No monte do Senhor se proverá!

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O Caminho da Graça

NO MONTE DO SENHOR SE PROVERÁ! Caio Fábio

Leia o texto de Gênesis 22: 1 – 19

Abraão é um homem que caminhou sob o signo dos abandonos. Das renúncias. Das retiradas. Tudo começa conforme a narrativa de Gênesis no capítulo 12, quando diz que ele ouviu a voz de Deus que o retirou da casa do seu pai e o enviou para um lugar, uma terra que lhe era absolutamente desconhecida. Sem fixarlhe residência. Processo no qual ele esteve durante décadas e décadas, por aproximadamente 60 anos, peregrinando em terras estrangeiras. Uma residência mais demorada aqui, logo uma mudança para ali. O acossamento da fome chegava. Eles tinham que se refugiar em algum outro lugar. Daí Abraão ser o pai dos Hebreus, dos Appiru. Que significa aqueles que andam, cruzam, atravessam. Que se mantém em movimento. Que se mantém em processo. Que não param nunca. Os desinstalados, em processo de movimento. E isso teve a ver não apenas com geografias. Teve a ver com decisões existenciais, relacionadas à vida toda dele. Como eu disse: iniciou com aquela voz que dizia “sai da tua casa, da tua parentela, da casa dos teus pais e vai para uma terra que Eu te mostrarei”. E ele se levantou e foi. E se você for lendo do capítulo 12 em diante no livro de Genesis, o que você vai ver são esses movimentos. Não apenas de

um lugar para o outro. Quando tudo parecia estar relativamente instalado num lugar, ele se levantava para outro lugar por ordem divina. Você observará a quantidade enorme de processos de separação, renúncia, afastamento. De tornar a vereda dele mais leve à medida que ele caminha. Deixou a casa dos pais. Depois de um tempo ele teve que se separar do seu sobrinho Ló, que andava com ele, mas porque os pastores de Ló e os pastores dele viviam em confusão, o Senhor disse a ele: “diz a Ló para escolher para onde quiser ir na Terra. A Prioridade de escolha é dele. Se for para um lado, tu vais para o outro, mas não é bom que haja divisão, conflito, guerra, problema entre tu e aqueles que são da tua parentela”. De modo que Ele disse à Ló “escolhe Ló aonde tu queres ir” e Ló escolheu as campinas do Jordão, porque lhe pareciam formosas e foi armando as suas tendas cada vez mais na direção de Sodoma, aonde Ló veio a habitar. Depois disso vemos aquela luta enorme de Abraão e Sara por gerarem um filho. E eles eram aparentemente incapacitados de o fazerem. Pelo menos Sara parecia se estéril. E não conseguia (lhe) dar à luz a um filho. E sobre eles repousava justamente uma promessa que afirmava que a grande benção de Deus na vida deles se estabeleceria através de um filho que deles

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Então disse Deus: "Tome seu filho, seu único filho, Isaque, a quem você ama, e vá para a região de Moriá. Sacrifique-o ali como holocausto num dos montes que lhe indicarei".[...]


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Aí Sara recorre à ideia de um “bebê de proveta”. Pediu ajuda a Agar, que era uma serva da casa. Uma egípcia. E disse a Abraão: “já que eu não posso te dar filhos, procria com Agar. Ela é jovem. Ela provavelmente seja fértil. E assim é possível que a promessa de Deus tenha a sua sequência pelo fato de que o filho será teu. Embora não seja do meu ventre. Como tu é que ouviste a voz de Deus dizendo: ‘da tua descendência eu abençoarei a Terra’, não significa dizer que tem de ser do meu ventre. Pode ser do ventre de outra mulher, mas essa promessa tem que se cumprir. Porque da semente de Abraão proverá esse grande manifestar do Amor e do abençoar de Deus sob nações e povos do planeta Terra”. Abraão tomou para si a escrava Agar, servente de Sara, passou a ter relações sexuais com ela e ela engravidou não muito tempo depois. E aí vem um terceiro corte na vida dele. Bem dolorido. Como diz o livro de Eclesiastes, quando você pega um escravo com mentalidade de escravo, com complexo de escravo, com cabecinha minimalista de escravo, com ambições frustradas de escravo, e o torna príncipe ou princesa do dia pra noite, o coração dele fica insensato, tolo, e não raramente surta.

E foi o que aconteceu com Agar, tão logo o seu filho, que se chamava Ismael, nasceu. E é o que acontece com muita gente aqui entre nós, que não está acostumada a comer mel e quando come se lambuza. Você começa a favorecer a pessoa um pouco mais, ela tinha uma mentalidade tão minimalista, tão reduzida, que logo depois começa a ser tornar abusiva. Mas não é por causa disso que o Evangelho manda que voltemos atrás. O que o Evangelho manda é que tratemos a todos com toda a graça e ajudando. E podendo fazê-lo, fazendo-o sempre, agora cada um viva com as consequências da insensatez que assuma. Com Sara e Agar foi isso que houve. Tão logo Agar deu á luz a Ismael, ela começou a se sentir ensoberbecida e superior à sua senhora, à mulher de Abraão, e passou a tratá-la, a desrespeitá-la e a desconsiderála. De tal modo que Sara ficou completamente tomada de todos os sentimentos que vocês possam imaginar. Não consegue dar à luz. Frustrada com isso. Pede ao marido que mantenha relações sexuais com a escrava, para que por ela o marido tenha descendência e quem sabe ela ache um viés na benção de Deus. E, tão logo a mulher dá à luz, passa a desrespeitar a sua senhora. Imagine os elementos femininos que se combinaram na cabeça de Sara a ponto de isso se tornar totalmente insuportável para ela. Então ela chamou Abraão e disse: “Olha eu não suporto mais! Manda a escrava embora com o menino”. E diz aqui, em Gênesis 16, que isso foi extremamente penoso pra Abraão. Ele sentiu uma dor enorme. E fez o que ela pediu. Lá, Pedro diz que as mulheres devem ser como Sara, que chamava Abraão de meu senhor. Mas quem manda aqui é ela! Em quase tudo... Então aí: “não quero mais a mulher e o filho aqui”. E o Abraão, com um coração de

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haveria de proceder. Do ventre de Sara. Mas décadas vão passando e esse filho não vem. A ponto de que Sara começa a envelhecer de tal maneira que vai entrando naquele processo de menopausa. De já não poder mais procriar, não ovular. E depois de todas as tentativas ela se cansou. Embora aquela fosse uma promessa recorrente. Desde que eles saíram da casa do seu pai, a benção de Deus sob ele era essa: “será de sua descendência que Eu abençoarei todas as nações da Terra”. E ele não gerava descendência nenhuma.


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Logo adiante, Deus se apiedou de Agar e ouviu a voz de Agar no deserto, quebrantada. Enviou um anjo do Senhor que disse: “Agar, o Senhor é contigo e o Senhor vai te abençoar também e vai fazer do teu filho Ismael, uma grande nação. Agora volta para a casa da tua senhora, Sara, e aprende a respeitá-la e fica lá por que haverá acolhida para ti. Ela volta. Só que 12 anos passam, 12 anos mais nesse convívio, quando não se sabe amainou, mas de qualquer modo era um convívio tenso. Quem um dia já mandou o outro embora e convive mais 12 anos sem mudança alguma, vive num estado de tensão enquanto o menino crescia e ficava taludinho. E entrou na puberdade. Tornouse pré-adolescente. Quando o Senhor visita a Abraão mais uma vez, dentre várias que lhe havia feito, e envia-lhe o Anjo do Senhor, que é uma manifestação do Cristo Eterno, e dois anjos para prometerem que a graça de Deus os visitaria e a descendência dele procederia de Sara. E não de qualquer arranjo. E Sara ouvia isso atrás da tenda, atrás de um véu. De um cortinado. Quando ela ouviu esse negócio, nem Sara se aguentou na presença de Deus. Começou a dar umas gargalhadinhas. O Anjo do Senhor, o Cristo Eterno perguntou a Abraão: “por que se ri Sara lá atrás escondida? Pensa que Eu não estou sabendo das coisas? Está caindo na gargalhada”. Porque ela dizia: “eu não menstruo já faz um tempão, meu marido

(me desculpem a expressão) está broxa (só se for com guindaste celestial e com fertilizante da Nova Jerusalém para poder acontecer alguma coisa aqui)”. Então ela estava achando aquilo patético. Estava mais idosa do que a minha mãe. Imaginem só! Chegar assim o Senhor e dizer à minha mãe que ela ia dar à luz a um filho. E olha que ela ainda está um broto de 84 anos. A Sara já estava com seus 90. E Abraão com 100. Abraão era um homem de fé: “se o Senhor está dizendo, eu estou aqui”. E se for para um exercício desses de levantamento, que a graça de Deus venha sobre mim. Sara disse: “desse ventre não sai coelho, quanto mais menino. Nunca saiu, porque que agora depois de “morto” (tinha virado uma sepultura o ventre de Sara)?”. E ela riu de ironia. Riu do absurdo. O Senhor disse: “Ela está rindo! Daqui a um ano eu te visitarei outra vez e vocês estarão aqui, nesta casa, com a criança chorando. Um neném que vai nascer dela. E vai brotar leite do peito dela e ela própria amamentará”. Quando o neném nasceu, diz aqui o texto em Gênesis, que Abraão ficou muito feliz. E deu um grande banquete. Depois de 60, 65 anos esperando aquilo todo dia, nasce o menino. Abraão convidou todo mundo. Mandou fazer uma festança. Foi um dia de alegria e júbilo. A criança ainda era um bebezinho. Estava no processo de amamentação para ser desmamada, e o seu filho Ismael (filho dele com a escrava Agar), que já tinha seus 12 anos de idade, vendo aquela festa toda ficou enciumado. A mãe dele também ficou provavelmente enciumada e despeitada. Todos aqueles sentimentos ruins que podem acontecer no coração humano levantaram-se e ele começou a caçoar do menino. Sabe lá o que ele dizia. Caçoava do garotinho. Isaque não devia ser uma gracinha, para Ismael ter

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galinha, pegou Agar e o menino e mandouos embora. A criança ainda era um bebezinho. Mas no deserto, para onde eles foram, ele deu apenas alguns elementos básicos para a sobrevivência: botija com água e pão. E os despediu. Os entregou ao deserto como os pais de Moisés o entregaram à correnteza. À providência divina. E ficou doido.


tanta razão para caçoar dele. Vai ver que o “bichinho” era meio troncho, qualquer coisa assim. Frequentemente a graça de Deus vem em coisas tronchas. Ismael, “como um bom pai dos árabes”, tinha aquele humor absolutamente desastroso quando deseja. De tal modo que Sara ficou tão importunada de ver aquele filho que deu uma de mãe ciumenta em creche, que chama a diretora, a professora, o marido. Quer resolver o assunto no Conselho Tutelar quase. Chamou Abraão e disse: “agora eu não agüento mais. Há doze anos eu suportei. Segurei a onda até agora, mas agora é com meu filho. E eu não vou admitir que isso aconteça assim. Com meu filho crescendo complexado com esse Ismael, essa Agar fazendo pouco dele. Manda-os embora. (isso é porque ela chamava Abraão de ‘Meu senhor’!) Abrão ficou com o coração pesado. O texto diz que isto outra vez muito lhe pesou no coração, por causa do menino e da serva. E o coração dele ficou esmagado. Mas o Senhor disse: “Não receie em fazer o que te pede Sara, tua mulher”. E de fato o pedido dela era: “rejeita”! Esta é a palavra usada no texto bíblico: “rejeita esta mulher e este menino e manda-os embora”. E Abraão teve que mais uma vez fazer um corte. Uma renúncia. E pegou Agar e o menino. Fez provimentos como ele pode e os enviou com a promessa de que Deus os abençoaria. Como de fato veio abençoálos, porque havia uma benção de Deus para Agar e Ismael. E a descendência deles prosseguiu. Todavia, aquela era a hora de se fazer mais um corte, de se passar mais um cutelo no cordão umbilical. Lá na Mesopotâmia, em Ur dos Caldeus. Um cutelo entre ele e seu sobrinho Ló. Um terceiro cutelo quando ele mandou Agar e Ismael embora. Agora, a quarta vez, mais difícil, porque doze anos se haviam

passado. Ele tinha amizade, convívio, carinho, relacionamento com o filho e mais uma vez manda-o embora. Esse homem é o pai da fé. Agora vejam como a fé vai se construindo com cortes. Cortes. Cortes. Quebras. Rupturas. Abandonos no sentido de obedecer à voz. E aí se chega nesse momento, quando o garoto agora Isaque já está com doze anos aproximadamente. Com a mesma idade com que ele tinha despedido Ismael. Ironia divina. O menino com doze anos. Com a mesma idade com que ele tinha mandado Ismael embora. Vem a voz do Senhor para ele, na sua tenda, numa noite escura e fala-lhe o absurdo: “Abraão”. E ele disse: “eis-me aqui, Senhor. E o Senhor lhe disse: “toma teu filho Isaque, teu único filho a quem amas (ainda vem com este detalhezinho sofisticado). Toma teu filho, teu único filho Isaque (que era o filho da promessa) a quem amas e oferece-o a mim em holocausto, em sacrifício em um dos montes que Eu lhe mostrarei”. Pelo amor de Deus, em dias atuais, um cara que dissesse que ouviu Deus falar uma coisa dessas seria internado na mesma hora sob sete chaves. Um cara perigosíssimo. Pelo menos não venha com essa conversa para mim, que eu prendo você na mesma hora! E se eu chegar com essa conversa para vocês, por favor, me algemem. Façam alguma coisa. Aí você diz: “ué, por quê?”. Porque hoje o Verbo já se fez carne. Já habitou entre nós cheio de graça e de verdade. Toda a revelação Dele já me foi dada. E Ele já disse “quem me vê a mim vê ao Pai”. E Ele já disse qual é a palavra Dele. E Ele já nos revelou todas as coisas, de modo que Abraão vivia no tempo do mistério ainda oculto. Nós vivemos agora no tempo do mistério revelado. Está dito. O caminho está todo definido. Mas Abraão vivia na era da

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para eu não enfiar esta adaga no meu peito. Liberta-me, Jesus, dessa desgraça que me carcome mas que eu adoro tanto!. Ah me dá forças pra eu não continuar saindo com aquela mulher que destrói a minha vida mas que tem uns cheiros incomparáveis. Ah, Jesus, me liberta daquele homem que não me ama mas que me faz sentir uns prazeres esquisitos”. Pelo amor de Deus. É um negócio danado. O cara rouba. Vai ser preso. Está sendo destruído. Acabando com o caráter dele. Está andando na direção da “morte”, mas que dificuldade parar de roubar! Corrupção: “Senhor, me dá forças para eu parar de me corromper!”. É mais ou menos nesse nível que estamos lidando. Olha só a idiotice. Depois dizemos que tem fé. Eu vejo pessoas em pânico me pedindo oração. E alguns em angústia profunda e revolta com Deus porque o pai ou a mãe de 90 anos morreu. De vez em quando, eu encontro alguém que está de mal com Deus. Eu digo: “por que meu irmão?”. E ele diz: “porque o Senhor levou o meu pai e eu não aceito isso”... Quando alguém, além de Jesus, venceu a morte no planeta Terra desde sempre? A gente já não nasce sabendo que vai morrer? Mas os “caras” querem parênteses familiares.... “O meu pai não!... A minha mãe não!”. Esse corpo aqui já foi novinho. Cada ano ele vai ficar “mais esbagaçadinho”, e vocês vão assistir. Até chegar o dia em que ele vai se consumir. Nada mais natural. E eu acho lindo esse processo. No entanto tem gente que luta contra os fluxos naturais da vida inteira quanto mais em relação àquilo que Deus nos peça para fazer de nós, de meninos idiotados em homens e mulheres genuinamente andando na direção dos

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subjetividade. Não havia ainda nem lei de Moisés. Não havia escritura. Não havia nada. Só havia subjetividade. E, aliás, a única perspectiva que Deus poderia falar com o homem tal coisa era numa era da mais absoluta subjetividade, no que diz respeito à revelação e a relação dele com os seres humanos. Porque logo, logo, na lei de Moisés já se proibiu tal coisa, e na medida em que a revelação evoluiu na consciência humana isso se tornou abominável. E em Jesus a ordem é: “ama o inimigo. Ora pelo que te persegue”. E não existe a menor chance de que tal lhe seja solicitado. Não dessa forma. Não nesses termos: “pega teu filho, te único filho, Isaque, a quem tu amas, e leva-o a um monte que te mostrarei e oferece-o a mim em holocausto”. Nesses termos nunca mais. Até porque o filho unigênito, absoluto que não é Isaque, é Jesus, já foi oferecido de uma vez para sempre diante de Deus, como prova do amor do homem por Deus. Não da humanidade por Deus, mas do Filho do Homem amando ao Pai por todos os homens que não o amam ainda. Que não o amaram até aqui, até agora e que não obedeceram até aqui e até hoje. No lugar de todos Jesus disse: “Eis-me aqui. No livro está escrito a meu respeito. Cumpra-se em mim toda a Tua vontade”. De modo que Jesus amou a Deus por mim primeiro. De tal modo que nunca dessa forma nos será tal solicitado. Mas a fé carrega consistentemente as mesmas marcas que definem a jornada de Abraão, que é o pai da fé. Cortes. Renúncias. Estou falando isso para uma assembleia de caprichosos, que não aceita renúncia, nem aquilo que lhes faz mal, nem aquilo que está matando. O cara tá sendo morto assassinado todo dia. Está se suicidando. E a Palavra vem e diz: “não faça mal a você”. E o sujeito entra em luta com os céus: “Senhor, me dá forças


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Abraão saiu sem saber para onde ia. Com a mulher e um sobrinho (que perturbava). Aguenta aquilo anos, sustenta o sobrinho, leva o peso para lá e para cá, e o sobrinho dando trabalho. Chega uma hora em que o Senhor diz: “deixa o sobrinho ir, pois onde pisar a planta dos teus pés Eu te abençoarei, mas dá a ele o poder da decisão prioritária e livre”. Vem a história de Agar (“Vamos gerar um filho pelo ventre dela, não será meu, mas a semente é tua. Vamos criar um casuísmo para Deus cumprir a promessa Dele e eu poder dormir e morrer em paz de que eu não atrapalhei a benção de Deus na tua vida, ó marido”). A escrava dá à luz mas vem o capricho e as dores de Sara e ele tem que mandar o menino embora. Depois Deus o visita. Vem o filho dele. Num dia de grande alegria, Ismael surta, começa a falar mal da criança. Aí vem outra voz de Sara dizendo: “agora não dá mais, manda de

vez”. E doze anos tinham se passado. As afeições tinham se entranhado. De modo que ele faz isso, mas não sem uma dor horrenda. E agora, mais doze anos se passam, quando chega essa noite escura e Deus diz: “agora pega a Isaque, teu filho, teu único filho a quem tu amas e leva até o monte Moriá e oferece-o ali num dos montes em holocausto a mim, Abraão”. E o pior. Aqui se diz: “e Abraão se levantou e foi”. Nós íamos reunir um grupo de pastores, procurar todos os conselhos. E o primeiro que encontrássemos iria logo dizer: “não faz isso não, rapaz. Não seja doido”. E iríamos dizer: “é, realmente Deus não falou comigo. Foi impressão minha”. Como ouvi em um documentário do History Channel, um idiota dizendo que não foi a voz de Deus, foi um ET do mal que falou com Abraão. Foi um intergaláctico das trevas, mas não foi a voz de Deus. Mas Abraão se levanta e vai. Levanta-se de manhã. Pega o seu jumento. Dois servos. O filho. Reúne lenha. Bota lenha sobre o ombro do filho. Os servos vão levando o jumento. E ele vai, com uma tocha em uma mão, um cutelo na outra. Vinham de Betseba, no extremo sul. Andaram até Jerusalém. O monte Moriá está em Jerusalém, que naquele tempo não tinha nenhuma população à volta. Exceto um povoadinho pequeníssimo embaixo chamado Gebus, dos gebuseus. E o monte Moriá, solitário, sobressaindo sob as demais montanhas. Ele todo liso em pedra. E quando ele viu ao longe o monte, o Senhor disse a ele: “deixe aqui os dois servos e o jumento e vai sozinho com o garoto”. Porque este espetáculo é inassistível. É absurdo. Está para além da imaginação. Nenhuma mente pode processar.

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patamares, das dimensões da consciência de Deus. Da amizade de Deus. Do amor de Deus. Da entrega a Deus. Do mergulho em Deus. A ponto de que Abraão foi chamado amigo de Deus. Nossas lutinhas são essas aqui, com esses caprichos. E nós pensamos que somos gente de fé? Somos uns idiotas de umas crenças bobas que nos reúnem no domingo à noite e em alguns horários durante a semana. Mas fé ainda anda muito longe do nosso coração. Fé para coisas mais básica que são: - “sai da tua casa, da casa de teu pai, da tua parentela e vai para onde Eu te mostrarei”. – “Não, não posso. Mudar de cidade? Jamais! Para longe da casa de papai e de mamãe? Nunca! Aí, meu Deus. Pelo amor de Deus. Eu vou entrar em pânico! Vou cair em depressão”. E isso é com contrato assinado, com emprego garantido. Com um monte de coisas. Para ganhar bem e o cara não vai.


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“Ficai aqui e eu e o menino iremos e, em tendo adorado, voltaremos para junto de vós”. É uma imagem crítica extraordinária, a do menino levando o madeiro e o pai com o fogo e o cutelo. É a cruz antes da crucificação. É a cruz arquetípica se manifestando mais uma vez na história humana, numa decisão de fé que agora envolve um coração de um pai humano e de um filho humano. Numa obediência louca e absurda. Para além de todo e qualquer valor, conceito moral, ético, explicação, filosofia. Transcendendo a qualquer que seja a lógica, o bom senso ou sentido. Loucura. Como loucura é a salvação de Deus oferecida em Cristo Jesus pela pregação da fé. Lá vai Isaque levando o madeiro, e Abraão com o fogo e o cutelo. E vem essa pergunta dilacerante do filho ao pai: “pai?” E Abraão disse: “eis-me aqui, meu filho”. E ele disse: “eis aqui a lenha. Aí eu vejo o fogo e cutelo, mas onde está o cordeiro para o holocausto?” ― “Meu filho, o Senhor proverá para si o Cordeiro. O Senhor proverá para si o Cordeiro”, respondeu.

Estamos falando aqui de coisa grande e nós não passamos de uns panacas. “O Senhor proverá para si o Cordeiro”... Não conseguimos renunciar a um capricho ou abrir mão de uma segurançazinha que, às vezes, não é nem segurança, mas apenas um estepe, uma escolha. É uma decisão temporária, de uma coisa que nosso coração já sabe que não tem nenhuma definição nela, mas é apenas um conforto existencial e psicológico de um momento. Brigamos e fazemos confusão e luta com Deus e com a vida por causa de situações que são de “Barbie”, são conflitos de “Barbie e Ken”, que nós levamos em oração diante de Deus, dizendo “oh, Pai, pelo amor de Deus”. Eles chegam lá e Abraão num silêncio horrível. O garoto mudo, o pai petrificado. Abraão vai fazendo tudo o que tem de fazer. Amontoa pedras. Pega a lenha de cima do filho, arma-a sobre o altar. Ateia fogo. E o garoto olhando em perplexidade apavorada dizendo: “Meu Deus! Que louco é esse? Que Deus é esse? Que voz é essa? Que pai é esse? Que devoção é essa? Quem sou eu?”. E Abraão amarrou o filho e o deita sobre o altar. Ateia fogo embaixo. O fogo começa a crepitar e ele se prepara com o cutelo. E o garoto olhando para ele em silêncio e em temor. E ele vai baixando o cutelo com tamanha veemência que diz a narrativa do livro de Gênesis que o Anjo do Senhor lhe bradou com insistência: “Abraão, Abraão!” porque ele ia descendo o cutelo com toda a decisão para degolar o filho. E Abraão voltou-se e o Anjo do Senhor, que é o Cristo Eterno, que é o mesmo da cruz, o mesmo que se deu por nós no lugar de Abraão, Isaque, Jacó, de mim, por todos nós, disse: “agora eu sei que tu temes a Deus! Porque tu não me negaste o teu único filho”. E mostrou e

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Então Abraão diz: “fiquem aqui. E eu e o menino iremos. E tendo O adorado voltaremos para junto de vós”. Mais adiante, lemos em Hebreus, no capítulo 11, que ele iria matar o filho. Como, de fato, levantou o cutelo para degolá-lo, crendo, todavia, que se Deus lhe fizera uma promessa ― de que daquele filho lhe viria descendência e as bênçãos todas prometidas ― Ele seria poderoso para ressuscitar o seu filho de dentre os mortos. Era o tamanho da loucura do homem, que é conforme a loucura de Cristo, que se entrega à morte para ser ressuscitado, que é conforme a loucura do Pai. Por isso Abraão é o pai da fé.


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Nenhum de nós jamais foi posto numa decisão desse nível. Jamais. Nem o seremos porque Jesus já é a consumação de todas as decisões dessa gravidade absurda para além de toda a compreensão de toda moral, de toda ética, de toda razoabilidade. Deus estava em Cristo realizando a loucura e o absurdo que os homens não entendem, mas que era o absurdo dos absurdos. Porque era Deus matando Deus. Era Deus tirando de todos os universos a Deus. Era Deus morrendo. Essa é a loucura. É Deus matar Deus. É o Cordeiro imolado por todas as criaturas, por todas as dimensões. Por todos os mundos, por todas as eras. De todas as eternidades anteriores a qualquer outra para eternidade, aeon, tempo. Ou referência, existência, percepção e consciência que tenham existido no passado, no presente ou em qualquer que seja aquilo que chamemos de futuro. Está consumado. Agora pense que você não está diante da subjetividade do absurdo, numa noite escura com a voz de Deus visitando você e dizendo pega teu filho e mata! Leva até o telhado do Caminho da Graça e o oferece em cima da Estação em holocausto a mim, Caio. Nunca mais alguém ouvirá tal voz. Nós temos o Evangelho. E o único ser que se manda matar no Evangelho é o meu self, é o meu si mesmo, é a minha persona ilusiva, caprichosa e adoecida, que seja levada para cruz, seja negada, deixada para morrer para que se tenha vida, para que

apareça o eu verdadeiro seguindo a Deus em consciência em desprendimento, leveza, liberdade e obediência. No mais, ninguém é chamado a matar ninguém, mas somos chamados a cortar um braço, a cortar uma perna, a arrancar um olho, coisas de que não queremos mais saber, porque a religião criou um rolo compressor de adulação, um circo de fanfarrices tão pernósticas e tão avassaladoramente distanciadoras do nosso coração em relação ao que seja coragem de ser em Deus e para Deus, que qualquer palavra que não nos adule o ego, que não nos seja uma promessa de que nada em nós jamais será pedido, de nós que viveremos apenas de acréscimos e extensões, é por nós imediatamente rejeitada e repudiada especialmente nessa geração. Eu não sou chamado a imolar nenhum filho, mas eu nunca tive de matar um filho, o que me deixa numa situação extremamente confortabilíssima. A situação de sepultar um filho que eu não matei, de sepultar um filho das minhas entranhas que eu não matei é uma situação de extremo conforto de fé, sabendo ainda que ele foi levado para glória do Pai, mas tem gente que até para sepultar o filho que não matou o faz com ódio aos céus e à vida. Não foi o momento mais difícil da minha vida pegar um filho que eu não matei, ao qual eu só me dei em amor, e que a graça de Deus o acidentou em morte para levá-lo para a Glória Eterna e poupá-lo... A fé demanda renúncias, renúncias corajosas... Às vezes, temos de cortar um braço, um braço que está nos gangrenando, e cuja manutenção é a nossa morte... Temos de cortar. Se, às vezes, temos de fazer isso num filho para salvá-lo contra todas as vontades dele, mas fazer isto, quanto mais contra nós mesmos! Às vezes são relacionamentos cancerígenos

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disse: “olha o cordeiro aqui, o carneiro. Pega esse bichinho aqui, coloca-o no lugar do teu filho e imola-o. Porque Eu te abençoarei e te multiplicarei e a tua descendência será incontável. E por ela serão abençoadas e benditas todas as nações da Terra. Volta para casa agora e cuida do teu filho”.


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Ló é chamado como um homem bom e justo, o sobrinho de Abraão, mas por que houve desentendimento entre pessoas ligadas a eles, o Senhor disse: “deixa-o ir, e deixa que ele escolha o melhor”. Mas, às vezes, estamos ligados a cretinos, a canalhas, a doentes, tarados, abusivos, e não temos a coragem de os livrarmos do que está nos matando, quanto mais coragem de ficarmos livres de algo que não é ruim. Ló tinha Deus na vida dele, mas não é por isso que ele tinha um caráter bom, que ele era a pessoa para continuar ao lado de Abraão naquele momento da História, e Deus disse: “deixe o ir, corta!. Não é por que ele é mau, é por causa do teu caminho comigo. Agar não era má, e nem Ismael também. A circunstância é que não inspirava vida, é que não traria vida, nem cumpriria a promessa, então “manda ela embora”. Isaque era a promessa. Agora veja aonde Deus chega quando queremos andar com Ele e ficar amiguinho Dele mesmo: “em Isaque serão cumpridas todas as minhas promessas na tua vida”. Aí chega a hora em que Abraão tem de aprender a última lição: de que é melhor Deus sozinho sem promessa nenhuma do que todas as promessas do mundo sem Deus nelas; porque às vezes ficamos como cultuadores da promessa de tal maneira que nos

esquecemos, nos desapaixonamos do Deus das promessas! É o que eu vejo acontecendo toda hora com pessoas que vão ficando tão aferradas à benção de Deus, ou à promessa de Deus, ao sucesso em Deus, à realização em Deus, à felicidade, ao contentamento em Deus... É tanta expectativa pelo que de Deus procede, que não importa, e aí, antes que chegue este dia, antes que o culto à benção se torne uma idolatria, antes que o culto à boa esperança se torne uma desgraça, antes que o culto aos bons e retos desejos se torne um fim a si mesmo, tenha coragem de dizer a Deus: “eis aqui os meus filhos, se Tu quiseres levá-los todos, leva-os, por que eles são Teus, mas eu não serei Teu se os cultuá-los como se eles fossem Tu”. Está pensando que a fé é feita de brincadeira, meu irmão? “Eis aqui o meu emprego, eis aqui o meu amor que eu sinto por essa menina/esse carinha”...Essa cócega gostosa que você não pode nem chamar de raiz de vida, de promessa, como era Isaque na vida de Abraão, mas para você já é uma eleição da qual você não abre mão, aí a verdadeira benção, a verdadeira promessa, a verdadeira graça nunca se cumpre na sua vida porque você vive agarrado com Agar, com Ismael, com o viés, com a meia-volta, com o capricho, com o desejo do outro, com as suas próprias idiossincrasias, batizadas de “minhas esperanças humanas em Deus”. Ah, eu já preguei milhares de vezes neste texto sob tantos ângulos e aspectos diferentes, mas hoje eu só queria falar sobre este único. Sobre fé que se carrega da disposição da renúncia. No caso de Abraão, na hora em que ele renuncia e ele leva, e ele executa - porque hebreus diz que com efeito aos olhos de Deus ele imolou o filho -, o anjo teve que parar-lhe a mão aos gritos pois o homem já tinha

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que temos. Não se diz que o pai de Abraão era mal e mesmo assim Deus disse: “deixa teu pai e tua mãe”. Imagina aquele pai estuprador, violentador, abusivo, aquela família perversa, adoecida, ainda tem gente que diz: “não, eu vou morrer aqui dentro dessa história, com tudo no Evangelho dizendo ‘se tu tens a oportunidade de tornar-te livre, torna-te livre hoje’”. Mas ficamos viciados até a sepultura como residência.


O Caminho da Graça

Agora pense nisso, e considere não nos pedidos absurdos do Evangelho, mas no que o Evangelho chama Vida: “Corta esse pé Caio, se você não cortar vai ter gangrena, rapaz”. Ah, meu irmão, eu corto; se me disserem que se eu não cortar o pé, ou a perna, porque eu vou ter gangrena,

pode ter certeza. Minha mulher sabe que eu vou dizer pra ela na mesma hora que vou cortar, como Jesus disse: “é melhor tu entrares inteiro na Vida, do que tendo os ‘dois membros’ seres lançado na morte”. Esse é o paradoxo do Evangelho: quem corta um membro para preservar a essência não perde nada, ainda fica inteiro; arranca um olho, se descapacita humanamente para ver melhor, para enxergar melhor e entrar melhor na ambiência da totalidade em Deus. São amputações que nos trazem benefícios. O Evangelho, no máximo, pede isso de nós… Mas quem corrompe a sua essência por causa do seu capricho, entra inteiro no nada. O Evangelho não está mandando o indivíduo matar um filho, mas mandando você fazer escolhas para vida. Só que parece que lhe são tão penosas para dar razão a Deus. Abraão creu em Deus contra o absurdo, e nós não cremos em Deus nem no fluxo da mais razoabilidade do sentido da vida, e, às vezes, até no testemunho da verdade que temos dentro de nós, mas não queremos seguir nem obedecer. A que você chama isso? De fé? Honestamente renomeie e recategorize o que existe no seu coração até que isso se torne fé. Mas eu creio que o Espírito de Deus está suscitando fé em nós, decisões e consciência de que andar com Ele implica a capacidade de, não por deliberação, mas por obediência, frequentemente cruzar a outra fronteira: PORQUE NO MONTE DO SENHOR SE PROVERÁ!

Mensagem ministrada em 10/07/2011 Estação do Caminho - DF www.caiofabio.net | www.vemevetv.com.br

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executado tudo no coração - “do monte do Senhor se proveu substituição e livramento”. Mas às vezes, as não é Isaque que está ali, não. Às vezes é um demônio que está ali para ser imolado mesmo. Ou quem está ali é um cordeiro, ou é só uma escolha da minha própria vontade, capricho, desejo, e infelicidade desorientada e que precisa ser de, algum modo, oferecida a Deus pra que eu cresça, me liberte, creia que no monte do Senhor se fará provisão e livramento. Mas enquanto eu quiser fazer as provisões, eu mesmo para minha vida, terei apenas aquilo que eu arranjar, terei apenas Agar, terei apenas Ismael, andarei com Ló ate não aguentar mais, mas nunca provarei a leveza final de chegar e dizer “Deus, eu te entrego até as bênçãos; eu mato as bênçãos todas, mas não fico sem ti”. Esse é o sentido final da adoração, quando toda a promessa deixa de ter galardão, quando toda vitória fica vazia de seu sentido, se ela for aumentada aos nossos olhos como coisa de importância maior. É quando acreditamos que das pedras Deus podem suscitar filhos de Abraão, e não só necessariamente de Isaque. Abraão chegou ao ponto de crer que das pedras Deus lhe suscitariam filhos, mas ele preferia não ter filho nenhum a ter qualquer que fosse o filho sem que Deus fosse a primazia da vida dele, o Absoluto do Absoluto da vida dele.


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