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Expocrato Expocrato

Falar sobre a Expocrato, assim como foi escrever toda a Revista Memórias Kariri, antes de tudo, tem sido para mim um desconforto. Um exercício de desacostumar o olhar. Tenho me esforçado para tornar-me turista na cidade que nasci, na rua do colégio em que quase sempre estudei, nas calçadas que brinquei quando criança – até parei de sentar no mesmo banco da Praça da Sé onde tropecei e cortei-me aos seis ou sete anos, quando conquistei a cicatriz na sobrancelha que carrego até hoje. Descobri nesta experiência de escrever sobre o Cariri que o tempo de convivência em um lugar determina o grau de estranhamento das coisas. Embora vejamos mais, percebemos muito menos, porque passamos a estranhar muito pouco. É como pensar, só que ao contrário, a sensação de estar pela primeira vez em um ponto turístico muito famoso de uma cidade que não é a nossa. Tudo parece fácil de ser notado. Em consequência, voltar ao Parque de Exposição Pedro Felício Cavalcante em época de Expocrato, pela décima oitava vez, nesses meus vinte anos de vida para construir uma pauta de ensaio fotográfico, foi no primeiro contato frustrante.

Tudo parecia comum, do mesmo jeito. Do que vi, pouco poderia muito descrever. Recorri ao passado. Busquei na memória as minhas imagens da Expocrato e me apeguei a uma lembrança da infância, quando só conseguia ver de baixo para cima a multidão e a mão de minha mãe. Foi o momento que silenciei. Fato e memória, o contraste que necessitava. Reconheci, naquele momento, a dinâmica do tempo no espaço e as singularidades passaram por a ser vista outra vez. Fiz percurso olhando para baixo, fotografando por aquele ângulo que por anos foi meu. Os primeiros passos fediam a estrume e cachorro molhado, depois cheiro de fritura e óleo quente e nos últimos passos pude sentir a quentura do fogão a lenha e o sabor de rapadura na boca. Estava no engenho de cana-de-açúcar e ali comecei a fotografar. A pauta deste ensaio é a ressignificação. É uma crônica que se reproduziu em mim da saturação das mesmices de todos os anos ao reconhecimento do “tudo novo de novo”. Este ensaio está em construção. Por isso, interprete-o.

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