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CONTEXTO HISTÓRICO PAULISTA

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Para melhor entendimento do local que se desenvolverá o projeto no Complexo Antarctica do bairro da Mooca neste trabalho de graduação, este capítulo contextualiza a Cidade e o bairro que abriga esse palco industrial.

2.1. A indústria do século XIX na cidade de São Paulo

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A cidade de São Paulo, diferentemente do que se conhece hoje por metrópole, até o período do século XVIII não passava de uma vila colonial, possuindo em sua aparência uma “estrutura modesta”. (BRUNO, 1954)

É a partir do século XIX, com o fim da colonização da cidade de São Paulo e a introdução da economia cafeeira, que a cidade desenvolve diversas transformações: urbana, econômica e social. Trata-se do início das instalações férreas que mais tarde introduziriam as fábricas; o fim da escravidão e incentivo a imigração no Brasil; novas ocupações habitacionais e estruturas urbanas que darão origem aos bairros operários.

A chegada da estrada de ferro, por demanda da introdução do café, desempenhou papel de ligação entre várias cidades do País. No caso da São Paulo Railway Company (1867), a cidade de São Paulo era uma passagem obrigatória entre o porto e as regiões de escoamento de café (localizadas, em maior parte, no oeste paulista), o que possibilitou a Cidade uma modernização radical, não somente pelo novo transporte (ferrovia), mas também pelo surgimento de novas classes sociais:

(1) a burguesia cafeeira que possibilitou construções significativas urbanas desde a palacetes na Avenida Paulista (Séc. XIX), em uma escala arquitetônica, até a construção do viaduto do Chá (Séc. XIX) no Centro da cidade, em uma escala urbana;

(2) trabalhadores imigrantes europeus que eram a nova mão de obra na agricultura cafeeira e, mais tarde, das fábricas que possibilitaram novas conformações de bairros operários.

As estradas de ferro promoveram ainda várias transformações em cidades e até, em alguns casos, sua fundação. Pela sua extrema importância para as cidades, influíam na configuração das ruas e até mesmo em seu sistema de identificação, nos meios de transportes urbanos, no estabelecimento de atividades complementares nos arredores de suas estações, tais como a comercial e a hotelaria e a própria estrutura de vida de uma época. (KUHL,1998, p.125)

Essa nova conformação de cidade em relação a expansão ferroviária fez exigências, também, da implementação de “atividades urbanas”, sendo que muitas delas eram para atender sua própria manutenção (construção civil, manutenção de trilhos, armazenamento de produtos, carvão, maquinários etc.). As fábricas, em sua maioria, foram instaladas próximas às linhas férreas devido a disponibilidade de terrenos a baixo custo, com pouco declive e próximos ao Rio Tamanduateí e Tietê, que eram fontes de água. Mais tarde, essa economia industrial possibilitou o crescimento de uma nova população: trabalhadores de fábricas que em sua maioria, preferiam residir próximos ao trabalho, assim configurando-se os bairros operários (a exemplo da Mooca, Brás, Pari, Bom Retiro, etc.) dispostos de vilas operárias, cortiços e fábricas (Figura 3).

São nesses bairros que surgem as primeiras fábricas na cidade de São Paulo, por exemplo: cervejaria Bavária que mais tarde foi comprada pelo conjunto da Cia Antarctica (1890), Cotonifício Crespi (1897), Armazéns Gerais de Piratininga (1912), Armazéns Ernesto de Castro (1918), Moinho Gamba (1920) e Armazéns das Indústrias Reunidas Francisco Matarazzo (1927).

O crescimento industrial de bens de consumo teve sua massiva instalação, principalmente, em meados dos anos de 1930 (período Vagas), mas perdurou-se até a década de 1970 com os Planos Nacionais de Desenvolvimento (PNDs) estabelecidos durante o regime militar que incentivaram a descentralização de indústrias para o interior do País.

“(...) além de um número elevado (...) de operários qualificados que vieram ocupar as mais importantes posições no sistema produtivo da indústria (...) o rápido crescimento do potencial energético (...)) vieram criar economias externas necessárias ao surto de industrialização, que a partir dos anos trinta, projetaria definitivamente o estado paulista como o mais importante centro industrial do País” (SUZIGAN, 1971, p.90)

É a partir desse período que muitas construções situadas nas áreas industriais de São Paulo, como o Bairro da Mooca sofreram problemas de abandono, subutilização e periferização.

2.2. O Bairro da Mooca

“A Mooca nasce com cara morena, indígena. Não tem documentos de nascença, apenas a suposição de que foi no dia 17 de agosto de 1556, quando os jesuítas construíram a ponte Tabatinguera sobre o rio, para unir a via ao caminho dos bandeirantes” (TONETO, 2006)

“Faz casa” nome dado pelos indígenas ao verem a técnica construtiva em taipa, material este obtido pelas lamas das bordas do rio Tamanduateí que os jesuítas utilizavam para construir as moradias, é neste contexto (em meados do século XVI) que nasce a primeira conformação do bairro da Mooca. Essa paisagem, no entanto, é alterada em meados do século XIX com a inauguração da estrada de ferro São Paulo Railway e da consequente introdução de novas indústrias no perímetro do bairro.

“A ferrovia mudou tudo em poucas décadas. Transformou em bairro o antigo arrebalde ao ligá-lo definitivamente à cidade, trouxe a São Paulo e a Mooca milhares de imigrantes, e atraiu fábricas, depósitos, moinhos, que gradualmente se instalaram às suas margens.” (KUNSCH,2006, p.52)

Além disso, é possível identificar que devido ao trio ferrovia-indústria-imigração a Mooca adquiriu em seu território um desenho urbano desenvolvido não somente pelas indústrias, mas pelos novos moradores do bairro:

“Junto às fábricas surgiram vilas operárias e proliferaram os cortiços. Os operários, como é natural, queriam morar perto do trabalho e seus ordenados eram modestíssimos.” (KUNSCH,2006, p.52)

A implantação de fábricas ou pequenas oficinas de bens de consumo (bebidas, roupas, calçados, etc.) apontavam às necessidades que os moradores da região tinham em relação a serviços, comércios e lazer, haja vista o que demonstravam os bairros Brás, Mooca e Belenzinho: um “núcleo de intensa vida própria a ponto de merecer a designação de “outra cidade ” ou “cidadela ”. Logo obtém-se, por característica desses bairros operários, uma ocupação desordenada e mista pela falta de planejamento, o que resultou em grandes aglomerados de casas, falta de esgoto e excesso de ruas lamacentas que mais tarde apresentariam problemas de salubridade.

“Os operários da Mooca viviam em casas geminadas, sem jardim e com um pequeno quintal nos fundos. As portas e as janelas davam diretamente para a rua, e de dentro das casas se ouviam as conversas dos vizinhos, o pregão do verdureiro e do vassoureiro, as brincadeiras das crianças e as brigas dos bares.” (TONETO,20061)

1 Reportagem disponível em < http://www.portaldamooca.com. br/heranca-que-fica-bernadete-toneto/> Acesso: 11 de Ago. 2020

2.3. Formação do perímetro urbano da Mooca

Partindo-se para uma análise urbana, pode-se afirmar que conforme as indústrias e a densidade demográfica cresciam no Brasil, a região da Mooca também expandia suas ocupações. Observa-se, no entanto, que a restrição de adensamento nessa região era barrada devido as grandes enchentes ocorridas pelo Rio Tamanduateí, impedindo que os bairros do local se incorporassem à cidade até meados dos anos de 1893 quando o rio foi canalizado dando lugar ao Parque D. Pedro II. Pela comparação entre os Figura 7 (Mapa de São Paulo de 1810), Figura 8 (Mapa de São Paulo de 1881) e Figura 9 (Mapa de São Paulo de 1947) observa-se que no primeiro há o limite de ocupação ao leste devido à problemas naturais, como mencionado anteriormente, e no segundo e terceiro, uma grande mudança em relação ao de 1810 visto que trata-se de períodos que já obtinham investimentos da economia cafeeira, ou seja, introdução de ferrovias e instrumentos urbanos; estações e fábricas, além da retificação do rio. O que demostra um traçado de bairro cada vez mais subdividido em quadras.

Apesar do grande abandono que a Mooca vem sofrendo desde a década de 1950, devido à descentralização de fábricas para o interior do Brasil, identifica-se a importância que esta região tem para o Patrimônio Histórico, Cultural e Humano da Cidade, pois, desenvolveu-se junto a um traçado férreo histórico, das primeiras indústrias nacionais e ainda carrega uma forte cultura imigrante1 pelo seu caráter de vizinhança que representa a “memória e pertencimento” do bairro (BOSI, 2003), o que faz desse local um grande arsenal cultural e tradicional da cidade de São Paulo.

“A maior parte seguia rumo ao interior, para trabalhar nas fazendas do café, mas muitos permaneciam na cidade. Tantos, que, no início do século 20, de cada quatro pedreiros trabalhando em São Paulo, três eram italianos.” (KUNSCH,2006, p.53)

1 A Associação que Ama (defende) a Mooca e o Porta da Mooca são instituições promovidas junto a subprefeitura e moradores da região que demonstram o sentimento de pertencimento do bairro em relação à população do local.

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