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Com a Inteligência Artificial Cada Vez Mais Real, Como Faremos Nós Parte do Futuro?

Nos últimos anos tornou-se evidente que será impossível dispensar a Inteligência Artificial de qualquer domínio da vida nos próximos anos e não há qualquer área em que esta não venha a ser chamada a optimizar processos considerando, tempo, eficiência e custos. No entanto, tudo se está a precipitar a uma velocidade nunca antes vista, reforçando a tese de que o futuro (re)nasce agora, não com base no sonho do Homem, mas no algoritmo generativo das máquinas que parecem tudo saber. Com o lançamento do ChatGTP, no final do ano passado, foi dado mais um desses passos rumo a um novo amanhã que entusiasma quase tanto como suscita questões e levanta preocupações que não têm, para já, resposta. E nós? Que lugar ocuparemos neste “maravilhoso mundo novo”?

Desde o início da primeira revolução industrial que se iniciou em 1760, as máquinas têm sido amplamente utilizadas para melhorar a eficiência. Três séculos depois, e com o mundo a bater, com estrondo, na porta da Quarta Revolução Industrial, do outro lado está a era em que as máquinas se tornaram inteligentes, optimizando-se a si mesmas e aos sistemas nos quais operam. Chegou o tempo da Inteligência Artificial (AI).

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E esta é uma mudança que está a moldar muitas das megatendências, que, por sua vez, estão a mudar, já hoje, a forma como o mundo funciona. Mais do que tudo, como a vida tal como a conhecemos, do trabalho às empresas, do nosso dia a dia à forma de nos relacionamos, irá mudar nas próximas décadas. E esse futuro, já começou.

Os mais pessimistas vêem-no como a ascensão dos robots – um futuro distópico de desemprego em massa e desumanização à medida que máquinas inteligentes, metódicas, incansáveis eliminam a necessidade de pessoas, reféns da sua orgânica ineficácia e imprecisão, e dos seus humanos circunstâncialismos e emoções. Não faltam livros e filmes com essa visão. Mas, acreitando no princípio de Lavoisier de que "na natureza nada se cria, nada se perde e tudo se transforma”, e olhando à História, temos de ponderar o facto de, embora as novas tecnologias possam diminuir, ou mesmo irradiar, em muitos casos, a necessidade de envolvimento humano em diversas tarefas, elas irão também conduzir à criação de novos empregos e indústrias.

Para a consultora Ernst & Young (EY) “o desafio não é a tecnologia – é ser criativo ao reinventar como usá-la para gerar novas oportunidades, valor e crescimento”.

IA cresce pelo Mundo. E cá dentro?

Se a IA é já uma realidade que está a mexer com as projecções do que será o futuro do mundo nos mais variados aspectos, como estamos a este nível em Moçambique? O que estamos a fazer nas esferas tecnológica, regulatória, de formação, entre outras, e até onde seremos capazes de nos 'encaixar' esta tendência?

O que se pode dizer, de forma muito sucinta, é que enquanto nos países mais desenvolvidos economicamente em termos de pesquisas e de implementação de ferramentas de IA há experiências práticas interessantes, Moçambique ainda ocupa uma posição modesta, sendo os sectores financeiro, das telecom e as ex- tractivas, das poucas áreas em que se está, de facto a olhar para esta nova realidade, embora ainda com muito espaço por explorar.

A E&M ouviu o engenheiro João Gaspar, presidente da Associação das FinTech de Moçambique (FINTECHMZ) com mais de 30 anos de experiência nas áreas de IT e Telecomunicações bem como na definição, implementação e suporte de serviços e negócios na área de sistemas de pagamentos. João Gaspar, recorda como já se utilizaram alguns princípios da IA (machine learning) para diagnosticar doenças em plantas agrícolas. Tirou-se uma fotografia a uma planta de milho, que foi depois trabalhada num software que está na cloud e que tem milhões de informações sobre as várias doenças de plantas. Através da fotografia conseguiu-se comparar dados e fazer-se um diag- nóstico. Na medicina, por exemplo, estas tecnologias têm já uma larga aplicação e, a este nível, a IA será fundamental para novas descobertas médicas que poderão salvar milhões de pessoas em todo o mundo. "Por exemplo, é possível ter pequenos dispositivos electrónicos a acompanharem o ritmo cardíaco de uma pessoa durante todo o dia, e esses dados são depois carregados numa cloud e comparados a outros milhões de casos que lá existem. A partir daqui é possível perceber o padrão da pessoa testada em relação aos casos existentes e diagnosticar falhas com alguma precisão e prever algum tipo de doença próxima. Esta seria a utilização da IA mais imediata e interessante para nós humanos”, defende João Gaspar. Ouvimos também o administrador do BCI, Rogério Lam, mestre em Engenharia de Telecomunicações e cujo

ONDE (JÁ) ESTÁ A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL

A IA já não é coisa do futuro. É uma realidade presente em vários segmentos económicos e sociais. Conheça algumas das suas aplicações práticas.

INDÚSTRIA

Há equipamentos que fabricam e conferem os produtos sem precisarem de ser operados por um humano. Também estão a ser desenvolvidas máquinas que criam e executam por si mesmas novos projectos criativos sem limitações de uso.

GPS

As rotas sugeridas pelo aplicativo Waze geralmente apontam o melhor caminho. Isso acontece porque o programa usa a Inteligência Artificial para interpretar dados fornecidos automaticamente por outros usuários sobre o tráfego nas vias.

CARROS AUTÓNOMOS

Uber, Google e Tesla são algumas das empresas que desenvolvem carros que não precisam de motorista para conduzilos. A inovação é possível graças a uma combinação de tecnologias e sensores que orientam o movimento dos automóveis.

Atendimento Ao Usu Rio

Chatbots e sistemas com processamento de linguagem natural estão a ficar cada vez mais inteligentes para substituir operadores humanos e estarem à disposição de usuários com dúvidas 24 horas por dia.

Com Rcio Online

Algoritmos de lojas virtuais reconhecem padrões de compras de usuários para apresentar-lhes ofertas de acordo com as suas preferências. A Amazon criou a Amazon Go, uma loja de retalho que não conta com ‘stocker’ e check-out, por exemplo.

Jornalismo

Com acesso a bases de dados, há programas capazes de escrever matérias jornalísticas informativas com uma perfeição que torna difícil para o leitor distingui-las de textos escritos por humanos.

BANCA

Instituições financeiras utilizam algoritmos para analisar dados do mercado, gerir finanças e se relacionar-se com clientes. Em Moçambique, o sector financeiro é o que está mais próximo da realidade actual.

Entretenimento

Um dos exemplos mais quotidianos é o sistema de recomendação personalizada em serviços de streaming, garantindo uma melhor experiência na plataforma. Os games e e-sports estão também cada vez mais imersivos.

DIREITO

Escritórios de advocacia e departamentos jurídicos contarão com robots para realizar, de forma mais rápida, precisa, directa e acessível do ponto de vista económico, boa parte do que um advogado faz na actualidade.

Sa De

Um dos exemplos actuais é o uso de máquinas inteligentes a identificação de focos de contaminação e infectados pelo covid-19. Antes, a tecnologia já estava a cooperar com o diagnóstico precoce de doenças como o Alzheimer, etc.

Manuten O Preditiva

Antecipar problemas é uma boa maneira de evitar dores de cabeça no futuro. E é exactamente isso que a IA faz. Avalia informações preliminares de maquinaria e produtos e evita que eventuais erros parem uma empresa inteira.

Redes Sociais E Aplicativos

Reconhecimento de fotos, identificação de objectos e situações, reprodução temática de vídeos, tradução simultânea e remoção automática de conteúdo inapropriado são algumas das contribuições da IA para redes sociais e outros aplicativos.

currículo inclui uma já longa e sólida experiência em canais digitais. Falando sobre a importância da IA no sector financeiro, começa por concordar que “já estamos todos a ser testemunhas do efeito positivo que as transformações tecnológicas têm no acesso aos serviços financeiros, destacando-se a explosão na utilização de canais alternativos ao balcão bancário tradicional”. No entanto, prossegue, "a questão que se levanta relativamente à IA lança um desafio ainda mais específico e consequente dos processos de transformação digital, pois a utilização de canais alternativos é um grande gerador de volume de dados para as instituições financeiras, nomeadamente nas transferências, depósitos ou pagamentos de compras, todas com o potencial de produzir insights importantes para a gestão das instituições financeiras, em especial as que operam no sistema bancário nacional. Do que tenho observado no mercado, a implementação destas iniciativas em Moçambique ainda é algo modesta e com pouca visibilidade e não vislumbro ainda aplicações de utilização de ferramentas de IA por cá. No entanto, insisto que, tal não quer dizer que não esteja a ser feito trabalho nesse sentido. A minha observação prende-se essencialmente pela dimensão dos canais de acesso aos consumidores". Mas esta é, para o responsável do BCI, "só uma das variadíssimas vertentes de utilização da IA. Outras serão muito pouco perceptíveis para o consumidor, como por exemplo as componentes de segurança, de prevenção ao branqueamento de capitais, segmentação de clientes, análise de risco", complementa. "De um modo geral, a IA irá seguramente melhorar um conjunto de processos internos das instituições, bem como nas iniciativas de contacto directo com os clientes dos bancos. Como? Diria que podemos acelerar os processos de validação documental no processo de aberturas de conta onde, por exemplo, pode ser utilizado o reconhecimento facial com recurso à IA ou até, espoletar recomendações num conjunto de produtos e servi- ços mais adequados ao perfil de determinado cliente, aliás, ao estilo do que hoje já se observa por exemplo, quando temos recomendações de filmes no Netflix ou no Youtube." E continua: "Ainda ao nível de processos internos, pode ser utilizada uma das componentes da IA, o Machine Learning, para identificar padrões e desenhar melhor os processos de concessão de crédito. Podem ainda ser melhorados os processos de segmentação da carteira, com vista a segmentar clientes com base em comportamentos e interesses similares e adequar a oferta aos tais segmentos específicos. Depois, na vertente de interacção com os clientes, a utilização da IA com recurso a chatbots é uma oportunidade para os bancos e pode ajudar a melhorar significativamente a experiência dos clientes 24 horas por dia, sete dias por semana", assegura.

O caso do ChatGTP e a corrida à IA

O ChatGTP é a ferramenta de IA que está a dar que falar em todo o mundo. Trata-se, no fundo, de um algoritmo de linguagem, criado pela OpenAI, com sede em São Francisco (EUA), especificamente para gerar textos em linguagem natural, de maneira semelhante a um ser humano. Com maior capacidade e velocidade.

João Gaspar, afirma que a adopção desta tecnologia em Moçambique e no mundo será, a partir de agora, bastant rápida, e embora que de facto "a tecnologia é impressionante", também tem falhas próprias, e levanta já algumas questões éticas. Ao nível do ensino, por exemplo, são já vários os casos de estudantes que se graduaram recorrendo a esta tecnologia e existe um grande movimento em Inglaterra e nos EUA que pretende proibir o uso deste tipo de ferramentas no ensino. "Esta IA, associada à capacidade que as máquinas têm de aprender, torna-se cada vez mais inteligente porque vai correlacionar e validar dados que estão em várias fontes de tal forma que depois os apresenta mais correctamente em textos ou em programas”, explica João Gaspar. Tal é o potencial detectado em poucos meses de chatGTP que não é de admirar que nas últimas semanas tenham sido canalizados investimentos massivos das grandes tecnológicas para a Open AI. Entretanto, a Microsoft apostou 10 'bis' e lançou o novo Bing (o seu até agora muito pobrezinho motor de busca quando comparado com o Google) 'turbinado' por um software de IA da OpenAI, baseada no GPT-4, modelo que ainda não foi lançado ao público. O novo Bing, que está disponível para um pequeno grupo de testes e terá acesso ampliado em breve, aparenta ser um híbrido de um mecanismo de busca padrão e um chatbot no estilo GPT. Um misto de Google (nós) e de algo a tentar ser como nós (a IA). Irá funcionar como: Digita uma frase — diga, “escreva um menu de um jantar vegetariano” — e o lado esquerdo da sua tela será preenchido com anúncios padrão e links para sites de receitas. No lado direito, o Bing começa a digitar uma resposta com frases completas, geralmente linkadas aos sites de onde as informações foram retiradas. Para fazer uma pergunta relacionada ou solicitar informações mais detalhadas — por exemplo, “escreva uma lista de compras para o menu, dividida por corredores (do supermercado) e com quantidade suficiente para oito pessoas” — você pode abrir uma janela de chat e digitar. Claro que, nem todas as IA são... tão inteligentes, ou bem intencionadas (?) como são 'vendidas' pelas tecnológicas que as criam. Que o diga a Alphabet que, em Fevereiro entrou na corrida dos chatbot com o "Bard", a sua resposta ao GPT da Open AI. Porém, naquela foi a sua apresentação oficial ao mundo, "afirmou" incorrectamente que o telescópio James Webb foi o primeiro a tirar fotografias de um planeta fora do nosso sistema solar. E como não foi, a empresa-mãe do Google afundou na bolsa e perdeu 100 mil milhões de dólares em valor de mercado. Por uma vez os internautas que apressaram a apontar um erro em caixas de comentários fizeram-no... sem causar dor em alguém.

Mas porque é que esta tecnologia é considerada completamente disruptiva no que diz respeito ao que se vai assistir daqui em diante? É que, de facto, conseguiu criar um circuito de produção intelectual, no caso digital, similar à do cérebro humano, ou seja, trabalha com ligações lógicas entre os neurónios e várias áreas do cérebro onde está guardado o conhecimento. Com a velocidade de processamento e o acesso a um conjunto de informação, estas correlações são muito mais rápidas e consegue-se dar soluções e ideias, desenvolver produtos e serviços muito mais rapidamente do que qualquer ser humano. Por exemplo, enquanto existem pessoas vocacionadas para a Medicina, para a Engenharia ou as Artes, no caso do GTP, o sistema tem todas estas valências.

A par de aplicações como o ChatGTP, o DALL-E (que cria imagens ultra-reais) e outras que produzem traduções, textos publicitários, pautas musicais ou código de computação, há que considerar o machine learning, ou a aprendizagem constante das máquinas. A diferença é que o GPT não está ligado à Internet e por isso não consegue ir buscar dados actuais. Mas os novos motores de machine learning que estão a ser criados (casos do Bard e do novo Bing) estão ligados à Internet e assim poder pesquisar e validar dados. Sendo acessível em qualquer parte do mundo, as empresas e instituições em Moçambique têm como fazer uso do ChatGTP nas suas actividades, mas há importantes barreiras por transpor para tornar isso possível, desde as de ordem legal até ao investimento no capital humano, passando pela adopção da cultura de pesquisa em tecnologia. E há riscos, claro, ao nível do emprego, do ciber-crime e, no caso de Moçambique, da própria iliteracia digital. "A evolução tecnológica, como tudo, tem pós e contras e a tensão entre os potenciais benefícios da IA e a preocupação em torno de questões como a perda de empregos é comum, e é importante abordá-la de maneira ponderada e diferenciada. De um modo geral, embora o potencial da IA no sector bancário no País seja enorme, é importante que a sua implementação ocorra de um forma gradual, responsável e sustentável, tendo em conta os desafios e riscos inerentes, bem como a necessidade de garantir uma prévia regulamentação", assinala Jaikumar Sathish, Director de Tecnologias de Informação (CIO) do Absa Bank.

Barreiras legais e perigos reais Consta que, actualmente, o OpenIA e o ChatGPT já têm alguns pilotos e vão lançar em breve o Aplication Program Interface (API), que são rotinas que se podem ligar aos sistemas informáticos das empresas, seja de que ramo forem (clinica médica, banco, seguradora, empresa do Estado, etc.). Isto é, não será preciso que as empresas desenvolvam toda uma arquitectura nos seus sistemas (o que para já é impossível), daí a importância das interfaces com estes motores e bases de da- dos que estão na cloud. Esta oportunidade poderia ser acessível e bem aproveitada pelas empresas e organizações em Moçambique, mas há uma barreira estrutural: é que existem actividades, nomeadamente as da área financeira, em que não é permitido utilizar tecnologia que esteja na nuvem para processamento de dados. Exige-se, pelo contrário, que essa informação esteja num servidor privado dentro do País, o que é, dizem-nos, tecnicamente impossível, porque a valência deste tipo de soluções consiste em que trabalhem numa rede neural, na qual a informação está disseminada por uma rede de computadores em qualquer parte do mundo.

Mas este impedimento pode ter os dias contados. A E&M ouviu Lourino Chemane, presidente do Instituto Nacional das Tecnologias de Informação e Comunicação (INTIC) — órgão responsável por regular, supervisionar e fiscalizar o sector das Tecnologias de Informação e Comunicação no País — que, reconhecendo haver a necessidade de corrigir a regulamentação relacionada com a questão da computação em nuvem, revelou "estarem já em curso" acções para alterar o actual código legal. A primeira medida foi o lançamento de um concurso para a contratação de um consultor que irá encarregar-se de elaborar os passos que devem ser seguidos para a utilização segura dos dados em nuvem, visto que há questões por acautelar relacionadas com a salvaguarda da segurança cibernética. Outra é a construção e operação dos centros de dados em agenda. “Entendemos que não podemos fugir às boas práticas ao mesmo tempo que temos o dever de estimular a criatividade e a inovação”, assumiu.

Olhando para o mercado do emprego, Alexis Meyer-Cirkel, representante residente do FMI em Moçambique, prefere abordar toda a questão como economista e não como representante daquela instituição, começa por deixar claro que, no novo paradigma de aprimoramento da IA, as empresas, definitivamente, devem chamar a si a responsabilidade de formar o seu capital humano, pois não haverá volta a dar se quiserem tornar-se competitivas. E admite, entretanto, que o temor de que tecnologias como o ChatGTP possam ocasionar o desemprego massivo de pessoas pode efectivar-se, com a agravante de poder causar, simultaneamente, a substituição de trabalhos da área da produção e dos serviços.

E cita como exemplo o fim de grande parte das agências de viagens em resultado do avanço da comunicação digital que liga compradores e operadores de forma directa. Apesar disso, sublinha, sempre que a tecnologia avança e se teme o aumento do desemprego, verifica-se, depois, que os postos de trabalho em causa são readaptados ou transformados noutras competências. “Como economista, vejo a evolução da IA como um ‘problema bonito’, porque vai gerar eficiência na produção, competitividade, maior crescimento e melhor distribuição de renda. Mas será preciso definir como é que os sectores público e privado vão coordenar, em conjunto, a estratégia de implementação da IA, lembrando que os governos têm um papel importante a desempenhar em todo o processo”.

Entretanto, uma pesquisa facultada à E&M pela EY sobre o tema acrescenta que a chave para maximizar o potencial passará pela combinação criativa de software de IA com outras tecnologias, aumentando as suas capacidades para criar novas e melhores formas de trabalhar e transformar a tecnologia emergente numa vantagem competitiva. “Afinal, historicamente, a maioria dos avanços tecnológicos não provêm de momentos únicos de genialidade. Até a própria IA é um exemplo disso”, refere o estudo, sugerindo que as empresas terão muito trabalho para transitar para a nova realidade.

IA made in Moçambique?

Além da experiência que está a ser ensaiada pela Universidade Pedagógica de Maputo, com o seu projecto de Robótica Educacional (leia o “Especial Inovações Daqui”) e de alguns, poucos e isolados, projectos desenvolvidos por outras universidades, o País não se tem assumido como potencial protagonista da mudança. Para Rogério Lam, administrador do BCI, investir em IA em Moçambique "pode ser um desafio, especialmente no que diz respeito à infra-estrutura e ao acesso a recursos de pesquisa e desenvolvimento. No entanto, existem iniciativas locais que podem promover o desenvolvimento da IA, como parcerias entre empresas, universidades e organizações do Governo.

“Acredito que seja possível explorar a possibilidade de desenvolver soluções de IA adaptadas ao contexto moçambicano. Embora seja verdade que a maioria destas soluções sejam importadas, não significa que não seja possível criar soluções locais. E isso pode trazer benefícios significativos, como a redução de custos e a criação de soluções adequadas às necessidades específicas do nosso mercado e ainda como forma de capacitação dos quadros nacionais”, referiu. Mas alerta que "é importante lembrar que o desenvolvimento de soluções de IA requer investimento em pesquisa e desenvolvimento, bem como em capacitação de recursos humanos". Além disso, prossegue, "é fundamental garantir a transparência e a ética no desenvolvimento e uso da IA". E sublinha que, “com esforços conjuntos que envolvam as empresas, universidades e organizações do Governo, "será certamente possível desenvolver soluções de IA made in Moçambique adaptadas ao contexto local”.

São precisas equipas de “Estratégias de Inovação”

João Gaspar, por seu turno, considera ser urgente que todas as empresas comecem a pensar em constituir equipas de duas ou três pessoas numa área que se pode chamar “Estratégias de Inovação”. Sugere que estes quadros não olhem para o que a empresa está a fazer hoje, mas para tecnologias que serão implementadas no futuro da empresa. “É preciso ter algum tipo de investimento para enveredar por este caminho, pois não é fácil pagar a alguém que não está a trazer negócio hoje, estando a preparar para o futuro”, admite o engenheiro.

No fim de contas, Moçambique não foge à realidade de nenhum país do mundo quanto à possibilidade de acesso a determinadas ferramentas de IA mas, por outro lado, o que não falta são desafios no quadro da adopção destas novas ferramentas 'desenhadas' pela IA, a começar pela conjuntura socioeconómica de um país, que tem um dos PIB per capita mais baixos a nível mundial, e que se debate com a exiguidade de recursos materiais e humanos com capacidade técnica e conhecimento e literacia digital.

Depois, todos os intervenientes ouvidos pela E&M coincidem num facto: é fundamental assegurar a utilização destas novas ferramentas e das excitantes possibilidades que abrem em linha com os aspectos regulatórios e éticos. E alertam para a utilização destas ferramentas dever ser continuamente monitorada e optimizada para conferir confiança dos consumidores. Se assim for, pode trazer benefícios para áreas como a educação, a medicina, a ciência e a produção de conhecimento, melhorando a eficiência, a produtividade e reduzindo custos, fraudes e actividades suspeitas. Se vier por bem, será um parceiro. No fundo, está nas nossas mãos, como sempre esteve, a forma como a IA se irá posicionar no nosso futuro. Se será uma ajuda para melhorar o mundo real em que vivemos. Ou se só mais uma desculpa para o destruir.

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