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Revista de Psicologia da Crianรงa e do Adolescente Journal of Child and Adolescent Psychology


Mediateca da Universidade Lusíada de Lisboa – Catalogação na Publicação REVISTA DE PSICOLOGIA DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. Lisboa, 2010 Revista de psicologia da criança e do adolescente = Journal of child and adolescent psychology / propr. Fundação Minerva – Cultura – Ensino e Investigação Científica ; dir. Tânia Gaspar Sintra dos Santos. – N. 1 (Abril 2010)Lusíada, 2010-

. – Lisboa : Universidade

. - 24 cm. - Semestral

ISSN 1647-4120 I – SANTOS, Tânia Gaspar Sintra dos, 19771. Psicologia infantil – Periódicos 2. Psicologia do adolescente - Periódicos CBC

BF712.R48

Ficha Técnica Título

Revista de Psicologia da Criança e do Adolescente Journal of Child and Adolescent Psychology

Proprietário Directora Secretariado Conselho Científico

A. 4, N.º 2 (Julho-Dezembro 2013)

Fundação Minerva - Cultura - Ensino e Investigação Científica Tânia Gaspar Francisca Soares de Albergaria Adriana Baban (DP | Babeş-Bolyai University | Romania), Ana Isabel Martins Sani (Universidade Fernando Pessoa | Portugal), Antony Morgan (National Institute for Health and Clinical Excellence | United Kingdom), Aristides Isidoro Ferreira (IPCE | Universidade Lusíada de Lisboa | Portugal), Carmen Moreno Rodríguez (FP | Universidad de Sevilla | España), Celeste Simões (FMH | Universidade Técnica de Lisboa | Portugal), Daniel Sampaio (FM | Universidade de Lisboa | Portugal), Edwiges Mattos Silvares (IP | Universidade de São Paulo | Brasil), Eliane Falcone (Universidade do Estado do Rio de Janeiro | Brasil), Evelyn Eisenstein (FCM | Universidade do Estado do Rio de Janeiro | Brasil), Isabel Leal (Instituto Superior de Psicologia Aplicada | Portugal), Isabel Torres (IPCE | Universidade Lusíada do Porto | Portugal), José Alves Diniz (FMH | Universidade Técnica de Lisboa | Portugal), José Augusto Messias (FCM | Universidade do Estado do Rio de Janeiro), José Enrique Pons (FM | Universidad de la República | Uruguay), Jose Livia Segovia (Universidad Nacional Federico Villarreal | Peru), José Luís Pais Ribeiro (FPCE | Universidade do Porto | Portugal), Lúcia Williams (Universidade Federal de São Carlos | Brasil), Marcelo Urra (EP | Universidad de Artes y Ciencias Sociales | Chile), Margarida Gaspar de Matos (FMH | Universidade Técnica de Lisboa | Portugal), Mónica Borile (Instituto Médico de la Comunidad | Argentina), Paula Lebre (FMH | Universidade Técnica de Lisboa | Portugal), Paulo Moreira (CIPD | Universidade Lusíada do Porto | Portugal), Rosario Tuzzo (FM |Universidad de la República | Uruguay), Tânia Gaspar (IPCE | Universidade Lusíada de Lisboa | Portugal), Teresa Leite (IPCE | Universidade Lusíada de Lisboa | Portugal), Virgílio Estólio do Rosário (IHMT | Universidade Nova de Lisboa | Portugal), Zilda A.P. del Prette (DP | Universidade Federal de São Carlos | Brasil)

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301631/09

ISSN

1647-4120

Local Ano Periodicidade Editora

Lisboa 2013 Semestral Universidade Lusíada Editora Rua da Junqueira, 188-198 1349-001 Lisboa Tel.: +351 213611500 / +351 213611568 Fax: +351 213638307 URL: http://editora.lis.ulusiada.pt E-mail: editora@lis.ulusiada.pt

Fotocomposição e capa

João Paulo Fidalgo

Publicação Electrónica

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Solicita-se permuta – On prie l’échange – Exchange wanted – Pídese canje – Sollicitiamo scambio – Wir bitten um Austausch Mediateca da Universidade Lusíada de Lisboa Rua da Junqueira, 188-198 – 1349-001 Lisboa Tel.: +351 213611617 / Fax: +351 213622955 E-mail: mediateca@lis.ulusiada.pt © 2013, Universidade Lusíada de Lisboa Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida por qualquer processo electrónico, mecânico ou fotográfico incluindo fotocópia, xerocópia ou gravação, sem autorização prévia da Editora O conteúdo desta obra é da exclusiva responsabilidade dos seus autores e não vincula a Universidade Lusíada.


Sumário

SUMÁRIO

Nota introdutória............................................................................................... 7 actitudes y comportamiento sexual de riesgo de embarazo en jóvenes universitarios ............................................................................. 11 Marta Yubero, Elisa Larrañaga, Santiago Yubero O papel dos estilos educativos parentais na sintomatologia ansiosa de adolescentes do 3º ciclo do ensini básico .......................................................................................................... 31 Vanessa Azevedo, Sónia Simões, Mariana Marques e Marina Cunha educação sexual em meio escolar: percepção dos alunos ... 51 Sandra Dias e Margarida Gaspar de Matos estudo das propriedades psicométricas das escalas de resiliência de prince-embury....................................................................... 73 Sílvia Filipe e Celeste Simões avaliação da auto-compaixão em adolescentes: adaptação e qualidades psicométricas da escala de auto-compaixão .............................................................................................................. 95 Marina Cunha, Ana Xavier e Inês Vitória resiliência e adolescência: estudo da relação entre factores de resiliência e qualidade de vida em adolescentes com deficiência motora ............................................ 119 Ana Sereno e Celeste Simões crianças com pais ou mães encarcerados: uma revisão da literatura.............................................................................................................. 141 Gabriela Reyes Ormeño, Joviane Marcondelli Dias Maia e Lúcia Cavalcanti Albuquerque Williams Journal of Child and Adolescent Psychology Revista de Psicologia da Criança e do Adolescente. Lisboa, 4(2) 2013

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Sumário

características psicométricas da versão portuguesa do inventário da percepção dos professores acerca da melhoria da escola (Leithwood e col., 2006) ................................... 163 Adelaide Dias, João Tiago Oliveira e Paulo A. S. Moreira estilos parentais e desenvolvimento positivo em crianças e adolescentes com doença crónica ................................................. 185 Teresa Santos, Margarida Gaspar de Matos, Maria Celeste Simões, Inês Camacho, Gina Tomé e María Carmen Moreno prevenção e promoção da saúde: um desafio na formação de psicólogos ...................................................................................................... 205 Suzane Schmidlin Löhr, Márcia Helena da Silva Melo, Caroline Guisantes de Salvo e Edwiges Ferreira de Mattos Silvares

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nota introdutória A Revista Psicologia da Criança e do Adolescente é uma revista científica multidisciplinar, que procura publicar resultados de novas pesquisas e intervenções no âmbito da Psicologia e ciências relacionadas, nestes grupos etários. Funciona como uma forma de divulgação da investigação e prática de diversos temas actuais e de elevada pertinência na área científica da Psicologia da Criança e do Adolescente. É um fórum de encontro e discussão da experiência, ideias e investigação científica fundamentais para o desenvolvimento profissional de Psicólogos, docentes, investigadores e outros profissionais, assim como discentes. A Revista envolve e integrar várias abordagens e quadros teóricos, incidindo essencialmente numa perspectiva desenvolvimental e ecológica. Procuramos artigos originais, artigos de revisão, artigos de investigação aplicada, cartas ao editor, comentários e ainda estudos de caso nas áreas de Psicologia da saúde, Clínica, Educacional, Trabalho e Organizações, Criminal entre outras disciplinas que trabalhem com ou estejam envolvidas com o desenvolvimento psicossocial da criança e do adolescente. Assumindo-se como uma Revista multidiciplinar e interdisciplinar, promove a diversidade, internacionalidade e qualidade, o que se reflecte na aceitação de artigos de temáticas e abordagens associadas a diversas linhas de investigação e intervenção. Recebemos artigos científicos em quarto línguas: Português, Espanhol, Inglês e Francês. A Revista contempla, também, trabalhos relacionados com a intervenção, desde que devidamente fundamentada e avaliada, assim como, possui espaço para resumos de tese de mestrado e de doutoramento. De modo a promover e manter a qualidade científica dos artigos e demais colaborações, contamos com um conselho científico de investigadores Nacionais e Internacionais, especializados directamente ou indirectamente na área da Psicologia da Criança e do Adolescente e áreas associadas. O Conselho Científico realizará a revisão cega entre pares dos trabalhos submetidos e dará o seu parecer. Esta revista é oficialmente publicada pelo Instituto de Psicologia e Ciências de Educação/ Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Lusíada de Lisboa e pelo Centro de Investigação em Psicologia para o Desenvolvimento

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(CIPD). Propõe ser uma publicação semestral, publica números de carácter genérico e, periodicamente, números de carácter temático. A Revista Psicologia da Criança e do Adolescente pode ser adquirida através de assinatura, pretende estabelecer um sistema de permuta com um elevado número de revistas nacionais e internacionais. Até ao presente número, a Revista de Psicologia da Criança e do Adolescente tinha o “Número” como organizador dos vários grupos de contribuições/artigos. Contudo, a tipologia de organização das revistas mais consensual é uma tipologia com dois níveis: a categoria do “conjunto de artigos publicado num ano - Volume” e “conjunto de artigos agrupados no mesmo produto editado – Número”. Desta forma, o conjunto de artigos publicados ao longo de um ano tem a denominação de “Volume”, ao passo que o conjunto de contribuições publicado num determinado momento tem a denominação de “Número”. A distribuição que cada revista faz da edição de conjuntos de contribuições (Números) ao longo do ano define a sua “periocidade”. Assim, existem revistas anuais (concentram a edição de todas as contribuições/artigos num único momento anual), semestrais (publicam de 6 em seis meses), quadrimestrais, trimestrais, bi-semestrais e mensais (publicam todos os meses). A tipologia de organização adoptada tem implicações ao nível da identificação das contribuições (incluindo para as citações das mesmas). Com o objectivo de alinhar a sua organização com a vigente na generalidade das revistas científicas da sua área científica, a Revista de Psicologia da Criança e do Adolescente passa a adoptar a tipologia de “Volume” e Número”. Assim, e uma vez que este é o quarto ano de publicação da revista, o Volume do ano de 2013 é Volume 4. Pelo facto de ser uma revista semestral, o conjunto de contribuições publicados no 1º semestre denomina-se Número 1 e o conjunto de contribuições publicado no 2º semestre denomina-se de Número 2.

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Introductory Note The Journal of Child and Adolescent Psychology is a multidisciplinary scientific journal that aims to publish the results of new research and interventions in psychology and related sciences, in these age groups. It serves as a dissemination vehicle of research and practice on several current subjects of high relevance in the scientific areas related to Child and Adolescent Psychology. It is a forum to meet and discuss experience, ideas and research, fundamental to the professional development of psychologists, teachers, researchers and other professionals, as well as students. The Journal involves and integrates various approaches and theoretical frameworks, focusing mainly on an ecological and developmental perspective. We seek original articles, review articles, articles of applied research, letters to the editor, comments, and also case studies in the areas of Health Psychology, Clinical, Education, Work and Organizations, Criminal and other disciplines that work with or are involved with child and adolescent psychosocial development. Assuming itself as a multidisciplinary and interdisciplinary Journal, it promotes diversity, internationality and quality, which is reflected in the acceptance of article topics and approaches associated to different lines of research and intervention. We accept papers in four languages: Portuguese, Spanish, English and French. The Journal also envisages work on intervention, if properly justified and evaluated, as well as offers space for summaries of master’s thesis and doctoral programs. To promote and maintain the quality of scientific articles and other contributions, we have a scientific advisory board of national and international researchers who are specialized directly or indirectly in Child and Adolescent Psychology and related areas. The Scientific Council will hold a blind peer review on the submitted papers and give its opinion. This journal is officially published by the Institute of Psychology and Educational Sciences/Faculty of Humanities and Social Sciences of the Universidade Lusíada in Lisbon and by Research Center Psychology for the Development (CIPD). It has a biannual publication, publishing generic issues and, periodically, theme issues.

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The Journal of Child and Adolescent Psychology may be purchased by subscription, and will establish an exchange system with a large number of national and international journals. Up until now, the Journal of Child and Adolescent Psychology had the “number” as the organizer of all contributions/articles. However, the most consensual organization for scientific journals has two levels: the “set of articles published in a year – Volume” and “set of articles grouped in the same edited product – Number”. This way, the set of articles published through out a year is called Volume, and the set of articles published in a certain moment of the year has a certain number. The distribution that each journal makes of all the articles in a year defines its periodicity. Therefore, there are annual journals (with all the articles edited in one moment of the year), semiannual (published every 6 months), every four months (quarterly), every trimester, every two months and monthly. The adopted organization has implications in terms of the contributions, even for their citation. With the aim of aligning its organization with the one used by most of the scientific journals of our scientific area, the Journal of Child and Adolescent Psychology is adopting the Volume and Number typology. Since this is the fourth year that the Journal is published, the Volume of the year 2013 is Volume 4. Due to the fact that it is a semiannual Journal, the set of articles published in the 1st semester will be part of Number 1 and the set of articles published in the 2nd semester will be part of number 2.

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Actitudes y comportamiento sexual de riesgo de embarazo en jóvenes universitarios Attitudes and risk sexual behaviour of pregnancy in university students Atitudes e comportamento sexual com risco de gravidez em alunos universitários

Marta Yubero Elisa Larrañaga Santiago Yubero

Facultad de Ciencias de la Educación y Humanidades Universidad de Castilla-La Mancha, España

Contacto para correspondencia: Elisa Larrañaga Elisa.larranaga@uclm.es Resumen: El objetivo de este estudio ha sido analizar el comportamiento sexual en estudiantes universitarios, para conocer las variables que se asocian al comportamiento sexual de riesgo en esta población. Para ello, se ha realizado un cuestionario sobre las temáticas más relevantes en el ámbito del comportamiento sexual de riesgo de embarazo. El cuestionario ha sido completado por 262 estudiantes de la Universidad de Castilla-La Mancha. En primer lugar se realiza el análisis descriptivo del comportamiento sexual y de las variables de estudio. Con la aplicación del análisis de regresión logística se han configurado modelos para la relación sexual, para el riesgo de embarazo en las primeras relaciones y con la relación sexual actual. Los resultados confirman que, en general, el

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comportamiento sexual es bastante similar entre los hombres y las mujeres universitarias del siglo XXI. El modelo de regresión muestra que la actitud es un buen predictor del comportamiento sexual de riesgo de embarazo. Se señala la necesidad de intervenir en la prevención de comportamiento de riesgo mediante el cambio de actitud. Palabras clave: Comportamiento sexual; riesgo de embarazo; actitudes; anticoncepción; estudiantes universitarios. Abstract: The aim of this study was to analyze sexual behaviour in university students in order to identify variables associated with risky sexual behavior among this population. For this purpose, a questionnaire on the most relevant topics in the field of sexual behaviour with risk of pregnancy was carried out. It was completed by 262 students at the University of Castilla-La Mancha. First, it was performed the descriptive study of the sexual behaviour and the analyzed variables. Applying the logistic regression analysis, we have configured some models for the sexual relation, for the risk of pregnancy in the first relations and the current sexual relation. The results have confirmed that, in general, sexual behaviour is quite similar among male and female university students of the 21st century. The regression model shows that the attitude is a good predictor of the sexual behaviour of risk of pregnancy. It highlights the need of intervening in the prevention of that risky behaviour by means of the change of attitude. Key-words: Sexual behavior; risky of pregnancy; attitudes; contraception; university students. Resumo: O objectivo deste estudo é o de analisar o comportamento sexual de alunos universitários de modo a identificar variáveis associadas com comportamentos sexuais de risco nesta população. Um questionário com os tópicos mais relevantes na área do comportamento sexual com risco de gravidez foi desenvolvido. For respondido por 262 alunos da Universidade de Castilla-La Mancha. Primeiro foi efectuado um estudo descritivo do comportamento sexual e as variáveis foram analisadas. Foi aplicada uma análise de regressão, onde alguns modelos foram configurados sobre a relação sexual, o risco de gravidez na primeira relação sexual e relação sexual actual. Os resultados confirmaram que, em geral, o comportamento sexual é semelhante entre alunos (rapazes) e alunas (raparigas) do século XXI. O modelo de regressão mostra que a atitude é uma boa preditora do comportamento sexual com risco de gravidez. É salientada a necessidade de intervenção na prevenção do comportamento de risco de modo a efectuar mudanças na atitude. Palavras-chave: comportamento sexual; risco de gravidez; atitudes; contracepção; alunos universitários.

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Introducción Si tenemos en cuenta que para la gran mayoría la sexualidad es un elemento fundamental en la vida y necesario para el equilibrio personal (87% de los hombres y 78% de las mujeres, según la Encuesta Nacional de Salud Sexual), garantizar una sexualidad segura se convierte en un objetivo básico del bienestar. Ha de entenderse la sexualidad como un estado de bienestar físico, emocional y mental, que requiere la posibilidad de tener experiencias sexuales seguras (Organización Mundial de la Salud, 2006), considerando que la salud reproductiva implica la libertad de tener hijos y de decidir cuándo tenerlos. El Ministerio de Sanidad y Política Social aprobó la Ley Orgánica 2/2010, que en su Título Primero articula los conceptos y medidas (sanitarias y educativas) de la salud sexual y reproductiva. El artículo 11 de la Ley establece el desarrollo del Plan de Estrategia Nacional de Salud Sexual y Reproductiva (ENSR) que fue publicado en enero de 2011. La ENSR marca entre las recomendaciones de la salud sexual emprender acciones para promover una sexualidad saludable, encaminadas a la prevención de embarazos no deseados. Según los datos proporcionados por el Ministerio de Sanidad, Política Social e Igualdad, en sus informes anuales de Interrupción Voluntaria del Embarazo (IVE), la tasa más alta se encuentra en el rango de edad entre 20 a 24 años. Gökengin et al. (2003) definen el comportamiento sexual de riesgo como aquel que está asociado a la combinación de un inicio precoz de las relaciones sexuales, el hecho de tener múltiples parejas sexuales y el uso inadecuado de una anticoncepción eficaz. Sin duda, incurrir en un comportamiento sexual de riesgo conlleva consecuencias a corto y largo plazo; entre ellas, embarazos no deseados, interrupciones voluntarias del embarazo y el contagio de enfermedades de transmisión sexual (Jaspan et al., 2011). Beadnele et al. (2005) añaden a todos estos factores la variable frecuencia en las relaciones sexuales, siendo para ellos el uso inadecuado de métodos anticonceptivos el factor que más influye en el comportamiento de riesgo de embarazo. Los jóvenes se consideran un colectivo susceptible de incurrir en la práctica de relaciones sexuales de riesgo (Hernández et al., 2009), ya que tienden a no utilizar métodos anticonceptivos eficaces en sus relaciones, tienen un inicio precoz en sus relaciones coitales, en torno a los 15 años (Paz, Castro, Madrid y Buela-Casal, 2010; Reina, Ciriaravino, Llovera y Castelo-Branco, 2010; Teva, Paz y Buela-Casal, 2009a) y un mayor número de parejas ocasionales. Es importante conocer los factores que influyen en el comportamiento sexual de riesgo de los jóvenes. Navarro, Carrasco, Sánchez y Torrico (2004) atribuyen este comportamiento sexual de riesgo en jóvenes a una escasa información, a poseer creencias erróneas, tener una actitud negativa frente al uso de anticonceptivos, a las características de invulnerabilidad propias de la juventud y a no tener suficiente asertividad para la adquisición de métodos anticonceptivos o a la falta de convencimiento de la pareja sobre la necesidad de su utilización.

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Existen también factores sociodemográficos como el sexo, la religión, el estatus y el nivel socioeconómico de los padres, que pueden ser importantes y se han de tener en cuenta ya que se ha demostrado que una buena relación y un control paterno eficaz sobre el comportamiento sexual de los jóvenes influye positivamente en sus conductas (Reagan, Wetherill y Fromme, 2010; Nappi et al., 2009; Wamoyi et al., 2009). Es importante resaltar las diferencias de género observadas en el comportamiento sexual de riesgo, siendo los varones quienes asumen mayor riesgo en su comportamiento sexual (Reis, Ramiro, Gaspar de Matos y Diniz, 2012). Los hombres tienen un inicio más precoz de las relaciones sexuales, mayor número de parejas, consumen en mayor medida alcohol durante las relaciones y tienen más parejas ocasionales (Luengo, Orts, Caparrós y Arroyo, 2007; Muñoz-Silva et al., 2009). En relación con el uso de métodos anticonceptivos es el preservativo el más usado, hasta un 85% (Capuano et al., 2009; Gökengin et al., 2003). La utilización de este método está muy extendida y se observan porcentajes muy elevados de adolescentes que lo utilizan tanto en la primera relación como en la última (Teva, Paz y Buela-Casal, 2009b). Es probable que el gran número de campañas publicitarias sobre el uso del preservativo haya hecho más general su utilización (Teva, Paz y Buela-Casal, 2011). Un dato a resaltar es que se observan menores porcentajes en el uso del preservativo en el contexto de una relación actual con pareja estable (Reis, Ramiro, Gaspar de Matos y Diniz, 2013a), sobre todo en mujeres, lo que aumenta las conductas de riesgo. Parece ser que en una relación de pareja estable se percibe como menos importante el uso del preservativo y no usarlo no se considera como práctica sexual de riesgo, en particular por las mujeres (Teva et al., 2009a; Failde, Lameiras y Bimbela, 2008). En cuanto al uso de la anticoncepción de emergencia existen en la literatura científica porcentajes muy variados de su utilización. En lo que si coinciden todas las investigaciones es que el uso de la anticoncepción de emergencia constituye un factor que influye negativamente sobre el comportamiento sexual de riesgo. Existe en las investigaciones controversia sobre en qué medida puede influir el conocimiento sobre anticoncepción en el comportamiento sexual de los jóvenes. Aunque un porcentaje elevado de jóvenes afirman haber recibido educación sexual en el instituto (Capuano et al., 2009), sólo un 19% de estos jóvenes se consideran suficientemente informados en temas de sexualidad (Dueñas et al., 2005). Además, es importante también conocer su actitud hacia estos temas. Teva et al. (2011) han constatado que un 37% de los jóvenes encuestados afirman que el uso de anticonceptivos resta placer a las relaciones sexuales, que usar métodos anticonceptivos quita espontaneidad a las relaciones (38%) y que el preservativo es complicado de usar (62%). Un 19% de los jóvenes afirma no llevar preservativos por temor a que los demás piensen mal de ellos, siendo el porcentaje de chicas ligeramente superior. Algunos datos muestran una actitud desfavorable hacia el

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uso de métodos anticonceptivos, y con ello, una mayor probabilidad de rechazar su utilización e incurrir en un comportamiento sexual de riesgo de embarazo. Actualmente el conocimiento en esta área es incipiente. La mayoría de los estudios sobre el comportamiento sexual de riesgo se centran en las ETS y el VIH. Para posibilitar una intervención eficaz en la prevención del embarazo no deseado es necesario conocer las experiencias sexuales de los jóvenes y determinar cuáles son los motivos que les llevan a mantener prácticas de riesgo. Basándonos en los estudios sobre el comportamiento sexual de riesgo, analizaremos qué variables intervienen específicamente sobre el comportamiento de riesgo de embarazo. Nos centraremos en la influencia del contexto familiar y el comportamiento de los iguales, el nivel de conocimiento y la actitud sexual de los jóvenes. Metodología Participantes Debido a la dificultad que supone obtener información válida sobre una actividad tan íntima como la sexualidad personal, la muestra fue seleccionada en función de la disponibilidad de acceso. Se eligió que perteneciera al mismo organismo en el que se encuadra este trabajo, con el objetivo de incrementar la confianza y la predisposición a participar en la investigación. La muestra está compuesta por 262 jóvenes estudiantes universitarios de los grados de Trabajo Social y Educación Social, del campus de Cuenca de la Universidad de Castilla-La Mancha. La distribución por sexos se encuentra sesgada (77.8% mujeres, 21.5% hombres) en función de la constitución de origen. La media de edad es de 20.92 años (hombres 25.87 años, mujeres 20.60 años). Instrumento Para la recogida de los datos se elaboró un cuestionario teniendo en cuenta las investigaciones previas sobre comportamiento sexual en adolescentes y el comportamiento sexual de riesgo (Calafat et al., 2009; Navarro et al., 2004), actitudes ante el preservativo y conocimientos sobre anticoncepción (Hernández et al. 2009). Se optó por un cuestionario autoadministrado para favorecer la sensación de intimidad y confidencialidad. El cuestionario incluye los siguientes bloques temáticos, que se corresponden con las variables de estudio: - Variables sociodemográficas. Se recogieron los datos de religión, país de nacimiento y rendimiento académico de los jóvenes. También se les preguntó sobre el nivel académico de los padres y su religión. - Comportamiento sexual. Incluye información sobre la experiencia de haber mantenido relaciones sexuales completas, la edad de la primera relación sexual y el método anticonceptivo utilizado, las relaciones sexuales actuales, si tienen

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pareja actual, el método anticonceptivo que emplean actualmente, el consumo de alcohol previo a la relación sexual y la utilización de la anticoncepción de emergencia. También se ha valorado la disposición para comprar o conseguir anticonceptivos y para plantearle su uso a la pareja. Se incluyó información sobre el modelaje de padres y amigos en el uso de medidas anticonceptivas. - Conocimientos sobre anticoncepción. Está compuesto por diez enunciados en relación con las creencias y conocimientos básicos sobre anticoncepción. Los sujetos tenían que responder si consideraban verdadero o falso el enunciado propuesto. - Actitud hacia las relaciones sexuales y el uso de métodos anticonceptivos. Este bloque abarca 15 ítems referentes a la actitud hacia las relaciones sexuales completas (con penetración), las ventajas o desventajas percibidas en el uso de anticonceptivos y la disposición a usarlos. El sujeto debía expresar su grado de acuerdo y desacuerdo a través de una escala Likert de cinco puntos (1-Totalmente en desacuerdo, 5-Totalmente de acuerdo). Procedimiento Explicados previamente los objetivos del estudio, los sujetos participaron libremente, de manera voluntaria e individual. El cuestionario fue aplicado en el curso 2011/2012, dentro de las aulas de cada una de las facultades, con el consentimiento previo de los profesores de la titulación, que ocupaban el espacio en el momento de completarlo. Análisis de datos En primer lugar se han realizado los análisis descriptivos de las variables de estudio y la comparación en cada una de ellas según el sexo. El comportamiento sexual se ha analizado en relación al establecimiento de relaciones completas, la primera relación sexual y las relaciones sexuales actuales. En la variable de conocimiento se ha calculado una puntuación global sobre los ítems. Para la actitud se ha realizado un análisis factorial exploratorio de la escala desarrollada para extraer los factores de estudio. El comportamiento sexual de riesgo de embarazo se ha codificado dicotómicamente (práctica de riesgo/no riesgo de embarazo) agrupando los métodos anticonceptivos empleados en función de la seguridad que proveen contra el embarazo. Así, el empleo de preservativos, pastillas y el anillo vaginal se ha considerado prácticas seguras. No emplear ningún método, el coito interrumpido y practicar sexo durante la regla se han categorizado como comportamientos de riesgo de embarazo. Si tenemos en cuenta, como afirman las investigaciones (Beadnele et al., 2005; Gokengin et al., 2003) que el uso inadecuado de los métodos anticonceptivos es un factor de riesgo de embarazo, hemos calculado el riesgo real de embarazo al que se exponen los jóvenes. Para ello, hemos recodificado en comportamiento de riesgo el empleo de preservativos en los sujetos que informan

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que su empleo es seguro si se coloca antes de la eyaculación (pregunta 1 de la batería de conocimiento). Con el objeto de conocer qué variables se asocian al comportamiento sexual con penetración y al riesgo de embarazo, se han analizado las relaciones entre las variables criterio y el resto de las variables incluidas en el estudio, a través de regresiones logísticas binarias. Hemos empleado el riesgo informado y el riesgo real calculado como variables dependientes en los análisis de las relaciones completas actuales. Además, teniendo en cuenta el diferente comportamiento sexual que informan las investigaciones (Teva et al., 2009b, Failde et al., 2008), hemos analizado independientemente el comportamiento de los jóvenes que tienen pareja. Los análisis se han realizado progresivamente, incluyendo las variables significativas que indican las investigaciones y manteniendo las variables que habían alcanzado significación en la regresión antecedente. Las variables predictoras que hemos introducido en la regresión son: variables personales (sexo, país de nacimiento, religión, rendimiento), variables familiares (nivel académico y religión del padre y de la madre), formación sexual (educación sexual, percepción de tener suficiente información, total de conocimientos sobre anticoncepción), características de la primera relación (edad de la primera relación, con quién mantuvo la primera relación), situación actual (tener pareja, empleo de anticonceptivo de emergencia, consumo de alcohol), modelaje (prevención de embarazos en la familia y en los amigos), actitud (estabilidad de la pareja, rechazo de los métodos anticonceptivos, rechazo social de los preservativos, rechazo personal de los preservativos y actitud positiva hacia la anticoncepción). Se han incluido como variables predictoras aquellas con más de un 10% de los casos en cada casilla. La inclusión ha sido por pasos según la categorización establecida siguiendo el criterio adelante Wald. Los análisis estadístico han sido desarrollados a través del paquete informático SPSS/PC (versión 19). Resultados Más de la mitad de los jóvenes de la muestra, 56.5%, se declaran católicos no practicantes. Un 13% se autodefinen como católicos practicantes y un 26.5% no practica ninguna religión. Por género, un 48% de los hombres afirman no practicar ninguna religión y las mujeres en un 61.1% son católicas no practicantes, p<.000. En cuanto al rendimiento académico, un 73.4% afirma que su rendimiento es bueno, siendo superior la percepción de las mujeres, 52.7% de los hombres, 79.1% de las mujeres, χ2= 23.77, p<.001. En relación con el país de nacimiento, los sujetos de la muestra son mayoritariamente de nacionalidad española, 95.4%. Respecto al contexto familiar, un 38.5% de los padres no han realizado estudios, un 35.1% estudios primarios, un 15.3% estudios secundarios y un 5.7% son titulados universitarios. En porcentajes similares se distribuye el nivel académico de las madres: un 42.4% sin estudios, 30.5% estudios primarios, estudios

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secundarios un 17.6% y un 4.6% estudios universitarios. La mayoría identifican a sus progenitores con la religión católica, son practicantes un 25.4% de los padres y un 36.2% de las madres. Católicos no practicantes un 56.5% de sus padres y un 52.3% de las madres. Un 16.2% informa que su padre no practica ninguna religión. En cuanto a las madres el porcentaje es del 9,2%. Comportamiento sexual Un 90% de los jóvenes afirma haber mantenido relaciones sexuales completas, 90.9% de los hombres, 90.1% de las mujeres, p= ns. La edad media de la primera relación fue 16.49 años, no encontrándose diferencia entre los hombres y las mujeres, hombres: M= 16.22, Sx= 3.38; mujeres: M= 16.54, Sx= 2.71; t= -0.72, p= ns. Un 26.6% afirman haber tenido la primera relación con una pareja ocasional, obteniendo datos diferentes por género, 41.1% en hombres y 21.2% en mujeres. El 71% de las mujeres han tenido la primera experiencia sexual con una pareja estable, χ2= 12.84, p<.01. En cuanto al uso de anticonceptivos en la primera relación, los datos marcan diferencias por sexo, χ2= 66.23, p<.000. Solamente un 1.6% de las mujeres informa de uso de anticonceptivos orales. Un 7.4% de los jóvenes incurren en un comportamiento sexual de riesgo de embarazo en la primera relación sexual, siendo similar la conducta de riesgo en ambos sexos, 12% de hombres, 6.2% de mujeres; χ2= 1.88, p= ns: no emplear ningún método anticonceptivo, 5.9% hombres, 2.6% mujeres, y coito interrumpido, 5.9% hombres, 2.6% mujeres. Se obtiene un 86% de uso del preservativo, 88% de los hombres, 86% de las mujeres. Principalmente lo compran los hombres. El 75% de las mujeres informan que lo compró la pareja y un 70% de los hombres informan que lo compraron ellos. Un 73% de los jóvenes encuestados afirma tener relaciones sexuales completas en el momento de contestar el cuestionario, siendo los porcentajes similares por sexo, 75% hombres, 72% mujeres, χ2= 0.94, p= ns. Tienen pareja un 64% de las mujeres y un 47% de los hombres, χ2= 6.17, p= ns. Un 23% no tiene pareja ni relaciones sexuales. Un 57% tiene relaciones con su pareja y un 16% no tiene pareja estable, pero sí tiene relaciones sexuales con parejas ocasionales, siendo superior el porcentaje de hombres, 35.4% de hombres, 11.3% de mujeres. En el contexto de las relaciones sexuales actuales, el porcentaje de jóvenes que incurre en un comportamiento sexual de riesgo de embarazo asciende a un 27.4%. Por género, el porcentaje de riesgo en hombres es un 22.2% y en mujeres un 28%, χ2= 2.74, p= ns. Los jóvenes que tienen pareja incurren en mayor medida en riesgo, 25%, que los que mantienen relaciones con parejas ocasionales, 15%, χ2= 81.18, p<.001. Los métodos anticonceptivos que emplean los estudiantes universitarios de ambos sexos son similares. Un 10% de los hombres y un 9% de las mujeres no emplea ningún método anticonceptivo, χ2 4.57, p= ns. El método más empleado es el preservativo, 53.6% hombres, 38.4% mujeres, χ2= 5.78, p= ns. Su empleo se

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incrementa en las mujeres que tienen pareja, 50.8%; mientras que los hombres mantienen el porcentaje de empleo con independencia de la situación de pareja, 59.3% hombres, 58.3% mujeres, χ2= 0.00, p= ns. Informan que toman pastillas anovulatorias un 14.9%, 7.1% hombres, 17.2% mujeres, χ2= 3.88, p= ns, más las mujeres que tienen pareja, 21.7%. El anillo solamente lo emplea un 3.1%, 1.8% hombres, 3.4% mujeres, χ2= 0.47, p= ns, todos informan de pareja. Un 11.8% práctica el coito interrumpido, 12.7% hombres, 18.3% mujeres, χ2= 0.38, p= ns, e informan de tener relaciones sexuales durante la regla exclusivamente dos estudiantes. No se produce diferencia en el consumo de alcohol antes de la relación sexual, 37% de los hombres, 33% de las mujeres. La mayoría informa que sus amigos toman medidas preventivas ante el embarazo, un 83.6% de los hombres y un 91.6% de las mujeres, χ2= 3.51, p= ns. Los hombres tienen mayor desconocimiento sobre la anticoncepción familiar, 48%, mientras que las mujeres, 33%, no saben si sus padres emplean alguna prevención. Responden afirmativamente el 56% de los estudiantes. Con respecto a la utilización de anticoncepción de emergencia, un 39.1% de los jóvenes afirma haberla empleado alguna vez, con porcentajes similares los hombres y las mujeres, 35.3% hombres, 39.5% mujeres, χ2= 10.89, p= ns. Han hecho uso de la píldora postcoital un 49.7% de los jóvenes que tienen pareja. A pesar de haber empleado el anticonceptivo de emergencia, más del 60% sigue realizando prácticas sexuales con riesgo de embarazo, 22% coito interrumpido, 15% no emplea ningún método anticonceptivo y el 24% utiliza el preservativo antes de la eyaculación. Conocimiento sexual En relación con la información sexual, un 77.4% de los estudiantes universitarios se consideran suficientemente informados en temas relacionados con la sexualidad. Casi el 80% ha recibido formación sobre sexualidad en el instituto. Si puntuamos a los jóvenes según las respuestas correctas sobre diez puntos, el nivel de conocimiento es similar en hombres y mujeres, hombres: M= 7.23, Sx= 1.13, mujeres: M= 7.41, Sx= 1.49, t= -0.84, p= ns. En relación al empleo del preservativo, 66 estudiantes que lo emplean en sus relaciones informan que consideran que es seguro si se coloca antes de la eyaculación. Son sujetos que están realizando prácticas de riesgo de embarazo y así los hemos considerado. Para ello, hemos creado una nueva variable que designamos “riesgo real de embarazo”. El porcentaje de jóvenes que incurre en un comportamiento sexual de riesgo real de embarazo asciende a un 59%. Por género, el porcentaje de riesgo en hombres es de un 57% y en mujeres un 63%, χ2= 1.65, p= ns. Los jóvenes que tienen pareja incurren en mayor medida en riesgo real, 55.9%, que los que mantienen relaciones con parejas ocasionales, 29.2%, χ2= 81.47, p<.001.

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Actitud hacia la sexualidad y los métodos anticonceptivos Se realizó un análisis factorial con rotación Varimax sobre la Escala de Actitud, con el fin de conocer las variables latentes de la actitud hacia la sexualidad y los métodos anticonceptivos. Los factores de la solución rotada explicaron los siguientes porcentajes de varianza total: Factor I, Estabilidad de la pareja, 12.36%; Factor II, Rechazo de los métodos anticonceptivos, 11.96%; Factor III, Rechazo social del preservativo, 11.41%; Factor IV, Rechazo personal del preservativo, 11.20%; Factor V, Aceptación de la anticoncepción, 10.20%. En la Tabla 2 se presenta la matriz de configuración resultante de la rotación. La comunalidad de todos los ítems fue superior a .400. La saturación de los ítems en cada uno de estos cuatro factores fue suficientemente elevada, ya que presentaron pesos factoriales mayores de .40 en el factor correspondiente, y menos de .30 en cualquier otro factor; con la excepción del ítem segundo, que entra a formar parte de los factores I y III. Explorada la estructura factorial y adoptada la decisión de mantener los cinco factores, se determinaron los índices de fiabilidad para cada uno de ellos (Tabla 1). Tabla 1. Análisis factorial de la escala de Actitud Sexual ITEMS Solamente se debe tener sexo con una pareja estable. Necesito estar conectado/a emocionalmente para tener sexo. Es adecuado tener varias parejas sexuales a la vez. Es importante esperar hasta el matrimonio para tener relaciones sexuales. Cuando tienes una pareja estable no es necesario tomar medidas anticonceptivas. La mujer que toma anticonceptivos es porque ha tenido muchas parejas sexuales. La educación anticonceptiva es imprescindible para los jóvenes. Los preservativos crean desconfianza en la pareja. Los preservativos son complicados de usar. No me importaría llevar preservativos aunque pensaran mal de mí . Los preservativos disminuyen la sensibilidad. Utilizar métodos anticonceptivos resta espontaneidad a la relación. Cuando se quiere a una persona, tener sexo incrementa el amor. Los anticonceptivos permiten disfrutar más por la seguridad que aportan. Los preservativos se pueden utilizar como juguete erótico y disfrutar más de la relación α de Crombach

Factores* EP RMA .752 .737 -.697 .465

RSP

RPP

AA

.549 .768 .742 -.637 .787 .659 -.445 .753 .715 .667 .664 .572

.624

.601

.424

.594

.412

Nota. Se han eliminado los pesos factoriales inferiores a .30, para mejorar la claridad expositiva. *EP: Estabilidad de la pareja; RMA: Rechazo de los métodos anticonceptivos; RSP: Rechazo social del preservativo; RPP: Rechazo personal del preservativo; AA: Aceptación anticoncepción.

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Los estudiantes universitarios muestran su acuerdo con el control del embarazo. La puntuación actitudinal más alta se corresponde con la Aceptación de la anticoncepción, hombres: M= 3.37, Sx= 0.82, mujeres: M= 3.37, Sx= 0.75, t= -0.05, p= ns. Aunque los hombres rechazan en mayor medida el empleo de medidas anticonceptivas, hombres: M= 1.61, Sx= 0.74, mujeres: M= 1.35, Sx= 0.54, t= 2.27, p< .05) y muestran un rechazo personal más elevado al empleo de los preservativos, hombres: M= 2.55, Sx= 0.78, mujeres: M= 2.27, Sx= 0.77, t= 2.20, p< .05). Las mujeres consideran más importante la estabilidad de la pareja, hombres: M= 2.67, Sx= 0.83, mujeres: M= 2.99, Sx= 0.68, t= -2.41, p< .01. Modelos de regresión para el comportamiento sexual con penetración y el riesgo de embarazo Relaciones sexuales con penetración La variable de respuesta es dicotómica, agrupándose sus categorías en haber tenido una relación sexual completa con penetración o no. Entran a formar parte de la ecuación como predictores las variables: religión de la madre (β= 8.27, Wald= 3.39, p= ns), tener pareja (β= 5.98, Wald= 21.19, p<.001), total de conocimiento (β= 9.52, Wald= 6.70, p<.01) y la estabilidad de la pareja (β= -1.49, Wald= 6.29, p<.05). El modelo muestra buen ajuste global, χ2= 100.59, gl= 13, p<.001. El coeficiente R2 de Nagelkerke indica que el 69.7% de la variabilidad en la variable de respuesta viene explicada por el modelo de regresión logística. En la tabla de clasificaciones de los casos según el valor observado y el valor pronosticado, el porcentaje total de coincidencias es del 92%. Riesgo primera relación La variable de respuesta es dicotómica, agrupándose sus categorías en haber tenido riesgo de embarazo en la primera relación o no. Entran a formar parte de la ecuación como predictores las variables: madre estudios (β= -2.27, Wald= 4.39, p< .05), madre religión (β= 2.21, Wald= 5.31, p< .05), edad primera relación (β= -0.68, Wald= -4.25, p< .05), rechazo social del preservativo (β= 10.80, Wald= 7.46, p< .01) y rechazo personal del preservativo (β= 3,24, Wald= 7.86, p< .01). El modelo muestra buen ajuste global, χ2 = 47.03, gl= 15, p<.001. El coeficiente R2 de Nagelkerke indica que el 65% de la variabilidad en la variable de respuesta viene explicada por el modelo de regresión logística, asimismo, en la tabla de clasificaciones de los casos según el valor observado y el valor pronosticado, el porcentaje total de coincidencias es del 95.7%. Riesgo relación actual La variable de respuesta es dicotómica, agrupándose sus categorías en haber tenido riesgo de embarazo en las relaciones actuales o no. Entran a

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formar parte de la ecuación como predictores las variables: edad de inicio de las relaciones sexuales (β= -.255, Wald= 3.66, p< .01), consumo de alcohol previo relaciones sexuales (β= .892, Wald= 4.84, p< .05), anticoncepción de emergencia (β= .926, Wald= 5.64, p< .05) y rechazo personal del preservativo (β= .869, Wald= 3.27, p< .05). El modelo muestra buen ajuste global, χ2 = 32.18, gl= 12, p<.001. El coeficiente R2 de Nagelkerke indica que el 25.2% de la variabilidad en la variable de respuesta viene explicada por el modelo de regresión logística, asimismo, en la tabla de clasificaciones de los casos según el valor observado y el valor pronosticado, el porcentaje total de coincidencias es del 75.5%. Riesgo real actual total La variable de respuesta es dicotómica, agrupándose sus categorías en haber tenido riesgo real de embarazo en las relaciones actuales o no. Entran a formar parte de la ecuación como predictores las variables: consumo de alcohol previo a las relaciones sexuales (β= .097, Wald= 5.17, p< .05), estabilidad de pareja (β= .596, Wald= 4.20, p< .01), rechazo personal del preservativo (β= .898, Wald= 5.78, p< .05) y aceptación de la anticoncepción (β= -.422, Wald= 3.26, p< .05). El modelo muestra buen ajuste global, χ2 = 19.77, gl= 12, p<.05. El coeficiente R2 de Nagelkerke indica que el 15.1% de la variabilidad en la variable de respuesta viene explicada por el modelo de regresión logística, asimismo, en la tabla de clasificaciones de los casos según el valor observado y el valor pronosticado, el porcentaje total de coincidencias es del 67%. Riesgo real actual con pareja La variable de respuesta es dicotómica, agrupándose sus categorías en haber tenido riesgo real de embarazo con la pareja en las relaciones actuales o no. Entran a formar parte de la ecuación como predictores las variables: estabilidad de pareja (β= .566, Wald= 3.04, p= ns), rechazo personal del preservativo (β= .981, Wald= 5.14, p< .05) y aceptación de la anticoncepción (β= -.783, Wald= 6.57, p< .05) El modelo muestra buen ajuste global, χ2 = 25.84, gl= 12, p<.05. El coeficiente R2 de Nagelkerke indica que el 24% de la variabilidad en la variable de respuesta viene explicada por el modelo de regresión logística, asimismo, en la tabla de clasificaciones de los casos según el valor observado y el valor pronosticado, el porcentaje total de coincidencias es del 69.7%. Discusión El empleo correcto de las distintas opciones de anticoncepción es un elemento clave para hacer efectivo el derecho de cada persona a tomar decisiones respecto a su vida reproductiva. Sin olvidar, que en lo referente a la salud sexual,

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excepto el preservativo, el resto de los métodos para prevenir embarazos no deseados, no protegen de las infecciones de transmisión sexual, incluido el VIH, por lo que su uso pone en riesgo la salud sexual de quienes mantienen prácticas sexuales coitales. La Estrategia Nacional de Salud Sexual y Reproductiva (2011) establece como primer objetivo para la promoción de la salud sexual facilitar a la población información y educación para la salud sexual desde una visión holística, considerando las necesidades y las situaciones específicas de los distintos grupos de personas. A su vez, pretende promover la atención y la promoción de la salud sexual a partir de la mejora de los servicios ya existentes e impulsar la creación de otros nuevos, que se adecuen a las necesidades de la sociedad. Para poder cumplir estos objetivos, previamente es necesario un análisis de las diferentes situaciones concretas y el estudio de las variables que están incidiendo en los comportamientos de riesgo de los distintos colectivos. De esta forma se estructurarán programas de intervención más eficaces. Por ello, es importante la investigación de las prácticas sexuales y de las variables que están vinculadas con los comportamientos de riesgo de los colectivos más vulnerables. El objetivo de este trabajo fue analizar las prácticas sexuales de riesgo de embarazo en los estudiantes universitarios, al tratarse de una población que está llevando a cabo prácticas de riesgo de embarazo en un porcentaje importante. En el caso de los jóvenes universitarios, no encontramos prácticamente diferencias en el comportamiento sexual entre hombres y mujeres. Un 90% ha mantenido relaciones sexuales completas. La edad de la primera relación se sitúa en torno a los 16 años, coincidiendo con los datos de las investigaciones en adolescentes (Luengo et al., 2007; Reis et al., 2012; Valdez, Avilés y Saudán, 2012), pero sin haber encontrado diferencias según el sexo. El método anticonceptivo que informan como más empleado en las primeras relaciones es el preservativo, que han adquirido fundamentalmente los hombres, coincidiendo con el estudio de Teva et al. (2009a). Las mujeres tienen su primera relación mayoritariamente en pareja estable, mientras que los hombres informan haberla tenido con parejas ocasionales. El riesgo de embarazo en la primera relación, atendiendo al anticonceptivo empleado, es de un 7%, no observándose diferencias significativas por sexo, siendo menor que el informado en otras investigaciones. Casi dos tercios de los jóvenes universitarios mantienen relaciones sexuales en el momento de completar el cuestionario. Las mujeres principalmente con su pareja, los hombres también con parejas ocasionales. El empleo del preservativo es mayor en la primera relación que en las relaciones que mantienen actualmente (Reis et al., 2013a; Teva et al., 2011). Los estudiantes universitarios informan del uso del preservativo en los mismos porcentajes hombres y mujeres. Agrupando los métodos no eficaces para prevenir embarazos, un 28% de los universitarios está en situación de riesgo. El porcentaje es menor en los hombres, 22%, aunque la diferencia no alcanza significación estadística. Los resultados confirman que el riesgo es mayor en los estudiantes que tienen pareja estable, y en las mujeres.

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Este resultado también se observó en la investigación de Failde et al. (2008), asumiendo un mayor comportamiento de riesgo en las relaciones consideradas por los jóvenes como estables, conduciendo a un patrón diferencial en las medidas de prevención (Encuesta Nacional de Salud Sexual, 2009), dirigidas en mayor medida en las mujeres al empleo de anovulatorios orales y el uso del anillo vaginal, que solamente ha sido informada por los jóvenes que tienen pareja estable. Un 39% de los jóvenes informa que ha usado alguna vez la anticoncepción de emergencia, observándose también la asociación entre el uso de la píldora post coital e incurrir en comportamiento sexual de riesgo de embarazo (Ahideé et al., 2010; López-Amorós et al., 2010). Algunos estudios explican la baja percepción de riesgo sexual de los jóvenes, recurriendo a los sesgos cognitivos como la influencia del optimismo ilusorio (Pons-Salvador, Miralles y Guillén-Salazar, 2010). El optimismo ilusorio se produce cuando una persona estima que la probabilidad de ser víctima de un suceso desagradable es menor que la de otras personas, con el consiguiente efecto perjudicial que le conduce a no realizar conductas preventivas. Sería necesario estudiar con mayor profundidad la percepción y la motivación que lleva a los jóvenes a mantener su comportamiento de riesgo. Un porcentaje considerable de jóvenes encuestados presentan conocimientos sobre anticoncepción aceptables, con nivel de conocimiento similar en hombres y mujeres. El desconocimiento del uso adecuado de los preservativos lleva a incurrir en riesgo de embarazo a un porcentaje de jóvenes, que consideran que su comportamiento es seguro. Esta situación nos ha llevado a calcular y analizar el riesgo real de embarazo que tienen sus comportamientos sexuales. Bajo este criterio, más de la mitad de los jóvenes se sitúa en la franja de riesgo, correspondiendo en un 60% a las relaciones de pareja estable. Se confirman en mayor medida los datos de las investigaciones que ponen de manifiesto que en el contexto de una relación estable no usar el preservativo no se concibe como una práctica sexual de riesgo (Teva et al., 2011; Failde et al., 2008). Respecto a la actitud, las mujeres presentan actitudes más favorables (Reis, Ramiro, Gaspar de Matos y Diniz, 2013b) y se muestran en mayor medida de acuerdo con la necesidad de tener una pareja estable para mantener relaciones sexuales. La encuesta nacional también afirmaba que “amar y ser amado” es más importante en las mujeres para mantener relaciones sexuales, 45.5% de las mujeres y 32% de los hombres. No obstante, debemos tener en cuenta el riesgo que lleva asociado este comportamiento para las ETS y el VIH. Los hombres, en consonancia con los resultados de otras investigaciones (Gökengin et al., 2003; Muñoz-Silva et al., 2009) presentan una actitud más negativa hacia el empleo de los preservativos. El procedimiento de regresión logística binaria parece ser un instrumento idóneo para hacer una buena predicción del riesgo de embarazo en estudiantes

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universitarios, como muestran los porcentajes de casos bien clasificados que hemos obtenido (Remus y Wong, 1982). No ha entrado en ninguna de las ecuaciones las variables personales. Aunque diversos autores informan sobre la influencia de los iguales en el comportamiento sexual de riesgo en adolescentes (Camacho et al., 2010; Navarro-Pertusa, Reig-Ferrer, Barberá y Ferrer, 2006), el modelaje no ha resultado significativo para los estudiantes universitarios. Se confirma que el tener pareja es un factor importante para mantener relaciones sexuales completas. Además, se evidencia la importancia de la actitud sexual, puesto que se muestra que no creer en que es preciso tener estabilidad en la pareja actúa como predictor de mantener relaciones sexuales completas. El conocimiento y el contexto familiar, a través de las creencias religiosas de la madre, también entran en la ecuación. El modelo de la primera relación incluye también las variables contextuales de la familia, centrando el peso en la madre, tanto el nivel de estudios como la religión. La ecuación confirma la relevancia de la edad de la primera relación para el riesgo de embarazo (Cavazos-Rehg et al., 2010; Capuano et al., 2009; Luengo et al., 2007), siendo el riesgo mayor conforme se reduce la edad de inicio. Destacan también los factores actitudinales del rechazo personal y social del uso de preservativos, confirmando los datos de las investigaciones previas (Navarro et al., 2004). El riesgo de embarazo en las relaciones actuales muestra la influencia de la edad de inicio de las relaciones sexuales y la utilización de la anticoncepción de emergencia (López-Amorós et al., 2010; Ahideé et al., 2010). Entra también en el modelo el rechazo personal del preservativo (Beadnele et al., 2005). Analizando el riesgo real de embarazo, toma relevancia la actitud sobre el resto de las variables de estudio, también en los jóvenes que mantienen relaciones con pareja estable. La estabilidad de la pareja, la aceptación de la anticoncepción y el no rechazo personal al empleo del preservativo son las variables relevantes para explicar el comportamiento de riesgo de embarazo. Aunque el nivel de riesgo es superior en los jóvenes que informan de pareja, las variables vinculadas al comportamiento sexual parece que son similares para todos sujetos del estudio. En la prevención de los embarazos no deseados parece ser un buen predictor la actitud positiva hacia los métodos anticonceptivos, en general, y hacia los preservativos, particularmente. La relevancia predictiva de la actitud sexual tiene una especial transcendencia, al tratarse de variables sobre las que es posible actuar para reducir el riesgo de embarazo en la juventud. Esta premisa exige adoptar una perspectiva integrada de salud sexual (Machado y Gaspar de Matos, 2011) y ampliar la formación de los agentes educativos de la sexualidad (Ramiro, Reis, Gaspar de Matos y Vilar, 2010). Dado el alto porcentaje de clasificaciones correctas obtenido es este estudio piloto, resulta suficientemente interesante continuar trabajando en esta línea de investigación y perfilar nuevos estudios a partir de la regresión logística. En sucesivas investigaciones es necesario también ampliar la muestra de estudio

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e incrementar la representación de los hombres, así se obtendrá una mayor representatividad en los resultados y se garantizará la estabilidad de los modelos jerárquicos. Entre las limitaciones del estudio, es importante tener en cuenta que el cuestionario estaba basado en la autodeclaración de los comportamientos sexuales, por lo que la validez de las respuestas es limitada, pudiendo dar lugar a cierto sesgo de información. No obstante, el anonimato de los cuestionarios favorece que haya una mayor sinceridad. Por último, el carácter transversal del estudio nos impide establecer una relación causal clara. Los indicios obtenidos indican la relevancia de continuar investigando el tema, ampliando el conocimiento existente sobre el comportamiento de riesgo de embarazo y los factores relacionados. A pesar de las limitaciones comentadas, los resultados reflejan la magnitud del comportamiento de riesgo de embarazo entre los universitarios y la necesidad de diseñar programas preventivos. Las intervenciones realizadas en otros países confirman el éxito en la reducción de la vulnerabilidad (Nelas et al., 2013) y la importancia de trabajar en la adolescencia para incrementar el conocimiento de los métodos anticonceptivos (Martins, Reis, Souza y Duarte, 2013). Referencias Ahideé. G., Leyva- López, R., Erika, E., Betania, A., Ramírez, D., y Rivera, E. (2010). Anticoncepción de emergencia en estudiantes mexicanos. Salud Pública de México, 52(2), 156-164. Beadnele, B., Morrison, D.M., Wilsdon, A., Wells, E.A., Mourowchick, E., Hoppe, M. y Gillmore, M.R.(2005). Condom use, frequency of sex, and number of partners: multidimensional characterization of adolescent sexual risk-taking. Journal of Sex Research, 42(3), 192-202. Calafat, A., Juan, M., Becoña, E., Mantecón, A. y Ramón, A. (2009). Sexualidad de riesgo y consumo de drogas en el contexto recreativo. Una perspectiva de género. Psicothema, 21(2), 227-233. Camacho, I., Tomé, G., Gaspar de Matos, M., Gamito, P. y Diniz, J.A. (2010). A escola e os adolescentes: Qual a influencia da familília e dos amigos? Journal of Child and Adolescent Psychology, 1, 101-116. Capuano, S., Simeone, S., Scaravilli, G., Raimondo, D. y Balbi, C. (2009). Sexual behaviour among Italian adolescents: knowledge and use of contraceptives. The European Journal of Contraception and Reproductive Health Care, 14(4), 285-289. Cavazos-Rehg, P.A., Spitznagel, E.L., Bucholz, K.K., Nurnberger, J.J., Edenberg, H.J. y Kramer, J.R. (2010). Predictors of sexual debut at age 16 or younger. Archives of Sexual Behaviour, 39(3), 664-673. De la Cruz, C., Fernández, M.A. y Bataller, V. (2008). Educar y atender la sexualidad desde pediatría. Recuperado de http://www.fsc.ccoo.es/comunes/

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O Papel dos estilos educativos parentais na sintomatologia ansiosa de adolescentes do 3º ciclo do ensino básico The role of parental rearing styles in anxious symptoms of adolescents from middle school Vanessa Azevedo

Associação Soltar os Sentidos

Sónia Simões

Instituto Superior Miguel Torga

Mariana Marques

Instituto Superior Miguel Torga / GAPSI

Marina Cunha

Instituto Superior Miguel Torga

Contacto para correspondência: Vanessa Azevedo vanessazevedo87@gmail.com Resumo: O presente estudo visa analisar o papel que a perceção dos adolescentes sobre os estilos educativos parentais tem sobre a manifestação de sintomatologia ansiosa. A amostra envolveu 136 adolescentes do 3º ciclo do ensino básico, 48 rapazes e 88 raparigas com idades compreendidas entre os 12 e os 15 anos, recolhida no Colégio São Martinho em Coimbra. O protocolo de investigação incluiu os seguintes instrumentos de colheita de dados: Questionário Sociodemográfico, State-Trait Anxiety Inventory for Children e EMBU-A. Os resultados do estudo sugerem que existem correlações significativas entre a rejeição paterna e a sintomatologia ansiosa. O modelo preditivo avançado no estudo mostra que o suporte emocional e sobreproteção do pai são preditores Journal of Child and Adolescent Psychology Revista de Psicologia da Criança e do Adolescente. Lisboa, 4(2) 2013

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significativos da ansiedade-total nos adolescentes. Por seu lado, apenas a sobreproteção paterna é preditor significativo da ansiedade-traço nos jovens. Já no que respeita à ansiedade-estado nos jovens, é preditor significativo a rejeição paterna. Assim, este estudo permite concluir que a rejeição paterna é um dos estilos educativos parentais que exerce maior influência na manifestação de ansiedade nos adolescentes. Palavras-chave: sintomatologia ansiosa; estilos educativos parentais; adolescentes. Abstract: This study aims to analyze the role adolescents perception about parental rearing styles on the manifestation of anxiety symptoms. The sample involved 136 adolescents from the 3rd cycle of basic education, 48 boys and 88 girls aged between 12 and 15 years old, gathered in Colégio São Martinho in Coimbra. The investigation protocol included the following data collection instruments: a Sociodemographic Questionnaire, State-Trait Anxiety Inventory for Children and EMBU-A. The results of the study suggest that there is a significant correlation between paternal rejection and higher levels of anxiety symptoms. The predictive model in advanced study shows that emotional support and overprotection of father are significant predictors of overall anxiety in adolescents. For its part, only paternal overprotection is significant predictor of trait anxiety in young people. However, with respect to state anxiety in young people, is a significant predictor of paternal rejection. Thus, this study shows that paternal rejection is one of the parental rearing styles with more influence on the manifestation of anxiety in adolescents. Key-words: anxiety symptoms; parental rearing styles; adolescents.

Introdução Ansiedade em adolescentes A ansiedade é vista como uma emoção caracterizada por um estado de apreensão desconfortável, comummente orientada por reações do sistema nervoso autónomo (Fonseca, 2010). Quando normativa, a ansiedade visa alertar o indivíduo para situações novas, inesperadas e/ou perigosas, permitindo preparar-se para enfrentá-las ou evitá-las (Rosen & Schulkin, 1998). Assim, a ansiedade envolve um conjunto de estratégias que se estendem desde a perceção até à execução rápida de ações, tendo como foco a proteção do sujeito perante o perigo ou uma ameaça antecipada (Baptista, 2000). Porém, se a ansiedade pode ser normativa, também se pode revelar patológica (Fonseca, 2010).

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As perturbações de ansiedade encontram-se entre os problemas de saúde mental mais frequentes entre crianças e adolescentes (Cunha, 2006; Sharma, Sagar, Deepak, Mehta, & Balhara, 2011), estando inseridas no Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais (DSM-IV-TR) da Associação Americana de Psiquiatria (APA, 2002). Relativamente à ansiedade, a diversidade de possíveis situações de perigo e as suas características pressupõem diferentes respostas de alarme, face às particularidades e funções específicas de cada indivíduo. Isto significa que o tipo de resposta dada - seja resposta ansiosa observável (fuga, evitamento, imobilidade), defesa agressiva ou submissão - deve ser adaptada ao tipo de ameaça detetada (Baptista, 2000). Surge, então, uma questão pertinente: Se a ansiedade faz parte de um processo normal de desenvolvimento observável, quando é que esta se transforma em psicopatologia? Há um largo consenso entre clínicos relativamente à distinção entre ansiedade normal e patológica, ocorrendo perturbações de ansiedade quando a ansiedade vivenciada pelo indivíduo atinge uma intensidade considerável, que vai para além do que se espera numa determinada idade (Fonseca, 2010). Neste sentido, Rosen e Schulkin (1998) abordam no seu estudo a forma como a ansiedade patológica se pode desenvolver a partir de estados de medo adaptativos. Respostas de medo, tais como o congelamento, sobressalto, alterações da pressão arterial, frequência cardíaca e uma maior vigilância são respostas comportamentais funcionalmente adaptativas que surgem perante uma situação de perigo, impulsionando o indivíduo a dar as respostas mais adequadas. Já a ansiedade patológica manifesta-se nas perturbações de ansiedade, sendo um estado de medo exagerado expresso pela hiperativação, hipervigilância e aumento da responsividade comportamental que persistem ao longo do tempo e interferem na vida do dia-a-dia do individuo. A teoria de ansiedade estado-traço de Spielberger serve de sustento teórico à construção do State-Trait Anxiety Inventory for Children (STAIC). Segundo este autor, a ansiedade-estado é compreendida como um estado emocional transitório, qualificado por sentimentos subjetivos de tensão e apreensão, conscientemente percebidos pelo aumento da atividade do sistema nervoso autónomo. Por seu lado, a ansiedade-traço reporta-se a diferenças individuais relativamente estáveis, evidenciadas num conjunto de situações percecionadas como ameaçadoras, na qual a resposta se cinge a reações de ansiedade desproporcionadas (Spielberger, 1966 cit. in Matias, 2004). De acordo com Bosquet e Egeland (2006), as representações cognitivoafetivas têm uma forte influência na manutenção da ansiedade em adolescentes. Relativamente à evolução dos problemas de ansiedade em crianças e adolescentes, Fonseca (2000) relata que esta tem sido amplamente estudada, sobretudo no que diz respeito à questão se as perturbações de ansiedade nesta faixa etária se mantêm estáveis até à idade adulta, se desaparecem, diminuem ou evoluem para outras perturbações.

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A família e a parentalidade A partir dos anos 60 do século XX, os estudos pioneiros sobre a parentalidade focaram principalmente os comportamentos educativos parentais, realçando a importância das investigações de Diana Baumrind. No entanto, desde a década de 80, o papel dos processos cognitivos começou a adquirir uma atenção expressiva, bem como dos processos afetivos parentais (Cruz, 2005). Darling e Steinberg (1993) apresentam uma importante distinção entre práticas e estilos educativos parentais. As práticas educativas parentais envolvem comportamentos específicos, em que os pais exercem as suas responsabilidades em determinados contextos. Em contrapartida, os estilos educativos aglomeram um conjunto de atitudes parentais, designadamente, os objetivos respeitantes à socialização, as práticas educativas usadas para auxiliar a criança a atingir essas metas e o clima emocional no qual a socialização ocorre. Há duas abordagens centrais no comportamento parental, a tipológica e a dimensional. A abordagem tipológica identifica os tipos de estilos educativos parentais, enquanto a abordagem dimensional dissocia os estilos educativos parentais em duas dimensões: controlo e suporte/afeto dos pais perante os seus filhos (Simões, 2011). Para esta investigação importa salientar a importância da abordagem dimensional, que envolve as dimensões suporte/afeto e controlo. A dimensão suporte/afeto diz respeito a um conjunto de caraterísticas que os pais apresentam na interação com os seus filhos (suporte parental, expressões de afeto, disponibilidade afetiva, envolvimento positivo, sensibilidade para os estados psicológicos da criança, entre outras). Estes comportamentos parentais têm como principal finalidade suprir as necessidades básicas da criança, de modo a que se sinta aceite e acarinhada pelos seus pais (Cummings, Davies & Campbell, 2000). No polo oposto, temos a rejeição parental que pode estar associada a níveis mais elevados de preocupação nas crianças (Brown & Whiteside, 2008; Muris, Meesters, Merckelback, & Hülsenbeck, 2000), havendo também um risco elevado para o desenvolvimento de depressão e agressividade nos adolescentes (Akse, Hale, Engels, Raaijmakers, & Meeus, 2004). Compreende-se, deste modo, que a rejeição parental possa atuar como agente de desenvolvimento da ansiedade, potenciando o risco de aparecimento de psicopatologia. Relativamente à experiência da rejeição, as investigações têm incidido principalmente sobre o comportamento das mães, embora estudos mais recentes tenham igualmente envolvido os pais (Hudson & Rapee, 2002). Nesta linha de orientação, o estudo de Bögels e Brechman-Toussaint (2006) diz-nos que a rejeição pode estimular a criança e/ou adolescente a desenvolver uma visão negativa de si próprio, levando ao desenvolvimento de medos e de uma avaliação negativa, contribuindo assim para a manutenção da ansiedade. Barber (1994) fez a diferenciação entre dois tipos de controlo parental: o psicológico e o comportamental, demonstrando que os dois tipos de controlo têm diferentes associações com problemas internalizantes (psicológico) e

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externalizantes (comportamental) nos adolescentes. Uma das principais conclusões que o autor salienta é que existem padrões de interação familiar que inibem o desenvolvimento psicológico dos jovens, apresentando um risco para o aparecimento de problemas internalizados. Portanto, se a dimensão suporte/afeto se relaciona de modo positivo com diversas esferas do desenvolvimento da criança e do adolescente (Doyle & Markiewicz, 2005), por seu lado, a rejeição parental pode estar associada a diferentes indicadores negativos do desenvolvimento infantil e juvenil (e.g., Akse et al., 2004; Brown & Whiteside, 2008). Estilos educativos parentais e ansiedade em adolescentes A literatura tem documentado a influência do comportamento parental no desenvolvimento e/ou manutenção de problemas de ansiedade em crianças e adolescentes. Por exemplo, Bögels e Brechman-Toussaint (2006) evidenciaram que a hereditariedade genética envolve um conjunto de variáveis familiares (vinculação, conflitos conjugais, coparentalidade, funcionamento familiar, relacionamento entre irmãos e crenças que os pais têm sobre os filhos) que podem estar relacionadas com a transmissão intergeracional da ansiedade. Assim, existe uma associação entre cada um destes fatores familiares e a ansiedade na criança. Já a investigação de Bögels e van Melick (2004) mostra que os comportamentos parentais de autonomia/sobreproteção e aceitação/rejeição estão relacionados com a ansiedade dos pais, mas também com a ansiedade da criança. A relação entre a perceção do comportamento parental e a sintomatologia ansiosa dos filhos foi estudada por Grüner, Muris e Merckelbach (1999), através da aplicação do EMBU, que concluíram que a rejeição parental e a educação ansiosa estão envolvidas no desenvolvimento de sintomatologia ansiosa infantil. Por seu lado, tem sido salientado que os estilos educativos parentais com maior suporte/afeto se relacionam com um nível reduzido de ansiedade na adolescência (Wolfrad, Hempel, & Miles, 2003). Em síntese, a revisão da literatura permite constatar que os estilos educativos parentais influenciam o nível de ansiedade das crianças e dos adolescentes, destacando-se em particular o impacto da perceção dos filhos sobre a rejeição parental. Para clarificar a problemática em estudo, o objetivo geral desta investigação visa analisar o papel que a perceção dos adolescentes sobre os estilos educativos parentais tem sobre a manifestação de sintomatologia ansiosa. Mais especificamente, pretende-se: 1) Analisar as diferenças na manifestação da sintomatologia ansiosa (ansiedade-estado e ansiedade-traço) em função de algumas variáveis sociodemográficas dos adolescentes e dos seus pais; 2) Explorar as diferenças na perceção dos estilos educativos parentais (suporte emocional, sobreproteção e rejeição) em função de algumas variáveis sociodemográficas dos adolescentes e dos seus pais; 3) Avançar com modelos preditores para a ansiedade-

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total, ansiedade-traço e ansiedade-estado, analisando o contributo dos estilos educativos do pai e da mãe, bem como de algumas variáveis sociodemográficas. Metodologia Procedimentos Para garantir a exequibilidade da investigação, procedeu-se ao envio do pedido de autorização à Direção do Colégio São Martinho em Coimbra. Deferido o pedido, elaborou-se o consentimento informado dirigido aos pais, realçando-se que iriam ser respeitados os princípios éticos de confidencialidade e anonimato. A recolha efetuou-se durante os meses de fevereiro e março de 2012. Refira-se que, antes da administração dos instrumentos, realizou-se um ensaio, para haver um maior controlo sobre algumas dificuldades que pudessem surgir durante este processo. Aquando da administração dos instrumentos em contexto de sala de aula, estiveram presentes duas investigadoras que tiveram a função de explicar os objetivos do estudo e as instruções relativamente a cada questionário. Os alunos demoraram cerca de 45 minutos a completar os questionários: Questionário Sociodemográfico, STAIC e EMBU-A. Instrumentos Questionário Sociodemográfico O Questionário Sociodemográfico é composto por nove questões e está dividido em duas partes. A primeira parte do questionário corresponde à caracterização dos adolescentes, envolvendo as variáveis: idade, sexo, ano de escolaridade e o número de disciplinas com nota negativa no 1º período. Tendo em vista análises futuras, dicotomizámos a variável idade da seguinte forma: 1) 12-13 anos; e 2) 14-15 anos. A variável número de disciplinas com nota negativa no primeiro período foi categorizada em: 1) nenhuma negativa; 2) 1-2 negativas; e 3) 3-7 negativas. A segunda parte do questionário compreende variáveis relacionadas com os pais: composição do agregado familiar, idade, nível de escolaridade e situação profissional do pai e da mãe. Importa salientar que, através dos dados relativos aos irmãos, foi possível determinar a posição do adolescente na fratria. State-Trait Anxiety Inventory for Children (STAIC) O STAIC foi traduzido e adaptado por Ponciano e Matias (Matias, 2004) para a população portuguesa, tendo por base o instrumento original de Spielberger, Edwards, Montuori e Lushene (1973). Este questionário pretende medir a ansiedade (estado e traço) em crianças e adolescentes entre os 9 e os 12 anos de idade.

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A escala de ansiedade-estado é composta por 20 itens, sendo solicitado ao adolescente uma resposta que demonstre o que sente “neste preciso momento”. Nesta escala, metade dos itens refletem a presença de ansiedade e a outra metade ausência de ansiedade. Os itens que evidenciam a presença de ansiedade são cotados com uma pontuação de 3 a 1, sendo o peso das pontuações invertido nos itens que indicam ausência de ansiedade. A escala de ansiedade-traço também contém 20 itens, em que as respostas indicam “como habitualmente se sente”. As pontuações totais das escalas de ansiedade-estado e ansiedade-traço são obtidas através do somatório das pontuações dos 20 itens de cada escala (Matias, 2004). Na análise psicométrica conduzida no presente estudo, verificou-se que o alfa de Cronbach na escala de ansiedade-estado é de 0,74 (razoável). Na escala de ansiedade-traço o valor de alfa é de 0,82 (bom) (Pestana & Gageiro, 2008).1 A Parental Rearing Style Questionnaire for use with Adolescents (EMBU-A) O EMBU-A foi criado por Gerlsma, Arrindell, Van der Veen e EmmelKamp (1991) e validado para a população portuguesa por Lacerda (2005), tendo como objetivo medir a perceção do sujeito relativamente à frequência com que ocorrem determinados comportamentos educativos durante a infância e adolescência (12 aos 17 anos), aplicados em separado para o pai e para a mãe (Lacerda, 2005). O EMBU-A é composto por 48 itens, que devem ser respondidos através de uma escala de Likert de quatro pontos. Optou-se pela distribuição fatorial do estudo principal de Lacerda (2005), ou seja, os itens que compõem cada dimensão são iguais para o pai e para a mãe, realçando-se três dimensões: a) suporte emocional; b) sobreproteção; c) rejeição. No que respeita à consistência interna do EMBU-A, o valor de alfa de Cronbach na dimensão suporte emocional é 0,93 e 0,92 (ambos muito bons) para o pai e para a mãe, respetivamente; na dimensão sobreproteção, o alfa corresponde a 0,72 (razoável) para o pai e 0,65 (fraco) para a mãe; e, por fim, na dimensão rejeição o valor de alfa é 0,89 para o pai e 0,88 para a mãe (ambos bons) (Pestana & Gageiro, 2008). Amostra Nesta investigação utilizou-se a amostragem não-probabilística acidental, uma vez que os participantes foram selecionados pela sua conveniência (Maroco, 2010). Foi definido como critério de inclusão na amostra a frequência no 7º, 8º e 9º ano do ensino básico. Já os critérios de exclusão abrangeram adolescentes 1

Os valores de alfa de Cronbach foram interpretados de acordo com os critérios de Pestana e Gageiro (2008): ‹0,6 – inadmissível; 0,6 a 0,7 - fraca; entre 0,7 e 0,8 razoável; entre 0,8 e 0,9 boa; superior a 0,9 muito boa.

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com necessidades educativas especiais, adolescentes institucionalizados, e adolescentes em que o pai ou a mãe tenham falecido. Da amostra potencial de 163 inquiridos, foram excluídos 27 sujeitos porque os questionários estavam incompletos ou porque os adolescentes faltaram à escola no dia da aplicação dos instrumentos. Os resultados da caraterização sociodemográfica dos adolescentes apresentam-se na Tabela 1. Tabela 1. Caraterização sociodemográfica da amostra de adolescentes n = 136

% = 100

Medidas descritivas

Sexo Masculino Feminino

48 88

35,3 64,7

Mo: feminino (88)

Idade 12 - 13 Anos 14 - 15 Anos

74 62

54,4 45,6

Ano de escolaridade 7º Ano 8º Ano 9º Ano

45 49 42

33,1 36,0 30,9

Posição na fratria Filho único Filho mais velho Filho do meio Filho mais novo

41 43 6 46

30,1 31,6 4,40 33,8

M = 13,29 Mo: 14 DP = 0,94 Mo: 8º ano (49)

Mo: filho mais novo (46)

Nº disciplinas nota negativa M = 0,65 0 72 52,9 Mo: 0 1-2 39 28,7 DP = 0,77 3-7 25 18,4 n = número total de sujeitos da amostra; Mo: moda; M = média; DP = desvio-padrão

O total da amostra foi de 136 adolescentes (n = 136), sendo constituída por 48 rapazes (35,3%) e 88 raparigas (64,7%). A média de idades é 13,29 anos (DP = 0,94), sendo menos frequente os adolescentes terem entre 14 e 15 anos (45,6%). No que concerne ao ano de escolaridade, ainda que exista uma distribuição semelhante por ano de escolaridade, verificou-se que a maior parte dos sujeitos frequentam o 8º ano (36,0%). Relativamente à posição na fratria, existe uma distribuição muito semelhante pelos grupos constituídos por filhos únicos, filhos mais velhos e filhos mais novos, sendo menos frequentes os filhos do meio (4,4%). Quanto às disciplinas com nota negativa, o mais frequente é os elementos da amostra não terem negativas (52,9%). Na Tabela 2 apresentam-se os dados relativos à caraterização sociodemográfica dos pais.

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Tabela 2. Caraterização sociodemográfica dos pais Idade do pai 34 - 39 Anos 40 - 49 Anos 50 - 63 Anos

n pai = 136

%

19 97 20

14 71,2 14,6

Idade da mãe 32 - 39 Anos 40 - 49 Anos 50 - 55 Anos Nível de escolaridade Ensino básico Ensino secundário Ensino superior

40 73 23

29,4 53,7 16,9

n mãe = 136

%

Medidas descritivas M = 44,71 Mo: 45 DP = 5,16

37 95 4

27,1 69,9 2,9

31 76 29

22,8 55,9 21,3

M = 42,15 Mo: 44 DP = 4,29 Mo pai e mãe: 9º ao 12º ano

Situação profissional Desempregado 10 7,4 16 11,8 Mo pai e mãe: trabalha Trabalha 124 91,2 120 88,2 Reformado 2 1,5 n = número total de sujeitos da amostra; Mo: moda; M = média; Md = mediana; DP = desvio-padrão

Na caraterização sociodemográfica dos pais, a idade mais frequente situase entre os 40 e 49 anos, tanto no pai (71,2%), como na mãe (69,9%). Realça-se igualmente que a média de idades do pai e da mãe varia entre 44,71 (DP = 5,16) e 42,15 (DP = 4,29), respetivamente. Quanto ao nível de escolaridade dos pais, é mais frequente tanto o pai (53,7%), como a mãe (55,9%) terem o ensino secundário. Em relação à situação profissional, a maior parte dos pais (91,2%) e das mães (88,2%) estão empregados. Análise de dados Para a realização deste trabalho utilizou-se o programa informático de análise estatística, o Statistical Package for Social Sciences (SPSS), versão 19.0 para Windows. Numa primeira fase, procedeu-se ao cálculo da normalidade da distribuição das vaiáveis na amostra através do teste da normalidade de Kolmogorov-Smirnov, que indicou que a amostra não tem uma distribuição normal. Prosseguiu-se com a avaliação da normalidade das variáveis através dos coeficientes de assimetria (sk) e curtose (ku) que revelou que nenhuma variável apresenta valores de Sk e Ku superiores indicadores de violações severas à distribuição normal (|Sk|<3 e |Ku|<10). Posteriormente, fez-se uma análise descritiva, envolvendo o cálculo de medidas de tendência central e medidas de dispersão. Determinou-se o coeficiente de correlação de Pearson para testar as associações entre as dimensões do STAIC e do EMBU-A. Calculou-se, ainda, o teste t de Student para amostras independentes com o intuito de verificar a existência de diferenças estatisticamente significativas

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nas dimensões do STAIC e no total do STAIC, e nas dimensões do EMBU-A em função das variáveis sexo e idade dos adolescentes. Para analisar a variância nas pontuações médias das dimensões do STAIC e do EMBU-A em função de algumas variáveis sociodemográficas, utilizou-se a ANOVA Oneway. Neste contexto, efetuou-se o teste Post-Hoc de Tukey para situar as diferenças nas pontuações médias entre os respetivos grupos. Finalmente, foram conduzidas análises de regressão múltipla hierárquica, considerando como variáveis dependentes as diferentes sintomatologias ansiosas (total, traço e estado). Resultados Sintomatologia ansiosa Na Tabela 3 apresentam-se as correlações entre as dimensões do STAIC. Tabela 3. Correlações entre as dimensões do STAIC Dimensões-STAIC

Ansiedade-traço

Ansiedade-total

Ansiedade-estado

0,419**

0,849**

Ansiedade-traço

-

0,835**

p = nível de significância; coeficiente de correlação de Pearson (**p < 0,01)

Foram estudadas as associações entre as dimensões do STAIC, utilizandose o coeficiente de correlação de Pearson2. Como seria esperado, os resultados demonstram que existem correlações entre a ansiedade-estado e a ansiedade-traço (r = 0,419), e correlações altas entre a ansiedade-estado e a ansiedade-total (r = 0,849), bem como entre a ansiedade-traço e a ansiedade-total (r = 0,835). De seguida, foi realizada a análise da variância da sintomatologia ansiosa em função das variáveis idade e sexo dos adolescentes. Os resultados do Teste t de Student para a variável idade dos adolescentes, indicam que existem diferenças significativas na ansiedade-estado em função da idade (p = 0,033). São os adolescentes mais velhos (14-15 anos) (M = 31,39; DP = 7,60) a ter pontuações mais elevadas na ansiedade-estado. Não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas na manifestação de sintomatologia ansiosa entre rapazes e raparigas, ainda que haja uma tendência para serem as raparigas a manifestarem uma maior ansiedade-traço (M = 38,19; DP = 5,66) e ansiedade-total (M = 68,48; DP = 10,42). Já na ansiedade-estado os resultados são idênticos para rapazes (M = 30,38; DP = 5,75) e para raparigas (M = 30,28; DP = 6,41). 2

Nas correlações muito baixas, o r situa-se abaixo de 0,19; nas correlações baixas, o r está entre o 0,20 e 0,39, enquanto nas correlações moderadas o r está entre 0,40 e 0,69, considerando alta uma correlação que se situe entre 0,70 e 0,89 (Pestana & Gageiro, 2008).

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Para se analisar as diferenças na sintomatologia ansiosa em função do (in) sucesso escolar dos adolescentes efetuou-se uma ANOVA, verificando-se que há diferenças significativas na ansiedade-traço (p = 0,034), resultantes do nível de (in) sucesso escolar dos jovens. Ao realizar-se o teste de Post-Hoc de Tukey, constatou-se que os adolescentes que têm entre 3 e 7 notas negativas (M = 39,56; DP = 6,90) sentem um nível de ansiedade-traço mais elevado, em comparação com os jovens que têm notas positivas a todas as disciplinas (M = 36,15; DP = 5,44). Relativamente às diferenças entre grupos na sintomatologia ansiosa em função das variáveis posição da fratria e nível de escolaridade do pai e da mãe separadamente, a análise da variância indicou que não existem diferenças nas médias. Estilos educativos parentais A Tabela 4 apresenta a análise correlacional entre as dimensões do EMBU-A. Tabela 4. Correlações entre as dimensões do EMBU-A Dimensões EMBU-A

SupEmoc-Mãe

Sobprot-Pai

Sobprot-Mãe

Rejeição-Pai

Rejeição-Mãe

SupEmoc-Pai

0,468**

0,335**

- 0,130

- 0,387**

- 0,269**

SupEmoc-Mãe

-

0,009

0,121

- 0,234**

- 0,434**

Sobprot-Pai

-

-

0,505**

0,429**

0,275**

Sobprot-Mãe

-

-

-

0,390**

0,439**

Rejeição-Pai

-

-

-

-

0,665**

Coeficiente de correlação de Pearson (**p < 0,01)

Foram estudadas as correlações entre as várias dimensões do EMBU-A, calculando-se o coeficiente de correlação de Pearson. Os resultados demonstram que existe uma correlação positiva entre o suporte emocional paterno e materno (r = 0,468), entre a sobreproteção paterna e materna (r = 0,505) e a rejeição paterna e materna (r = 0,665). O suporte emocional do pai correlaciona-se de modo positivo com a sobreproteção paterna (r = 0,335) e apresenta uma correlação negativa com a rejeição paterna (r = - 0,387) e materna (r = - 0,269). Quanto ao suporte emocional da mãe, este correlaciona-se de modo negativo com a rejeição do pai (r = - 0,234) e com a rejeição materna (r = - 0,434). No que respeita à dimensão sobreproteção, a sobreproteção paterna correlaciona-se positivamente com a rejeição paterna (r = 0,429) e materna (r = 0,275), já a sobreproteção materna apresenta correlações positivas com a rejeição do pai (r = 0,390) e da mãe (r = 0,439). Seguidamente, analisou-se se existiam diferenças nos estilos educativos do pai e da mãe em função do sexo e idade dos adolescentes, através do teste t de Student. Os resultados revelam que não há diferenças entre rapazes e raparigas na forma como percecionam os estilos educativos do pai e da mãe, revelando apenas

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uma tendência para os rapazes percecionarem níveis mais elevados de suporte emocional paterno (M = 63,13; DP = 9,96), que as raparigas, estando esta diferença no limiar da significância estatística (p = 0,056). Quanto à idade, não se observam diferenças estatisticamente significativas no que respeita aos estilos educativos do pai e da mãe. Para se obter as pontuações médias do EMBU-A em função da posição na fratria, realizou-se para o efeito uma ANOVA. Neste sentido, não foram encontradas diferenças significativas na perceção dos adolescentes sobre os estilos educativos dos pais, ainda que possa existir uma tendência para os filhos únicos percecionarem mais suporte emocional paterno (M = 64,56; DP = 10,80). Foi conduzida mais uma ANOVA para estudar as diferenças nos estilos educativos parentais em função do (in)sucesso escolar dos adolescentes, podendo verificar-se que existem diferenças significativas na sobreproteção da mãe (p = 0,010), na rejeição do pai (p = 0,003) e da mãe (p = 0,001), dependendo do nível de (in) sucesso escolar. Assim, o teste de comparação Post-Hoc de Tukey indica que são os adolescentes que têm entre 3-7 notas negativas (M = 26,40; DP = 4,09) que sentem maior sobreproteção materna, comparativamente com os jovens que têm notas positivas a todas as disciplinas (M = 23,44; DP = 4,36). No que respeita à rejeição parental, as diferenças situam-se novamente entre os adolescentes que têm entre 3-7 notas negativas, que são os que percecionam níveis mais elevados de rejeição paterna (M = 32,60; DP = 12,39) e materna (M = 32,80; DP = 9,51), e o grupo de adolescentes que não têm notas negativas, que percecionam menor rejeição paterna (M = 25,44; DP = 6,99) e materna (M = 25,82; DP = 6,92). Relativamente à varável rejeição paterna, uma vez que não se verificou o principio da homogeneidade das variâncias (p < 0,05 no teste de Levene), optou-se por confirmar estes resultados através da aplicação de um teste não paramétrico para esta variável. No Teste H de Kruskal-Wallis foram igualmente encontradas diferenças estatisticamente significativas na rejeição paterna face ao nível de insucesso escolar dos adolescentes (p = 0,003), corroborando os resultados anteriormente apresentados. De seguida, calcularam-se as diferenças entre as pontuações médias obtidas no EMBU-A em função do nível de escolaridade do pai e da mãe, calculadas através da ANOVA. Pode verificar-se que existem diferenças significativas na perceção dos adolescentes acerca da rejeição materna em função das habilitações académicas do pai (p = 0,015). O teste Post-Hoc de Tukey indica que as diferenças significativas se situam entre o grupo de pais que têm habilitações entre o 4º e 6º ano (M = 30,83; DP = 9,01) e os pais que têm habilitações entre o 9º e 12º ano (M = 26,07; DP = 7,83), no sentido em que os filhos do primeiro grupo se sentem mais rejeitados em comparação com os adolescentes filhos do segundo grupo de pais. No mesmo sentido, também se observam diferenças na rejeição paterna em função das habilitações académicas da mãe (p = 0,035), sentindo-se os filhos de mães com habilitações entre o 4º e 6º ano (M = 31,65; DP = 9,83) mais rejeitados, em comparação com os filhos que têm mães com habilitações entre o 9º e 12º ano (M = 26,93; DP = 9,72). Por fim, foram encontradas diferenças na sobreproteção materna em função

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do nível de escolaridade da mãe (p = 0,007). O teste Post-Hoc de Tukey situa os filhos de mães com um menor nível de escolaridade (M = 26,42; DP = 4,08) como percecionando maior sobreproteção materna, comparativamente com os filhos que têm mães com uma escolaridade entre o 9º e o 12º ano (M = 23,51; DP = 4,20). Relação entre os estilos educativos parentais e sintomatologia ansiosa Quanto à relação entre os estilos educativos dos pais e a sintomatologia ansiosa dos adolescentes, os resultados apresentam-se na Tabela 5. Tabela 5. Correlação entre estilos educativos parentais e sintomatologia ansiosa Dimensões

SupEmoc Pai

SupEmoc Mãe

Sobprot Pai

Sobprot Mãe

Rejeição Pai

Ansiedade-estado

- 0,236**

- 0,117

0,198

0,217*

0,353**

Ansiedade-traço

- 0,259**

- 0,252**

0,268**

0,276**

0,405**

0,370**

0,292**

0,449**

0,326**

Ansiedade-total - 0,293** - 0,217* 0,275** Coeficiente de correlação de Pearson (*p < 0,05; **p < 0,01)

Rejeição Mãe 0,182*

Testou-se a relação entre os estilos educativos parentais e a ansiedade, utilizando o coeficiente de correlação de Pearson. Os resultados revelam que o suporte emocional do pai se correlaciona negativamente com a ansiedade-estado (r = - 0,236), ansiedade-traço (r = - 0,259) e ansiedade-total (r = - 0,293). O mesmo se verifica em relação ao suporte emocional materno, mas apenas existe uma correlação negativa com a ansiedade-traço (r = - 0,252) e ansiedade-total (r = - 0,217). No que respeita à sobreproteção do pai, existem correlações positivas com a ansiedade-traço (r = 0,268) e ansiedade-total (r = 0,275). Por seu lado, a sobreproteção materna apresenta correlações positivas com a ansiedade-estado (r = 0,217), ansiedade-traço (r = 0,216) e ansiedade-total (r = 0,292). Relativamente à rejeição paterna, observam-se correlações positivas com a ansiedade-estado (r = 0,353), ansiedade-traço (r = 0,405) e ansiedade-total (p = 0,449). O mesmo se verifica face à rejeição da mãe, que se correlaciona positivamente com a ansiedade-estado (r = 0,182), ansiedade-traço (r = 0,370) e ansiedade-total (r = 0,326). Variáveis preditoras da sintomatologia ansiosa em adolescentes De forma a poder realizar a análise de regressão múltipla hierárquica, teve-se em consideração as assunções deste tipo de análise: tamanho da amostra, presença de multicolinearidade, homocedasticidade, presença de outliers e independência dos resíduos. Dado que uma das condições para a utilização da análise de regressão hierárquica é a normalidade das distribuições, transformámos

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as variáveis que apresentaram uma distribuição assimétrica. Houve um caso em que o valor mínimo da variável foi igual a zero e, por isso, adicionou-se à fórmula uma unidade (Pallant, 2007). Na Tabela 6, apresenta-se a análise de regressão múltipla hierárquica, considerando como variáveis dependentes a ansiedade-total, a ansiedade-traço e a ansiedade-estado. Tabela 6. Regressão múltipla hierárquica predizendo a sintomatologia ansiosa Preditores ΔR2 Ansiedade-total Bloco 1 Suporte emocional do pai Suporte emocional da mãe Sobreproteção do pai Rejeição do pai Rejeição da mãe Ansiedade-traço Bloco 1 (In)sucesso escolar Bloco 2 Suporte emocional do pai Suporte emocional da mãe Sobreproteção do pai Sobreproteção da mãe Rejeição do pai Rejeição da mãe Ansiedade-estado Bloco 1 Idade dos adolescentes Bloco 2 Suporte emocional do pai Sobreproteção da mãe Rejeição do pai Rejeição da mãe

Sintomatologia ansiosa β

0,213

-0,304 -0,010** 0,307** 0,158 0,094

0,049

0,100

0,256

-0,269 -0,070 0,298 (tendency p = 0,053) -0,011 0,057 0,171

0,025

0,117

0,138

-0,073 0,121 0,300** -0,096

R2 = Coeficiente de determinação; β = Beta;**p < 0,05 ***p < 0,001

Como variáveis independentes, para além dos estilos educativos do pai e da mãe foram consideradas as variáveis sociodemográficas. No que respeita à predição da ansiedade-total, verificou-se que a rejeição do pai e da mãe, sobreproteção do pai, e suporte emocional do pai e da mãe, introduzidas no bloco 1, explicaram 25% da variância da ansiedade-total [F(5,130) = 8,578, p ≤ 0,001]. Se se considerar a contribuição independente de todas as variáveis, somente duas ofereceram uma contribuição estatisticamente significativa (≤ 0,05). Foram elas: suporte emocional (β = 0,304, p = - 0,014) e sobreproteção do pai (β = 0,307, p = 0,008). Estes valores caraterizam a contribuição única de cada variável, quando os efeitos das outras

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variáveis foram estatisticamente removidos. Seguidamente, conduziu-se outra análise de regressão, para predizer a variância da ansiedade-traço. Assim, introduziu-se no bloco 1 o (in)sucesso escolar, que explica 5% da variação da ansiedade-traço. Depois de introduzirmos no bloco 2 a rejeição do pai e da mãe, sobreproteção do pai e da mãe, suporte emocional do pai e da mãe, a variância (da ansiedade-traço) explicada pelo modelo foi de 26% [F(7, 128) = 6,281, p ≤ 0,001]. Estas variáveis explicaram uma percentagem adicional de 22% da variância, depois de controlar as variáveis do bloco 1, mudança do R2= 0,22, mudança do F (6, 128) = 5,934, p ≤ 0,001. No modelo final, apenas uma variável se mostrou tendencialmente significativa, com a sobreproteção do pai a registar o beta (β = 0,298, p = 0,053). Este valor carateriza a contribuição única da variável, quando os efeitos das outras variáveis foram estatisticamente removidos. Para estudar que varáveis são preditoras da sintomatologia ansiosa estado, introduziu-se a idade dos adolescentes no bloco 1, que explica 2,5% da sua variação. Depois de introduzirmos no bloco 2, as variáveis suporte emocional do pai, sobreproteção da mãe, rejeição do pai e da mãe, a variância (da ansiedade-estado) explicada pelo modelo foi de 14% [F(5, 130) = 4,168, p = 0,002]. Estas variáveis explicaram uma percentagem adicional de 11% da variância, depois de controlar as variáveis do bloco 1, mudança do R2= 0,11, mudança do F(4, 130) = 4,251, p ≤ 0,003. No modelo final, apenas uma variável se mostrou significativa, com a rejeição do pai a registar um beta significativo (β = 0,300, p = 0,014). Este valor carateriza a contribuição única da variável, quando os efeitos das outras variáveis foram estatisticamente removidos. Discussão No presente estudo foram analisadas as diferenças na sintomatologia ansiosa dos adolescentes, avaliada pelo STAIC, em função das variáveis sociodemográficas estudadas. A comparação dos grupos etários indica-nos que os adolescentes mais velhos (14-15 anos) manifestam mais ansiedade-estado. Estes resultados não estão de acordo com o referido na literatura. Por exemplo, Borges, Manso, Tomé e Matos (2008) descrevem que são os adolescentes mais velhos que apresentam níveis de ansiedade mais elevados, quando comparados com os adolescentes mais novos. Quanto às diferenças na manifestação da sintomatologia ansiosa, dependendo do (in)sucesso escolar dos adolescentes, verificou-se que os adolescentes que têm maior insucesso escolar, traduzido num número maior de negativas, apresentam níveis mais elevados de ansiedade. A literatura documenta a associação entre estas variáveis, como é exemplo do estudo de Hughes, Lourea-Waddell e Kendall (2008), que refere que os alunos com queixas somáticas de ansiedade têm um desempenho académico mais pobre. Deste modo, ao identificar-se este tipo de situações, pode intervir-se precocemente prevenindo o agravamento do mau desempenho. Neste contexto, Oguztürk, Bülbül, Özen, Ekici, Örnek, Ünlu e Yüksel (2012) apresentam

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a hipótese explicativa de que as dificuldades vividas pelos adolescentes fomentam limitações na vida escolar, ao afetarem o nível de autoestima e a motivação académica, dificuldades estas que podem gerar ansiedade, influenciando negativamente o seu desempenho escolar. O estudo das diferenças nos estilos educativos parentais em função das variáveis sociodemográficas estudadas apresentou resultados que permitem fazer uma nova leitura, principalmente em relação às dimensões rejeição e sobreproteção parentais. Quando analisada a variância dos estilos educativos parentais em função do sexo, não emergiram diferenças estatisticamente significativas, ainda que os resultados denotem uma tendência no sentido dos rapazes sentirem mais suporte emocional paterno, comparando com as raparigas. Todavia, este resultado difere da maioria dos estudos que evidenciam que, regra geral, os rapazes percecionam mais rejeição parental (e.g., Muris et al., 2000; Someya, Uehara, Kadowaki, Tang, & Takahashi, 1999). A literatura relata que os adolescentes mais novos sentem maior suporte emocional do pai e da mãe (Maccoby, 1980). Também na presente investigação os adolescentes com 12-13 anos percecionam níveis mais elevados de suporte emocional do pai e da mãe, ao passo que os adolescentes mais velhos (14-15 anos) sentem maior sobreproteção e rejeição parentais. Relativamente ao estudo da variância dos estilos educativos parentais em função do (in)sucesso escolar dos jovens, salienta-se que quanto maior é o insucesso escolar dos adolescentes, traduzido por um maior número de notas negativas, mais estes se sentem rejeitados por ambos os pais e sobreprotegidos pelas mães. Estes dados são congruentes com a literatura, uma vez que Feitosa, Matos, Del Prette e Del Prette (2005) referem que, quanto maior a dificuldade no relacionamento entre pais e filhos, mais elevada é a tendência para os adolescentes terem um baixo rendimento académico. Por seu lado, Shumow e Miller (2001) revelam que o envolvimento dos pais na escolaridade dos filhos tem um impacto positivo nas suas notas escolares. O nível de escolaridade dos pais revelaram influenciar a perceção dos adolescentes sobre os estilos educativos dos seus pais. Particularmente, os filhos cujo pai tem um baixo nível de escolaridade percecionam níveis mais elevados de rejeição materna, e os filhos de mães com um nível de escolaridade mais baixo sentem maior sobreproteção materna e rejeição paterna. Assim, em geral, são os filhos de pais com nível de escolaridade mais baixo que percecionam níveis mais elevados de rejeição materna e paterna e maior sobreproteção materna. A bibliografia confirma estes resultados, salientando que os pais com baixas habilitações académicas são mais vulneráveis a situações indutoras de stresse e, por isso, tendem a avaliar de modo negativo o comportamento dos filhos, exercendo um controlo excessivo e aplicando estratégias punitivas, principalmente a mãe (Custódio & Cruz, 2008). O presente estudo comprova que há correlações significativas entre os estilos educativos parentais e a sintomatologia ansiosa em adolescentes, resultados que

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são apoiados pela literatura (e.g., Bögels & van Melick, 2004; Grüner et al., 1999; Wolfrad et al., 2003). A análise das correlações sugere que a rejeição paterna se relaciona de forma mais significativa com a manifestação de ansiedade nos jovens. Por isso, o uso prudente da punição e a relação de apoio entre pais e filhos é uma ferramenta fundamental para o equilíbrio disciplinar (Baumrind, 1997). Neste contexto, também importa referir que existe semelhança entre os estilos educativos do pai e da mãe, apresentando correlações significativas entre as dimensões, o que é congruente com a literatura (e.g., Simões, 2011). Ainda que este estudo se tenha debruçado sobre o papel dos estilos educativos parentais na manifestação de sintomatologia ansiosa em adolescentes, tem sido sublinhado que a rejeição parental está mais relacionada com a ansiedade dos pais (Whaley, Pinto, & Sigman, 1999), sugerindo que os pais ansiosos têm maior tendência para rejeitar os seus filhos. A análise de regressão múltipla hierárquica, conduzida com o objetivo de identificar as variáveis preditoras da ansiedade nos jovens, permitiu identificar variáveis que influenciam a sua sintomatologia ansiosa (ansiedade-total, ansiedade-traço e ansiedade-estado). Relativamente às variáveis preditoras da ansiedade-total, somente duas variáveis ofereceram uma contribuição significativa, nomeadamente o suporte emocional e sobreproteção do pai. No que respeita à predição da ansiedade-traço, apenas uma variável, a sobreproteção paterna, se mostrou significativa. Por fim, a variável preditora significativa da sintomatologia ansiosa estado foi a rejeição do pai. A literatura confirma em parte estes resultados, referindo que a rejeição parental está envolvida no desenvolvimento de ansiedade infantil (Grüner et al., 1999). Assim fica evidenciada a contribuição significativa dos estilos educativos parentais para a análise da sintomatologia ansiosa dos jovens. Contudo, não é possível afirmar totalmente a direção das associações encontradas, uma vez que podem existir influências bidirecionais entre as perceções dos adolescentes acerca dos estilos educativos parentais e da manifestação de ansiedade. Conclusão Nesta pesquisa houve a preocupação de estudar a influência que os estilos educativos parentais têm ao nível da sintomatologia ansiosa dos adolescentes, considerando-se que os objetivos foram alcançados e certamente são um contributo relevante nas áreas em estudo. Não obstante, podem ser referidas como limitações o facto de a amostra ser composta apenas por adolescentes oriundos de um contexto suburbano e terem idades entre os 12 e os 15 anos, não envolvendo todo o período da adolescência. Outro fator limitativo é os participantes terem sido sujeitos a instrumentos de autorresposta. A fácil aplicação é evidente, contudo, o confronto com dificuldades de ordem diversa, pode causar embaraço nas respostas. A título de sugestão, seria interessante alargar este estudo, administrando-se um instrumento para avaliar a ansiedade parental, uma vez que se trata de uma

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variável que não foi controlada na presente investigação e que tem sido descrita como um fator importante ao nível dos estilos educativos parentais e da ansiedade juvenil. Portanto, ao estudar a relação entre a ansiedade parental e os estilos educativos parentais, poder-se-ia entender se a ansiedade parental e a conjugação das variáveis ansiedade parental e estilos educativos parentais são preditores do desenvolvimento da sintomatologia ansiosa em crianças e adolescentes (e.g., Grüner et al., 1999; Murray, Creswell, & Cooper, 2009). Conclui-se que a rejeição paterna é uma das dimensões dos estilos educativos parentais que tem maior impacto na ansiedade dos adolescentes, influenciando a manifestação da sintomatologia ansiosa nos mesmos. Neste sentido, um estilo educativo paterno rejeitante parece desencadear níveis elevados de ansiedadetraço e ansiedade-total. Não obstante, é importante realçar o papel protetor que o suporte emocional dos pais, na forma de afeto e apoio emocional, pode ter na diminuição dos quadros de ansiedade dos seus filhos. Os dados obtidos no presente estudo sugerem ser de máxima importância a intervenção do psicólogo clínico, principalmente ao nível da implementação de programas de sensibilização e ações de formação a técnicos de saúde, pais e professores, ajudando-os a identificar e a lidar com os problemas ansiosos e emocionais da criança e do adolescente. Referências bibliográficas Akse, J., Hale W.W., Engels, R.C.M.E, Raaijmakers, Q.A.W., & Meeus, W.H.J. (2004). Personality, perceived parental rejection and problem behavior in adolescence. Social Psychiatry and Psychiatric Epidemiology, 39, 980-988. American Psychiatric Association (2000). Manual de diagnóstico e estatística das perturbações mentais (4.ª ed., texto revisto). Lisboa: Climepsi Editores. Barber, B.K. (1994). Associations between parental psychological and behavioral control and youth internalized and externalized behaviors. Child Development, 65(4), 1120-1136. Baptista, A. (2000). Perturbações do medo e da ansiedade: uma perspectiva evolutiva e desenvolvimental. In I. Soares (Ed.), Psicopatologia do Desenvolvimento – Trajectórias (In)adaptativas ao longo da vida (pp. 91-140). Coimbra: Quarteto. Baumrind, D. (1997). The discipline encounter: contemporary issues. Aggression and Violent Behavior, 2(4), 321-335. Bögels, S.M. & Brechman-Toussaint, M.L. (2006). Family issues in child anxiety: Attachment, family functioning, parental rearing and beliefs. Clinical Psychology Review, 26, 834-856. Bögels, S.M. & van Melick, M. (2004). The relationship between child-report, parent self-report, and partner report of perceived parental rearing behaviors and anxiety in children and parents. Personality and Individual Differences, 37(8), 1583-1596.

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O papel dos estilos educativos parentais na sintomatologia ansiosa de adolescentes..., pp. 31-50

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Vanessa Azevedo, Sónia Simões, Mariana Marques e Marina Cunha

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Educação Sexual em Meio Escolar: perceção dos alunos Sex Education in School: student’s perception Sandra Dias

FMH e Escola Básica Integrada de Miraflores

Margarida Gaspar de Matos

Universidade Técnica de Lisboa e CMDT

Contacto para correspondência: Sandra Dias sandracgdias@gmail.com Resumo: Introdução: O presente estudo analisa como é implementada a educação sexual em meio escolar, no concelho de Oeiras, após as alterações legislativas introduzidas pela Lei n.º 60/2009, que estabelece o regime de aplicação da educação sexual em meio escolar, e a Portaria n.º 196-A/2010, que a regulamenta, contando, para tal, com a colaboração de alunos do décimo segundo ano de escolaridade. São objetivos deste trabalho: (1) identificar as conceções dos alunos relativamente à educação sexual em meio escolar (ESME); (2) identificar e caracterizar atividades desenvolvidas no âmbito da ESME e (3) identificar as perceções de alunos sobre os comportamentos sexuais dos adolescentes. Metodologia: A investigação decorreu em três escolas secundárias do concelho de Oeiras, sendo a amostra constituída por 313 alunos do décimo segundo ano de escolaridade. Os dados foram recolhidos através de um questionário, tendo sido utilizadas questões e escalas de vários estudos realizados com a população portuguesa. Resultados: 90,7% dos alunos participantes refere ter tido experiências de ESME ao longo do seu percurso escolar, sobretudo no 3.º ciclo do ensino básico Journal of Child and Adolescent Psychology Revista de Psicologia da Criança e do Adolescente. Lisboa, 4(2) 2013

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(CEB) (69%), asseguradas por professores de Ciências da Natureza/Ciências Naturais e/ou Biologia (72,2%), considerando 48,9% dos inquiridos que ficou Bem a Muito bem esclarecido relativamente aos temas de ES abordados. Segundo os alunos, as palestras foram a metodologia privilegiada (71,2%), por oposição à resolução de problemas (6,4%). A maioria (60%) dos alunos reconhece aptidão aos professores para a abordagem formal de temas relacionados com a sexualidade, referindo, no entanto, os pares (99,7%) e a Internet (66,8%) como principais fontes de informação no domínio da sexualidade. Palavras-chave: educação sexual; educação para a saúde; alunos; adolescência; puberdade. Abstract: Introduction: In this paper our aim is to analyse the way in which sex education (SE) is implemented at school following amendments introduced by Law n. 60/2009, which establishes the implementation of sex education at school, and by Decree n. 196-A/2010, that regulates it. For that purpose, we counted upon the cooperation of 12th year of secondary education. This study has the following objectives: (1) to identify the conceptions of students about SE; (2) to identify and characterize school activities in the domain of SE and (3) to identify the perceptions of young students about the sexual behaviours of adolescents. Methods: This research took place in three schools in the municipality of Oeiras. The sample consisted of 313 students of the 12th year of secondary education. Data were collected using a self-report questionnaire. We used questions and scales from different studies on the Portuguese population. Results: In general, 90,7% of the students reported to have had experiences of SE at school, especially along the 3rd cycle of basic education (69%), provided by teachers of Natural Sciences, Life Sciences and/or Biology (72,2%). A percentage of 48.9% considered that they were Well or Very well informed on the subjects of SE that were addressed. According to the students, the lectures were the privileged methodology (71,2%), as opposed to the solving problems (6,4%). The majority (60%) of the students recognize the teachers’ ability to formally address issues related to sexuality, referring, however, their peers (99,7%) and Internet (66.8%) as major sources of information in the field of sexuality. Key-words: sex education; health education; teachers; teenagers. Introdução Educação sexual e os adolescentes A educação sexual (ES) tem início na infância e prossegue até à adolescência e idade adulta, capacitando gradualmente as crianças e os jovens com informação cientificamente correta e com competências e valores positivos que lhes

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permitam compreender e usufruir da sua sexualidade e ter relações responsáveis que assegurem satisfação, prazer e o seu bem-estar e o dos outros (GTES, 2005, 2007; UNESCO, 2010). As abordagens no âmbito da ES não se limitam, por isso, a questões biológicas, devendo abranger as dimensões psicológicas, socioculturais e espirituais (Sexuality Information and Education Council of the United States, 2004). A informação sobre sexo e sexualidade está acessível aos jovens em diversas fontes: publicidade, meios de comunicação social, livros, páginas da Internet, conversa com os amigos. Se parte dessa informação é correta, outra parte não o é, deixando-os vulneráveis a coação, abuso e exploração, gravidez indesejada e infeções ou doenças sexualmente transmissíveis. Por outro lado, mesmo quando a informação é baseada em conhecimento científico, nem sempre é acessível à faixa etária ou aos conhecimentos dos jovens. Para que, desde cedo, as crianças e os jovens comecem a zelar pela sua saúde sexual, há que fornecer a informação necessária e pertinente para as diferentes faixas etárias, que seja culturalmente relevante e cientificamente correta, de modo a desenvolver competências que permitam, no presente e no futuro, que os indivíduos se sintam seguros nas suas decisões. Deste modo pretende-se dotar os mais novos de capacidades de proteção face a abusos e exploração sexual. A escola surge como o meio que reúne um conjunto de condições favoráveis à implementação de programas de educação em sexualidade. Na maioria dos países, é na escola que as crianças entre os cinco e os treze anos passam um número significativo de horas do seu dia. A escola assegura uma estrutura apropriada, com professores e outros profissionais capacitados e currículos formais que garantem uma programação a longo prazo. Por outro lado, as instituições escolares são responsáveis pela segurança e bem-estar das crianças, estabelecendo um elo entre estas, as suas famílias, os serviços de saúde e a comunidade. Segundo os especialistas, os programas de ES bem sucedidos são aqueles que são apropriados à idade dos alunos e às diferentes etapas do desenvolvimento, que, para além da informação, utilizam atividades que promovem um papel ativo dos jovens através de jogos, dramatizações e debates, que exploram valores, atitudes e normas sociais, que estimulam os alunos a assumir responsabilidade pelo seu comportamento, que abordam as influências dos meios de comunicação e dos pares no comportamento sexual e que promovem competências inerentes à educação global de qualquer cidadão: a capacidade de ouvir, de negociar, de respeitar o outro, de tomar decisões, de reconhecer pressões ou de destacar a informação pertinente e os locais onde poderão encontrá-la (SIECUS, 2004; GTES, 2005, 2007; UNESCO, 2010; WHO, 2010). O sucesso desses programas é fundamentado nos seguintes princípios: (i) estão integrados em programas de educação para a saúde; (ii) são assegurados por professores treinados e privilegiam metodologias de ensino e aprendizagem diversificadas; (iii) envolvem toda a comunidade educativa (pais, família alargada, professores, líderes religiosos, serviços de saúde, instituições da

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comunidade, jovens); (iv) são focados nos jovens (idade, sexo, cultura, religião, conhecimentos, necessidades) (WHO, 2012). Agentes de socialização Socialização sexual é o processo através do qual um indivíduo desenvolve ideias, crenças e valores sobre sexualidade, através de mensagens explícitas ou implícitas e ações das pessoas no seu seio familiar e noutros contextos sociais (Shtarkshall et al., 2007). Os adolescentes recolhem informações sobre sexualidade e comportamentos sexuais em diversos cenários e com vários atores. Entre os agentes formais de informação encontramos a escola, os serviços de saúde, as instituições religiosas e outras organizações da comunidade. Os pais e a família mais próxima, os amigos e colegas, os meios de comunicação social e as novas tecnologias são alguns exemplos dos agentes de socialização informal. A abordagem holística, pró-ativa, construtiva e “pela positiva” (GTES, 2005, p. 10) dos temas ligados à sexualidade e à saúde sexual que os Ministérios da Saúde e da Educação preconizam confere às escolas, aos pais, à família e aos profissionais de saúde um papel importante na educação para a sexualidade e na prevenção das consequências associadas a comportamentos sexuais de risco nos jovens. A família É no seio familiar que a criança recebe as suas primeiras mensagens sobre sexualidade, desempenhando os pais um papel de grande importância na forma como influenciam a socialização sexual das crianças e dos jovens. Os pais influenciam as atitudes das crianças formando crenças e valores relativos à identidade, ao relacionamento e à intimidade (Novilla et al., 2006) e devem “ter um papel importante em qualquer programa de ESME” (GTES, 2005, p. 7). O envolvimento parental na vida dos adolescentes é um fator crítico associado ao comportamento sexual dos jovens. A qualidade das relações entre pais e filhos, a comunicação que entre eles é estabelecida, a monitorização e conscientização das amizades e atividades dos adolescentes são associadas a uma redução de uma iniciação sexual precoce (Ikramullah et al., 2009; Albert, 2012). As investigações nesta área indicam que a promoção da comunicação sobre saúde sexual entre os pais e os adolescentes é eficaz, pois aumenta a comunicação entre pais e filhos (Schuster et al., 2008). Adolescentes que conversam com os seus pais tendem a iniciar mais tarde as suas relações sexuais, a usar contraceção e a ter menos parceiros sexuais (Schuster et al., 2011; Reis, Ramiro, Matos & Diniz, in press). Turnbull, Wersch & Schaik (2008) sugerem que os pais são os educadores sexuais primários e identificam como fatores facilitadores que influenciam a comunicação entre pais e filhos, na abordagem de assuntos ligados à educação

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sexual, a abertura e honestidade presentes num relacionamento de proximidade e confiança entre pais e filhos. Por outro lado, os conhecimentos dos pais constituem outro fator facilitador na comunicação. Nem sempre os pais têm o conhecimento necessário sobre determinadas temáticas, mas a sua vontade em recolher informação para a assegurar aos seus filhos é um indicador da forma como os progenitores fomentam um relacionamento mais próximo. Um terceiro aspeto salientado é o tempo passado em família – as temáticas de sexualidade são discutidas de uma forma mais aberta quando os pais e os filhos passam tempo juntos nas refeições, em atividades desportivas ou em conversas privadas, reforçando laços no seu relacionamento (Turnbull, 2012). Os meios de comunicação No domínio da sexualidade e saúde reprodutiva, a comunicação é realizada através de uma diversidade de mensagens e difundida por inúmeros meios de comunicação. Os meios de comunicação de difusão massiva são um importante suporte para a difusão e pesquisa de informação e estão cada vez mais presentes nas rotinas diárias dos jovens (Jones & Biddlecom, 2011). A televisão, a rádio, a imprensa escrita (nomeadamente as revistas), o correio eletrónico, o telemóvel, as consolas de jogos e a Internet são, nos nossos dias, plataformas de comunicação a que os jovens dedicam o seu tempo e importantes agentes informais de socialização no que diz respeito à sexualidade e saúde sexual (Matos et al., 2012; Ramiro, Reis & Matos, 2013). Os conteúdos ligados à sexualidade estão presentes na publicidade, nos artigos de jornais, nos programas televisivos, nas páginas da Internet e também, de forma mais ou menos explícita, nas mensagens escritas, nas fotos, nos vídeos, nos perfis que muitos jovens editam e recebem nos seus telemóveis e computadores. Segundo o relatório do estudo Health Behaviour in School-aged Children, mais de metade dos jovens portugueses dos sexto, oitavo e décimo anos de escolaridade passa, durante a semana, de uma a três horas em frente do computador, sendo crescente a presença das novas tecnologias na vida dos jovens (Matos et al., 2012). A maioria dos jovens do oitavo e décimo anos de escolaridade refere ainda comunicar mais do que uma vez por dia com os amigos através do telefone/telemóvel (51,1%), por mensagens escritas (63,9%) e/ou via Internet (44,9%). Apesar de em Portugal ser ainda um fenómeno relativamente recente, a utilização da Internet pelos jovens tem registado um aumento significativo, graças também a políticas educativas que equiparam tecnologicamente as escolas, permitindo a todos os alunos um acesso facilitado à Internet em espaço escolar. O YouTube, o Facebook, os chats (salas virtuais de conversa), os e-mails (mensagens eletrónicas) e os videojogos são algumas das atividades online que

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permitem o acesso a conteúdos de forma grátis, rápida e em tempo real. Graças à tecnologia, a comunicação entre os jovens faz-se atualmente noutras direções e com consequentes influências na socialização sexual. No entanto, esta evolução tecnológica dos jovens portugueses tem também uma vertente de risco – a exposição a referências pornográficas, a violência ou a promoção de drogas e álcool são alguns dos exemplos da utilização negativa dos meios de comunicação digital. Por outro lado, a participação em debates e o envio de informações pessoais têm sido formas propiciadoras de aliciamento dos jovens para redes de pedofilia. Educação sexual em meio escolar em Portugal O estudo Health Behaviour in School-aged Children 2010 refere que 21,8% dos alunos que frequentam o oitavo e décimo anos de escolaridade são sexualmente ativos, indicando que entre eles 12,7% menciona ter tido relações sexuais associadas ao consumo de álcool ou drogas (Matos et al., 2012). Dados do Instituto Nacional de Estatística [INE] (2013) referem que o número de nados-vivos em jovens tem vindo a diminuir nos últimos anos, registando-se em 2012 uma taxa de fecundidade das jovens entre os quinze e os dezanove anos de 12,5%. Porém, segundo dados do Gabinete de Estatísticas da União Europeia [EUROSTAT] (2013), Portugal está entre os dez países, na Europa dos vinte e sete, com maior taxa de mãe adolescentes. Em Portugal, vários estudos efetuados demonstram que (i) ter acesso a informação correta e a serviços de saúde, (ii) desenvolver competências no domínio da prevenção e (iii) a existência de programas de ES podem estabelecer a diferença entre atitudes responsáveis e atitudes comprometedoras no futuro (Reis, Ramiro, Carvalho & Pereira, 2009). Na sequência dos relatórios do Grupo de Trabalho de Educação Sexual, e reconhecendo que a ES é uma das dimensões da saúde, a Assembleia da República aprovou em 2009 um conjunto de princípios e regras em matéria de ES1, prevendo, desde logo, a organização funcional da ES nas escolas. A Portaria n.º 196-A/20102 consagra as bases gerais do regime de aplicação da ES em meio escolar. Estabelece a obrigatoriedade da ES, que passa a ser objeto de intervenção pedagógica estruturada, formal, inserida no projeto educativo dos agrupamentos de escolas e das escolas não agrupadas, com conteúdos e orientações curriculares e com carga horária definida, devendo contar com a participação de pais e encarregados de educação em todas as fases da sua organização. 1 Lei n.º 60/2009 de 6 de agosto. Diário da República, 1.ª série – N.º 151 – 6-8-2009. Lisboa: Assembleia da República. pp. 5097-5098. 2

Portaria n.º 196-A/2010 de 9 de abril. Diário da República, 1.ª série – N.º 69 – 9-4-2010, pp. 1170-(2), 1170 – (3) e 1170-(4).

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Perante o que anteriormente foi referido, consideramos ser pertinente estudar o processo de implementação da educação sexual nas escolas, na perspetiva de um dos seus principais agentes – os alunos. A análise tem por base a relação das variáveis sociais, demográficas e escolares e as perceções, os conhecimentos e os comportamentos de alunos do décimo segundo ano no domínio da saúde sexual e reprodutiva. Metodologia Participantes Para a presente investigação, foi construído um questionário de administração direta destinado a alunos do décimo segundo ano de escolaridade, sendo o preenchimento realizado por cada inquirido. A opção quanto ao grau de ensino foi feita considerando a escassez de investigação sobre esta faixa etária e o facto de assinalar o ano final de um percurso de escolarização. O questionário é constituído por quatro partes: a primeira permite efetuar uma caracterização sociodemográfica dos inquiridos (idade, sexo, nacionalidade, curso frequentado e religião); num segundo momento, o questionário pretende identificar as conceções dos alunos relativamente à educação sexual em meio escolar; a terceira parte tem por objetivo caracterizar as atividades de educação sexual em que os alunos estiveram envolvidos ao longo do seu percurso escolar e o seu contributo para o desenvolvimento de conhecimentos, atitudes e comportamentos; e, por fim, o propósito da quarta parte é identificar as conceções dos alunos relativamente à sexualidade dos outros jovens (conhecimentos, atitudes, valores e comportamentos). Considerando que o tema central deste questionário – a sexualidade e a educação sexual – pode ainda ser sentido como delicado, o predomínio das questões fechadas é evidente. Para várias questões optámos por fornecer indicações sobre campos de respostas que consideramos aceitáveis. Deste modo, asseguramos o seu preenchimento (Ghiglione & Matalon, 2001) com respostas que, de outra forma, os alunos não dariam por pudor ou receio de parecerem inconvenientes. É igualmente assegurada maior uniformidade, rapidez e simplificação na análise das respostas, sendo também facilitada a categorização das respostas para posterior análise. Por outro lado, estamos conscientes de que as listas de respostas pré-definidas conduzem a uma menor concentração do inquirido sobre o assunto em questão, levando-o também a optar por uma resposta que se aproxima mais da sua opinião e que poderá não traduzir uma representação fiel da realidade. Para evitar o risco de influenciar excessivamente as respostas obtidas, acrescentou-se, no final da lista de opções, a rubrica “Outra. Qual?”. Foram também introduzidas algumas questões abertas para impedir que o questionário se torne fastidioso e para respeitar a riqueza de pensamento dos inquiridos, com utilização do seu próprio vocabulário, permitindo uma recolha

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mais completa e complexa de informação. No início do questionário encontra-se uma breve introdução onde é apresentado o investigador e fundamentada a legitimidade do estudo. São apresentados o âmbito e objetivos da investigação, sendo sublinhada a garantia de privacidade e confidencialidade, assim como a eventual oportunidade para esclarecimento sobre o tema da investigação numa data posterior. A construção deste questionário teve por base questões e escalas de vários estudos anteriormente realizados com a população portuguesa: questionário no âmbito do modelo informação-motivação-aptidões comportamentais (Carvalho, 1999); Health Behaviour in School-aged Children (HBSC) (Matos et al., 2012); Questionários Saúde Sexual e Reprodutiva em Estudantes Universitários 2010 (QSSREU) (Matos, Reis, Ramiro & Equipa Aventura Social, 2012); Associação para o Planeamento da Família/Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa (Vilar, Ferreira & Duarte 2009), tendo os autores autorizado a utilização e/ou adaptação das mesmas. Procedimento A investigação decorreu em três escolas secundárias do concelho de Oeiras. Para a administração dos questionários, solicitámos a intervenção do coordenador do Projeto de Educação para a Saúde, e, considerando a dinâmica de organização de cada estabelecimento de ensino, a distribuição foi realizada através dos diretores de turma, tendo sido o questionário preenchido em contexto de sala de aula. Os questionários foram distribuídos durante o mês de fevereiro de 2012 e a sua recolha foi realizada durante o mês de março do mesmo ano. As análises e procedimentos estatísticos foram realizados com recurso ao programa informático Statistical Package for Social Sciences (SPSS, versão 18.0 para Windows). A análise de estatística descritiva foi complementada com o teste do Qui-quadrado c2 (com análise dos residuais ajustados). Resultados Caraterização sociodemográfica dos alunos Dos 313 alunos inquiridos, 41,5% são do sexo feminino e 183 (58,5%) do sexo masculino. As idades estão compreendidas entre os 16 e os 22 anos, estando a média próxima dos 18 anos (M=17,7 e DP=0,9). 93,6% são de nacionalidade portuguesa, declarando-se maioritariamente católicos, apesar de a percentagem daqueles que afirmam não ter religião ser significativa (31,9%). Cerca de metade dos inquiridos frequenta o curso de Ciências e Tecnologia, sendo possível encontrar alunos de cursos técnicos: Turismo (4,8%, N=15) e Técnico Profissional de Animação Sociocultural (3,8%, N=12). (Tabela 1)

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Tabela 1. Características sociais e demográficas da amostra dos alunos do 12.º ano Variáveis sociais e demográficas

N

%

183 130

58,5 41,5

3 170 88 36 15

1,0 54,3 28,1 11,5 4,8

Nacionalidade (N=313) Portuguesa Brasileira PALOP União Europeia Europa Oriental

293 6 8 1 5

93,6 1,9 2,6 0,3 1,6

Religião (N=310) Católica Protestante Judaica Budista Sem religião Outra

196 2 2 5 100 5

62,6 0,6 0,6 1,6 31,9 1,6

Curso (N=313) Ciências e Tecnologia Línguas e Humanidades Ciências Socioeconómicas Artes Visuais Técnico-Profissional

175 49 24 38 30

55,9 15,7 7,7 12,1 8,6

Sexo (N=313) Homem Mulher Idade (N=312) 16 17 18 19 ≥20 M=17,7 DP=0,90

Experiências em ESME Apenas 8,9% dos alunos refere não ter abordado temas de ES ao longo do seu percurso escolar. A abordagem aconteceu maioritariamente nos últimos anos do ensino básico e no ensino secundário e foi dinamizada por professores de Ciências da Natureza, Ciências Naturais e/ou Biologia e, para apenas 13,4% dos inquiridos, por professores de outras disciplinas. Não é, por isso, de estranhar que entre os temas abordados as frequências mais elevadas recaiam sobre conteúdos curriculares das disciplinas anteriormente indicadas: Contraceção e sexo seguro (86,6%); Infeções sexualmente transmissíveis (80,5%); Puberdade (76,7%). Por outro lado, perto de metade da amostra indicou que a abordagem dos temas de ES foi da responsabilidade de agentes externos e 233 alunos assinalaram as Palestras entre as atividades realizadas no âmbito da ES. A Resolução de

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problemas (6,4%) e a Dramatização (12,5%) foram as atividades realizadas no âmbito da ES que reuniram as frequências mais baixas. Considerando o desenho curricular dos últimos anos letivos e as profundas restruturações que desde o início do ano letivo 2011/12 têm sido levadas a cabo, não podemos ficar indiferentes à significativa percentagem de alunos (40,9%) que refere ter abordado os temas relativos à ES na Formação Cívica (FC)/Área de Projeto (AP)/Estudo Acompanhado (EA). Perceções dos alunos relativamente à ESME Finalidades da ESME A quase totalidade dos alunos inquiridos considera que a principal função da ESME é Fornecer mais informação (97,1%), logo seguida de Reduzir as consequências de comportamentos de risco (95,5%). Destaca-se aqui uma valorização do contexto preventivo por parte dos alunos. Aptidão dos professores Quando questionados sobre a aptidão dos professores, em geral, para abordar a educação sexual, mais de metade dos inquiridos considera-os Aptos (56%) ou Muito aptos (4%). Para tal pesa o facto de serem claros e seguros na forma como abordam os assuntos e de serem Pessoas já com muita experiência de vida. No entanto, este conjunto de alunos refere que entre o grupo de professores Há professores especializados no tema e outros que não o são; que Nem todos os professores se sentem à vontade para falar desse assunto e também não sabem tudo, sendo frequentemente associada a aptidão à disciplina que lecionam e ao seu currículo – Se forem professores de Ciências são ainda mais aptos para fazêlo porque faz parte da matéria da disciplina. É, no entanto, frequente encontrar, entre as duzentas e quarenta e oito respostas, a expressão Não têm à-vontade para abordar o tema (23,4%). Os alunos percecionam falhas ao nível dos conhecimentos e metodologias, que associam por vezes à falta de formação profissional, especialização, atualização. Reconhecem que É um tema difícil de abordar pois a intimidade e confiança com os alunos é dependente da relação professor/aluno e que o facto de não demonstrarem um à-vontade total na explicação deste tema condiciona a sua prestação e deixa os professores bastante embaraçados. Não existem diferenças estatisticamente significativas entre a forma como os inquiridos percecionam a aptidão dos professores para a educação sexual e a variável género. Porém, quando centramos a nossa análise na variável curso apuramos que, com exceção dos alunos do curso Línguas e Humanidades, onde se observa uma frequência mais elevada (55,3%) entre os que consideram os professores Pouco aptos, mais de metade dos inquiridos dos restantes cursos considera que os professores estão Aptos para abordar as temáticas de ES, registando os inquiridos dos cursos técnicos a frequência mais alta (72,2%).

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Verificamos que existe uma associação estatisticamente significativa entre o curso frequentado pelos alunos e a forma como percecionam a aptidão dos professores [(c2=11,43, gl=4, p< .05), N=302]. Esclarecimento relativamente aos temas de ES Quando solicitamos aos alunos que indiquem, numa escala entre 0% e 100%, o grau de esclarecimento relativamente aos temas abordados nas sessões de ESME, observamos que é entre os que consideram que ficaram Bem e Muito bem (48,9%) esclarecidos que se registam as frequências mais elevadas. Rapazes e raparigas não diferem quando à perceção do grau de esclarecimento relativamente aos temas de ES abordados na escola [(c2=2,92, gl=2, p=0,232), N=302]. Importância atribuída aos tópicos de ES Com o objetivo de aferir se as temáticas privilegiadas pelos professores nas suas práticas letivas, no domínio da ES, foram ao encontro das necessidades e anseios dos alunos, solicitámos que assinalassem o grau de importância que atribuem a cada um dos dezoito temas de ES listados, recorrendo, para tal, a uma escala de cinco pontos (em que 1 representa Nada importante e 5 Extremamente importante). Observando as médias e modas dos dezoito itens apresentados (Tabela 2), verificamos que doze apresentam valores 4 e 5. Destacam-se entre os considerados de Extrema importância para os alunos: Contraceção e sexo seguro (78,3%), Infeções sexualmente transmissíveis (73,2%), Uso do preservativo (71,9%) e Contraceção (71,6%).

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Tabela 2. Importância atribuída pelos alunos aos temas de ES/Sexualidade Nada

Extremamente

Importante

1 (%)

Imagem corporal

Importante

2 (%)

3 (%)

4 (%)

5 (%)

Mediana

Moda

7

21,7

36,1

24,3

8,9

3

3

2,6

8,9

33,9

34,8

18,2

4

4

16,9

32,6

31,9

11,5

4,5

2

2

Reprodução e nascimento

3,5

4,5

27,8

36,1

26,8

4

4

Contraceção e sexo seguro

1,9

1,0

6,1

11,2

78,3

5

5

Masturbação

8,6

27,2

33,9

20,4

8,6

3

3

Prazer e orgasmo

4,8

21,1

34,2

22,4

15,7

3

3

Puberdade Sonhos molhados

Homossexualidade

15,3

11,2

28,4

24,9

18,2

3

3

Atração, amor e intimidade

2,9

9,9

29,1

33,9

23,0

4

4

Infeções sexualmente transmissíveis Gravidez e parentalidade (ser pai e mãe) na adolescência Segurança pessoal (prevenção do abuso sexual) Comunicação acerca do relacionamento amoroso Vacinação contra o HPV e cancro do colo do útero Testes VIH/SIDA

0,6

2,9

5,1

16,9

73,2

5

5

1,0

2,9

10,9

21,1

62,6

5

5

2,2

3,5

12,5

27,2

53,4

5

5

4,5

13,7

31,9

30,4

17,9

3

3

2,2

3,8

13,1

22,4

56,5

5

5

1,6

1,6

12,5

20,4

62,3

5

5

Uso do preservativo

2,6

1,9

6,1

16,3

71,9

5

5

Contraceção

1,6

1,9

6,7

16,6

71,6

5

5

1,9

2,2

14,4

34,8

45,4

4

5

Maternidade/paternidade adolescência

na

Verificamos existir associação estatisticamente significativa de alguns destes temas com o género dos inquiridos. Há evidência de associação significativa dos rapazes que consideram Muito importante a abordagem com os temas Sonhos molhados [(c2=11,06, gl=4, p< .05), N=305] (com um valor de resíduo ajustado de +2,9) e Prazer e orgasmo [(c2=11,18, gl=4, p< .01), N=307] (com um valor resíduo ajustado de +3,7). Verifica-se o oposto relativamente ao tema Homossexualidade [(c2=42,062, gl=4, p< .001), N=307], considerado Nada importante (com um valor de resíduo ajustado de +5,5) pelos inquiridos do género masculino e Extremamente importante (com um valor de resíduo ajustado de +3,4) pelos do sexo feminino.

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Fontes de informação sobre sexualidade consultadas pelos jovens Quando perguntamos aos jovens Quais os locais e as pessoas que normalmente procuras para te informares sobre sexualidade?, rapazes e raparigas elegem os Familiares mais próximos, os Pares e a Internet como agentes de socialização privilegiados. Curiosamente, as frequências mais baixas incidem sobre os agentes de socialização formal (professores, psicólogos e técnicos do Gabinete de Apoio e Informação) (Tabela 3). Observamos uma associação estatisticamente significativa entre o género feminino e as fontes de socialização Pais [(c2=11,33, gl=1, p< .001), N=311], com um valor de resíduo ajustado de +3,4; Familiares mais próximos [(c2=13,04, gl=1, p=.000), N=311], com um valor de resíduo ajustado de +3,6; Professores [(c2=4,01, gl=1, p< .05), N=311], com um valor de resíduo ajustado de +2,0 e Profissionais de saúde [(c2=14,48, gl=1, p=.000), N=311], com um valor de resíduo ajustado de +3,8.

N

%

Família

Familiares próximos Pais Irmãos

201 146 52

64,2 46,6 16,6

Escola

Colegas/amigos Professores Gabinete de Atendimento e Informação/psicólogos

312 32 23

99,7 10,2 7,3

Outros

Tabela 3. Caraterização das fontes de informação sobre sexualidade consultadas pelos alunos Fontes de informação: (N=313)

Internet Profissionais de saúde Livros, revistas, folhetos

209 113 11

66,8 36,1 3,5

Conceção dos comportamentos sexuais dos outros jovens Início da sexualidade Solicitámos aos alunos do décimo segundo ano que assinalassem, para o género masculino e para o feminino, em que etapa do desenvolvimento humano – período pré-natal, infância, adolescência, idade adulta ou senescência – tem início a sexualidade. Dos 306 inquiridos que responderam a esta questão, apenas uma minoria (10,9%) assinala o período Pré-natal, em ambos os sexos, como o início da sexualidade. Para as restantes etapas do desenvolvimento humano existe um

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desfasamento entre géneros, ou seja, o mesmo inquirido assinala em etapas diferentes o início da sexualidade para os rapazes e para as raparigas, ou limitase apenas a assinalar o que diz respeito ao seu género (N=3). A análise das frequências (Fig. 1 e 2) mostra que as raparigas estão mais esclarecidas sobre este tema do que os rapazes. Figuras 1 e 2. Perceção do início da sexualidade nas raparigas e nos rapazes vs. Género

Feminino (%)

Masculino (%)

20

80

58,9

60 40

58,8

41,2

33,3

66,7

59,4

40,6

61,9

38,1

58,8

41,2

Masculino (%)

41,1

Rapazes

Raparigas

Feminino (%)

Podemos verificar, através da análise das Tabelas 4 e 5, que os conhecimentos sobre a sexualidade humana divergem com o curso frequentado pelos alunos. Os alunos do curso de Ciências e Tecnologia são os que apresentam frequências mais elevadas para o início da sexualidade dos rapazes no período Prénatal, chegando este valor a ser zero para os alunos de Ciências Socioeconómicas, que, na sua quase totalidade (95,8%), percecionam o início da sexualidade dos rapazes apenas na Adolescência, chegando esta frequência a atingir os 100% para o início da sexualidade nas raparigas no referido período. Relativamente ao início da sexualidade nos rapazes, há uma associação significativa entre os alunos do curso de Ciências e Tecnologia e as fases Pré-natal e Infância, com um valor de resíduo ajustado de +2,5, e os alunos de Ciências Socioeconómicas e a fase da Adolescência, com um valor de resíduo ajustado de +3,0.

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Tabela 4. Perceção do início da sexualidade nos rapazes vs. Curso frequentado Pré-natal (%)

Infância (%)

Adolescência (%)

Idade adulta (%)

Ciências e Tecnologia (N=170)

15,3

24,1

58,8

1,8

Línguas e Humanidades (N=47)

10,6

14,9

74,5

0

Ciências Socioeconómicas (N=24)

0

4,2

95,8

0

Artes Visuais (N=38)

7,9

13,2

78,9

0

Cursos Técnicos (N=24)

0

16,7

75,0

8,3

Tabela 5. Perceção do início da sexualidade nas raparigas vs. Curso frequentado Pré-natal (%) Ciências e Tecnologia (N=170)

Infância (%)

Adolescência (%)

Idade adulta (%)

15,9

17,6

64,7

1,8

11,6

7,0

76,7

4,7

Ciências Socioeconómicas (N=22)

0

0

95,5

4,5

Artes Visuais (N=38)

5,3

15,8

78,9

0

Cursos Técnicos (N=17)

0

5,6

94,4

0

Línguas e Humanidades (N=43)

Idade da primeira relação sexual Outra das questões colocadas aos alunos participantes nesta investigação foi Com que idade rapazes e raparigas têm a sua primeira relação sexual? Constatámos que a perceção da idade em que acontece a primeira relação sexual nos rapazes e raparigas também mostrou uma associação estatisticamente significativa com o género dos inquiridos. Enquanto 55,5% das alunas percecionam a primeira relação sexual dos rapazes entre os 10 e os 15 anos de idade, 56,2% dos rapazes assinalam este acontecimento a partir dos 16 anos. Quando analisamos a afinidade entre a idade apontada para a primeira relação

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sexual das raparigas e o género dos inquiridos, observamos que 65,3% das raparigas considera que as jovens têm a sua primeira relação sexual aos 16 anos ou mais tarde, havendo entre os respondentes do sexo masculino 48,1% que perceciona a primeira relação sexual das raparigas antes dos dezasseis anos (Figs. 3 e 4). Figuras 3. e 4. Perceção da primeira relação sexual nas raparigas e nos rapazes vs. Género

<16 anos Masculino (%)

≥16 anos Feminino (%)

[(c2=5,43, gl=1, p< .05), N=298]

46,9

64,3 35,7

<16 anos Masculino (%)

53,1

Rapazes

65,3 34,7

51,9

48,1

Raparigas

≥16 anos Feminino (%)

[(c2=3,89, gl=1, p< .05), N=294]

Ao tentarmos encontrar o motivo que conduz à primeira relação sexual, verificamos também que sensivelmente metade dos inquiridos considera que as relações sexuais são decisões partilhadas, embora 30% indique que É o rapaz que toma a iniciativa. As raparigas e os rapazes diferem na justificação encontrada para a primeira relação sexual entre os jovens. O sexo feminino assume uma opinião mais romântica, considerando a maioria das estudantes que a primeira relação sexual acontece porque Estão muito apaixonados e decidem assim [(c2=28,32, gl=1, p< .001), N=305], que esta acontece num contexto em que Já namoram há muito tempo [(c2=10,97, gl=1, p< .001), N=305], ou mesmo Porque não querem que o(a) parceiro(a) fique zangado(a) ou o(a) abandone [(c2=5,70, gl=1, p< .05), N=305]. Já os rapazes associam a primeira relação sexual a comportamentos de risco: Tomaram drogas (50%); Beberam de mais (45,8%) e Querem experimentar (42,7%), não tendo sido encontrada associação estatisticamente significativa. Por fim, ao procurarmos identificar a maior barreira ao uso do preservativo nas relações sexuais, constatámos uma associação estatisticamente significativa ao género. As raparigas selecionam mais frequentemente que os rapazes as opções Comprá-lo, fico um pouco envergonhado(a) [(c2=4,90, gl=1, p< .05), N=294] e Saber

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insistir para o usar na relação [(c2=5,87, gl=1, p< .05), N=294]. Já os rapazes referem mais frequentemente, como barreiras ao uso do preservativo, Trazer um preservativo sempre comigo [(c2=3,86, gl=1, p< .05), N=294] e Conseguir usá-lo e ter as mesmas sensações [(c2=4,82, gl=1, p< .05), N=294]. Discussão Podemos dizer, em síntese, com base nos resultados obtidos na investigação, que, entre os alunos do décimo segundo ano, existe relação significativa das variáveis sociodemográficas e escolares com as perceções e os comportamentos dos adolescentes no domínio da saúde sexual e reprodutiva. No que diz respeito à ESME, cerca de 90% referiu ter abordado temas de ES ao longo do seu percurso escolar, sobretudo no 3.º CEB e no secundário, tendo estas sessões decorrido sobretudo nas aulas de Ciências da Natureza/Ciências Naturais/ Biologia (72,2%) ou sido asseguradas por agentes externos (48,6%). Apesar de serem um indicador de que o trabalho tem vindo a ser desenvolvido, nos vários ciclos de ensino, nestas escolas do concelho de Oeiras, os resultados apontam mais uma vez para o lado do currículo das “ciências” e de um (ainda) fraco envolvimento das outras disciplinas (13,4%), tal como foi também verificado noutros estudos portugueses (Macário, 2010; Vilar, Ferreira & Duarte, 2009). Segundo os alunos inquiridos, as áreas curriculares não disciplinares (Formação Cívica, Área de Projeto, Estudo Acompanhado) foram também, ao longo dos últimos anos, um espaço privilegiado (40,9%) para o desenvolvimento de atividades no âmbito da ES. No entanto, a mais recente reestruturação retirou do desenho curricular do ensino básico a Área de Projeto, espaço de excelência para a abordagem multidisciplinar e para o desenvolvimento de trabalho de projeto. Os alunos referem existir desconforto e falta de formação docente no campo da ES, associando-os à falta de envolvimento dos professores nestas atividades. Tal como já foi constatado em várias investigações levadas a cabo nos últimos anos em Portugal (Anastácio et al., 2008; Ramiro e Matos, 2008; Dias, 2013), o conforto e a forma como os docentes autoavaliam a sua formação específica em ES estão relacionados com a implementação de atividades neste âmbito. São os professores que se autoavaliam positivamente e os que sentem mais conforto aqueles que mais dinamizam atividades de ES. Considerando que a abordagem das temáticas/ conteúdos deve integrar “além de aspectos biológicos, questões relacionadas com a percepção de competência e participação na vida social, com a sensação de pertença e apoio do grupo social, atribuindo às relações interpessoais um papel de importância reforçada” (GTES, 2007, p. 6), num trabalho que se quer transdisciplinar, só uma mudança significativa na formação e atitude dos docentes poderá inverter este cenário. Cabe às direções das escolas identificar necessidades de formação docente e a cada grupo disciplinar e professor do conselho de turma definir que contributo pode ser dado.

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Foram encontradas relações estatisticamente significativas nas variáveis curso frequentado e o sexo: • O curso frequentado pelos alunos inquiridos revelou ser um fator associado à avaliação que estes fazem da aptidão dos professores para desenvolverem atividades no domínio da ES. Com exceção dos alunos do curso de Línguas e Humanidades, os alunos, na sua maioria, são de opinião que os professores estão aptos para a abordagem de temas relacionados com a sexualidade e consideram que ficaram esclarecidos nas sessões que foram dinamizadas em espaço escolar. No entanto, constatámos que são os alunos do curso de Ciências e Tecnologias que melhores conhecimentos possuem sobre o início da sexualidade e, por outro lado, que é junto dos profissionais de saúde que os alunos dos cursos técnicos procuram esclarecer as suas dúvidas sobre os temas da sexualidade. • Em média, os jovens percecionam a primeira relação sexual por volta dos 15 anos, sensivelmente um ano mais tarde que a idade indicada no relatório nacional HBSC (Matos et al., 2012), embora seja percecionada com diferenças significativas por rapazes e raparigas. Os inquiridos do sexo feminino percecionam a primeira relação do sexo oposto antes dos 15 anos, considerando os inquiridos do sexo masculino que os rapazes só têm a sua primeira relação sexual depois dos 16 anos. • De igual modo, a nossa análise refere que quando os jovens têm relações sexuais é o casal que decide quando é a altura, tal como os dados do estudo HBSC (Matos et al., 2012) reportam. No entanto, encontramos diferenças estatisticamente significativas quanto ao género, que associam às raparigas decisões ligadas à paixão (Estão muito apaixonados e decidiram assim) e à estabilidade da relação (Já namoram há muito tempo). Não deixa de ser preocupante o facto de 70,2% das raparigas indicar que a primeira relação sexual acontece sobretudo porque Não querem que o(a) parceiro(a) fique zangado(a) ou o(a) abandone, o que denuncia que por vezes a primeira relação sexual poderá acontecer sem existir um completo desenvolvimento emocional e cognitivo, ou, até, de competências de comunicação e negociação face a pressões do(a) parceiro(a) e antes de os jovens estarem preparados para tal (Matos et al., 2011, 2012). • Foram também observadas diferenças estatisticamente significativas entre o género e algumas barreiras associadas ao uso do preservativo. As questões de assertividade emergem mais uma vez quando mais de três quartos das raparigas afirmam que a maior barreira ao uso do preservativo nas relações sexuais é Saber insistir para o usar na relação. Conclusão Verificámos que, maioritariamente, as práticas de ES assumem sobretudo uma vertente médico-sanitária. Esta valorização está associada a uma aquisição

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de conhecimentos sobre reprodução e à prevenção de comportamentos de risco, em detrimento das restantes dimensões da sexualidade – psicológicas, espirituais, sociais, económicas, políticas e culturais – onde deveria ganhar espaço a abordagem de outros espaços curriculares, para além das Ciências Naturais/ Biologia. Também neste estudo o desconforto e a menor aptidão dos professores para trabalhar as temáticas da educação sexual são associados pelos alunos à falta de formação profissional. Estes dados deverão conduzir a uma reflexão ao nível da formação académica, pós-graduada e contínua, quer do pessoal docente, quer dos restantes elementos de uma comunidade educativa que se pretende interveniente na educação sexual formal dos jovens em idade escolar. Os resultados obtidos apontam também para a necessidade de implementar estratégias que promovam um papel mais ativo dos alunos neste processo e que permitam, para além da aprendizagem de conhecimentos alicerçados em evidências científicas, a aquisição de competências que são transversais: de comunicação (quer com os pares, quer com os progenitores), de pensamento crítico, de resolução de problemas, de negociação, de respeito mútuo, de cooperação. Referências bibliográficas Albert, B. (2012). “With One Voice 2012: Highlights from a Survey of Teens and Adults”. The National Campaign to Prevent Teen and Unplanned Pregnancy. http:// www.thenationalcampaign.org/resources/pdf/briefly-wov-2012-highlights. pdf, acedido em 28 de outubro de 2012. Anastácio, Z., Carvalho, G. & Clément, P. (2008). Concepções dos professores de 1.º Ciclo do Ensino Básico sobre o contributo da Educação Sexual para a Promoção da Saúde e a sua relação com a formação. In pereira, B., Carvalho, G. (coord.). “Actividade física, saúde e lazer: modelos de análise e intervenção”. Lisboa: Lidel. Carvalho, M. A. D. (1999) O modelo informação-motivação-aptidões comportamentais: Estudo dos determinantes dos comportamentos preventivos na transmissão do VIH em jovens adultos. Dissertação de mestrado. Instituto Superior de Psicologia Aplicada. http://repositorio.ispa.pt/ handle/10400.12/403. Dias, S. (2013). Educação sexual nas escolas do concelho de Oeiras: perceção de professores e alunos. Dissertação de Mestrado, faculdade de Motricidade Humana – Universidade Técnica de Lisboa. Gabinete de Estatísticas da União Europeia. (2013). Live births by mother’s age at last birthday and by birth order. Recuperado em 23 julho, 2013 de, http://appsso. eurostat.ec.europa.eu/nui/submitViewTableAction.do Grupo de Trabalho de Educação Sexual (2005) Relatório preliminar. Lisboa: DGIDC. Grupo de Trabalho de Educação Sexual (2007) Relatório de progresso. Lisboa: Journal of Child and Adolescent Psychology Revista de Psicologia da Criança e do Adolescente. Lisboa, 4(2) 2013

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Educação Sexual em Meio Escolar: perceção dos alunos, pp. 51-71

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Estudo das Propriedades Psicométricas das Escalas de Resiliência de Prince-Embury Study of the psychometric properties of the Prince-Embury resiliency scales Sílvia Filipe Celeste Simões

Faculdade de Motricidade Humana

Contacto para correxpondência Celeste Simões csimoes@sapo.pt

Resumo: Este artigo tem como objectivo o estudo das propriedades psicométricas, a adaptação e a validação das Escalas de Resiliência de PrinceEmbury (2006) para a população adolescente portuguesa, com idades entre os 15 e os 18 anos. Neste artigo é feita uma abordagem inicial à resiliência, factores de protecção, factores de risco e são ainda referenciadas questões sobre a avaliação e adaptação de instrumentos. Quanto ao estudo psicométrico das escalas foi observado um valor de alfa de Cronbach de 0,82 para a escala da Capacidade de Controlo, de 0,90 para a escala da Capacidade de Relacionamento e de 0,91 para a escala da Reactividade Emocional. Os índices de ajustamento obtidos através da análise factorial confirmatória não se revelaram muito adequados para os modelos testados. Para o estudo da validade preditiva foi estabelecida a relação entre o consumo de álcool e drogas ilegais por parte dos adolescentes e os resultados nas três escalas, onde foi assim observada a existência de diferenças significativas na escala da Reactividade Emocional, em função dos diferentes níveis de consumo.

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Palavras-chave: Resiliência; Avaliação; Escalas de Resiliência; Consumo de drogas e álcool. Summary: This article aims to study the psychometric properties, the adaptation and validation of Resiliency’s scales of Prince-Embury (2006) for Portuguese adolescents between 15 and 18 years old. This paper begins with an approach to resilience, protective and risk factors, there are also references to evaluation and adaptation of instruments. The psychometric study of the scales observed a value of Cronbach’s alpha of 0,82 for the scale of Mastery, 0,90 to Relatedness and 0,91 for the scale of Emotional Reactivity. The rates of adjustment obtained in the confirmatory factor analysis have proved not to be very suitable for the models tested. To study the predictive validity was established the relationship between alcohol and illegal drugs consumption by adolescents and the results in the three scales, which allowed to observe significant differences in the scale of Emotional Reactivity, depending on the different levels of consumption. Key-words: Resilience; Evaluation; Scales of Resilience; Drugs and alcohol consumption.

Introdução A definição e a contextualização da resiliência conduzem a uma grande controvérsia por parte dos autores que se centram no seu estudo. Uns defendem uma visão da resiliência enquanto traço individual e outros como um processo complexo de características dinâmicas. Mas ao ser feita uma abordagem sobre a resiliência importa também considerar os factores de risco e de protecção dos sujeitos, procurar as suas distinções e os seus pontos de conflito. Desta forma, a avaliação, tendo em conta a utilização de métodos quantitativos e qualitativos, torna-se imprescindível quando se pretende estudar a resiliência do indivíduo nos seus múltiplos contextos. Apesar dessa necessidade, são escassos os instrumentos de avaliação da resiliência adaptados e validados para a população portuguesa. Assim, o presente artigo procura contribuir para o crescente número de instrumentos de carácter avaliativo da resiliência e para a investigação e estudo do tema. Resiliência: Aspectos Fundamentais O termo resiliência provém da física e é usado na descrição de materiais que são caracterizados pelas suas propriedades de elasticidade, ou seja, materiais que voltam ao seu estado inicial após uma situação de adversidade, sem que tenham

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sofrido modificações significativas (Anaut, 2005). No entanto, comprovado que muitos dos indivíduos sujeitos a situações adversas, e de alto risco, não apresentam indícios de desajustamento ou de desadaptação (Luthar, Cicchetti & Becker, 2000), o conceito de resiliência foi sendo utilizado também para se fazer referência ao Homem. Porém, não existe uma definição única para o conceito de resiliência (Madsen & Abell, 2010). Para Anaut (2005) a resiliência é “a capacidade de sair vencedor de uma prova, que poderia ter sido traumática, com uma força renovada” (p.43). Semelhante a essa definição é a de Pinheiro (2004) que refere que, em psicologia, a resiliência é definida como sendo a capacidade que o indivíduo, ou a sua família, tem para enfrentar as situações de adversidade e que apesar de ser alvo de transformações, consegue ultrapassá-las. Segundo Rutter (1999), a resiliência refere-se à resistência do indivíduo às experiências de risco de ordem psicossocial. Já para Rutten et al. (2013), a resiliência é um processo dinâmico e adaptativo que facilita a manutenção e a recuperação rápida da homeostasia, em condições de stress. Enquanto que, de acordo com Poletto e Koller (2008), resiliência não é mais do que um fenómeno de superação do stress e da adversidade, aplicado a indivíduos que superam, com êxito, situações de risco para o desenvolvimento de psicopatologias. Por sua vez, Wright, Masten e Narayan (2013) defendem que a resiliência reflecte a adaptação positiva na presença do risco e da adversidade, ou a capacidade de um sistema dinâmico para resistir ou recuperar de um distúrbio. No entanto, apesar das diferenças encontradas na conceptualização da resiliência, existem pontos de convergência nas várias definições apresentadas pelos autores, como seja a existência de risco e dos resultados positivos alcançados perante a adversidade. Porém, uma definição consensual para a resiliência parece não ter sido ainda encontrada. Considerar a resiliência como um traço ou atributo do indivíduo ou, por outro lado, como um processo que envolve várias variáveis do envolvimento, é também alvo de desacordo entre alguns investigadores. Luthar et al. (2000) propõem a distinção entre Resiliency e Resilience. O primeiro refere-se a traços de personalidade do próprio sujeito e à sua flexibilidade de funcionamento nas respostas a circunstâncias envolvimentais. Por outro lado, Resilience é utilizado como referência a um processo dinâmico que engloba uma adaptação positiva em contextos de adversidades significativas. Desta forma, segundo os mesmos autores, o termo Resilience deve ser empregue quando se refere a um processo ou fenómeno e, ao invés, Resiliency deve somente ser utilizado quando é feita referência a traços específicos da personalidade do indivíduo. Rutter (2012) defende que a resiliência deve ser vista enquanto processo e não como um atributo fixo de um indivíduo. Porém, o facto da resiliência ser vista como um processo, ou fenómeno, não permite que seja directamente medida, dado que só as variáveis envolvidas no processo o podem ser (Trzesniak, Libório & Koller, 2012). Ou seja, se a resiliência é revelada quando o sujeito recupera de situações de adversidade, então só é possível observar as manifestações dos seus

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factores de protecção, assim como a adaptação do seu funcionamento ao longo do tempo (Madsen & Abell, 2010). Pelo que se torna importante uma abordagem aos factores de risco e de protecção inerentes à resiliência. Factores de Risco A distinção entre factores de risco e factores de protecção é complexa, uma vez que, em função das circunstâncias e do próprio indivíduo, o mesmo factor pode contribuir para o risco ou para a protecção (Anaut, 2005). Segundo Reppold, Pacheco, Bardagi e Hutz (2002), os factores de risco são “condições ou variáveis que estão associadas a altas probabilidades de ocorrência de resultados negativos ou indesejáveis” (p.10). Estes factores aumentam a probabilidade do indivíduo apresentar problemas de ordem física, psicológica e social (Poletto & Koller, 2006), i.e., os factores de risco constituem assim circunstâncias que aumentam as hipóteses de maus resultados (Zolkoski & Bullock, 2012). As experiências de situações de adversidade desencadeiam nos sujeitos diferentes respostas, algumas de cariz adaptativo, e outras que o expõem a riscos maiores (Reppold et al., 2002). Um estudo de Trzesniak et al. (2012), com crianças e adolescentes do Brasil sujeitas a trabalho infantil, permitiu concluir que este nem sempre era considerado como uma situação de adversidade significativa para as crianças. Pelo contrário, o facto de trabalharem poderia ser uma potencial contribuição para o funcionamento normal e para o bem-estar das crianças. Em síntese, e de acordo com Richman e Fraser (2001), a relação entre o risco e a resiliência centra-se no comportamento adaptativo como resultado da interacção entre factores de risco e factores que reduzem o risco (factores de protecção). Consumo de Álcool e Drogas na Adolescência Os comportamentos de risco envolvem comportamentos de saúde negativos que podem comprometer o desenvolvimento positivo dos adolescentes a curto, médio e longo prazo (Simões, 2007). Segunda a autora, os comportamentos que podem ser considerados de risco estão associados à sua ocorrência em momentos onde não eram supostos, como seja o caso do consumo de álcool ou o comportamento sexual em idades precoces. Também o consumo de drogas surge como um comportamento de risco. De acordo com Simões (2007), vários jovens, na idade da adolescência, praticam actos de delinquência e experimentam tabaco e álcool. Um estudo realizado por Silber e Souza (1998) revelou que o álcool era a substância mais utilizada pelos adolescentes, seguindo-se o tabaco, inalantes, medicamentos psicotrópicos e drogas ilícitas, como o caso da cocaína. O mesmo estudo permitiu ainda concluir que o consumo de álcool está implicado em mais de metade das mortes de jovens, em acidentes de viação. Nos estudos de Ungar (2003) observou-se que os adolescentes envolvidos

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em actividades de risco, tal como fumar marijuana, percepcionavam esse comportamento como tendo efeitos positivos no desenvolvimento das suas relações interpessoais. Pode então dizer-se que a definição dos comportamentos que são inadequados, ou mesmo a sua frequência, constitui um desafio nos estudos em resiliência (Walsh, Dawson & Mattingly, 2010). No entanto, segundo Silber e Souza (1998), apesar de o consumo de substâncias, por parte dos adolescentes, poder estar associado a uma fase de experimentação e curiosidade e, portanto, inerente ao desenvolvimento do jovem, o consumo de tabaco, de álcool e de drogas ilícitas deve ainda assim ser considerado um comportamento de risco. Num estudo realizado por Castillo e Dias (2009), com 248 jovens com idades entre os 14 e os 19 anos, pretendia-se estudar a relação entre auto-regulação (com recurso a um questionário de auto-regulação), resiliência (com recurso a uma escala de resiliência) e o consumo de substâncias. Concluiu-se que os adolescentes que consumiam bebidas alcoólicas apresentavam pontuações médias inferiores na subescala de controlo de impulsos e na subescala do estabelecimento de objectivos, do Questionário de Auto-regulação utilizado no estudo. Para além disso, foram encontradas correlações elevadas e positivas entre a resiliência e a subescala do estabelecimento de objectivos e uma correlação moderada entre o controlo de impulsos e a resiliência. De acordo com Dillon et al. (2007), os sujeitos resilientes estão habilitados a reconhecer o consumo de substâncias como um risco e, assim, evitar esse comportamento. Segundo Becoña (2007), vários estudos indicam que existe uma relação consistente entre ter uma maior resiliência e o menor consumo de substâncias, especialmente o consumo de álcool e drogas ilegais. Para ambas as substâncias, os estudos indicam que ter uma maior resiliência é um factor de protecção para o consumo de álcool e drogas. Assim, o autor conclui que este conceito é de grande importância quando se trata da dependência de drogas, em particular no desenvolvimento de programas de prevenção baseados na resiliência. Factores de Protecção De acordo com Poletto e Koller (2006), os factores de protecção referem-se às influências que alteram ou melhoram as respostas do indivíduo a determinados riscos de desadaptação. Segundo Richman e Fraser (2001), os factores de protecção são características individuais ou condições do envolvimento que ajudam o sujeito a resistir ou contrariar os riscos aos quais estão expostos. Para Madsen e Abell (2010), os factores de protecção capacitam e ajudam o indivíduo a evitar, ou ultrapassar, os resultados negativos associados a experiências violentas. Por outras palavras, estes factores interagem com as experiências de vida do sujeito e activam os processos que induzem a adaptação e a saúde emocional (Poletto & Koller, 2008).

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No entanto, o que são considerados factores de protecção para algumas crianças não o são para todas (Ungar, 2004). Werner (1989) concluiu, com os seus estudos, que alguns factores de protecção parecem ter um efeito superior no processo de adaptação, comparativamente a determinados factores de risco específicos. É então importante atribuir um papel activo ao indivíduo quando se estudam os factores de protecção em casos particulares, dado que a heterogeneidade dos indivíduos é determinante quando é feita a detecção de quais são os factores que actuam como protectores face ao risco. Este artigo tem como objectivo o estudo das propriedades psicométricas, a adaptação e a validação das Escalas de Resiliência para Adolescentes de Sandra Prince-Embury, publicada originalmente pela PsychCorp (2006), para a língua Portuguesa e população adolescente Portuguesa, com idades entre os 15 e os 18 anos de idade. Métodos Amostra A amostra é composta por 277 jovens, 138 do género feminino e 139 do género masculino, com idades entre os 15 e os 18 anos (M=16,58, DP=0,95 e M=16,58, DP=1,02 para os indivíduos do género feminino e masculino, respectivamente). Os participantes frequentavam o último ano do terceiro ciclo (9º ano) e o ensino secundário. O grau de escolaridade dos pais dos participantes revelou que 27,3% e 26,7% das mães e dos pais, respectivamente, completaram o ensino secundário e que apenas 0,4% dos pais não frequentaram a escola. Instrumento O instrumento alvo de adaptação e validação é a Resiliency Scales for Adolescents de Sandra Prince-embury (2006), traduzido para português como Escalas de Resiliência para adolescentes (ERA). As escalas medem os atributos e características pessoais do adolescente que são significativos para o processo de resiliência. Estas escalas, sob a forma de questionário, englobam 64 itens distribuídos por três escalas: escala da Capacidade de Controlo (20 itens), escala de Capacidade de Relacionamento (24 itens) e escala da Reactividade Emocional (20 itens). Cada uma destas escalas abrange subescalas. A escala da Capacidade de Controlo é composta pela subescala do Optimismo, da Auto-eficácia e da Adaptabilidade; a escala de Capacidade Relacionamento envolve as subescalas do Conforto, Confiança, Apoio e Tolerância; por último, a escala da Reactividade Emocional compreende as subescalas da Sensibilidade, da Incapacidade e da Recuperação.

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A cotação dos itens, das três escalas, é feito a partir de uma escala de Likert, assim, para cada questão o jovem tem cinco possibilidades de resposta: 0 (nunca); 1 (raramente); 2 (algumas vezes); 3 (frequentemente); e 4 (sempre). Nas escalas Capacidade de Controlo e Capacidade de Relacionamento uma cotação de valor elevado significa um resultado positivo, ou seja, o pretendido. Ao invés, na escala Reactividade Emocional, o desejável é o valor mínimo possível, pelo que tais considerações deverão estar presentes no momento da cotação da escala e interpretação dos resultados. Procedimento Para a tradução da escala de Resiliência de Prince-Embury (2006), originalmente na língua inglesa, foi utilizado o método back-translation (Hambleton, 2005), ou seja, a escala foi traduzida para português e, de seguida, de português para inglês. Por fim, depois de comparada a versão original da autora com a versão retrotraduzida, foi possível obter uma versão em português com equivalência de conteúdo. Na recolha de dados foram utilizados dois métodos. O método 1 consistiu no preenchimento da escala pelos alunos, em sala de aula, supervisionados por um professor responsável. No método 2 os jovens responderam às questões da escala através de um formato digital colocado na internet. No método 1, a recolha de dados foi feita em duas escolas públicas do concelho de Lisboa. Foram contactados os directores de ambas as escolas e assim solicitada a autorização para a aplicação das escalas a jovens com idades entre os 15 e os 18 anos. Seguidamente foram fornecidas as autorizações para os encarregados de educação e, após esse consentimento, os instrumentos foram distribuídos e preenchidos pelos alunos na sala de aula, durante o horário lectivo normal, em tempos cedidos pelos professores para o efeito. Dada a impossibilidade da aplicação das escalas ser feita pelas autoras do estudo, foram disponibilizadas, aos professores, as instruções a serem previamente lidas aos alunos aquando o preenchimento do instrumento. No método 2, a escala foi colocada em formato online e distribuída, através do seu link, a professores do ensino básico e secundário português. Os professores reenviaram o endereço aos alunos cujas idades se enquadravam no estudo e as respostas, anónimas, automaticamente ficavam registadas numa base de dados confidencial. Depois de obtidas as respostas dos jovens, pelos dois métodos, estas foram codificadas e analisadas no programa estatístico SPSS, versão 18, (com a excepção da análise factorial confirmatória que foi efectuada no programa EQS versão 6.1) para assim ser feito o tratamento de dados.

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Resultados São apresentados os resultados da consistência interna das escalas e subescalas, assim como das análises factoriais e correlações, relativas às escalas e suas subescalas. Por último, o estudo da validade preditiva através da relação entre o consumo de substâncias e as pontuações obtidas nas escalas das ERA, também com o recurso à ANOVA one-way. Consistência Interna das Escalas e Subescalas Para o estudo da consistência interna foram observados os valores do alfa de Cronbach para cada escala e subescala, em função do género, e na amostra global, e os valores mínimos e máximos das correlações inter-item no caso das subescalas (tabela 1) para a totalidade da amostra. De um modo geral, o valor do alfa de Cronbach é indicador de uma boa consistência interna para as escalas e para as subescalas, com a excepção da subescala da adaptabilidade. Na subescala da sensibilidade são apresentados valores mínimos da correlação negativos, que se devem ao facto do item 3, da escala da Reactividade Emocional, apresentar correlações negativas com todos os outros itens da mesma subescala, com excepção do item 4, com quem tem uma correlação positiva. Tabela 1. Valores do alfa de Cronbach para as escalas e subescalas, e as correlações inter-item. Escala

Subescalas

Capacidade de Controlo

Total

0,84

0,81

0,82

Correlações inter-item para o total da amostra

Optimismo

0,76

0,78

0,77

0,19 – 0,66

0,77

0,78

0,77

0,08 – 0,67 0,03 – 0,30

Adaptabilidade

0,66

0,21

0,38

0,88

0,91

0,90

Confiança

0,77

0,78

0,78

0,23 – 0,57

Apoio

0,77

0,62

0,67

0,20 – 0,63

Conforto

0,79

0,83

0,81

0,81 – 0,84 0,06 – 0,42

Tolerância Reactividade Emocional

80

Masculino

Auto-eficácia Capacidade de Relacionamento

Feminino

0,65

0,74

0,71

0,90

0,92

0,91

Sensibilidade

0,65

0,69

0,68

-0,16 – 0,68

Recuperação

0,76

0,83

0,80

0,30 – 0,66

Incapacidade

0,90

0,91

0,91

0,80 – 0,82

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Na tabela 2 constam os valores do alfa de Cronbach com a retirada de itens que favorecem o seu aumento. Apenas estão incluídos os itens cuja exclusão se reflecte num aumento do alfa. De notar que não é feita referência à escala da Capacidade de Relacionamento, no total, e às subescalas da auto-eficácia, da confiança e da tolerância por não apresentarem itens que retirados beneficiem o valor do alfa de Cronbach. Tabela 2. Valores do alfa de Cronbach para cada escala a subescala com a exclusão de itens. Escala Capacidade de Controlo

Subescalas

Item

Alfa Cronbach com o item

Alfa Cronbach se o item for retirado

Total

17

0,82

0,85

Optimismo

4

0,77

0,78

Adaptabilidade

15 17

0,38 0,38

0,43 0,40

Apoio

18

0,67

0,78

Conforto

3

0,81

0,84

Total

3

0,91

0,92

Sensibilidade

3

0,67

0,76

Capacidade de Relacionamento

Reactividade Emocional

Recuperação

10

0,80

0,82

Incapacidade

20

0,91

0,91

Análise Factorial Confirmatória De seguida foi realizada a análise factorial confirmatória das ERA. Esta análise permitirá encontrar, juntamente com os dados anteriores, a estrutura das ERA que mais se adequa à população adolescente portuguesa. Assim, para se poder avaliar a adequabilidade do modelo proposto pela autora das ERA utilizaram-se os seguintes índices de ajustamento: Bentler-Bonnet Nonnormed Fit Index (NNFI), Comparative Fit Index (CFI), Standardized Root Mean Square Residual (SRMR), Root Mean Square Error Approximation (RMSEA). Um ajustamento adequado do modelo é indicado para valores superiores a 0,95 no índice do CFI e no do NNFI (Hu & Bentler, 1999), e inferiores a 0,05 no índice SRMR e no RMSEA (Fülöp, 2007). Contudo valores de RMSEA entre 0,05 e 0,08 são considerados ainda aceitáveis (Little, Card, Slegers, & Ledford, 2007; Fülöp, 2007). São ainda apresentados os valores do qui-quadrado (χ2). No entanto, apesar de um qui-quadrado não significativo ser considerado um bom índice de ajustamento, é importante referir que este índice é sensível ao número de sujeitos da amostra (Fülöp, 2007). Neste caso, o número da amostra é já considerado como elevado, pelo que o qui-quadrado não constitui o índice mais indicado para a avaliação da adequação do modelo, assim, este índice é apresentado,

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maioritariamente das vezes, apenas a título ilustrativo. Por isso, em alternativa, é apresentado um indicador com base no qui-quadrado no qual o valor do quiquadrado é dividido pelo número de graus de liberdade, sendo que um rácio inferior a 2 é considerado bom, se for inferior a 3 é ainda razoável, não devendo ser aceite um rácio superior a 5 (Jackson, Dezee, Douglas & Shimeall, 2005). Finalmente, é ainda de referir que, à excepção do índice SRMR, todos os outros índices foram obtidos através do método Robust (Yuan-Bentler Correction). Este método é utilizado quando os valores da curtose multivariada sugerem que a amostra não tem distribuição normal. Desta forma, este método possibilita, nestes casos, a obtenção de resultados fiáveis, em comparação com os métodos usuais, como no caso do Maximum Likelihood. O modelo inicialmente testado consistiu no modelo proposto pela autora, que se traduz num modelo com 13 factores, 10 factores de 1ª ordem (subescalas) e 3 factores de 2ª ordem (escalas). A obtenção dos modelos finais envolveu a realização de um conjunto de passos, no sentido de se obter um modelo mais adequado (tabela 3). Assim, para o melhoramento dos modelos foram eliminados parâmetros não significativos e adicionados parâmetros significativos e consistentes com a teoria (Savalei & Bentler, 2006). No caso da adição de parâmetros, consta, como exemplo, a introdução das covariâncias entre os erros de medida. Tabela 3. Índices de ajustamento do modelo de treze factores χ2 (g.l.) 1

χ2/g.l

CFI2

NNFI2

Etapa 1 3105,26 (1939)

1,60

0,75

0,74

0,05

0,08

Etapa 2 2217,77 (1364)

1,65

0,80

0,79

0,05

0,07

Etapa 3 2029,68 (1359)

1,49

0,85

0,84

0,05

0,07

RMSEA2 SRMR2

Modelo treze factores

1 – Scaled Chi-Square (Yuan-Bentler); 2 – Robust

Etapa 1 – Modelo proposto; Etapa 2 – Eliminação de indicadores; Etapa 3 – Introdução de parâmetros. Foram realizadas três etapas com a finalidade de se obter um modelo mais adequado, com índices satisfatórios. A primeira etapa reflecte o modelo de treze factores, como proposto pela autora. Tal como se pode observar na tabela 4.3.1, foram obtidos valores de CFI e NNFI de 0,75 e 0,74, respectivamente, ou seja, fracos indicadores de um bom modelo, uma vez que, para tal, deveriam ser superiores a 0,95. Desta forma, o próximo passo consistiu em retirar os itens cuja variância explicada (R2) era inferior a 0,2 (etapa 2), por se considerar que esse é um indicador de grandes níveis de erro (Hooper, Coughlan & Mullen, 2008).

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Verificou-se, então, um aumento do CFI e do NNFI e uma ligeira diminuição do SRMR mas, ainda assim, o modelo continuou a não evidenciar índices satisfatórios. Por último, o modelo final, representado na etapa 3, onde foram introduzidas quatro covariâncias entre os erros de medida entre as variáveis que representem os seguintes itens: item 10 e 11 da escala da Capacidade de Controlo; item 9 e 10 da escala da Capacidade de Relacionamento; item 1 e 2 da escala da Reactividade Emocional; e, por último, item 12 e 13 também da escala da Reactividade Emocional. Para além disso, verificou-se que o item 19 (“Se me acontecer alguma coisa de mal, eu consigo pedir ajuda aos meus pais”) da escala da Capacidade de Relacionamento, pertencente à subescala do apoio, apresentava uma saturação superior na subescala da adaptabilidade, pelo que foi introduzido o crossloading do item em ambos os factores. Assim, nesta última etapa constataramse aumentos, ainda que reduzidos, no índice do CFI e do NNFI, sendo que o RMSEA e o SRMR se mantiveram. Nas três etapas realizadas com o modelo de treze factores, o qui-quadrado mostrou-se não significativo mas, dado que este é um indicador muito sensível à dimensão da amostra, foi calculado o rácio qui quadrado/ graus de liberdade e, em todas as etapas, se verificaram valores abaixo de dois, o que os autores defendem como sendo um bom indicador do modelo. No entanto, mesmo com a eliminação e introdução de parâmetros, pode-se verificar que os índices do CFI e do NNFI, obtidos no modelo de treze factores, estão abaixo do valor defendido como um indicador de um bom modelo (0,95), assim como o SRMR se encontra acima do valor de corte (0,05). Por outro lado, os valores do RMSEA estão enquadrados no limite dos valores de referência aceitáveis. Assim, dada a inconsistência nos valores dos índices de ajustamento do modelo de treze factores, exploraram-se outros modelos alternativos que pudessem ser mais adequados, conceptualmente e estatisticamente, tal como um modelo de três factores e um modelo de dez factores, sendo que em ambos os modelos todos os factores se correlacionam entre si Tabela 4. Comparação dos Índices de ajustamento dos modelos explorados χ2 (g.l.) 1

χ2/g.l

CFI2

NNFI2

Modelo de treze factores

3105,26 (1939)

1,60

0,75

0,74

0,05

0,08

Modelo de três factores

3663,60 (1949)

1,88

0,63

0,62

0,06

0,08

Modelo de dez factores

3024,20 (1907)

1,49

0,76

0,75

0,05

0,07

RMSEA2 SRMR2

Através da análise da tabela 4 se verifica que, ainda que ocorram pequenas diferenças entre os valores dos índices, essas parecem não ser indicativas de existir um modelo substancialmente mais adequado que outro. Ou seja, não existe nenhum modelo cujos índices satisfaçam o requisito de um modelo

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adequado, dado que em nenhum se verificam, concomitantemente, valores de CFI e de NNFI superiores a 0,95 e valores de SRMR e RMSEA abaixo de 0,05. Pelo que, dado que a proposta da autora consiste num modelo de 2ª ordem com treze factores (três factores de 2ª ordem – escalas, e dez factores de 1ª ordem – subescalas), se apresentam os valores obtidos na solução estandardizada do modelo de treze factores. A tabela 5 apresenta os valores de saturação das subescalas nas escalas, assim como o erro residual e a variância explicada do modelo final de treze factores. Tal como se pode observar, os valores de saturação mais baixos constam nas subescalas da adaptabilidade e do conforto, sendo as restantes sempre superiores a 0,70. Também em relação à variância se verificam os valores mais baixos na subescala do conforto e da adaptabilidade, sendo também aquelas onde o erro residual é superior. Tabela 5. Saturação dos indicadores nos factores (l), erro residual (E) e variância explicada (R2) no modelo de treze factores, relativamente às escalas e subescalas. l

Escala Capacidade de Controlo

Capacidade de Relacionamento

Reactividade Emocional

E

R2

Optimismo

0,707

0,707

0,500

Auto-eficácia

0,807

0,591

0,651

Adaptabilidade

0,479

0,878

0,229

Conforto

0,541

0,841

0,292

Confiança

0,869

0,495

0,755

Tolerância

0,953

0,303

0,908

Apoio

0,889

0,457

0,791

Sensibilidade

0,945

0,326

0,894

Recuperação

0,881

0,473

0,776

Incapacidade

0,703

0,711

0,494

Em relação às saturações, erros residuais e variâncias explicadas relativas às subescalas e itens constata-se que, em nenhum caso, as variâncias explicadas são inferiores a 0,2 uma vez que, como referido atrás, foram retirados os itens onde essa situação se verificava. O item cuja saturação é mais baixa no factor é o item 19 da subescala do apoio, com uma saturação de 0,299, e aquele com saturação superior é o item 1 da subescala do conforto, ambos pertencentes à escala da Capacidade de Relacionamento. No que diz respeito à correlação entre as escalas, foi observado, no modelo final de treze factores, uma forte correlação positiva (r=0,85) entre a escala da

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Capacidade de Controlo e a escala da Capacidade de Relacionamento, e uma correlação fraca e negativa (r= - 0,30) entre a escala da Capacidade de Controlo e a escala da Reactividade Emocional, bem como entre a escala da Reactividade Emocional e a escala da Capacidade de Relacionamento (r= - 0,29). Correlações entre Escalas e Subescalas É possível observar, na tabela 6, os valores de correlação de Pearson entre as três escalas, entre as subescalas, e entre escalas e as subescalas. Tabela 6.Correlações entre as ERA e as suas subescalas Capacidade de Controlo Optimismo

1 1

2

,820

1

3

4

5

Auto-eficácia

,868

,537

Adaptabilidade

,537

,230 ,274

,626

,480 ,532 ,480

,492

,366 ,484 ,200 ,641

Capacidade de Relacionamento Conforto

6

7

8

11

12

13

1 1 1

Apoio

,445

,373 ,327 ,351 ,823 ,259

,471

,429 ,391 ,247 ,872 ,536 ,622

,502

,363 ,449 ,400 ,802 ,307 ,532 ,572

Tolerância

10

1

Confiança Reactividade Emocional Sensibilidade

9

1 1 1

-,255 -,219 -,213 -,160 -,256 -,051 -,280 -,232 -,251

1

-,191 -,131 -,211 -,093 -,187 -,100 -,158 -,188 -,184 ,818

1

Incapacidade

-,248 -,210 -,193 -,179 -,202 -,005 -,255 -,170 -,206 ,938 ,653

1

Recuperação

-,194 -,221 -,142 -,055 -,251 -,090 -,242 -,230 -,227 ,724 ,500 ,528

1

Legenda: 1»Capacidade de Controlo; 2»Optimismo; 3»Auto-eficácia; 4»Adaptabilidade; 5»Capacidade de Relacionamento; 6»Conforto; 7»Apoio; 8»Confiança; 9»Tolerância; 10»Reactividade Emocional; 11» Sensibilidade; 12»Incapacidade; 13»Recuperação.

Observam-se valores de correlação fortes entre as subescalas e as respectivas escalas onde estão inseridas, com a excepção da correlação entre a subescala da Adaptabilidade com a escala da Capacidade de Controlo (r=0,537), e da correlação entre a subescala Conforto e a escala da Capacidade de Relacionamento (r=0,641), que apresentam, nos dois casos, valores de correlação moderados. No entanto, é possível observar que no caso da escala da Reactividade Emocional esses valores são ainda mais elevados, chegando a correlação entre a subescala da Incapacidade com a escala da Reactividade Emocional a ser r=0,938. Na escala da Capacidade de Controlo destaca-se a subescala da Adaptabilidade Journal of Child and Adolescent Psychology Revista de Psicologia da Criança e do Adolescente. Lisboa, 4(2) 2013

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pelos fracos valores de correlação que existem entre essa e as restantes subescalas da mesma escala. Na escala da Capacidade de Relacionamento, a correlação mais baixa encontra-se entre a subescala do Conforto e a subescala do Apoio, com um valor de 0,259. Quando se trata da escala da Reactividade Emocional o valor mais baixo consta da correlação entre a subescala da Recuperação e a da Sensibilidade (0,500). A escala da Reactividade Emocional correlaciona-se negativamente com todas as outras escalas, e subescalas. Nas restantes escalas, as correlações entre si, e entre as subescalas, apresentam valores positivos. Validade Preditiva De acordo com Guillevic e Vautier (1998), não obstante a importância de dispôr de um instrumento sensível e estável, torna-se crucial que os resultados desse instrumento reflictam, com exactidão, o que é suposto que ele meça. Essa característica constitui a validade do teste. Segundo os mesmos autores, um dos aspectos da validade de um teste é a chamada validade preditiva: obtida pela correlação que se estabelece entre a medida em si e o que essa permite prever. Assim, e dada a relação verificada, em estudos anteriores, entre resiliência e consumo de substâncias, e com o objectivo de se estudar a relação deste último com as pontuações obtidas nas ERA, foram consideradas, neste estudo, as variáveis que se seguem: Consumo de cerveja; Consumo de bebidas destiladas; Frequência com que o jovem refere ficar embriagado e Consumo de drogas ilegais ao longo da vida. Estas variáveis são provenientes do estudo do Peer DriveCleanEU (prevenção do consumo de substâncias relacionado com a condução de veículos motorizados), inserido no Projecto Aventura Social & Saúde que está integrado numa rede Europeia (Health Behaviour in School Aged Children HBSC/ Organização Mundial de Saúde). Projecto esse que pretende ter impacto nas políticas de promoção e educação para a saúde. Para cada uma das variáveis em estudo foi realizada uma análise de variância após a recodificação das variáveis relativas ao consumo de substâncias1. Em todas as análises foi realizado o teste de homogeneidade de variâncias e utilizado o teste robusto de Welch sempre que as variâncias dos grupos em análise não se revelaram homogéneas. Consumo de cerveja Os resultados obtidos na análise de variância das três escalas em estudo, organizadas em função da frequência do consumo de cerveja, não revelaram 1

As variáveis “consumo de cerveja”, “consumo de bebidas destiladas”, “Embriaguez” englobavam cinco modalidades de resposta que foram recodificadas para três modalidades: Nunca, Raramente e Frequentemente. A variável “Consumo de drogas ilegais ao longo da vida” apresentava sete modalidades de resposta, que se relacionavam com a frequência do consumo de drogas ilegais, e que foram convertidas para Sim (consumiu drogas ilegais) e Não (não consumiu drogas ilegais).

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a existência de diferenças significativas ao nível da escala da Capacidade de Controlo (F2,207=1,204, p>0,05) e da escala da Capacidade de Relacionamento (F2,210=0,613, p>0,05) No entanto, na escala da Reactividade Emocional (F2,215=3,696), encontraram-se diferenças significativas na pontuação da referida escala para os diferentes níveis de consumo de cerveja (p<0,05). Realizado o teste de Scheffé, constata-se que as diferenças ocorrem entre os jovens que nunca consumiram cerveja e aqueles que o fazem frequentemente. Consumo de bebidas destiladas Numa análise idêntica à anterior, mas agora relacionada com o consumo de bebidas destiladas, como os licores, whisky, vodka, entre outros, começouse por verificar, através do teste de Levene, a existência da homogeneidade de variâncias, onde p>0,05, para as três escalas. Assegurada essa premissa, a ANOVA permitiu constatar que não existem diferenças significativas entre o consumo de bebidas destiladas relativamente às escalas da Capacidade de Controlo (F2,207=0,188) e Capacidade de Relacionamento (F2,210=0,568), dado que p>0,05. Pelo contrário, quando se trata da escala da Reactividade Emocional, diferenças significativas foram encontradas (F2,215=3,659), com p<0,05. Assim, o teste de Scheffé permitiu observar que existiam diferenças significativas na escala da Reactividade Emocional entre os jovens que nunca beberam bebidas destiladas e aqueles que o fazem frequentemente. Frequência com que ficou embriagado O teste de Levene para a homogeneidade de variâncias confirmou a existência da mesma para as três escalas (p>0,05), relativamente à frequência com que o jovem refere ficar embriagado. Aquando o estudo das diferenças entre os valores médios das frequências em que o jovem diz ficar embriagado, em cada escala, através da ANOVA constatou-se que essa diferença não existe na Capacidade de Controlo e na Capacidade de Relacionamento (F2,203=1,108 e F2,206=0,488, respectivamente) para p>0,05. O mesmo não se verificou na escala da Reactividade Emocional, onde essas diferenças são significativas (F2,211=6,997), dado que p<0,05. Assim, encontraram-se, através do teste de Scheffé, diferenças significativas entre a frequência Nunca e Raramente e entre Nunca e Frequentemente, ou seja, existem diferenças entre os jovens que nunca ficaram embriagados e aqueles que, mesmo que raramente, já ficaram. Consumo de drogas ilegais ao longo da vida do jovem O teste de Levene para a homogeneidade de variâncias assegurou a mesma para as três escalas (p>0,05). A realização da ANOVA possibilitou verificar que não existem diferenças significativas no consumo de drogas ilegais nas escalas

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da Capacidade de Controlo (F1,201=0,816) e da Capacidade de Relacionamento (F1,205=0,138), com p>0,05. Na escala da Reactividade Emocional (F1,210=3,934) foram já observadas diferenças significativas, p<0,05, entre ter consumido, ou não, drogas ilegais. Discussão e Conclusão Seguindo a ordem da apresentação dos resultados, constata-se que os valores de consistência interna, expressa pelos valores de alfa de Cronbach, são superiores na versão original da escala, independentemente do género. Assim, neste estudo, a escala da Capacidade de Controlo teve um valor de alfa de 0,82 (0,95 na versão original), na escala da Capacidade de Relacionamento foi de 0,90 (0,95 na versão original) e, por fim, na escala da Reactividade Emocional o alfa foi de 0,91 (0,94 na versão original). De notar que, no caso da versão portuguesa, o valor mais elevado foi encontrado na escala da Reactividade Emocional onde, na versão original, foi o valor mais baixo comparativamente às restantes escalas. Ainda assim, todos os valores originais são superiores à versão portuguesa. Na escala da Reactividade Emocional, e nas suas subescalas, o valor do alfa de Cronbach é superior no género masculino. O mesmo ocorre na escala e subescalas da Capacidade de Relacionamento, com a excepção da subescala do apoio. Por sua vez, na escala da Capacidade de Controlo o alfa é superior no género feminino, mas nas suas subescalas os valores são muito semelhantes entre os géneros, com a excepção da subescala da adaptabilidade, onde o valor do alfa é bastante superior no género feminino. Nesta subescala, adaptabilidade, foram encontrados valores de consistência interna fracos (0,38), em particular para os rapazes (0,21), sendo a subescala que, entre as dez subescalas, tem o valor de alfa de Cronbach mais baixo. Também na versão original da escala o valor mais baixo do alfa encontrava-se na subescala da adaptabilidade, porém com valores consideravelmente superiores (0,82 para a versão original). De notar que a subescala da adaptabilidade está incluída na escala da Capacidade de Controlo, aquela que, entre as três escalas, apresentou valores inferiores de consistência interna. Quando retirados alguns itens das escalas, e subescalas, o alfa de Cronbach aumenta, no entanto os incrementos observados não são muito elevados. Em concreto, na escala da Capacidade de Controlo a retirada do item 17 representa um aumento de 0,03 no valor do alfa. Na subescala da adaptabilidade, já referida como uma subescala com fracos valores de alfa, a extracção do item 15 e 17 aumentam o valor de alfa mas, no melhor dos casos, em apenas 0,05. No entanto, é de referir que essa é uma subescala com poucos itens e, segundo Pallant (2007), o valor do alfa de Cronbach é bastante sensível ao número de itens da escala (ou subescala), ou seja, em escalas com menos de dez itens é comum encontrar baixos valores de alfa. Ora, a subescala da adaptabilidade apenas contém três itens, o que pode justificar os baixos valores de consistência interna encontrados.

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Em relação à escala da Capacidade de Relacionamento, na totalidade, não se observou o melhoramento da sua consistência interna pela extracção de nenhum item. Apenas se verificaram reduzidas melhorias no alfa de Cronbach nas subescalas do apoio e do conforto pela extracção dos itens 18 e 3, respectivamente para cada subescala. Ao retirar o item 3 da escala da Reactividade Emocional, e consequentemente da subescala da sensibilidade, observou-se um aumento da consistência interna de 0,91 para 0,92 e de 0,67 para 0,76, respectivamente para a escala e para a subescala Seguiu-se a análise factorial confirmatória do modelo proposto pela autora das ERA. A autora propõe a existência de três escalas e dez subescalas, portanto, um modelo de 2ª ordem com um total de treze factores. Os resultados dos índices do CFI e do NNFI, mesmo após etapas de eliminação e introdução de parâmetros, não se revelaram indicadores de um bom modelo. Isto é, não alcançaram o valor de 0,95 proposto por Hu e Bentler (1999). Também nos resultados originais da construção da escala, feitos pela sua autora, se observaram valores de AGFI (Adjusted Goodness-of-Fit Index) de 0,92, portanto, inferiores a 0,95. A autora encontrou, tal como neste estudo, valores de RMSEA de 0,05. Porém, podese dizer que este modelo de treze factores, perante a inconsistência dos vários índices de ajustamento, não se revela muito adequado. Na tentativa de encontrar um modelo que melhor satisfizesse as condições necessárias, foram estudados dois modelos alternativos: de dez factores e três factores, ambos de 1ª ordem. As conclusões não indicaram, mais uma vez, a existência de um bom modelo, dado que alguns dos índices se mantinham ainda bastante afastados dos valores de referência. Nos resultados da análise constatou-se que o item 19 da subescala do apoio, da escala da Capacidade de Relacionamento saturou, com maior peso, na subescala da adaptabilidade. Veja-se o item 19: “Se me acontecer alguma coisa de mal, eu consigo pedir ajuda aos meus pais”. Este resultado sugere que este item remete mais para a capacidade do jovem controlar uma situação, ou se adaptar a ela, do que para uma capacidade de relacionamento e de apoio. Para além disso, a análise factorial confirmatória apontou para a necessidade de introduzir as covariâncias entre os erros de medida de algumas variáveis, tais como as que representam os itens 10 e 11 da escala da Capacidade de Controlo (“Consigo ultrapassar os problemas que me vão aparecendo” e “Se eu tiver um problema, eu consigo resolvê-lo”) que revelaram uma correlação com um valor de r=0,508. A covariância entre os erros de medida das variáveis que representam o item 9 “Posso confiar nos outros” e o item 10 “Eu posso deixar os outros perceberem os meus verdadeiros sentimentos”, da escala da Capacidade de Relacionamento, foi igualmente introduzida. Também na escala da Reactividade Emocional é sugerida, pela análise dos resultados do LM Test, a introdução de covariâncias entre erros de medida. São as variáveis relativas aos itens 1 e 2 (“Para mim é fácil ficar irritado” e “As pessoas dizem que me irrito facilmente”, respectivamente) e as variáveis que representam os itens 12 e 13 (“Quando me irrito, fico irritado durante todo o dia” e “Quando me irrito, fico irritado durante

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vários dias”, respectivamente). Quando são feitas as correlações entre as escalas das ERA, através da análise factorial confirmatória, obtêm-se valores de 0,85 entre as escalas da Capacidade de Relacionamento e a Capacidade de Controlo. Ainda que seja uma correlação expressiva, segundo Pallant (2007), não sugere multicolinearidade entre as escalas, dado que, para isso, os valores de correlação teriam de ser acima de 0,90. No caso da relação entre a escala da Reactividade Emocional e a escala da Capacidade de Controlo e entre a escala da Reactividade Emocional e a escala da Capacidade de Relacionamento, os valores são, nos dois casos, baixos e de sinal negativo, o que se justifica, mais uma vez, pelo facto de termos duas dimensões que contribuem positivamente para a resiliência e uma dimensão negativa que contribui de forma negativa para a resiliência. Terminada a análise factorial confirmatória, foram pedidas as correlações de Pearson entre as escalas e respectivas subescalas, onde se observaram valores no geral elevados, sugerindo uma forte associação entre as escalas e suas subescalas. Verifica-se, no entanto, que a correlação entre a subescala da adaptabilidade com a escala da Capacidade de Controlo (r=0,537) sugere uma relação moderada desta subescala com o domínio da Capacidade de Controlo. Na escala da Capacidade de Relacionamento foram observados valores de correlação elevados entre essa e as suas subescalas, com a excepção da subescala do conforto, com quem apresenta uma correlação moderada. Também se verificaram valores de correlação elevados entre a escala da Reactividade Emocional e as suas três subescalas. De notar que esta última escala se correlaciona negativamente com todas as outras escalas e subescalas dado o facto de a cotação estar invertida. Quando nos referimos à validade preditiva do instrumento, através da comparação do consumo de cerveja e o consumo de bebidas destiladas, pelos jovens, e os resultados em cada escala, concluiu-se que existem diferenças significativas entre os jovens que nunca consumiram cerveja e bebidas destiladas e aqueles que o fazem frequentemente, nos resultados da escala da Reactividade Emocional. Também quando estudada a frequência com que o jovem refere ficar embriagado, constata-se que, na escala da Reactividade Emocional, existem diferenças entre os que nunca ficaram embriagados e os que ficaram frequentemente, mas também entre os que nunca ficaram e os que, mesmo que raramente, já estiveram embriagados. Por último, em relação à variável do consumo de drogas ilegais, ao longo da vida, foram encontradas diferenças significativas também relativamente às pontuações obtidas na escala da Reactividade Emocional. Ou seja, os que nunca beberam (cerveja ou bebidas destiladas) ou consumiram drogas, assim como os que referem nunca ter ficado embriagados, apresentam valores melhores (portanto mais baixos) na escala da Reactividade Emocional. Por outras palavras, estes resultados sugerem que quem bebe com frequência, quem já consumiu drogas ou quem já ficou embriagado, apresenta uma menor capacidade para regular os seus comportamentos e as suas emoções. Resumindo, parece existir uma relação entre ter uma maior resiliência e

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o menor consumo de substâncias, dadas as diferenças no consumo de álcool e drogas, em particular, na escala da Reactividade Emocional. Para além disso, estes resultados vão também ao encontro dos estudos de Dillon et al. (2007), tendo em conta que os que têm uma melhor pontuação na escala da Reactividade Emocional (indicador de resiliência) parecem evitar o consumo de substâncias. Em síntese, os valores de consistência interna obtidos foram considerados bons, com a excepção da subescala da adaptabilidade. As correlações entre as subescalas, entre si, foram altas, assim como as correlações entre as subescalas e as escalas nas quais estavam incluídas. Por último, diferenças foram encontradas nos resultados da escala da Reactividade Emocional quando se estuda o consumo de cerveja, o consumo de bebidas destiladas, a frequência com que os jovens referem ficar embriagados e o consumo de drogas ilegais ao longo da vida. Uma limitação a este estudo relaciona-se com a carência de uma amostra representativa da população adolescente portuguesa, uma vez que os jovens são apenas da região metropolitana de Lisboa. Desta forma, não é possível estabelecer uma norma para os resultados dos jovens submetidos à avaliação da resiliência com as escalas das ERA. Pelo que se sugere um estudo alargado com uma amostra representativa para, assim, construir uma referência normativa para os resultados. Referências Anaut, M. (2005). A Resiliência: Ultrapassar os traumatismos. Lisboa: Climepsi Editores. Becoña, E. (2007). Resiliencia y consumo de drogas: una revisión. Adicciones, 19(1), 89-101. Castillo J. G., & Dias, P. C. (2009). Auto-Regulação, Resiliência e Consumo de Substâncias na Adolescência: Contributos da Adaptação do Questionário Reduzido de Auto-Regulação. Psicologia, Saúde & doenças, 10(2), 205-216. Dillon, D., Chivite-Matthews, N., Grewal, I., Brown, R., Webster, S., Weddell, E., Brown, G., & Smith, N. (2007). Risk, protective factors and resilience to drug use: identifying resilient young people and learning from their experiences. London: Home Office. Fülöp, I., E. (2007). A confirmatory factor analysis of the attitudes and belief scale 2. Journal of Cognitive and Behavioral Psychotherapies, 7(2), 159-170. Guillevic, C., & Vautier, S. (1998). Diagnóstico e Testes Psicológicos. Lisboa: Climepsi Editores. Hambleton, R. K. (2005). Issues, Designs and Technical Guidelines for Adapting Tests into Multiple Languages and Cultures. In R. K. Hambleton, P. F. Merenda & C. D. Spielberg (Eds.), Adapting Educational and Psychological Tests for CrossCultural Assessment (pp. 3-38). New Jersey: Lawrence Erlbaum Associates. Hooper, D., Coughlan, J., & Mullen, M. R. (2008). Structural Equation Modelling: Guidelines for Determining Model Fit. The Electronic Journal of Business Research Journal of Child and Adolescent Psychology Revista de Psicologia da Criança e do Adolescente. Lisboa, 4(2) 2013

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Sílvia Filipe e Celeste Simões

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Avaliação da auto-compaixão em adolescentes: Adaptação e qualidades psicométricas da Escala de Auto-Compaixão Assessment of self-compassion in adolescents: Adaptation and psychometric properties of the Self-Compassion Scale

Marina Cunha

Instituto Superior Miguel Torga, Coimbra Centro de Investigação do Núcleo de Estudos e Intervenção Cognitivo-Comportamental (CINEICC), Universidade de Coimbra

Ana Xavier

Centro de Investigação do Núcleo de Estudos e Intervenção Cognitivo-Comportamental (CINEICC), Universidade de Coimbra

Inês Vitória Instituto Superior Miguel Torga, Coimbra

Contacto para correspondência: Marina Cunha Instituto Superior Miguel Torga Largo da Cruz de Celas, 1 3000-132 Coimbra E-mail: marina_cunha@ismt.pt

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Marina Cunha, Ana Xavier e Inês Vitória

Resumo: A auto-compaixão, entendida como uma estratégia de regulação emocional eficaz e adaptativa para lidar com pensamentos, sentimentos indesejados ou desagradáveis e acontecimentos de vida negativos ou dolorosos, tem sido associada ao bem-estar emocional e psicológico. O presente estudo tem como objetivo apresentar a versão para adolescentes da Escala de Auto-Compaixão (SCS-A) e as suas características psicométricas numa amostra de adolescentes portugueses com idades compreendidas entre os 12 e os 19 anos (M =16.03; DP = 1.87). Após o estudo de adaptação da escala para adolescentes, seguiu-se a análise das suas qualidades psicométricas. A SCS-A apresenta uma boa consistência interna para o total da escala (α = .85) e respetivas dimensões (α = .69 para a dimensão Auto-crítica, .70 para a dimensão Mindfulness, .71 para a dimensão Condição Humana, .73 para a dimensão Sobre-identificação, e .75 para as dimensões Isolamento e Calor/Compreensão), e uma adequada estabilidade temporal (r = .83). Evidenciou ainda uma validade convergente e divergente no sentido esperado, com medidas de memórias de calor e segurança, auto-criticismo, auto-tranquilização e indicadores psicopatológicos (ansiedade, depressão e stresse). Os resultados permitem concluir que a SCS-A é um instrumento fidedigno e útil para avaliar a auto-compaixão em adolescentes em contextos de investigação, educativos e clínicos. Palavras-chave: adolescência.

Auto-compaixão;

SCS;

propriedades

psicométricas;

Abstract: Self-compassion, viewed as a strategy of emotion regulation effective and adaptive to deal with unwanted or unpleasant thoughts and feelings, as well as negative or painful life events, has been linked to emotional and psychological wellbeing. This paper aims to present the adolescent version of the Self-Compassion Scale (SCS-A) and its psychometric properties in a sample of Portuguese adolescents with ages between 12 and 19 years old (M =16.03; SD = 1.87). Posterior to the adaptation study of the scale for adolescents, it was analysed its psychometric qualities. The SCS-A show a good internal consistency for total scale (α = .85) and respective dimensions (α = .69 for Self-Judgment, .70 for Mindfulness, .71 for Common Humanity, .73 for Over-Identification, and .75 for Isolation and Self-Kindness) and an adequate temporal stability (r = .83). The results also show a convergent and divergent validity in the expected direction with measures of early memories of warmth and safeness, self-criticism, self-reassuring and psychopathological indicators (depression, anxiety and stress). The results suggest that the SCS-A is a valid and reliable instrument to measure self-compassion in adolescents in research, educational and clinical contexts. Key-words: Self-compassion; properties; adolescence.

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SCS;

Portuguese

version;

psychometric

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Introdução A adolescência é caracterizada por rápidas e múltiplas alterações desenvolvimentais que interagem entre si, permitindo a maturação física, o desenvolvimento cognitivo, a emergência da sexualidade, o processo de autonomia, o aumento da influência de pares, a formação da identidade, a independência emocional (Steinberg, 2002; Wolfe & Mash, 2006). Este desenvolvimento torna o adolescente progressivamente mais consciente da representação de si, da visão dos outros e da relação eu-outros no contexto social. A formação da identidade, definida como uma conceção/perceção do eu relativamente estável e generalizável para diferentes situações (Nurmi, 2004) assume nesta fase desenvolvimental um papel relevante. Durante a transição para a adolescência, nas tarefas desenvolvimentais que lhe são inerentes, o jovem recebe feedback dos outros (e.g., pais, grupo de pares), particularmente, acerca dos acontecimentos negativos, erros e fracassos, o que requer um reajustamento dos seus objetivos, planos e pensamentos, com o intuito de lidar eficazmente com os próximos desafios desenvolvimentais (Lerner & Steinberg, 2009). Na verdade, a construção da identidade permite integrar e organizar a multiplicidade de pensamentos e sentimentos autorreferentes numa estrutura coerente (Nurmi, 2004).Trata-se, portanto, de um processo contínuo de autoavaliação e comparação social que ocorre, no contexto social, onde o adolescente vai procurar desempenhar papéis sociais para tentar estabelecer a sua autoidentidade e ocupar um lugar na hierarquia social (Gilbert & Irons, 2008). Nesta arena social surgem novas fontes de stresse para o adolescente, associadas ao desempenho académico, à imagem corporal, às preocupações com a atração sexual e à necessidade de ser aceite, aprovado e integrado no grupo de pares (e.g., popularidade e integração no grupo) (Gilbert & Irons, 2008; Neff & McGehee, 2010; Wolfe & Mash, 2006). Com efeito, os adolescentes tornam-se mais focados e orientados para a integração nos grupos de pares e para a competição por recursos e uma posição social (Gilbert & Irons, 2008). Neste contexto, o procurar desenvolver relações com os pares, a necessidade de ser aceite, aprovado e atrativo para os outros torna-se tão importante, que aumenta a comparação em relação aos outros em vários domínios (e.g., comparações negativas ou desfavoráveis) e o sentimento de vulnerabilidade à rejeição, à exclusão, às experiências de bullying e à manifestação de comportamentos de submissão, evitamento e apaziguamento (Gilbert & Irons, 2008; Irons & Gilbert, 2005). Neste sentido, o desenvolvimento de processos de regulação emocional adaptativos que possibilitem lidar de forma eficaz com estes novos desafios (que incluem muitas vezes sentimentos e experiências difíceis ou dolorosas, níveis elevados de stress) torna-se especialmente importante neste período de vida. Na cultura ocidental as atitudes psicologicamente saudáveis são frequentemente conceptualizadas em termos de auto-estima (Neff, 2004). Com efeito, a Psicologia do Desenvolvimento tem enfatizado a importância

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da autoestima, encorajando a comunidade científica, pais, professores e profissionais de saúde a promover a autoestima nos jovens. A autoestima é tipicamente definida como o modo como os indivíduos se avaliam a si próprios de acordo com padrões autorreferenciais ou normativos (Nurmi, 2004). Em 1890, William James (citado por Nurmi, 2004) definiu a autoestima como um produto da perceção de competência em áreas ou domínios considerados importantes. Os resultados dos estudos acerca da autoestima são contraditórios, na medida em que existem assunções de que uma autoestima elevada é sinónimo de sucesso, bom desempenho escolar e bem-estar, mas existem também autores que argumentam que os indivíduos com excessiva ênfase e avaliação deles próprios tendem a ser mais autocentrados e a apresentar níveis mais elevados de narcisismo, egoísmo e ausência de preocupação acerca dos outros (Baumeister, Campbell, Krueger, & Vohs, 2003; Baumeister, Smart, & Boden, 1996; Neff, 2003a; Neff & Vonk, 2009). A ênfase excessiva na autoestima pode, de facto, ser problemática, na medida em que a auto-estima baseia-se em avaliações de competências e do valor pessoal, o que aumenta a necessidade de se sentir superior aos outros e a competição social, apenas para se sentir bem consigo próprio. Esta tendência para se colocar numa posição superior em relação aos outros e colocar os outros numa posição inferior (i.e., a necessidade de se sentir superior aos outros: “mais popular, mais inteligente, mais atraente, mais valorizado, mais talentoso”), conduz ao aumento da distância e separação interpessoal, deteriorando a conexão e ligação aos outros (Neff, 2009; Neff & Vonk, 2009). Mais ainda, alguns estudos têm mostrado que uma elevada autoestima está associada a comportamentos agressivos, antissociais, violência, bullying (por exemplo, os agressores ou bullies sentemse bem consigo próprios quando agridem os outros) (Baumeister et al., 1996). Assim, a autoestima tende a flutuar (i.e., não é estável ao longo do tempo), na medida em que, por vezes, a avaliação do Eu é positiva ou até irrealista e, outras vezes, é negativa ou desfavorável (Neff, 2004). Com efeito, a tentativa de promover ou aumentar a autoestima nos adolescentes pode ser problemática e contra-produtiva (Neff, 2011; Neff & McGehee, 2010). Em contraste, existe uma outra forma de nos relacionarmos connosco próprios que não envolve autoavaliações do valor pessoal ou comparações sociais (positivas ou negativas/desfavoráveis), mas, ao invés disso, implica compaixão (Neff, 2009, 2011). A compaixão é um constructo que deriva do Budismo e do pensamento filosófico oriental e que tem vindo recentemente a ser alvo de interesse por parte do domínio da Psicologia (Gilbert, 2005; Neff, 2003a). A compaixão envolve ser contagiado pelo sofrimento dos outros, abrir a consciência ao sofrimento dos outros, não o evitando ou desconectando, o que permite a emergência de sentimentos calorosos para com os outros, bem como o desejo de aliviar o seu sofrimento (Gilbert, 2005; Neff, 2003a, 2003b). Quando a compaixão e as capacidades compassivas são dirigidas ao próprio, designa-se de auto-compaixão. De acordo com Neff (2003a, 2003b), baseandose na tradição Budista e na Psicologia Social, a auto-compaixão envolve três

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componentes principais que estão interligados e interagem reciprocamente: Calor/Compreensão versus Auto-crítica; sentimentos de Condição Humana versus Isolamento; e Mindfulness versus Sobre-identificação. A componente Calor/Compreensão refere-se à tendência para ser caloroso, amável e compreensivo com o próprio, em vez de ser duro, crítico ou julgador. Assim, perante falhas pessoais ou inadequações, esta capacidade compassiva implica ser caloroso, afetuoso, compreensivo e usar um tom de voz com uma tonalidade emocional de suporte e tranquilização dirigida a nós próprios (Neff, 2003a, 2003b, 2011). Ao contrário de ser duro e crítico para connosco próprios por ter fracassado ou cometido um erro, a auto-compaixão significa aceitar o facto de sermos seres humanos imperfeitos (Neff, 2003a, 2003b, 2011). O sentido de Condição Humana envolve reconhecer de que todas as pessoas falham, cometem erros e se sentem inadequadas em algumas situações (Neff, 2003a, 2003b, 2011). Neste sentido, a auto-compaixão integra a imperfeição como fazendo parte da condição humana e, portanto, partilhada por todos os seres humanos. Ao perspetivar as dificuldades da vida e o sofrimento como fazendo parte desta experiência humana, isso conduz a sentimentos de ligação e conexão aos outros, e minimiza a perceção ou os sentimentos de isolamento em relação aos outros (Neff, 2003a, 2003b, 2011). O terceiro componente da auto-compaixão diz respeito ao Mindfulness que significa estar consciente da experiência do momento presente, numa perspetiva equilibrada, na qual não há um envolvimento na supressão/evitamento (e.g., ignorar) ou ruminação dos aspetos não desejados do Eu ou da vida (Brown & Ryan, 2003; Neff, 2003a, 2003b, 2011). Envolve, assim, uma atitude de aceitação dos pensamentos e sentimentos dolorosos, sem haver uma identificação em demasia (ou sobre-identificação) com os mesmos (Hayes, Strosahl, & Wilson, 1999; Neff, 2003a, 2003b). Com o objetivo de avaliar a auto-compaixão, Kristin Neff (2003a) desenvolveu uma escala para medir estes três componentes da auto-compaixão em seis subescalas separadas (calor/compreensão versus auto-crítica, condição humana versus isolamento, e mindfulness versus sobre-identificação), sendo ainda possível obter uma pontuação total que representa o nível geral de autocompaixão dos indivíduos. No estudo de desenvolvimento e validação da Escala de Auto-Compaixão (Self-Compassion Scale; SCS; Neff, 2003a), a autora conduziu análises fatoriais confirmatórias (AFC) para cada componente da escala, tendo obtido elevadas inter-correlações entre as seis dimensões teóricas. A avaliação global do modelo foi analisada através de AFC para determinar a existência de um único fator de ordem superior a explicar estas intercorrelações entre os seis fatores. Os resultados sugerem que a auto-compaixão parece ser um fator de segunda ordem que emerge da combinação de diferentes componentes (Neff, 2003a). Para a escala total, os resultados mostram uma excelente consistência interna (α = .92) e uma boa estabilidade temporal (α = .93). As diversas subescalas evidenciam igualmente consistências internas adequadas, variando os seus valores entre .75

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e .81 (.78 para a subescala Calor/compreensão; .77 para a subescala Auto-crítica; .80 para a subescala Condição Humana; .79 para a subescala Isolamento; .75 para a subescala Mindfulness; .81 para a subescala Sobre-identificação). Relativamente à validade de constructo, os resultados mostram que a escala de auto-compaixão não se correlaciona significativamente com enviesamentos de desejabilidade social. No que respeita à validade convergente e divergente, a auto-compaixão apresenta uma associação negativa significativa com o autocriticismo e uma correlação positiva significativa com o sentimento de conexão/ ligação social (Neff, 2003a). Adicionalmente, a auto-compaixão encontra-se positiva e significativamente correlacionada com a inteligência emocional, em particular com as dimensões de clareza e reparação emocional, o que parece sugerir que as competências auto-compassivas estão associadas à capacidade para identificar, compreender e discriminar com clareza as emoções, assim como regular as emoções negativas (Neff, 2003a). A autora (Neff, 2003a) encontrou ainda que a auto-compaixão apresenta uma associação negativa e significativa com a ansiedade e a depressão e uma associação positiva e significativa com a satisfação com a vida. Diversos estudos têm mostrado que a auto-compaixão pode ser um processo adaptativo que aumenta a resiliência e o bem-estar (Neff, 2003a, 2003b; Wei, Liao, Ku, & Shaffer, 2011; Castilho, Pinto-Gouveia, & Duarte, 2013; Freitas, 2011), uma vez que os resultados têm mostrado que a auto-compaixão está associada a vários indicadores de funcionamento psicológico saudável (Neff, 2003a, 2003b; Neff, Kirkpatrick, & Rude, 2007; Neff, Rude, & Kirkpatrick, 2007). Em particular, os indivíduos com elevados níveis de auto-compaixão relatam maiores níveis de conexão e ligação social e menores níveis de auto-criticismo, depressão, ruminação, supressão de pensamento e ansiedade (Neff, 2003a, 2003b; Neff et al., 2007). Um estudo realizado por Neff, Hsieh, e Dejitterat (2005), sobre a autocompaixão e o fracasso no contexto académico, mostrou que a auto-compaixão está positivamente associada à obtenção de objetivos de mestria, cujo foco assenta no prazer da aprendizagem e no desejo de desenvolver novas competências, à motivação intrínseca e a estilos de coping adaptativos (Neff et al., 2005). Além disso, a auto-compaixão encontra-se associada a menores níveis de ansiedade e preocupação com o contexto académico e menor tendência à procrastinação (Williams, Stark, & Foster, 2008). Em síntese, a literatura empírica tem mostrado a importância da autocompaixão no bem-estar e saúde mental (Neff, 2003a, 2003b; Neff, Kirkpatrick, & Rude, 2007; Neff, Rude, & Kirkpatrick, 2007; Gilbert, 2009, 2010), em diversas populações (Castilho et al., 2013; Costa & Pinto-Gouveia, 2011; Gilbert & Irons, 2004, 2005; Freitas, 2011; Neely, Schallert, Mohammed, Roberts, & Chen, 2009) e em diversos contextos sociais (e.g., acontecimentos de vida negativos, contexto académico; Leary, Tate, Adams, Allen, & Hancock, 2007; Williams et al., 2008). Contudo, o constructo de auto-compaixão tem sido pouco estudado na adolescência, assistindo-se recentemente a um progressivo interesse pelo

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desenvolvimento de competências auto-compassivas nesta fase etária. A este respeito, Neff e McGehee (2010) realizaram um estudo que analisa a auto-compaixão numa amostra de adolescentes em comparação com um grupo de jovens adultos e os resultados evidenciam que os níveis de auto-compaixão são similares entre os adolescentes e os jovens adultos, não se verificando diferenças significavas entre os dois grupos. Para ambos os grupos, a autocompaixão é um preditor significativo da saúde mental, com os indivíduos mais auto-compassivos a reportarem menores níveis de depressão e ansiedade e maiores níveis de sentimentos de ligação/conexão social. Ainda no mesmo estudo, os autores (Neff & McGehee, 2010) encontraram que o suporte materno, o funcionamento familiar harmonioso, o estilo de vinculação seguro contribuem positiva e significativamente para predizer a auto-compaixão. Por outro lado, outra pesquisa (Tanaka, Wekerle, Schmuck, Paglia-Boak, & MAP Research Team, 2011), com um desenho longitudinal, que acompanhou adolescentes abrangidos por uma medida de proteção infantil ao longo de 6 a 24 meses, mostra que os maus-tratos infantis (em particular, abuso físico e emocional e negligência emocional) estão significativamente associados com baixos níveis de auto-compaixão nos adolescentes. Adicionalmente, os adolescentes com baixos níveis de auto-compaixão tendem a apresentar uma vulnerabilidade aumentada para o sofrimento psicológico, problemas de abuso de álcool ou tentativas de suicídio, quando comparados com os indivíduos com níveis mais elevados de auto-compaixão (Tanaka et al., 2011). Na mesma linha de investigação, o estudo de Vettese, Dyer, Li, e Wekerle (2011) mostra que a auto-compaixão é um mediador significativo na relação entre a história de maus-tratos na infância e as dificuldades na regulação emocional em adolescentes. Estes resultados parecem sugerir que a auto-compaixão é um potencial fator atenuante ou moderador do impacto de experiência precoces de maus-tratos (e.g., abuso físico, sexual, emocional) nas dificuldades posteriores de regulação das emoções (Vettese et al., 2011). A par destes diversos estudos empíricos, têm surgido propostas de intervenção terapêutica com vista ao desenvolvimento de competências de autocompaixão, como é o caso do Treino da Mente Compassiva (Gilbert, 2000, 2005, 2009, 2010; Gilbert & Irons, 2005), com importantes implicações ao nível do bemestar psicológico e interpessoal (Gilbert & Irons, 2004; Gilbert & Procter, 2006). Tem sido igualmente apontado por vários autores a pertinência de desenvolver abordagens focadas na auto-compaixão para a população de adolescentes (Gilbert & Irons, 2008; Neff & McGehee, 2010) e, em particular, para jovens com comportamentos auto-lesivos não suicidários (e.g., comportamentos de autodano; Vliet & Kalnins, 2011). Concluindo, os estudos mencionados sugerem que a auto-compaixão pode ser entendida como uma estratégia de regulação emocional eficaz e adaptativa, na medida em que perante acontecimentos de vida negativos/perturbadores (por exemplo, experiências de fracasso/erro, vergonha, bullying) os sentimentos

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indesejados, dolorosos ou desagradáveis não são evitados nem são perpetuados através de atitudes auto-críticas, mas, em vez disso, são encarados como fazendo parte da experiência humana através de uma atitude de aceitação, compassiva e não julgadora (Neff, 2003a; Neff & McGehee, 2010). Com efeito, o aumento destas competências ao longo do desenvolvimento, sobretudo na adolescência, é extremamente importante para lidar com tarefas desenvolvimentais stressantes, conduzindo a comportamentos pró-ativos para promover e manter o bem-estar, assim como aumentar a resiliência e o ajustamento psicológico (Metzler et al., 2000; Neff, 2003a, 2003b; Neff & McGehee, 2010; Singh et al., 2007). O objetivo principal do presente artigo é estudar a versão da Escala de AutoCompaixão para adolescentes. Para tal, pretende-se analisar as suas características psicométricas numa amostra de adolescentes, examinado a qualidade dos itens, a consistência interna, a estabilidade temporal, as diferenças de género e a validade convergente e divergente deste instrumento usando medidas de auto-criticismo, memórias de calor e segurança e de sintomas de psicopatologia (ansiedade, depressão e stresse). Método Participantes A amostra é constituída por 838 alunos de escolas públicas situadas na região do centro do país. Na definição da nossa amostra, foram tidos em conta os seguintes critérios de inclusão: a) alunos a frequentarem o 3º ciclo do ensino básico e secundário ou equivalente; b) idades iguais ou superiores a 12 e inferiores ou iguais a 19 anos; c) preenchimento completo dos instrumentos; e c) não evidência clara de dificuldades de compreensão, perturbadoras do correto preenchimento dos instrumentos de medida. Fizeram parte da amostra 465 rapazes (55.5%) e 373 raparigas (44.5%), com uma média de idades de 16.03 anos (DP = 1.87) e uma média de anos de escolaridade de 9.97 (DP = 1.61). Os rapazes apresentam uma média de idades (M = 16.16) significativamente mais elevada, t(836) = 2.18, p = .030, que as raparigas (M = 15.88), não se diferenciando relativamente aos anos de escolaridade, t(836) = -.084, p =.399. Instrumentos A Escala de Auto-Compaixão (Self-Compassion Scale – SCS; Neff, 2003a; adaptação para adolescentes por Pinto-Gouveia, Cunha, Xavier, & Castilho, 2011) pretende medir a auto-compaixão entendida como a capacidade para tolerar o sofrimento com uma atitude calorosa e de aceitação. Esta escala é composta por 26 itens divididos em 6 subescalas: (i) Calor/Compreensão (5 itens); (ii) Isolamento (4 itens); (iii) Condição humana (4 itens); (iv) Auto-crítica (5 itens); (v)

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Mindfulness (4 itens); e (vi) Sobre-Identificação (4 itens). Os sujeitos, tendo em conta a pergunta inicial “Como é que, habitualmente, me comporto em momentos difíceis?”, são solicitados a responder a cada item de acordo com uma escala de resposta de 5 pontos (1 = “quase nunca”; 5 = “quase sempre”). As pontuações para cada subescala derivam da média da soma dos itens que a compõem. Para o total da escala, as subescalas Isolamento, Auto-crítica e Sobre-identificação são cotadas inversamente, de forma a que a pontuações mais elevadas correspondem elevados níveis de auto-compaixão. A versão portuguesa da Escala de AutoCompaixão (Castilho & Pinto-Gouveia, 2011a), aplicada a adultos revelou uma adequada consistência interna, quer para o total da escala (α =.89), quer para as subescalas, cujos valores variaram entre .78 e .84. A estabilidade temporal revelou-se adequada (r = .78) após um intervalo temporal de 4 semanas. A Escala de Memórias Precoces de Calor e Segurança para Adolescentes (EMWSS-A; Early Memories of Warmth and Safeness Scale; Richter, Gilbert, & McEwan, 2009; adaptação Portuguesa por Matos, Pinto-Gouveia, & Duarte, 2012; adaptação portuguesa para adolescentes por Cunha, Xavier, Martinho, & Matos, 2013) é um instrumento originalmente desenvolvido para avaliar a recordação de sentimentos de calor, segurança e afeto na infância, ou seja, as memórias emocionais positivas. Esta escala foi adaptada para a população portuguesa de adolescentes (Cunha et al., 2013) e pretende avaliar a recordação de experiências da infância caracterizadas por sentimentos de afeto, calor, tranquilização, segurança e ligação/conexão aos outros. Trata-se de uma escala unidimensional, composta por 21 itens. Para cada item é solicitado aos sujeitos que respondam, de acordo com uma escala de 5 pontos, a frequência com que cada frase se aplica a si, durante a infância (0 = “Não, nunca”; 4 = “Sim, a maior parte do tempo”). As pontuações mais elevadas correspondem a mais memórias emocionais positivas de calor, tranquilização e segurança. No estudo da versão original aplicada numa amostra de adultos, os autores (Richter et al., 2009) obtiveram uma excelente consistência interna (α = .97). Na versão portuguesa da escala para adolescentes (EMWSS-A; Cunha et al., 2013), os resultados indicam uma excelente consistência interna (α = .95) e estabilidade temporal (r = .92). No presente estudo, a escala revelou igualmente um alfa de Cronbach de .92, indicador de uma boa fidedignidade. A Escala das Formas de Auto-Criticismo e de Auto-Tranquilização (FSCRS – Forms of self-criticizing/attacking and self-reassuring scale; Gilbert, Clarke, Hempel, Miles, & Irons, 2004; Castilho & Pinto Gouveia, 2011b) pretende avaliar em que medida o indivíduo se auto-crítica/ataca ou, pelo contrário, se reconforta/tranquiliza, em situações de fracasso (e.g., “quando as coisas lhe correm mal”). Esta escala é constituída por 22 itens, com uma escala de resposta de 5 pontos (0 = “não sou assim” e 4 = “sou extremamente assim”). Esta medida é composta por três fatores: (1) o Eu Inadequado, que avalia a sensação de inadequação do Eu perante fracassos e recuos; (2) o Eu Detestado, que mede um sentimento de autorrepugnância/ódio e uma resposta destrutiva perante

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fracassos, caracterizada por uma perseguição agressiva com o intuito de se magoar a si próprio; e (3) o Eu Tranquilizador, que avalia a capacidade do Eu para se tranquilizar, reconfortar e acalmar perante experiências de fracasso. No estudo original (Gilbert et al., 2004) foram encontrados os seguintes valores de alfa de Cronbach: .90 para a subescala Eu Inadequado e .86 para as subescalas Eu Tranquilizador e Eu Detestado. No presente estudo verificaram-se bons índices de consistência interna para as diferentes formas de auto-criticismo, nomeadamente obtiveram-se alfas de Cronbach de .84 para o Eu Inadequado, .77 para o Eu Detestado e .84 para o Eu Tranquilizador. A Escala de Ansiedade, Depressão e Stresse (EADS-21; Lovibond & Lovibond, 1995; Pais-Ribeiro, Honrado, & Leal, 2004) é uma escala de autorresposta constituída por 21 itens que avaliam três dimensões de sintomas psicopatológicos: depressão, ansiedade e stresse. A versão de 21 itens foi desenvolvida selecionando os itens com saturações fatoriais elevadas da versão de 42 (Lovibond & Lovibond, 1995). Na EADS-21 os itens indicam uma valência emocional negativa e são respondidos de acordo com uma escala de resposta do tipo Likert de 4 pontos (0 = “nada”; 3 = “sempre”) relativamente ao modo como o indivíduo se tem sentido nas últimas semanas. Assim, as pontuações para cada subescala são determinadas pela soma dos resultados dos sete itens, podendo variar entre o mínimo de “0” e o máximo de “21”, correspondendo as notas mais elevadas a estados afetivos mais negativos. Na versão portuguesa de 21 itens (Pais-Ribeiro et al., 2004) os resultados mostram alfas de Cronbach de .85 para a subescala depressão, .74 para a subescala ansiedade e .81 para a subescala stresse. No presente estudo também se verificaram bons índices de consistência interna, especificamente para a dimensão depressão o alfa de Cronbach foi de .83, para a dimensão ansiedade foi de .84 e para a dimensão stresse foi de .79. Procedimentos Uma vez que a Escala de Auto-Compaixão nunca tinha sido aplicada adolescentes, houve necessidade de adaptar a versão portuguesa estudada em adultos (Castilho & Pinto-Gouveia, 2011a). Conceptualmente a escala é a mesma que para os adultos. Contudo, tendo em conta as idades dos participantes, os itens foram revistos para serem compreensíveis para este grupo. Assim, a análise e discussão crítica dos itens, que envolveu os autores e um grupo de adolescentes, conduziu à modificação da formulação de alguns itens de modo a que a validade de conteúdo de cada item se mantivesse mas se tornasse mais facilmente compreensível. As diferenças consistem na inclusão, à frente de alguns itens (itens 5 e 12) de um exemplo/frase que ajude a esclarecer o sentido do item, bem como na substituição de palavras ou expressões por outras mais simples (e.g., “tendo” foi substituído por “tenho tendência”; “sinto-me mais separado” por “sinto-me à parte”). No caso das instruções, foi também alterada a utilização da terceira para a segunda pessoa do singular, facilitando uma linguagem mais amigável e menos

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formal, bem como foi alterado o formato da escala de forma a tornar mais claro e facilitado o preenchimento da mesma. Assumimos uma perspetiva conservadora que se propunha respeitar a perspetiva teórica subjacente ao desenvolvimento desta escala, pelo que mantivemos a estrutura original da escala. Assim, inspecionámos as relações entre itens e dimensões, reproduzindo os procedimentos dos estudos anteriores desde o original até à versão de adaptação portuguesa. A versão final, que denominámos, Escala de Auto-Compaixão para Adolescentes (SCS-A) é constituída por seis subescalas ou dimensões. Previamente à recolha de dados obteve-se a autorização por parte dos conselhos executivos de cada escola, bem como dos encarregados de educação dos alunos. A participação foi informada, voluntária, anónima, tendo sido assegurados os princípios éticos de investigação. Os questionários foram respondidos, individualmente, em contexto de sala de aula, na presença do investigador. Para o tratamento estatístico recorreu-se ao Software PASW (Predictive Analytics Software, versão 20, SPSS, Chicago, IL, USA). Relativamente aos procedimentos estatísticos utilizados, optámos por referi-los à medida que os resultados vão sendo apresentados. Resultados Análise preliminar dos dados As análises preliminares dos dados consistiram na avaliação da normalidade das variáveis através do teste Kolmogorov-Smirnov e da análise dos valores de assimetria (Sk) e de achatamento (Ku). De acordo com o teste de KolmogorovSmirnov, a pontuação total da escala de auto-compaixão não apresenta uma distribuição normal (K-S, p ≤.001). Contudo, segundo Kline (2005) os valores de assimetria e de achatamento (-1.81 e -0.96, respetivamente) não representam um enviesamento sério ou comprometedor à distribuição normal (|Sk |< 3 e |Ku| < 8-10), pelo que foram utilizados testes paramétricos dada a robustez que apresentam face a violações da normalidade das variáveis (Maroco, 2010). A análise da existência de observações extremas foi feita através da representação gráfica dos resultados (Diagrama de Extremos e Quartis – Box Plot), tendo-se decidido pela manutenção dessas observações, por não interferirem com as análises estatísticas realizadas (Tabachnick & Fidell, 2007). Caracterização das variáveis de auto-compaixão Foram utilizadas medidas de tendência central (média, mediana), de localização (quartis) e de dispersão (desvio-padrão) com o objetivo de caracterizar as variáveis em estudo. Na Tabela 1 são apresentadas as estatísticas descritivas do total da escala da auto-compaixão e das respetivas subescalas ou dimensões.

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Os resultados mostram que os valores para o total e subescalas variam entre o mínimo de 1 e o máximo de 5. Para o total da escala a média obtida nesta amostra para a Escala de Auto-Compaixão para Adolescentes é de 3.07 (DP = 0.52). Este resultado é similar àquele encontrado por Neff e McGehee (2010) para a escala total de auto-compaixão numa amostra de adolescentes (N = 235; M = 2.97; DP = 0.62). No presente estudo, a dimensão de Mindfulness é a que revela a média mais alta (M = 3.15; DP = 0.77) e a subescala de Sobre-identificação é a que obtém um valor médio mais baixo (M = 2.91; DP = 0.89). Tabela 1. Médias, desvios-padrão, medianas, valores mínimos, máximos e percentis para a amostra total (N = 838) M

DP

Mediana

Mínimo

Máximo

Percentis 25

50

75

SCS-A Total

3.07

0.52

3.08

1

5

2.81

3.08

3.38

Calor/compreensão

3.00

0.77

3.00

1

5

2.60

3.00

3.40

Condição Humana

3.13

0.80

3.25

1

5

2.50

3.25

3.75

Mindfulness

3.15

0.77

3.00

1

5

2.75

3.00

3.75

Auto-Crítica

2.96

0.76

3.00

1

5

2.40

3.00

3.40

Isolamento

2.94

0.90

3.00

1

5

2.25

3.00

3.75

5

2.25

3.00

3.50

0.89 3.00 1 Sobre-identificação 2.91 Nota. SCS-A = Escala de Auto-Compaixão para Adolescentes

Influência das variáveis sexo, idade e anos de escolaridade Para analisar o papel das variáveis sociodemográficas sobre a autocompaixão (total) foram determinados os coeficientes de correlação de Pearson (para a idade e anos de escolaridade) e correlação bisserial por pontos, no caso da variável sexo. A auto-compaixão (total) não se mostrou correlacionada com a idade (r = -.00, p > .05), nem com os anos de escolaridade (r = -.02, p >.05). Já em relação ao sexo, a correlação bisserial por pontos indicou uma associação significativa com o valor total de auto-compaixão (r = -.15; p = .001). Para localizar as diferenças foram realizados testes t de Student para o total da escala e respetivas subescalas. Na Tabela 2 são apresentadas as médias, os desvios padrão e os testes t de Student em função do sexo. Os resultados mostram que as raparigas apresentam valores totais de auto-compaixão mais baixos (M = 2.99; DP = 0.58), comparativamente aos rapazes (M = 3.14; DP = 0.45), sendo esta diferença significativa, t(695.579) = 4.139; p < .001. Analisadas as diferenças nas seis subescalas que a compõem, verifica-se que as raparigas evidenciam valores significativamente mais baixos de mindfulness, t(836) = 2.166, p = .031, e valores mais elevados de auto-crítica, t(836) = -3.852, p < .001, de isolamento, t(753.989) = -4.423, p < .001, e de sobre-identificação, t(763.713) = -5.718, p < .001.

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Tabela 2. Diferenças entre rapazes e raparigas nos valores médios obtidos no total e subescalas da SCS-A (N = 838) Rapazes (n = 465)

Raparigas (n = 373)

M

DP

M

DP

t

p

SCS-A Total

3.14

0.45

2.99

0.58

4.139

.000

Calor/compreensão

3.02

0.74

2.96

0.81

1.074

.283

Condição Humana

3.09

0.81

3.18

0.79

-1.605

.109

Mindfulness

3.20

0.74

3.09

0.80

2.166

.031

Auto-crítica

2.87

0.73

3.07

0.79

-3.852

.000

Isolamento

2.82

0.85

3.10

0.95

-4.423

.000

Sobre-identificação

2.75

0.84

3.10

0.92

-5.718

.000

Nota. SCS-A = Escala de Auto-Compaixão para Adolescentes

Análise dos itens e consistência interna O estudo da qualidade dos itens que constituem cada uma das seis subescalas foi feito através da correlação do item com os respetivos totais (Maroco, 2010; Tabachnick & Fidell, 2007). A Tabela 3 indica para cada fator da escala, os itens que o constituem, as médias, os desvios-padrão e a correlação corrigida entre o item e total do fator, bem como o α de Cronbach se o item fosse excluído. Por último, são também apresentados os α de Cronbach para o total da Escala de Auto-compaixão e respetivas subescalas. Tabela 3. Propriedade dos itens dos fatores da Escala de Auto-Compaixão para adolescentes (SCS- A) (N = 838) Item Versão Portuguesa SCS – Adolescentes

DP

r Item α Cronbach Total

5.Tento ser afetuoso(a) comigo próprio(a) quando estou a sofrer (ex., fazer ou dizer algo que seja reconfortante para 3.04 mim).

1.15

.494

.72

12. Quando atravesso um momento verdadeiramente difícil na minha vida, sou compreensivo(a) e afetuoso(a) comigo 3.03 mesmo(a).

1.12

.579

.67

19.Sou tolerante e afetuoso(a) comigo mesmo, quando 2.93 experiencio sofrimento.

1.04

.565

.69

23.Sou tolerante com os meus erros e inadequações.

2.89

1.03

.473

.72

26.Tento ser compreensivo(a) e paciente em relação aos 3.10 aspetos da minha personalidade de que não gosto.

1.08

.484

.72

1.03

.429

.68

M

Calor/Compreensão (α = .75)

Condição Humana (α = .71) 3.Quando as coisas me correm mal, vejo as dificuldades como 3.46 fazendo parte da vida, e pelas quais toda a gente passa

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7. Quando estou “em baixo” lembro-me que existem muitas 2.92 outras pessoas no mundo que se sentem como eu.

1.20

.565

.59

10. Quando me sinto inadequado(a) ou fracassado(a) de alguma forma, tento lembrar-me que a maioria das pessoas, 2.75 por vezes, também sente o mesmo.

1.09

.562

.60

15.Tento ver os meus erros e falhas como fazendo parte da 3.40 condição humana (os humanos erram).

1.08

.413

.69

9. Quando alguma coisa me aborrece ou entristece, tento manter o meu equilíbrio emocional (controlo as minhas 3.42 emoções).

1.12

.421

.67

14.Quando alguma coisa dolorosa acontece tento ter uma 3.18 visão equilibrada da situação.

1.00

.550

.59

17.Quando falho em alguma coisa importante para mim, 3.16 tento analisar as coisas sem dramatizar.

1.07

.516

.61

22.Quando me sinto “em baixo” tento olhar para os meus sentimentos com curiosidade e abertura (isto é, sem os julgar 2.86 ou os tentar afastar.

1.04

.441

.66

1.Desaprovo-me e faço julgamentos acerca dos meus erros e 3.26 preocupações

0.96

.328

.68

8.Quando passo por tempos difíceis tenho tendência a ser 3.06 muito exigente e duro(a) comigo mesmo(a).

1.18

.496

.62

11. Sou intolerante e pouco paciente em relação aos aspetos 2.80 de minha personalidade de que não gosto

1.18

.479

.63

16.Quando vejo aspetos de mim próprio(a) que não gosto, 2.82 fico muito “em baixo”.

1.18

.402

.66

21.Posso ser bastante frio(a) e duro(a) comigo mesmo(a) 2.86 quando experiencio sofrimento

1.19

.520

.61

4.Quando penso acerca das minhas inquietações e defeitos, 3.04 sinto-me mais à parte e desligado(a) do resto do mundo.

1.19

.448

.75

13.Quando me sinto “em baixo” tenho tendência para achar que a maioria das pessoas é, provavelmente, mais feliz do 2.93 que eu.

1.23

.602

.67

18.Quando me sinto com muitas dificuldades, tenho tendência a pensar que, para as outras pessoas, as coisas são 2.86 mais fáceis.

1.13

.571

.68

25.Quando falho nalguma coisa importante para mim, tenho 2.93 tendência a sentir-me sozinho(a) no meu fracasso.

1.22

.580

.68

2.Quando me sinto “em baixo” tenho tendência a ficar agarrado(a) e a ficar obcecado(a) com tudo aquilo que está 2.87 errado.

1.23

.545

.66

6. Quando falho em alguma coisa que é importante para mim, 2.79 torturo-me com sentimentos de inadequação (fracasso).

1.30

.506

.68

Mindfulness (α = .70)

Autocrítica (α = .69)

Isolamento (α = .75)

Sobre-identificação (α = .73)

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20.Quando alguma coisa me aborrece ou entristece, deixo-me 3.15 levar pelos meus sentimentos

1.13

.512

.68

24.Quando alguma coisa dolorosa acontece, tenho tendência 2.82 a exagerar a sua importância.

1.14

.526

.67

SCS-A Total (α = .85)

No que concerne à qualidade dos itens da Escala de Auto-Compaixão para adolescentes, como se pode verificar na Tabela 3, todos os itens apresentam correlações item-total superiores ou iguais a .3, o que indica que os itens contribuem consistentemente para a medida global de auto-compaixão. O coeficiente de alfa de Cronbach obtido para a escala total (α = .85) é indicador de uma boa consistência interna (Maroco, 2010; Tabachnick & Fidell, 2007). Em relação às seis dimensões teóricas que a compõem, verifica-se igualmente uma adequada consistência interna: .75 para a subescala Calor/Compreensão; .71 para a subescala Condição Humana; .70 para a subescala Mindfulness; .69 para a subescala Auto-crítica; .75 para a subescala Isolamento; .73 para a subescala Sobre-identificação. Adicionalmente, todos os itens contribuem para a consistência interna da escala da versão portuguesa para adolescentes, na medida em que a remoção de algum item não incrementaria a consistência interna. Fidelidade teste-reteste Para analisar a estabilidade temporal da SCS-A foi necessário administrá-la em dois momentos diferentes, com um intervalo de três semanas, a um grupo de adolescentes (N = 25), obtendo-se o coeficiente de correlação de r de Pearson de .83, o que sugere uma boa estabilidade temporal do instrumento (Maroco, 2010). Validade Convergente e Divergente Uma vez que os resultados anteriores mostraram uma influência do sexo sobre o total da auto-compaixão, foram realizadas correlações de Pearson para explorar a relação entre a escala total da auto-compaixão (SCS-A), as memórias de calor e segurança (EMWSS-A), as formas de auto-criticismo (FSCRS) e a sintomatologia depressiva, de ansiedade e stresse (EADS-21), controlando o efeito da variável sexo (rapaz versus rapariga) (Pallant, 2005; cf. Tabela 4).

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Tabela 4. Correlações (Pearson two-tailed), controlando o sexo, entre a auto-compaixão (N=838), as memórias de calor e segurança (N = 651), o autocriticismo (N = 178) e a sintomatologia depressiva, de ansiedade e stresse (N = 838) Rapazes (n = 465)

Raparigas (n = 373)

Total de Auto-Compaixão (SCS-A) Memórias emocionais positivas Memórias de calor e segurança (EMWSS-A)

.39*

.44*

Eu inadequado (FSCRS)

-.46*

-.49*

Eu detestado (FSCRS)

-.37*

-.45*

Eu tranquilizador (FSCRS)

.28*

.48*

Depressão (EADS-21)

-.44*

-.46*

Ansiedade (EADS-21)

-.28*

-.36*

Stresse (EADS-21)

-.39*

-.48*

Auto-Criticismo

Psicopatologia

Nota.*p ≤ .001. SCS-A = Escala de Auto-Compaixão para Adolescentes; EMWSS-A = Escala de Memórias de Calor e Segurança para Adolescentes; FSCRS = Escala das Formas de Auto-Criticismo e Auto-Tranquilização; EADS-21 = Escalas de Ansiedade, Depressão e Stresse.

Os resultados mostram que, relativamente às memórias precoces de calor e segurança, existe uma associação positiva e significativa com a auto-compaixão para os rapazes (r = .39, n = 330, p < .001) e para as raparigas (r = .44, n = 321, p < .001). Por outras palavras, quanto mais memórias emocionais positivas os jovens apresentam, maior é o nível de auto-compaixão. No que toca às formas de auto-criticismo, verifica-se uma correlação negativa significativa entre a auto-compaixão e o eu inadequado, e o eu detestado, para os rapazes (r = -.46, n = 130, p < .001; r = -.37, n = 130, p < .001, respetivamente) e para as raparigas (r = -.49, n = 48, p < .001; r = -.45, n = 48, p < .001, respetivamente). Estes resultados indicam que quanto maior for a auto-compaixão, menor será a tendência para o jovem se auto-criticar. Já em relação ao Eu Tranquilizador, a auto-compaixão evidencia uma associação positiva significativa quer para os rapazes (r =.28, n = 130, p = .001) quer para as raparigas (r = .48, n = 48, p = .001), mostrando que valores elevados de auto-compaixão estão associados a níveis elevados de sentimentos de tranquilização e acalmia dirigidos ao eu. Por último, relativamente à psicopatologia, verificam-se correlações negativas significativas entre a auto-compaixão e os sintomas depressivos (rapazes: r = -.44, n = 465, p < .001; raparigas: r = -.46, n = 373, p < .001) , de ansiedade (rapazes: r = -.28, n = 465, p < .001; raparigas: r = -.36, n = 373, p < .001) e stresse (rapazes: r = -.39, n = 465, p < .001; raparigas: r = -.48, n = 373, p < .001).

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Desta forma, níveis elevados de auto-compaixão estão associados a baixos níveis de sintomatologia depressiva, ansiosa e stresse. Discussão e Conclusões O presente estudo tem como objetivo apresentar a versão portuguesa da Escala de Auto-Compaixão (SCS) e as suas características psicométricas quanto à fidedignidade, dimensionalidade, validade convergente e divergente, numa amostra de adolescentes portugueses com idades compreendidas entre os 12 e os 19 anos. O primeiro passo consistiu no processo de adaptação da escala a adolescentes, o que implicou a reformulação de alguns itens e alterações nas instruções de preenchimento da escala de forma a ser mais compreensível pelos jovens a que se destinam. Seguiu-se o estudo das qualidades psicométricas desta versão adequada a adolescentes. Os resultados das análises descritivas mostram valores médios para o total da escala semelhantes aos indicados por Neff e McGehee (2010) no seu estudo com adolescentes (M = 2.97; DP = 0.52). Comparando os valores médios das subescalas entre si, constatamos que os adolescentes portugueses apresentam, em média, níveis mais elevados de competências mindfulness e menores níveis de sobre-identificação com os pensamentos e sentimentos dolorosos. Isto sugere que, nesta amostra, os adolescentes tendem a estar conscientes da experiência do momento presente, numa perspectiva equilibrada e descentrada, não reagindo aos pensamentos e sentimentos negativos ou indesejados que surgem acerca do próprio ou da sua vida (i.e., não dramatizam ou exageram). Na leitura destes dados há que ter em conta que se trata de uma amostra da comunidade, onde possivelmente a presença de psicopatologia é esbatida, podendo assim explicar a o predomínio de dimensões positivas ou adaptativas sobre as dimensões negativas avaliadas pela escala de auto-compaixão. Relativamente à influência de variáveis sociodemográficas (género, idade, escolaridade), apenas o género mostrou uma associação positiva, exibindo as raparigas menores níveis de auto-compaixão, comparativamente aos rapazes. Em particular, as raparigas manifestam, por um lado, menores competências em estar consciente da experiência do momento presente, numa perspetiva equilibrada e mindful, e, por outro lado, envolvem-se mais numa atitude auto-crítica, avaliativa e de julgamento, experienciam maiores sentimentos de isolamento e manifestam uma maior sobre-identificação com os pensamentos e sentimentos indesejados ou dolorosos. A revisão da literatura a este respeito evidencia resultados mistos, ou seja, nem sempre é clara a influência do género. Contrariamente aos nossos resultados, Neff e McGehee (2010) não encontraram diferenças significativas entre os sexos no total de auto-compaixão numa amostra de adolescentes.

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Contudo, noutros estudos realizados com adultos (Neff, 2003a; Vettese et al., 2011), as mulheres reportaram maiores níveis de auto-crítica, isolamento e sobreidentificação, e menores níveis de mindfulness, em comparação com os homens, padrão semelhante ao dos nossos dados. A versão da SCS nesta amostra de adolescentes apresenta valores adequados de consistência interna para o total e subescalas, o que indica a boa fidedignidade deste instrumento de medida. A estabilidade temporal foi avaliada num intervalo de três semanas, revelando igualmente um valor elevado. Estes resultados são semelhantes aos encontrados noutros estudos (Castilho & Pinto-Gouveia, 2011a; Neff, 2003a). Quanto à validade convergente e divergente, os resultados das correlações, controlando a variável sexo, mostram que os jovens com elevados níveis de auto-compaixão apresentam menores níveis de auto-criticismo focado nos erros e inadequações do Eu (Eu Inadequado) e focado em sentimentos de autorrepugnância/ódio em relação ao Eu (Eu Detestado). Além disso, os adolescentes que reportam níveis elevados de auto-compaixão apresentam mais competências para se auto-tranquilizarem, auto-reconfortarem e acalmarem perante situações de erro ou fracasso (Eu Tranquilizador). Mais ainda, os jovens com elevados níveis de auto-compaixão reportam mais memórias precoces de calor, segurança, afeto e ligação com figuras significativas. Estes resultados são suportados pela literatura que demonstra que os indivíduos de ambientes precoces seguros, emocionalmente calorosos e afetuosos parecem ser mais capazes de se relacionarem consigo próprios de um modo mais caloroso e compassivo (Gilbert & Irons, 2004; Gilbert & Procter, 2006). De facto, o suporte materno, o funcionamento familiar harmonioso e a vinculação segura são preditores significativos de níveis elevados de auto-compaixao nos adolescentes (Neff & McGehee, 2010). Pelo contrário, os indivíduos com experiências precoces caracterizadas pelo criticismo, abuso (emocional, físico ou sexual), negligência, frieza emocional, ameaça, insegurança manifestam uma tendência mais autocrítica dirigida aos seus erros, inadequações ou situações de vida difíceis (Gilbert & Procter, 2006) e apresentam maiores dificuldades em desenvolver uma atitude compassiva dirigida ao Eu (Castilho & Pinto-Gouveia, 2011a; Gilbert et al., 2004; Neff & McGehee, 2010; Tanaka et al., 2011; Vettese et al., 2011). Relativamente aos sintomas de psicopatologia, os dados obtidos indicam que os jovens, que apresentam uma atitude compassiva perante situações difíceis, manifestam uma menor tendência para experienciar sintomas depressivos, ansiosos e de stresse, o que é corroborado por diversas investigações (Freitas, 2011; Gilbert, 2009, 2010; Neff, 2003a, 2003b; Neff et al., 2007; Neff & McGehee, 2010). Os resultados do presente estudo vão de encontro ao que era esperado, reforçando, assim, a validade e a fidedignidade desta escala. Os nossos dados permitem dizer que quanto maior a auto-compaixão nos adolescentes, menores são os níveis de auto-criticismo, de sintomas de ansiedade, depressão e stresse, bem como maior é a competência de auto-tranquilização e o nível de memórias emocionais positivas.

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Tendo em conta a evidência empírica sobre a relevância da autocompaixão na saúde mental e bem-estar dos indivíduos, têm sido desenvolvidas diversas intervenções terapêuticas focadas no ensino da compaixão e aptidões relacionadas (e.g., Dialectical Behaviour Therapy: Linehan, 1993; Compassionfocused Therapy: Gilbert, 2009), reforçando, assim, a necessidade de uma medida de avaliação válida e fidedigna. Por outro lado, como vimos na revisão da literatura, grande parte dos estudos tem sido realizada com adultos, existindo ainda poucos dados sobre a adolescência, embora bastante promissores. Neste sentido, o presente trabalho pretende contribuir para a avaliação psicológica na adolescência, disponibilizando um instrumento válido para esta faixa etária, atestando as qualidades psicométricas da escala de auto-compaixão. Com efeito, a avaliação da auto-compaixão poderá ser útil não só no domínio de investigação mas também em contextos educativos e clínicos. Neste estudo devem ser tidas em consideração algumas limitações. Uma das limitações prende-se com o facto de os dados serem retirados de uma amostra da comunidade, o que questiona a representatividade e generalização dos resultados, sendo necessário a replicação deste estudo em amostras mais diversificadas do ponto de vista geográfico. No entanto, este estudo constitui uma primeira abordagem das qualidades psicométricas desta escala e parece ser importante que estudos futuros analisem a sua estrutura fatorial, recorrendo a uma Análise Fatorial Confirmatória, a fim de assegurar uma continuidade do trabalho focando a validade deste instrumento. Futuras investigações poderiam ainda analisar o comportamento desta escala em amostras clínicas. Concluindo, apesar das limitações mencionadas, os resultados deste estudo sugerem que a versão portuguesa para adolescentes da Escala de Auto-Compaixão é um instrumento útil e válido para avaliar o constructo de auto-compaixão e as dimensões que o compõem. A SCS-A apresenta boas características psicométricas, adequada estabilidade temporal, validade convergente e divergente, no sentido esperado, com medidas de auto-criticismo, auto-tranquilização, memórias de calor e segurança e indicadores psicopatológicos (ansiedade, depressão e stresse). Referências Bibliográficas Baumeister, R. F., Campbell, J. D., Krueger, J. I., & Vohs, K. D. (2003). Does high self-esteem cause better performance, interpersonal success, happiness, or healthier lifestyles? Psychological Science in the Public Interest, 4, 1–44. doi: 10.1111/1529-1006.01431 URL: http://dx.doi.org/10.1111/1529-1006.01431 Baumeister, R. F., Smart, L., & Boden, J. M. (1996). Relation of threatened egotism to violence and aggression: The dark side of high self-esteem. Psychological Review, 103, 5–33. Doi: 10.1037/0033-295X.103.1.5 Brown, K. W., & Ryan, R. M. (2003). The benefits of being present: mindfulness and its role in psychological well-being. Journal of Personality & Social Psychology,

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Resiliência e adolescência: estudo da relação entre factores de resiliência e qualidade de vida em adolescentes com deficiência motora. Resilience and adolescence: a study of the relationship between resilience factors and quality of life in adolescents with physical disabilities.

Ana Sereno Celeste Simões

Faculdade de Motricidade Humana

Contacto para correspondência: Celeste Simões csimoes@sapo.pt

Resumo: Este estudo procurou analisar um conjunto de fatores associados à resiliência em adolescentes com deficiência motora em diferentes contextos sociais (familiar, escolar, comunidade e grupo de pares) e a sua relação com o bem-estar e qualidade de vida. O estudo foi constituído por uma amostra de 22 adolescentes com deficiência motora. Os instrumentos utilizados para a recolha de dados foram duas escalas de resiliência - Healthy Kids Resiliency Assessment Module e Resiliency Scales for Adolescents, uma escala de avaliação de qualidade de vida – Instrumento Kidscreen – 52, e uma Checklist de Acontecimentos de Vida. Os resultados obtidos mostraram uma associação entre os diversos recursos internos e externos associados à resiliência e a qualidade de vida.

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Estes resultados apontam para a necessidade de sensibilização/formação dos principais agentes que participam na vida destes adolescentes no sentido de promoverem o seu bem-estar e qualidade de vida. Palavras-Chave: Resiliência; Adolescência; Qualidade de Vida; Contextos Sociais. Abstract: This study sought to analyze a number of factors associated to resilience in adolescents with physical disabilities in different social contexts (family, school, and community and peer group) and their relationship with the well-being and quality of life. The study consisted of a sample of 22 adolescents with physical disabilities. The measurement instruments used for data collection were two scales of Resiliency Healthy Kids Resiliency Assessment Module and Resiliency Scales for Adolescents, a quality life scale - Kidscreen - 52, and a Life Events Checklist. The results showed an association between various internal and external assets associated to resilience and quality of life. These results point to the importance of awareness and training of key elements involved in these adolescents lives in order to promote their well – being and quality of life. Key-words: Resilience; Adolescence; Quality of Life; Social Contexts.

Introdução A adolescência é um período da vida repleta de desafios: a relação com o corpo, a autonomia, a comunicação com os pais, o relacionamento interpessoal com os o pares, entre outros. Para os adolescentes com Necessidades Especiais (NE) além dos desafios próprios deste período, os jovens encaram os desafios suplementares na conquista da sua autonomia e identidade (Canha & Neves,2008) Ao longo da adolescência, os jovens com deficiência apresentam sentimentos ambíguos, como por exemplo, a rejeição e a proteção familiar, a inclusão e a separação. Estes dilemas podem dificultar a vivência dos adolescentes neste período (Montanari, 1999) e contribuir para uma instabilidade ao nível emocional e afetivo. Os adolescentes movimentam-se numa série de contextos sociais: a família, a escola e o grupo de pares. Estes envolvimentos são espaços de apoio, de diálogo acerca dos problemas que estão presentes na vida do adolescente (Simões, 2007). Para fazer face às adversidades, os adolescentes apresentam recursos internos e externos que os protegem das situações de risco. A resiliência descreve-se pela capacidade do individuo responder às adversidades da vida com uma atitude positiva, com a combinação entre os envolvimentos em que está inserido. A etapa

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da adolescência é importante para desenvolver e fortalecer os fatores protetores e prevenir os fatores de risco, e consequentemente potenciar a resiliência (Paladini, Daverio, Moreno & Montero, 2005). Os vários contextos sociais apresentam diversos fatores de risco e de proteção, estes fatores possuem um impacto negativo e positivo na qualidade de vida. A qualidade de vida pode ser desenvolvida numa interação do individuo com o meio ambiente e a discrepância entre os objetivos planeados e concretizados (Brown & Brown, 2004). Qualidade de Vida e Fatores Associados A qualidade de vida é um conceito de difícil definição pela sua abrangência e variação intercultural. A Organização Mundial de Saúde (O.M.S.) define qualidade de vida como a saúde física e psicológica, a independência e as relações com os contextos sociais. A O.M.S. refere também que a perceção do indivíduo acerca da sua posição nos vários envolvimentos, os seus objetivos, expectativas e preocupações complementam o conceito de qualidade de vida (WHO, 1994; WHOQOL, 1996). Harding (2001) refere que a qualidade de vida está relacionada com fatores de bem-estar do individuo (físico, psicológico e social). Teixeira (2000), tendo por referência um estudo da O.M.S., afirma que para muitos indivíduos, a qualidade de vida está relacionada com a capacidade de realizar as tarefas diárias de forma autónoma e sem qualquer restrição às mesmas. A qualidade de vida para algumas pessoas significa ter a liberdade de escolher, tendo um leque de opções (Brown & Brown, 2004). Uma questão central no âmbito da qualidade de vida são as dimensões que a compõem. De acordo com a O.M.S. a qualidade de vida apresenta seis domínios: (i) físico; (ii) psicológico; (iii) nível de independência; (iv) relações sociais; (v) contexto; (vi) espiritualidade, incluídas no instrumento WHOOQOL-100 (Fleck, 2000). O European Kidscreen Group (2006, cit in Aventura Social & Saúde) salienta que a qualidade de vida descreve aspetos físicos, psicológicos, mentais, sociais e funcionais de bem-estar. Ainda neste âmbito, Schalock (1996, cit in Melo, 2008) refere que as dimensões da qualidade de vida são: bem-estar emocional, relações interpessoais, bem-estar material, desenvolvimento pessoal, bem-estar físico, autodeterminação, inclusão social e direitos. As dimensões nucleares da qualidade de vida são iguais para todas as pessoas, não existindo dimensões diferentes para grupos diferentes, como as pessoas com deficiência (Schalock, 1997, cit. in Melo, 2008). Harding (2001) refere que a qualidade de vida está relacionada com fatores de bem-estar do indivíduo (físico, psicológico e social). Por isso os acontecimentos de vida negativos podem influenciar negativamente o bem-estar, na medida em que um fator de stress pode ter um efeito forte na vida do indivíduo se existir um ou mais fatores de risco (Kaplan, 1999). O número de fatores de risco é fundamental para a compreensão do processo de desajustamento, Rutter (1979) verificou que

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quatro fatores de stress quadruplicavam o desenvolvimento de desajustamento em relação à combinação de três fatores de risco. Também Simões, Matos, Tomé e Ferreira (2008) verificaram, num estudo realizado com adolescentes com necessidades especiais, que a presença de quatro ou mais acontecimentos de vida negativos estavam associados a um decréscimo significativo nos níveis de bemestar destes adolescentes. A Resiliência como recurso para a Qualidade de Vida Para além destas ameaças ao bem-estar, e consequentemente à qualidade de vida, as pessoas possuem também recursos que permitem lidar com estes riscos. Uma pessoa resiliente supera as adversidades recorrendo aos seus recursos internos e externos, conseguindo ultrapassar os problemas, mas provocando uma transformação positiva, uma nova forma de estar e de agir (Tavares, 2001). Os recursos internos constroem-se a partir dos recursos externos, por isso é fundamental que a sociedade promova os recursos externos necessários para um desenvolvimento saudável dos jovens (Constantine, Benard & Diaz, 1999). Oishi, Diener e Lucas (2009) salientam que as relações sociais são muito importantes para o bem-estar dos indivíduos, pois as pessoas necessitam de relações positivas para sustentar o seu bem-estar. Deste modo, a resiliência é um processo que conduz o indivíduo a uma qualidade de vida em situações adversas com mais ou menos fatores de risco. O modelo conceptual da resiliência e desenvolvimento na adolescência de Benard de 1995 assenta na interação entre os recursos ambientais e os recursos internos. Os recursos externos presentes nos vários envolvimentos (família, escola, pares e comunidade) promovem resultados positivos em diversas áreas (social, académica, saúde). Benard (2004) refere que é importante que nos vários envolvimentos existam relações afetivas, expectativas elevadas e oportunidades de participação. As ligações afetivas nos vários contextos sociais são fundamentais para a promoção de um desenvolvimento saudável, e pelo menos uma pessoa de apoio é muito importante para uma boa adaptação na confrontação com o risco. As expectativas elevadas desenvolvem nos adolescentes sentimentos de autoestima, autoeficácia, autonomia e otimismo. As oportunidades de participação promovem um sentido de responsabilidade e a capacidade de tomar decisões.

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Figura 1. Modelo Conceptual da Resiliência e Desenvolvimento na Adolescência de Benard (Adaptado de Institute of Education Sciences, 2007)

Os jovens com fracas relações afetivas com os familiares e amigos, e que se mostram vulneráveis ao surgimento de determinados problemas, como a depressão e a ansiedade, estão num risco muito elevado para apresentarem comportamentos negativos face às adversidades (McWhirter, McWhirter, McWhirter, McWhirter, 1998). Pelo contrário, um contexto familiar adequado que promove no adolescente competências sociais satisfatórias (Lieberman, Doyle & Markiewiez, 1999, cit in Simões, 2007), no qual os adolescentes apresentam um sentimento de proximidade com os pais, sentem que a família se preocupa com eles e que mostram satisfação com o envolvimento familiar têm menos probabilidade de apresentarem comportamentos de risco (Silliman, 1994). Em relação ao contexto escolar, vários estudos referem que a perceção de segurança na escola, uma ligação afetiva com os colegas e professores e um sentimento de pertença à escola são fatores de proteção que promovem o sucesso académico e o bem-estar geral (Simões et al, 2008). A corroborar estas afirmações, Simões, Matos, Moreno, Rivera, Batista-Foguet e Simons- Morton (2012) afirmam que a apreciação que os professores fazem sobre as capacidades dos alunos contribui para o seu bem-estar. Tal como em relação aos fatores de proteção, Yunes e Szymanski (2001) salientam que os fatores de risco devem ser considerados como um processo e não como uma variável. Estes autores associam os fatores de risco com as adversidades vivenciadas pelos indivíduos, causando problemas físicos, sociais e emocionais. Garmezy (1993) afirma que a aglomeração dos fatores de risco presenciados por um indivíduo é muito negativo, pois começam a destruir os recursos internos e externos do indivíduo, tendo como consequência a diminuição da resiliência.

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Em relação aos fatores individuais, estes podem contribuir ou não para a qualidade de vida. A comunicação é um fator individual muito importante para a qualidade de vida, pois através desta, os adolescentes iniciam relações sociais, estas fundamentais para o desenvolvimento pessoal e social do adolescente. A cooperação e a comunicação estão associadas à capacidade de trabalhar em parceria e expressar sentimentos aos outros (Austin & Kilbert, 2000), estes dois fatores são essenciais para uma interação satisfatória com os vários contextos sociais. Canha e Neves (2008) afirmam que a tolerância às diferenças é a capacidade do individuo dar as suas opiniões e aceitar a dos outros. Este fator pode ser definido como a competência que o individuo possui para manter a interação com os outros aceitando as diferenças de opinião. A autoeficácia é outro fator individual que também pode contribuir para o bem-estar, é caraterizada por um sentimento de valorização pessoal essencial para enfrentar as adversidades de uma forma positiva. O autoconhecimento é definido como a compreensão que temos de nós próprios e dos outros (Austin & Kilbert, 2000), assim Bandura (2001) afirma que a perceção que o adolescente tem de si próprio apresenta uma forte influência na realização das atividades e nas expetativas de futuro. Canha e Neves (2008) mencionam também que é essencial que os indivíduos tenham a perceção do que querem, sentem, pensam e fazem para planearem e ajustarem aos diversos contextos. A Adolescência como etapa de Promoção da Resiliência A adolescência é um período do ciclo de vida onde existem muitos desafios e obstáculos significativos para o adolescente. Nesta etapa, os adolescentes ao entenderem que não podem resolver os seus problemas sempre de modo eficaz, podem começar a apresentar comportamentos desajustados com a sua família e sociedade. O estudo do HBCS realizado em 2010 (Aventura Social, 2010), dedicado ao estudo dos comportamentos e estilos de vida na adolescência, permite compreender que os factores de risco e protecção nesta etapa não são transversais a todos os adolescentes. Alguns factores como, por exemplo, o género e a idade são elementos importantes no processo de resiliência. Concretamente em relação ao género, este estudo concluiu que as raparigas apresentam mais frequentemente sintomas de mal-estar físico e psicológico e insatisfação com a vida, enquanto os rapazes mostram mais comportamentos de externalização (p.e. consumo de álcool e drogas, prática de atividade física) e maior satisfação com a vida. Em relação à escola, o mesmo estudo refere que os alunos continuam a gostar da escola, mas mostram grandes níveis de stress associados às tarefas escolares, que é maior nos adolescentes mais velhos. Neste estudo foram encontradas características protetoras de nível social e pessoal, como por exemplo, a comunicação com os pais, amigos, professores interessados nos alunos e capacidade de resiliência. O período da adolescência também é uma fase em que os jovens mostram a

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capacidade de confrontar, refletir, analisar e de tirar as suas próprias conclusões. Por isso, esta etapa é importante para desenvolver e fortalecer os fatores protetores e prevenir os fatores de risco, consequentemente potenciar a resiliência (Paladini et al, 2005). Os adolescentes com NE podem apresentar dificuldades nas interações sociais, nomeadamente com os seus pares, e isso pode ter como consequência sentimentos de solidão e de depressão (Heiman & Margalit, 1998). A aceitação dos pares é muito importante porque através desta, os adolescentes com deficiência podem começar a encarar a vida e a deficiência de forma diferente, porque provavelmente estarão mais aptos para enfrentar a sua ansiedade sobre a deficiência e os desafios que a vida lhes coloca (Prumes, 2007). No âmbito do projeto “Risco e Resiliência em Adolescentes com Necessidades Educativas Especiais”, Simões et al (2008) efetuaram um estudo com o objetivo de conhecer os comportamentos de saúde e estilos de vida dos adolescentes com Necessidades Educativas Especiais (NEE), nos vários envolvimentos sociais. Os resultados deste estudo mostram que os adolescentes com NEE praticam menos atividade física, apresentam dificuldade na comunicação com os dois progenitores, têm menos amigos, sentem que os professores têm expectativas baixas em relação a eles, apresentam sentimentos de tristeza e de solidão e são mais frequentemente vítimas de bulliyng. A família e a escola são os envolvimentos mais importantes para estes adolescentes. O estudo qualitativo efetuado por Sereno (2011) corrobora o estudo anterior que teve como objetivo identificar a perceção dos adolescentes com deficiência motora na relação que existe entre os fatores de resiliência e a qualidade de vida. Este estudo concluiu que para os adolescentes os fatores do envolvimento familiar e escolar estão associados à qualidade de vida. A família surgiu como um importante fator de proteção, nomeadamente a comunicação entre os diversos membros da família. No contexto escolar, as relações afetivas com os professores e as expectativas dos professores são fatores de proteção para uma qualidade de vida satisfatória, os jovens mencionaram que o apoio dos professores no esclarecimento de dúvidas e as suas expectativas têm um efeito positivo no seu bem-estar. Ao nível dos fatores de risco na família, o estudo revelou que os conflitos familiares provocam um mal-estar nos adolescentes, pois uma comunicação adequada entre pais e filhos é essencial para a abordagem de diversos assuntos e para um desenvolvimento pessoal e social adequado. No envolvimento escolar, destacam-se como fatores de risco as competências académicas e o insucesso escolar. Os adolescentes destacaram que uma avaliação positiva ou negativa nas avaliações académicas são muto importantes para um sentimento de bem-estar. Os aspetos teóricos apresentados na revisão bibliográfica colocam em evidência a existência de vários fatores envolvimentais, determinantes para a qualidade de vida na adolescência. Estes contextos constituem os principais

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envolvimentos de socialização, por isso podem apresentar fatores de risco e de proteção para o desenvolvimento dos adolescentes. Os adolescentes com NE, numa sociedade mais competitiva, são frequentemente alvo de discriminação, preconceito ou desconhecimento, estes comportamentos têm como consequência uma reduzida interação social nos vários contextos em que estão inseridos. Este estudo quantitativo visa analisar os fatores de proteção e de risco associados ao bem-estar e à qualidade de vida dos adolescentes com deficiência motora, com a finalidade de uma reflexão por parte dos diversos contextos sociais de novas ações que vão ao encontro das necessidades e aspirações dos adolescentes com deficiência motora. As questões de investigação deste estudo são: 1. De que modo os acontecimentos de vida negativos e positivos influenciam a qualidade de vida nos adolescentes com deficiência motora. 2. Em que medida os recursos externos (envolvimento familiar, envolvimento escolar, envolvimento na comunidade, envolvimento com os pares) associados à resiliência estão relacionados com a qualidade de vida nos adolescentes com deficiência motora. 3. Em que medida os fatores internos (Cooperação e Comunicação, Autoeficácia, Empatia, Resolução de Problemas, Autoconhecimento Objetivos e Aspirações) associados à resiliência estão relacionados com a qualidade de vida nos adolescentes com deficiência motora. 4. Em que medida alguns traços de resiliência (sentimento de domínio em relação à sua própria vida (MAS), os sentimentos em relação à interação com os outros (REL), e a reatividade (REA) estão relacionados com a qualidade de vida nos adolescentes com deficiência motora. Metodologia Amostra A amostra deste estudo é composta por vinte e dois adolescentes com deficiência motora. Estes adolescentes apresentam idades compreendidas entre os 11 e os 19 anos (M= 14,14; D.P.= 2,05). A maior parte dos adolescentes é do género feminino (n=13). Os adolescentes estão a frequentar o 2º e 3º ciclo do ensino básico (5º ao 9º ano de escolaridade). Instrumentos Os instrumentos utilizados para a recolha de dados neste estudo empírico foram duas escalas de resiliência- Healthy Kids Resiliency Assessment Module (Martins, 2005) e Resiliency Scales for Adolescents (Prince-Embury, 2006), uma

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escala de avaliação de qualidade de vida – Instrumento Kidscreen – 52 (RavensSieber et al,2005) e uma Checklist de Acontecimentos de Vida (Johnson,1986) O Healthy Kids Resiliency Assessment Module tem como objetivo conhecer os diversos recursos internos (cooperação e comunicação, autoeficácia, empatia, resolução de problemas, autoconhecimento, objetivos e aspirações) e externos (relações afetivas, expectativas, e oportunidades de participação na família, escola, comunidade e grupo de pares) associados à resiliência, relacionados com o desenvolvimento adequado dos adolescentes. Este instrumento tem 58 itens e encontra-se organizado num questionário sob a forma de subescalas tipo Likert de 1 a 4 pontos (1- Discordo Totalmente/ Totalmente Falso, 4- Concordo Totalmente/ Muito Verdadeiro). A Resiliency Scales for Adolescents avalia as capacidades individuais dos adolescentes que são importantes para a manifestação ou não da resiliência. A Resiliency Scales é uma escala de autorrelato constituída por três escalas: o sentimento em relação à sua própria vida (MAS), sentimentos em relação à interação com os outros (REL) e a reatividade (REA). A MAS é constituída por 20 itens que avaliam os seguintes traços de resiliência: otimismo; autoeficácia e adaptação. A (REL) é organizada em 24 itens e avalia os seguintes traços de resiliência: confiança, apoio, conforto e tolerância. A sensibilidade, recuperação e incapacidade são traços de resiliência da REA, e esta é composta por 20 itens. Estas três escalas encontramse organizadas num questionário sob a forma de subescalas tipo Likert (Nunca/ Raramente/ Algumas Vezes/ Frequentemente/ Sempre). O instrumento Kidscreen – 52 mede a qualidade de vida relacionada com a saúde em crianças e adolescentes (8 -18 anos). O Kidscreen – 52 é constituído por 10 dimensões que descrevem a qualidade de vida relacionada com a Saúde (QVRS): Saúde e Atividade Física (nível de atividade, energia e aptidão física, sentimentos de mal-estar e queixas de uma saúde pobre); Sentimentos (bem estar físico e psicológico); Estado de Humor em Geral (sentimentos e emoções depressivas e stressantes); Sobre Ti Próprio (perceção do adolescente tem de si próprio); Autonomia /Tempo Livre (gestão do tempo social e de lazer); Família e Ambiente Familiar (relação com os pais e o ambiente em casa); Questões Económicas (perceção do adolescente acerca da qualidade dos recursos financeiros); Amigos (natureza das relações do adolescente com os seus pares); Ambiente Escolar e Aprendizagem (perceção do adolescente acerca da sua capacidade cognitiva, de aprendizagem, sentimentos pela escola e relação com os professores); Provocação (sentimentos de rejeição pelos pares na escola). As 10 dimensões são constituídas por diversos itens, e estes avaliam a relação da criança e adolescente com cada dimensão. A Checklist de Acontecimentos de Vida é constituída por 46 itens (42 itens de acontecimentos de vida e quatro itens de opções em aberto para preenchimento de outros acontecimentos de vida que não estão listados na escala). Para preenchimento da escala, os adolescentes têm que assinalar: a) os acontecimentos de vida experienciados por ele no último ano; b) o tipo de acontecimento (Bom/

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Mau); c) o efeito/impacto que teve na sua vida (1- Nenhum Efeito; 4 - Muito Efeito). Procedimento Para a recolha da amostra, no distrito de Lisboa, foram contactadas diversas escolas do 2º e 3º ciclo do Ensino Básico e várias Associações de Pessoas com Deficiência com a finalidade de obter autorização para a recolha dos dados e para os informar acerca dos objetivos do estudo. Após a solicitação responderam quatro escolas e uma associação. Nas escolas, depois da autorização do Diretor da Escola, e após autorização dos Encarregados de Educação, foi iniciado a aplicação das quatro escalas aos adolescentes. Os jovens com deficiência motora preencheram os diversos instrumentos de uma forma autónoma, isto é, sem qualquer ajuda do investigador. Para a aplicação dos questionários na Associação Salvador foram enviados os questionários por e-mail aos adolescentes (referenciados pela Associação Salvador), que depois de os preencherem reencaminharam-nos para a Associação. Análise Estatística Para realizar o tratamento estatístico, recorreu-se ao SPSS – Windows (versão 17.0). Inicialmente efetuou-se a consistência interna de cada escala. A consistência interna revelou-se dentro dos parâmetros, tendo o valor do alfa variado entre .66 a .91 para o instrumento Kidscreen, o alfa da Resiliency Scales, variou entre .50 a .85 na MAS, de .55 a .88 na REL e .72 a .93 na REA. O valor do alfa de Cronbach na escala Healthy Kids Resiliency Assessment Module, variou entre .40 a .65 para o envolvimento escolar, no envolvimento familiar variou entre .60 a .90, quanto ao envolvimento com os pares, o alfa variou entre .31 a .76, no envolvimento na comunidade variou entre.63 a .90. Nos recursos internos o alfa variou entre .30 a .83.

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Tabela 1. Instrumentos de Avaliação e valores do Alfa de Cronbach Alfa de Cronbach

10 Dimensões do Instrumento Kidscreen Saúde e atividade física Sentimentos Estado de humor em geral Tempo livre Sobre ti próprio Questões económicas Família, ambiente familiar e vizinhança Ambiente escolar e Aprendizagem Amigos Provocação Resiliency Scales MAS Optimismo Auto_Eficácia Adaptabilidade MAS (todos itens) REL Confiança Suporte Conforto Tolerância REL (todos os itens) REA Sensibilidade Recuperação Incapacidade REA (todos os itens) Healthy Kids Resilience Envolvimento Escolar Relações_Afectivas_Escola Elevadas_Espectativas_Escola Participação_Significativa_Escola Envolvimento_ Escolar (todos os itens) Envolvimento Familiar Relações_Afectivas_Famíliar Elevadas_Espectativas_Familiar Participação_Significativa_Familiar Envolvimento_ Famíliar (todos os itens) Envolvimento com os Pares Relações_Afectivas_Pares Elevadas_Espectativas_Pares Envolvimentos_Pares (todos os itens) Envolvimento Comunidade Relações_Afectivas_Comunidade Elevadas_Espectativas_Comunidade Participação_Significativa_Comunidade Envolvimento_ Comunidade (todos os itens) Cooperação_Comunicação AutoEficácia Empatia Resolução_Problemas Auto-Consciência Objectivos_Aspirações

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.80 .72 .85 .66 .70 .91 .83 .84 .85 .80

.50 .85 .62 .85 .55 .66 .75 .76 .88 .72 .90 .92 .93

.65 .41 .40 .64 .90 .90 .60 .90 .76 .31 .70 .90 .90 .63 .85 .30 .80 .71 .83 .70 .70

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Dado que a amostra apresenta um pequeno número de sujeitos e a análise exploratória da distribuição das diversas variáveis em estudo ter revelado que algumas destas variáveis não apresentam uma distribuição normal (simétrica e mesocúrtica), optou-se pela utilização de testes não paramétricos (correlação de Spearman) para a análise das associações entre as variáveis em estudo. Após esta análise foram somados os itens correspondentes a cada uma das escalas e subescalas que irão ser analisadas seguidamente. Resultados Associação entre os Acontecimentos de Vida Negativos e Positivos e a Qualidade de Vida relacionada com a saúde (10 dimensões do Kidscreen) Tabela 2. Correlação ( de Spearman) entre as variáveis dos acontecimentos de vida negativos e positivos e as 10 dimensões do instrumento Kidscreen AVN Total

AVP Total -.337

Saúde e atividade física

-.449

Sentimentos

-.198

.116

Estado de humor em geral

.649**

.167

Tempo livre

-.280

-.308

Sobre ti próprio

-.413

-.258

Questões económicas

-.379

-.308

Familia, ambiente familiar e vizinhança

-.051

-.100

Ambiente escolar e Aprendizagem

.027

.433*

Amigos

.095

-.145

Provocação

.062

-.039

*

* <.05 ** <. 01 Pela análise da tabela nº 2 é possível verificar que o estado de humor em geral apresenta uma correlação positiva (moderada) com os acontecimentos de vida negativos ( =.65, <.01). A variável saúde e atividade física apresenta uma correlação negativa com os acontecimentos de vida negativos ( =-.45, <.05). Quanto aos acontecimentos positivos, é possível verificar que a dimensão ambiente escolar e aprendizagem apresenta uma correlação positiva (moderada) com os acontecimentos de vida positivos ( =.43, <.05).

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Associação entre os Recursos Externos (Healthy Kids Resilience) e a Qualidade de Vida relacionada com a saúde (10 dimensões do Kidscreen) Tabela 3. Correlação ( de Spearman) entre as variáveis do envolvimento familiar, envolvimento escolar, envolvimento com pares, envolvimento da comunidade e as 10 dimensões de Kidscreen Envolvimento Saúde e atividade física Sentimentos Estado de humor em geral Sobre ti próprio Tempo livre Família, ambiente familiar e vizinhança Questões económicas Amigos Ambiente escolar e aprendizagem Provocação

Envolvimento

Escolar .289 .463* -.288 .270 -.066 .338

Envolvimento Familiar .623** .656** -.293 .580** .455* .750**

Envolvimento Comunidade -.029 .070 .188 .225 .061 .379

-.077 .214 .322

.334 .490* .335

.097 .034 -.136

.202 .405 -.161

-.316

-.507*

-.284

-.292

Pares -.018 .272 .089 .253 .193 .222

* <.05 ** <.01 Pela análise da tabela nº 3º é possível verificar que a dimensão saúde e atividade física apresenta uma correlação positiva (moderada) com o envolvimento familiar ( =.62, <.01). Os sentimentos apresentam uma correlação positiva (moderada) com o envolvimento escolar ( =.46, <.05), e uma correlação positiva (moderada) com o envolvimento familiar ( =.66, <.01). A dimensão sobre ti próprio possui uma correlação positiva (moderada) com o envolvimento familiar ( =.58, <.01). A variável tempo livre apresenta uma correlação positiva (moderada) com o envolvimento familiar ( =.46, <.05). A variável família, ambiente familiar e vizinhança possui uma correlação positiva (forte) com o envolvimento familiar ( =.75, <.01). Os amigos apresentam uma correlação positiva (moderada) com o envolvimento familiar ( =.49, <.05). A provocação apresenta uma correlação negativa com o envolvimento familiar ( =-.51, <.05).

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Associação entre os Recursos Internos (Healthy Kids Resilience) e a Qualidade de Vida relacionada com a saúde (10 dimensões do Kidscreen) Tabela 4. Correlação ( de Spearman) entre as variáveis Cooperação e Comunicação, Autoeficácia, Empatia, Resolução de Problemas, Autoconsciência, Objetivos e Aspirações e as 10 dimensões da Kidscreen Cooperação Comunicação

Autoeficácia

Empatia

Resolução Problemas

Auto Conhecimento

Objetivos _aspirações

Saúde e atividade física

.781**

.528*

-.223

.115

.431*

.005

Sentimentos

.724**

.431*

.090

.403

.418

.027

Estado de humor em geral

-.427*

-.420

.357

-.237

-.394

.095

Sobre ti próprio

.715**

.417

-.014

.170

.210

-.150

Tempo livre

.511*

.121

-.167

.105

.150

.108

Família, ambiente familiar e vizinhança

.707**

.310

.411

.176

.114

.037 .338

Questões económicas

.210

.059

-.335

.382

.127

Amigos

.414

.105

-.204

-.062

.283

.161

.233

.311

-.058

.145

.145

-.009

-.474*

-.272

-.112

-.181

.136

.202

Ambiente escolar aprendizagem Provocação

e

* <.05 ** <.01 Pela análise da tabela nº 4 é possível verificar que a variável saúde e atividade física apresenta uma correlação positiva (forte) com a variável cooperação e comunicação ( =.78, <.01). A variável saúde e atividade física também apresenta uma correlação positiva (moderada) com a autoeficácia ( =.53, <.05) e com o autoconhecimento ( =.43, <.05). Os sentimentos apresentam uma correlação positiva (forte), com a cooperação e comunicação ( =.72, <.01) e uma correlação positiva (moderada) com a autoeficácia ( =.43, <.05). O estado de humor em geral apresenta uma correlação negativa com a cooperação e comunicação ( =-.43, <.05). A variável sobre ti próprio possui uma correlação positiva (forte) com a variável cooperação e comunicação ( =.72, <.01). O tempo livre possui uma correlação positiva (moderada) com a variável cooperação e comunicação ( =.51, <.05). A família, ambiente familiar e vizinhança apresenta uma correlação positiva (forte) com a variável cooperação e comunicação ( =.71, <.01). A provocação possui uma correlação negativa com a cooperação e comunicação.

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Associação entre os vários domínios MAS, REL, REA (Resiliency Scales) e a Qualidade de Vida relacionada com a saúde (10 dimensões do Kidscreen) Tabela 5. Correlação ( com Kidscreen 52

Saúde e atividade física Sentimentos Estado de humor em geral Sobre ti próprio Tempo livre Família, ambiente familiar e vizinhança Questões Económicas Amigos Ambiente escolar e aprendizagem Provocação

de Spearman) dos vários itens do MAS, REL, REA

1 .359 .635** -.116 .249 .076 .557**

MAS 2 3 .572** .371 .494* .254 -.403 -.166 .506* .112 .276 -.168 .498* .251

5 .451* .493* -.058 .443* .407 .838**

REL 6 .519* .427* -.154 .472* .273 .542**

7 .742** .706** -.416 .665** .329 .705**

Total

.612** .625** -.385 .436* .191 .570**

4 .654** .680** -.163 .676** .306 .680**

8 .711** -.579** .702** -.610** -.238 .743** .660** -.778** .335 -.095 .814** -.326

REA 9 10 -.570** -.740** -.776** -.558** .590** .732** -.671** -.633** -172 -.122 -.266 -.313

-.718** -.704** .770** -.730** -.149 -.350

.052 .298 .475*

-.015 .342 .180

.053 .063 .197

.063 .345 .351

.149 .542** .292

.320 .384 .173

.230 .357 .150

.214 .369 .231

.177 .433* .270

-.065 -.003 -.510*

-.152 -.187 -.187

-.227 -.052 -.308

-.160 -.085 -.385

-.371

-.236

.055

-.292

-.464*

-.313

-.421

* -.523* -.522

.507*

.488*

.224

.405

Total

Total

Nota: 1= Otimismo; 2= Auto eficácia; 3= Adaptabilidade; 4= Confiança; 5= Suporte; 6=Conforto; 7= Tolerância; 8= Sensibilidade; 9= Recuperação; 10= Incapacidade * **

<.05 <. 01

A variável saúde e atividade física apresenta uma correlação positiva forte com a tolerância ( =.74, <.01) e uma correlação positiva (moderada) com a autoeficácia ( =.57, <.01), confiança ( =.65, <.01), suporte ( =.45, <.05) e com o conforto ( =.52, <.05). A variável saúde e atividade física apresenta uma correlação negativa com a sensibilidade ( =-.58, <.01), recuperação ( =-.57, <.01) e incapacidade ( =-.74, <.01). Os sentimentos apresentam uma correlação positiva (moderada) com o otimismo ( =.64, <.01), confiança ( =.68, <.01), autoeficácia ( =.49, <.05), suporte ( =.49, <.05), conforto ( =.43, <.05), e uma correlação positiva (forte) com a tolerância ( =.71, <.01). Os sentimentos apresentam uma correlação negativa com a sensibilidade ( =-.61, <.01), recuperação ( =-.78, <.01) e incapacidade ( =-.56, <.01). O estado de humor em geral apresenta uma correlação positiva (forte) com a sensibilidade ( =.74, <.01), incapacidade ( =.73, <.01) e uma correlação positiva (moderada) com a recuperação ( =.59, <.01). O domínio sobre ti próprio apresenta uma correlação positiva (moderada) com a confiança ( =.68, <.01), tolerância ( =.67, <.01), autoeficácia ( =.51, <.05), e suporte ( =.44, <.05). A dimensão sobre ti próprio apresenta uma correlação negativa com a sensibilidade ( =-.79, <.01), recuperação ( =-.67, <.01) e incapacidade ( =-.63, <.01). A família, ambiente familiar e vizinhança apresenta uma correlação positiva (moderada) com o otimismo ( =.56, <.01), confiança ( =.68, <.01), conforto ( =.54,

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<.01), e autoeficácia ( =.50, <.05), e uma correlação (forte) com o suporte ( =.84, <.01), e com a tolerância ( =.71, <.01). Os amigos têm uma correlação positiva (moderada) com a confiança ( =.54, <.01). O ambiente escolar e aprendizagem apresenta uma correlação positiva (moderada) com o otimismo ( =.48, <.05). A dimensão ambiente escolar e aprendizagem apresenta uma correlação negativa com a sensibilidade ( =-.51, <.05). A provocação apresenta uma correlação positiva (moderada) com a sensibilidade ( =.50, <.05), e com a recuperação ( =.49, <.05). A provocação apresenta uma correlação negativa com a confiança ( =-.46, <.05), e com a tolerância ( =-.52, <.05). Discussão Os resultados obtidos neste estudo mostram que diversos fatores estão associados às diferentes dimensões da qualidade de vida dos adolescentes com deficiência motora. Entre estes encontram-se os acontecimentos de vida negativos e positivos. Mais concretamente verificou-se que à medida que ocorrem mais acontecimentos de vida, ou com maior impacto, diminui o estado de humor em geral e saúde e atividade física afetando assim a qualidade de vida. Estes resultados corroboram a afirmação de Harding (2001) que afirma que a qualidade de vida está relacionada com fatores de bem-estar do indivíduo (físico, psicológico e social), por isso os acontecimentos de vida negativos podem influenciar negativamente o bem-estar. Os acontecimentos de vida positivos provocam um efeito positivo no ambiente escolar e aprendizagem, o que está de acordo com vários estudos que referem que a perceção de segurança na escola, uma ligação afetiva com os colegas e professores e um sentimento de pertença à escola são fatores de proteção que promovem o sucesso académico e o bem-estar geral (Simões et al, 2008). Os resultados da correlação entre os fatores externos associados à resiliência (envolvimento familiar, envolvimento escolar, envolvimento na comunidade, envolvimento com os pares) com as dez dimensões da qualidade de vida mostram que o envolvimento familiar tem uma associação positiva com as seguintes dimensões da qualidade de vida: saúde e atividade física, sentimentos, sobre ti próprio, tempo livre, amigos, família, ambiente familiar e vizinhança. Esta associação positiva reflete que a família tem um papel essencial no desenvolvimento global da criança e adolescente, e confirma a posição de alguns autores que referem que a comunicação com os pais afeta o bem-estar geral, (Jackson, Bijstra, Oostra, & Bosma, 1998; King et al., 1996 cit in Simões, 2007) e a perceção de um bom relacionamento familiar estão associados a um bem-estar geral (Chou, 1999; Greef & le Roux, 1999 cit in Simões, 2007). O envolvimento escolar provoca um efeito negativo ou positivo na dimensão

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sentimentos conforme o seu envolvimento escolar, pois este é o local onde os adolescentes passam uma parte significativa do seu tempo. Matos (2005) refere que a escola pode acentuar a integração e o sucesso, ou pelo contrário o insucesso e a rejeição. Na associação entre os recursos internos (cooperação e comunicação, autoeficácia, empatia, resolução de problemas, autoconhecimento, objetivos e aspirações) associados à resiliência com as diferentes dimensões da qualidade de vida nos adolescentes com deficiência motora, verificou-se que os fatores de proteção individuais são muito importantes no confronto com as diversas adversidades. A variável cooperação e comunicação apresenta uma associação com as seguintes dimensões da qualidade de vida: saúde e atividade física, sentimentos, sobre ti próprio, família, ambiente familiar e vizinhança, tempo livre, provocação e estado de humor em geral. Este resultado vai ao encontro da literatura que mostra que o adolescente com deficiência pode apresentar alguns problemas na aceitação social por parte dos pares devido, por vezes à sua dificuldade de comunicar (Sereno,2011). A comunicação é a capacidade de expressar sentimentos aos outros (Austin & Kilbert, 2000), e é fundamental para o estabelecimento das várias relações sociais nos diversos contextos. A variável autoeficácia apresenta uma associação com duas dimensões da qualidade de vida: saúde e atividade física e sentimentos. Verificou-se que o autoconhecimento e a dimensão da saúde e atividade física estão relacionados entre si. Neste âmbito Bandura (2001) refere que a perceção que o adolescente tem de si próprio apresenta uma forte influência na realização das atividades e nas expetativas de futuro. Os traços de resiliência (sentimento de domínio em relação à sua própria vida, os sentimentos em relação à interação com os outros, e reatividade) estão associados às diferentes dimensões da qualidade de vida nos adolescentes com deficiência motora. Quanto maior for o nível de sentimento em relação à sua própria vida (MAS) haverá um sentimento positivo em relação às seguintes dimensões da qualidade de vida: saúde e atividade física, sentimentos, família, ambiente familiar e vizinhança, sobre ti próprio. Como referem Canha e Neves (2008) é essencial que os indivíduos tenham a perceção do que querem, sentem, pensam e fazem para planearem e ajustarem aos seus diversos contextos. Verificou-se que as dimensões do Kidscreen: saúde e atividade física; sentimentos, estado de humor em geral, sobre ti próprio apresentam uma associação significativa com a REL (sentimentos em relação à interação com os outros).Esta associação corrobora o estudo de Canha e Neves (2008) que mostra que a tolerância às diferenças é uma competência fundamental do individuo para manter a interação com os outros aceitando as diferenças de opinião. Também os autores Oishi, Diener e Lucas, (2009) afirmam que as pessoas necessitam de apoio e relações positivas para sustentar o seu bem-estar. A escala - reatividade (REA), ao contrário das outras escalas, apresenta correlações negativas com as seguintes dimensões da qualidade de vida: saúde

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e atividade física, sentimentos, estado de humor em geral, sobre ti próprio. É percetível a direccionalidade das correlações (negativas) da REA com as quatro dimensões da qualidade de vida, pois estes traços de resiliência estão associados a aspetos que podem comprometer o bem-estar dos adolescentes ao longo do seu ciclo de vida. Conclusão Neste estudo procurou-se analisar em que medida os acontecimentos de vida, os recursos internos e os recursos externos estão associados à qualidade de vida dos adolescentes com deficiência motora. Os resultados obtidos mostraram que os acontecimentos de vida negativos e positivos apresentam uma influência na qualidade de vida. Na análise da associação entre os recursos externos e a qualidade de vida, destaca-se o envolvimento familiar como tendo uma correlação significativa com as diversas dimensões da qualidade de vida, pois a família tem interferência na socialização, na transmissão de valores e de um modo geral na saúde e bem-estar dos seus elementos. Também os recursos internos apresentam uma correlação com a qualidade de vida, as diversas competências sociais permitem ao individuo obter resultados positivos numa interação social. Quanto aos traços de resiliência, estes apresentam também uma associação significativa com a qualidade de vida. Os traços de resiliência – sentimento de domínio em relação à sua própria vida e os sentimentos em relação à interação com os outros têm uma correlação positiva com a qualidade de vida, enquanto o traço de resiliência – reatividade apresenta uma correlação negativa com a qualidade de vida. Ao longo deste estudo quantitativo deparamo-nos com várias limitações ao estudo. Em primeiro lugar, este estudo utilizou uma amostra muito reduzida de adolescentes com deficiência motora, o que de alguma formar poderá limitar a interpretação dos resultados obtidos. Em segundo lugar, salienta-se o facto de se ter utilizado uma escala (Resiliency Scales) que no momento ainda não estava validada para a população portuguesa. Apesar de termos conseguido dar algumas respostas às questões levantadas nesta temática, muitas questões continuam em aberto. Por isso, parece assim pertinente fazer algumas propostas em termos de trabalho futuro. Seria importante promover programas de intervenção com o objetivo de desenvolver os recursos internos, mas em simultâneo incluir os elementos significativos dos principais contextos de vida dado a sua relevância em todo este processo e avaliar a eficácia dos mesmos ao nível da promoção da qualidade de vida destes adolescentes.

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Crianças com pais ou mães encarcerados: uma revisão da literatura Children with incarcerated parents: a literature review

Gabriela Reyes Ormeño

Universidade Tuiuti do Paraná, Laboratório de Análise e Prevenção da Violencia LAPREV

Joviane Marcondelli Dias Maia Laboratório de Análise e Prevenção da Violencia LAPREV

Lúcia Cavalcanti Albuquerque Williams Universidade Federal de São Carlos, coordenadora do LAPREV

Contacto para correspondencia: Laboratório de Análise e Preveção da Violência / DPsi / UFSCar Rod. Washington Luis, km 235 - São Carlos - SP - BR - CEP:13565-905 e-mail. gabyreyes2@gmail.com

Resumo: O presente estudo visou revisar a literatura brasileira e norteamericana de 1998 a 2011 sobre os filhos de pais encarcerados. Foi pesquisada a base SAGE com as seguintes palavras chaves: incarcerated children, children of parents in prison, e no Brasil a base Scielo e Lilacs, com as palavras chaves: filhos de presidiários, filhos de encarcerados, e filhos de mulheres presas. No Brasil foram encontrados cinco artigos, em contraste na literatura americana há inúmeros trabalhos. Sendo assim, optou-se por destacar duas obras: estudo pioneiro de Gabel e Johnston e a meta-análise de Poehlmann, Dallaire, Loper e Shear (2010). A partir dos dados encontrados foi subdividido em 4 categorias: (1) Os filhos de

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mães/pais encarcerados na America do Norte; (2) Pesquisas com filhos de mães/ pais encarcerados no Brasil; (3) Pesquisas e programas de intervenção com filhos de mães/pais encarcerados na America do Norte; e (4) Políticas Públicas para filhos de encarceradas no Brasil. Conclui-se que há existência de diversos fatores de risco aos quais essas crianças estão expostas, antes e durante o encarceramento de seus progenitores. No entanto, há benefícios positivos quando são realizadas intervenções com esta população, podendo diminuir os possíveis problemas já instalados na vida destas crianças. Palavras chave: Filhos de encarcerados; fatores de proteção; programas de intervenção. Abstract: The present study aimed at reviewing the Brazilian and NorthAmerican literature, from 1998 to 2011, on children of incarcerated parents. The research was done through SAGE database with the following keywords: incarcerated children, children of parents in prison, and in Brazil through the Scielo and Lilacs database with the key words: filhos de presidiarios, filhos de encarceradas, filhos de mulheres presas. Five papers were found in Brazil, whereas in the North-American literature has a vast number of Studies. We chose to highlight two papers: a pioneer study by Gabel and Johnston and a meta-analysis by Poehlmann, Dallaire, Loper and Shear (2010). The resulting information was divided in four topics: children of incarcerated mothers/ fathers according to North-American literature; Research with children of incarcerated mothers/fathers in Brazil; Research and intervention programs with children of incarcerated mothers/fathers in North-American, Public Policies for children of incarcerated parents in Brazil. There are several risk factors to which these children are exposed before and during their parents’ incarceration. Nevertheless, there are positive benefits when interventions are conducted with this population as to reduce possible problems that are already installed in the lives of these children. Key-words: Children of prisoners; protective factors; Intervention programs.

Agradecimentos: Este trabalho é financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNQP) processo 402958/2008-0

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Introdução A maioria dos homens e mulheres encarcerados é pai ou mãe. No entanto, não existe uma estimativa específica mundial sobre quantas crianças encontramse separadas de seus pais ou cuidadores devido ao encarceramento. Ao se considerar o amplo aumento global da população carcerária, tanto masculina quanto feminina, obtém-se números alarmantes, pois os estudos internacionais mostram que cada vez mais as crianças têm um dos pais ausentes em consequência da violência e de prisões decorrentes (Greene, Haney & Hurtado, 2000; Mumola, 2000; Murray & Farrington, 2005; Murray, 2007). Nos Estados Unidos, mais de dois milhões de crianças são filhos de pais encarcerados. Desses, 200.000 são filhos de mães encarceradas, o que representa duas em cada 100 crianças (Phillips & Bloom, 1998; Program Children´s Service Practice Notes, 2002). Estima-se que em tal país, aproximadamente, seis mil bebês nasçam todos os anos, filhos de mulheres em situação de encarceramento (Johnston, 1995). Na Escócia, 13.500 crianças por ano tem seus pais presos (Families Outside, 2008). No Canadá, no mínimo 20.000 crianças são separadas de suas mães, anualmente, em virtude do encarceramento das mesmas (Cunningham & Baker, 2003). Na literatura brasileira não há dados indicativos de quantas crianças se encontram na condição de ter mãe ou pai preso. A Secretaria de Administração Penitenciária (2009) descreveu que a média é de dois filhos por preso masculino, mas não são descritas outras características a respeito dos filhos. Além disso, os dados internacionais mostram que, em 10% dos casos, as mulheres ingressam no sistema carcerário grávidas, o que aumentaria consideravelmente o número de crianças nessa situação (Johnston, 1995). A Secretaria de Administração Penitenciária (2009) caracteriza a mulher presa do Estado de São Paulo, Brasil, como sendo jovem, com idade entre 18 e 30 anos, e em mais de 54% dos casos como sendo chefe de família monoparental. Os principais crimes cometidos por elas são: tráfico de entorpecentes e roubo. Ao se caracterizar a mulher como sendo jovem, pode-se relacionar tal fato com a idade reprodutiva dessa mulher. A questão da maternidade entre as presas envolve uma série de conflitos: a separação dos filhos, a situação dos filhos sem a mãe, o parto que algumas vezes é feito na própria prisão, entre outros. Além disso, existem as questões que envolvem a maternidade antes da prisão, já que em muitos casos há histórico de negligência materna decorrente do abuso de drogas ou até mesmo de maustratos (Dalley, 2002; Seymour, 1998). No estudo de Dalley (2002), realizado nos Estados Unidos, a autora aponta que o encarceramento materno agrava problemas já existentes nas crianças. Nos casos de problemas com a maternidade prévia à prisão, cerca de 40% das mulheres já haviam perdido a guarda dos filhos pelo menos uma vez, deteriorando a relação entre mãe-filho e acarretando em dificuldades emocionais,

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sociais e comportamentais às crianças (Dalley, 2002). Adicionalmente, com o encarceramento surgem novos problemas, pois acompanha a mulher presa estigmas sociais como o de ser uma “má” pessoa, e, consequentemente, o de não exercer o seu papel de mãe adequadamente (Dodge & Pogrebin, 2001). Além da influência da prisão sobre a maternidade, existe o sentido inverso: a maternidade pode ser um fator que influenciou a prisão dessas mulheres. Não apenas a maternidade, mas a necessidade de prover melhores condições para os filhos em um ambiente de recursos escassos, o que pode levar determinadas mulheres ao envolvimento em atividades ilícitas, como o tráfico de drogas e estelionato (Ferraro & Moe, 2003). A respeito da situação das crianças que ficam sem a mãe no período de encarceramento surge outro problema que requer atenção – elas são muitas vezes colocadas em lares adotivos temporários ou com parentes com os quais elas não têm um apego adequado. Esse contexto pode ser prejudicial ao desenvolvimento infantil, na medida em que o vínculo é de extrema importância, principalmente nos dois primeiros anos de vida da criança (Dalley, 2002). Em virtude das conseqüências nocivas para o desenvolvimento infantil do encarceramento dos pais, e, em especial o encarceramento materno, bem como a escassez de literatura, o presente estudo visou revisar a literatura brasileira e norte-americana da área, de 1995 a 2011 sobre crianças cujos pais ou mães estivessem encarcerados. Para tanto foi pesquisada a base de dados internacional SAGE com as seguintes palavras chaves: incarcerated children, children of parents in prison. As bases de dados brasileiros foram: Scielo e Lilacs1, com as palavras chaves: filhos de presidiários, filhos de encarcerados, e filhos de mulheres presas. Nas bases de dados do Brasil foram encontrados apenas cinco resumos de artigos científicos. Ao se analisar o conteúdo dos mesmos pode-se constatar que dois estudos tinham como foco filhos de homens encarcerados (Santos 2006; Schilling & Miyashiro, 2008); dois estudos abordavam os filhos de mulheres encarceradas (Stella, 2009a; Stella, 2009b) e um deles enfocou o estigma sofrido por essa população, bem como a relação dos filhos de presidiários com a escola (Kosminsky, Pinto & Miyashiro, 2005). Em contraponto, na literatura de língua inglesa foi constatado um vasto número de trabalhos sobre a temática, podendo ser exemplificado pelos diversos periódicos científicos que abordam o tema (Prision Journal, Criminal Justice, Criminal Justice Policy Review, Criminal Justice and Behavior, Crime & Delinquency, International Journal of Offender Therapy and Comparative Criminology, entre outros). Tais publicações existem desde a década de 1920, além da existência de vários livros sobre homens e mulheres encarcerados, bem como a situação de seus filhos e familiares (Eddy & Poehlmann, 2010; Enos, 2001;Golden, 2005; Harris, Graham & Carpenter, 2010; Seymour & Hairston, 2001; Travis, 2005). 1

Utilizou-se como instrumento adicional de pesquisa o Google Acadêmico para tentar abranger um maior número de trabalhos.

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Considerando que na leitura norte-americana encontrou-se uma vasta produção sobre o assunto, optou-se inicialmente nesse estudo por destacar duas obras, a saber: a) o estudo sobre crianças de pais encarcerados de Gabel e Johnston (1995), por ser considerado pioneiro e abrangente, e b) a meta-análise sobre filhos em contato com seus pais encarcerados realizada por Poehlmann, Dallaire, Loper e Shear (2010), por ser a única meta-análise sobre o assunto. A obra editada por Gabel e Johnston (1995) é considerada um texto clássico da literatura americana sobre a temática de filhos de encarcerados, sendo dividida em seis partes: 1) o encarceramento dos pais: mães encarceradas, pais encarcerados e diferenciações; 2) efeitos causados pelo encarceramento parental; 3) cuidados e locais nos quais as crianças ficam após o encarceramento; 4) questões legais; 5) intervenções com filhos de encarcerados e 6) políticas públicas desenvolvidas no Sistema Legal Americano. Sendo assim, tal publicação englobou as principais características, aspectos e dificuldades enfrentadas por filhos com pais/e ou mães encarcerados. Na meta-análise de Poehlmann et al. (2010) foram descritos 35 trabalhos abordando os aspectos positivos e negativos da relação entre pais/mães encarceradas e seus filhos sob a ótica, tanto dos encarcerados, de seus cuidadores e de professores. Desses, 16 trabalhos enfocavam as mães encarceradas, sendo que em três estudos as mulheres se encontravam em regime condicional. Em 11 dos trabalhos, os participantes do estudo eram pais ou mães encarcerados, e seis eram relacionados exclusivamente a pais encarcerados. Finalmente, em dois estudos não foi descrito se o trabalho foi realizado com mães ou pais encarcerados. A meta-análise teve como objetivo apresentar resultados de pesquisas a respeito de visitas e outras formas de contato que acorrem entre as crianças e seus pais encarcerados, descrevendo conseqüências positivas e negativas para as crianças. Como aspectos positivos, os autores (Block & Potthast, 1998; Byrne, Goshin & Joestl, 2010; Carlson, 1998; Dallaire, Ciccone & Wilson, 2010; Dallaire, Wilson & Ciccone, 2009) apontaram que as crianças apresentaram uma relação de apego seguro, menos problemas somáticos e sintomas depressivos, maior ligação com o mãe/pai encarcerado. Além disso, os autores afirmaram que se o cuidador da criança tem uma relação positiva com o encarcerado (a), a relação com o filho se tornava mais próxima e positiva, consequentemente as crianças apresentavam menos problemas na escola como suspensões ou evasões. Como pontos negativos, alguns estudos. Dallaire, Ciccone & Wilson, 2010; Dallaire, Wilson & Ciccone, 2010; Dallaire, Wilson & Ciccone, 2009; Poehlmann, 2005a; Shlafer & Poehlmann, 2010) apontaram que, quanto mais visitas as crianças realizavam a seus pais encarcerados, maior a probabilidade de apresentar “afeto inseguro” e problemas de atenção. Desta forma, segundo os autores, é importante para a criança, ter conhecimento sobre a situação da mãe/pai encarcerado, tendo contato com os mesmos. No entanto, ter uma relação frequente com pai/mãe na cadeia, pode ser negativo para a criança em algumas situações, criando problemas, quando a

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criança ainda não tem um entendimento claro da situação devido a sua fase de desenvolvimento. Além disso, a meta-análise apresentou recomendações para que as crianças tenham contato com seus genitores, sugerindo áreas de pesquisa que verifiquem o verdadeiro impacto do contato das crianças com seus pais encarcerados, a realização de mais trabalhos de intervenção com as próprias crianças nos quais possam relatar suas opiniões, para assim entender de forma mais adequada os diferentes sistemas (exo, macro, e messosistema) nos quais estão inseridas, bem como avaliações de como se dá a interação das crianças com seus pais e análise dos efeitos tanto para as crianças, quanto para seus genitores. Após a análise dos artigos acima referidos e do relatório do Center for Children and Families in The Justice System London2- Canadá (2003) visando complementar a apresentação do tema, as informações obtidas foram subdivididas em quatro categorias levando-se em conta os achados principais da revisão da literatura: (1) Os filhos de mães/pais encarcerados segundo a literatura norte-americana de língua inglesa; (2) Pesquisas com filhos de mães/pais encarcerados no Brasil; (3) Pesquisas e programas de intervenção com filhos de mães/pais encarcerados na América do Norte e (4) Políticas Públicas para filhos de encarceradas no Brasil Os filhos de mães/pais encarcerados na América do Norte Dentre as principais características destacadas como apresentadas pelas crianças de mães/pais encarcerados pela literatura norte-americana, pode-se destacar: o estigma social, a preocupação gerada pelo questionamento sobre como será viver sem o pai ou a mãe, lembranças do episódio traumático da prisão do pai ou da mãe, ansiedade, culpa, baixa autoestima, solidão, sentimento de abandono emocional por parte dos familiares e amigos, distúrbio de alimentação e do sono, distúrbios de atenção e comportamento regressivo, agressividade, comportamento antissocial, envolvimento precoce com o crime, entre outros (Cunningham & Baker, 2003; Johnston, 1995). A pesquisa com filhos de encarcerados, realizada nos Estados Unidos, por Johnston (1995), identificou três fatores que podem afetar a criança em qualquer estágio de seu desenvolvimento: a separação entre pais e filhos, estresse póstraumático e cuidados inadequados persistentes. Adicionalmente, a pesquisa destacou que, no período pré-natal, podem ocorrer diversos riscos para a criança de mãe/pai encarcerados, como o abuso de drogas lícitas (álcool e cigarro) e ilícitas (maconha, crack, cocaína), alimentação precária, estresse materno, falta de acompanhamento médico, doenças sexuais não tratadas, entre outros. Johnston (1995) descreveu as características das crianças cujas mães estão encarceradas, subdividindo o desenvolvimento infantil em quatro estágios. Com relação ao primeiro estágio, o autor aponta que, nos dois primeiros anos de vida, 2

Centro para Crianças e Familiares no Sistema de Justiça.

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os bebês nascidos de mulheres encarceradas enfrentam mudanças de vários cuidadores, o que acarretaria em inúmeras dificuldades. Contudo, parece que o maior efeito causado para as crianças no primeiro ano de vida seria a dificuldade em criar laços de apego com suas mães encarceradas, além dos laços adicionais que precisariam ser estabelecidos com seus cuidadores. No segundo estágio do desenvolvimento (2 a 6 anos), Johnston (1995) descreveu que tanto a autonomia da criança, quanto a iniciativa podem ser afetadas, devido a experiências traumáticas associadas às atividades criminais dos pais e/ou mandados policiais de prisão, comportamento de superproteção por parte dos pais perante possíveis agressores e a separação dos pais em decorrência do encarceramento. Os efeitos a longo prazo dessas experiências nesse estágio, segundo o autor, parecem ser mais prejudiciais do que os de qualquer outro estágio do desenvolvimento, visto que em sua visão, as crianças pequenas perceberiam e se lembrariam mais desses eventos traumáticos e dessa maneira precisariam de ajuda especializada para superá-los. No terceiro estágio (7 a 10 anos), a criança está desenvolvendo habilidades com seus pares e aprendendo a trabalhar e cooperar dentro de determinado grupo. Outra capacidade que ela está desenvolvendo é o controle de suas emoções, o que lhe possibilitará lidar com diversas situações de pressões e frustrações na vida adulta. Essas capacidades podem ter seu desenvolvimento e amadurecimento comprometidos com a prisão do pai ou da mãe (Johnston, 1995). Um fator importante refere-se à agressividade e problemas de comportamento apresentados por essas crianças que podem ser observados no cotidiano escolar, também mencionados por outros autores (Cunningham & Baker, 2003). Com relação ao quarto estágio (11 a 14 anos), de acordo com Johnston (1995), alguns adolescentes não conseguem superar a ausência do pai ou da mãe encarcerada e tal fato, somado ao estresse enfrentado na fase da préadolescência, incorrem em situações distintas que englobam desde o assumir a responsabilidade de um adulto em casa, até a rejeição dos limites impostos pelo adulto com o qual o adolescente tenha vínculos. De fato, para Murray (2007), adolescentes com pais que já foram presos têm maior propensão a passarem pelo Sistema Judiciário, apresentarem comportamentos sexualizados precocemente e abusaram de substâncias lícitas e ilícitas. Portanto, a prisão de um dos pais, especialmente da mãe, decorrente de atividades criminosas, interfere no desenvolvimento saudável da criança. A combinação de fatores como estresse traumático causado pelo fato em si, a separação da criança do cuidador e o abandono a que muitas crianças ficam sujeitas acarreta consequências alarmantes para a vida adulta (Jonhston, 1995; Murray, 2007). Além das dificuldades apontadas, Cunningham e Baker (2003) destacam que, no caso das crianças serem filhos de mães inseridas no sistema carcerário, os problemas apresentados se agravam, pois na maioria dos casos a mãe é a cuidadora principal e única. Por este motivo, em função do encarceramento, são

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necessárias modificações na rotina dos filhos, que podem implicar em mudanças de cuidados, escola, cidade, entre outras. No entanto, para essas autoras, um dos maiores problemas enfrentando pelas crianças é o estigma social que sofrem ao lidar com a situação do encarceramento paterno. Pesquisas com filhos de mães/pais encarcerados no Brasil No que se refere à literatura brasileira, cinco estudos encontrados nesse trabalho descrevem a população de filhos de pais encarcerados no Brasil (Kosminsky, Pinto & Miyashiro, 2005; Santos 2006; Schilling & Miyashiro, 2008; Stella, 2009; Stella, 2009b). Kosminsky et al. (2005) estudaram as condições de vida de crianças filhos de presidiários com o intuito de verificar o estigma vivenciado perante os pares e professores de escola ao ter um genitor preso. Foram realizados dois estudos de caso em uma escola de Ensino Fundamental na Cidade de Marília, São Paulo. Para recrutar os participantes, foi solicitado aos professores da escola a indicação de quais crianças tinham algum familiar encarcerado, sendo assim, identificadas sete crianças, filhos de pai, mãe ou irmão de encarcerado. No entanto, participaram do trabalho apenas duas crianças: uma filha e um irmão de um encarcerado. Para realizar a coleta de dados foram realizadas entrevistas com as crianças e seus professores na própria escola. Os resultados do estudo mostraram diferenças quando a prisão era do pai, assim como o motivo da mesma. No caso da filha do encarcerado, esta se encontrava perante um conflito entre duas realidades, a que acontecia com o pai e a do discurso de não violência da escola, o que a deixava confusa por acreditar que as pessoas devem ser punidas ao realizar atos inadequados, mas era seu pai que estava passando por essa situação. Já a outra criança se mostrou tímida ao falar sobre seu irmão encarcerado. Os professores descreveram que procuravam atender as crianças de forma igualitária aos demais alunos. No entanto, as autoras interpretaram este comportamento como “falta de interesse” pelos problemas da criança fora da escola, pois o discurso ministrado pela escola não era condizente com a realidade familiar da criança. Com relação ao cuidador das crianças, segundo o relato dos professores, esses concentravam mais sua atenção para o ente que estava detido, deixando a criança, menos protegida e mais vulnerável. Embora a amostra desse estudo seja extremamente restrita, fazendo com que seus resultados sejam interpretados com cautela, o estudo contribui para reforçar a necessidade de se intervir com crianças e familiares encarcerados, visando romper o ciclo da intergeracionalidade carcerária. O artigo de Santos (2006) discutiu como a criança pequena vivencia a experiência da referência paterna submetida à tutela do Estado, assim como a discordância entre os direitos do Estatuto da Criança e da Adolescente e a execução da Lei Penal, já que o primeiro garante o direito e proteção das crianças e a última as submete a situações de humilhação, tais como a retirada de fraldas

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e/ou peças íntimas na revista durante o horário de visita na prisão. Desta forma, segundo o autor, fica incompatível o cumprimento simultâneo destas duas leis. O estudo realizou entrevistas com mães de três filhos de encarcerados, sendo que o primeiro contato era realizado no dia de visita na fila para ingressar ao presídio, e depois era requerido um encontro na casa da família para discutir os assuntos abordados. Cabe mencionar que as idades das crianças variavam entre dois e quatro anos. O conteúdo das entrevistas apontou diversas dificuldades que as crianças enfrentavam por estarem separadas de seus pais, tais como: lidar com sua ausência no dia a dia, e principalmente todas as situações que estas enfrentavam para continuar a manter contato com os mesmos. O dia da visita era caracterizado como um verdadeiro “via crucis” por motivos como: acordar muito cedo, suportar longos períodos de espera na fila, bem como as situações de humilhação durante a revista. O depoimento de uma menina de quatro anos exemplifica essa situação: “... a gente abaixa e levanta três vezes, é igual fazer xixi.”. Além disto, foi mencionado o tratamento dado pelos agentes penitenciários, as dores de barriga apresentadas pela longa espera, para finalmente poder ver o pai. As mães apontaram que as crianças acabavam dormindo após a espera. A autora atribuiu este comportamento ao desgaste psicológico sofrido, somandose à falta de diálogo, acabando por induzir ao sono como forma de se preservar. O estudo de Santos (2006) alerta para a importância de se proporcionar cuidado especial para esta população “invisível”, que a cada dia cresce mais. Deve-se estar atento às necessidades da criança de manter contato com suas principais figuras de ligação (mãe/pai) e, ao mesmo tempo, protegê-la perante esta situação que pode ser considerada como uma forma de maus-tratos contra estas crianças (Santos, 2006). Schilling e Miyashiro (2008) discutem como pode ser enfrentada a educação inclusiva nas escolas, já que esta sempre foi direcionada para os indivíduos com necessidades especiais (cognitivas, motoras ou perceptivas), uma vez que o cenário mudou, sendo necessário incluir nesse grupo outros indivíduos que também apresentam necessidades, como as minorias e os filhos de encarcerados. O estudo de cunho qualitativo baseou-se nos depoimentos referentes ao estigma abordados na dissertação da segunda autora envolvendo apoio da Pastoral Carcerária. Assim, foram realizadas entrevistas com seis filhos que tinham ou tiveram pai/mãe encarcerados, sendo cinco mulheres com idades entre 14 e 26 anos e um rapaz de 21anos. O conteúdo das entrevistas apontou que o estigma que uma pessoa em situação de encarceramento enfrenta acaba sendo ampliado para pessoas com as quais o encarcerado (a) tenha um relacionamento direto. Ou seja, a sociedade os vê como o filho, a mulher, a família do “preso”. Desta forma, ser filho de preso acaba tendo um grande peso. As autoras fazem uma reflexão no sentido de rever como esta situação pode ser avaliada no âmbito da escolar. Stella (2009a) realizou um estudo retrospectivo com filhos de mulheres encarceradas que moravam com a mãe na época da prisão e freqüentavam a

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escola. Fizeram parte do estudo quatro rapazes e duas moças com idade média de 21 anos. Os participantes foram indicados pelas suas próprias mães, que estavam reclusas na penitenciária feminina de São Paulo, na época da realização do estudo. Foi realizada uma entrevista na qual os participantes relatavam sua história de vida desde a infância, questões sobre violência, qualidade da escola, preconceito, religiosidade e criminalidade. Baseando nos resultados, a autora concluiu que a prisão materna pode deixar a criança em situação de vulnerabilidade, o que se reflete na socialização que é promovida pela escola, provocando, por exemplo, ausência de motivação para o processo de aprendizagem por estar envolvida com os problemas familiares, e/ou possível deficiência de um acompanhamento sistemático do seu desenvolvimento, o que a pode levar a apresentar inúmeras dificuldades, como múltiplas repetências escolares, desmotivação, baixo rendimento e evasão escolar. Num segundo momento, com a mesma metodologia e com os mesmos participantes do estudo anterior (Stella, 2009a), Stella (2009b) analisou a importância do papel da mãe encarcerada sobre a socialização de seus filhos. Todos os participantes residiam com a mãe ou com a família materna na época do encarceramento. A autora apontou três aspectos importantes na internalização dos sentimentos dos indivíduos: 1) a figura materna criada entre a figura mítica de mãe e a “delinquência” materna; 2) a culpa que os indivíduos sentiam pela “delinquência” materna; e 3) a responsabilização da mãe sobre o abandono sofrido na infância. Embora estes aspectos afetassem a socialização dos filhos dessas mulheres, podendo até ser influenciados pela criminalidade e prisão materna, a autora concluiu que os filhos de mulheres encarceradas podem sofrer, de forma menos intensa, se tivessem a oportunidade de vivenciar a maternagem com outro cuidador. Pesquisas e intervenções com filhos de encarcerados na América do Norte Greene, Hayne & Hurtodo, 2000 realizaram um estudo com 102 mães encarceradas em três unidades prisionais no Estado da Califórnia, nos Estados Unidos, no qual foi investigado a relação dos fatores de risco experienciados na infância por mulheres presas e os riscos aos quais seus filhos estavam expostos. Os resultados apontaram que 86% das mães e 83% das crianças estiveram expostas a maus-tratos na sua infância. Os principais tipos de maus-tratos experienciados por esta população incluíram: assistir episódios de violência intrafamiliar (60% das mães e 69% das crianças); sofrer abuso físico (65% das mães e 44% de seus filhos) e sofrer abuso sexual (55% das mães e 9% de seus filhos), evidenciando a relação intergeracional dos maus-tratos durante a infância. O estudo de Byrne, Goshin & Joestl, 2010 teve como objetivo analisar o apego de crianças que co-residiam na maternidade de New York State Department of Correcional (NYS DOCS) (Departamento de Serviços Prisionais de Nova Iorque). As mães responderam à Adult Attachment Interview (Entrevista de

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Apego em Adultos) (Bretherton, Ridgeway, et al., 1990); e ao Strange Situation Procedure (Procedimento de Situação Estranha) (Gomille, Loening & Vetter, 2002). Participaram do estudo 30 díades de mães/bebês que foram dividas em dois grupos separados por tempo de prisão e co-residência. A intervenção durante o período do encarceramento materno consisitiu em visitas semanais por uma enfermeira, nas quais eram trabalhados temas como: desenvolvimento infantil, habilidades parentais positivas, finalidade da maternidade, dentre outros. Eram também consideradas as principais preocupações e inquietações das participantes. Foram gravadas oito sessões lúdicas não estruturadas em uma sala desconhecido da criança com brinquedos adequados à sua faixa etária. Nesta situação, a criança era exposta a partidas e saídas da mãe e a estranhos por um período de aproximadamente 20 minutos. Os resultados apontaram que 60% dessas crianças foram classificadas como apresentando apego seguro. Dessas, 75% co-residiram um ano ou mais com sua mãe. Das crianças que co-residiram menos de um ano, 43% também apresentaram apego seguro, dados semelhantes quando comparados com os resultados da amostra normativa, segundo os autores. Além disso, os filhos que co-residiram com as mães ao longo de um ano apresentaram senso de segurança mais significativo e organizado. Esses resultados apontaram que, embora as mães se encontrassem em uma situação vulnerável, a proporção de apego seguro apresentada pelos filhos era maior do que a apresentada por filhos de mães de baixa renda, ou com histórico depressivo, ou abuso de álcool e drogas. O estudo de Byrne et al. (2010) foi o primeiro a apontar que mães encarceradas podem cuidar de seus filhos na prisão de forma benéfica para a criança. Poelhmann (2005a) analisou as relações de apego em 54 crianças com idades entre 2,5 e 7,5 anos, cujas mães encontravam-se encarceradas em cadeias de segurança média no Centro-Oeste dos Estados Unidos. Para isto, foram aplicados testes (Standford-Binet, Children’s Representations of Attachment Relationships – CRAR) (Bretherton, Ridgeway, et al., 1990), entrevistas semi-estruturadas e vídeo-gravações com as mães, com as crianças e seus cuidadores. Os resultados das crianças não foram surpreendentes em virtude da condição de alto risco: a maioria (63%) foi classificada como tendo um relacionamento inseguro com suas mães e cuidadores. A autora apontou que relacionamentos mais seguros eram mais prováveis ​​quando as crianças viviam em uma situação estável de cuidado, quando reagiram à separação da mãe com tristeza (ao invés de raiva) e quando as crianças eram mais velhas. A reação mais comum associada à separação inicial da mãe era tristeza, medo, confusão, raiva, solidão, problemas de sono e comportamentos regressivos. Os resultados reforçaram a necessidade de apoio às famílias afetadas pela prisão materna, especialmente aumentandose os esforços para promover a estabilidade e a inserção das crianças em novos ambientes. Além disto, o estudo salientou a importância de pesquisas longitudinais para um melhor entendimento desta população.

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No estudo de Trice e Brewster (2004), as autoras examinaram aspectos relativos à frequência, atenção, condutas impróprias na escola, na comunidade e o comportamento apresentado na família, assim como, as possíveis detenções por parte de adolescentes cujas mães estavam encarceradas na prisão estadual da Virgínia, nos Estados Unidos. Os dados são relativos a 58 adolescentes, com idades entre 13 e 19 anos (28 meninos e 30 meninas), sendo 30 adolescentes afrodescendentes e 28 caucasianos. Para realização do estudo foram entregues questionários para as mães encarceradas sobre seus filhos (58 adolescentes). Adicionalmente, os cuidadores dos filhos responderam a um questionário de 13 itens que abordava aspectos positivos e negativos relacionados ao comportamento dos adolescentes na escola e na comunidade. Em 84% dos casos, os cuidadores devolveram os questionários respondidos. Adicionalmente, foi solicitado que os pais dos melhores amigos dos adolescentes respondessem ao mesmo questionário respondido pelos cuidadores. Os resultados apontaram que 36% dos adolescentes havia abandonado a escola e a maioria abandonou quando era mais velho, sendo que o mesmo havia acontecido com as respectivas mães no passado para um número expressivo desses adolescentes. O estudo reforça a idéia que filhos de mães encarceradas podem possuir um alto risco para desenvolver problemas e desajustes na escola, na comunidade e no lar. A pesquisa de Dallaire, Ciccone e Wilson (2010) aborda a compressão de professores sobre crianças cujos pais e/ou mãe estivessem encarcerado. Tal pesquisa foi desenvolvida em dois estudos diferentes. No primeiro, descritivo e qualitativo, foram discutidas as experiências dos professores com alunos cujos pais estavam encarcerados; o segundo (de cunho experimental) teve o objetivo de avaliar as expectativas dos professores com relação ao sucesso ou fracasso escolar. Participaram do primeiro estudo 30 professores e do segundo estudo 73 professores. Foram utilizados: dois instrumentos (Questionário Demográfico e Questionário Aberto e Fechado) que não foram descritos pelos autores, sobre as experiências desses professores de crianças com pais encarcerados. Os participantes caracterizaram os lares das crianças com pai e/ou mãe encarcerado (seus alunos), como sendo mais caóticos do que os de seus pares e notaram que essas crianças demonstravam reações comportamentais e emocionais em sala de aula. Além disto, o estudo apontou que as crianças cujas mães estavam encarceradas pareciam estar em maior desvantagem do que aquelas cujos pais estavam presos. Outro ponto levantado diz respeito à idade das crianças: crianças pequenas pareciam ser mais vulneráveis aos efeitos do encarceramento do que as crianças mais velhas, por conta de suas necessidades de desenvolvimento e por terem tido maior probabilidade de testemunharem a prisão, tal como descrito no segundo estágio do desenvolvimento por Johnston (1995). O estudo de Dallaire, Ciccone e Wilson (2010) indicou que professores do Ensino Fundamental pareciam ter maior probabilidade de estar atentos à prisão dos pais de algum aluno, do que professores do Ensino Médio. Estigmas e reputação podem afetar negativamente as crianças de pais encarcerados em

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razão do efeito na percepção e expectativa dos outros em relação a essa criança. Os professores que, randomicamente, avaliaram uma aluna fictícia a partir da informação de que sua mãe estava encarcerada, avaliaram-na como menos competente do que os professores que, randomicamente, avaliaram a mesma aluna a partir da informação de que a mãe estava ausente por outros motivos que não a prisão. Com relação a pesquisas com crianças e familiares dos encarcerados, Shlafer e Poehlmann (2010) realizaram um estudo longitudinal com 57 famílias de crianças que participaram de um programa de orientação para crianças de pais encarceradas, com idades de 4 a15 anos. O objetivo do estudo foi analisar o relacionamento das crianças com seus cuidadores e/ou pais encarcerados. Para tal, foram realizadas entrevistas mensais com as crianças, seus cuidadores e mentores, durante os primeiros seis meses de participação no programa. Além disto, foram aplicados os seguintes instrumentos: The Inventory of Parent and Peer Attachment (IPPA) (Armsden, 1986; Armsden & Greenberg, 1987), Revised Inventory of Parent Attachment (R-IPA) (Johnson, Ketring, & Abshire, 2003), Child Behavior Checklist (CBCL) (Achenbach, 1991) e Teacher Report Form (TRF) (Achenbach, 1991), no inicio e no final do estudo para avaliar a relação da criança com seu cuidador e a relação da criança com seu pai encarcerado, bem como, os problemas de comportamento apresentados pelas crianças. Os resultados mostraram que, embora algumas crianças apresentassem uma relação de apego positivo, outras crianças relataram sentimentos negativos, ou nenhuma relação com seu pai encarcerado. Contudo, quando as crianças eram questionadas diretamente sobre sua relação com seu parente encarcerado, mais de um terço (39%), não discutiu o vínculo durante a entrevista, esquivando-se de responder sobre esse tema. Além disso, as informações relativas às crianças de nove anos ou mais revelaram que a ausência de contato com o parente encarcerado estava associada à sensação de alienação em relação a esse parente, em comparação com as crianças que possuíam contato. Os autores encontraram uma tendência a maior comunicação positiva das crianças com seus cuidadores no início do estudo, e isto se manteve após os seis meses de intervenção, sugerindo que a intervenção uniu e melhorou a relação dos pais encarcerados com seus filhos. Outro dado importante diz respeito aos problemas de comportamento apresentados pelas crianças, que aconteceu num contexto relacional ou na reação ao estigma social associado à prisão dos pais. Avaliações de intervenções No que diz respeito a trabalhos de intervenção com filhos (as) de mulheres em situação de encarceramento, um programa estabelecido e mais referenciado na literatura americana é o desenvolvido por Block e Potthast (1998): “Girl Scouts Beyond Bars” desenvolvido para mães encarceradas e suas filhas. O objetivo dessa

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intervenção é proporcionar o aumento e melhoria das visitas entre mães e filhas para preservar o relacionamento, reduzir o estresse de separação entre elas e aumentar a percepção das filhas sobre si mesmas, assim como, minimizar a falta da mãe perante a comunidade na qual estava inserida. O Programa é voltado para filhas de encarceradas com idades entre sete e 17 anos moradoras da cidade de Baltimore. Os encontros acontecem quinzenalmente aos sábados pelas manhãs. Durante as sessões de grupos, mães e filhas realizavam diversas atividades, projetos que são desenvolvidos por várias semanas, nos quais são abordados assuntos como gravidez na adolescência, uso de drogas, utilizando sempre a técnica de role-play. Como resultados, o programa possibilitou o aumento do número e da regularidade das visitas, bem como a qualidade da interação mãe-filha durante tais visitas. Os relatos das mães e cuidadores apontaram para uma diminuição dos problemas apresentados pelas filhas, tais como tristeza, raiva, havendo também uma maior preocupação das filhas com a situação de suas mães. Poehlmann (2005b), em um segundo estudo, buscou responder se mães encarceradas estabeleciam relações entre as experiências de separação de suas crianças (separações prematuras, frequência de visitas e telefonemas) e seus sintomas depressivos. Para esse trabalho foram escolhidas 98 mulheres encarceradas de prisões estaduais de segurança mínima e média nos Estados Unidos. Dentre essas, 94 mulheres aceitaram participar do estudo. As mães tinham filhos entre dois e sete anos de idade. Para a coleta de dados, foram aplicados os seguintes instrumentos: Inventário de Sentimentos Familiares (Family Feelings) (Lowman, 1980), Entrevista Semi-estruturada a respeito de Trauma, Violência e Separações Prematuras e Inventário de Depressão CES–D (Center for Epidemiological Studies - Depression Scale) (Radloff, 1977) e um questionário com duas questões abertas (Quais foram seus sentimentos quando você foi separada de seu filho(a) por causa da prisão? Como você esta lidando com a separação agora?). As mães participaram de aulas de habilidades parentais, que não foram descritas pelo autor da pesquisa. Para cada mãe que participou do estudo, um brinquedo foi doado para a instituição prisional para que pudesse ser usado nas visitas das crianças às mães. A análise qualitativa revelou que a maioria das mães experenciou estresse intenso em razão da separação de seus filhos, ao passo que algumas mulheres revelaram uma situação mais balanceada em relação ao estresse. Os achados quantitativos indicaram que as poucas visitas que as mães recebiam, estavam associadas à experiência de separação precoce e o trauma resultante estava relacionado aos sintomas depressivos dessas mães. A relação mãe-filho era mais positiva quanto maior a frequência de telefonemas com seus filhos mais velhos. Além disso, quando existiam relacionamentos conflituosos entre os cuidadores e a mãe, essas relatavam ter um menor contato com seus filhos. A pesquisa demonstrou que as mães encarceradas apresentavam altos níveis de sintomas depressivos, múltiplas experiências traumáticas, perda do relacionamento e pouco contato com as crianças durante o encarceramento. Este estudo apontou

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três resultados importantes: 1) a visita das crianças e a relação maternidade na adolescência como não estando associados à saúde mental de mães encarceradas; 2) a relação existente entre os contatos telefônicos com as crianças e durante o processo de encarceramento materno e a qualidade do relacionamento entre a mãe-criança; e 3) a relação entre mãe-cuidador e da mãe encarcerada com seus filhos. Os resultados destacaram a importância dos Serviços de Saúde Mental para as mulheres encarceradas e sugeriram que as intervenções devam priorizar o aumento do contato entre mãe e filhos, sendo importante, também, melhorar a qualidade das relações dos cuidadores com as mulheres encarceradas. Políticas Públicas para filhos de encarceradas no Brasil Considerando-se o aumento do número de mulheres ingressantes no sistema prisional brasileiro, o governo brasileiro vêm implementando e aumentando o número de novas unidades destinadas à população feminina (Secretaria de Administração Penitenciária, 2009). A constituição brasileira resguarda o direito dessas mães (Lei nº 7.210/84) a permanecerem com os filhos até os quatro anos de idade, caso estejam desamparados em decorr~encia da prisão, com a previsão de prisões específicas para mulheres, dotadas de creches e locais para amamentação. Apesar de a Lei ser de 1984, apenas recentemente foi divulgada a construção de penitenciárias planejadas para o público feminino, dotadas de creches, salas para amamentação, playgrounds para visita das crianças, além de que, nessas unidades, as mães poderão permanecer seis meses com os bebês (Secretaria de Administração Penitenciária, 2009). No entanto, segundo o Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) (2008), no relatório do diagnóstico brasileiro da mulher encarcerada, a realidade é diferente, uma vez que em apenas 19,61% dos estabelecimentos penais federais femininos há berçários ou estruturas separadas das celas, nas quais a mãe está detida. Com relação à existência de berçários e/ou creches nas unidades, a condição é mais complexa, pois apenas 16,13% dos casos possuíam este tipo de estrutura (DEPEN – Departamento Penitenciário Nacional, 2008). Com relação ao tempo de permanência da criança junto com a mãe durante o encarceramento, este pode variar de seis meses até seis anos dependo do Estado onde esta localizada a unidade prisional, sendo que em 63% das unidades, as crianças ficam até os seis meses de vida (Santa Rita, 2009). A Unidade Materno Infantil Madre Teresa de Calcutá, no Complexo Penitenciário de Bangu, Rio de Janeiro, exemplifica tal situação. Nesta unidade são atendidas mulheres que tiveram o bebê enquanto cumpriam pena, ou foram presas e tinham bebês com idade inferior a seis meses. Mães e bebês ficam em alojamento comunitários, mas sem grades, até o mesmo completar seis meses de idade, tal como determinado pela Vara de Infância e do Adolescente. Depois de completado esse tempo, o bebê, na maioria das vezes, fica sob custódia de familiares maternos. Nas situações em que a encarcerada não possui um familiar que possa cuidar do bebê, esse é

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encaminhado para uma instituição do Estado, até que a mãe cumpra sua pena (Secretária de Administração Penitenciária, 2009). Um dado importante é que a mulher encarcerada geralmente tem filhos antes de ingressar no sistema carcerário (DEPEN – Departamento Penitenciário Nacional, 2008; Canzaro & Argimon, 2010; Ormeño & Williams, 2011) e, tal como apontado pelo Censo Penitenciário (DEPEN – Departamento Penitenciário Nacional, 2008), esses ficam em quase 80% dos casos sob a custódia de familiares maternos da detenta. Desta forma, as crianças acabam tornando-se uma responsabilidade inesperada à família da detenta e, em muitos casos, ficam expostas aos mesmos fatores de riscos aos quais suas mães estiveram quando criança, sendo que para os filhos de mulheres encarceradas não há Política Pública direcionada. A situação da criança “encarcerada” é complexa já que, se por um lado ela precisa ficar perto do amparo materno visando o desenvolvimento do apego seguro (Gabel & Johnston, 1995), por outro lado essa criança pode muitas vezes ficar exposta a ambientes inadequados e insalubres (DEPEN – Departamento Penitenciário Nacional, 2008). Uma política implantada pelo Ministério da Previdência Social (2011) é o auxílio reclusão que tem como objetivo ajudar no sustento aos dependentes do encarcerado. No entanto, para poder usufruir desse benefício, a família do encarcerado necessita comprovar que o detento estava segurado antes do encarceramento e, além disto, ter recebido um salário mensal que varie de R$ 560,81 a R$ 862,113 e não receber benefícios da empresa a qual estava afiliado. No levantamento aqui realizado, encontrou-se apenas uma entidade não governamental, no Brasil, que oferecia assistência a filhos de encarcerados. O Movimento de Assistência aos Encarcerados de São Paulo (2011) tem como objetivo abrigar crianças e adolescentes carentes e filhos de encarcerados, no período em que o lar, por motivo de prisão de um dos genitores, estiver desfeito ou sem condições de fornecer a necessária assistência à criança ou adolescente. Essa instituição conta com duas casas: uma destinada para crianças com idades entre 0-12 anos e a outra para adolescentes de 12-18 anos. Em maio de 2011 foram atendidas 54 crianças, segundo o Movimento de Assistência aos Encarcerados de São Paulo (2011). Outra instituição brasileira que presta assistência aos encarcerados e consequentemente, aos seus familiares, é a Pastoral Carcerária que trabalha há mais de 20 anos e tem objetivos religiosos, além de zelar para que os Direitos Humanos no sistema prisional sejam respeitados. Embora o objetivo principal da Pastoral Carcerária não seja os filhos de presidiários, a instituição acaba sendo um meio de apontar as dificuldades que esses enfrentam. Apesar de voltada para todas as pessoas privadas de liberdade, a Pastoral vem dando atenção particular às mulheres que estão grávidas durante o encarceramento. Cabe ressaltar que 3

O equivalente a $311 a $ 478 dólares americanos.

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essas entidades realizam um trabalho assistencial, na falta de implementação de Políticas Públicas voltadas, tanto para filhos de pais encarcerados, quanto para os próprios encarcerados. Considerações Finais Não se pode desconsiderar a relevância e complexidade da questão dos filhos de mães e/ou pais encarcerados, em virtude das consequências do encarceramento para o desenvolvimento saudável na infância e na vida adulta, bem como por fatores que contribuem para intergeracionalidade do fenômeno do encarceramento. Na revisão da literatura aqui conduzida foi encontrado um maior número de estudos sobre a temática na literatura norte-americana, havendo um número considerável de estudos de mães encarceradas, visto que na meta-análise de Poehlmann et al. (2010), das 35 pesquisas descritas, 16 (ou 47,2%) enfocavam as mães encarceradas. Houve uma predominância também de estudos descritivos, o que preconiza a necessidade de avaliações de intervenções sistemáticas com esta população. No Brasil, os filhos de encarcerados compõem uma população esquecida, tanto pelo governo quanto pelos estudiosos, o que é refletido pela existência de poucos estudos com essa população no âmbito nacional, bem como de dados oficiais sobre o fenômeno. Reitera-se a importância de se obter e disponibilizar dados nacionais de quantas crianças e adolescentes estão separadas de seus pais/ mães pelo encarceramento e qual o perfil dessas crianças, pois dessa forma poderá ser conhecida a real dimensão do problema e, assim desenvolver e implementar Políticas Públicas. Conforme destacado anteriormente, cabe ressaltar que, apesar de haver no Brasil uma lei que assegure o direito de as mães encarceradas permanecerem com seus filhos (Lei nº 7.210/84), uma pequena parte dos estabelecimentos prisionais brasileiros possui estrutura para tal, embora as novas construções de unidades prisionais estejam prevendo esta necessidade. Além de todas as dificuldades apontadas no estudo de Cunningham e Baker (2003), as autoras mostraram que, no caso de as crianças serem filhos de mães inseridas no sistema carcerário, os problemas se agravam, pois na maioria dos casos, a mãe é o principal e único cuidador. Assim, por este motivo, os filhos precisam modificar a rotina, mudando de escola, de cuidador, de cidade, entre outras mudanças. No caso do pai encarcerado, as crianças apresentam outros tipos de dificuldades, como a falta de dinheiro, mudança na rotina familiar e estresse (Poelhmann, 2005b). No entanto no caso de filhos de mães ou pais encarcerados, um dos maiores problemas enfrentados é o estigma social que esses sofrem ao lidarem com a situação. Tal estigma é agravado pela tendência social a esperar resultados negativos dos comportamentos desses filhos de encarcerados, ressaltando a expectativa intergeracional em expressões populares como: “Filho de peixe, peixinho

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é”, ou “Quem sai aos seus não degenera”. Considerando o aumento da população carcerária e, em especial, o da população feminina, é preciso que sejam realizadas pesquisas sistemáticas de prevenção primária direcionadas a crianças, principalmente para aquelas que se encontram no segundo e terceiro estágio de desenvolvimento, em virtude das consequências do encarceramento parental nessa fase. Presenciar ou ter um de seus progenitores na prisão pode ser um fator de risco para o ingresso no mundo criminal. Portanto, se faz necessário caracterizar e descrever em qual estágio as crianças se encontram e realizar intervenções sistemáticas com o intuito de diminuir possíveis problemas já instalados, visando diminuir os riscos de que essas crianças ou adolescentes se tornem a próxima geração de encarcerados, por estarem expostos aos mesmos fatores de risco do que seus pais. É importante ressaltar que a produção brasileira sobre a temática de filhos de encarcerados vem aumentando, embora vagarosamente. Os estudos ainda se apresentam em número limitado, e com número reduzido de participantes e metodologia sem a utilização de instrumentos validados. Desta forma, considerando a falta de estudos no âmbito Brasileiro, é imprescindível a elaboração de pesquisas e intervenções sistemáticas nos ambientes nos quais às crianças estão inseridas, como, a família e escola, pois essas instituições não estão preparadas para lidar com tal situação. Tais trabalhos teriam como objetivo minimizar as consequências traumáticas enfrentadas pelas crianças, bem como o incremento dos fatores protetivos e diminuição dos possíveis fatores de riscos presentes nos contextos nos quais elas estão inseridas, estimulando o processo de resiliência. Ormeño e Williams (2006) apontaram que se o ambiente no qual a criança esta inserido for coercitivo e não sofrer mudanças, a criança irá se comportar seguindo os mesmos padrões aos quais está habituada. Isto confirma o apontado por Holland (1978): “O comportamento é resultado de contingências e mudanças de comportamento duradoras envolvem alterações de contingências que dão origem ao comportamento e o mantêm” (p.3). Outro ponto que necessita ser mais bem investigado em futuras pesquisas refere-se a interação entre os filhos e seus pais/mães encarcerados. Byrne et al. (2010) foram pioneiros em apontar que mães encarceradas podem cuidar de seus filhos na prisão de forma benéfica para a criança. A questão do contato entre filhos e mães/ pais encarcerados envolve pontos positivos e negativos, assim como destacado por Poehlmann et al. (2010), devendo ser analisada de forma não preconceituosa e estigmatizante. Outro ponto que poderia ser analisado por futuras pesquisas é o impacto de tais interações ao processo de ressocialização de seus pais. Pensar nas necessidades e carências dos filhos de encarcerados (as) possibilitaria agir preventivamente, rompendo o ciclo de violência e possivelmente evitar futuros encarceramentos, um problema cada vez maior na sociedade brasileira. Sendo assim, se faz imprescindível uma atenção para os filhos de encarcerados, especialmente dos filhos das mulheres, pois esses ficam expostos a maiores fatores de risco ao ficarem sem seu principal cuidador.

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Características psicométricas da versão Portuguesa do Inventário da Percepção dos Professores acerca da Melhoria da Escola (Leithwood e col., 2006) Psychometric properties of the Portuguese version of the School Improvement Teacher Survey (2006) Adelaide Dias Observatório da Melhoria e Eficácia da Escola; Universidade Lusíada do Porto

João Tiago Oliveira CIPD; Universidade Lusíada do Porto

Paulo A.S. Moreira CIPD; Observatório da Melhoria e Eficácia da Escola, Universidade Lusíada do Porto

Contacto para correspondência: Paulo A.S. Moreira paulomoreira@por.ulusiada.pt

Resumo: As percepções dos professores acerca dos esforços de melhoria da escola são um indicador importante para a monitorização e avaliação dos mesmos. Por isso, a existência de instrumentos de avaliação desta dimensão com características psicométricas adequadas é de grande relevância. O objectivo deste estudo foi avaliar as características psicométricas da versão portuguesa do

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School Improvement Teacher Survey (SITS; Leitwood e col., 2006), o Inventário da Percepção dos Professores acerca da Melhoria da Escola (IPPME). Participaram neste estudo 472 professores de agrupamentos de escolas de três municípios do Norte de Portugal. Foram encontrados 3 factores na versão portuguesa do School Improvement Teacher Survey. Ao nível da fidelidade, todas as escalas apresentam valores de alpha de Cronbach acima de .82 (entre .82 e .95) valores consistentes com os da versão original. Os resultados deste estudo sugerem que a versão Portuguesa do instrumento apresenta características psicométricas adequadas para a avaliação das percepções dos professores acerca dos esforços de melhoria. Palavras-chave: Percepção dos professores; características psicométricas; melhoria da escola; eficácia da escola. Abstract: Teachers’ perceptions about school improvement efforts are important indicators for monitoring and evaluation of improvement efforts. Therefore, the existence of evaluation instruments for the assessment of teachers’ perceptions of school improvement instruments are of great importance. The aim of this study was to evaluate the psychometric characteristics of the Portuguese version of the School Improvement Teacher Survey (SITS; Leitwood, et al., 2006). The study had the participation of 472 teachers, from three municipalities of the North of Portugal. In the Portuguese version of the School Improvement Teacher Survey three factors were found. Regarding fidelity, all scales have Cronbach’s alpha values above .82 (between .820 and .954), which are consistent with those of the original version. The results of this study suggest that the Portuguese version of the instrument presents adequate psychometric characteristics for its use in assessing teachers’ perceptions about school improvement efforts in the Portuguese population. Key-Words: Teacher’s perceptions; psychometric properties; school improvement; school effectiveness.

Introdução Nos últimos anos existe uma preocupação crescente por parte da comunidade científica em identificar os elementos característicos da escola que contribuem para a melhoria do desempenho académico dos alunos e identificar o que deve e o que pode ser feito para se conseguir melhorar uma escola (Fin & Achilles, 1999; Stoll e Fink, 1996). Os primeiros estudos sobre os efeitos da escola foram realizados por Coleman et. al (1966), cujos resultados demonstraram que a escola tinha pouco efeito no desempenho dos alunos, quando comparado com os efeitos produzidos

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por factores como o contexto socioeconómico ou factores de natureza étnica. Contudo, o desenvolvimento da investigação educacional tem permitido concluir que ao desmontar-se os processos e dinâmicas que compõe a escola (e.g. Brookover, 1979), mostra-se que o efeito da escola, pode e deve ser analisado através do impacto produzido pelas mudanças introduzidas pela escola (e.g. Rutter, Mortimore & Ouston, 1979), dando origem ao movimento conhecido, internacionalmente, como School Effectiveness. Este movimento procura determinar as diferenças entre as escolas para se perceber em que é que uma escola se diferencia da outra, tornando-a mais eficaz. Paralelamente aos estudos sobre a eficácia da escola, surgem também os estudos acerca da melhoria da escola. A melhoria da escola define-se como uma estratégia de mudança educativa que embora valorize a melhoria dos resultados dos alunos, procura o reforço das capacidades escolares para tratar a mudança educacional que permitirá que a melhoria dos resultados se mantenha constante no tempo (Hopkins, 1995). Modelo de Melhoria e Eficácia da Escola Leithwood, Jantzi e MCElheron-Hopkins (2006) propõem um modelo multidimensional de avaliação do processo de melhoria da escola. A partir de um estudo longitudinal de 5 anos envolvendo pais, professores, alunos e directores de 10 agrupamentos de escola do Canadá, Leithwood et al (2006), identificaram os factores que têm impacto na melhoria dos resultados académicos, o que permitiu identificar as principais variáveis que têm impacto para o processo de melhoria da escola (ver Figura 1). Figura 1. Modelo de melhoria e eficácia da escola

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Adaptado de Leithwood, Jantzi e MCElheron- Hopkins ( 2006). Development and Testing of a school Improvement Model. School Effectiveness and School Improvement, 17 (4), 448 A Figura 1 é uma representação geral do modelo onde se encontram identificadas as variáveis que influenciam o processo de melhoria da escola e a relação entre essas variáveis (Leithwood e col, 2006). As variáveis numeradas de 1 a 4 são as variáveis centrais ou principais do processo de melhoria da escola. Um conjunto de factores (como por exemplo: fraco rendimento académico; reduzido envolvimento dos alunos com a escola; fraco envolvimento parental; baixas expectativas dos pais e dos alunos em relação à escola) ou pressões (nomeadamente pressões externas que visam a melhoria dos resultados académicos dos alunos) conduzem à necessidade de elaboração de um plano de melhoria da escola (variável 1) que tem um conteúdo e estratégias próprias e diferenciadores (variável 2), atendendo-se às necessidades e prioridades identificadas na escola. O plano de melhoria da escola pretende alcançar um conjunto de objectivos previamente definidos e que têm impacto nos resultados que se pretende alcançar (variável 4). No entanto, as estratégias desenvolvidas e implementadas (variável 3) também contribuem para os resultados. A monitorização (variável 5) e a comunicação (variável 6) (variáveis determinantes para o processo de melhoria da escola) que devem ser desenvolvidas desde o início do processo de melhoria da escola, envolvendo toda a comunidade educativa. As últimas 5 variáveis identificadas no modelo representam os agentes educativos cujas acções têm impacto no sucesso do plano de melhoria e na melhoria e eficácia educativa. Face à diversidade cultural e à comunidade educativa heterogénea que caracterizam as escolas em circunstâncias especialmente difíceis e num contexto de responsabilização para com a educação, com a procura contínua da melhoria e eficácia educativa, o modelo de melhoria e eficácia da escola assume particular importância na explicação dos processos envolvidos na melhoria da escola (Leithwood e col, 2006). Indicadores de melhoria e eficácia da escola Tradicionalmente, as trajectórias académicas centram-se apenas em indicadores de desempenho cognitivo (por exemplo as notas obtidas pelos alunos nos testes) (Ainscow, 2010). No entanto, esta visão redutora e tradicionalista das trajectórias académicas tende a ser ultrapassada dado o reconhecimento das trajectórias académicas como fenómenos multicomponenciais (incluindo diversos indicadores de funcionamento). A perseguição de níveis elevados de eficácia educativa requer a valorização de outros indicadores de domínios de funcionamento como resultado da acção da escola (que se deseja que promova um desenvolvimento holístico dos

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estudantes). Por outras palavras, a avaliação dos esforços de melhoria da escola requer não apenas a avaliação do seu impacto nos níveis de desempenho, como em outros domínios de funcionamento e em dimensões que embora não sendo resultados académicos, são mediadores dos mesmos (Leithwood, Harris & Strauss, 2010). Aqui, se incluem os indicadores de funcionamento dos agentes envolvidos na edução, dinâmicas interpessoais (ex. interacção professor aluno (Brophy & Good, 1986), envolvimento parental, envolvimento da comunidade (Chapman & Allen, 2005), clima social, etc.), processos de ensino-aprendizagem (ex. frequência e características de estratégias de promoção do sucesso escolar) (Creemers & Kyriakides, 2010), desempenho académico (Clark, 2002). Sendo, os professores agentes privilegiados dos esforços de melhoria, as percepções que os mesmos têm acerca dos esforços de melhoria são um importante indicador do processo de melhoria (Kyriakides, Creemers, Antoniou & Demetriou, 2010). Reconhecendo a importância dos diferentes indicadores, neste trabalho abordou-se especificamente as percepções dos professores acerca dos planos de melhoria da sua escola (Figura 2). Figura 2. Relações entre os diferentes agentes educativos e indicadores de melhoria da escola

No entanto, a investigação tem demonstrado que os instrumentos disponíveis para avaliar os esforços de melhoria da escola apresentam limitações metodológicas, nomeadamente ao nível das suas características psicométricas como validade e fidelidade (e.g. Geijsel, Sleegers, Stoel, & Krüger, 2009). Assim, o presente estudo teve como objectivo avaliar as características psicométricas da

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versão portuguesa do School Improvement Teacher Survey (Leithwood e col, 2006). Metodologia Participantes Participaram neste estudo 472 professores que leccionam nos agrupamentos de escolas pertencentes a 3 municípios da região Norte de Portugal. Os participantes apresentam idades compreendidas entre os 23 e os 61 anos (M= 41.49; SD=8.066). Destes 472 participantes, 362 são do género feminino (M= 76.7; SD=10.15) e 110 do género masculino (M=23.3); SD= 2.04). Instrumento Inventário de Percepção dos Professores acerca da Melhoria da Escola (IPPME). Foi utilizada a versão portuguesa e experimental do School Improvement Teacher Survey (Leithwood e col, 2006) que avalia a percepção dos professores em relação aos esforços de melhoria da escola. O School Improvement Teacher Survey (Leithwood e col, 2006) é constituído por 57 itens que se encontram divididos em 2 partes: a primeira parte, constituída por 1 item que avalia a fase em que se encontra o processo de melhoria da escola. Neste item são apresentados 4 possibilidades de resposta, em que os indivíduos devem responder em que fase se encontra o processo de melhoria da sua escola de acordo com as seguintes possibilidade: a) Desenho/planeamento inicial; b) Implementação inicial; c)Implementação/revisão/monitorização/ avaliação em curso; d) Institucionalização, isto é, as rotinas de trabalho da escola integram o plano de melhoria da escola (Tabela 1). Tabela 1. Descrição do IPPME: 1ªparte Escala Em que fase está o processo de melhoria da escola na sua escola?

Nº de itens 4

Itens Desenho/planeamento inicial, isto é, desenvolvendo o seu primeiro plano de melhoria da escola; Implementação inicial, isto é, implementando o seu primeiro plano de melhoria da escola; Implementação/revisão/monitorização/avaliação em curso, isto é, rever e adaptar (actualizar) o plano a eventuais novas prioridades e aferir o que funciona ou não na implementação das actividades; Institucionalização, isto é, as rotinas de trabalho da escola integram o plano de melhoria da escola.

A segunda parte do IPPME é constituída por 56 itens que se encontram divididos em 10 escalas pontuados de acordo com escala tipo Likert: (1) Concordo

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totalmente; (2) Concordo; (3) Nem concordo nem discordo; (4) Discordo; (5) Discordo totalmente e (6) Não aplicável. A primeira escala denomina-se por Avaliação geral do impacto do processo de melhoria da escola [IPPME-A] é constituído por 2 itens (e.g. O seu contributo para o plano de melhoria da escola tem sido positivo para a escola). A segunda escala denomina-se por Processo de melhoria da escola [IPPME-P] é constituído por 4 itens (e.g. Tem prioridade sobre outras actividades fora da escola).A terceira escala, constituída por 5 itens, denomina-se por Conteúdo do plano de melhoria da escola [IPPME-C] (e.g. Centra-se na melhoria da aprendizagem dos alunos). A quarta escala avalia a Implementação do plano de melhoria da escola [IPPME-I] é constituída por 4 itens (e.g. Permite lidar eficazmente com os problemas à medida que estes surgem). A quinta escala denomina-se por Monitorização do plano de melhoria da escola [IPPME-M] é constituída por 5 itens (e.g. É efectuada por um grupo liderado por pais e professores). A sexta escala avalia a percepção dos professores em relação à liderança da Direcção da Escola [IPPME-LD] é constituída por 11 itens (e.g. Desempenha um papel fundamental na liderança do plano de melhoria da escola). A sétima escala avalia a percepção dos professores em relação à Liderança do professor [IPPME-LP] e é composta por 11 itens (e.g. Desempenham um papel fundamental no esforço de melhoria da escola). A oitava escala denomina-se por Colaboração entre professores [IPPMECP] é constituída por 4 itens (e.g. Contribuem para o planeamento do processo de melhoria da escola; Trabalham juntos como uma equipa). A nona escala denomina-se por Resultados para os professores do esforço de melhoria da escola [IPPME-RP] é constituída por 7 itens (e.g. Tiveram um significativo aumento da carga de trabalho). A décima escala denomina-se por Resultados para os alunos do esforço de melhoria da escola [IPPME-RA] é composta por 3 itens (e.g. Programas mais ajustados às necessidades dos alunos) (Tabela 2). Tabela 2. Descrição do IPPME: 2ª parte Escalas

Nº Itens

Exemplo

Avaliação geral do impacto do processo de melhoria da escola [IPPME-A]

2

O seu contributo para o plano de melhoria da escola tem sido positivo para a escola

Conteúdo do plano de melhoria da escola [IPPME-C]

5

Centra-se na melhoria da aprendizagem dos alunos;

Implementação do plano de melhoria da escola [IPPME-I]

4

Envolve todos os membros da comunidade escolar

Monitorização do plano de melhoria da escola [IPPME-M]

5

É efectuada por um grupo liderado por pais e professores

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Liderança da Direcção da Escola [IPPMELD]

11

Considera prioritário o esforço professores na melhoria da escola

dos

Liderança do Professor [IPPME-LP]

11

Desempenham um papel fundamental no esforço de melhoria da escola

Colaboração entre professores [IPPME-CP]

4

Colaboram regularmente na tomada de decisões sobre o esforço de melhoria da escola

Resultados para os professores do esforço de melhoria da escola [IPPME-RP]

4

Mudaram as suas práticas na sala de aula

Resultados para os alunos do esforço de melhoria da escola (IPPME-RA)

3

Melhoria da aprendizagem dos alunos

A confiança interna (alpha de Cronbach’s) de todas as escalas são aceitáveis, variando de.72 a.96., no geral o modelo proposto consegue explicar 7% da variância do desempenho académico dos alunos (Leithwood e col, 2006). Procedimentos Foi dirigida uma carta às escolas, agrupamentos de escolas e professores dos três Municípios (Vila Nova de Famalicão, Penafiel e Maia) parceiros do Observatório da Melhoria e Eficácia da Escola (OMEE) a explicar os objectivos e relevância do estudo, a forma como acediam e preenchiam os instrumentos disponibilizados on-line e a palavra passe que permitia o registo na plataforma do OMEE. Para assegurar a confidencialidade dos dados foi atribuída uma única chave de identificação, comum a todos os professores, o que não permitia identificá-los nem pelo município, nem pela escola ou agrupamento de escola onde leccionam. Os instrumentos foram disponibilizados no site do OMEE durante os meses de Fevereiro e Março de 2011. Para a análise dos dados utilizou-se o Statiscal Package for the Social Sciences (SPSS) para Windows, versão 18.0. Resultados Análise factorial exploratória do IPPME O teste de Kaiser-Meyer-Olkin apresenta um valor de 0,971 pelo que a matriz de dados é excelente para ser sujeita a procedimentos de análise factorial. Quanto ao teste de esfericidade de Bartlett, o valor é de 24253,243 apresentando um nível de significância de 0,000 o que assegura haver correlação entre as variáveis. Estes dados sugerem que a matriz é susceptível de ser submetida e avaliada a procedimentos de análise factorial. Foi realizada uma análise factorial exploratória, com rotação Promax, extraindo-se 3 factores (Tabela 3).

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Tabela 3. Análise dos componentes principais do IPPME (Promax com rotação Kaiser) Itens

Dimensão

Factores 1

IPME_8 Representa as prioridades da escola

2

3

IPPME_C

,846

,557

,613

IPME_9 Traça procedimentos adequados à concretização IPPME_C dessas prioridades

,837

,589

,656

IPME_7 Centra-se na melhoria da aprendizagem dos alunos. IPPME_C

,831

,591

,576

IPME_12 Permite lidar eficazmente com os problemas à IPPME_LP medida que estes surgem

,812

,608

,647

IPME_11 Inclui estratégias que fomentam o envolvimento IPPME_A dos pais na aprendizagem dos alunos

,805

,593

,563

IPME_14 Envolve todos os membros da comunidade escolar IPPME_LD (professores, auxiliares, pais e alunos).

,799

,605

,604

IPME_28 Incentiva os esforços de aprendizagem da IPPME_LP comunidade escolar

,788

,523

,745

IPME_22 Considera prioritário o esforço dos professores na IPPME_LP melhoria da escola

,785

,447

,692

IPME_33 Têm a oportunidade de conduzir o plano de IPPME_I melhoria da escola.

,773

,695

,619

IPME_36 Ajudam à criação de um clima que encoraja o IPPME_I envolvimento dos pais na escola

,772

,649

,473

IPME_15 Aumenta a colaboração entre pais e professores.

IPPME_A

,768

,616

,630

IPME_24 Ajuda à criação de um clima que incentiva o IPPME_P envolvimento dos pais na escola

,767

,540

,728

IPME_5 Envolve todos os membros da comunidade escolar. IPPME_LD

,765

,568

,606

IPME_42 Incentivam os colegas a implementar o plano de IPPME_I melhoria nas suas aulas

,757

,715

,560

IPME_37 Desempenham um papel fundamental comunicação do esforço de melhoria da escola

,756

,602

,470

IPME_2 O seu contributo para o plano de melhoria da escola IPPME_P tem sido positivo para si.

,755

,518

,526

IPME_19 Baseia-se na utilização de dados válidos e IPPME_M fidedignos

,741

,436

,739

IPME_45 Contribuem para o planeamento do processo de IPPME_LP melhoria da escola

,733

,698

,546

IPME_32 Desempenham um papel fundamental no esforço IPPME_LP de melhoria da escola

,729

,543

,405

IPME_1 O seu contributo para o plano de melhoria da escola IPPME_CP tem sido positivo para a escola

,727

,490

,493

na IPPME_LD

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IPME_41 Ajudam os colegas a adquirir novas competências IPPME_LP e conhecimento

,723

,720

,531

IPME_4 É revisto e adaptado regularmente

IPPME_P

,553

,582

,432

IPME_29 Disponibiliza recursos que facilitam o esforço de IPPME_P melhoria da escola

,722

,521

,703

IPME_43 Colaboram regularmente na tomada de decisões IPPME_CP sobre o esforço de melhoria da escola

,714

,701

,529

IPME_13 Tem uma calendarização ajustada à concretização IPPME_C dos seus objectivos e actividades

,699

,627

,654

IPME_35 Consideram prioritário o esforço de melhoria da IPPME_RP escola.

,693

,592

,486

IPME_40 São eficazes na obtenção de ajuda comunitária para o esforço de melhoria da nossa escola

IPPME_LP

,655

,649

,652

IPME_6 É influenciado pela minha opinião

IPPME_RP

,611

,537

,559

IPME_3 Tem prioridade sobre outras actividades fora da IPPME_P escola.

,605

,433

,548

IPME_10 É determinado, em larga medida, por entidades IPPME_C externas à escola

,431

,268

,394

IPPME_52 Apresentaram um aumento de motivação IPPME_50 Tiveram mais oportunidades de aprendizagem

IPPME_RP

,525

,805

,491

,579

,804

,514

IPPME_47 Aprenderam bastante acerca do seu trabalho

IPPME_RP

,705

,800

,570

IPPME_49 Existiu mais colaboração entre os colegas

IPPME_RP

,541

,798

,476

IPPME_51 Obtiveram uma taxa de sucesso mais elevada

IPPME_RA

,519

,794

,468

IPPME_55 Melhoria da aprendizagem dos alunos

IPPME_RA

,619

,793

,505

IPPME_56 Aumento do interesse dos alunos em relação à IPPME_RA escola

,585

,786

,520

IPPME_48 Mudaram as suas práticas na sala de aula

IPPME_RP

,515

,785

,474

IPPME_54 Programas mais ajustados às necessidades dos IPPME_RA alunos.

,621

,780

,524

IPPME_46 Trabalham juntos como uma equipa

IPPME_RP

IPPME_CP

,680

,768

,492

IPPME_34 Coordenam a implementação do plano de IPPME_LP melhoria da escola

,706

,720

,616

IPPME_44 Têm tempo suficiente para trabalhar em equipa IPPME_CP os assuntos do plano de melhoria da escola

,408

,620

,454

IPPME_53 Tiveram um significativo aumento da carga de IPPME_RP trabalho.

,427

,507

,292

IPPME_26 Orienta novas equipas para os nossos planos de IPPME_LD melhoria da escola.

,607

,535

,885

IPPME_27 Selecciona novas equipas que dão continuidade IPPME_LD ao nosso esforço de melhoria da escola.

,525

,539

,875

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IPPME_31 Supervisiona o planeamento do processo de IPPME_LD melhoria da escola.

,688

,475

,825

IPPME_30. É eficaz na obtenção de ajuda da comunidade IPPME_LD envolvente para o esforço de melhoria da nossa escola.

,682

,554

,822

IPPME_25 Desempenha um papel fundamental comunicação do nosso esforço de melhoria da escola.

na IPPME_LD

,801

,516

,808

IPPME_23 Protege as iniciativas dos professores de outras IPPME_LD prioridades.

,570

,515

,789

IPPME_39 Seleccionam novas equipas que dão continuidade IPPME_LP ao esforço de melhoria da escola

,484

,558

,787

IPPME_38 Orientam novas equipas para os nossos planos de IPPME_LP melhoria da escola

,559

,637

,772

IPPME_18 Baseia-se na recolha de informação de diversas IPPME_M fontes.

,727

,441

,764

IPPME_21 Desempenha um papel fundamental na liderança IPPME_LD do plano de melhoria da escola.

,753

,553

,753

IPPME_M

,720

,468

,742

IPPME_16 É efectuada por um grupo liderado por pais e IPPME_M professores.

IPPME_20 É apresentada à comunidade escolar

,521

,492

,681

IPPME_17 É efectuada pelo conselho executivo

,506

,355

,590

IPPME_M

IPPME_A =Inventário da percepção dos professores aos esforços de melhoria da escola_ Avaliação do Impacto dos esforços melhoria da escola; IPPME-P= Inventário da percepção dos professores aos esforços de melhoria da escola_Processo de melhoria da escola; IPPME_C =Inventário da percepção dos professores aos esforços de melhoria da escola_Conteúdo do plano de melhoria da escola; IPPME – I =Inventário da percepção dos professores aos esforços de melhoria da escola_Implementação do plano de melhoria da escola; IPPME-M= Inventário da percepção dos professores aos esforços de melhoria da escola_Monitorização plano de melhoria da escola; IPPME-LD= Inventário da percepção dos professores aos esforços de melhoria da escola_Liderança do Director; IPPME-LP= Inventário da percepção dos professores aos esforços de melhoria da escola_Liderança do Professor; IPPME-CP= Inventário da percepção dos professores aos esforços de melhoria da escola_Colaboração do Professor; IPPME-RP= Inventário da percepção dos professores aos esforços de melhoria da escola_Resultados para o professor dos esforços de melhoria da escola; IPPMERA= Inventário da percepção dos professores aos esforços de melhoria da escola_ Resultados para o aluno dos esforços de melhoria da escola A análise factorial exploratória revela que os 3 factores extraídos são consistentes e adequados com o modelo teórico proposto. No conjunto os 3 factores explicam 60, 86% da variância total, sendo que os itens que saturam em cada factor apresentam, na sua maioria, valores superiores a .60.

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No factor 1 com um valor próprio de 29.176 incluem-se itens relacionados com o Processo de melhoria da escola, com saturações entre 0.431 e 0.846 e explica 52.099% da variância total. Neste factor saturam os itens 8, 7, 9, 11, 32, 2, 22, 36, 37, 14, 12, 1, 5, 28, 15, 24, 41, 43, 40,19, 4, 33, 42, 35, 45, 29, 13, 3, 6, 10. O factor 2 que se denomina por Resultados dos esforços de melhoria da escola apresenta como valor próprio de 2.858 inclui itens com saturações entre 0.507 e 0.805 e explica 5.103% da variância total. Neste factor saturam os itens 52, 51, 49, 48, 50, 56, 55, 54, 47, 46, 44, 34, 43, 53. O factor 3 diz respeito á Monitorização dos esforços de melhoria da escola com um valor próprio de 2.052 inclui itens com saturações entre 0.590 e 0.885 e explica 3.665% da variância total. Neste factor saturam os itens 27, 26, 39, 31, 23, 30, 38, 25, 20, 16, 21, 17. Correlações entre factores resultantes da análise factorial exploratória De seguida apresentam-se os resultados obtidos (média, desvio padrão) nos 3 factores resultantes da análise factorial exploratória (Tabela 4). Tabela 4. Média e Desvio Padrão dos factores resultantes da análise factorial exploratória Estatística Descritiva dos resultados obtidos Factores

Média

Desvio Padrão

Processo de melhoria da escola

64,2050

22,98852

Resultados dos esforços de melhoria da escola

32,2793

10,75073

Monitorização dos esforços de melhoria da escola

31,9987

12,36880

Tabela 5. Correlações entre os 3 factores resultantes da análise factorial exploratória Correlações entre factores 1

2

3

1. Processo de melhoria da escola 2. Resultados dos esforços de melhoria da escola

,814**

3. Monitorização dos esforços de melhoria da escola

,845**

,701**

**. Correlação estatisticamente significativa para p ≤ .01

Através da estatística inferencial podemos verificar que existe uma correlação estatisticamente significativa (p=.000) entre os 3 factores resultantes da análise factorial exploratória do IPME.

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Média, Desvio Padrão e Consistência Interna das escalas do IPPME Para averiguar a fidelidade do IPPME foi utilizado o método de consistência interna recorrendo ao cálculo do valor estatístico de alpha de Cronbach. O valor do alpha de Cronbach para a totalidade da escala é .982, o que demonstra que a escala total apresenta excelentes valores de consistência interna A análise dos valores obtidos em relação a cada escala permite-nos assegurar que as 10 escalas do IPPME possuem valores elevados de consistência interna, com os valores de alpha de Cronbach a situarem-se entre os .820 e .954 (Tabela 6). Tabela 6. Média, Desvio Padrão e Consistência Interna das escalas do IPPME Escalas

Nº de itens

M

SD

α

Avaliação do Impacto do PME

2

3.845

1.901

.914

Processo de Melhoria da Escola

4

9.766

3.673

.820

Conteúdo do PME

5

10.640

4.311

,879

Implementação do PME

4

8.944

3.675

.892

Monitorização do PME

5

11.903

24.061

.866

Liderança do Director

11

25.718

10.224

.954

Liderança do Professor

11

23.374

8.702

.934

Colaboração do professor

4

9.865

3.462

.849

Resultados para os professores do PME

7

17.153

6.012

.906

Resultados para os alunos do PME

3

7.286

3.039

.912

A escala de Avaliação do Impacto do Plano de melhoria é constituída por 2 itens, apresenta uma média de 3.845 (M= 3,845; DP= 1.901) e um valor de alpha de.914, a sub-escala do Processo de melhoria da escola, constituída por 4 itens, apresenta uma média de 9.766 (DP= 3.673) e um valor de alpha de.820. A escala do Conteúdo do plano de melhoria da escola é constituída por 5 itens, apresenta uma média de 10.640 (DP= 4.311) e um valor de alpha de.879, a escala de Implementação do plano de melhoria é constituída por 4 itens, apresenta uma média de 8.944 (DP= 3.675) e um valor de alpha de.892. A escala de Monitorização do plano de melhoria é constituída por 5 itens, apresenta uma média de 11.903 (DP= 24.061) e um valor de alpha de .866, a escala da Liderança do director é constituída por 11 itens, apresenta uma média de 25.718 (DP= 10.224) e um valor de alpha de.954, a escala da Liderança do professor é constituída por 11 itens, apresenta uma média de 23.374 (DP= 8.702) e um valor de alpha de.934, a escala de Colaboração do professor é constituída por 4 itens, apresenta uma média de 9.865 (DP= 3.462) e um valor de alpha de.849, a escala de Resultados para os professores do plano de melhoria é constituída por 7 itens, apresenta uma média

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de 17.153 (DP= 6.012) e um valor de alpha de .906, a escala de Resultados para os alunos do plano de melhoria é constituída por 3 itens, apresenta uma média de 7.286 (DP= 3.039) e um valor de alpha de.912. Tabela 7. Correlações entre as escalas da versão original do IPPME Correlações entre escalas do IPPME 1 1.Avaliação do Impacto do PME 2.Processo de Melhoria da Escola 3.Conteúdo do PME 4.Implementação do PME 5.Monitorização do PME 6.Liderança do Director 7.Liderança do Professor 8.Colaboração do professor 9.Resultados para os professores do PME 10.Resultados para os alunos do PME

2

3

4

5

6

7

8

9

10

,654** ,686**

,797**

,659**

,782**

,829**

,578**

,690**

,695**

,729**

,615**

,743**

,765**

,785**

,836**

,631**

,754**

,753**

,796**

,738**

,809**

,558**

,652**

,642**

,718**

603**

,669**

,801**

,561**

,650**

,643**

,678**

,583**

,644**

,754**

,731**

,500**

,589**

,625**

,681**

,533**

,626**

,711**

,667**

,746**

**. Correlação estatisticamente significativa para p ≤ .01

Através da estatística inferencial podemos verificar que existe uma correlação estatisticamente significativa (p=.000) entre as escalas que compõe o IPPME. Discussão O objectivo deste estudo foi avaliar as características psicométricas do Inventário da percepção dos professores aos esforços de melhoria da escola. 1. Estrutura factorial do IPPME O modelo de melhoria da escola (Leithwood, et al, 2006) (Figura 6) inclui um conjunto de instrumentos de avaliação da percepção dos diferentes agentes educativos, em relação a cada uma das dimensões incluídas no modelo de melhoria da escola: 1) Plano de melhoria da Escola; 2) Conteúdo do Plano de melhoria da Escola; 3) Implementação do Plano de melhoria da Escola; 4) Resultados; 5) Monitorização; 6) Comunicação; 7) Liderança; 8) Participação dos pais; 9) Participação dos Professores; 10) Apoio do município; 11) Apoio da

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Administração Central. A estrutura factorial encontrada pelos autores da versão original resulta da combinação das diferentes percepções dos vários agentes educativos: pais, professores, alunos e direcção da escola. A versão original inclui 5 factores: 1) Liderança da direcção escola; 2) Processo de melhoria da escola; 3) Conteúdo do plano de melhoria da escola; 4) Implementação do plano de melhoria da escola e 5) Resultados do plano de melhoria. O presente estudo avaliou apenas as dimensões das percepções dos professores aos esforços de melhoria da escola. A estrutura factorial do IPPME identificou 3 factores. A distribuição dos itens pelos 3 factores assumiu a seguinte configuração: no factor 1 agrupam-se os itens relacionados com o processo de desenvolvimento, conteúdo e implementação dos esforços de melhoria da escola. Por isso denominamos este factor de Processo de melhoria da escola; no factor 2 agrupam-se os itens relacionados com as percepções dos professores dos resultados dos esforços de melhoria da escola. Este factor denominou-se por Resultados dos esforços de melhoria da escola; no factor 3 agrupam-se os itens relacionados com o processo de monitorização dos esforços de melhoria. Por isso, denominou-se este factor como Monitorização dos esforços de melhoria da escola (Tabela 8). Tabela 8. Distribuição dos itens do IPPME pelos factores resultantes da análise factorial Dimensões conceptuais

Nº de Factor em que itens saturou na versão totais da portuguesa dimensão

Nº de itens de cada dimensão que saturou em cada factor

Exemplos

Conteúdo do plano de melhoria

5

Processo de melhoria da escola

5

O plano de melhoria da sua escola inclui estratégias que fomentam o envolvimento dos pais na aprendizagem dos alunos

Avaliação do impacto do processo de melhoria da escola

2

Processo de melhoria da escola

2

O seu contributo para o plano de melhoria da escola foi positivo para si

Implementação

4

Processo de melhoria da escola

4

Permite lidar eficazmente com os problemas à medida que estes surgem

Processo de melhoria da escola

4

Processo de melhoria da escola

4

Tem prioridade sobre outras actividades fora da escola

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Liderança do professor

Liderança do director

Colaboração do professor

11

11

4

Processo de melhoria da escola

6

Os professores têm a oportunidade de conduzir o plano de melhoria da escola

Resultados dos esforços de melhoria

3

Coordenam a implementação do plano de melhoria

Monitorização dos esforços de melhorias

2

Seleccionavam novas equipas que dão continuidade aos esforços de melhoria da escola

Processo de melhoria da escola

4

Considera prioritários os esforços dos professores na melhoria da escola

Monitorização dos esforços de melhorias

7

Supervisiona o planeamento do processo de melhoria da escola

Processo de melhoria da escola

1

Contribuem para o planeamento do processo de melhoria da escola

Resultados dos esforços de melhoria

3

Trabalham juntos como equipa

Resultados para os alunos dos esforços de melhoria

3

Resultados dos esforços de melhoria

3

Aumento do interesse dos alunos em relação à escola

Resultados para os professores dos esforços de melhoria

7

Resultados dos esforços de melhoria

7

Apresentaram um aumento de motivação

Monitorização do plano de melhoria da escola

5

Monitorização dos esforços de melhorias

5

Baseia-se na recolha de informação de diversas fontes

O factor 1 – Processo de melhoria da escola – agrupa 26 itens que pertencem a 7 dimensões da proposta conceptual dos autores: 1) Conteúdo do plano de melhoria (5 itens) (e.g. O plano de melhoria da sua escola inclui estratégias que fomentam o envolvimento dos pais na aprendizagem dos alunos); 2) Avaliação do impacto do processo de melhoria da escola (2 itens) (e.g. o seu contributo para o plano de melhoria da escola foi positivo para si); 3) Implementação (4 itens) (e.g. permite lidar eficazmente com os problemas à medida que estes surgem); 4) Processo de melhoria da escola (4 itens) (e.g. tem prioridade sobre outras actividades fora da escola); 5) Liderança do professor (6 itens) (e.g. os professores têm a oportunidade de conduzir o plano de melhoria da escola); 6) Liderança do director (4 itens) (e.g. considera prioritário os esforço dos professores na melhoria da escola) e 7) Colaboração do professor (1 item) (e.g. contribuem para o planeamento do processo de melhoria da escola). Em relação a este item, apesar de ser expectável que saturasse no mesmo factor onde saturam os outros itens (3 itens) da dimensão (factor 2), é compreensível que este item sature no factor 1. De facto, as dimensões das

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percepções dos professores não são construtos lineares e, assim como aconteceu na versão original, existem itens da mesma dimensão que saturam em factores diferentes. O factor 2 – Resultados dos esforços de melhoria da escola – agrupa 16 itens que pertencem a 4 dimensões da proposta conceptual dos autores: a) Resultados para os alunos dos esforços de melhoria (3 itens) (e.g., aumento do interesse dos alunos em relação à escola); b) Resultados para os professores dos esforços de melhoria (7 itens) (e.g. apresentaram um aumento de motivação), c) Colaboração do professor (3 itens) (e.g. trabalham juntos como equipa) e d) liderança do professor (3 itens) (e.g., coordenam a implementação do plano de melhoria). Os itens que pertencem à dimensão liderança do professor seria expectável que saturassem mo factor 3, no entanto atendendo ao carácter dinâmico do construto a avaliar (percepção dos professores) é compreensível que estes saturem aqui, tal como aconteceu na versão original, existem itens da mesma dimensão que saturam em factores diferentes. O factor 3 – Monitorização dos esforços de melhoria da escola – agrupa 14 itens que pertencem a 3 dimensões da proposta conceptual dos autores: i) Monitorização do plano de melhoria da escola (5 itens) (e.g. baseia-se na recolha de informação de diversas fontes); ii) Liderança do director (7itens) (e.g. supervisiona o planeamento do processo de melhoria da escola) e iii) Liderança do professor (2 itens) (e.g. seleccionavam novas equipas que dão continuidade aos esforços de melhoria da escola). Embora não existam dados disponíveis que nos permitam discriminar os itens que saturam em que factores na versão original, sabe-se que existem itens que saturam em factores diferentes do factor em que saturam os itens da mesma dimensão (liderança do professor, liderança da direcção da escola, resultados e comunicação dos esforços de melhoria) (Leithwood e col, 2006). A saturação dos itens (na versão portuguesa) num factor diferente daquele em que saturam a maioria dos itens da respectiva dimensão é congruente com a natureza dinâmica das percepções dos professores acerca dos processos de melhoria da escola (Leithwood e col, 2006). De facto, não sendo as percepções dos professores aos esforços de melhoria da escola um construto linear, é expectável que em estruturas factoriais complexas (Sass & Smith, 2010) alguns itens avaliem simultaneamente mais do que uma dimensão. Aliás, este facto tem sido identificado repetidamente e tem sido explicado quer por razões de natureza do fenómeno em estudo, quer por razões da complexidade do item e da estrutura (Sass & Smith, 2010). A análise factorial permite agrupar os itens de um instrumento de acordo com as suas características e comunalidades em factores. A estrutura factorial de um instrumento pode ser definida desde estrutura simples, perfeita (traduzido do inglês perfect simple structure), estrutura simples aproximada (aproximate simple structure) ou estrutura complexa (complex structure) (Sass & Smith, 2010). A estrutura simples perfeita significa que os itens saturam apenas num factor,

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não existindo saturações cruzadas (cross-loading). A estrutura simples aproximada significa que existem saturações cruzadas (quando os itens saturam em mais do que um factor) baixas (>.30). A estrutura complexa significa que existem saturações cruzadas com valor de magnitude superior a. 30 (Sass & Smith, 2010). Este facto explica a saturação cruzada do mesmo item em vários factores, quer na versão original, quer na versão portuguesa. 2. Consistência Interna do IPPME Tendo presente que as dimensões incluídas no instrumento original resultam de critérios teóricos, para efeitos deste estudo analisou-se a consistência interna da versão portuguesa seguindo a validação teórica proposta pelos autores. A análise do valor da consistência interna revelou valores elevados do alpha de Cronbach quer para a escala global (α=. 98) quer em cada uma das dimensões conceptuais do IPPME (Avaliação do processo de melhoria da escola (α=. 98); Processo de melhoria da escola (α=. 82); Conteúdo do plano de melhoria da escola (α=. 87); Implementação (α=. 89); Monitorização do plano de melhoria (α=. 86); Liderança do professor (α=. 93); Liderança do Director (α=. 95); Colaboração do professor (α=. 84); Resultados para os professores (α=. 90); Resultados para os alunos (α=. 91). O valor do alpha de Cronbach é uma medida de fidelidade que avalia a consistência interna ou homogeneidade dos itens do instrumento. Esta medida estatística refere-se ao grau de uniformidade existente entre as respostas dos sujeitos a cada um dos itens que compõem o instrumento (Freire & Almeida, 2008). Os níveis elevados obtidos pela consistência interna da versão portuguesa estão de acordo com a versão original, os valores do alpha da versão portuguesa variam entre .82 para a dimensão Processo de melhoria da escola e .95 para a Liderança do Director, os valores do alpha de Cronbach da versão original variam entre os .72 na dimensão Processo de melhoria da escola e .94 na Liderança do Director, o que significa que nas duas versões os valores inferiores da consistência interna situam-se na mesma dimensão (Processo de melhoria da escola) e os valores mais elevados referem-se à mesma dimensão (Liderança do Director). Conclusões A investigação em melhoria e eficácia da escola tem incluído a avaliação como uma dimensão central (Hofman, Dijkstra & Hofman, 2005), o que contribui para a complexificação ao nível da avaliação (utilizando metodologias mistas de avaliação), dos esforços de melhoria e da eficácia da escola, nomeadamente uma avaliação sistematizada com especial destaque para as metodologias quantitativas e não apenas qualitativas dos processos e dos resultados quer da escola quer da sala de aula (Potter, et al. 2002). No entanto, vários autores (Harris,

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Chapman, Muijs, Russ & Stoll, 2007; Geisel, Kruger & Sleegers, 2001) referem que o desenvolvimento de instrumentos de avaliação dos processos de melhoria da escola, com características psicométricas adequadas é um dos principais desafios (e obstáculos) da investigação em melhoria e eficácia da escola. Um dos elementos centrais ao processo de desenvolvimento de planos de melhoria da escola é o recurso a uma avaliação sistemática dos processos e das práticas educativas, utilizando-se a informação que resulta do processo de avaliação para dar feedback aos agentes educativos, comparando os processos e estratégias existentes com o que é expectável (Reynolds, Harris, Clarke, Harris & James, 2006). A perseguição de níveis elevados de eficácia educativa requer, portanto a valorização de indicadores de diferentes domínios de funcionamento como resultado da acção da escola (que se deseja que promova um desenvolvimento holístico dos estudantes) e com impacto nos níveis de desempenho dos alunos (Leithwood, Harris & Strauss, 2010). A investigação tem demonstrado que os instrumentos disponíveis para avaliar os esforços de melhoria da escola apresentam limitações metodológicas, nomeadamente ao nível das suas características psicométricas como validade e fidelidade (e.g. Geijsel, Sleegers, Stoel, & Krüger, 2009). A avaliação das características psicométricas do instrumento em estudo apresenta-se como uma contribuição significativa para o desenvolvimento dos estudos na área da melhoria e eficácia da escola em Portugal. Como se percebe pelos resultados anteriores, este instrumento apresenta características psicométricas adequadas, quer a nível da análise factorial quer ao nível da consistência interna. Constituindo-se como um importante recurso para o desenvolvimento de avaliações sistemáticas e regulares do processo de melhoria da escola, já que os instrumentos disponíveis (em Portugal não conhecemos nenhum) para a monitorização do processo de melhoria da escola não têm disponíveis dados acerca das suas características psicométricas. Futuros estudos Apesar das potencialidades deste instrumento, o seu uso deve ser feito com algum cuidado. Outros estudos são necessários para uma maior clarificação das suas características psicométricas, nomeadamente a associação das percepções dos professores a outras dimensões como ao nível da personalidade (Greenfield, Rinaldi, Proctor & Cardarelli, 2010, estilo do professor (Tucker, Zayco, Herman, Reinke, Trujillo, Carraway, Wallack & Ivery, 2002) desenvolvimento pessoal (Hargreaves, 2005) percepção de auto-eficácia (Caprara, Barbaranelli, Steca & Malone, 2006), anos de serviço (Greenfield, Rinaldi, Proctor & Cardarelli, 2010), interacção professor- aluno (Ney, Konstantopoulos & Hedges, 2004; Rowan, Correnti & Miller, 2002), que têm sido estudadas pela investigação educacional. Da mesma forma, em estudos futuros deverão procurar recolher-se informação

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sobre a percepção de todos os agentes educativos envolvidos nos esforços de melhoria, pais, directores da escola e membros da comunidade (municípios, empresas) pois só assim se garante a melhoria da eficácia educativa (Ainscow, 2011; Mujis et al, 2010; Kidren & Darwin, 2007). Quanto mais informação uma escola possua sobre o processo de implementação dos esforços de melhoria, em especial as percepções dos principais interessados estudantes e professores (como foi o objectivo deste estudo), mais apta estará para tomar decisões que afectam positivamente a comunidade educativa (DeAngelis & Presley, 2011; Hargreaves, 2007) e que efectivamente promovam a melhoria e eficácia educativa de todos. Referências Ainscow, M. (2010). Achieving excellence and equity: reflections on the development of practices in one local district over 10 years. School Effectiveness and School Improvement 21(1), 75-92. Ainscow, M., Dyson, A., Goldrick, S. & West, M. (2011). Developing equitable education systems. London: Routledge. Brophy, J., & Good, T. (1986). Teacher behavior and student achievement. In M. Wittrock (Ed.), Handbook of research on teaching, (pp. 340-370). NY: Chapman, C., & Allen, T. (2005). Partnerships for improvement: The specialist schools achievement programme. Coventry, UK: University of Warwick. Clark, R. (2002). Ten hypotheses about what predicts student achievement for african american students and all other students: What the research shows. In W. R. Allen, M. B. Spencer, & C. O’Conner (Eds.), African American education: Race, community, inequality, and achievement: A Tribute to Edgar G. Epps. (pp.----). Oxford: Elsevier Science. Coleman J. S, Campbell E Q, Hobson C J, McPartland, J, Mood A M, Weinfeld F D & York R L. (1966). Equality of Educational Opportunity. Washington, DC: US Department of Health, Education & Welfare. Creemers, B. P. M. & Kyriakides, L. (2010). Explaining stability and changes in school effectiveness by looking at changes in the functioning of school factors. School Effectiveness and School Improvement, 21 (4), 409 – 427. DeAngelis, K. J., & Presley. J. B. (2011). Teacher Qualifications and School Climate: Examining Their Interrelationship for School Improvement. Leadership and Policy in Schools, 10(1), 84–120. Dennis, T. A., Brotman, L. M., Huang, K., & Gouley, K. K. (2007). Effortful control, social competence, and adjustment problems in children at risk for psychopathology. Journal of Clinical Child & Adolescent Psychology, 36(3), 442-454. Finn, D.W. & Achilles, C. M. (1999). Tennessee’s class size study: Findings, implications, misconceptions. Educational Evaluation and Policy Analysis, 2, 97-109. Geijsel, F. P., Sleegers, P. J. C., Stoel, R. D., Krüger, M. L. (2009). The effect of

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Estilos Parentais e desenvolvimento positivo em crianças e adolescentes com doença crónica Parenting styles and positive development in children and adolescents with chronic condition Teresa Santos Margarida Gaspar de Matos Maria Celeste Simões Inês Camacho Gina Tomé Faculdade de Motricidade Humana (“Social Adventure” Team)/Universidade de Lisboa (FMH/UL) Centro de Malária e Doenças Tropicais/IHMT/Universidade Nova de Lisboa (CMDT/IHMT/UNL)

María Carmen Moreno

Dpto. de Psicologia Evolutiva y de La Educatión, Universidade de Sevilla, Espanha

Declaration of interest Santos, T. receives a PhD grant from the Portuguese Foundation for Science and Technology (FCT), reference SFRH/BD/82066/2011. None of the authors reported any further financial interests or potential conflicts of interest. Contacto para correspondência: Teresa Santos, PhD Faculdade de Motricidade Humana/Universidade de Lisboa Estrada da Costa 1495-688 Cruz Quebrada – PORTUGAL Phone: + 351 21 414 91 52 / Mobile: + 351 966142393 E-mail: tsantos@fmh.utl.pt

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Resumo: A adolescência compreende um período de profundas mudanças biopsicossociais, que pode ser agravado na presença de uma doença crónica e suas limitações. Os modelos educativos/família influenciam fortemente os comportamentos e a socialização, tendo um papel decisivo no desenvolvimento da criança. Papel ainda mais relevante perante uma situação de doença crónica, oscilando entre: necessidades de proteção da saúde, e, de autonomização e responsabilização. O presente artigo tem como objetivo uma abordagem teórica sobre vinculação e estilos parentais, relacionando a sua relevância na adaptação à doença crónica em adolescentes. Foram explanados os vários tipos de estilos parentais, bem como sucintamente enquadradas as principais características de uma condição crónica na adolescência, e, estilos parentais mais eficazes durante o processo de adaptação. Estilos parentais restritivos foram identificados como obstáculos a uma boa adaptação dos jovens com doença crónica, enquanto um estilo parental democrático se apresenta como facilitador da adaptação à doença. A família é um alvo de intervenção crucial numa situação de condição crónica, devido à relação de dependência numa idade em desenvolvimento e também ao impacto para a criança e ambiente familiar. Por sua vez, os pais devem também facilitar a comunicação com os filhos, ajudando-os a adquirir competências de autonomia e monitorização face à doença crónica. Por fim, salienta-se que, cada vez mais é importante “dar voz” aos jovens com doença crónica, de forma a ouvir as suas necessidades, conhecimentos, competências e direitos específicos, e, sobretudo, porque são intérpretes competentes do seu “mundo”. Palavras-Chave: adolescentes; doença crónica; estilos parentais; promoção da saúde Abstract: Adolescence consists of profound bio-psychosocial changes that can be made worse in the presence of a chronic illness and its limitations. Educational models /family strongly influence behaviors and socialization, having a decisive role in child development. Family’s role becomes even more relevant in a situation of chronic condition, oscillating from health protection needs, to autonomy and empowerment. The aim of this paper is to describe a theoretical approach of attachment and parenting styles, and its association and relevance in adaptation to chronic condition in adolescents. Various types of attachment and parenting styles were explained, as well as succinctly explored the main characteristics of a chronic condition in adolescence. In addition, the more effective parenting styles during the adaptation process were also described. Restrictive parenting styles were identified as obstacles to a good adaptation of adolescents with chronic condition; on the other hand, an authoritative

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parenting style presents itself as a facilitator for adaptation. Family is a crucial target for interventions in a situation of chronic condition, due to age dependency level in the development process, and also because of the impact on the child and family environment. In turn, parents should also facilitate communication with children, helping them to acquire skills and autonomy to face chronic condition’s management. Finally, it is noted that it is increasingly important to “give voice” to young people with chronic condition, in order to listen to their needs, knowledge, skills and specific rights, and especially because they are competent interpreters of their “world”. Key-words: adolescents; chronic condition; health promotion; parenting styles Vinculação e Estilos Parentais Os modelos parentais, as expectativas e os métodos educativos determinam largamente o reportório de comportamentos da criança, bem como as suas atitudes e objetivos, verificando-se que a família (primeiro grupo social da criança) tem um papel decisivo no seu desenvolvimento (Camacho, 2009; Soares, 2012), nomeadamente na transmissão de atitudes, regras, ideias, sentimentos e comportamentos que estão na base de tomada de decisões com consequências a longo prazo (Simões, Matos, Ferreira, & Tomé, 2009). Assim, os estilos e práticas parentais parecem ter um papel fundamental na socialização, podendo facilitar ou dificultar os vários desafios que se apresentam à criança, e, mais tarde, ao adolescente (Sprinthall & Collins, 1999), uma vez que os pais têm um papel fulcral de suporte emocional (Wenz-Gross et al., 1997). De facto, desde o nascimento que se estabelecem interações entre a mãebebé, salientando-se o papel fundamental da mãe e/ou cuidador em responder eficazmente às necessidades globais (físicas e emocionais) do bebé (Bion, 1991; Bowlby, 1989; Winnicott, 1990, 2012). Precocemente são estabelecidos padrões básicos de comportamentos de vinculação da criança, que têm a função adaptativa de procura de segurança e proteção (Feeney & Noller, 1996). O procedimento da “situação do estranho” desenvolvido por Ainsworth (Ainsworth, Blehar, Waters & Wall, 1978) permitiu avaliar precisamente a segurança da vinculação e identificar três grandes padrões de vinculação: seguro, ansioso-ambivalente e ansioso-evitante (Ainsworth et al., 1978; De Wolff & Van Ijzendoorn, 1997). A qualidade da vinculação estabelecida irá, em grande parte, contribuir para o tipo de relacionamento que a criança estabelece com os outros. Uma vinculação segura facilita a exploração do ambiente, promove a reciprocidade, compreensão, empatia, e a demonstração de comportamentos mais competentes e adaptativos nas interações com o grupo de pares (Coll et al., 2004). Porém, esses padrões vão evoluindo à medida que a criança cresce, e, dado o seu início precoce e por serem maioritariamente automáticos e inconscientes, tendem a perdurar ao longo da vida, originando estilos relacionais

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de funcionamento geral enquanto adulto (Bowlby, 1984). A acrescentar ao padrão de vinculação estabelecido, os estilos parentais são igualmente importantes para o desenvolvimento do jovem, tendo a literatura identificado três estilos, usados por pais na educação dos filhos (Baumrind, 1987): estilo autoritário, estilo permissivo e estilo democrático (muitas vezes traduzido como autoritativo, numa alusão incorreta ao termo inglês authoritative). O estilo autoritário apresenta elevados níveis de controlo e padrões de comportamento muito rígidos, envolvendo a punição e a violência como formas de reposição da autoridade (relativamente à qual foram violadas as normas instituídas). Este estilo parental está associado a um ambiente familiar pouco afetivo. O estilo permissivo encontra-se em oposição ao estilo autoritário, existindo poucas ou nenhumas regras e, como tal, a violação das normas e consequente punição é algo que não existe. Geralmente prevalece a vontade da criança ou do adolescente. O estilo democrático diferencia-se dos anteriores, na medida em que envolve um elevado controlo comportamental, e, simultaneamente, um elevado nível de suporte e afetividade. Constitui-se como um estilo que promove a independência e sentido de responsabilidade, identificando os pais como figuras de autoridade, mas uma autoridade fundamentada. A definição de regra é realizada tendo em atenção as necessidades e interesses dos jovens, bem como a explicação das consequências associadas aos comportamentos, e, este estilo associa-se a uma maior assertividade e responsabilidade social dos jovens. Posteriormente, foi definido um conjunto mais alargado de estilos parentais, encontrados nas interações entre pais e filhos e provenientes da conjugação de três dimensões bipolares relativamente independentes, designadamente: Controlo (Restritivo/Permissivo), Apoio (Hostil/Caloroso), e Ansiedade (Calmo/Ansioso). Da combinação dos diferentes polos destas dimensões, é possível encontrar oito estilos parentais: 1) Organizado: restritivo, caloroso, calmo; 2) Democrático: permissivo, caloroso, calmo; 3) Rígido: restritivo, hostil, calmo; 4) Negligente: permissivo, hostil, calmo; 5) Super-Protetor: restritivo, caloroso, ansioso; 6) Condescendente: permissivo, caloroso, ansioso; 7) Autoritário: restritivo, hostil, ansioso; 8) Neurótico: permissivo, hostil, ansioso. Salienta-se que as características de cada um dos estilos apresentados representam modelos, sendo que muitos pais podem não conjugar todas as dimensões, tal como foi apresentado, e, por isso, será mais exato falar em tendências ou predominância. O comportamento da maioria dos pais tende também a situar-se mais próximo do meio do que dos extremos da maioria das dimensões, e, pais com comportamentos mais extremos, ou inconsistentes, parecem ser os que mais colocam a criança em perigo (McWhirter, McWhirter, McWhirter, & McWhirter, 1998). Mais tarde, surgem ainda outras dimensões de estilo parental relevantes para os problemas de comportamento da criança (Hemphill & Sanson, 2001): a punição, que se refere à utilização de estratégias disciplinares rígidas que envolvem ordens, ameaças ou punição física; a afetividade, que envolve a expressão de afeto prazer e aceitação em relação à criança; e, o raciocínio indutivo, que engloba a explicação

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das consequências dos comportamentos, a definição dos limites do comportamento e a participação da criança nas decisões disciplinares. Desta forma, de um modo geral existe um consenso de que práticas muito liberais/permissivas, ou, em contraste, muito autoritárias/punitivas, não são as mais indicadas. As primeiras não permitem ao jovem perceber os limites na vida familiar e social, e, as segundas, não possibilitam à criança libertar a sua agressividade no seio da família, pelo que terá de o fazer em outros contextos (p.e. na rua ou escola) (Coslin, 1999; Favre & Fortin, 1999). As práticas que definem um estilo parental parecem ser algo mais ou menos estável nas famílias (Loeber, Russo, Stouthamer-Loeber & Lahey, 2000). No entanto, a eficácia de determinado estilo parental está também dependente das características da própria criança, e, por exemplo, as crianças fortemente reativas e muito irritáveis, estão em risco de desenvolver problemas de comportamento se os pais utilizarem um estilo com elevados níveis de punição ou baixos níveis de afeto (Hemphill & Sanson, 2001). Por sua vez, o estatuto socioeconómico surge como um fator importante na escolha do estilo parental, atuando indiretamente através das crenças e do stress familiar associado às condições de desvantagem socioeconómica (Pettit, Laird, Dodge, Bates & Criss, 2001; Pinderhughes, Dodge, Bates, Pettit & Zelli, 2000). Pais de baixo estatuto socioeconómico tendem a ter disciplinas mais duras, em parte porque têm crenças mais fortes acerca do valor instrumental da punição física e porque experienciaram níveis mais elevados de stress (Pinderhughes et al., 2000). Uma boa comunicação parece ser um fator determinante para o bem-estar e ajustamento global do adolescente (Hartos, & Power, 1997), e, a comunicação entre pais e filhos permite a afirmação da individualidade e a identificação com os pais, sendo importante que estes percebam que o diálogo com os filhos poderá ser poucas vezes agradável e deixar uma sensação de que mensagem não passou ou fez eco do outro lado (Braconnier, & Marcelli, 2000). Geralmente, é com a mãe que os adolescentes têm mais facilidade em comunicar (Settertobulte, 2000), e, dados do estudo nacional do Health Behaviour in School-aged Children (HBSC/OMS) indicam que falar com o pai é mais fácil para os rapazes, e falar com ambos os pais é mais fácil para os adolescentes mais novos (Matos et al., 2000), constatando-se uma diminuição nessa facilidade à medida que a idade vai aumentando (Camacho, 2009). Os jovens com dificuldades de comunicação com os pais apresentam um maior envolvimento em comportamentos de violência na escola, reportam mais frequentemente sintomas de mal-estar físico e psicológico, enquanto que os jovens que têm mais facilidade em falar com os seus pais, acerca das suas preocupações, sentem-se mais felizes (Matos et al., 2000). Foram identificados três tipos de diálogo (Braconnier, & Marcelli, 2000) entre pais e filhos adolescentes: o informativo, que consiste num diálogo neutro que envolve a troca de informação; o interativo, diálogo ativo que envolve a troca de afetos e emoções; e o de compreensão emocional, que permite trocar afetos e emoções e retirar informações sobre eles. Segundo os autores, grande parte das vezes

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na comunicação entre pais e filhos estão envolvidos os três tipos de diálogos, o que leva a alguns desencontros, na medida em que se misturam questões instrumentais com questões afetivas. Como facilitadores da interação destacam-se também quatro características da comunicação: autoafirmação (afirmação responsável clara e segura do seu ponto de vista), independência (expressão de diferentes pontos de vista), permeabilidade (estar aberto e compreender a perspetiva dos outros), mutualidade (respeito na interação estabelecida) (Sprinthall & Collins, 1999). Todavia, parece que o fundamental é dar o direito à diferença, favorecer as ligações afetivas, estar disponível e saber ouvir os seus filhos. Para além disso, é importante os pais falarem “com” os filhos e não apenas “para” os filhos. (Silliman, 1994; Sprinthall & Collins, 1999). Estudos demonstram que os adolescentes de ambientes familiares ajustados, em que as famílias são fonte de afeto e suporte, são mais competentes socialmente e referem mais amizades positivas (Lieberman, Doyle & Markiewicz, 1999). Desta forma, tanto em crianças mais pequenas como em adolescentes, uma relação de apego seguro, um estilo parental democrático, a promoção de relações sociais, a resposta às necessidades dos filhos, uma saúde mental adequada dos pais e uma boa rede de suporte social dos mesmos apresentam-se como fatores de proteção no desenvolvimento social e pessoal (Moreno, 2004a,; Moreno, 2004b). Salienta-se ainda que o desenvolvimento harmonioso na adolescência parece contribuir positivamente para a perceção subjetiva do bem-estar (Gaspar, Matos, Ribeiro, Leal & Ferreira, 2009), implicando o desenvolvimento de diversas competências específicas, denominadas “Cinco C”: 1) competência, perspetiva positiva sobre a própria ação em diversos domínios; 2) confiança, perceção de autoestima e de autoeficácia, perspetiva do valor global do próprio; 3) Ligação “Connection”, ligações positivas com pessoas e instituições com as quais se estabelecem relações bidirecionais; 4) carácter, respeito pelas regras sociais e culturais, sentido do bem e do mal e integridade; 5) compaixão, sentido de simpatia e empatia para com os outros (Lerner et al., 2005). No entanto, embora as práticas parentais influenciem o desenvolvimento pessoal das crianças, não são as únicas que contribuem para o desenvolvimento infantil, sendo a interação com os pares crucial, e, na adolescência torna-se mesmo mais relevante do que o suporte familiar (Barros, 2003). Contudo, mesmo no relacionamento com os pares existe uma forte influência das experiências presentes no ambiente familiar, nomeadamente as primeiras relações de vínculo, as práticas educativas, os estilos de interação dos pais, e, por último, as atitudes dos pais face às relações sociais e à promoção do desenvolvimento social (Coll et al. 2004). Adolescência e Doença Crónica A adolescência é o período evolutivo de vida entre os 10 e os 20 anos (de acordo com a Organização Mundial de Saúde - OMS), no qual decorrem as mais significativas alterações físicas, emocionais, sociais e cognitivas, ocorrendo

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novas e múltiplas tarefas desenvolvimentistas (Bizarro, 2001). O adolescente tem que lidar com transformações biopsicossociais, nomeadamente mudanças corporais da puberdade, estabelecimento de novas relações interpessoais próximas e duradouras, procura de identidade sexual e pessoal, inconformismo e alguns comportamentos de rebeldia, conquista de autonomia e independência económica, progressão académica e questões vocacionais (Sprinthall & Collins, 1999). Contudo, nem sempre os jovens se encontram preparados para lidar com estas exigências, e, se para alguns este desafio é razoavelmente bem alcançado sem alterações do seu bem-estar psicológico, para outros, este período pode representar uma exaustão dos recursos disponíveis, com reflexos no equilíbrio e bem-estar psicológico, e, possíveis repercussões graves no futuro (Bizarro, 2001). Os desafios e cenários referidos anteriormente, típicos da adolescência, podem tornar-se ainda mais complexos, difíceis e agravados quando se verifica uma situação de doença crónica (Barros, 2009). Os dados atuais sugerem que um número cada vez maior de crianças e adolescentes sofre de uma doença crónica, e, estudos epidemiológicos estimam que aproximadamente 15 a 20% de pessoas com menos de 18 anos, apresentam este tipo de problema de saúde (Siegel, 1998). O conceito de doença crónica engloba condições de saúde prolongadas e irreversíveis (Barros, 2009; Bizarro, 2001), que interferem com o funcionamento normal diário por um período maior do que três meses num ano ou que resulta em hospitalização por mais de um mês num ano, ou, quando ocorrem simultaneamente ambas as condições (Newachech & Taylor, 1992). As doenças crónicas com maior prevalência na adolescência são as situações de asma, doença cardíaca congénita, epilepsia e diabetes. Ainda que com enorme variabilidade individual dos resultados, é possível identificar algumas tarefas de adaptação, nomeadamente 1) conhecimento sobre a doença e aceitação do diagnóstico; 2) a vivência da doença; 3) adaptação e confronto com procedimentos invasivos/ dolorosos ou de sintomas (Barros, 2009). Os avanços na medicina permitiram prolongar e melhorar a vida dos adolescentes com doença crónica, contudo, estes jovens podem ser afetados no seu desenvolvimento geral (Suris, Michaud & Viner, 2004) e enfrentam diversos desafios, tais como: menor perceção de saúde (Serrabulho, Matos & Raposo, 2012); limitações nas atividades do dia-a-dia, na aquisição de competências cognitivas e no relacionamento familiar/escolar/social; na adesão a tratamentos de rotina e na transição para a vida adulta (Law et al., 2006). Estes adolescentes podem ainda encontrar-se em maior risco para um desenvolvimento emocional e comportamental saudável (Bernstein, Sore, Stockwell, Rosenthal & Gallagher, 2011; Verhoof, Maurice-Stam, Heymans & Grootenhuis, 2012), e experienciar maiores dificuldades de ajustamento (Geist, 2003; Oeseburg, Jansen, Groothoff, Dijkstra & Reijneveld, 2010), apresentando sintomas internalizantes, tais como depressão (Miyazaki, Amaral & Grecca, 2006; Vanhalst et al., 2013) e ansiedade, e também externalizantes (relacionados com problemas de comportamento) (Lavigue & Fier-Routman, 1992). Assim, os adolescentes com doença crónica

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estão duplamente em desvantagem, podendo envolver-se em comportamentos de risco, de forma semelhante aos seus pares saudáveis, ficando mais vulneráveis aos riscos provenientes desses mesmos comportamentos (Saunders, 2011; Scaramuzza et al., 2010). Contudo, muita da investigação realizada comparando jovens com ou sem doença crónica, ou comparando adolescentes com diferentes condições de saúde entre si, tem sido contraditória e inconclusiva, não se confirmando relação direta entre doença e sofrimento/perturbação (Barros, 2009; Combs-Orme, Helfinger & Simpkins, 2002). Alguns estudos sugerem maior risco nesta população (Barlow & Ellard, 2006), outros, a possibilidade de boa adaptação (Barros, Matos & BatistaFoguet, 2008). Porém, a investigação tem vindo a alertar para a possibilidade de maior vulnerabilidade nesta população, indicando que o risco de dificuldades e de alterações ao bem-estar psicológico pode ser maior quando, associadas à doença crónica, se acentuam variadas restrições e limitações que afetam a prática da vida quotidiana, sugerindo que os jovens com ambas as condições (doença crónica e acentuadas restrições), podem apresentar diferenças psicológicas mais significativas comparando com os seus pares saudáveis (Bizarro, 2001). Assim, as respostas de adaptação são muito variáveis e não homogéneas, dependendo de fatores individuais/contextuais, e também do tipo de condição crónica e suas limitações. Relevância da Interação Parental para o Adolescente com Doença Crónica Lidar com uma doença crónica na adolescência constitui, então, um desafio major para o próprio, para a sua família e para os profissionais de saúde (Suris et al., 2004). Não é uma tarefa fácil para os pais, sobretudo porque as consequências de uma doença crónica vão para além da esfera individual, influenciando todo o sistema familiar (Quittner, Romero, Kimberg, Blackwell & Cruz, 2011). Ainda que, com variações consoante o grau de severidade da doença, intensidade dos tratamentos e limitações da rotina, é toda uma realidade que se altera, sendo necessários recursos que permitam a aceitação destas mudanças (Santos, 2012). Os pais confrontam-se com algumas questões únicas, tais como o ter que aceitar a doença crónica, modificar as suas expectativas sobre um filho saudável, alterar rotinas e projetos em face da doença e suas limitações, lidar com responsabilidades financeiras associadas, planear a educação e o cuidado continuado ao longo da vida, lidar com o stress associado a uma condição que não é partilhada por outros, e, com a ambivalência e conflito inerentes. Ainda cabe aos pais ajudarem os filhos a aceitarem a doença, limitações e tratamentos associados, gerir emoções de tristeza, raiva e frustração, e, extremamente importante, manter algum equilíbrio nas suas próprias emoções e em outras áreas das suas vidas (Barros, 2009; Coffey, 2006; Santos, 2012). Por sua vez, e, de acordo com o foi explanado anteriormente, o ambiente social em que a criança vive e se desenvolve, e, a família mais restrita muito

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em particular (vinculação e estilos parentais), irão determinar o significado atribuído à doença crónica, os recursos internos e externos disponíveis, e, de forma geral, toda a adaptação da criança e adolescente, sendo a doença crónica claramente um assunto de família, onde todos os elementos vão ser afetados e ter que desenvolver mecanismos de confronto de adaptação. Assim, a família tanto pode ser um facilitador importante na adaptação, ou, pelo contrário, ser dificultadora ou um obstáculo, a essa mesma adaptação (Braconnier & Marcelli, 2000). Os padrões interativos familiares podem mesmo tornar-se um fator de risco e influenciar aspetos emocionais e comportamentais nestes jovens, bem como a adaptação psicossocial do jovem com doença crónica, o seu sucesso nas tarefas desenvolvimentais e no decurso da doença, particularmente na adesão aos tratamentos (farmacologia, dietas, cuidados de higiene, etc) (Viana, Barbosa, & Guimarães, 2007). Os pais têm sido assim considerados como importantes nas definições do papel de doente e no controlo dos sintomas e atitudes de adesão às prescrições médicas, colocando-se um ênfase especial no seu papel, na promoção da adaptação à doença crónica (Simões, Matos, Ferreira, & Tomé, 2009). Perante esta, os pais assumem, inevitavelmente, um novo papel de cuidadores, de gestão e monitorização da doença, e, em simultâneo, tentam proporcionar um espaço de autonomização ao jovem (Barros, 2009). Contudo, estes objctivos podem ser contraditórios e difíceis de conciliar, sendo necessário um enorme balanceamento entre as necessidades de proteção da saúde e as de autonomização e responsabilização. O binómio proteger e autonomizar torna-se, assim, uma arte nova a aprender, nada fácil de colocar em prática, onde impera ter que manter a proteção que o filho/a necessita, e, simultaneamente, evitar a superproteção, cujos efeitos podem ser discriminatórios, conduzir a situações de incómodo/embaraço social e a que o jovem se percecione como não sendo capaz de autonomamente gerir a sua vida (Santos, 2012). Assim, o processo de conquista da autonomia e independência dos pais (que se acentua normativamente na adolescência) pode também ficar comprometido, uma vez que o jovem se poderá ver numa situação de forçada dependência para apoio instrumental e emocional e fisicamente restringido comparativamente aos seus pares saudáveis (Kasak, Segal-Andrews & Johnson, 1995). A literatura indica que os pais de adolescentes com doença crónica parecem ser mais protetores e colocar mais restrições à autonomia e independência dos filhos, do que os pais de jovens saudáveis (Eiser & Berrenberg, 1995). Diferentes estudos evidenciam que os pais tendem a usar práticas educativas menos exigentes com os seus filhos que têm uma doença crónica (Ievers, Drotar, Dahms, Doershuk & Stern, 1994), e, por seu lado, os jovens são capazes de reconhecer que os pais lhes atribuem privilégios especiais (Walker, Garber & Van Slyke, 1995). O relacionamento pais-filhos parece também ser menos positivo na presença de uma doença crónica, e, comparativamente com famílias saudáveis verificam-se níveis mais baixos de responsividade emocional e estilos parentais

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democráticos, e, em contraste, níveis mais elevados de controlo/monitorização, sobreproteção e estilos parentais autoritários/negligentes. Por sua vez, as famílias que apresentam um funcionamento familiar não-saudável referem maior interferência nos aspetos da comunicação, papéis sociais e envolvimento afetivo/emocional (Herzer, Godiwala, Hommel, Driscoll, Mitchell, Crosby, Piazza-Waggoner, Zeller & Modi, 2010). Por sua vez, os diferentes tipos de stress/coping e estilos parentais podem ainda ser preditores de uma condição mais severa da doença, sendo que esta associação pode alterar-se à medida que a criança vai crescendo. Irritação/zanga crónicas e supressão de emoções por parte da mãe parecem ser fatores agravantes para crianças com menos de sete anos. Para crianças de sete anos ou mais velhas, comportamentos mais egocêntricos por parte da mãe parecem ser um atenuante, e, em contrário, os comportamentos de maior interferência, parecem agravar a doença (Nagano, Kakuta, Motomura, Odajima, Sudo, Kubo, & Nishima, 2010), sugerindo que as associações entre características psicológicas da mãe e a criança asmáticas são consideravelmente diferentes de acordo com a idade da criança. Também uma condição mais severa da doença se relaciona com atitudes mais críticas por parte da mãe (Hermanns, Florin, Dietrich, Rieger & Hahlweg, 1989), e, atitudes parentais de rejeição passiva ou ativa (Shibuya & Akasaka, 1993). Verifica-se ainda que, uma maior presença de problemas de comportamento na criança estão associadas com níveis mais elevados de dificuldades parentais, e, vice-versa, ou seja, pais que reportam ter mais frequentemente estilos parentais disfuncionais, indicam maiores dificuldades com o comportamento da criança (Morawska, Stelzer & Burgess, 2008). Em contraste, quando a capacidade de respostas dos pais se foca num estilo parental de apoio e emocionalmente caloroso, há uma associação com melhorias na qualidade de vida em jovens (Botello-Harbaum, Nansel, Haynie, Iannotti & Simons-Morton, 2008). Um estilo democrático parece também contribuir para uma maior adesão comportamental e menor stress pediátrico parental, podendo trazer benefícios para o funcionamento geral familiar (Monaghan, Horn, Alvarez, Cogen & Streisand, 2012) e para o controlo glicémico e adesão aos tratamentos. Por outro lado, um estilo permissivo parece predizer pior adesão aos tratamentos, ainda que, a presença de um elevado sentimento de desamparo/abandono (helplessness) em ambos os estilos parentais (democrático e permissivo) surge como um preditor para pior controlo glicémico e menor adesão aos tratamentos, concluindo-se que um estilo parental democrático e non-helplessness é associado com um melhor controlo sobre a doença (Shorer, David, Schoenberg-Taz, LevaviLavi & Meyerovitch, 2011). Ainda assim, a maioria das famílias que enfrentam uma situação de criança/adolescente com doença crónica têm uma adaptação razoável (Pinquart, 2013), e, comparativamente a famílias saudáveis, não diferem significativamente entre si no que diz respeito ao funcionamento familiar geral (Herzer et al., 2010). Contudo, esta adaptação pode ser feita com consequências para outras funções,

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papéis sociais/pessoais e períodos de crise muito difíceis (Barros, 2009). Porém, as situações específicas de epilepsia, deficiência auditiva e asma parecem ser as que apresentam maiores dificuldades em encontrar níveis apropriados de comportamentos protetores, controlo e afeto parental, no sentido da construção de relacionamentos mútuos positivos entre crianças e pais (Pinquart, 2013). Discussão No presente artigo salientou-se que, apesar dos avanços na medicina, os adolescentes com doença crónica enfrentam ainda inúmeros desafios e exigências, podendo existir comprometimento do seu desenvolvimento geral (Suris, Michaud & Viner, 2004), emocional e comportamental (Bernstein et al., 2011; Verhoof et al., 2012), e também, maiores dificuldades de ajustamento (Geist, 2003; Oeseburg et al., 2010). O tipo de vinculação precoce, as expectativas e os métodos educativos (estilos parentais) irão exercer, largamente a sua influência, sobre o reportório de comportamentos da criança, na sua socialização, bem como as atitudes e objetivos, verificando-se que a família (primeiro grupo social da criança) tem um papel decisivo no seu desenvolvimento (Camacho, 2009; Soares, 2012). O papel fundamental parental torna-se ainda mais relevante perante uma situação de doença crónica (Quittner et al., 2011; Suris et al., 2004), oscilando entre as necessidades de proteção da saúde e as de autonomização e responsabilização. Os modelos parentais podem ser, então, um facilitador ou um obstáculo, à adaptação a uma condição crónica (Braconnier & Marcelli, 2000). Na realidade, os pais de adolescentes com doença crónica tendem a ser mais restritivos à autonomia dos filhos (Eiser & Berrenberg, 1995), apresentando níveis mais elevados de controlo/monitorização, sobreproteção e estilos parentais autoritários/negligentes (Herzer et al., 2010). Respostas parentais que se focam em níveis mais baixos de responsabilidade emocional, supressão das emoções (Nagano et al., 2010), demonstração de atitudes críticas (Hermanns et al., 1989) ou de rejeição passiva/ativa (Shibuya & Akasaka, 1993), parecem também agravar a condição da doença. Por outro lado, um estilo permissivo, ou, a presença de um elevado sentimento de desamparo/abandono (helplessness) em ambos os estilos parentais (democrático e permissivo), são ainda preditores de pior adesão aos tratamentos. Desta forma, conclui-se que um estilo parental democrático e nonhelplessness está associado a um melhor controlo sobre a doença (Shorer et al., 2011), contribuindo para maior adesão comportamental e menor stress pediátrico parental, com benefícios para o funcionamento geral familiar (Monaghan et al., 2012). Acrescenta-se ainda que um estilo parental de apoio e focado na emoção se associa ainda a melhorias na qualidade de vida dos jovens com doença crónica

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(Botello-Harbaum et al., 2008). Ainda assim, a maioria das famílias que enfrentam uma situação de criança/adolescente com doença crónica têm uma adaptação razoável (Herzer et al., 2010; Pinquart, 2013). Reconhecendo a importância dos estilos e modelos parentais na adaptação dos adolescentes com doença crónica, é fundamental que futuras intervenções com famílias e pais tenham estes aspetos em conta, com o objetivo de identificar, planear e implementar estilos parentais mais eficazes e adequados a cada situação em particular. Focar a intervenção na individualização de cada caso é também fundamental, pois as respostas de adaptação dos jovens são extremamente heterogéneas. Assim, a família deve fazer um esforço concertado para, em conjunto com a escola, profissionais de saúde e grupos de pares, crie sinergias nesse sentido, transmitindo a ideia que o seu filho é um indivíduo único, sendo a doença crónica apenas uma, entre várias características da sua personalidade e vivência. Fornecer um espaço em que o jovem possa ser ouvido e fortalecer os canais de comunicação entre pais e filhos parece ser também fundamental para os jovens possam falar das suas experiências positivas e negativas face à sua condição crónica, promovendo o seu autoconhecimento. Torna-se também crucial que, após fornecidas as informações básicas relativamente à situação de saúde (pelos profissionais de saúde), que os pais ajudem os seus filhos a adquirir competências de autonomia relativamente às tarefas de monitorização da doença, e, na tomada de decisões e resolução de problemas perante a mesma. Focar a atenção nas competências e não no déficit pode ser uma ideia central a reter. Contudo, mediante todas as exigências de adaptação solicitadas aos pais/família, pode ser necessário o recurso a técnicos que ajudem a lidar com uma doença crónica, e resultantes emoções, expectativas, conflitos de valores e transições de vida. Até porque, frequentemente, estas situações de saúde podem implicar enormes alterações na dinâmica familiar, nomeadamente o aparecimento de conflitos entre o casal e o aumento da rivalidade entre irmãos (Cobb & Warner, 1999). A intervenção com pais deve fornecer aspetos principais focados em três dimensões: educacional (informação e treino de competências), terapêutica (focada nas necessidades dos pais no processamento e compreensão das suas emoções e experiências), e, organizacional (centrada nas necessidades de suporte social dos pais) (Fine, 1991), através de programas de intervenção educativa parental, apoio individualizado psicoterapêutico e terapia familiar. Outro objetivo será ainda ajudar a família a fazer a transição entre infância e juventude, mantendo uma comunicação aberta e eficaz entre os vários elementos da mesma. Existem também associações relacionadas com condições clínicas em particular (exp.: Associação de Jovens Diabéticos de Portugal, entre outras), que podem assumir o papel de rede de suporte psicossocial a jovens e pais. Estas permitem fornecer informações potencialmente facilitadoras da adaptação e compreensão da condição clínica, permitindo um sentimento de pertença e de partilha da

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mesma situação e atuar como modelos sociais de estratégias de coping eficazes, apresentando soluções em resposta aos problemas relacionados com a doença (Barros, 2009). Em Portugal, o estudo HBSC (Matos et al., 2006; 2010) e o estudo Kidscreen (Gaspar & Matos, 2008) apontam uma maior vulnerabilidade destes adolescentes, e, ressalvam precisamente a necessidade de reforço das principais estruturas de apoio (nas quais se inclui a família), alertando os sistemas de saúde e ensino para aspetos globais de saúde mental, integração escolar/social e prevenção de comportamentos de risco (Barros, 2009). Desta forma, salienta-se que a família é necessariamente um alvo de intervenção quando existem condições pediátricas incapacitantes, devido à relação crucial de dependência numa idade em desenvolvimento e também ao impacto que uma condição de saúde crónica tem na criança e ambiente familiar (Russo, Chiusso, Trevisi, Martinuzzi, Zulian, Battaglia, Viel & Facchin, 2012). Por fim, mais do que as ideias/intervenções que os pais, família, amigos, profissionais de saúde possam ter face aquele adolescente com uma situação de doença crónica em particular, o importante será ouvi-lo. E, de facto, cada vez mais, os jovens sentem que as suas vidas são geridas pelos requisitos do sistema médico. Desta forma, é importante inserir cada vez mais as suas perspetivas (Schipper & Abma, 2011), destacando-se que são os próprios jovens que indicam que gostariam que os seus pais pudessem aprender: um estilo parental pedagógico, a ter maior confiança nos filhos, e, a progressivamente, lhes transferirem maior responsabilidade sobre o seu tratamento médico, de forma a prepará-los para a vida adulta (Bregnballe, Schiøtz & Lomborg, 2011). Face a esta evidência, e, no que diz respeito à investigação, é necessário continuar o ensaio de metodologias de intervenção com os adolescentes com doença crónica, focadas nas suas necessidades individuais. Salienta-se também que cada vez mais surgem indicadores da importância em “dar voz” aos jovens com doença crónica, de forma a ouvir as suas necessidades, conhecimentos, competências e direitos específicos (Michaud, Suris & Viner, 2004), e, sobretudo, porque os jovens são descritos como intérpretes competentes do seu “mundo” (Sartain, Clarke & Heyman, 2000). Referências Ainsworth, M.D.S., Blehar, M.C., Waters, E., & Wall, S. (1978). Patterns of attachment: a psychological study of the strange situation. Hilldsdalle, N.J.: L. Erlbaum. Barros, L. (2009). Os adolescentes com doença crónica. In M. Matos & D. Sampaio (Coord.), Jovens com Saúde. Diálogo com uma geração (pp.304-320). Lisboa: Texto Editores, Lda. Barros, L. (2003). A doença crónica: conceptualização, avaliação e intervenção [Chronic Disease: conceptualization, evaluation and intervention]. Psicologia

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Prevenção e promoção da saúde: um desafio na formação de psicólogos Prevention and health promotion: a challenge in the psychologists’ training Suzane Schmidlin Löhr

Professora Adjunta do Setor de Educação da Universidade Federal do Paraná, Departamento de Teorias e Fundamentos da Educação.

Márcia Helena da Silva Melo

Professora Doutora do Departamento de Psicologia Clínica da Universidade de São Paulo.

Caroline Guisantes De Salvo Professora Doutora da Universidade Estadual do Centro-Oeste do Paraná

Edwiges Ferreira de Mattos Silvares

Professora Titular do Departamento de Psicologia Clínica da Universidade de São Paulo.

Endereço para correspondência: Suzane Schmidlin Löhr Av. Candido Hartmann, 570 conj 311/312 CEP 80730-440 Curitiba- Paraná Márcia Helena da Silva Melo Departamento de Psicologia Clínica Av. Prof. Mello Moraes 1721 (Bloco F) CEP 05508-030 - Cidade Universitária - São Paulo - SP

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Resumo: A graduação em psicologia busca a formação generalista do futuro profissional, porém, enquanto área de saúde emergente, os cursos de psicologia no Brasil tendem a reproduzir o modelo tradicional curativo, ou seja, pouca ênfase à vocação para prevenção e promoção de saúde permeia a formação do psicólogo. Essa contingência tem deixado lacunas na formação do profissional, visto que poucas ações comunitárias e de reflexão sobre a prevenção e a promoção de saúde são contempladas nos currículos e estágios de formação em psicologia; ações estas que se encontram entre as demandas mais atuais requeridas aos profissionais. Frente a estas necessidades emergentes, este artigo busca descrever propostas de atuação preventiva e de promoção de saúde passíveis de serem desenvolvidas na graduação em psicologia, visando o amplo desenvolvimento pelo aluno de recursos para uma atuação que vá além da perspectiva curativa/ clínica e que contribua para formação generalista do psicólogo. O trabalho é permeado, inicialmente, pelas contribuições à ciência preventiva no âmbito internacional. Em seguida, o texto aborda a realidade brasileira em relação a tais vertentes. Neste ponto são identificados estudos nacionais desenvolvidos nos serviçosescola de psicologia que rompem com as intervenções tradicionais. Enfatiza-se a incipiência de intervenções preventivas e promoção de saúde na formação em psicologia tendo em vista as poucas instituições de ensino que incluem em seus currículos disciplinas ou atividades de estágio com tais enfoques. A qualificação de profissionais para atuar preventivamente e na vertente de promoção da saúde é fundamental para auxiliar a sociedade a mudar a perspectiva de atuação. Palavras-chave: Psicologia; Formação; Promoção de Saúde; Prevenção. Abstract: The graduation in psychology aims a generalist formation of the future professional, however, discussing psychology as an emerging health area, the Brazilian psychology’s courses tend to reproduce the curative traditional model, which means that little emphasis on vocation for prevention and health promotion are around the psychologists formation. This contingency has left lacunas in the graduation of the future professional, because little communitarian actions and reflections about prevention and health promotion are contemplated in the curriculum and internships of psychological formation, actions that are the most current demands of professional. Thinking about these emerging necessities, the presenting article has the goal to describe prevention proposals for actions and health promotion possible to be developed in the graduation of psychology’s courses, aiming a wide development by the student of resources that go beyond the curative/clinical perspective and contribute to a generalist formation of the psychologist. The article is, initially, permeated by preventive science’s contributions to an international extent. And then, the text approaches the Brazilian reality concerning this issue. At this point, it is identified national studies developed at psychology’s school services that break with the traditional interventions. It is emphasized the incipience of preventive interventions and

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health promotion in the psychology’s formation thinking about the few teaching institutions that include in their curriculum classes or internship’s activities with such approach. The qualifications of professionals to work preventively and in the approach of health promotion are fundamental to help society to change its perspective of acting. Key-words: Psychology; Formation; Health promotion; Prevention.

Introdução Hoje é bastante difundida a noção de que ações preventivas são mais efetivas, além de envolverem menor custo financeiro. Diferentes áreas voltam-se para esta vertente de intervenção. É assim que ações preventivas são discutidas e começam a ser implantadas em escolas. As empresas mudam seu foco para a prevenção, procurando minimizar riscos de acidentes os quais, além de prejuízo direto para os envolvidos, têm alto ônus financeiro para a empresa. Políticas públicas em implantação no Brasil, como o Programa de Agentes Comunitários ou o Programa de Saúde da Família, têm forte apoio na compreensão de que a prevenção é o melhor caminho para a Saúde coletiva e dão inclusive um passo além da prevenção, estimulando ações que promovam a saúde da população. Na clínica, autores como Ribes (1990) e Bayes (1987) defendem a vocação preventiva da psicologia. Segundo tais autores, a psicologia apoiada na análise do comportamento, ao estudar em profundidade o comportamento humano, é uma das ciências que mais pode contribuir para a prevenção. Este trabalho tem como objetivo discutir possibilidades e limites dos enfoques preventivo e de promoção de saúde na formação dos alunos dos cursos de psicologia brasileiros. Segundo Ribes (1990) e Bayes (1987) a psicologia tem um importante trunfo: ao estudar o comportamento humano desenvolveu recursos para prever o comportamento antes mesmo de sua emissão. Assim, utilizando este conhecimento é possível agir no sentido de evitar o surgimento de comportamentos que possam ser prejudiciais à própria pessoa, ou a outrem. Ou seja, nós, psicólogos, podemos contribuir significativamente na implantação de ações visando a promoção da saúde de todos. As pesquisas já acumularam significativo conhecimento sobre fatores que favorecem o desenvolvimento de problemas psicológicos e sobre a eficiência de intervenções preventivas visando coibir o surgimento de dificuldades de ordem comportamental ou emocional. Estudos revelam que 50% dos transtornos mentais têm início na infância ou na adolescência (Kessler & cols., 2005) e 20% dos adolescentes que estão na escola precisam de tratamento para problemas psicológicos específicos (U.S. Department of Health and Human Services, 2000).

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Somado a isso, os transtornos subclínicos ou que não foram diagnosticados na infância ou adolescência constituem risco para o desenvolvimento de problemas futuros, e frequentemente são carregados para a idade adulta (Mash & Graham, 2005), afetando sobremaneira o desempenho dessas pessoas em seu quotidiano. A implantação de ações voltadas para a prevenção poderia reduzir o ônus financeiro para a sociedade ao diminuir as despesas com consultas, hospitalizações, medicamentos, ou mesmo com policiamento, já que ações educativas e cuidados desde a infância poderiam reduzir a violência. O efeito multiplicador da prevenção e da promoção da saúde tem potencial para impactar positivamente sobre toda a população viabilizada pela criação de instrumentos que oportunizassem qualidade de vida para todos. Ações preventivas têm cunho educativo e para que atinjam toda a população, precisam ter respaldo governamental. No Brasil a saúde da população no âmbito público é atendida e gerenciada pelo Sistema Único de Saúde (SUS). O SUS é descrito por Guaresch, Bennemann, Dhein, Reis e Machry (2009) como um marco na redemocratização do país, promotor da saúde coletiva e para atingir toda a população precisa atuar preventivamente e na promoção à saúde. Se os estudos mostram como ações preventivas podem melhorar a qualidade de vida, é importante levantar como as universidades tem formado os acadêmicos para esta área de atuação profissional. As autoras analisaram currículos dos cursos de Psicologia de um estado brasileiro, o Rio Grande do Sul, e identificaram o despreparo que a graduação fornece aos acadêmicos de psicologia para atuar no Sistema Único de Saúde (SUS). O despreparo dos psicólogos para esta nova abordagem focada na prevenção e promoção da saúde aponta para o momento de transição em que nos encontramos. Sabemos da importância das ações preventivas e de promoção da saúde e temos realizado pesquisas neste sentido. A legislação nacional está mudando e incluindo o psicólogo nas equipes interdisciplinares, mas a formação dos psicólogos ainda não conseguiu absorver na íntegra esta nova perspectiva, mantendo-se, em alguns momentos, presa ao modelo tradicional, baseado no modelo clínico e direcionado para a doença. As autoras do presente trabalho destacam que a Psicologia Social e Comunitária poderiam facilitar este aspecto, ao influenciar mudanças nas produções teóricas, metodológicas e na prática psicológica. Identificaram em algum dos currículos a disciplina Saúde propondo discussão das concepções de saúde na contemporaneidade com enfoque interdisciplinar. Staliano, Araujo e Lapa Coelho (2009) analisaram os trabalhos de conclusão de curso de psicologia sobre a intervenção junto a Agentes Comunitários de Saúde, outra estratégia com ênfase na prevenção e promoção de saúde, no município de Campo Grande- Brasil. Identificaram que os psicólogos eram chamados a compor equipes multiprofissionais, o que os fazia recorrer a cursos de especialização no sentido de desenvolver as habilidades que a graduação não havia fornecido. Paiva e Yamamoto (2010) destacam a formação em Psicologia Social no Brasil como precária e que a inserção do psicólogo no campo das

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polícias e práticas sociais constitui-se em um novo espaço de atuação, exigindo prática diferente da tradicional, de cunho psicossocial e que venha a ocorrer de forma interdisciplinar. Carvalho Teixeira (2002) descreveu o percurso da psicologia da saúde em Portugal, destacando seu inicio em 1987 e as sucessivas ações que foram sedimentando-a naquele país. Embora a Psicologia da Saúde seja um espaço para a prevenção e promoção de saúde, o que o autor encontrou foi uma tendência a enfocar variáveis psicológicas relacionadas à doença em detrimento das relacionadas à saúde. Destaca que isto se deve ao predomínio do modelo da psicologia clínica e o pouco interesse de psicólogos ligados a outras áreas, como a social e das organizações, para enfatizar a promoção de saúde. Como modelo conceitual e operativo a prevenção tem suas raízes nas medidas de Saúde Pública, que centralizam suas preocupações com o bem-estar da população. Segundo Mrazek e Haggety (1994), a Comissão de Doenças Crônicas norte-americana classificou já em 1957 a prevenção de doenças em primária, secundária e terciária. A classificação que nasceu na clínica ganhou espaço e hoje é utilizada em outros âmbitos, como escola, empresa ou comunidade. Leavell e Clark (1965) utilizaram o conceito de promoção da saúde ao desenvolverem o modelo que comporta os três níveis de prevenção. Segundo os autores, a prevenção primária comportaria a promoção de saúde e a proteção específica contra doença e agentes patogênicos. A prevenção secundária trataria do diagnóstico e tratamento precoce, enquanto a prevenção terciária, buscaria a reabilitação e a limitação da invalidez. Para facilitar a diferenciação das três formas de prevenção, pode-se utilizar a seqüência temporal do problema. Medidas tomadas antes do seu início correspondem à prevenção primária, que neste sentido diminui a sua incidência. Segundo Buss (2009), esse nível de prevenção constaria de medidas destinadas a desenvolver uma saúde geral ótima pela proteção específica do homem contra variáveis de risco. Como parte desse primeiro nível de prevenção, as medidas adotadas para a promoção da saúde não se dirigem a determinada doença ou desordem, mas servem para aumentar a saúde e o bem-estar gerais. Nesse nível de prevenção poderiam ser descritas estratégias como aconselhamento e educação a pais, esporte e lazer, educação sexual, aconselhamento pré-nupcial, entre outras. As medidas usadas durante o desenvolvimento do problema podem ser nomeadas de prevenção secundária. Neste caso serão providenciadas estratégias para reduzir o numero de casos existentes na população (prevalência). Nesse nível de prevenção a identificação de características de vulnerabilidade e de fatores de risco associados ao desenvolvimento de patologias tornam possível a atuação sob contextos em que este é aumentado. Assim, intervenção que buscam, por exemplo, agir sob contextos infantis de vulnerabilidade ao desenvolvimento, como carências afetivas e sócio-culturais, planos de ação junto a mães de bebês prematuros para estimulação precoce dos mesmo, entre outros, configuram a prevenção secundária (Pérez-Ramos, 1990). Por último, se diz que a prevenção é terciária

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se as medidas são aplicadas quando o problema já está em curso. Pode-se dizer que este tipo de prevenção procura minimizar os efeitos do problema, sejam eles físicos, psicológicos ou sociais, através da reabilitação e reintegração social assim como da prevenção de recaídas. Aqui estão elencadas, por exemplo, as estratégias voltadas a crianças portadoras de deficientes (motoras, cognitivas, visual, auditiva) com a principal finalidade de atenuar os efeitos de tais distúrbios (Pérez-Ramos, 1990), os grupos operativos em contextos de bem-estar social e saúde mental, entre outras (Yoshida, 1999). Gordon (1987), por sua vez, classifica as intervenções preventivas com base no público-alvo, considerando a relação custo-benefício. Desse modo, seriam três os tipos de ação preventiva: universal, seletiva e indicada. A primeira é destinada à população em geral ou a todos os integrantes de um grupo específico, tais como mulheres grávidas, crianças ou idosos. Nesta modalidade de ação preventiva, os benefícios superam os custos e os riscos. Na ação seletiva, a intervenção é direcionada a um grupo de risco, distinto seja por idade, gênero, histórico familiar ou ocupação. Neste caso, como ainda não há o desenvolvimento do problema, a relação custo-benefício é justificada em virtude do alto risco ao qual a referida população encontra-se exposta. A ação indicada é aplicada a pessoas que apresentam alto risco de desenvolvimento de doenças em função de algum fator genético, condição ou anormalidade. O autor inclui nesta categoria os indivíduos que, mesmo não manifestando sintomas, enquadram-se em uma situação clínica. Geralmente, os custos são significativos e os benefícios não são totalmente favoráveis aos participantes da ação, podendo ocorrer efeitos colaterais, o que leva a avaliar o custo-benefício e à extensão da medida apenas ao grupo de risco. Uma década posterior à publicação de Gordon (1987), foi realizado um estudo de meta-análise por Durlak e Wells (1997), centrado nos trabalhos preventivos com crianças e adolescentes. A pesquisa identificou dois enfoques nestes programas: voltados para promoção das competências ou para promoção da saúde. Quanto aos níveis de intervenção os autores destacaram os estudos a) centrados na pessoa ou b) centrados em alterações promovidas no ambiente que indiretamente venham a exercer ação sobre a população-alvo. Os primeiros constituíram a maioria dos programas, observando-se 106 casos contra 25. Referindo-se aos tipos de populações-alvo, estes autores classificaram os programas como universal (destinados a toda a comunidade de uma estipulada faixa etária), grupo de risco (todos da comunidade que compõem um grupo de risco, como filhos de pais alcoolistas, crianças de baixa renda dentre outros) e de transição (indivíduos que passam por uma etapa marcante e decisiva do desenvolvimento, como crianças que ingressam na escola). Revisando 177 programas americanos de prevenção primária para crianças e adolescentes, Durlak e Wells (1997) chegaram a conclusões positivas sobre este tipo de intervenção, verificando que (a) o nível de satisfação com os programas foi tão

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alto quanto o alcançado por programas preventivos desenvolvidos em áreas afins às da Psicologia, como é o caso da Medicina e das Ciências Sociais; (b) as condições apresentadas pelos grupos que receberam tratamento, independentemente do tipo de programa, foram significativamente mais satisfatórias que as do grupo controle e (c) os resultados obtidos com as intervenções atingiram um duplo efeito: tanto reduziram problemas como aumentaram competências. Os resultados encontrados por Durlak e Wells (1997) parecem refletir um avanço das intervenções preventivas quando comparados aos dados de McClure e cols. (1980), analisados a partir de 176 artigos publicados em revistas especializadas em Psicologia Comunitária e Social entre os anos de 1975 e 1978. Os estudos do passado se voltavam predominantemente para conceituações teóricas e raramente para ações interventivas. Além disso, caracterizavam-se por uma qualidade questionável e não apresentavam propostas inovadoras, pouco se distinguindo dos trabalhos clínicos individuais, contra os quais a psicologia comunitária havia se insurgido. Apesar das diferenças nos resultados encontradas por MacClure e cols. (1980) e Durlak e Wells (1997), ambos enfatizam traços distintivos dos programas de intervenção na comunidade, contrastando com os programas clínicos tradicionais: os programas de intervenção na comunidade enfatizam a prevenção e a promoção de competência da população-alvo; o modo do serviço de intervenção é pró-ativo (seeking mode) e não passivo ou de espera (waiting mode) e, por último, o cliente não é mais o indivíduo e sim o grupo. Considerando que um dos papéis do psicólogo reside na capacitação dos indivíduos a fim de efetivar sua participação na vida da comunidade, um dos aspectos em que a psicologia pode contribuir é auxiliando as pessoas no desenvolvimento de competências que lhe permitam melhorar a qualidade de suas relações com os demais. O objetivo principal consiste em que este indivíduo sinta-se bem consigo e otimize suas interações, seja com o mundo físico seja com o social. Como conseqüência direta, a aquisição de competências reduz a probabilidade de desenvolvimento de condutas que comprometam a qualidade das relações interpessoais, constituindo uma relevante forma de prevenção. Esta é a idéia de alguns autores (e.g. Spence & Matos, 2000; Arthur, Hawkings, Pollard, Catalano & Baglioni, 2002), os quais enfatizam a crescente necessidade de se pensar em programas preventivos que promovam competências, com atuação da comunidade. Autores como St. Pierre e Kaltreider (2001), Webster-Stratton, e Taylor (2001), Bierman (2004), Buhs, Ladd e Herald-Brown (2010) demonstram preocupação com as crianças rejeitadas por seus pares, evidenciando estreita correlação entre crianças rejeitadas e conduta disruptiva na juventude, envolvendo uso de drogas, evasão escolar e delinqüência juvenil. Segundo os autores citados, as crianças rejeitadas pelos pares vêm de uma história familiar de interações coercitivas, com tendência à agressividade, não cooperação e violação de regras. Todos estes elementos comprometem diretamente a qualidade das relações interpessoais,

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gerando déficits de competência social. Tal conhecimento fez com que alguns trabalhos fossem desenvolvidos, tentando reverter o ciclo disfuncional. Lamal (1997) ao desenvolver análises da cultura, mostra como o conhecimento psicológico pode ser colocado a serviço da compreensão da cultura, explicando como padrões disfuncionais são mantidos por gerações. Compreender o processo é a primeira etapa para pensar em alguma proposta de mudança naquilo que ao final da análise for percebido como não produtivo para aquele grupo, ou mesmo para a espécie humana. Aqui é importante citar Skinner (1993/1953), o qual, ao avaliar o que estamos fazendo com o mundo, reflete nas ações do homem, nas conseqüências a longo prazo de tais ações e aponta alternativas que possam evitar catástrofes futuras ou até a exclusão da própria espécie humana, caso continuemos a enfatizar o prazer imediato, sem pensar nas conseqüências a longo prazo de nossas ações. Dado o panorama internacional até aqui descrito, surge o questionamento de como se apresenta a realidade brasileira da psicologia em relação a ações preventivas e de promoção da saúde. Considerando que a atuação preventiva depende de uma formação específica apoiada na prática profissional, a qual, na psicologia, está geralmente vinculada aos serviços-escola, percebe-se que os mesmos precisam estar devidamente estruturados para tal vertente de intervenção, podendo ofertar aos graduandos recursos para uma atuação que vá além da perspectiva curativa. Nesse sentido, Lacerda Júnior e Guzzo (2005) reconhecem haver, no Brasil, tentativas de “sistematizar intervenções guiadas por lógicas diferentes dos modelos de trabalho individualistas e remediativos” (p. 247). O serviço-escola constitui um espaço para o estudante de psicologia, no qual este, em primeira instância, exercita suas habilidades profissionais, construídas durante a graduação. Trata-se de um espaço regulamentado pela legislação vigente desde a fundação dos cursos de psicologia, e inicialmente atendeu ao modelo médico: hoje, busca atender a novos modelos de atendimento, que dêem conta das recentes demandas do trabalho psicológico (Löhr & Silvares, 2006). Em pesquisas que investigam a atuação do psicólogo brasileiro, publicadas pelo Conselho Federal de Psicologia (2005) observa-se a área clínica ainda como grande preferência dos graduados. Entre as hipóteses para estes resultados estão a possibilidade de trabalho autônomo e atuação independente de vagas para contratação. Porém, essa ênfase na clínica não está em consonância com as demandas atuais, que exigem do psicólogo novas formas de atuação que extrapolem a clínica por si só (Löhr & Silvares, 2006). Será que a falta de formação para atuação em novos campos, abrindo novas perspectivas de inserção profissional, inibem o psicólogo de tentar construir novos espaços, os quais poderão requerer estratégias diferenciadas de ação? Estamos em um momento em que se faz necessário pensar na formação dada nos cursos de psicologia e os reflexos da formação recebida na atuação dos profissionais da psicologia. Observando as diretrizes para a elaboração dos currículos de psicologia, percebe-se claro estímulo à adaptação dos currículos às necessidades regionais

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e flexibilização profissional, o que acarreta uma nova visão do serviço-escola, extrapolando o modelo de atendimento apenas individual e passando a incluir ações comunitárias, assim como reflexão sobre a prevenção e a promoção de saúde. Uma iniciativa que caminha nessa direção é o movimento de integração das universidades com os serviços de saúde, representado mais recentemente pelo Programa Nacional de Reorientação da Formação Profissional em Saúde (Pró-Saúde) – produto da parceria entre os Ministérios da Saúde e da Educação, lançado no ano de 2005 – cujo eixo central é a integração entre ensino e serviço. A idéia é que os alunos, desde o início da formação, possam se inserir em práticas de atenção básica à saúde, possibilitando uma formação mais voltada para a comunidade e uma participação mais substancial da psicologia na promoção da saúde. A implantação desse tipo de modalidade de serviço acarreta não só a necessidade de modificações no currículo, mas o preparo dos professores/ supervisores do curso de psicologia para atuar nesse contexto. Apesar das novas diretrizes, estudos sobre serviços-escola brasileiros são escassos nos periódicos de psicologia. A falta de caracterização da população que procura atendimento, bem como de suas queixas, leva a formas de atendimento ineficientes, o que acarreta alta incidência de desistência do tratamento psicológico em tais serviços. Sem conhecer o público a ser atendido, não é possível determinar “quando, onde e especialmente como atender a quem procura ajuda”. Da mesma forma, sem este tipo de estudo, trabalhos preventivos envolvendo as principais demandas da comunidade, não são desenvolvidos (Silvares, Meyer, Santos & Gerencer, 2006). Foi a partir do trabalho de Ancona-Lopez (1981), que se observa um aumento gradual dos estudos sobre serviços-escola. Ainda assim, na década de oitenta apenas oito estudos sobre o tema foram publicados. Os estudos da década de oitenta descritos por Silvares (1998) apontam dados coerentes com outros citados na literatura (e.g. Ancona-Lopez, 1981, 1983, Santos, 1990) no que tange à caracterização da população que busca as clínicas escola: freqüência maior de meninos, na faixa escolar, predomínio de primogênitos, alta incidência de problemas de aprendizagem e comportamento externalizante, tendo como principal fonte de encaminhamento a escola. Os estudos da década de 90 demonstram que não houve grandes mudanças no quadro da clientela das clínicas-escola: a evasão continuou alta, poucos trabalhos enfocavam a prevenção ou a atenção primária (Silvares 1998). Manteve-se as características da população que busca os serviços, ou seja, predominância dos meninos sobre as meninas, clientela em idade escolar, maior incidência de primogênitos, alta incidência de distúrbios de aprendizagem do tipo externalizante (Silvares, Lino & Gerencer, 2006). Visando analisar a qualidade do serviço ofertado em uma clinica escola de Ribeirão Preto, Santos, Moura, Pasian e Ribeiro (1993) realizaram pesquisa, a qual identificou entre as falhas do modelo tradicional de clinica escola as filas de espera amplas, o alto nível de desistência, o predomínio da população feminina

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solteira, entre outros. As altas taxas de desistência foram identificadas no estudo de Romaro e Capitão (2003). Estes referem que a evasão em seu estudo, ao longo do atendimento psicológico, correspondeu a 32,5% da amostra, sendo a faixa de 15 a 19 anos (43%) a que obteve o maior índice de evasão. Lhullier, Nunes e Horta (2006), por sua vez, identificaram, a partir dos prontuários de 429 clientes atendidos em uma clínica-escola de São Paulo, que aproximadamente 49,5% desses desistiram do tratamento. Houve maior desistência em crianças de zero a 12 anos, além de ser identificado efeito da sazonalidade do atendimento, ou seja, para atender a demanda dos estagiários o cliente é transferido entre estagiários durante o ano, ou ao término do semestre, o que contribui para a evasão do mesmo nos momentos de mudança de terapeuta. Esses dados remetem à necessidade de repensar o modelo de funcionamento dos serviços-escola de forma a contemplar com excelência seu duplo papel: a) espaço para o treino de habilidades profissionais específicas dos graduandos; b) contexto que propicia atendimento psicológico à população, necessitando resguardar os direitos e necessidades do público-alvo. Silvares (1998) chama a atenção para o fato de que apesar dos estudos indicarem certas necessidades da clientela e a existência de formas de atendêla mais eficientes, o poder de mudança que os dados já levantados têm sobre o funcionamento dos serviços-escola é pequeno e pouco significativo. Os estudos deveriam ser vistos como diagnósticos institucionais, antecedendo e auxiliando na definição dos melhores tipos de serviços a serem prestados à comunidade, além de propiciarem a busca de formas alternativas de atendimento, que poderiam superar os impasses vivenciados pelos serviços de psicologia. A partir desses questionamentos sobre a formação do psicólogo e do papel do serviço-escola, Silvares propôs a criação, em 1991, junto à Associação Nacional de Pesquisa e Pós graduação em Psicologia (ANPEPP), de um grupo de trabalho para pensar no papel dos serviços-escola. Este grupo desenvolve uma pesquisa envolvendo consulta a acadêmicos de psicologia, professores supervisores e gestores de serviços-escola de todo o país e os resultados de tal consulta encontram-se em fase de tabulação, embora alguns dados preliminares apontem ainda para a centralização na clinica, com o despontar de ações comunitárias. Algumas ações caminhando na perspectiva do psicólogo atuar na promoção de saúde e na prevenção psicológica, descritos na literatura, ou fruto da experiência dos pesquisadores que compõem o grupo de trabalho serviços-escola da ANPEPP podem constituir estímulo para a reflexão sobre novas propostas de atendimento à comunidade por parte dos serviços-escola, capacitando os futuros profissionais para atuarem em uma sociedade que pede maior flexibilidade e capacidade de adaptação às novas contingências, por parte dos profissionais. Pretende-se a seguir, discorrer brevemente sobre tais alternativas, deixando claro que constituem apenas relato de algumas experiências, sendo possível a criação de inúmeras alternativas de trabalho. O foco maior das experiências que

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serão descritas a seguir, está em ações voltadas à saúde, migrando da vertente clínica para uma de promoção da saúde, descrevendo algumas ações preventivas realizadas em âmbito escolar. Silvares tem desenvolvido e orientado trabalhos (e.g. Melo, 1999; Silvares, 2000; Melo, 2003, 2006) diretamente na comunidade no formato de sucursais da clinica escola onde o atendimento é realizado na própria comunidade, invertendo, como cita a autora, o caminho e propiciando atendimento psicológico muitas vezes antecedendo a instauração de problemas. Neste sentido, Silvares (2000) orientou seus alunos de graduação a realizar intervenção preventiva em uma escola pública voltada para as dificuldades de atenção e organização de crianças entre 7 e 10 anos de idade. Em quatro reuniões semestrais com os professores dessas crianças, foram mostrados vídeos de suas aulas com intuito de favorecer mudanças nos padrões de interação com seus alunos. Professores e observadores concordaram quanto às melhoras alcançadas na competência social e nos problemas comportamentais dos alunos; as crianças ficaram mais atentas durante as tarefas em sala de aula bem como passaram a interagir mais com seus professores sem, contudo, que seus efeitos perdurassem. A despeito das limitações enfatizadas pela autora e a necessidade de uma intervenção ampliada, a proposta de inversão de fluxo de atendimento psicológico atingiu seu objetivo maior que consistiu em reduzir a evasão durante o atendimento, visto que nenhum dos integrantes desistiu do tratamento. Este, com certeza é um requisito indispensável ao sucesso de qualquer procedimento, seja ele psicológico ou não. Mello (2003) desenvolveu em seu doutorado um estudo preventivo multifocal, em uma comunidade de risco para a prevalência da delinqüência, a fim de promover maior aceitação da criança no entorno escolar. Os professores foram orientados na introdução de novos procedimentos com ênfase no relacionamento interpessoal estabelecido em sala de aula, desenvolvendo habilidades sociais em crianças, treinando seus responsáveis em procedimentos de instruções específicas com intuito de melhorar as práticas educativas adotadas por eles. A intervenção com professores foi adaptada de um programa adotado em escolas espanholas, desenvolvido por Trianes e Muñoz (1994). Este modelo de intervenção forneceu uma nova forma de intervenção psicológica, rompendo os limites impostos pela clínica tradicional – restrita ao ambiente familiar – na medida em que promoveu o envolvimento efetivo da Escola que sabidamente tem um destacado papel no desenvolvimento infantil. Respaldado nos estudos empreendidos por autores como Patterson, Reid e Dishion (1992), Biglan, Metzler e Ary (1994), Dumka, Roosa, Michaels e Suh (1995), Kazdin (1995), McFadyen-Ketchum e Dodge (1998), Biglan e Smolkowski (2002), Melo (2003) amplia sua proposta inicial (Melo 1999) - sem tirar o foco da prevenção - envolvendo além da família, os professores e os colegas de classe de crianças indicadas para atendimento psicológico (Castro, Melo & Silvares, 2003). Esse modelo de intervenção preventiva – focado no ambiente – mostrou-se eficiente no alcance dos objetivos propostos, promovendo melhoras, sobretudo

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na interação entre crianças e destas com suas professoras, bem como na percepção de suas mães. Em 1999 Löhr propôs, junto à graduação em psicologia de uma universidade pública paranaense, a criação de um projeto visando o desenvolvimento de Habilidades Sociais em pré-escolares. Este projeto atendeu entre 1999 e 2004 cerca de 200 crianças da rede pública de ensino na cidade de Curitiba. A meta do projeto era desenvolver habilidades facilitadoras do relacionamento da criança com seus pares nas etapas iniciais da escolarização, evitando assim o sofrimento da criança que não tem as habilidades necessárias para o convívio interpessoal produtivo e passa pela dor do isolamento por ser tímida, ou pela rejeição dos pares por apresentar um padrão de interação em que predominam comportamentos agressivos. Na condução de diversos grupos foi possível perceber que a adesão era maior por parte das famílias cujas crianças já apresentavam problemas. Os professores e direção da escola também enfatizavam mais a intervenção reabilitadora do que a preventiva. Por mais que a escola fosse esclarecida do foco preventivo do projeto, era comum o questionamento sobre a possibilidade de inserir crianças com problemas já instaurados, nos grupos de intervenção do projeto. O projeto tinha uma vertente de atuação direcionada aos pais. Poucos pais compareciam às reuniões agendadas, justificando sua ausência com a alegação de que uma vez que seus filhos não tinham problemas, não precisavam comparecer. Tal atitude mostra o quanto a sociedade ainda não está preparada para engajar-se em prevenção e promoção da saúde. O projeto, na sua implementação, pressupunha atividades desenvolvidas por acadêmicos de psicologia de diferentes séries, propiciando espaço na formação, que visava desenvolver nos futuros psicólogos abertura e sensibilidade para a necessidade de ações preventivas (Löhr, Sternadt, Loyola & Silva, 2000). Indo ao encontro da proposição de Roosa, Michaels e Suh (1995) de que todos os programas preventivos, uma vez testados e demonstrada sua eficácia, deveriam ser disseminados, Melo (2006) desenvolveu parte de seu programa preventivo multifocal, junto a psicólogos e professores da rede pública, voltado à promoção da competência social em escolares, residentes numa comunidade de risco para a prevalência de transtornos de conduta. Esse trabalho contemplou sete escolas do estado de São Paulo, envolvendo a orientação de sete professores, a aplicação do programa a 248 alunos, treinamento e supervisão a sete psicólogas que já atuavam em escolas de ensino infantil e em consultório. Se por um lado, os resultados sinalizam a necessidade de uma intervenção mais abrangente, incluindo orientação parental, por outro, foi positiva a avaliação dos ganhos verificados ao final desse estudo. Entre as crianças e seus professores, os resultados alcançados indicaram alternativas de conduta mais flexíveis e tolerantes, concretizando recomendações relativas aos programas de disseminação de que devem ajudar as pessoas a desenvolver respostas mais saudáveis na sua interação com o meio, especialmente em seus relacionamentos com pessoas significativas. A disseminação do programa contribuiu para ampliar as possibilidades de

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intervenções fora do consultório, atendendo a necessidades da comunidade (Biglan & Smolkowski, 2002, Olweus, & Limber, 2010). Integrante de um grupo de pesquisadores de Ribeirão Preto (SP), Elias (2003) realizou estudo de caracterização da população e de intervenção junto a crianças encaminhadas com queixa de baixo rendimento escolar e dificuldades comportamentais. Outro trabalho que focalizou as dificuldades acadêmicas associadas ao desempenho social foi o de Del Prette e Del Prette (2003). Os autores defendem que déficits nas habilidades sociais figuram como fatores de risco para o desenvolvimento de problemas de comportamento. Em linhas gerais, todos estes estudos enfatizam que o risco de desajustamento pode ser reduzido quando são promovidas competências gerais e específicas voltadas para a ampliação do repertório de comportamentos pró-sociais em jovens, auxiliando-os a identificar situações e problemas, implementar soluções, avaliar resultados e manter ou modificar estratégias. Naturalmente, são consideráveis as variações que os trabalhos preventivos apresentam quanto ao foco de atuação, com programas que contemplam isolada ou conjuntamente – pais, pares, crianças e professores. Por isso mesmo, Biglan e cols. (1994) defendem que a prevenção agregada à intervenção comunitária pode ser mais eficaz porque modifica a influência dos pares através da mobilização de canais adicionais, como pais e professores. A defesa, assim como a realização de estudos multifocais que buscam prevenir desajustes comportamentais via promoção de competências têm-se tornado comum na literatura (e.g. Elias, 2003; Bierman, 2004; Melo & Silvares, 2007, Webster- Stratton & Reid, 2008). Porém, ainda são poucos os estudos que incluem pais, professores, colegas, além das próprias crianças, que são alvo das intervenções, principalmente em nosso país. Nesse sentido, o delineamento de intervenções em vários ambientes, envolvendo vários agentes significativos para a criança, constitui uma alternativa importante, já que tende a produzir efeitos mais abrangentes e mais duráveis no tempo, como afirma Mash (1998). Mas se a prevenção e a promoção de saúde são tão importantes e a psicologia é uma das ciências que mais pode contribuir neste sentido, por que ela é tão pouco valorizada na formação em Psicologia? Poucas são as instituições de ensino que incluem disciplinas ou atividades práticas na forma de estágios, cujo objetivo central esteja afinado com os princípios de promoção de saúde ou da prevenção psicológica, o que significa que os modelos que focalizam a remediação de problemas/doenças ainda marcam a formação, a ciência e a profissão em nosso país (Lacerda Júnior & Guzzo, 2005). Uma hipótese para explicar tal déficit, pode estar relacionada ao fato de que professores supervisores de estágio, cuja formação deu-se nos moldes tradicionais, tendo sua prática voltada às intervenções curativas e individuais, podem sentir certo desconforto e não se julgarem capacitados para orientar acadêmicos em propostas diferenciadas, repetindo, nas atividades que orientam, o modelo que receberam em sua formação.

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A nossa sociedade embora fale tanto em prevenção, é ainda movida pelas conseqüências imediatas da ação. Observa-se que as pessoas tendem a esquivarse de ações preventivas, julgando que não é para elas, já que não apresentam no momento o problema alvo da intervenção. Ou seja, quando se oferecem trabalhos preventivos, há dificuldade de engajamento por parte da população em geral, ocasionando baixo nível de adesão. Se para o professor supervisor inserir atividades focadas na promoção da saúde e na prevenção psicológica é um desafio, se a comunidade tem baixa adesão a tais ações, fica fácil compreender o afastamento ou a dificuldade dos acadêmicos de psicologia em debruçar-se sobre intervenções envolvendo ações preventivas e de promoção da saúde e ao mesmo tempo o conflito que se instala, quando eles passam a refletir sobre o binômio custo-benefício. Para que haja engajamento dos futuros psicólogos com propostas preventivas, é necessário que os mesmos trabalhem sua tolerância à frustração e modifiquem suas crenças e valores, o que não é uma tarefa simples. Profissionais preparados para atuar preventivamente e na vertente de promoção da saúde têm condições de auxiliar a sociedade a mudar a perspectiva de atuação, o que reflete em aumento nas condições de sobrevivência pessoal e grupal, evitando problemas futuros. Os cursos de psicologia precisam analisar seus currículos, incluindo neles disciplinas que venham a desenvolver habilidades para intervenções que vão além do atendimento individual, investindo em ações coletivas. Disciplinas frequentemente ofertadas nas graduações, como Psicologia social e comunitária poderiam ser analisadas no que tange a capacitação do futuro psicólogo para a promoção de saúde da população. Precisamos lembrar que se trata de um processo em construção. Há indícios, tanto no Brasil quanto em Portugal, que os cursos de psicologia estão sensibilizados para a necessidade de formar os futuros profissionais na direção da promoção de saúde, mas a mudança de paradigmas demora certo tempo para de fato concretizar-se. Referências Ancona-Lopez, M. (1981) Avaliação de serviços de psicologia clínica. Dissertação de Mestrado, Departamento de Psicologia Clínica, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo. Ancona-Lopez, M. (1983). Características da clientela de serviços-escola de psicologia em São Paulo. Arquivos Brasileiros de Psicologia, 35, 78-92. Arthur, M. W., Hawkings, J. D., Pollard, J. A., Catalano, R. F., & Baglioni, A. J. Jr. (2002). Measuring risk and protective factors for substance abuse, delinquency, and other adolescent problem behaviors: the communities that care youth survey. Evaluation Review, 26 (6), 575-601. Bayes, R. La prevención del câncer. (1987). Jano: Medicina y Humanidades, 33 (783), 45-55.

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NÚMERO ANTERIOR À conversa sobre violência entre especialistas: Tertúlia no âmbito do Congresso “Prevenção da criminalidade e dependências” na Universidade Lusíada de Lisboa, Abril 2012 ........................................................................................................ 11 Margarida Gaspar de Matos, Armando Leandro, Eurico Reis, Isabel Stilwell, Izabel Baptista e Jorge Negreiros O consumo de álcool pelos alunos do 9.º ano de escolaridade no distrito de Beja: fatores determinantes....................................................................................... 21 Teresa Tavares, Jorge Bonito e Maria Manuela Oliveira Os Novos Caminhos da Reabilitação Alcoólica: Uma Proposta de Intervenção .49 Sónia Ferreira e Lídia Moutinho Programas de prevenção primáriada violência nos relacionamentos íntimos: da prática Internacional à prática Nacional................................................................. 65 Rosa Saavedra e Carla Machado Delinquência juvenil: Da caracterização à intervenção ........................................ 95 Teresa Braga e Rui Abrunhosa Gonçalves Perturbações do Comportamento na Infância e Adolescência: Uma Revisão da Literatura .................................................................................................................... 117 Anabela Rosa Amaral Rosando La conducta antisocial adolescente a la luz de las ciencias del cerebro........... 129 Alfredo Oliva Delgado Alienação parental: síndrome ou não, eis a questão ............................................. 149 Marta Costa e Catarina Saraiva Lima

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Prevenir – um modelo de intervenção longitudinal ............................................... 183 Lorena Crusellas, Marta Costa da Cruz e Margarida Barbosa Determinantes do comportamento tabágico e implicações para a prevenção do tabagismo ..................................................................................................................... 191 Paulo D. Vitória, Cátia Branquinho e Hein de Vries

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UNIVERSIDADE LUSÍADA EDITORA Últimas publicações ENSAIOS Rueff, Maria do Céu (Coordenação) Direito da Medicina - Eventtos adversos, Responsabilidade, Risco - 2013 Silva, Paulo Brito da Geometria da Iluminação Natural na Arquitectura - 2013 Oliveira, Maria Isabel de Matos Braz de (Coordenação) Seminário Internacional da COR - 2012 MANUAIS Rodrigues, Paula Cristina Lopes Marketing em contexto de mudança - 2012 Peliganga, Mandume Licumbi, Azevedo, Rui Gabriel Araújo de Energias Renováveis, Sistemas Fotovoltaicos e Eólicos - 2012 TESES Campos, Ana Paula C. Ordenamento Vocacional Susutentado - 2012 Journal of Child and Adolescent Psychology Revista de Psicologia da Criança e do Adolescente. Lisboa, 4(2) 2013

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Pinheiro, Ricardo Futre Jazz fora de horas: Jam sessions em Nova Iorque - 2012 Manoel, Bernardo d’Orey Fundamentos de Arquitectura em Raul Lino – 2012 REVISTAS Revista de Economia & Empresa Serie II, n.º 15 (2012). Lisboa Revista de Estudos Jurídico-Políticos (POLIS) N.º 18/21 (2012). Lisboa Revista de Intervenção Social N.º 39 (1º semestre de 2012). Lisboa Revista de Psicologia da Criança e do Adolescente Volume 3, n.º 1 (2012) ACTAS Ollero, Rodrigo (Coordenação) (2012) Actas 3º Encontro ESTEJO. CITAD (Universidade Lusíada)

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