuga. Henet exceatem conselho CONSULTIVO seque cus, sum nis nam iu Qui te nullant Alda destiosse Salomão, Andreia Narigão, António adis iusci re in prae voles Souto; Bernardo Aparício, Denise Branco, sant laborendae nihilib uscius sinusam Fabrícia deeos Almeida Henriques, Frederico rehentius resti dolumqui dolorep Silva, Hermano Ali Aiuba, reprem vendipidJuvane, que eaIacumba et eumque non João Gomes, Jorge Ferrão, Rogério Samo nonsent qui officiasi Gudo, ipsum Salim Cripton Sérgio Nicolini lorem LiquatisValá, nienis doluptae ADMINISTRAÇÃO, REDACÇÃO velit et magnis enis necatin nam fuga. E PUBLICIDADE Media4Development Henet exceatem seque cus, sum nis nam Rua Ângelo Azarias nº iusci 311 A re —in iu Qui te nullant adisChichava destiosse Sommerschield, Maputo – Moçambique; prae voles sant laborendae nihilib uscius marketing@media4development.com sinusam rehentius eos resti dolumqui IMPRESSÃO E ACABAMENTO dolorep reprem vendipid que ea et Minerva Print - Maputoqui - Moçambique eumque non nonsent officiasi Tiragem 4 500Liquatis exemplares lorem ipsum nienis doluptae Propriedade dOnecatin Registo velit et magnis enis nam fuga. Executive Moçambique Henet exceatem seque cus, sum nis nam Exploração e iusci re in iu Qui te nullantEditorial adis destiosse Comercial em Moçambique prae voles sant laborendae nihilib uscius Media4Development sinusam rehentius eos resti dolumqui Número de Registo dolorep reprem vendipid que ea et 01/GABINFO-DEPC/2018 eumque non nonsent qui officiasi lorem ipsum Liquatis nienis doluptae velit et magnis enis necatin nam fuga. Henet exceatem seque cus, sum nis nam iu Qui te nullant adis destiosse iusci re in prae voles sant laborendae nihilib uscius sinusam rehentius eos resti dolumqui dolorep reprem vendipid que ea et eumque non nonsent qui officiasi
www.economiaemercado.co.mz | Abril 2019
observação
Moçambique, 2020
Vacina, a certeza que nos traz dúvidas Está quase assegurada a recepção, por Moçambique, de seis milhões de doses da vacina do Covid-19 em 2021, numa altura em que vários laboratórios no mundo anunciam eficácia em torno de 95% das experiências realizadas, tendo o Reino Unido dado o pontapé de saída ao iniciar, em meados de Dezembro, a utilização da Pfizer e BioNTech, a primeira vacina licenciada. Para Moçambique, seis milhões de doses da vacina cobrem 20% da população. São insuficientes, claro, mas é um avanço assinalável para um país cujo Orçamento do Estado não previa qualquer plano de vacinação. O mérito para a obtenção deste lote é o facto de o País ser parte de uma iniciativa global conhecida como COVAX
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que permite aos países membros acesso rápido e equitativo a vacinas seguras, eficazes e pré-qualificadas pela OMS. Mas a boa notícia traz consigo dúvidas pertinentes: quais serão os critérios para definir os grupos prioritários? Como será a cobertura geográfica? Haverá condições de acondicionamento e armazenamento (que exige rigor e equipamentos de refrigeração de grande capacidade)? Qual será o laboratório/mercado fornecedor? E que nível de eficácia a vacina para Moçambique terá em comparação com os de primeira linha? O Ministro da Saúde, Armindo Tiago, garante que o Executivo está já a trabalhar para o breve esclarecimento de muitas destas questões.
www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
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RADAR Total atribui bolsas de estudo a 40 moçambicanos
O projecto Mozambique LNG, liderado pela petrolífera francesa Total, em parceria com o Governo francês, vai atribuir bolsas de estudo a 40 moçambicanos para o ensino superior na França, anunciou a empresa em comunicado. As bolsas terão validade a partir do próximo ano lectivo europeu a iniciar em Setembro de 2021, “nas variadas disciplinas para os níveis de bacharelato, mestrado e doutoramento”, lê-se no comunicado. “A formação destes jovens, que poderão abraçar futuramente oportunidades dentro e fora do nosso projecto, é, pois, parte fundamental desta responsabilidade de contribuir para o desenvolvimento sustentável e responde aos compromissos estabelecidos com o Governo moçambicano em matéria de desenvolvimento do conteúdo local”, disse o director-geral da Total em Moçambique, Ronan Bescond. Segundo o documento, a diversidade de género, proveniência e diferentes contextos académicos serão parte do “rigoroso” processo de selecção dos candidatos às bolsas, que terão a duração de dois a três anos.
ECONOMIA
Agro-negócio. Cerca de 2800 jovens das zonas rurais poderão ser abrangidos por
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projectos de agro-incubadoras até 2025 através de uma iniciativa da associação juvenil Aro-Moçambique e parceiros que prevêem investir cerca de um milhão de dólares. Trata-se de uma iniciativa que consiste em sessões periódicas de quatro meses de formação de jovens em matérias que incluem lições teóricas e práticas sobre tecnologias agrárias. Segundo Policarpo Tamele, director-executivo da Aro-Moçambique, espera-se que os beneficiários da
primeira fase do projecto avancem para uma fase independente de aplicação dos conhecimentos obtidos na incubação. Sector privado. O Governo pretende continuar e aumentar os apoios ao sector privado através de incentivos não fiscais, a fim de assegurar o crescimento da economia de 2021, que deverá fixar-se em 2,1%. No fundo, o Executivo está a sinalizar que não tenciona reduzir a carga de impostos à actividade empresarial, factor que é alvo de protesto por parte destes, que têm apontado o IVA (17%) como um dos impostos mais prejudiciais aos seus empreendimentos. Segundo o Primeiro-Ministro, Carlos Agostinho do Rosário, a estratégia vai consistir no “contínuo investimento no domínio da expansão das infra-estruturas de estradas, abastecimento de água, electricidade e formação técnico-profissional”.
Importação de viaturas. Moçambique está a registar uma redução de receitas na importação de viaturas devido aos efeitos do Covid-19 que resultaram no encerramento da maior parte das fronteiras desde Março, afectando o comércio internacional através da limitação na circulação de mercadorias sem contar com a escassez de dólares no mercado. Segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), até meados de Novembro de 2020, o Estado arrecadou apenas
cerca de seis mil milhões de meticais de impostos resultantes da importação de viaturas contra oito mil milhões de meticais cobrados em igual período de 2019, uma queda de pouco mais de dois mil milhões de meticais. Agricultura. A Bolsa de Valores de Moçambique (BVM) passará a fazer o registo, a liquidação financeira e a compensação do Certificado de Depósito emitido pela Bolsa de Mercadorias de Moçambique (BMM), à luz de um memorando de entendimento entre ambas as instituições, propiciando assim um mecanismo de financiamento directo para o sector agrícola nacional. Trata-se de uma parceria que vai permitir uma melhor colaboração, cooperação e articulação entre a BMM e a BVM, bem como maior apoio aos produtores e comerciantes no que diz respeito ao seu financiamento. Para o efeito, as duas instituições vão partilhar as operações da Central de Valores Mobiliários da BVM, permitindo deste modo que se faça o registo, a liquidação e compensação financeira dos produtores e comerciantes que tenham produtos agrícolas armazenados nos silos da BMM. Financiamento. Recentemente, a Alemanha subscreveu com o Governo moçambicano três contratos de apoio financeiro para as empresas enfrentarem o Covid-19, para ajuda à agricultura e ao sector da educação no País. De acordo com uma nota da cooperação alemã, um total de 18 milhões de euros serão doados, enquanto outros 10 milhões de euros vão alimentar uma linha de crédito. À luz destes contratos, a Cooperação Financeira Alemã, através do Banco de Desenvolvimento KfW, vai enwww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
tregar seis milhões de euros através de um mecanismo de subvenção de emergência face ao Covid-19, não reembolsável, para Pequenas e Médias Empresas e serão canalizados via Banco de Moçambique e instituições financeiras parceiras. Banca. O Centro de Integridade Pública (CIP) defende que o Estado deve organizar concursos públicos para escolher os bancos com que trabalha e evitar o que chama de “concentração e opacidade” na relação com o sector. “O Governo deve introduzir reformas no sentido de reforçar a competição no sistema financeiro moçambicano” e “o resultado deve ser a redução do actual nível elevado de concentração”, lê-se numa nota de análise. O CIP considera que, sem novas regras, alimenta-se o espaço de ‘lobbies’ para acesso a recursos do Estado cujos custos, por sua vez, se reflectem nos preçários e taxas de juro junto da população e empresários. Finanças verdes. O governador do Banco de Moçambique, Rogério Zandamela, reconhece como seu, “o papel de criação de sustentabilidade e resiliência através das chamadas Políticas de Finanças Verdes Inclusivas para proteger as populações mais vulneráveis aos efeitos das mudanças climáticas”. Trata-se de um tema novo no País, mas amplamente explorado nos países desenvolvidos. A constatação é de que há desafios na criação de uma banca sustentável em termos ambientais e sociais e o Governador de Moçambique reconhece quem deve tomar a dianteira no processo de inclusão financeira no País. Rogério Zandamela assume www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
que essa responsabilidade é do Banco de Moçambique. “Como bancos centrais e reguladores, somos chamados a incorporar a sustentabilidade e resiliência no quadro de políticas internas, priorizando factores ambientais, climáticos e sociais”, referiu o Governador numa conferência internacional de Finanças Verdes Inclusivas, que se realizou recentemente.
EXTRACTIVAS Conteúdo local. O Governo assegura que 917 empresas estão inscritas para beneficiar de oportunidades no âmbito da exploração do gás natural liquefeito na bacia do Rovuma em Cabo Delgado e adianta mesmo que mais de um terço (365 empresas) já beneficiaram de algumas dessas oportunidades. Segundo o Ministro dos Recursos Minerais e Energia, Max Tonela, que falava durante o debate sobre as propostas do Plano Económico e Social e o Orçamento do Estado para 2021, o Executivo criou um comité técnico dedicado às questões de Conteúdo Local para facilitar a partilha de informações com as concessionárias sobre novas oportunidades. Fundo Soberano. O Banco de
Moçambique está a promover um processo de auscultação pública sobre a criação do Fundo Soberano no País, instrumento financeiro que visa gerir e administrar as receitas provenientes de exploração de recursos naturais não renováveis. O processo de auscultação tem estado a decorrer nas capitais provinciais, com a participação de representantes da sociedade civil, académicos, deputados, organizações económicas e sociais, partidos políticos e público interessado.
OPINIÃO
Universidades moçambicanas: — os dilemas, as crises e o futuro (I)
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Jorge Ferrão • Reitor da Universidade Pedagógica de Maputo & Ivan Collinson • Universidade Eduardo Mondlane ensino superior tem sido um importante elemento de reflexo do desenvolvimento das sociedades, mas é também orientador desse caminho ao desenvolvimento, estando, por isso, ligado intrinsecamente ao momento histórico que se vive, conforme descreve a célebre teoria do Path-Dependency, proposto por Ramirez & Christensen (2012). Neste exercício contínuo para manter a sua autonomia, sem descurar a sua responsabilidade, enquanto farol para a sociedade, usando as palavras de Henry Rosovosky, Professor Emérito da Universidade de Harvard, nas quais define o ensino superior como o “ensino básico” do mundo moderno (Brock-Utne, 2003). Não admira que, presentemente, as instituições privadas passem, igualmente, por semelhantes sintomas. As universidades públicas enfrentaram, nas últimas três décadas, crises de legitimidade, de hegemonia e, naturalmente, crises institucionais e tecnológicas. Todas agravadas pela covid-19. Os últimos desenvolvimentos tecnológicos ou, na linguagem mais comum, a era digital, podem ter agravado esta crise ou exacerbado, até aos limites, as debilidades que já se verificavam. A covid-19, consequentemente, não teve o condão de extrapolar as dificuldades que já eram visíveis tendo, apenas, complementado e exposto as desigualdades, como fez nas diferentes esferas económicas e sociais. Portanto, a covid-19 transformou em sintomáticas situações que pareceriam assintomáticas, e tardavam a revelar os seus diagnósticos. Não existem dúvidas que a inteligência artificial, a robótica, as nanociências, a rede 5G e todas as novidades derivadas dos algoritmos, mais cedo ou mais tarde, ditariam o gap que nos separa de outras instituições mais competitivas, mais funcionais e mais estruturadas. Os algoritmos e os sistemas de plataformas, disponibilidade de dispositivos electrónicos, conectividade, estabilidade das redes, surgiriam mesmo que a covid-19 nunca tivesse acontecido. Deste modo, e sem querer ser pessimista, a imensidão das
tarefas que temos pela frente perpassa as recorrentes questões de legitimidade ou de hegemonia, para se estabelecerem numa contínua incapacidade competitiva e na indisponibilidade disruptiva. O senso comum, a rigor, com maior ou menor intensidade, colocou as nossas universidades e os cursos oferecidos como incapazes de responder ao mercado de trabalho, cada vez mais exigente e dinâmico. As estatísticas ditam que 30% do capital humano produzido pelas universidades, consegue entrar para o mercado de trabalho com predominância dos sectores da saúde, da educação e do sector terciário. Por conseguinte, este imenso capital humano que continua sendo formado a cada ano, fruto de uma opção inicial e necessária, pela massificação do ensino superior fica voltado ao designado empreendedorismo ou susceptível à disputa de espaços secundários no sector produtivo. Estes resultados, associados à baixa integração profissional, fraca produção de conhecimento e pouco impacto à melhoria das condições de vida, espelham a necessidade de um maior investimento ao ensino superior. Aliás, nestes tempos de covid-19, espera-se que o envelope financeiro dedicado a consolidar o acesso seja mais robusto, tanto mais não seja para conjugá-lo a uma dimensão que, neste ano, está em muito comprometida: o sucesso. A recente sessão extraordinária denominada Encontro Global da Educação, a propósito da educação pós-covid-19, organizada pela UNESCO entre os dias 20 e 22 de Outubro de 2020, priorizou exactamente essa importância ao destacar, na sua Declaração, a necessidade do investimento no ensino superior, especialmente necessário para o corpo de funcionários afectos ao ensino superior, considerados como “trabalhadores da linha de frente” (UNESCO, 2020). Os Estados, e o Estado moçambicano em particular, têm enfrentado este contínuo desafio de financiar o ensino, a pesquisa e até a extensão. Dito por outras palavras, são os financiamentos do Estado que terão de retornar à sociedade e ao País como centros de geração e difusão de
As universidades públicas enfrentaram, nas últimas três décadas, crises de legitimidade, de hegemonia e, naturalmente, crises institucionais e tecnológicas. Todas agravadas pela covid-19
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As universidades moçambicanas estão atrasadas em relação às da África Austral no que diz respeito à pesquisa e inovação
conhecimento, como a inestimável contribuição, que proporcionará à economia capacidade de lidar com todos os desafios de crescimento económico e bem-estar social. Mas estas parecem ser meramente as armadilhas doutrinárias. Reconhecemos que uma nação mergulhada na ignorância e instabilidade pagaria um preço duplamente mais penalizante. Moçambique, se comparado aos países da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), se preferirem, aos países da Africa Austral, que temos sempre como referência, ainda se encontra distante dos rankings, quer em termos de número de estudantes que frequentam o ensino superior, quer como um país de pesquisa e inovação. Segundo o mais recente ranking do 4 International Colleges & Universities (2020), das dez melhores universidades da região, oito são sul-africanas e a nossa melhor (a mais antiga) ocupa a posição número 29, seguida da segunda mais antiga na posição 141. Nestes corredores dos rankings, desta feita da Times Higher Education – World University Rankings 2021, a melhor universidade africana (Cape Town) ocupa uma posição invejável (155ª), com uma pontuação de 42.1 no item pesquisa e 30.1 no ensino. Neste ranking das 200 melhores universidades, segundo a THE, não constam universidades dos PALOP, ou sequer do espaço CPLP. Ainda assim, nos conforta-nos a posição intermédia em publicações ao nível da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), onde aparecemos imediatamente a seguir ao Brasil e Portugal e competindo com Angola. Estas comparações, e esta pequena análise sobre as crises, remetem-nos para alguns dos desenvolvimentos recentes que estão associados à aprovação e eventual entrada em funcionamento de 13 novas instituições de ensino superior em Moçambique. Em tempos de crise, mais instituições? Umas ostentam a designação de universidade e outras são institutos superiores. Para um e para outro caso, trata-se de instituições de nível terciário e que, por conseguinte, concorrem não apenas para as estatísticas das quais nos refewww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
renciamos antes, mas, e sobretudo, para dar corpo ao sonho dos jovens ávidos por uma formação técnica diversificada e condizente com a era digital e com o já gasto discurso sobre os recursos naturais. Portanto, quando tudo indicava que a covid-19 e as diferentes crises financeiras e tecnológicas iriam amainar as tendências de crescimento das instituições de ensino superior e desenfrear a sua expansão pouco competitiva, eis que a resiliência do nosso mercado prova um viés contrário às tendências regionais e globais. Depois de um longo período de expansão universitária por todo País, começava a ser tempo de consolidar as instituições, potenciá-las e beneficiar dos ganhos da sua existência e do capital gerado. A tendência, acreditávamos, seria a de que as universidades e instituições de ensino superior existentes pudessem começar a competir, de forma mais firme, nos rankings regionais e internacionais, oferecendo soluções e alternativas para enfrentarmos as crises económicas, pandémicas, sociais, culturais e até as crises de identidade. Sucede, porém, que uma nova vaga de instituições de ensino superior, que oferecem, em rigor, a mesma oferta formativa, que não tem uma preocupação de se expandir para além do eixo Maputo-Matola-Boane, não se apresentam, a priori, com as preocupações reais de servir a juventude nas regiões mais carentes e mais necessitadas. Continuamos em busca de um mercado que já se apresenta saturado, descapitalizado e com debilidades fundamentais tecnológicas e de conectividade. Para agravar ainda mais esta situação, que tem de preocupar a todos, e a cada um, debatemo-nos hoje com um dispositivo legal cujo mérito não pretendemos discutir, mas que deixa lacunas e dúvidas profundas para as instituições públicas, principalmente para as mais estabelecidas e que investiram profundamente na formação do seu capital docente internamente e no estrangeiro, ao longo de anos. Segunda parte deste artigo continua na próxima edição da E&M
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especial
Covid-19 e terrorismo ensombram um 2020 de maior investimento O ano de 2020 confirmou que o maior investimento de África está no norte de Moçambique. E esse podia ser o tema que faria eclipsar qualquer outro, não fosse o covid-19 e a crise humanitária provocada pelo terrorismo em Cabo Delgado
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Texto Luís Fonseca, * Serviço especial da agência Lusa para a E&M • Fotografia Ricardo Franco
balanço de 2020 na área da Economia em Moçambique fica marcado por um evento que é também relevante para África: o consórcio da Área 1 da bacia do Rovuma, ao largo de Cabo Delgado, conseguiu angariar 15,8 mil milhões de dólares de agências financeiras e bancos para a construção de infra-estruturas para a produção de gás natural liquefeito (GNL). Moçambique passa a acolher o maior investimento privado sob financiamento em África. “Estão garantidos recursos suficientes para o financiamento de todo o processo e construção das infra-estruturas”, declarou Max Tonela, ministro dos Recursos Minerais e Energia, a 03 de Julho. Uma reunião em Maputo entre o governante e o presidente de Exploração e Produção da petrolífera Total, Arnaud Breuillac, assinalou o mar-
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co histórico. Agências de comércio externo e bancos garantiram os 15,8 mil milhões de dólares que faltavam para completar o orçamento total de 23 mil milhões de dólares. O ano de 2024 continua a ser a meta para o início da produção, apesar dos obstáculos. O covid-19 foi um deles, mas atingiu o projecto numa fase inicial – em que decorrem sobretudo processos de ‘procurement’ e engenharia –, o que permitiu manter o cronograma para o arranque das principais obras no terreno em 2021. Os ataques terroristas com ligações extremistas ao grupo jihadista Estado Islâmico e outras ainda por esclarecer têm poupado o recinto de investimento, mas colocam mais pressão sobre a segurança e logística – com a petrolífera Total a apoiar as tropas moçambicanas. A escalada do conflito em 2020 representa um risco acrescido.
O ano do terror Vilas tomadas de assalto e ocupadas. ‘Raids’ destruidores. Massacres. Os ataques de grupos armados em Cabo Delgado cresceram para níveis inéditos em 2020. Os ‘malfeitores’, como eram rotulados pelas autoridades, passaram a ser designados de terroristas e o impacto da guerra no norte de Moçambique nas despesas do Estado e no ambiente de negócios passou a ser factor incontornável em todas as análises de consultoras ou outros organismos - como o Banco de Moçambique. A despesa do Estado cresceu e o conflito armado foi, ao lado do covid-19, uma das principais justificações do Governo para apresentar um Orçamento de Estado rectificativo para 2020. Os números do terror são avassaladores e seguem uma infeliz tendência para aumentar. A violência armada em Cabo Delgado dura há três anos e está www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
balanço 2020 Acontece que têm uma reserva de gás em comum que agora passou a ser prioridade, porque é mais barata de explorar do que as que têm em separado. Mas como é um cofre de tesouro partilhado, há que negociar o quinhão de cada parte. “Eles querem usar primeiro o gás mais barato”, enquanto a economia mundial não recupera do covid-19, disse uma das fontes à Reuters. O sucesso nas negociações pode ser particularmente importante para a Exxon, que ainda precisa de atrair os investidores antes de uma decisão final de investimento (FID), sucessivamente adiada no seu projecto Rovuma LNG, de 30 mil milhões de dólares, que várias fontes agora não esperam antes de 2022. O da Total já avança e deve iniciar produção em 2024. Antes, em 2022, arranca a produção de uma plataforma flutuante da Área 4, mas de menor dimensão. O projecto Mamba adiado pela Exxon representa mais de metade do total de exportação de gás previsto nas contas do Estado moçambicano para colocar o País a crescer na casa dos 10% ao ano na próxima década. O director-geral da Exxon Mobil em Moçambique, Jos Evens, disse em Outubro que seria especulação
do. A mineradora brasileira Vale tem capacidade instalada para produzir 12 milhões de toneladas de carvão por ano (o principal produto de exportação de Moçambique e que tem sobretudo a Ásia como destino), mas de Janeiro a Setembro não foi além de 4,6 milhões de toneladas. Em 2018 tinha produzido 11,5 milhões de toneladas e em 2019 oito milhões de toneladas. Em Novembro, a empresa anunciou obras de manutenção que vão aumentar ainda mais a capacidade de produção (para 15 milhões de toneladas a partir de 2021), certa de que a retoma pós-Covid-19 já aí está. No caso, não houve despedimentos (e os trabalhos de manutenção em Moatize, Tete, vão até criar mais emprego), mas a maioria dos moçambicanos, que vive das oportunidades da economia informal, queixa-se de um constante fechar de portas. No mercado formal, o Banco Mundial estima que o País tenha perdido 120 000 empregos devido à pandemia. Segundo os Indicadores de Confiança e Clima Económico (ICCE) do Instituto Nacional de Estatística (INE) moçambicano, só os sectores da produção industrial, transportes e comércio registaram “uma perspectiva de subida
Os ataques em Cabo Delgado cresceram para níveis inéditos. Os ‘malfeitores’ passaram a ser designados de terroristas e o impacto da guerra é incontornável em todas as análises a provocar uma crise humanitária com cerca de 2000 mortes e 500 000 pessoas deslocadas, sem habitação nem alimentos, concentrando-se sobretudo na zona da capital provincial, Pemba. Mas a fuga leva a uma dispersão crescente e a vaga de deslocados já chega ao centro do País. O fim desta crise é imprevisível, tal como a verdadeira dimensão do rombo económico no terreno e nas expectativas de segurança de quem quer investir no País. E, afinal, a Exxon Mobil? Neste cenário de insegurança crescente e de contracção económica por causa da covid-19, a Exxon (Área 4) e a Total (Área 1) procuram cortar despesas, escreveu a agência Reuters em Novembro, ao anunciar novas conversações entre as duas petrolíferas presentes no norte de Moçambique. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
indicar uma data para a Decisão Final de Investimento. “O futuro parece brilhante e confiável, mas apontar uma data é especulação. Depende de como o mercado evoluir nos próximos meses e anos e isso será um factor importante para os accionistas se juntarem e avaliarem a viabilidade do projecto”, referiu durante a Cimeira de Gás de Moçambique. Pandemia arrasa economia Talvez em 2021 se consigam vislumbrar melhor os estragos causados pela pandemia do covid-19 na economia moçambicana, mas parece desde já claro que, como no resto do mundo, os sectores da hotelaria e restauração levaram a maior machadada. No pódio das exportações moçambicanas, a indústria extractiva – que depende da procura exterior – também se ressente, embora o pior pareça já ter passa-
de emprego” após a queda a pique em todas as áreas de actividade nos três primeiros trimestres. Cenário agrava insegurança alimentar em 2020 A pandemia e a crise económica que lhe está associada estão a agravar a insegurança alimentar em Moçambique - que já afectava de forma crónica a cerca de 1,6 milhões de pessoas, segundo dados do Programa Mundial da Alimentação (PMA). De acordo com a análise periódica da rede humanitária de Alerta Antecipado de Fome (rede Fews, sigla inglesa), “prevê-se que a assistência alimentar cubra menos da metade das necessidades estimadas, de Novembro a Março de 2021, e algumas famílias provavelmente permanecerão em crise”. O último relatório salienta que este ano há um novo factor de agravamento: a
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Com o Covid-19 chegam os apoios externos Com a pandemia chegaram apoios diversos para compensar o impacto: o Governo elaborou um plano de necessidades orçado em 700 milhões de dólares (100 para prevenção e tratamento, 200 para apoio ao Orçamento do Estado, 240 para transferência para as famílias e 160 para micro-negócios). Até final de Outubro, Moçambique tinha recebido pouco mais de 461,7 milhões (66% do total pedido), segundo o mais recente relatório publicado no portal do Ministério da Economia e Finanças. O Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Mundial, Banco Africano de Desenvolvimento (BAD), Fundo Global e os EUA são os principais parceiros.
A par da UE, várias organizações multilaterais têm canalizado os apoios a Moçambique para combater a pandemia e os efeitos nefastos dos ataques armados pandemia do covid-19 que fez alastrar as zonas de crise alimentar a muitas famílias em áreas urbanas. Por outro lado, o novo Coronavírus está também a deixar subfinanciada a ajuda humanitária. “O quadro agrava-se quando falamos do sector de nutrição, que é particularmente subfinanciado, beneficiando de menos de 1% de toda a assistência destinada ao desenvolvimento”, realça o PMA. A agência das Nações Unidas nota que os doadores tradicionais “enfrentam também a crise sanitária e socioeconómica provocada pela emergência do novo Coronavírus”, pelo que “a mobilização de recursos é ainda mais desafiadora”. Dívida, nos mercados e nos tribunais Em 2020, a dívida pública de Moçambique equivale a 12 370 milhões de dólares, anunciou o ministro da Economia e Finanças, Adriano Maleiane, em Novembro, no Parlamento. Uma parcela de 16% daquele valor (cerca de 2000 milhões de dólares) é devida à China e foi empregue sobretudo para a construção de estradas e pontes, incluindo a via circular à capital, a ponte suspensa sobre a Baía de Maputo e as estradas a sul. Do total da dívida pública, 9850 milhões são dívida externa e o
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restante é dívida interna. Uma fatia de 44% da dívida externa, ou seja, 4350 milhões de dólares foram emprestados por instituições multilaterais como o Banco Mundial e o Banco Africano de Desenvolvimento (BAD). As dívidas das empresas Proindicus e MAM (Mozambique Asset Management) ligadas às dívidas ocultas do Estado foram excluídas desta apresentação. Maleiane explicou que o Estado accionou em tribunais de Londres processos contra o Credit Suisse e o banco russo VTB com vista à nulidade de ambos os empréstimos, tendo em conta o esquema fraudulento sob investigação e que terá estado na sua base – envolvendo figuras moçambicanas, banqueiros e o estaleiro naval Privinvest. Das dívidas não declaradas de 2200 milhões de dólares, Moçambique continua a suportar apenas o empréstimo original de 850 milhões de dólares à Ematum, uma vez que foi convertido em ‘eurobonds’, títulos soberanos. O regresso do apoio directo da UE O ano de 2020 ficou marcado pelo início de uma nova etapa na relação entre a União Europeia (UE) e o Governo moçambicano. Foi subscrito um apoio directo ao Orçamento do Estado de 100
milhões de euros, modalidade suspensa desde 2016 devido às dívidas ocultas e agora retomada por causa do covid-19, mas em diferentes moldes, anunciou a UE. “É um apoio orçamental específico, que está focado nas consequências dos impactos socioeconómicos do covid-19”, frisou António Sánchez-Benedito Gaspar, embaixador da UE em Maputo. O diplomata assegurou que o acordo está coberto por cláusulas de “monitoria e transparência”. “Estamos felizes por ter feito este programa específico de dois anos de duração, num montante de 100 milhões de euros, que vem acompanhado também de mecanismos de monitoria de controlo, de reforço da transparência da gestão pública”, sublinhou. A ministra dos Negócios Estrangeiros e Cooperação de Moçambique, Verónica Macamo, congratulou-se com a ajuda. “O retorno da União Europeia à modalidade de apoio directo ao Orçamento do Estado reflecte o compromisso da instituição de continuar a alinhar o seu programa com as prioridades do Governo”, declarou. O Fundo Monetário Internacional (FMI) manifestou, no final de 2019, disponibilidade para retomar as negociações, mas, entretanto, eclodiu a pandemia e o processo aguarda por novas datas. Entretanto, o FMI anunciou, em Abril, a entrega de 309 milhões de dólares ao Governo moçambicano para combater a pandemia, aliviar a balança de pagamentos e apoiar directamente o Orçamento do Estado. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
OPINIÃO
“Boas leis” para Moçambique e para o espaço lusófono Fabrícia de Almeida Henriques • Managing Partner da HRA Advogados & João Tiago Silveira • Sócio da Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados, Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, Investigador do CIDP – Centro de investigação de Direito & Diana Ettner • Consultora da Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados, Investigadora do CIDP – Centro de investigação de Direito Público
a
legística visa definir regras, métodos e boas práticas para a produção e redacção de textos normativos de qualidade. Dito de forma simples, a legística estuda como se devem preparar e redigir “boas leis”. Quando se fala em produzir “boas leis”, não está apenas em causa produzir leis juridicamente correctas. Ou seja, leis que, do ponto de vista do seu conteúdo, respeitem a Constituição e as outras leis em vigor ou que tenham seguido o procedimento correcto. Há mais do que isso. Quando se fala em produzir “boas leis”, está também em causa produzir leis que sejam claras, simples e eficazes, ou seja, que sejam facilmente apreensíveis por todos aqueles a quem se destinam e que cumpram os objectivos a que se propõem. Ora, esta dimensão da legística é fundamental por dois motivos muito relevantes: Por um lado, porque com leis claras e simples contribui-se para um melhor acesso ao Direito. Quanto mais claras e mais apreensíveis forem as regras, mais as pessoas conhecerão os seus direitos e poderão exercê-los convenientemente. Isto contribui para uma cidadania informada, responsável, motivada e construtiva, que é essencial para o Estado de Direito. Por outro, porque com leis claras e simples oferece-se maior segurança aos cidadãos e empresas que, moçambicanos ou estrangeiros, queiram investir no País. E isto é fundamental para incentivar mais investimento económico que, por sua vez, é essencial para criar emprego. Isto é, se os requisitos e condições para investir forem simples e claros, se os procedimentos a adoptar para aceder a uma actividade económica forem compreensíveis para todos, se as obrigações a que as empresas ficam sujeitas forem inequívocas, os agentes económicos sentir-se-ão mais confiantes para investir e para localizar as suas actividades
nos países onde seja oferecida essa estabilidade, previsibilidade e clareza. Portanto, a legística é fundamental em todas as áreas, desde a economia ao emprego, do sistema fiscal à administração da justiça, das questões de família aos temas da nacionalidade, entre tantas outras. Por exemplo, para um investidor é fundamental conhecer as regras sobre constituição de empresas em Moçambique e apreender facilmente os custos associados a esse procedimento. Do mesmo modo, será fundamental perceber facilmente como registar a aquisição de um imóvel ou que licenças necessita para realizar um projecto industrial. Para todas estas questões a lei deve providenciar respostas claras e simples. E esse é um objectivo essencial das regras de legística. Em Moçambique, não existe ainda um texto normativo que contenha e integre as regras de legística aplicáveis à produção de leis no País, seja no que se refere à redacção e sistematização dos actos normativos (a designada “legística formal”), seja no que respeita ao seu processo de definição e concepção (a designada “legística material”). Existem alguns elementos pontuais de legística noutros instrumentos, nomeadamente no regimento da Assembleia da República, mas não existe um regime geral que uniformize a forma de preparar e redigir actos nomativos. Ora, um diploma sobre legística para Moçambique seria muito relevante para alcançar os objectivos de simplificação, clareza e eficácia do ordenamento jurídico, e assim tornar o País mais atractivo para cidadãos e empresas, seja nas suas decisões de vida pessoal, seja nas suas opções de investimento. Mas a importância estratégica da definição de regras de legística manifesta-se também num contexto mais vasto, de que Moçambique faz parte, que é o do mundo lusófono. Na verdade, tendo por base o património comum partilhado
Quando se fala em produzir “boas leis”, está também em causa produzir leis que sejam claras, simples e eficazes... que sejam facilmente apreensíveis por todos aqueles a quem se destinam
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A Assembleia da República partilha, com outras entidades competentes, a responsabilidade de produzir “boas leis”
pelos Estados e Regiões Lusófonas, que é a língua portuguesa, mas também a semelhança das suas culturas jurídico-legais e a grande mobilidade dos seus cidadãos e empresas, é possível ir mais longe e ambicionar definir critérios, standards e regras comuns de legística aplicáveis em todos eles. Este é, aliás, o âmbito do projecto de investigação «Regras Comuns de Legística nos Estados e Regiões Lusófonas», desenvolvido pelo Centro de Investigação de Direito Público (CIDP) da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, que se encontra em desenvolvimento, e que conta com a participação de peritos de cada um dos ordenamentos envolvidos. Este caminho no sentido da definição de regras comuns de legística no espaço lusófono tem duas grandes vantagens, que podem e devem ser aproveitadas. Por um lado, a vantagem da criação de um espaço comum de legística que é vasto e abrangente, englobando nove Estados e Regiões localizados em continentes diferentes e geograficamente distantes (Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Região Administrativa Especial de Macau da República Popular da China, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste). Nesta dimensão, este caminho pode representar novas sinergias e relações cada vez www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
mais próximas e estreitas entre cidadãos e empresas destes Estados e Regiões, cujas regras legais se tornam assim (ainda) mais facilmente conhecidas e previsíveis. Por outro, a vantagem da definição de regras comuns de legística melhores e mais adequadas para todos, porque resultam de um processo de análise, reflexão e busca de soluções desenvolvido em conjunto por investigadores de todos os Estados e Regiões envolvidos, partilhando as suas experiências. De facto, o que se pretende com a definição destas regras comuns não é apenas somar as regras existentes para a redacção de actos normativos em cada Estado ou Região, consolidando essas práticas (o que só por si já seria um objectivo a prosseguir). Visa-se analisar as regras existentes em cada Estado ou Região, identificar as suas semelhanças e diferenças e, a partir daí, encontrar soluções melhores, mais coerentes e mais adequadas, que possam beneficiar das experiências de cada um e servir todos de forma mais eficiente. No contexto actual em que vivemos, marcado por circunstâncias tão únicas e excepcionais, este pode e deve ser um caminho a apostar: ter regras e práticas para fazer “boas leis”.
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Números em conta As marcas mais ‘Amadas’ do pós-Covid desde Março deste ano, a pandemia forçou milhões de pessoas a distanciarem-se fisicamente. Mas quando se trata de algumas das maiores marcas do mundo, novas relações foram forjadas e, de facto, os consumidores demonstraram um aumento de 23% no número de marcas com as quais têm uma ligação emocional. Então o que significa isto para as marcas? O gráfico abaixo destaca os dados do Estudo COVID da MBLM Brand Intimacy, que mede o quão emocionalmente ligados os consumidores nos EUA estão às marcas que utilizam e como estas
podem beneficiar. As marcas que alimentam laços emocionais com os seus clientes tendem a superar as empresas de topo listadas no S&P 500 e na Fortune 500, tanto em termos de receitas como de lucro. E se a Apple foi nomeada como a marca mais amada durante a pandemia (ocupava o terceiro lugar antes do covid-19), a lista das marcas mais amadas viu três novas adições ao longo do ano: Google, Youtube e Toyota, o que significa que as marcas de media e entretenimento dominam agora a lista.
AA como pple ultra p a a pan marca ma assou a Am d is populaemia, mu ‘amada’ azon du it femin ridade jun o devido à rante to ino e s dos m do públic ua illenn o ials.
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Duran te a emia nd Pa
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A indústria do retalho viu aumentar a sua performance global em 9,4% durante a pandemia. Google, Youtube e a Toyota entraram no Top 10. As marcas de Media e Entretenimento substituíram as de automóveis.
antes d a p As marcas mais ‘Amadas’ e o que suscitam nos consumidores Se é surpreendente que a Amazon tenha perdido a liderança, a Apple provou o seu valor respondendo às necessidades dos clientes.
Satisfação
Excede as expectativas de qualidade e eficácia.
Netflix ocupa a 8ª posição mas teve o segundo maior crescimento na sua ligação emocional com os consumidores desde o início da pandemia.
Indulgência
Cria relação centrada em momentos importantes.
Nostalgia
Focada em memórias do passado e familiaridade.
Ultimamente as ecossistema mo marcas que integram o bile aparentam bem-suced ser mais consumidores.idas na sua relação com os Especialmente da pandemia. desde o início
Ritual
Quando se assimila a marca no dia-a-dia.
Utilidade
Clientes tornam-se melhores através do uso.
Identidade
Reflecte uma qualidade aspiracional da marca.
Antes da pandemia
Durante a pandemia Fonte Estudo COVID-19 da MBLM Brand Intimacy
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OPINIÃO
Implementação de Leis de Conteúdo Local para o benefício das cadeias de valor
a
Hermano Juvane • Head of Oil & Gas, Coverage (CIB) Absa Bank Moçambique pesar de a definição de cadeia de valor ser ainda um ponto de discussão, a mais usada na indústria de Petróleo e Gás é a liderada pelo operador, seguida pela das empresas Engineering, Procurement and Construction (EPC) e subcontratos. Mas uma das partes por vezes esquecida neste contexto é a do conteúdo local que se divide em três partes importantes: panorama empresarial local, legislação governamental e comunidade em geral. A população moçambicana, a comunidade empresarial local e as organizações da sociedade civil (OSC) aguardam a aprovação e a ratificação da Lei de Conteúdo Local. Actualmente, existem legislações vigentes que regem os requisitos de conteúdo local. Um exemplo disto é o Decreto-Lei das Operações Petrolíferas 24/2004, que obriga os empreiteiros e proprietários de projectos a adquirir bens e serviços de empresas moçambicanas desde que as normas internacionais sejam cumpridas, e que o preço de venda, incluindo o IVA, não exceda o dos concorrentes internacionais em 10%. O mesmo foi revogado pelo Decreto-Lei 34/2015, cujo Artigo 55 garante que haja contribuição substancial para a produção ou a criação de valor de bens e serviços que sejam originadas localmente, ou por pessoas ou entidades moçambicanas. Vemos também que enquanto a aprovação da legislação pelo Parlamento moçambicano está pendente, os principais proprietários de projectos de LNG, como a Sasol, ExxonMobil, ENI e Total, estão a executar programas de capacitação para as empresas locais. O resultado final disto é um aumento da contratação de empresas locais. O projecto de LNG liderado pela Total, no valor de 20 mil milhões de dólares, está, actualmente, em fase de construção, na sequência da Decisão Final de Investimento (FID) sancionada em Junho de 2019. A fase de construção está programada para durar até 2024, passando o projecto, assim, para a fase de produção (First Gas). Esta é a etapa do projecto que indiscutivelmente apresenta o maior número de oportunidades para as empresas e talentos moçambicanos. Os patrocinadores do projecto Moçambique
LNG visam usar 2,5 mil milhões de dólares de gastos totais para empresas moçambicanas registadas localmente. Os restantes contratos foram e serão adjudicados a empresas altamente especializadas no fornecimento de bens e serviços técnicos, que a indústria local ainda não está preparada para fornecer. Prevê-se que o projecto empregue até 25 000 pessoas no pico da fase de construção. O agendamento do FID do projecto Rovuma LNG da ExxonMobil foi ainda mais afectado pela pandemia da COVID-19 em 2020, que impactou negativamente a rentabilidade do Grupo por barril de petróleo produzido globalmente. As crescentes preocupações em torno da agravada situação de insurreição em Cabo Delgado também não têm cooperado a favor da companhia petrolífera. Tal como o projecto Moçambique LNG, o projecto Rovuma LNG também deverá empregar até 25 000 pessoas no pico da fase de construção. Embora tenha havido manchetes que sugerem uma possível redução de custos em relação à estimativa inicial do valor do investimento de 30 mil milhões de dólares, seria seguro assumir que o valor do FID seria, pelo menos, de cerca de 20 mil milhões de dólares. Aproximadamente 60-65% de ambas as estruturas de capital do projecto consistirão em financiamento de dívida (ou seja, 15 mil milhões de dólares para o Moçambique LNG e +/- 13-15 mil milhões de dólares para o Rovuma LNG). Do capital total da dívida de ambos os projectos, mais de 80% é financiado por Agências de Crédito à Exportação (ECA) de vários países desenvolvidos, e o restante será financiado por bancos comerciais. O destino final do capital da dívida das ECA tende a ser os fornecedores dos bens e serviços técnicos e altamente especializados que são exportados para Moçambique, uma vez que um dos incentivos dos governos anfitriões das ECA é a criação de oportunidades de emprego. A ExxonMobil tem um historial de sucesso na contratação de elevadas percentagens de trabalhadores locais, com mais de 90% e 95% de emprego de pessoal local em Angola e Nigéria, respectivamente. Embora a definição de conteúdo local varie entre diferentes países e organizações, e seja um tema amplamente debatido em vários
Existem perigos que os agentes envolvidos na elaboração da política local devem evitar: a falta de responsabilização e monitorização dos objectivos e objectivos demasiado ambiciosos
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Muitos exemplos pelo mundo já demonstraram o quão desafiante é maximizar benefícios da exploração petrolífera. Moçambique também terá de lutar
fóruns locais; existe consenso sobre aquilo a que a sua implementação bem sucedida se deve traduzir em termos económicos. Alguns exemplos dos resultados desejados da elaboração e implementação bem-sucedida de políticas de conteúdo local seriam: - Uma elevada percentagem de contratos adjudicados a empresas locais e de propriedade local. Isto tornar-se-ia uma realidade no caso de um número adequado de empresas estar capacitado para fornecer bens e serviços de forma competitiva; - Mais de 50% das funções semi-qualificadas, qualificadas, profissionais e executivas serem ocupadas por nativos nas empresas petrolíferas locais, empresas de serviços de campos petrolíferos (OFS), contratantes principais, e empresas subcontratadas; - Mais de 50% dos pagamentos de fornecimentos por empresas petrolíferas e empreiteiros serem efectuados a empresas locais e de propriedade local. Em termos económicos, alcançar com sucesso os resultados desejados acima referidos traduzir-se-ia em: - Crescimento exponencial do produto interno bruto (PIB) da economia, uma vez que a adjudicação da maioria dos contratos a empresas locais e de propriedade local aumentaria as suas receitas para níveis acima da média. Estes são mais susceptíveis de se aplicarem a empresas de outros sectores para além do Petróleo e Gás, tais como Logística, expedição de mercadorias, bens consumíveis e Construção; - Um consequente aumento da contribuição fiscal, uma vez que o crescimento dos subcontratantes locais implicaria também um imposto mais elevado sobre as sociedades. O Governo de Moçambique (GdM) observaria, portanto, uma possível redução do défice fiscal, deixando margem para possíveis políticas fiscais expansionistas que poderiam estimular ainda mais o crescimento económico; - PIB per capita e rendimento por capital mais elevados levam ao aumento do volume de negócios nas diferentes camadas de sub-contratados, e a maior percentagem de nativos empregados significaria um www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
aumento quântico no pagamento de salários locais; - Redução do défice da balança corrente da economia. Para além de um aumento na percentagem de aquisição local de bens e serviços pelas empresas petrolíferas e subcontratantes, um Moçambique mais industrializado significaria também um aumento no consumo doméstico da população versus importações de bens e serviços que aumentam o défice da balança corrente. No entanto, existem certos perigos que os agentes envolvidos na elaboração da política local devem evitar. Por um lado, a falta de responsabilização e monitorização dos objectivos de conteúdo local poderia resultar em poucos incentivos para alcançar os mesmos, independentemente de quão boas as políticas parecem ser no papel. A Nigéria é a economia africana com a maior reserva de Petróleo e Gás, com um total estimado de 55 mil milhões de barris equivalentes de petróleo (BOE), e tem vindo a produzir petróleo desde 1952, após o Primeiro Petróleo da Shell. Apesar de várias décadas de desenvolvimento de políticas de conteúdo local, a monitoria mal-sucedida levou a que 95% dos 8 mil milhões de dólares do sector nigeriano de petróleo e gás em 2002 fossem utilizados para obter produtos e equipamentos do estrangeiro. Por outro lado, objectivos de conteúdo local demasiado ambiciosos e penalizações severas por incumprimento podem representar um risco elevado para uma economia não industrializada como a de Moçambique, com um número limitado de mão-de-obra especializada. Em 1953, o Presidente Vargas do Brasil proclamou um grau em que a Petrobras, a empresa petrolífera nacional daquele país, apenas utilizaria capital, trabalhadores e know-how locais. Apesar de ser uma nação mais desenvolvida do que Moçambique, isto representava alguns desafios. A reprodução de um tal decreto em Moçambique poderia colocar os proprietários do projecto numa posição comprometedora ou, possivelmente, posicionar negativamente o País como menos atractivo para investimentos em projectos de hidrocarbonetos.
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Nação
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Oil & Gas
Correr para ter trabalho O cumprimento das metas de criação de emprego local nos megaprojectos de gás natural que vão nascer nos próximos anos implica acelerar a fundo face ao que tem sido a realidade. O potencial existe, mas está por cumprir, numa verdadeira maratona corrida a alta velocidade
s
Texto Ricardo David Lopes • Fotografia Shutterstock.
e correr tudo como previsto no Plano Quinquenal apresentado pelo Governo em Março, nos próximos cinco anos vão surgir três milhões de novos empregos no País. A ideia é apostar nos sectores produtivos e geradores de renda, sobretudo para os mais jovens. Uma das apostas é o novo programa Sustenta, criado em 2017 e relançado em Março passado, focado no sector agrícola e seus relacionados. Tendo em conta o ritmo de criação de postos de trabalho dos últimos anos, a meta é ambiciosa, mesmo com o apoio de 500 milhões USD do Banco Mundial ao Sustenta, com o qual o Governo quer integrar a agricultura familiar em cadeias de valor produtivas e aumentar os rendimentos dos agregados rurais, promovendo a chamada “agricultura sustentável”, nas vertentes social, económica e ambiental. Entre 2018 e 2019, de acordo com dados oficiais (ver gráficos nestas páginas), foram criados cerca de 935 mil empregos, com uma ligeira aceleração no ano passado. O sector agrícola foi aquele que, em 2019, mais empregos gerou (cerca de 10% do total), mas, ainda assim, foram menos de 50 mil de forma directa. Este ano, com a pandemia de covid-19 a trocar as voltas a todas as previsões económicas, a criação de emprego caiu a pique: depois de um último trimestre de 2019 em que surgiram mais de 100 mil novos postos de trabalho, de Janeiro a Março deste ano há registo de menos de 60 mil. E, de Março e Junho, pior ainda: pouco mais de 42 mil. Tendo em conta os números, e somando-lhes o efeito depressivo da covid-19 sobre o investimento, este bem pode ser considerado “o” desafio económico do Governo de Filipe Nyusi, num País onde a taxa de desemprego não está longe dos 30% e onde a informalidade ainda é regra.
em parceria entre Governo e entidades privadas, irão contribuir para criação de emprego na agricultura”, afirma a responsável, para quem está em causa o cumprimento da “grande ambição” de se transformar Moçambique num país de excedentes agrícolas e menos dependente das importações de bens de consumo agrícola e não só”. E há mais vida para além deste sector, afirma a gestora. “O empenho que se tem dado à inclusão financeira, com a bancarização por via de plataformas digitais mesmo em zonas não urbanizadas, aliado ao regresso do apoio dos doadores a diversos projectos sociais ao nível dos distritos, irá igualmente contribuir para criação de emprego e oportunidades de novos negócios na área de bens e consumos, educação, agricultura e saúde”, prevê a directora, para quem algumas destas oportunidades poderão surgir já a partir do próximo ano. Por outro lado, acrescenta, a conclusão de projectos de reabilitação de infra-estruturas, estradas e linhas férreas “irá contribuir para o fomento de emprego em áreas como comércio a retalho e grosso, transporte e logística, bem como intensificação do manuseamento de bens em trânsito que, com o aumento dos volumes, necessitará de maior mão de obra”. “Com a consciencialização da nossa deficiente infra-estrutura e capacitação ao nível da saúde face aos diversos surtos que vêm assolando o País, bem como a capacitação de capital humano especializado nas respectivas áreas, perspectiva-se a intensificação de unidades sanitárias e instituições académicas, o que também irá contribuir para absorção da procura laboral”, afirma Martha Humbane. “As perspectivas de recuperação da economia para 2021 continuam positivas, com projecções de níveis mínimos de crescimento do PIB acima de 2%”, destaca a responsável do Absa.
Emprego vai chegar Mas nem por isso, defende Martha Humbane, directora de Negócios para a Banca Corporativa e de Investimentos do Absa Moçambique, deve instalar-se o pessimismo. “Os esforços que estão a ser empreendidos ao nível do projecto Sustenta,
Dar gás aos grandes projectos Paulo Pimenta, sócio da Pimenta & Associados, defende que “os grandes projectos relacionados com o gás, logística e transportes, portos, minas e energia são aqueles que poderão criar mais emprego” já em 2021, sobretudo na sua fase de
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O que fazemos
Onde trabalhamos
O Censo de 2017 refere haver cerca de 8,1% de pessoas ocupadas com mais de 15 anos. É evidente o peso da agricultura como ocupação principal dos inquiridos
Mais de metade das pessoas trabalha por conta própria
comércio e finanças
casa particular
desconhecido
684 194 empresa privada
487 394 869 376 desconhecidos
478 439 administração pública
719 486 outros serviços
343 079 conta própria com empregados
570 589 indústria manufactureira
199 382 empresa pública
205 378 construção
78 983 sector cooperativo
153 777 serviços administrativos
26 233 autarquias locais
94 976 transporte e comunicação
18 415 sem fins lucrativos
92 211 extracção mineira
17 716 organizações internacionais
60 376
agricultura, silvicultura e pescas
9 801 conta própria sem empregados
4 26
54 05 energia
trabalhador familiar
5 556
1 56 Fonte INE, RGPH 2017
afinal, Quem está sem trabalho? Em 2019 havia mais de 200 mil desempregados registados...
...A maior parte estava à procura do primeiro emprego
Em unidades
Em unidades
Mulheres
Procura novo emprego
50 406
93 528
Total desempregados
Total desempregados
189 846
189 846
139 440
96 318
Homens
Procura 1.º emprego Fonte MITESS, Boletim de Estatística do Trabalho, 2019
Onde é que estão os desempregados? Nampula, Cabo Delgado e Tete lideram o desemprego oficial % desempegados
Gaza
4,6
Manica Sofala
Niassa
0,3
6,3
6,8
16,4
Nampula
Maputo Província
Tete
8,5
13,1
Inhambane
9,6
Cabo Delgado
12,3 10,2 Zambézia
11,9
Maputo Cidade Fonte MITESS, Boletim de Estatística do Trabalho, 2019
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implementação, que envolve a construção de infra-estruturas, incluindo as próprias fábricas, estradas e áreas para alojamento e apoio à saúde. “O sector da construção irá gerar emprego no curto prazo, mas será igualmente importante que seja gerado no médio e longo, quando estes projectos entrarem na sua fase de velocidade de cruzeiro”, alerta o jurista, que recorda que “nesta segunda fase será naturalmente necessária menos mão-de-obra, mas em contrapartida esta será mais especializada e técnica, o que é bom para o País”. Também o sector da agricultura e florestas “poderá originar emprego, pois poderá permitir uma melhor fixação e distribuição da população nas zonas rurais e, desta forma, contribuir para evitar o fluxo de pessoas nos grandes centros urbanos, que já se encontram muito congestionados”, diz. O advogado reconhece que o Governo “está atento” a este aspecto, nomeadamente através de uma política destinada a promover o desenvolvimento rural”, mas lembra que “tal não www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
Oil & Gas
“Um projecto desta magnitude (Mozambique LNG) representa uma oportunidade significativa para a formação e desenvolvimento da mão-de-obra local” é fácil num País com um enorme potencial, mas com as dificuldades que são conhecidas por todos”. Total já empregou quase 6000 Na Total, protagonista do Mozambique LNG, o mega-investimento no sector do gás natural na área 1 da bacia do Rovuma, Cabo Delgado, orçado em 23 mil milhões USD, a palavra de ordem é de optimismo. “Um projecto desta magnitude representa uma oportunidade significativa para a formação e desenvolvimento da mão-de-obra local”, explica fonte oficial da empresa em Moçambique. Até agora, 5500 trabalhadores moçambicanos da área de construção “fizewww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
ram a entrega da nova Vila de Quitunda, do aeródromo de Afungi, da auto-estrada Palma-Afungi e de uma série de outros projectos essenciais para a construção da instalação de LNG propriamente dita”. “A experiência adquirida nestes projectos apoiará a capacidade desses trabalhadores moçambicanos de participar em futuros projectos, incluindo a construção da própria instalação de LNG”, avança a fonte, lembrando que “além da construção, o projecto apoiará posições locais em muitas áreas, incluindo desenvolvimento comunitário, procurement, engenharia, direito, finanças, geociências, saúde e meio ambiente, recursos humanos, tecnologia de informação, logística e manutenção”. A fase de operações terá 1500 empregos especializados locais, explica, revelando que, em Novembro, havia a registar “mais de 5900 moçambicanos empregues, representando 83% da mão-de-obra total” deste projecto. A fonte da multinacional francesa a operar em
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o desemprego cresce...
mulheres com pouco
Depois de subir lentamente de 2016 a 2018, disparou mais recentemente
Historicamente há muito mais homens do que mulheres a beneficiarem de oportunidades
Em milhares
Em milhares
189,8 Mulheres
181,4 177,4
179
2016
2017
145 115
169,5 2015
2018
Emprego registado
2019
478 904
... mas criação de emprego aumenta Foram mais de 21 000 novos postos criados em dois anos
333 789
Em milhares
Homens
2018
457 667
2019
478 904
pontos com mais e com menos empregos
projectos aprovados em 2018 O número de projectos cresceu menos do que a capacidade de expandir novos empregos Em unidades
Sem surpresa, a capital do País concentra a maior parte da mão-de-obra. Tete é a província com menos força de trabalho, apesar das reservas de carvão
2018
18 393 321
Em milhares
2019
29 818 335
maputo cidade
69 371
Empregos
Projectos
manica
56 913 nampula
55 700 zambézia
51 106 sofala
44 978 gaza
35 058 niassa
pandemia penalizou o sector do emprego Com a quase paralisação da economia houve aumento contínuo do desemprego Em milhares
102 331
59 642
42 150
4 Trim. 2019
1 Trim. 2020
2 Trim. 2020
34 648 maputo província
32 332 inhambane
29 074 cabo delgado
23 766 tete
21 606 minas da rsa
20 441 farmas da rsa
3 911
28
Fonte MITESS, Boletim de Estatística do Trabalho, 2018 e 2019
Moçambique assinala que o projecto “estabeleceu a meta de despender 2,5 mil milhões USD em contratos com empresas de capitais moçambicanos ou registadas em Moçambique durante a fase de construção de cinco anos”. “O nosso objectivo – em parceria com o Governo – está em adoptar medidas para aumentar a competitividade das empresas locais, para que possamos maximizar as oportunidades de participação nacional” no projecto. Até à data “mais de 917 milhões USD foram gastos com empresas de capitais moçambicanos ou registadas em Moçambique, dos quais mais de 206 milhões USD com empresas detidas por moçambicanos”. Contas feitas, mais de 365 empresas moçambicanas estão envolvidas, das quais mais de 200 são de capitais moçambicanos. A criação de emprego, lembra Paulo Pimenta, depende quer de investimento estrangeiro, quer de nacional, assim como de uma aposta reforçada no ensino e na formação profissional. Moçambique pode ser visto como um país “amigo do investimento”, afirma, mas “é importante acelerar os processos e a rapidez na aprovação e implementação de projectos. É essencial criar um ambiente de negócios favorável ao investimento, criar emprego e investir na formação profissional”. Martha Umbane, por seu turno, lembra que “existe já uma série de benefícios de investimento preconizados na Lei de Investimento que são suficientemente atractivos para a captação do investimento externo e interno”. Em causa, explica a directora de Negócios para a Banca Corporativa e de Investimentos do Absa Moçambique, estão, essencialmente, os benefícios fiscais e aduaneiros em função do montante, localização e sector de actividade do investimento, o crédito fiscal por investimento fora da Cidade de Maputo, o regime especial para investimentos em certas actividades e sectores, nas zonas rurais e no âmbito de leis específicas como Lei das Minas e também da Lei de Petróleos, para além de outros, www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
Oil & Gas diz a gestora. “A contínua divulgação dos incentivos de forma massiva e abrangente irá permitir adicional clareza e visibilidade dos incentivos já existentes e mais adequado aproveitamento dos mesmos por partes dos investidores internos e externos”, conclui. A Eni, que lidera o desenvolvimento do projecto Coral Sul, também no gás, um investimento de 7 mil milhões USD que deverá estar em operação em 2022, não respondeu em tempo útil às questões da Economia & Mercado sobre a criação de emprego. A Nacala Logistics, que integra as empresas que operam no corredor com o mesmo nome, não esteve, igualmente, disponível para avançar com uma previsão do que irá acontecer em termos de emprego no próximo ano e nos seguintes. A empresa, recorde-se, teve perdas de 16 milhões USD no terceiro trimestre, essencialmente por causa da quebra de actividade gerada pela pandemia do novo coronavírus. A Vale, que emprega cerca de 12 mil pessoas em Moçambique, também não indicou quais são as perpectivas de criação de emprego no próximo ano em Moatize, nas minas de carvão que explora. A empresa anunciou recentemente que vai avançar com o projecto Revamp, para atingir 15 milhões de toneladas em 2021. A renovação do complexo mineiro na província de Tete decorre entre Novembro deste ano a Março de 2021 e vai gerar 1300 empregos, mas temporários, indica um comunicado da companhia.
Nação
Petrodólares — Porque são mais os países que ‘desconseguem’ do que os que se desenvolvem Não são poucas as nações que têm ‘desconseguido’ fazer do Oil & Gas o verdadeiro motor de impulso ao emprego nos restantes sectores da economia, o que faz crescer as dúvidas sobre a prosperidade
u
Texto Celso Chambisso • Fotografia Mariano DR.
ma boa maneira de perceber, na prática, o que a exploração dos recursos naturais, essencialmente o petróleo e o gás, pode proporcionar de bom a uma economia leva-nos a começar por um dos poucos bons exemplos africanos: a Argélia.
De acordo com o Banco Mundial, nas últimas duas décadas, o boom dos hidrocarbonetos permitiu à Argélia fazer progressos no desenvolvimento económico e humano. O país liquidou a sua dívida externa, investiu em projectos de infra-estruturas e implementou políticas sociais redistributivas que contribuíram para uma redução significativa da pobreza, bem como para grandes melhorias nos Indicadores de Desenvolvimento Humano. A Argélia cumpriu os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas e é considerada como tendo atingido o ensino primário universal com uma taxa líquida de 97% de
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matrículas primárias em 2015, e com paridade de género. Também aumentou as taxas de matrículas no ensino superior, embora a qualidade do ensino ainda precise de melhorar. Mas este sucesso não deve ser visto, em si, como uma conquista permanente, afinal, a Argélia tem espaço para fazer ainda melhor. Com a indústria de hidrocarbonetos a representar 20% do PIB, 41% do Orçamento do Estado e 85% das exportações totais, o Banco Mundial entende que este país terá de mudar para um modelo económico mais diversificado se quiser sustentar taxas de crescimento económico mais elevadas e a criação de emprego, principalmente por estar a enfrentar um cenário de queda estrutural da economia causado pela descida do preço do petróleo no mercado internacional. Ou seja, mesmo sendo um país exemplar, a Argélia é permanentemente chamada a agir para manter saudável a ligação entre o sector perolífero e o resto da economia. Se as-
sim é com uma economia exemplar, o que será da grande maioria que, para já, inclui Moçambique? Uma questão que preocupa a todos… e a cada país Com muito poucos casos de sucesso, a falta (ou fraca) ligação entre a exploração de petróleo e gás com a criação de oportunidades de emprego noutras áreas, em África, é um denominador comum. Mas cada país apresenta uma particularidade que, em si, deve ser alvo de um estudo e intervenção específica. Uma nota actualizada do Banco Mundial mostra o quão vulnerável é a condição macroeconómica e de pobreza a que os maiores produtores africanos de petróleo estão mergulhados. Angola tem feito progressos económicos e políticos substanciais desde o fim da guerra em 2002. No entanto, continua a enfrentar desafios de desenvolvimento que incluem a redução da dependência do petróleo e a diversificação da economia, a reconswww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
Oil & Gas em África perigo: alta dependência Oil & Gas Sempre que os preços caem, os principais produtores registam quebras no PIB que dificultam o desenvolvimento de sectores não petrolíferos e a criação de emprego. Em %
Peso Peso nas no PIB exportações Líbia
65
95
25
90
33,3
90
Guiné Equatorial
angola
Argélia
20
85
9
90
Nigéria
Nota Banco Mundial, World Economic Outlook e OPEP
trução das infra-estruturas e o melhoramento da capacidade institucional, da governação, dos sistemas de gestão das finanças públicas, dos indicadores de desenvolvimento humano e das condições de vida da população. Um vasta franja desta população vive na pobreza sem acesso adequado a serviços básicos. O país poderia beneficiar de políticas de desenvolvimento mais inclusivas e, para o efeito, foi lançado um programa de protecção social com um projecto-piloto de transferência monetária que irá beneficiar mais de 1,6 milhões de famílias vulneráveis até 2022 em todo o país. Na Nigéria, o crescimento é demasiado baixo para tirar a maior parte da população da pobreza. A fraqueza do sector agrícola enfraquece as perspectivas para os pobres rurais, en-
quanto a elevada inflação tem um impacto negativo na subsistência dos pobres urbanos. Apesar da expansão em alguns sectores, a criação de emprego permanece fraca e insuficiente para absorver a força de trabalho em rápido crescimento, resultando numa elevada taxa de desemprego (23% em 2018), com mais 20% da força de trabalho sub-empregada. Além disso, a instabilidade militar no Norte e a consequente deslocação de pessoas contribuem para a elevada incidência da pobreza. Sem reformas estruturais significativas da política, prevê-se que o crescimento a médio prazo se mantenha em apenas 2%. Na Líbia, a economia permanece extremamente vulnerável a choques na produção de petróleo e às flutuações
Apesar da expansão em alguns sectores, a criação de emprego na Nigéria permanece fraca e insuficiente para absorver a força de trabalho em rápido crescimento, resultando numa elevada taxa de desemprego (23%) www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
do preço. A diversificação rápida dos recursos de hidrocarbonetos é essencial para um crescimento económico mais forte, resiliente e inclusivo, o que é muito difícil de se concretizar perante um conflito militar que dura há nove anos. A Guiné Equatorial experimentou toda a extensão da crise da Comunidade Económica e Monetária da África Central (CEMAC) devido à sua grande dependência das exportações de petróleo e à falta de amortecedores suficientes, tais como depósitos governamentais e reservas internacionais. Para evitar uma grande dependência da exploração de petróleo, o Banco Africano de Desenvolvimento (BAD) já se tinha comprometido em apoiar a diversificação económica por meio de um programa que se concentrará, entre outros, na transformação agrícola. Como repassar o oil & gás para a economia? Uma das soluções sugere foco em três áreas-chave de intervenção no contexto de política pública, nomeadamente a compreensão e gestão do boom, o papel do sector das construções e a vinculação da indústria aos recursos (conteúdo local). Esta conclusão saiu de um estudo recente, conduzido pelo Instituto Mundial de Pesquisa em Economia do Desenvolvimento da Universidade das Nações Unidas (UNU-WIDER), uma organização académica internacional criada para promover a paz e o progresso reunindo os principais académicos do mundo para solucionar os problemas globais. Intitulado “Como os recursos naturais podem apoiar o crescimento inclusivo em África?”, os resultados da pesquisa baseiam-se na realidade estudada em cinco países: Gana, Moçambique, Tanzânia, Uganda e Zâmbia. De um modo geral, a pesquisa concluiu que uma das causas da fraca ligação entre o sector do oil & gas (e toda a indústria extractiva) e o resto da economia é o facto de os países detentores de recursos terem estruturas económicas e de exportação altamente concentradas em apenas alguns (poucos) produtos, daí a necessidade de descobrir como as receitas e oportunidades associadas às descobertas de recursos naturais podem ser mais bem utilizadas para apoiar a mudança estrutural e a diversificação. Assim, qual deve ser o alcance de cada uma das áreas-chave propostas?
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Nação A (preocupante) situação de Moçambique Outra pesquisa da UNU-WIDER sobre o estágio actual do País, intitulada “Indústrias extractivas e diversificação económica em Moçambique”, considera evidente que “é pouco provável que o sector extractivo possa ser usado em breve para financiar estratégias de transformação visionárias destinadas a alcançar a diversificação económica”. A publicação avança ainda que “devido à difícil situação fiscal do País e aos atrasos no desenvolvimento do sector do gás natural ao largo da costa do Índico, parece que as extractivas não vão disponibilizar receitas adicionais durante pelo menos mais uma década, se não mais”. Refere, igualmente, que se a crise fiscal resultar no aprofundamento da deterioração da provisão de bens e serviços públicos, o ambiente de negócios vai piorar para as micro, pequenas e médias empresas.
Compreender e gerir o boom… O boom é mal concebido e gerido. Pesquisadores da UNU-WIDER entendem que é aqui onde todos os problemas começam. Ou seja, “o tamanho da receita dos recursos naturais e a sua disponibilidade são duas questões que os políticos e o público muitas vezes não entendem bem”. A pesquisa refere mesmo que no Gana, Moçambique, Tanzânia e Uganda, o tamanho do boom de recursos naturais foi sobrestimado e o atraso no recebimento das receitas subestimado. Além disso, alguns países como Gana e Zâmbia, por exemplo, responderam às notícias sobre as próximas receitas de recursos aumentando as despesas públicas e acumulando dívidas bem antes da receita que entra em operação. “Uma falha crítica da gestão dos gastos públicos nesses casos tem sido a falta de sistemas eficazes para priorizar e seleccionar projectos de investimento e a falta de provisão adequada para os custos recorrentes de manutenção”, defende o estudo. … O papel do sector das construções… O sector das construções, ao tornar mais fácil transformar o esforço de investimento em resultados, é vital para transformar o potencial das receitas dos recursos naturais em realida-
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As empresas de extração de recursos operam, muitas vezes, quase exclusivamente com fornecedores estrangeiros. A maioria das empresas locais está concentrada na extremidade inferior da cadeia de suprimentos de. A falta de capacidade das empresas, acesso a insumos materiais, mão-de-obra qualificada e acesso ao financiamento restringem a capacidade das empresas de construção nacionais de expandir a produção, limitando a participação local na fase de construção do boom de recursos. Os pesquisadores revelam que um trabalho aturado nas reformas institucionais e políticas pode aliviar as restrições à construção. No Gana, Tanzânia, Uganda e Zâmbia, por exemplo, as mudanças nas políticas solucionam direitos fundiários urbanos confusos e atrasos na permissão de planeamento. Também defendem que, com planeamento, as habilidades de construção podem ser desenvolvidas localmente. …. Aumentar o conteúdo local Vários países criaram instituições para orientar os seus esforços de conteúdo local. No entanto, os pesquisadores revelam que as empresas multinacionais de extracção de recursos e os seus fornecedores de primeiro nível, continuam, muitas vezes, a ope-
rar quase exclusivamente com fornecedores de segundo nível estrangeiros. A maioria das empresas locais está concentrada na extremidade inferior da cadeia de suprimentos de recursos naturais. Ainda de acordo com a pesquisa, a integração de empresas nacionais na cadeia de valor dos recursos depende da capacidade dos Governos e da indústria de desenvolver uma parceria público-privada eficaz. “A criação de uma unidade localizada dentro do gabinete do Chefe do Estado ou Governo - para actuar como correctora entre as empresas multinacionais e as empresas nacionais - é uma forma de desenvolver essa parceria”, defende. Também é a favor da intensificação do treinamento das empresas locais para elevar as suas capacidades ao nível mínimo necessário para permitir que entrem nas cadeias de valor das multinacionais, através de um figurino previamente acordado com o design do treinamento e com o processo de qualificação por meio do qual uma empresa obtém o status de “fornecedor aprovado”. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
Nação “É preciso reinvestir com foco na indústria transformadora” Michael Sambo, do Intituto de Estudos Sociais e Económicos, não vê como se pode ampliar a capacidade de geração de emprego sem que se conheça a fundo o potencial do sector transformador
o
Texto Celso Chambisso • Fotografia Mariano Silva instituto de estudos sociais e económicos (iese) já vem abordando questões relativas à economia extractiva e conta com um vasto leque de publicações sobre o tema. Michael Sambo, economista e pesquisador da instituição, a preparar uma publicação sobre os fundamentos do Investimento Directo Estrangeiro com incidência sobre a Indústria extractiva, a ser publicada em breve, fala do que fazer para se ter uma Indústria extractiva que, de facto, possa trazer desenvolvimento socioeconómico visível. O IESE é conhecido pela sua posição firme sobre a necessidade de reter os benefícios do sector extractivo. Para começar, importa entender como avalia a ligação que se estabelece entre este sector com outros não extractivos na economia. A ligação não é um dado adquirido porque depende da estrutura da economia e de como os diversos processos de produção inerentes à indústria extractiva articulam com os sectores não extractivos. Assim, quanto mais estruturada e diversificada for a economia – implicando uma maior disponibilidade e diversidade de serviços e existência de outras indústrias transformadoras –, maiores serão as ligações que se vão desenvolver entre os diversos sectores da economia com o sector extractivo. Ao contrário, isto é, quanto menos diversificada e estruturada for a economia, como o caso de Moçambique,
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menores serão as possibilidades de ligação e articulação. Vários estudos anteriores indicam que a indústria extractiva tem fracas ligações. Moçambique está na rota do desenvolvimento da indústria de gás. Já se fala da necessidade de assegurar que outros sectores de actividade sejam alimentados a partir daqui. Na sua óptica, quais os sectores que facilmente se podem beneficiar da dinâmica da produção e exportação do gás? Dada a estrutura económica do País, que é altamente concentrada na indústria extractiva e com uma indústria transformadora ainda incipiente, os outros sectores que poderão acompanhar o desenvolvimento da indústria de gás incluem as Infra-estruturas, Transportes e Serviços. Estes sectores tendem a acompanhar a dinâmica da indústria extractiva por serem fundamentais à prossecução da actividade deste sector. A experiência mostra que aqueles sectores tendem a atrair investimento externo imediatamente a seguir aos períodos de expansão do IDE da indústria extractiva, dando indicação de haver limitações da economia moçambicana em prover serviços satisfatórios à indústria extractiva. Este facto leva a compreender que as ligações intersectoriais tendem a ser feitas com empresas estrangeiras tecnologicamente mais avançadas e mais competentes que as nacionais, o que pode, por sua vez, implicar que essas ligações intersectoriais podem não se traduzir
em benefícios ao empresariado nacional, dependendo da capacidade deste de se organizar e prover serviços nos padrões internacionalmente exigidos. Que factores o levam a apontar a indústria transformadora como a aposta certa para aplicar o investimento do gás, se nem a esse nível Moçambique apresenta algum potencial? E a que áreas da vasta indústria transformadora se refere? Por exemplo, a indústria têxtil praticamente já não existe. A alimentar está agora a ressurgir, mas está concentrada na área de bebidas, sendo que tem espaço de expansão capaz de fornecer ao mercado interno. A indústria da borracha, tão básica que é, mesmo assim qualquer acessório, por pequeno que seja, é importado a custos muito altos. Se começássemos a trabalhar na indústria de borracha, dávamos início ao processo de substituição de importações. Também sou completamente a favor da indústria metalomecânica que permite a criação de produtos que podem ser usados em diversos sectores. Por exemplo, a nossa agricultura continua a ser predominantemente familiar de pequena escala, mas com uma indústria metalomecânica mais desenvolvida seria possível criar outros instrumentos de trabalho para a agricultura e outros sectores sem ter de depender da imwww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
Entrevista de para a gestão do Ministério da Economia e Finanças, então, o Orçamento do Estado sofrerá o efeito da flutuação dos preços no mercado internacional. Por isso, há necessidade de a receita ser reinvestida na economia, sendo, para isso, necessário um bom plano de utilização, que vá além da mera consignação para despesa pública. Mais do que a poupança para benefício das futuras gerações, o investimento na economia e as suas ligações irão beneficiar essas gerações muito mais do que apenas ter um fundo de poupança, já que este só sai em casos de flutuações de preços para apoiar o Orçamento do Estado. Penso que aqui há menos benefícios porque a economia continua dependente tendo um grande fundo estagnado enquanto o empresariado continua a precisar de capital para investir.
“Se o Estado financiar o empresariado na indústria metalúrgica, transformadora, têxtil, alimentar, metalomecânica… o potencial de geração de emprego poderá expandir-se consideravelmente” portação. Isto é, produzir para apoiar a produção de outros sectores. A indústria petrolífera é de capital intensivo, pelo que já se sabe que não deve trazer mudanças extraordinárias em termos de novas oportunidades de trabalho. Mas olhando para outras realidades pelo mundo, sobretudo em África, de que forma Moçambique pode transformar o gás em postos de trabalho fora do gás? Não havendo ligações intersectoriais ou com as ligações ainda fracas como acontece em Moçambique, a criação de novas oportunidades de trabalho pode passar necessariamente pela colecta de receitas do gás e o seu reinvestimento na economia. Falamos em reinvestir e não da proposta que se está a avançar com a ideia do Fundo Soberano. O debate que agora há sobre o Fundo Soberano prevê colecta de receitas e sua aplicação financeira pelo Banco de Moçambique interna ou externamente, além do apoio na cobertura do persistente défice ao Orçamento do Estado. Na lógica desta proposta, o Estado não criará postos de trabalho com bawww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
se nas receitas provenientes do gás. Alternativamente, se o Estado, através do Banco de Moçambique, financiar o empresariado nacional em sectores-chave da economia e fora do sector extractivo, como a metalúrgica, transformadora, têxtil, alimentar, metalomecânica e outras com efeito multiplicador, o potencial de geração de postos de trabalho poderá expandir-se consideravelmente, ao mesmo tempo que se diversifica a base produtiva da economia e se expande o potencial de captação de receitas fiscais para o Estado. Quer dizer que não é altura certa para se avançar com um Fundo Soberano? Porquê? É importante notar que mesmo Angola, Nigéria, etc., têm um Fundo Soberano, mas não determina a diversificação da economia. Estes países continuam a sofrer com as flutuações dos preços das commodities no mercado internacional, tanto que, quando existem baixas de preços, os seus orçamentos se ressentem. Visto que a proposta avançada pelo Banco de Moçambique é a de que vai gerir 50% da receita e disponibilizar outra meta-
Que lição se pode tirar do exemplo do carvão que, estando a ser explorado há mais de uma década, parece não ter impacto no emprego e noutras áreas como a agricultura, por exemplo (embora seja determinante no volume de exportações nacionais)? Um dos grandes problemas é a estrutura da nossa economia que não está devidamente preparada para responder às demandas de outras indústrias em termos de provisão de serviços necessários ao seu funcionamento. Por exemplo, no sector do carvão, em Tete, o boom das construções habitacionais chegou a ser enaltecido como um marco importante da dinâmica da sua exploração. Com o crescimento dos condomínios, começou-se a projectar uma perspectiva positiva. Mas mais tarde tudo “murchou” porque as próprias multinacionais acabaram construindo edifícios que anularam o efeito dos investimentos privados anteriores. Na área de infra-estruturas, a construção da linha ferroviária Moatize-Nacala para o escoamento do carvão levou a conflitos porque não havia abertura para que a via fosse usada por outros sectores e para a dinamização do comércio. Além disso, a negociação dos contratos não terá sido favorável ao Estado porque a captação de receitas não trouxe grandes oportunidades de reinvestimento na economia. Por isso, com os novos projectos de gás, é importante que haja uma negociação salutar, favorável em termos da receita fiscal para o País.
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mercado e finanças “Não deixámos de ser o que éramos, mas queremos ser mais” Rui Barros, administrador-delegado do Absa Bank, fala dos (bons) resultados do banco num ano “desafiante” a todos os níveis
a
Texto Pedro Cativelos • Fotografia Mariano Silva 11 de novembro a nova marca do Absa completou um ano. É um ano depois de ter deixado de se chamar Barclays, num processo que, segundo o administrador-delegado do Absa, Rui Barros, demorou três anos a ser preparado, tendo incluído, numa fase inicial, a negociação e o alinhamento com o Barclays sobre o que devia ser feito, depois todo o planeamento mais detalhado de constituição das equipas, entre outros aspectos. Nesta entrevista, Rui Barros faz um balanço de todo o processo de mudança a que se assistiu mas, mais do que isso, traz em exclusivo o novo perfil da nova instituição, a qual considera estável (mesmo que não tenha escapado aos efeitos negativos do covid-19) e determinada a estar mais próxima de toda a população. Qual foi o ponto mais crítico do processo? Terá sido a parte técnica, a imagem ou fazer perceber que era um banco diferente apesar de ser o mesmo grupo? Nós já estávamos a trabalhar muito no tema da cultura organizacional e julgo que as pessoas mais atentas, os nossos clientes, terão percebido que antes de o banco se tornar Absa já estava a mudar de atitude. Era a nossa estratégia enquanto banco desde há alguns anos que, obviamente, foi acelerada e amplificada com esta mudança de marca. Nós não só continuámos no caminho que já vínhamos a traçar nos anos anteriores como repensámos a nossa identidade enquanto Grupo. Portanto, ao mudarmos a marca e o logótipo mu-
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dámos muito mais do que isso: a nossa africanicidade, a nossa forma de pensar o negócio em que estamos envolvidos, o futuro desde continente e o papel que podemos ter para o apoiar. Assim, eu diria que esse será ainda hoje o aspecto mais importante que já vinha de trás e que estava aqui em Moçambique numa organização que se estava a transformar há alguns anos. Gostava de comentar que, ainda assim, houve aspectos bastante complexos e momentos particulares muito complicados. Nós alterámos cerca de 100 sistemas que operam no banco e muitas destas coisas foram feitas aos fins de semana, em que muitos de nós passámos várias horas a garantir que tudo corria bem. Este plano de mudança de marca está consumado há um ano, mas podemos considerar que já esteja terminado ou vai continuar? Em termos de imagem, o processo foi dado como concluído. Naturalmente que temos a necessidade de fazer manutenção e revisão das coisas ao longo do tempos mas, naquilo que surgia como mudança de marca, o processo está completamente concluído. Felizmente, concluímos com todos os prazos que tínhamos previsto. Contudo, a imagem é apenas uma parte da identidade que para nós é, acima de tudo, o elemento que se vê na atitude das pessoas, na forma como nós queremos chegar mais longe e ajudar mais gente. Nestes aspectos ainda temos muitos desafios pela frente. Continuamos a crescer e a querer encontrar aquilo que melhor pode servir este País.
Esta mudança teve um impacto grande na diminuição do lucro e no crescimento que vinham apresentando nos últimos anos. Começando aí, que balanço faz deste ano atípico? Sente que o mercado acolheu esta mudança? Sem dúvida que seis meses depois (ou até menos) de termos mudado de marca, estarmos no meio de uma pandemia não ajuda na consolidação de um projecto, de uma marca ou de uma identidade. Mas, felizmente, tem sido um sucesso. Temos, neste momento, um nível de reconhecimento da marca muito elevado, superior às expectativas que tínhamos quando a lançámos há um ano. Julgo que até existe alguma percepção, digamos, empírica, de que as pessoas reconhecem isso, mas temos também estudos que nos permitem quantificá-la. Pensando um pouco na lógica do investimento e da performance financeira que, no fundo, pode ser parcialmente o reflexo do sucesso da estratégia do banco e do lançamento da marca, a verdade é que houve grande investimento nos últiwww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
Entrevista aquilo que sempre fomos. Nos últimos anos, este tornou-se num banco mais corporate e, nesta medida, continuamos a ter uma actividade muito forte nesse segmento: apoiamos as grandes empresas, apoiamos o Governo, trabalhamos ao nível das cadeias de valor e, portanto, com diferentes dimensões empresariais, mas numa lógica corporate. A verdade é que temos agora condições para podermos ser mais universais e capazes de chegar mais longe no mercado de retalho, no mercado de particulares, nas PME e podemos conseguir corresponder às expectativas e necessidades de toda a população. É obvio que esse é um caminho que tem de ser feito. A pandemia trouxe-nos alguns desafios neste caminho, mas também trouxe algumas oportunidades, nomeadamente a forma como muito rapidamente estamos a ver uma adopção digital ou tecnológica da banca por todo o País. Temos de ser capazes de oferecer ferramentas para que todos possam aceder aos nossos serviços. Eu diria que não deixámos de ser o que éramos, mas queremos ser mais e expandir a esse nível, trabalhar o mercado como um todo com alguma diferenciação, dar às pessoas aquilo que elas procuram e que não é igual para todos.
Temos um nível de reconhecimento da marca muito elevado, superior às expectativas que tínhamos quando a lançámos há um ano. Julgo que até existe alguma percepção empírica de que as pessoas reconhecem isso mos anos e, portanto, a nossa base de custos aumentou especificamente por causa disso. Nós tivemos o cuidado de comunicar ao mercado quais seriam os nossos resultados normalizados, ou seja, se não houvesse custos extraordinários que no futuro não se prevê que se repitam e, nesse aspecto, a nossa performance foi também muito boa e isso prolonga-se um pouco para 2020. Mas o pior em termos de performance financeira tem que ver com a queda contínua das taxas de juro – e noto que isto começou em 2019. Em 2020 acresce-se a redução da actividade económica. É um período em que investir na nossa marca e na nossa presença neste mercado sofreu algumas limitações. Que dificuldades, em concreto? Por exemplo, desde o início da pandemia, algumas iniciativas de promowww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
ção da marca não estão a acontecer e, portanto, temos menos oportunidades de comunicar como tínhamos planeado. Os resultados, depois de ponderar tudo isso, eu diria que são fantásticos. Quer o do ano passado com o lançamento da marca, receptividade imediata e resultados financeiros que tivemos, quer o deste ano com as condições que estamos a viver de aumento contínuo dos nossos indicadores de confiança através dos inquéritos que vamos fazendo ao mercado, do reconhecimento da marca, de referenciação e de satisfação com os nossos serviços. O que é que nota no desempenho do Absa face ao Barclays? A base corporativa mantém-se e houve, eventualmente, um reforço na parte universal ou de retalho? De facto, nós não deixámos de ser
Qual foi a maior dificuldade que a pandemia trouxe? O factor mais importante é a interação humana dentro de casa. Porque, de facto, embora a tecnologia existente seja muito útil para nos manter activos e produtivos, a verdade é que num ambiente como o nosso, numa organização que tem vindo a trabalhar a cultura organizacional de colaboração, de inovação, de interacção em que damos valor e abertura para as pessoas poderem falar o que pensam e terem novas ideias, a distância é mais complicada. A partir de dentro, sentimos que impactou na nossa capacidade de partilhar a experiência dos mais velhos aos mais novos, etc. Por outro lado, tem um impacto externo. O contacto com o cliente, a forma como podemos acompanhar a sua actividade ou as suas necessidades, a forma como podemos ouvi-lo ou ajudá-lo ficou limitada. Um dos principais impactos disto é a redução da actividade comercial que também tem impacto financeiro. Mas estes são efeitos de curto prazo que toda a gente tem de perceber em 2020 e, se calhar,
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mercado e finanças ria que em 2020 o principal fenómeno a observar será um aumento muito significativo da linha de imparidades em todos os bancos. Também temos de olhar para a linha de proveitos para perceber se o volume de negócios se manteve, se a carteira de crédito, de depósitos ou o número de clientes aumentou, e com isso termos a indicação do que vão ser os próximos anos. Em termos de resultados, pelas razões que já indiquei, de certeza que haverá quedas muito significativas em todo o sistema. Nós estamos a tentar minimizá-las, mas sabemos que as vamos ter.
Sentimos que o covid-19 impactou na nossa capacidade de partilhar a experiência dos mais velhos aos mais novos, o contacto com o cliente, a forma de acompanhar a sua actividade, ou as suas necessidades... ainda em 2021. Mas tudo o resto terá de ser um conjunto de aprendizagens que vamos utilizar para benefícios de médio/longo prazo onde, estamos certos, de que tudo se irá recompor. Moçambique tem algumas condições específicas para sair mais rapidamente desta crise? Moçambique tem condições excepcionais na região. Já o sabíamos, mas, razões erradas (já que, naturalmente, ninguém queria uma crise como a que estamos a viver) fazem com que o País tenha condições ainda melhores do que outros países da região que não têm os mesmos argumentos. É verdade que têm papel importante os projectos de gás natural e tudo o que se pode criar em sua volta, as cadeias de valor que dali poderão surgir. E, muito importante, é a forma como a crise está a ser gerida. Nós não estamos a sofrer como alguns países da região em termos de número de casos e de saúde pública. Sem dúvida que o impacto económico e social que estamos a ter era inevitável, mas eu acredito que, a partir do momento em que o mundo começa a sair desta pandemia, e não tendo sido tão afectados, estaremos mais capacitados para recuperar noutras áreas. Por exemplo, o turismo pode estar mais rapidamente pronto para abrir as portas do que noutros países tipicamente vistos como con-
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corrência; a agricultura, onde o Governo tem estado a fazer grandes investimentos durante a pandemia, não só vai apoiar a produção e o consumo doméstico como também vai potenciar a exportação no pós-crise. Como tal, julgo que existem vantagens competitivas muito grandes e que esperamos que rapidamente venham a dar frutos. Qual é o impacto de um ano como este nas contas do banco? É similar ao impacto que tem na economia de um país? Todas as empresas vão ter impactos nos seus resultados muito maiores do que a queda do PIB no país em que operam. Na banca, há algumas considerações interessantes a fazer: a primeira é que os resultados líquidos podem cair bastante por diferentes razões sendo a principal, este ano, o nível de imparidades de crédito que decorrem não necessariamente do incumprimento efectivo dos seus clientes, mas as imparidades devidas à circunstância. Ou seja, o ambiente macroeconómico justifica um conservadorismo nessa matéria e a constituição de provisões que possam ser utilizadas se se materializar o pior. As próprias regras contabilísticas, hoje em dia, já o exigem e depois os bancos são entidades reguladas que devem ter cuidado na forma como gerem o seu balanço e a sua posição de capital. Assim, eu di-
Como é que está a questão da SIMO? Continuam a transitar ou já entraram no novo sistema? Ainda não está operacional e, obviamente, como banco operador, e também accionista como todos os outros bancos, vamos acompanhando este processo. O sistema ainda não foi alterado e estamos a caminhar a passos largos nesse sentido. Qual é a qualidade que descobriu que era mais necessária neste momento, enquanto gestor? Por exemplo, há quem fale em resiliência e há quem fale de solidez nas decisões. No seu caso, o que é que destaca nos momentos da sua liderança? Se calhar há duas. A primeira é sermos céleres a tomar decisões. Nos primeiros dois meses isso foi crucial. Por vezes é melhor tomar uma má decisão do que não tomar nenhuma, e acredito que reagimos muito rápido. Tomámos as medidas que achámos que eram apropriadas, ficámos a ver para corrigir se fosse necessário e, felizmente, não foi preciso grandes alterações. Mas há outro elemento que surge com força. É a comunicação. O facto de estarmos distantes fisicamente prejudica e por isso aumentámos muito o nível de comunicação entre todas as equipas e isto é algo que é feito pela organização como um todo, mas eu próprio tenho comunicado para todo o banco com muito mais regularidade, de forma aberta, a explicar como é que estava a acontecer, o que estávamos a fazer e como estávamos a pensar, ouvir as pessoas e, por vezes, a pedir a sua opinião. Por isso, esse diálogo foi muito importante e foi fundamental para a forma como ultrapassámos ou estamos a ultrapassar este momento. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
OPINIÃO
Parcerias nascidas no CEO
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João Gomes • Partner @ JASON Moçambique em o título deste artigo a propósito da já constante “chamada” das PME moçambicanas para participarem, activamente, através de Parcerias Empresariais Estratégicas (adiante “PEE”) com os grandes players, no desenvolvimento da cadeia de valor do Petróleo & Gás. Em estudo recente sobre o tema, realizado por uma consultora internacional, 80% dos CEO (Chief Executive Office) referiram estar à procura de desenvolver parcerias estratégicas. Contudo, 31% dos CEO inquiridos experimentou já o sabor do falhanço nas PEE em que participou. E neste contexto vale também o provérbio africano: “Sozinhos vamos mais rápidos, juntos vamos mais longe”. Neste artigo convido-vos a seguirem uma jornada na vida de uma parceria estratégica. E analisaremos como as parcerias empresariais podem ir mais longe, podem ser mais fortes, podem ser mais ágeis e assim tornarem-se estratégicas. O que é uma Parceria Empresarial Estratégica (PEE)? Sugiro a seguinte definição. 1- É um acordo formal , mas flexível; 2- Entre duas empresas que se conservam independentes enquanto organizações; 3- Que partilham, entre si, recursos/activos escassos; 4- Com o objectivo de, conjuntamente, superarem obstáculos/riscos; 5- E alcançarem objectivos estratégicos; 5- Repartindo justamente os benefícios/custos resultantes da acção comum; 6- Num período de tempo determinado, mas tendencialmente longo. Analisemos cada um dos componentes da definição acima apresentada. As parcerias meramente informais não são parcerias estratégicas. Mas, em regra, todas as PEE começam por ser parcerias informais, baseadas na confiança recíproca entre os líderes das organizações: diz-se a este propósito que as melhores parcerias nascem no CEO. Chegados a um ponto da viagem conjunta, os parceiros
informais consideram ser relevante juntarem forças (o chamado “efeito de massa crítica”) e (3) partilharem, entre si, recursos/activos escassos: por exemplo, quando duas empresas unem os esforços dos departamentos de Pesquisa & Desenvolvimento; ou quando duas empresas ligam partes das respectivas cadeias de valor (Produção; marketing) que são complementares entre si. E fazem-no para (4) superarem obstáculos/riscos: por exemplo, para mitigarem o risco financeiro resultante dos enormes custos iniciais da fase de exploração na indústria extractiva; ou para superarem o risco de incerteza tecnológica no desenvolvimento de um produto. E (5) alcançarem determinado(s) objectivo(s) estratégicos que, individualmente, muito dificilmente seriam alcançados: por exemplo, unirem-se para ganharem um concurso público para a realização de um projecto extraordinariamente complexo; ou unirem-se para ganharem economias de escala e servirem segmentos de mercado mais alargados; ou para agilizarem o processo produtivo e acelerarem o time-to-market. Nesta fase da caminhada em conjunto, secundando os líderes, um número cada vez maior de pessoas surge na relação de parceria, aumentando a respectiva complexidade e potencial de conflitualidade. Será tarde demais se não se tiver antecipado (1) o acordo formal de PEE. E a necessidade de mecanismos formais de comunicação e coordenação faz-se sentir com maior intensidade. De informal a parceria vai ganhando músculo e vai aumentando, exponencialmente, a necessidade de formalização dos termos e condições (T&C) de governação da mesma: por exemplo, num dos extremos encontramos formas contratuais mais simples como os contratos de simples partilha de recursos estratégicos, passando por acordos de associação empresarial. E no outro extremo, mais complexo, encontramos os contratos de outsourcing; as Joint Ventures. E com a formalização/burocratização, a PEE (1) vai perdendo em flexibilidade, na medida exacta em que vai ganhando em dimensão. É posto à prova o equilíbrio entre formalização e flexibilidade da PEE. Nesta fase da jornada, a PEE demanda por flexibilidade
Neste artigo convido-vos a seguirem uma jornada na vida de uma parceria estratégica. E analisaremos como as parcerias empresariais podem ir mais longe, podem ser mais fortes, podem ser mais ágeis e assim tornarem-se estratégicas
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Parcerias Empresariais Estratégicas possibilitam o alcance de resultados difíceis de conseguir individualmente
para poder responder rapidamente às ameaças que são frequentemente apontadas como as causas geradoras do falhanço, com estrondo, destas iniciativas. Neste contexto, a ausência de mecanismos de auto-regulação dos seguintes aspectos elimina qualquer possibilidade de construção de um PEE flexível e sustentável: (1) (4) - Objectivos desalinhados e/ou não ajustados às mudanças de contexto: por exemplo, uma parte a querer descontinuar um produto/serviço, e a outra a insistir na sua continuidade. - Falta de confiança entre as lideranças intermédias: por exemplo, quando os parceiros não promovem abertamente a parceria ou o parceiro no mercado e trazem para a parceria o “espírito de gestão por silo”. - Repartição dos “Papéis” e níveis de responsabilidade pouco claros: por exemplo, quando os parceiros disputam a quem pertence um cliente, ao invés de promoverem a satisfação, também conjunta, das necessidades do mercado. - Ausência de linhas claras de reporte, gestão de conflitos: por exemplo, quando as regras para escalar a resolução dos conflitos internos não são claras, ou até inexistentes. - A competição entre agendas: por exemplo, quando os parceiros têm preferências distintas em relação à pool de fornecedores estratégicos. - A apropriação de recursos da parte contrária: por exemplo, quando uma parte contrata colaboradores talentosos ou outros recursos estratégicos da outra parte, sem consentimento prévio daquela. - Indisponibilidade para investir em espécie, e não apenas em dinheiro: por exemplo, alocação de pessoal, tecnologia e activos fixos críticos. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
Mais adiante na jornada (mas sempre presente desde o momento zero da criação: lembrem-se, as boas parcerias nascem no CEO), alcançada a maioridade, o grande (2) desafio dos parceiros é o de manterem a independência e individualidade. O respeito recíproco pela cultura, pela diversidade, pelos valores e pela individualidade da empresa parceira são factores absolutamente chave para garantir a independência dos parceiros estratégicos. Neste contexto, para que se conservem independentes as PEE: - São baseadas em parcerias exclusivas. - Terão prévia e claramente definidas as condições de saída. - São limitadas no tempo (6): estudos apontam para uma duração média de sete anos (Joint Ventures). - Protegem previamente os activos estratégicos intangíveis que levam para a parceria: por exemplo, registando as marcas, as patentes. - Tratam com respeito e promovem o conhecimento e a proximidade entre as lideranças e chefias intermédias: por exemplo, através de acções de team building entre os parceiros. - (6) Repartem justamente os benefícios/custos resultantes da acção comum. Em conclusão: As Parcerias Empresariais Estratégicas nascem no CEO. Em síntese, proponho quatro equações para PPE de sucesso: 1 + 0= 0. Sozinhos valemos zero. Juntos somos mais fortes, vamos mais longe e saltamos mais alto. 1 + 1 = 1. O outro é igual a nós. Respeitar a diferença e valorizar a cultura é fundamental. 1 + 1 = 3. Sinergia. Ou existe, ou preparemo-nos para destruir valor, e não criá-lo. 1 + 1 = ½ + ½ . Tratamento justo interpares.
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EspecialInovação 46
Eventos híbridos
Como a multimilionária indústria dos eventos está, a nível global, a adaptarse ao ‘novo normal’, conjugando a força dos meios digitais com a indispensável presença humana.
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moogle
A App que leva o supermercado ao aparelho celular num clique
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Opinião
A inovação como arma de combate aos riscos cambiais
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As notícias da inovação em Moçambique, África e no Mundo
grandes eventos
Eventos Reiventam-se Para o Pós-Pandemia — Os Novos Formatos e Inovadores Modelos de Negócio Um dos sectores mais afectados pela pandemia, no mundo, foi o da indústria dos eventos. O cancelamento forçado de todo o tipo de espectáculos culturais e artísticos, festivais, competições desportivas e conferências académicas e profissionais teve um impacto calamitoso num sector que movimenta anualmente biliões de dólares e dá emprego a milhões de profissionais By Rui trindade – Photography by D.R.
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os primeiros meses da pandemia, Estados e Governos, em todos os continentes, procuraram mobilizar recursos de emergência para evitar ou atenuar o colapso de uma indústria cujo desempenho, ao longo das últimas décadas, ganhou um peso cada vez mais expressivo em termos económicos. Os modelos de apoio, nesta fase inicial, embora reflectindo particularidades regionais, foram, no essencial, bastante semelhantes. Num ensaio publicado recentemente na revista publicada pela plataforma Arts Management Network, Ribio Nze-
países como a Nigéria e a África do Sul, procuraram envolver empresas e associações profissionais no sentido de desenhar estratégias que permitissem não apenas mitigar o impacto negativo da pandemia mas, sobretudo, dar uma outra robustez ao sector – cujas debilidades estruturais se tornaram dramaticamente visíveis – e avaliar o potencial das plataformas digitais numa perspectiva de futuro e não apenas enquanto solução pontual. Com efeito, e como aconteceu a nível global, a pandemia desencadeou uma “migração” massiva de muitas iniciativas e eventos para o universo digital e, em particular,
Confinados em casa, muitos artistas começaram a propor actuações via livestream no Facebook za Bunketi Buse, professor na Universidade Católica do Congo e na Universidade de Kinshasa (RDC), fez um primeiro levantamento do impacto do Covid-19 no sector das Indústrias Culturais e Criativas em África. O artigo, baseado numa série de estudos e inquéritos realizados em todo o continente, entre Março e Maio, ilustra como o tipo de resposta à crise não foi diferente do que aconteceu noutras regiões do mundo. Ribio Nzeza Bunketi Buse cita, entre outros, os casos do Quénia, cujo Governo disponibilizou um milhão de dólares para o sector, e do Senegal, que avançou com 5 milhões de dólares para apoiar os agentes e actores culturais e criativos durante o período mais crítico do confinamento. Muitas outras iniciativas, sobretudo em
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para as redes sociais. Muitos festivais, concertos, espectáculos de teatro e dança, exposições e conferências de todo o tipo preferiram arriscar e “reinventar-se” online a cancelar os seus eventos. Confinados em casa, muitos artistas começaram a propor actuações via livestream no Facebook e outros descobriram o potencial das plataformas de videojogos, como o Fortnite, para actuar ao “vivo”. E mesmo alguns eventos desportivos foram impelidos a imaginar formatos alternativos. Bom exemplo disso têm sido as várias iniciativas que, de Nova Iorque à Cidade do Cabo e a Maputo, estão a propor “maratonas virtuais”. E também em Moçambique, como o caso que aconteceu recentemente na capital, com a prova “FNB MAPUTO 10K”, este ano www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
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grandes eventos
num formato de corrida virtual, uma inovação em corridas desta natureza no País, com vista a fazer face às limitações impostas pelas medidas de prevenção do Covid-19. As inscrições para o evento, que se enquadraram nas celebrações do aniversário da Cidade de Maputo, esgotaram em apenas três semanas, com um total de 1500 inscritos, o que demonstrou grande interesse e apetência da sociedade por este tipo de eventos e um reconhecimento do sucesso da 1ª edição da corrida FNB Maputo 10K, sobre a ponte Maputo-Katembe que se havia realizado em 2019. O formato em modo ‘novo normal’ em que se conjugam os meios virtuais com um cunho real do evento foi uma das coisas que mais impressionaram os participantes. Para Michela Simão, participante da corrida, esta “foi uma experiência diferente e incrível, desde o processo de abertura das inscrições até ao levantamento dos kits e a própria corrida inteiramente virtual, cada um faz ao seu ritmo, mas em que há pontos de água e apoio por parte do pessoal do FNB”. Se, inicialmente, esta “migração”, sobretudo como a alternativa possível e imediata ao confinamento, foi vista como uma solução alternativa temporária, com o passar dos meses, e chegados ao final do ano, começa a tornar-se claro que esta “experiência global e colectiva”, que impôs a milhões de pessoas não apenas uma familiarização acelerada com as tecnologias digitais, mas também a adopção de um outro “estilo de vida”, está a abrir caminho para uma reconfiguração da indústria dos eventos no mundo pós-pandemia com novos formatos e novos modelos de negócio já a serem ensaiados e testados.
Eventos híbridos
Ninguém duvida que após a pandemia os eventos ao vivo irão regressar em força e que, depois de um tão prolongado período de abstinência, a procura será, até por razões psicológicas, certamente esmagadora. Mas, independentemente deste factor psicológico, importa referir que as “experiências ao vivo” (EAV), designação usada pela indústria para categorizar espectáculos, festivais, exposições, eventos desportivos e todo o espectro de formas de entretenimento presencial, voltarão em força também porque, em muitos segmentos de actividade, como é, por exemplo, o caso da música, os espectáculos ao vivo tornaram-se a principal fonte de rendimentos para os artistas. Nas últimas duas décadas, as receitas provenientes de música gravada caíram a pi-
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As “experiências ao vivo” voltarão em força porque em muitos segmentos da actividade os espectáculos ao vivo tornaram-se a principal fonte de rendimentos que. De acordo com um estudo da Goldman Sachs, mesmo para os cem artistas mais bem remunerados no mundo, as EAV são hoje responsáveis por mais de metade da sua receita. O caso de Taylor Swift, a artista mais bem paga do mundo em 2019, ilustra bem esta realidade: 91% dos seus ganhos vieram de shows ao vivo. Por outro lado, as novas gerações, em particular a dos millennials, prefere, ao contrário das anteriores, gastar dinheiro em “experiências” mais do que na aquisição de bens. O que hoje também parece claro para a maior parte dos analistas é que a “vi-
vência” da pandemia, de tão prolongada, obrigou a um tal nível de criatividade na exploração de alternativas “virtuais” (tanto em termos de “formatos” como das melhores formas da sua monetização), que essa experiência se vai repercutir, inevitavelmente, nas formas de conceber e organizar as EAV no pós-pandemia. Até porque a “experiência” vivida por milhões de consumidores ao longo deste ano não implicou apenas uma aprendizagem acelerada no uso das tecnologias digitais (nomeadamente no que toca a todo o tipo de modalidades de “comércio electrówww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
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nico”), mas permitiu-lhes também ter acesso a “experiências” inéditas que vão certamente diversificar e ampliar o leque das suas escolhas. Nesta perspectiva, os analistas prevêem que a tendência dominante no pós-pandemia será a da proliferação de “eventos híbridos” que tenderão a combinar o presencial com o virtual. O dado mais importante a reter aqui tem que ver com uma alteração de paradigma até há bem pouco tempo difícil de imaginar: a disponibilidade dos consumidores para pagarem por eventos online. Segundo um estudo da brasileira Ingresse, divulgado em Junho, à pergunta “se você não puder ir a um evento que gosta muito por causa do preço ou da distância, você compraria um ingresso bem mais barato para acompanhar esse evento ao vivo da sua casa?”, 46% dos inquiridos não só respondewww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
ram afirmativamente como consideraram que esse seria um dinheiro “bem gasto”; 20% pagaria se a experiência fosse “única com vários artistas”; 21% afirmou que pagaria se o show fosse “exclusivo e diferente” (exemplo: cenário diferente, repertório específico, etc.), e 15% pagaria pela “possibilidade de interagir com o artista e aparecer no livestream”. Gabriel Benarrós, da Universidade de Standford (EUA), antevê que o modelo dos “eventos híbridos” constituirá um momento de viragem para a indústria dos eventos e irá dar corpo a uma multiplicidade de novos formatos e modelos de negócio. Para citar apenas um modelo de “evento híbrido” possível, referido por Gabriel Benarrós, considere-se o que aconteceu recentemente na Holanda onde o espectáculo da banda Di-rect, no Tea-
tro Real em Haia (uma sala com 680 lugares), vendeu 10 mil “bilhetes”, sendo que os consumidores que assitiram via livetreaming pagaram um ingresso substancialmente mais baixo do que em sala. Tendo analisado em detalhe vários cenários possíveis, Gabriel Benarrós considera não ser difícil imaginar como um evento-âncora poderá ser potenciado não apenas em termos de audiência (por poder chegar a um público muito mais vasto) como de retorno financeiro através do que ele designa como “eventos-satélite”. Um determinado evento poderá ter, por exemplo, uma versão premium (em sala e streaming exclusivo), mas ser também segmentado e partilhado numa versão mainstream que pode, por sua vez, ser incorporada noutros eventos (festivais locais ou regionais) ou “distribuída” via outras plataformas online que, entretanto, têm surgido exclusivamente dedicadas a eventos virtuais. Por último, Gabriel Benarrós lembra que a capacidade das tecnologias da Inteligência Artificial e Big Data em identificar milime21tricamente os perfis dos consumidores permitirá “oferecer” pacotes personalizados. Refira-se ainda que, num sentido inverso, muitos artistas e criadores bem como organizações de todo o tipo aprenderam a usar e, nalguns casos, adquiriram equipamentos que lhes permitirão continuar a produzir “eventos” online, tendo, agora, uma audiência que, consoante o tipo de oferta, estará disponível para pagar pela “experiência”. Em alternativa a esta opção mais “autónoma”, surgiram, entretanto, plataformas como a StageIt que, ao longo da pandemia, se destacou pela forma como apoiou a transmissão em livestream de “concertos ao vivo em casa” de diversos artistas e que agora, olhando para o pós-pandemia, aposta em providenciar, de acordo com Stephen White, “uma plataforma onde os artistas podem ser pagos pelos seus espectáculos e onde cobrimos os custos dos direitos de autor, da transmissão, do processamento de cartões de crédito e, mais, para que possam receber 80% de todo o lucro dos seus espectáculos.” Para além disso, os membros do público têm, através da StageIt, a possibilidade de doar dinheiro em tempo real, comprar bilhetes para outros utilizadores e também interagir com os artistas, podendo mesmo pedir músicas ou ter sessões de perguntas e respostas. Os concertos não são gravados nem mantidos na plataforma, de forma a manter um sentido de exclusividade e criar maior intimidade entre o artista e audiência.
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startup
moogle
Comprar e Pagar com Apenas um ′Clique‛ Quando ninguém mais pode tocar em ninguém, nem manusear livremente os objectos, incluindo o dinheiro, a tecnologia veio, mais uma vez, impor-se e evitar o caos Texto Hermenegildo Langa • Fotografia Mariano Silva
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riado por dois jovens engenheiros moçambicanos, o aplicativo Moogle apresenta-se, nada mais nada menos do que um “revolucionário” meio de pagamento electrónico em supermercados, táxis e restaurantes. E tudo, claro, sem contacto físico, como hoje está em voga. Descontando o exagero evolutivo da descrição da app feita pelos próprios jovens inventores, e não sendo revolucionária de facto, ela pode ser uma boa solução.
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“É uma mais-valia em tempos de distanciamento social, por causa da pandemia, defende Kim Cruz, gestor do aplicativo. Considerado um super-aplicativo, o Moogle congrega, até agora, vários serviços que vão desde as compras nos supermercados até ao transporte de pessoas e mercadorias. “Desenhámos esta app para prover quase 60 serviços, mas, neste momento, limitamo-nos ainda a ser um sistema de pagamento nos supermercados, restaurantes, serviços de táxi, de reboque e ambulân-
cias”, sublinha o gestor. Os dois engenheiros que encabeçaram o desenvolvimento desta app explicam que a ideia de conjugar vários serviços, dando opções ao consumidor, mas abrindo janelas de oportunidade também para quem vende produtos, dão o retalho como exemplo. “Através do Moogle, os gestores dos supermercados têm a oportunidade de expor os seus produtos para os 25 mil utilizadores da plataforma Pay Tech do sistema Metro Bus que é o aplicativo-mãe da Moogle”, explicam www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
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Aplicativo Moogle Criação Julho de 2020 Empresas Registadas 16 Gestor Kim Cruz
Edy Barrote e Kleyton Macatange. Para usar esta app, primeiro, o cliente “tem de descarregá-la para o sistema Android ou IOS, depois escolher o serviço que pretende usar. Se for para o supermercado, escolhe a loja que esteja dentro da plataforma em que pretende comprar, faz as compras, tem acesso ao valor a pagar e ainda pode solicitar o transporte. O custo total será descontado no seu cartão Pay Tech. E depois, através da plataforma, o cliente pode acompanhar todo o www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
processo de compra e transporte dos produtos, trajecto utilizado e estimativa de tempo de chegada, em tempo real até à porta de sua casa”, revelam. Os dois jovens consideram “até agora satisfatória” a adesão a este serviço, enunciando estar “desde já a trabalhar na promoção e divulgação”, uma área onde muitos jovens empreendedores com boas ideias acabam por falhar no mercado nacional. Por isso mesmo, não cobram qualquer taxa às empresas que queiram a platafor-
ma o que, não sendo bom para o negócio, o tem impulsionado ao nível da base de clientes e parceiros. “Estamos a fazer agora um trabalho comercial, não é altura de rentabilizarmos. Esperemos que numa segunda fase possamos monetizar o serviço”. Até aqui, 16 empresas foram registadas na plataforma, sendo os restaurantes em maior número e depois os supermercados. O objectivo? “A sua massificação perspectivando ter pelo menos 100 mil usuários até finais de 2021”.
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opinião
Por Marta Gune - Directora da Sala de Mercados do FNB Moçambique
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erá importante começarmos por definir o que é o risco cambial e depois lançar um olhar sobre o ambiente restritivo em que vivemos, para percebermos as possíveis formas de mitigar os riscos cambiais que enfrentamos. Se existirem duas moedas movidas, em contraciclo, por diversas variáveis macroeconómicas, políticas e sociais adversas, criando incertezas quanto ao valor da moeda entre a data da cotação e a data da liquidação da operação, acontece aquilo a que chamamos de risco cambial. Neste clima, qualquer investidor ou operador no mercado, com activos e/ou transacções em moeda diferente da local, estará exposto a esse risco. Actualmente em Moçambique, o risco é maior, particularmente porque há inúmeras variáveis que influenciam as economias mundiais, incluindo as dos nossos principais parceiros comerciais — África do Sul e Portugal. Depois, existe também a questão do impacto da redução do fluxo de moeda estrangeira, que resulta de uma ‘tempestade quase perfeita’ em que, ao volume de exportações abaixo dos níveis normais, à redução da ajuda externa e do IDE, se juntam a elevada demanda por moeda estrangeira para a importação de produtos acabados, derivada da fraca produção interna dos mesmos, apesar da redução da procura agregada que se vem registando ao longo do ano. Resultado? Volatilidade da taxa de câmbio do metical, em relação às principais moedas estrangeiras transaccionadas no nosso mercado, particularmente em relação ao dólar Americano, exacerbando, em última análise, o risco cambial na medida em que o Aviso nr. 05/GBM/2019 proibe
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Escassez de Moeda Estrangeira Afecta Mercado e Aumenta Risco Cambial. Solução? Inovação! a compra e venda de moeda com recurso a operações forward (operações com data de liquidação acima de dois dias), ou seja, produtos financeiros usados para a cobertura do risco cambial.
O que fazer do risco cambial, enquanto prevalecer a situação actual? Os mercados financeiros contam com vários produtos que podem ser utilizados para a cobertura ou mitigação do risco cambial. Contudo, nenhum produto financeiro pode substituir a liquidez, uma variável fundamental para que se possa inovar e criar produtos que conduzam à necessá-
É fundamental a existência de condições que permitam aceder aos mercados de protecção ao risco ria cobertura dos riscos cambiais na actividade económica do país. Adicionalmente, é fundamental a existência de condições regulamentares que permitam, aceder aos mercados e a produtos de protecção ao risco, localmente e offshore e garantir que tais operações sejam contratadas obedecendo a boas práticas internacionais. Por imposição regulamentar, as entidades residentes e não residentes que operam no mercado moçambicano não têm acesso a instrumentos de “hedging” de risco cambial, estando os seus balanços e income statements expostos ao mesmo. Numa economia como a nossa, estruturalmente deficitária, onde a demanda sempre se situou acima da oferta, a au-
sência de legislação que permita e/ou regule transacções de produtos financeiros conducentes à cobertura do risco cambial, com recurso a operações forwards/ swaps e de outros derivativos financeiros do mercado de balcão compromete a habilidade dos agentes comercais de se protegerem deste risco e o desenvolvimento do mercado cambial nacional para níveis próximos dos outros mercados financeiros semelhantes ao moçambicano. Assim, inovação para cobertura de risco cambial em Moçambique, poderá significar apenas, dar os primeiros passos em direcção à dinamizacao do nosso mercado cambial, monetário e de capitais. Não devemos, igualmente, descurar da necessidade simultânea de um mercado com operadores dispostos a participar activamente neste tipo de operações; de educação financeira; da criação de um ambiente regulamentar favorável à exploração segura dos vários produtos disponíveis, pelos participantes no mercado; de um mercado líquido por via do alargamento da base de participantes activos do mercado financeiro mocambicano, incluindo os mercados primário e secundário de títulos, que engloba também investidores estrangeiros, o regulador e os demais agentes económicos com necessidades de protecção do risco cambial. A entrada de novos players na actividade económica moçambicana, ligados ao sector de petróleo e gás e cujas exportações a partir de 2023 poderão melhorar sobremaneira os fluxos de liquidez em moeda estrangeira no país, poderá incontornavelmente exigir formas de mitigação do risco cambial, que não se deverão resumir ao mercado local e aos produtos que eram até há pouco tempo usados para o efeito. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
panorama
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Gestão municipal
Matola quer tornar-se cidade “digital e sustentável” O Conselho Municipal da Cidade da Matola lançou, recentemente, o Projecto ASToN, um programa financiado pela Agência Francesa de Desenvolvimento (AFD), sob gestão da Agência Nacional Francesa de Renovação Urbana (ANRU) que desenvolve ferramentas e práticas digitais para criar cidades sustentáveis e inclusivas para o contexto local. O projecto ASToN - Matola está orçado, até a presente fase, em 32 000 euros e prevê a criação de uma cidade inteligente que usa sistemas digitais para faci-
litar o processo de gestão administrativa, aproximando o município dos cidadãos, através da melhoria da capacidade de arrecadação de receitas fiscais e dando o seu contributo para que cada vez mais pessoas e comunidades tenham acesso a serviços de assistência a vários níveis. O lançamento do projecto contou com a presenta dos mais altos representantes do Conselho Municipal da Matola, da AFD, do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, entre outras instituições.
Inovação
BioMec vence a sexta edição do SeedStars Maputo A BioMec sagrou-se vencedora da sexta edição do SeedStars Maputo, a maior competição global de startups para mercados emergentes, que conta com o apoio do Standard Bank, através da sua Incubadora de Negócios. Trata-se de uma startup que fabrica próteses mecânicas confortáveis e de alto desempenho, com recurso a plásticos reciclados retirados do mar, suprindo, dessa forma, as necessidades de indivíduos com os membros amputados ou com deficiências físicas.
Com este feito, a BioMec vai representar Moçambique no SeedStars Global, em Abril de 2021, onde vai disputar com startups de todo o mundo o prémio de meio milhão de dólares em investimentos. Para o Standard Bank, o SeedStars constitui uma excelente plataforma de criação de um ecossistema empresarial robusto e estável no País, pois permite que os empreendedores e as PME tenham acesso aos recursos de que necessitam para desenvolver as suas ideias de negócio.
Segurança rodoviária
Botsuana lança primeiro sistema inteligente de teste de condução do continente africano O Director de transporte rodoviário e segurança do Botsuana anunciou, recentemente, o lançamento do Sistema de Teste de Motorista Inteligente (IDTS). Bokhutlo Modukanele afirmou que a instalação é um campo de testes totalmente equipado com controlos de automação de sistemas de computador para reduzir erros humanos e práticas corruptas, permitindo um processo de teste livre e justo. De acordo com a TechGist Africa, a tecnologia foi concebida após estudar www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
a implementação bem-sucedida de tecnologia semelhante em outros países industrializados, como a Rússia, China, Malásia e EUA, numa tentativa de abraçar a quarta Revolução Industrial. Além disso, planos também estão em andamento para o estabelecimento de uma instalação semelhante no Ruanda. A instalação foi construída de acordo com o Plano Global das Nações Unidas para a Segurança Rodoviária de que o Governo do Botsuana é signatário.
Tecnologia
Engenheira moçambicana distinguida nos EUA A moçambicana Nélia Mazula ganhou prémios de reconhecimento de patentes da Sociedade de Mulheres Engenheiras (SWE, na sigla em inglês de Society of Women Engineers), nos Estados Unidos da América. Mazula, que vive em River Oaks, é inovadora, engenheira e estrategista de transformação digital baseada em Houston, Texas, Estados Unidos da América. “Estou honrada em representar Houston e receber este prémio”, disse Mazula. “Espero servir como um exemplo de como a mulher afro-americana está a contribuir positivamente para a transformação digital numa indústria estabelecida como a de petróleo e gás”, afirmou. O Prémio de Reconhecimento de Patentes (Patent Recognition Awards) premeia os membros da SWE que receberam uma patente nos dez anos anteriores. Mazula possui cinco patentes: Actualização em realidade aumentada de modelos CAD 3D; Reengenharia de varredura a laser de modelos CAD 3D; Mapeamento gráfico baseado em densidade; Pesquisa baseada em frequência incorporada e processamento de dados gráficos 3D; e Re-imagem de pesquisa 3D para 2D. A Sociedade de Mulheres Engenheiras foi fundada em 1950 e é considerada a maior defensora mundial e catalisadora da mudança para as mulheres em engenharia e tecnologia.
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lá Fora
Mesmo com vacina, 2021 será um ano de perigos humanitários A conclusão é do relatório anual produzido pela ONU que aponta que 235 milhões de pessoas dependerão de assistência em 2021, um aumento de 40%. Outras organizações multilaterais também prevêem cenário desolador
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Texto Celso Chambisso • Fotografia D.R. o próximo ano, uma em cada 33 pessoas no mundo dependerão da ajuda humanitária para sobreviver. A previsão é da Organização das Nações Unidas (ONU), que indica que décadas de progressos sociais estão a ser ameaçadas, quando já não foram impactadas, pela pandemia do novo Coronavírus. As conclusões foram tiradas de um documento abrangente intitulado “Visão Humanitária Global”, divulgado pela entidade no início de Dezembro corrente, e que é citado por uma rede de rádio brasileira controlada pelo Grupo “Jovem Pan”. Apesar de o relatório ser publicado todos os anos, como forma de a ONU estabelecer e justificar as suas prioridades para os próximos 12 meses, a edição
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de 2020 tem um carácter quase inédito após anos seguidos de melhorias nos índices de fome e pobreza extrema, que vieram abaixo com a crise do covid-19. A organização estima que, em 2021, um total de 235 milhões de pessoas precisarão de receber algum tipo de ajuda humanitária. No entanto, o seu objectivo para o próximo ano é atender 159,9 milhões desses indivíduos, que estão espalhados em 56 países pelo mundo, com um orçamento de 35,1 mil milhões de dólares. A meta é mais do dobro dos 17 mil milhões de dólares que a entidade recebeu dos seus países-membros em 2020, quando houve um recorde na arrecadação. O subsecretário-geral para assuntos humanitários da ONU, Mark Lowcook, defendeu, em comunicado, que o valor é “muito pequeno” quando comparado à quantidade de www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
dinheiro que os países mais ricos do mundo estão a injectar nas suas próprias economias para recuperá-las. O responsável ilustrou que, enquanto as nações mais poderosas já estão a conseguir ver “a luz no fim do túnel” após a pandemia do novo Coronavírus, os países mais pobres enxergam apenas “luzes vermelhas” a piscarem em sinal de alerta. Nesse sentido, a nação com maior número de cidadãos a necessitarem de ajuda humanitária é o Iémen, com 24,3 milhões de pessoas a viverem em situação precária. Em seguida vem a Etiópia (21,3 milhões), a República Democrática do Congo (19,6 milhões), o Afeganistão (18,4 milhões) e o Sudão (13,4 milhões). Apesar de a Síria ocupar o sexto lugar, com 13 milhões de pessoas dependentes de auxílio, é o país que mais precisará dos recursos da ONU. A entidade prevê gastos na ordem de 4,2 mil milhões de dólares nesta nação. Lowcook ilustra que a pandemia se espalhou de forma desigual pelo mundo: enquanto alguns países conseguiram conter as infecções, outros ainda enfrentam uma enorme emergência de saúde pública. À medida que as transmissões continuam, o Covid-19 está a agravar as vulnerabilidades já existentes de algumas nações, criando assim novas necessidades humanitárias e exacerbando as actuais. “A esperança de vida vai cair. O número anual de mortes por HIV, tuberculose e malária deve dobrar. Tememos quase o dobro do número de pessoas que enfrentam a fome.
“A esperança de vida vai cair. O número anual de mortes por HIV, tuberculose e malária deve dobrar. Tememos quase o dobro do número de pessoas que enfrentam a fome no mundo Muitas meninas fora da escola nunca mais voltarão”, enumerou o subsecretário-geral. Cresce a pobreza e o número de deslocados De acordo com outra análise apresentada pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, PNUD – citando uma projecção do estudo-base Covid-19 onde o Fundo Monetário Internacional analisa as taxas de mortalidade actuais e faz previsões de crescimento –, “a longo prazo, os efeitos da pandemia podem levar mais 207 milhões de pessoas à pobreza extrema. Se isso acontecer, mil milhões de pessoas viveriam nessa condição em todo o mundo até 2030”. A ONU prevê que, seja por pobreza extrema, fome aguda, violência, desastres naturais ou conflitos nos seus países de origem, 14,6 milhões de pessoas tornaram-se refugiadas entre Janeiro e Junho de 2020. A maioria dos deslocamentos aconteceram em África, no Médio Oriente e na Ásia, mas o problema atinge 127 países em todo o mundo. Em países africanos como os Camarões, Moçambique, Níger e Somália, os números do primeiro semestre deste ano já são superiores aos de todo o ano passado. Na Síria, espera-se que o número total de refugiados, em 2020, também seja superior ao ano anterior. O apelo à comunidade internacional é que aumente a ajuda aos países menos desenvolvidos com fundos adequados e a meta é permitir que haja um espaço político suficiente e que as economias tenham projecção, fazendo as próprias escolhas políticas. Outra sugestão é que se tomem medidas de apoio internacional mais eficazes, principalmente na transferência de tecnologia.. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
ócio
(neg)ócio s.m. do latim negação do ócio
58 Nesta edição viajamos até à Ponta do Ouro, na província de Maputo
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e 60 Conheça o restaurante Fiamma, no Hotel Cardoso
61 Os cinco tintos que tornaram leve o confinamento dos degustadores
ponta de ouro
e Ponta do Ouro
O outro lado um grupo de turistas está
sentado em bancos corridos, num gabinete soalheiro, assistindo a um longo vídeo de sensibilização sobre os comportamentos que devem adoptar (ou evitar) ao longo das próximas horas. Depois de preencherem os devidos formulários, deixam os pertences no escritório e sobem para o atrelado de um tractor que os leva rumo à praia. Um burburinho de antecipação enche o ar. A experiência que têm pela frente, dizem os entendidos, é transformadora: nadar com golfinhos. Chegados à praia, ajudam a empurrar a lancha que os levará ao local. O dia mal começou e já está outro grupo a regressar a terra, desta vez envergando fatos de mergulho e carregando botijas de oxigénio. Mais ao fundo, meia dúzia de jovens com pranchas de surf debaixo do braço marcham afincadamente em direcção às ondas, pintando uma bela silhueta na areia. Este é apenas mais um dia típico
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da Ponta
na Ponta do Ouro, no extremo sul de Moçambique, um dos destinos mais populares do País que se tornou ainda mais concorrido depois da abertura da ponte Maputo-Katembe em Novembro do ano passado. Há um motivo adicional para percorrer os 120 km que separam a capital daquela estância balnear: a migração de baleias-corcunda que todos os anos passam ao largo da costa, procurando águas mais quentes. É uma rara oportunidade de observar o majestoso mamífero em trânsito entre a Antártida e a costa oriental de África para dar à luz. A praia está inserida na Reserva Marinha Parcial da Ponta do Ouro, uma área de conservação que ocupa 678 km2, entre a foz do Rio Maputo e a Ponta do Ouro, passando por Machangulo, Ponta Mamoli e Ponta Malongane. “A principal ameaça à biodiversida-
de é a pressão humana”, alerta Vicente Matsimbe, responsável pela fiscalização da Reserva. “Com a abertura da estrada, a cada dia que passa, aumenta o número de pessoas.” Este afluxo acrescido de turistas em busca de festa e diversão leva muitos a temerem o pior: movimento excessivo, trânsito congestionado ou níveis preocupantes de embriaguez. No entanto, diríamos que há duas Pontas: a da época alta, agitada e ruidosa; e outra, mais pacata, fora de época. Se prefere destinos sossegados, atreva-se a tirar um dia de folga a meio da semana e dê um salto até lá: ficará surpreendido com a tranquilidade do lugar. Passeando a pé pelas ruas de areia, sente-se os aparentes resquícios do flower power. Uma onda de “paz e amor” atravessa o coração da vila e as pessoas acolhem-nos com o privilégio do tempo e da paciência. Paramos para uma saborosa bola de Berlim na pastelaria Doce Vitória e passamos pela oficina de teares para apreciar a deswww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020
treza de um jovem tecelão a produzir coloridos kikoi (pano tradicional da Tanzânia). Sentados numa mesa de café, um casal de velhos residentes troca dois dedos de conversa, saboreando a pausa que antecede o bulício do fim-de-semana. É nestas alturas que conseguimos compreender o fascínio de pessoas como Michelle Centonze, proprietária do emblemático Love Café, que há 12 anos trocou o asfalto de Joanesburgo pela areia da Ponta: “É perceberes que queres estar vivo e não apenas viver”. texto Cristiana Pereira fotografia Jay grarido & D.R.
a Ponta do Ouro é um dos destinos mais populares do país que se tornou mais concorrido com a abertura da ponte ROTEIRO Como ir
Com a Ponte Maputo-Katembe e a construção da nova estrada, são cerca de 1 hora e 30 minutos de carro a partir de Maputo. A partir da África do Sul, a Ponta do Ouro é acessível por estrada através da fronteira de Kosi Bay, que dista cerca de 600 km de Joanesburgo e 415 km de Durban. ONDE DORMIR
Existem inúmeras opções de alojamento, sobretudo em guesthouses ou casas privadas para arrendamento. Exemplo deste último é o Complexo Mar e Sol, um conjunto de 38 chalés que podem ser arrendados para estadias de curta duração. Outras opções são a Casa Cyano, bastante reservada, ou a mais central Casa do Farol. ONDE COMER
O incontornável Love Café tem um menu variado e ambiente new age, com inspiradoras frases espalhadas por todos os cantos. Para um ambiente de pub com opções vegetarianas, tem o Melting Pot.
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A vista deslumbrante que oferece não pode deixar de ser considerada como um verdadeiro “suplemento de alma” que enriquece o desfrute gastronómico
para além dos inúmeros méritos gastronómicos que o
Fiamma possui, o facto de estar localizado no Hotel Cardoso, um dos mais emblemáticos edifícios de Maputo, confere-lhe um incontornável atractivo adicional, que tanto tem que ver com a história do Hotel, como com a vista deslumbrante que oferece, que não pode deixar de ser considerada como verdadeiro “suplemento de alma” que enriquece o desfrute gastronómico. Como é sabido, a história do Hotel Cardoso está ligada à figura do Comandante Augusto Cardoso. De acordo com Alfredo Pereira de Lima (em “Edifícios Históricos de Lourenço Marques”), Augusto Cardoso, então jovem oficial da Marinha de Guerra Portuguesa, começou por se notabilizar quando, em 1885, acompanhou Serpa Pinto numa expedição geográfica ao Niassa. Após a doença que atingiu Serpa Pinto, Augusto Cardoso completou sozinho a expedição sem atrasar o cumprimento do objectivo. Nesse período as margens do lago Niassa estavam em disputa entre Portugal e a Inglaterra e o assunto não ficou concluído aí, mas foram essas expedições de reconhecimento portugue-
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Fiamma
Avenida dos Mártires de Mueda, 707, Maputo
+258 21 49 1071
g Restaurante Fiamma
Um espaço recheado de encantos no coração da capital sas, e as negociações com os chefes tradicionais locais, em que o Comandante participou, que fizeram com que Moçambique tivesse as fronteiras actuais ao redor do lago Niassa. Em 1888, Augusto Cardoso foi colocado em Lourenço Marques tendo sido responsável por balizar a baía e construir o farol. Devido às suas funções, o Governo cedeu-lhe um terreno na zona da Ponta Vermelha onde veio a erguer o Hotel Cardoso, embora nunca o tenha explorado directamente (arrendou-o a dois empresários locais, primeiro Dolores Veja Bernin e, mais tarde, Luis Boschian) tendo acabado por vendê-lo em 1920. O Hotel viria, posteriormente, a passar por diversas transformações até chegar à sua configuração actual. O menu do Fiamma está repleto de propostas interes-
santes. Começando pelas entradas, as nossas sugestões vão para os Rolinhos de Camarão (com puré de couve-flor e molho agridoce), as Sardinhas Grelhadas (com ervas, alface, alho-porro, alcaparras e molho de tomate), a Salada de Quinoa (com beterraba, abóbora assada e queijo feta) e o Carpaccio de Bife (com queijo parmesão, ervas e molho de rabanete). Entre os pratos principais, os destaques vão para o Filete de Bacalhau (grelhado), acompanhado por lulas, espinafres, croquetes de batata e molho de alho e manteiga; o Rabo de Boi, cozido lentamente numa caçarola e acompanhado por três tipos de feijão; e o Surf & Turf, um prato de lagosta e filete de bife grelhado que é acompa-
nhado com puré de batata, queijo parmesão, molho pimenta e vegetais ao vapor. Não podemos, no entanto, deixar de fazer uma referência especial à Paella de Marisco, sobretudo por ser um prato que é pouco usual encontrar nos restaurantes da cidade. Os camponeses saíam para trabalhar no campo levando apenas arroz, azeite e sal. Usavam para cozinhar uma panela redonda, rasa, com duas alças, a que chamavam de “Paella”. Além do arroz eram adicionados ingredientes típicos do campo, tais como carne de caça, principalmente lebre e coelho, vagem e ervilhas.
texto rui Trindade fotografia Jay Garrido
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a partir de casa, enumeramos uma lista dos cinco vinhos mais memoráveis de 2020. Não serão os melhores. apenas isso mesmo, os mais memoráveis
Barris de Ochota Adelaide Hills “The Price of Silence” Gamay 2019 Biografia
Região vinícola da Basket Range fora de Adelaide, Austrália. Um surfista e punk rocker virou cultivador e enólogo, o tipo de homem, cheio de verve e traço, que atraía as pessoas porque era muito divertido estar por perto. Um Gamay de 2019 (55 dólares) tem, como todos os seus vinhos, o nome de bandas ou canções.
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Vinhos para recordar num ano para esquecer viagens, restaurantes e vinhas fo-
ram lugares ‘esquecidos’ no ano do “grande confinamento”. No entanto, muitas garrafas não deixaram de ser abertas em casa. Num ano normal, os momentos mais excitantes seriam muitas vezes os menos previsíveis: inclinar-se sobre o ombro de um agricultor enquanto se ajoelha sob uma fila de vinhas, mostrando algo que nunca conhecemos; desmaiar por causa de um vinho nunca antes bebido num restaurante recomendado por alguém acabado de conhecer; beber um vinho que pensava não gostar.
Nenhuma destas experiências aconteceu em 2020 e, com algumas excepções desde o início, as nossas memórias de 2020 serão extraídas do que bebemos em casa a ler as notícias da pandemia, os movimentos contra o racismo ou a discórdia política das eleições americanas. Assim, a partir de casa, enumeramos uma lista dos cinco vinhos mais memoráveis de 2020. Não serão os melhores. Apenas isso mesmo, os mais memoráveis, biografados, como se fossem pessoas que nos acompanharam ao longo dos meses em casa, do mais novo até ao mais velho.
ColleStefano Verdicchio di Matelica 2019
Pax Sonoma Coast Syrah Armagh Vineyard 2017
Biografia Os vinhos brancos italianos de 2020 são versáteis, deliciosos e harmonizam bem com os sabores e temperaturas da Primavera e do Verão.Este veredicchio de Matelica na região de Marche, em Itália, mais para o interior e crescidos em altura, são plenos de energia e acidez electrizante. Muita textura e sabor floral com uma mineralidade de concha esmagada.
Biografia No Norte da Califórnia nasceu uma adega que alberga seis produtores excepcionais partilhando o mesmo espaço, trabalhando de forma semelhante, sem leveduras ou outros aditivos, desenhando vinhos muito diferentes. Cada um dos rótulos Martha Stoumen Wines, Jolie-Laide, RAEN, Jaimee Motley Wines e Monte Rio Cellars - faz belos vinhos. Mas o destaque vai para Syrah da Pax Mahle Wines.
Weiser-Künstler Mosel Riesling Trocken Enkircher Steffensberg 2018
Aslina por Ntsiki Biyela África do Sul Cabernet Sauvignon 2017
Biografia Esta garrafa de 46 dólares oriunda da minúscula propriedade Weiser-Künstler ilusta os pequenos lotes de vinhas velhas que crescem em declives impossivelmente íngremes e que produzem rieslings finos e doces e excelentes secos com osso, como este da vinha de Steffensberg, perto de Enkirch. Numa colheita quente como 2018, e maravilhosamente pura, quase que apetece inalar o ar e o solo da borda do copo.
Biografia Ntsiki Biyela é a primeira enóloga negra da África do Sul e não haverá muitos sauvignons de cabernet de 20 dólares de qualquer parte do mundo que provoquem uma tal sensação de maravilha. É por isso que este vinho é tão memorável. Num universo de cabernets genéricos baratos, consegue ser encantador puro, seco e saboroso, com sabores que englobam o espectro da fruta, tabaco e ervas que podem tornar o cabernet tão distinto.
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Nyimba Art, uma celebração o seu corpo estava em Portugal, mas a sua alma morava em Moçambique. Nwetana sempre se sentiu estrangeira no seu país de origem e, por isso, há dez anos, escolheu Moçambique para renascer e foi neste país que viu ressurgir o seu encanto de infância pelas artes. Esse renascimento a fez transforma-se de Ana Lúcia Silva para Nwetana, nome que faz junção de Nweti (lua) e Ana. Foi em Moçambique que viveu um episódio mágico da sua vida. Ficou grávida do artista plástico Fiel dos Santos e quis eternizar o momento registando a gravidez de forma artística, o que acabou servindo de fonte de inspiração: fez pesquisas e ficou encantada pelas pinturas a mulheres grávidas e pelos
da alegria da gestação moldes gestacionais feitos em gesso. Junto do seu marido, registou a sua gravidez por meio de um molde gestacional. Algum tempo depois, observando o seu molde gestacional, pensou que podia unir o gosto pela arte ao prazer em proporcionar às mulheres grávidas um momento mágico que pudesse ser eternizado por meio de pinturas para a posterior fotografia. Assim surgiu a Nyimba Art, um projecto artístico que alia a alegria gestacional à arte. Nwetana, com a ajuda do seu marido, encontrou uma forma de deixar a arte viver em si e nos outros. Molduras gestacionais fei-
“A arte é vida e quando pinto ou faço as molduras gestacionais comunicome com dois seres: a mãe e o bebé...”
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tas de gesso e pinturas na barriga das gestantes para posteriormente fotografar são o prato forte do projecto Nyimba Art. “A arte é vida e quando pinto ou faço as molduras gestacionais comunico-me com dois seres: a mãe e o bebé ainda no ventre. Não pinto telas, pinto seres humanos. Tenho de me comunicar com eles e por isso há uma relação energética entre a artista e outros dois seres e isso é extraordinário”, comentou Nwetana. Há três anos que a Nyimba Art participa na vida de várias gestantes moçambicanas com seus trabalhos que transmitem alegria e vida às famílias que a procuram. Sonha em ter um espaço físico onde possa unir outros artistas que façam trabalhos relacionados com a gravidez, mas, enquanto isso não acontece, Nwetana leva a Nyimba Art às gestan-
Nyimba art
Decorre desde Novembro corrente ano em Maputo
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aircar da KleinVision
O Aptera é um carro eléctrico que garante 1600 km de autonomia e pode atingir uma velocidade máxima de 177 km/h.
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“Never Charge” o carro tem-se assistido a uma crescente aposta em carros eléctricos pelas marcas. Isto porque os consumidores estão cada vez mais consciencializados dos benefícios associados a um carro que não é alimentado por combustíveis fósseis. No entanto, consegue-se detectar dois principais ‛senãos′ que surgem na hora de investir num carro eléctrico: a autonomia e o preço a si associado. Para já, um carro alimentado por uma bateria tem um custo mais elevado do que um carro dito convencional e, por isso, na hora da escolha, nem sempre prevalecem os benefícios de longo prazo. Uma empresa americana esbateu estes dois entraves e desenvolveu uma proposta futurista. Com sede em San Diego, a Aptera Motors projectou um carro eléctrico ar-
futurista alimentado pelo Sol rojado que garante 1600 km de autonomia. Por ser alimentado a energia solar, o “Never Charge” da empresa americana é vendido com a garantia de não precisar de um carregamento regular. Isto porque o carro eléctrico é alimentado pelo sol e foi concebido tendo por base a eficiência. “A nossa matriz solar integrada mantém a sua bateria carregada e, para onde quer que queira ir, basta ir”, disse o cofundador da Aptera Motors, Chris Anthony. O modelo futurista possui um design aeronáutico bem como uma configuração de apenas três rodas, concedendo-lhe uma leveza única e essencial para o conceito. Ou seja, o vento auxiliará o alcance do carro eléctrico, podendo atingir uma velo-
alimentado a energia solar, o “Never Charge” também tem a garantia de não precisar de um carregamento regular
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cidade máxima de 177 km/ h. Além disso, será constituído por metais e materiais leves, sendo-lhe acrescentado um sistema de recolha de energia solar com cerca de três metros quadrados. Assim, por dia, o carro eléctrico será capaz de recuperar até 72 km através das suas 180 células solares. Conforme anunciou a empresa americana, o carro eléctrico e futurista é conduzido por motores eléctricos arrefecidos e vai de 0 a 96 km/h em 3,5 segundos. Além disso, possui controlo de vectorização do binário, de modo a assegurar conforto, estabilidade e capacidade de lidar com condições meteorológicas adversas. Com capacidade para dois (mais um animal de estimação) e uma tela sensível ao toque de 15 polegadas, o Aptera deve começar a ser entregue em 2021, com preços entre 25 900 e 46 000 dólares, dependendo do alcance e das opções. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2020