Do verbo à blasfêmia dos fariseus - Ciclo 1

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Projeto Gráfico e Editoração Márcio Bertachini

Composição – 04/2001 a 03/2002 Santo André – São Paulo Reedição – 03/2016 Atibaia – São Paulo Categoria: Estudo Bíblico

ministerioescrito@hotmail.com ministerioescrito.blogspot.com


A toda ação corresponde uma reação

de igual intensidade, porém em sentido contrário.

Princípio da Ação e Reação ou Terceira Lei de Newton


Era meu intuito apresentar esta compilação dos quatro Evangelhos em um único livro. Mas quando vi o volume do trabalho final, achei por bem dividi-lo em quatro partes. A nova questão então passou a ser: onde fazer a divisão sem ferir o conteúdo de cada parte e do todo? Buscando elementos para tal, percebi que o ministério de Cristo foi dividido em quatro períodos distintos, bem demarcados pelos escritores. Assim, este primeiro volume, denominado agora ‘ciclo’, inicia com a encarnação do Verbo, relatado por João, indo até a primeira blasfêmia dos fariseus e escribas. Neste ciclo inicial, de forma geral, Jesus se apresenta como o Rei de Israel, para a nação de Israel. O reino de Deus é apresentado em todo o seu vigor nos sermões da montanha e da planície. A esta ação celestial, com todos os milagres e ensinamentos do Mestre, todas as suas demonstrações de poder e misericórdia, bem como a primeira purificação do templo, reações a mais diversas se esboçaram. Mas a mais terrível foi a que demarcou seu novo modo de agir para com Israel: a rejeição dos líderes do povo, tanto espirituais como governamentais. Sua linguagem simples passou a ser escondida por entre as parábolas. Isto ficará também claríssimo para o leitor e leitora, a partir do segundo ciclo. O primeiro ciclo, pois, começa com a mais rica bênção de Deus, e culmina com a mais vergonhosa reação dos judeus, mostrando inequivocamente que todos estão debaixo do pecado. O segundo ciclo não será diferente.

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“Porque eu testifico a todo aquele que ouvir as palavras da profecia deste livro que se alguém lhes acrescentar alguma coisa, Deus fará vir sobre ele as pragas que estão escritas neste livro; e, se alguém tirar quaisquer palavras do livro desta profecia, Deus tirará a sua parte da árvore da vida, e da cidade santa, que estão escritas neste livro” (Ap 22.18-19). Sob este peso e direção é que compus esta compilação dos Santos Evangelhos segundo Mateus, Marcos, Lucas e João, que discorrem sobre o nascimento miraculoso, a vida imaculada, a morte preciosa e a ressurreição gloriosa de Nosso Senhor Jesus Cristo, em um único livro. Não foi tarefa fácil. Primeiro pela enorme quantidade de informações contidas nestes Evangelhos, com o agravante de os escritores terem abordado a vida e a pessoa de Jesus sob um determinado ponto de vista, e de forma nem sempre cronológica. E a segunda razão, e também a mais perversa, pela tradição que recebemos de nossos pais, sem os devidos questionamentos. Vamos esmiuçar um pouco mais estas dificuldades. Muitos cristãos sabem que Mateus enfatiza Jesus como Rei; Marcos o mostra como servo; Lucas, como homem; e João o eleva à Divindade. E estes enfoques, obviamente, levaram a narrativas em que, embora centradas no mesmo personagem, um livro contenha comentários que outro omita totalmente. Ou, o que se poderá perceber algumas vezes, parecendo-se tratar de um mesmo acontecimento, pela semelhança dos textos, na verdade os fatos ocorram em tempos distintos, depois de uma observação mais acurada.

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Exemplificando o que me propus a realizar, se tomarmos como fato a crucificação de Jesus, Mateus relata que na cruz foi escrita a seguinte sentença: “ESTE É JESUS, O REI DOS JUDEUS” (Mt 27.37). Marcos relata: “O REI DOS JUDEUS” (Mc 15.26). Lucas, por sua vez, mostra: “ESTE É O REI DOS JUDEUS” (Lc 23.38). João, finalmente, revela: “JESUS NAZARENO, REI DOS JUDEUS” (Jo 19.19). Observe as lacunas.

ESTE É JESUS ,

O REI DOS JUDEUS O REI DOS JUDEUS

ESTE É

O REI DOS JUDEUS JESUS

NAZARENO,

REI DOS JUDEUS

Nenhum dos quatro textos revelou a totalidade do que fora escrito em sua condenação. Portanto, com a união das passagens referidas, teríamos o seguinte na íntegra: “ESTE É JESUS NAZARENO, O REI DOS JUDEUS”. Nenhuma palavra falta, nenhuma se repete. Mas este é um caso fácil de se resolver. Uma simples comparação das passagens já é suficiente para se esclarecer a questão. Mas e, por exemplo, quanto à afirmação de Jesus sobre Pedro, que este o negaria três vezes antes que o galo cantasse, relatado em Mateus, Lucas e João, e um outro relato em Marcos que diz que Pedro o negaria duas vezes antes que o galo cantasse três vezes? Soma-se a isto a dificuldade de encontrarmos vários personagens envolvidos na história, em dois diferentes locais, e em distintas ocasiões. Como coadunar tudo

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isto? Ou por exemplo, na famosa e intrigante transfiguração de Jesus ante os discípulos, cujos livros de Mateus e Marcos o colocam seis dias depois de um certo depoimento seu, e Lucas o coloca como sendo quase oito dias depois deste mesmo pronunciamento. Alguém mais apressado poderia alegar que quase oito poderia significar seis. Um físico, ou um engenheiro, poderia permitir uma negligência como esta em sua área de trabalho? Você contrataria, descansadamente, um profissional assim? Se em nosso mundo moderno necessitamos cada vez mais de precisão, e ele certamente passará, por que negligenciarmos as revelações da Palavra de Deus, que “não hão de passar”? E aqui devemos fazer um importante comentário. E este comentário é a base, ou pedra angular, de toda a revelação escrita no livro chamado Bíblia. Foi a partir desse pressuposto e revelação que foi possível unir os quatro Evangelhos em uma só narrativa, apesar de todos os preconceitos em contrário. Usando o mesmo exemplo acima, estamos absolutamente convencidos de que Pedro negou Jesus três vezes naquela noite fatídica. E a partir deste conceito, ou preconceito por assim dizer, propus reunir as passagens relativas a estas negações. Só houve um pequeno problema. As passagens não se encaixavam de forma precisa e natural. Por um momento me desesperei. Será que não havia saída para tal impasse? Havia partido da premissa correta de que “a Escritura não pode ser anulada” (Jo 10.35). Sabia que “a profecia nunca foi produzida por vontade de homem algum, mas os homens santos de Deus falaram inspirados pelo Espírito Santo”, e que “nenhuma profecia da Escritura é de particular interpreta-

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ção” (2 Pe 1.20-21). Não fazia nada mais que estar “comparando as coisas espirituais com as espirituais” (1 Co 2.13). A própria Palavra de Deus e o Espírito que em mim habita testificavam que o impasse estava certamente na minha incompetência em alcançar as profundezas de Deus, e jamais, nunca, poderia haver falha nas Escrituras Sagradas. E com esta certeza, levantei-me de minha cadeira, apreensivo e desconsolado, e fui refrescar minhas ideias com um copo de água. Enquanto bebia, orei assim: Ah, Senhor! Eu sei que a tua Palavra é perfeita. Preciso de tua iluminação, ou não vou poder realizar esta tarefa. Ajuda-me! Então mais uma vez o Senhor mostrou-me a sua benignidade. Como numa iluminação momentânea, e não saberia como explicar, o Senhor sussurrou-me no fundo da minha mente algo que eu nunca pensaria de mim mesmo. E a partir desta pequena pista pude montar o quebra cabeça, que o leitor poderá verificar no texto à frente. E a resolução deste questionamento calou ainda mais fundo naquela certeza, já alicerçada, de que os Evangelhos jamais poderiam conter as alegadas contradições, como alguns assim classificam apressadamente. Devo mencionar que esta passagem sempre me intrigou profundamente, e isto muito antes de sequer pensar em fazer tal compilação. E me sentia tão apreensivo quanto a ela, que logo nas primeiras páginas deste trabalho, avancei para esta passagem “problemática”, pois se eu não pudesse resolvê-la, temia não poder realizar a tarefa a que me propusera. Resolvida a questão, soube intimamente que as demais passagens teriam o mesmo destino, e regressei ao ponto em que havia interrompido, certo de que só pararia no amém final. Mas o que deve ser ressaltado ao leitor é que não só os Evangelhos participam desta graça, mas “toda a Escritura di-

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vinamente inspirada é proveitosa para ensinar, para redarguir, para corrigir, para instruir em justiça: para que o homem de Deus seja perfeito, e perfeitamente instruído para toda a boa obra” (2 Tm 3.16-17), e que “as sagradas letras... podem fazer -te sábio para a salvação, pela fé que há em Cristo Jesus” (2 Tm 3.15). No entanto, quando o leitor apreciar o texto único, não terá um texto sagrado, ou canônico, apesar de estar lendo somente os Evangelhos. Porque se fosse canônico, ou fizesse parte da Palavra de Deus, deveria estar contido dentro da Bíblia, e graças a Deus não está. O Espírito de Deus resolveu por bem narrar a vida de Jesus em quatro narrativas separadas, de forma que o texto unificado não sofre a inspiração mencionada por Pedro em 2 Pe 1.20-21. Aqui se pode dizer o inverso do que se diz da Bíblia. A Bíblia não contém a Palavra de Deus; ela é a Palavra de Deus. O texto à frente não é a Palavra de Deus; simplesmente contém a Palavr a de Deus. A vida do Messias deveria ser assim comentada, sob quatro pontos diferentes de vista, para que se cumprisse o que Moisés diz: “... pela boca de duas testemunhas, ou pela boca de três testemunhas, se estabelecerá o negócio” (Dt 19.15). E o próprio Messias assim o confirma, dizendo: “E na vossa lei está também escrito que o testemunho de dois homens é verdadeiro” (Jo 8.17). Portanto, temos que dois apóstolos confirmam sua humanidade, e outros dois que confirmam sua divindade, pois “por boca de duas ou três testemunhas será confirmada toda a palavra” (2 Co 13.1). Reunindo então tudo o que já dissemos, se os quatro relatos são a Palavra de Deus, que não podem errar, e eles comentam sobre a vida de uma única e indivisível Pessoa, os

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quatro Evangelhos devem, naturalmente, ser passíveis de uma união perfeita e equilibrada. Com isto em mente é que pude integrar os quatro documentos em um só; e nos casos em que houvesse possíveis contradições, devido à forma diferente de narrar dos Evangelistas, estas deveriam ser resolvidas de forma natural no momento da reunião dos relatos, para que se tornassem um, da mesma forma que o personagem retratado é um, e o Espírito que os inspirou é um só. Usei, para tal contento, sem diminuir ou aumentar a Palavra de Deus, para que não incorresse nas pragas descritas no início desta introdução, uma fórmula muito simples: não poderia introduzir sequer uma vírgula no texto reunido. Como no caso citado acima, onde lemos a inscrição “Este é Jesus Nazareno, o Rei dos Judeus”, o leitor poderá verificar que as quatro frases estão dentro desta única frase, sem acrescentar ou subtrair nada.

Mas como eu havia dito, este trecho é facílimo de se resolver. Houve muitos textos em que, literalmente, sofri para unificá-los. A maioria das vezes devido às diferenças entre os relatos, que no momento da reunião, produziam uma quebra na continuidade lógica do todo. Também gramaticalmente, já que às vezes um texto falava no plural, e outro no singular. Seria impossível citar todas as dificuldades. As maiores complicações foram: primeiramente, a sequência exata dos fatos, no início do ministério de Cristo; o sermão da montanha, que num primeiro olhar sobre Mateus e Lucas pareciam se tratar do mesmo sermão, mas depois, num olhar mais penetrante, os Evangelhos na verdade relatavam dois sermões: um sermão chamado “da montanha”, e outro sermão que eu designei “da planície”; a transfiguração; o sermão profético; os dois cegos de Jericó; a última ceia; as negações de Pedro; Jesus perante o Sinédrio; a visita das mulheres

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ao túmulo no primeiro dia da semana; as aparições de Jesus aos discípulos após sua ressurreição. Todos estes textos terão suas devidas notas, para que o leitor possa entender o meu raciocínio, e também comparar com os Evangelhos, sentindo desta forma a mesma dificuldade que eu senti. Devo mencionar, também, lembrando ao leitor, que os títulos presentes nos Evangelhos, como por exemplo: “A entrada triunfal de Jesus em Jerusalém”, não fazem parte do texto original, que foi escrito em grego; portanto, não são a Palavra de Deus, e, logo, podem conter erros. No mesmo exemplo acima, lendo a narrativa referente à entrada de Jesus em Jerusalém, o leitor perceberá que não houve nada de “triunfal” em sua entrada, e nem poderia ser assim, visto que o Senhor dos Exércitos adentra Israel montado num jumentinho. Houve então da minha parte algumas mudanças nestes títulos, e quando acrescentei alguma palavra, ou mesmo um título novo, o que foi acrescentado estará entre chaves. E que também será explicado pelas notas. Outra dificuldade a ser mencionada são as repetições dos ensinos de Jesus. Se dentro de um mesmo Evangelho já há semelhanças profundas em alguns acontecimentos, que se dirá de quatro? O leitor pode experimentar estas dificuldades ao comparar estas simples passagens: Mt 5:29-30 com 18:8-9; Mt 12:38-40 com 16:1-4; Lc 8:16-18 com 11:33-36; Lc 11:43 com 20:46;

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Lc 12:11-12 com 21:12-15; Lc 13:15 com 14:5. Mas, na verdade, nem poderia ser diferente. Se pronunciando várias vezes os mesmos discursos, o público entendia muito pouco, imagine-se um único discurso, num tempo em que não havia gravadores. Também as repetições são muito interessantes, pois elas são recolocadas num novo contexto, dando maior dinamismo em suas pregações. Estes discursos repetidos em ocasiões diferentes, obviamente, foram preservados no texto unificado. Mesmo os sinais e milagres de Jesus não foram únicos, mas exaustivamente repetidos para aguçar os sentidos dos ouvintes, pois o mesmo Senhor interpela os seus apóstolos quanto ao seu entendimento; como no caso das duas multiplicações dos pães: “Como não entendeis ainda?” (Mc 8.15-21). Não adentrarei agora em todas as dificuldades, pois a maior parte delas será resolvida nas notas apropriadas. Vamos, antes, ter uma visão panorâmica dos quatro Evangelhos. O Evangelho mais diferenciado trata-se de João. É neste livro que encontramos as grandes pregações de Jesus. Não há muitos milagres narrados aqui; e quase todos os que aqui são encontrados, são exclusivos deste livro, quais sejam: a água feita em vinho, a cura do filho dum régulo, a cura do paralítico de Betesda, a cura dum cego de nascença e a ressurreição de Lázaro. Somente a primeira multiplicação dos pães e seu passeio a pé sobre o mar são comuns aos outros Evangelhos. Mas daqui retiramos as pedras mais preciosas de sua Divindade, quando Ele declara ser um com o Pai, o pão que

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desce do céu, a água da vida, a luz do mundo, o bom Pastor, a porta das ovelhas, “o caminho, e a verdade, e a vida”, a ressurreição, a videira verdadeira, aquele que saiu do Pai e tornaria para Ele. Somente aqui temos menção da festa dos tabernáculos, da festa da dedicação (ou das luzes) e da primeira expulsão dos vendedores do templo, logo no início de seu ministério. Somente aqui, também, vemos a menção das três páscoas consecutivas que Jesus participaria, depois de seu batismo. E de João se extrai a fala mais longa do Senhor durante a sua última ceia. Mateus, Marcos e Lucas, por terem basicamente a mesma construção, são chamados de Evangelhos Sinóticos; termo que insinuaria a capacidade destes três Evangelhos serem compostos num só esquema. Mas na realidade, somente Mateus e Marcos participam desta aptidão. Há diferenças sutis em Lucas, que num primeiro momento parece tratar de uma reprise dos outros dois livros, mas, na verdade, num olhar mais aguçado, trata de acontecimentos diferentes. O próprio autor foi enganado muitas vezes por essas similitudes, mas tiveram que ser revistas após um exame mais minucioso de seus contextos. Estas diferenças também serão comentadas. O livro de Marcos é o mais curto, e nada comenta sobre a infância de Jesus, partindo imediatamente para a pregação de João Batista. Comparado com Mateus, embora contenha algumas inversões quanto aos episódios ocorridos antes da primeira multiplicação dos pães, no restante são idênticos. Lucas é o livro mais longo, e o único a retratar a história de Isabel e Zacarias. Nele encontramos os detalhes do nascimento de Jesus e João Batista. Seu maior trunfo, no entanto, está em sua sequência da última viagem de Jesus para Jerusa-

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lém, comentando fatos e parábolas não abordados pelos outros. Comuns aos quatro evangelhos, temos: o ministério de João Batista, a primeira multiplicação dos pães, a entrada “triunfal” de Jesus em Jerusalém, Jesus preso em Getsémani, a traição de Judas, as negações de Pedro, o julgamento de Jesus pelos sacerdotes, por Herodes e Pilatos, sua crucificação, sua sepultura, sua ressurreição e seus aparecimentos em público após a ressurreição. Dito isto, passemos à forma do texto unificado. Para cada Evangelho usei uma determinada cor, para que o leitor possa visualizar com facilidade os textos. Mateus está em azul; Marcos, em ver melho;

Lucas, em pr eto; João, em ver de. Como havia dito, os títulos contêm algumas mudanças, que foram colocadas entre chaves. As passagens analisadas e agrupadas estão mencionadas nos títulos, nas cores devidas, bem como as notas necessárias. Utilizei a forma padrão na identificação das passagens, e nos casos em que havia a necessidade de divisão de um único versículo em duas ou três partes, empreguei a sequência abc para identificá-las. Quanto à fonte, servi-me da Edição Revista e Corrigida (ERC) para este trabalho. O leitor, amante da Palavra de Deus, deveria se exercitar acompanhando os textos sagrados enquanto lê a síntese, para que possa entender os artifícios lógicos usados pelo escritor, e não ser um mero expectador.

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Lembro mais uma vez que não sendo o texto unificado inspirado como a Palavra de Deus é, poderá conter erros quanto à minha visão dos acontecimentos, e que o leitor deverá corrigir, partindo sempre daquelas premissas abordadas há pouco. Quanto às falas entre os diferentes personagens e a sequência exata do ministério do Senhor, procurei encaixá-las da melhor maneira possível, já que os textos nem sempre nos dão a ordem precisa das mesmas, visando sempre o melhor entendimento dos fatos. Espero, com a reunião destes quatro Evangelhos em um só documento, ressaltar as peculiaridades de cada passagem, aguçando-nos os sentidos para as verdadeiras proposições do Espírito Santo, ao dividir a vida de Jesus e seus apóstolos em quatro partes. Além disso, espero que as muitas possíveis contradições e dúvidas sobre certas passagens sejam iluminadas e esclarecidas, contribuindo para a verdade de que “homens santos de Deus falaram inspirados pelo Espírito Santo”, e que “a Escritura não pode ser anulada”. Fora destes dois objetivos, a unificação não tem valor algum. “ (2 Pe 3.10), juntamente com este livro.

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Índice de assuntos Prefácio .................................................................................. 19 O Verbo se faz carne ............................................................. 19 A genealogia de Jesus Cristo ................................................. 20 Anúncio do nascimento de João ............................................ 21 Anúncio do nascimento de Jesus ........................................... 23 José recebe a Maria ............................................................. 24 Maria visita Isabel ................................................................. 24 O cântico de Maria ................................................................ 25 O nascimento de João Batista ................................................ 26 O cântico de Zacarias ............................................................ 27 O nascimento de Jesus ........................................................... 27 Os pastores de Belém ............................................................ 28 A circuncisão e apresentação de Jesus .................................. 29 Simeão e Ana......................................................................... 30 Os magos do Oriente ........................................................... 31 A fuga para o Egito; a matança dos inocentes ....................... 35 A volta do Egito .................................................................... 33 O menino Jesus no meio dos doutores .................................. 33 A pregação de João Batista.................................................... 34 O batismo de Jesus ................................................................ 36 Genealogia de Jesus ............................................................. 37 A tentação de Jesus................................................................ 38 O testemunho de João Batista ............................................ 39 Os primeiros apóstolos de Jesus ............................................ 41 As bodas em Caná: a água feita vinho .................................. 42 Jesus purifica o templo........................................................ 43 Jesus instrui Nicodemos acerca do novo nascimento ............ 44 Outro testemunho de João Batista ......................................... 46 A mulher de Samaria ............................................................. 47 A ceifa e os ceifeiros ............................................................. 49 Cura do filho dum régulo ...................................................... 50

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Cura dum paralítico de Betesda ............................................. 51 Jesus declara-se Filho de Deus e igual ao Pai ....................... 53 Jesus em Galileia ................................................................. 55 Jesus é expulso de Nazaré ..................................................... 56 Jesus vai habitar em Capernaum ........................................... 57 Os primeiros discípulos ......................................................... 58 A cura do endemoninhado de Capernaum............................. 58 Cura da sogra de Pedro .......................................................... 59 A pesca maravilhosa ............................................................ 60 O sermão da montanha. As bem-aventuranças ..................... 61 Os discípulos são o sal da terra e a luz do mundo ................. 62 O cumprimento da lei e dos profetas ..................................... 63 Esmolas, oração, jejum .......................................................... 65 O tesouro no céu. O olho puro. Os dois senhores. Ansiosa solicitude pela nossa vida .................................... 66 O juízo temerário. Não deis aos cães as coisas santas. Perseverança na oração. A porta estreita. Os falsos profetas. Devemos ouvir e cumprir as palavras de Jesus ................. 68 O leproso purificado .............................................................. 70 O paralítico de Capernaum .................................................... 70 A vocação de Mateus ............................................................ 72 O jejum .................................................................................. 72 Jesus é Senhor do sábado ...................................................... 73 A cura do homem que tinha uma das mãos mirradas ............ 74 Eleição dos doze ................................................................... 76 [Sermão da planície] ............................................................ 76 O centurião de Capernaum ................................................ 79 O filho da viúva de Naim ...................................................... 80 A blasfêmia dos fariseus [e escribas] ................................. 81 Árvore e seus frutos ............................................................... 82 O milagre de Jonas ................................................................ 83 A família de Jesus.................................................................. 83 Notas ..................................................................................... 85

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Prefácio (Lc 1:1-4) Tendo pois muitos empreendido pôr em ordem a narração dos fatos que entre nós se cumpriram, segundo nos transmitiram os mesmos que os presenciaram desde o princípio, e foram ministros da palavra, pareceu-me também a mim conveniente descrevê-los a ti, ó excelente Teófilo, por sua ordem, havendo-me já informado minuciosamente de tudo desde o princípio, para que conheças a certeza das coisas de que já estás informado.

O Verbo se fez carne (Jo 1:1-14) No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Ele estava no princípio com Deus.Todas as coisas foram feitas por ele, e sem ele nada do que foi feito se fez. Nele estava a vida, e a vida era a luz dos homens; e a luz resplandece nas trevas, e as trevas não a compreenderam. Houve um homem enviado de Deus, cujo nome era João. Este veio para testemunho para que testificasse da luz; para que todos cressem por ele. Não era ele a luz; mas para que testificasse da luz. Ali estava a luz verdadeira, que alumia a todo o homem que vem ao mundo. Estava no mundo, e o mundo foi feito por ele, e o mundo não o conheceu. Veio para o que era seu, e os seus não o receberam. Mas, a todos quantos o receberam, deulhes o poder de serem feitos filhos de Deus; aos que crêem no seu nome; os quais não nasceram do sangue, nem da vontade da

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carne, nem da vontade do varão, mas de Deus. E o Verbo se fez carne, e habitou entre nós, e vimos a sua glória, como a glória do unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade.

A genealogia de Jesus Cristo (Mt 1:1-17) Livro da geração de Jesus Cristo, filho de Davi, filho d’Abraão. Abraão gerou a Isaque; e Isaque gerou a Jacó; e Jacó gerou a Judas e a seus irmãos; e Judas gerou de Tamar a Farés e a Zará; e Farés gerou a Esrom; e Esrom gerou a Arão; e Arão gerou a Aminadabe; e Aminadabe gerou a Naasom; e Naasom gerou a Salmom; e Salmom gerou de Racabe a Booz, e Booz gerou de Rute a Obede; e Obede gerou a Jessé; e Jessé gerou ao rei Davi; e o rei Davi gerou a Salomão da que foi mulher de Urias; e Salomão gerou a Roboão; e Roboão gerou a Abia; e Abia gerou a Asa; e Asa gerou a Josafá; e Josafá gerou a Jorão; e Jorão gerou a Ozias; e Ozias gerou a Joatão; e Joatão gerou a Acaz; e Acaz gerou a Ezequias; e Ezequias gerou a Manassés; e Manassés gerou a Amom; e Amom gerou a Josias; e Josias gerou a Jeconias e a seus irmãos na deportação para a Babilônia. E, depois da deportação para a Babilônia, Jeconias gerou a Salatiel; e Salatiel gerou a Zorobabel; e Zorobabel gerou a Abiúde; e Abiúde gerou a Eliaquim; e Eliaquim gerou a Azor; e Azor gerou a Sadoque; e Sadoque gerou a Aquim; e Aquim gerou a Eliúde; e Eliúde gerou a Eleazar; e Eleazar gerou a Matã; e Matã gerou a Jacó; e Jacó gerou a José, marido de Maria, da qual

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nasceu Jesus, que se chama o Cristo. De sorte que todas as gerações, desde Abraão até Davi, são catorze gerações; e desde Davi até a deportação para a Babilônia, catorze gerações; e desde a deportação para a Babilônia até Cristo, catorze gerações.

Anúncio do nascimento de João (Lc 1:5-25) Existiu, no tempo de Herodes, rei da Judeia, um sacerdote chamado Zacarias, da ordem de Abias, e cuja mulher era das filhas d’Aarão; e o seu nome era Isabel. E eram ambos justos perante Deus, andando sem repreensão em todos os mandamentos e preceitos do Senhor. E não tinham filhos, porque Isabel era estéril, e ambos eram avançados em idade. E aconteceu que, exercendo ele o sacerdócio diante de Deus, na ordem da sua turma, segundo o costume sacerdotal, coube-lhe em sorte entrar no templo do Senhor para oferecer incenso. E toda a multidão do povo estava fora, orando, à hora do incenso; e um anjo do Senhor lhe apareceu, posto em pé, à direita do altar do incenso. E Zacarias, vendo-o, turbou-se, e caiu temor sobre ele. Mas o anjo lhe disse: Zacarias, não temas, porque a tua oração foi ouvida, e Isabel, tua mulher, dará à luz um filho, e lhe porás o nome de João; e terás prazer e alegria, e muitos se alegrarão no seu nascimento, porque será grande diante do Senhor, e não beberá vinho, nem bebida forte, e será cheio do Espírito San-

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to, já desde o ventre de sua mãe; e converterá muitos dos filhos de Israel ao Senhor seu Deus, e irá adiante dele no espírito e virtude de Elias, para converter os corações dos pais aos filhos, e os rebeldes à prudência dos justos; com o fim de preparar ao Senhor um povo bem disposto. Disse então Zacarias ao anjo: Como saberei isto? Pois eu já sou velho, e minha mulher avançada em idade. E, respondendo o anjo, disse-lhe: Eu sou Gabriel, que assisto diante de Deus, e fui enviado a falar-te estas alegres novas; e eis que ficarás mudo, e não poderás falar até ao dia em que estas coisas aconteçam; porquanto não crestes nas minhas palavras, que a seu tempo se hão de cumprir. E o povo estava esperando a Zacarias, e maravilhava-se de que tanto se demorasse no templo. E, saindo ele, não lhes podia falar; e entenderam que tinha visto alguma visão no templo. E falava por acenos, e ficou mudo. E sucedeu que, terminados os dias de seu ministério, voltou para sua casa. E depois daqueles dias Isabel, sua mulher, concebeu, e por cinco meses se ocultou, dizendo: Assim me fez o Senhor, nos dias em que atentou em mim, para destruir o meu opróbrio entre os homens.

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Anúncio do nascimento de Jesus (Lc 1:26-38) E, no sexto mês, foi o anjo Gabriel enviado por Deus a uma cidade da Galileia, chamada Nazaré, a uma virgem desposada com um varão, cujo nome era José, da casa de Davi; e o nome da virgem era Maria. E, entrando o anjo onde ela estava, disse: Salve, agraciada; o Senhor é contigo: bendita tu entre as mulheres. E, vendo-o ela, turbou-se muito com aquelas palavras, e considerava que saudação seria esta. Disse-lhe então o anjo: Maria, não temas, porque achaste graça diante de Deus; e eis que em teu ventre conceberás e darás à luz um filho, e pôr-lhe-ás o nome de Jesus. Este será grande, e será chamado filho do Altíssimo; e o Senhor Deus lhe dará o trono de Davi, seu pai; e reinará eternamente na casa de Jacó, e o seu reino não terá fim. E disse Maria ao anjo: Como se fará isto, visto que não conheço varão? E, respondendo o anjo, disse-lhe: Descerá sobre ti o Espírito Santo, e a virtude do Altíssimo te cobrirá com a sua sombra; pelo que também o Santo, que de ti há de nascer, será chamado Filho de Deus. E eis que também Isabel, tua prima, concebeu um filho em sua velhice; e é este o sexto mês para aquela que era chamada estéril; porque para Deus nada é impossível. Disse então Maria: Eis aqui a serva do Senhor; cumpra-se em mim segundo a tua palavra. E o anjo ausentou-se dela.

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[José recebe a Maria] Nota 01 - pg. 85 (Mt 1:18-25a) Ora o nascimento de Jesus Cristo foi assim: Estando Maria, sua mãe, desposada com José, antes de se ajuntarem, achouse ter concebido do Espírito Santo. Então José, seu marido, como era justo, e a não queria infamar, intentou deixá-la secretamente. E, projetando ele isto, eis que em sonho lhe apareceu um anjo do Senhor, dizendo: José, filho de Davi, não temas receber a Maria tua mulher, porque o que nela está gerado é do Espírito Sento; e dará à luz um filho e chamarás o seu nome Jesus; porque ele salvará o seu povo dos seus pecados. Tudo isto, aconteceu para que se cumprisse o que foi dito da parte do Senhor, pelo profeta, que diz: Eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho, e chamá-lo-ão pelo nome de Emanuel, que traduzido é: Deus conosco. E José, despertando do sonho, fez como o anjo do Senhor lhe ordenara, e recebeu a sua mulher; e não a conheceu até que deu à luz seu filho, o primogênito.

Maria visita Isabel (Lc 1:39-45) E naqueles dias, levantando-se Maria, foi apressada às montanhas, a uma cidade de Judá, e entrou em casa de Zacarias, e saudou a Isabel. E aconteceu que, ao ouvir Isabel a saudação de Maria, a criancinha saltou no seu ventre; e Isabel foi cheia do

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Espírito Santo; e exclamou com grande voz, e disse: Bendita tu entre as mulheres, e bendito o fruto do teu ventre. E donde me provém isto a mim, que venha visitar-me a mãe do meu Senhor? Pois eis que, ao chegar aos meus ouvidos a voz da tua saudação, a criancinha saltou de alegria no meu ventre. Bem-aventurada a que creu, pois hão de cumprir-se as coisas que da parte do Senhor lhe foram ditas.

O cântico de Maria (Lc 1:46-56) Disse então Maria: A minha alma engrandece ao Senhor, e o meu espírito se alegra em Deus meu Salvador; porque atentou na baixeza de sua serva; pois eis que desde agora todas as gerações me chamarão bem-aventurada: porque me fez grandes coisas o Poderoso; e santo é o seu nome. E a sua misericórdia é de geração em geração sobre os que o temem. Com o seu braço obrou valorosamente; dissipou os soberbos no pensamento de seus corações. Depôs dos tronos os poderosos, e elevou os humildes. Encheu de bens os famintos, e despediu vazios os ricos. Auxiliou a Israel seu servo, recordando-se da sua misericórdia, (como falou a nossos pais) para com Abraão e sua posteridade, para sempre.

E Maria ficou com ela quase três meses, e depois voltou para sua casa.

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O nascimento de João Batista (Lc 1:57-66) E completou-se para Isabel o tempo de dar à luz e teve um filho. E os seus vizinhos e parentes ouviram que tinha Deus usado para com ela de grande misericórdia, e alegraram-se com ela. E aconteceu que, ao oitavo dia, vieram circuncidar o menino, e lhe chamavam Zacarias, o nome de seu pai. E, respondendo sua mãe, disse: Não, porém será chamado João. E disseram-lhe: Ninguém há na tua parentela que se chame por este nome. E perguntaram por acenos ao pai como queria que lhe chamassem. E, pedindo ele uma tabuinha de escrever, escreveu, dizendo: O seu nome é João. E todos se maravilharam. E logo a boca se lhe abriu, e a língua se lhe soltou; e falava, louvando a Deus. E veio temor sobre todos os seus vizinhos, e em todas as montanhas da Judeia foram divulgadas todas estas coisas. E todos os que as ouviam as conservavam em seus corações, dizendo: Quem será pois este menino? E a mão do Senhor estava com ele.

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O cântico de Zacarias (Lc 1:67-80) E Zacarias, seu pai, foi cheio do Espírito Santo, e profetizou, dizendo: Bendito o Senhor Deus d’Israel, porque visitou e remiu o seu povo. E nos levantou uma salvação poderosa na casa de Davi seu servo. Como falou pela boca dos seus santos profetas, desde o princípio do mundo; para nos livrar dos nossos inimigos e da mão de todos os que nos aborrecem; para manifestar misericórdia a nossos pais, e lembrar-se do seu santo concerto, e do juramento que jurou a Abraão nosso pai, de conceder-nos que, libertados da mão de nossos inimigos, o serviríamos sem temor, em santidade e justiça perante ele, todos os dias de nossa vida. E tu, ó menino, serás chamado profeta do Altíssimo, porque hás de ir ante a face do Senhor, a preparar os seus caminhos; para dar ao seu povo conhecimento da salvação, na remissão dos seus pecados; pelas entranhas da misericórdia do nosso Deus, com que o Oriente do alto nos visitou; para alumiar aos que estão assentados em trevas e sombra de morte; a fim de dirigir os nossos pés pelo caminho da paz. E o menino crescia, e se robustecia em espírito. E esteve nos desertos até ao dia em que havia de mostrar-se a Israel.

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O nascimento de Jesus (Lc 2:1-7) E aconteceu naqueles dias que saiu um decreto da parte de César Augusto, para que todo o mundo se alistasse. (Este primeiro alistamento foi feito sendo Cirênio presidente da Síria). E todos iam alistar-se, cada um à sua própria cidade. E subiu também José da Galileia, da cidade de Nazaré, à Judeia, à cidade de Davi, chamada Belém (porque era da casa e família de Davi), a fim de alistar-se com Maria, sua mulher, que estava grávida. E aconteceu que, estando eles ali, se cumpriram os dias em que ela havia de dar à luz. E deu à luz a seu filho primogênito, e envolveu-o em panos, e deitou-o numa manjedoura, porque não havia lugar para eles na estalagem.

Os pastores de Belém (Lc 2:8-20) Ora havia naquela mesma comarca pastores que estavam no campo, e guardavam durante as vigílias da noite o seu rebanho. E eis que o anjo do Senhor veio sobre eles, e a glória do Senhor os cercou de resplendor, e tiveram grande temor. E o anjo lhes disse: Não temais, porque eis aqui vos trago novas de grande alegria, que será para todo o povo: pois, na cidade de Davi, vos nasceu hoje o Salvador, que é Cristo, o Senhor. E isto vos será por sinal: Achareis o menino envolto em panos, e deitado numa manjedoura.

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E, no mesmo instante, apareceu com o anjo uma multidão dos exércitos celestiais, louvando a Deus, e dizendo: Glória a Deus nas alturas, paz na terra, boa vontade para com os homens. E aconteceu que, ausentando-se deles os anjos para o céu, disseram os pastores uns aos outros: Vamos pois até Belém, e vejamos isso que aconteceu, e que o Senhor nos fez saber.

E foram apressadamente, e acharam Maria, e José, e o menino deitado na manjedoura. E, vendo-o, divulgaram a palavra que acerca do menino lhes fora dita; e todos os que a ouviram se maravilharam do que os pastores lhes diziam. Mas Maria guardava todas estas coisas, conferindo-as em seu coração. E voltaram os pastores, glorificando e louvando a Deus por tudo o que tinham ouvido e visto, como lhes havia sido dito.

A circuncisão e apresentação de Jesus (Mt 1:25b ; Lc 2:21-24) E, quando os oito dias foram cumpridos, para circuncidar o menino, foi-lhe dado o nome de Jesus, que pelo anjo lhe fora posto antes de ser concebido. E, cumprindo-se os dias da purificação, segundo a lei de Moisés, o levaram a Jerusalém, para o apresentarem ao Senhor. (Segundo o que está escrito na lei do Senhor: Todo o macho primogênito será consagrado ao Senhor). E para darem a oferta segundo o disposto na lei do Senhor: um par de rolas ou dois pombinhos.

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Simeão e Ana (Lc 2:25-39) Havia em Jerusalém um homem cujo nome era Simeão; e este homem era justo e temente a Deus, esperando a consolação d’Israel; e o Espírito Santo estava sobre ele. E fora-lhe revelado pelo Espírito Santo que ele não morreria antes de ter visto o Cristo do Senhor. E pelo Espírito foi ao templo, e, quando os pais trouxeram o menino Jesus, para com ele procederem segundo o uso da lei, ele então tomou-o em seus braços, e louvou a Deus, e disse: Agora, Senhor, despedes em paz o teu servo, segundo a tua palavra; pois já os meus olhos viram a tua salvação, a qual tu preparaste perante a face de todos os povos; luz para alumiar as nações, e para a glória de teu povo Israel. E José, e sua mãe, se maravilharam das coisas que dele se diziam. E Simeão os abençoou, e disse a Maria, sua mãe: Eis que este é posto para queda e elevação de muitos em Israel, e para sinal que é contraditado; (e uma espada traspassará também a tua própria alma); para que se manifestem os pensamentos de muitos corações.

E estava ali a profetisa Ana, filha de Fanuel, da tribo de Aser. Esta era já avançada em idade, e tinha vivido com o marido sete anos, desde a sua virgindade; e era viúva, de quase oitenta e quatro anos, e não se afastava do templo, servindo a Deus em jejuns e orações, de noite e de dia. E sobrevindo na mesma hora, ela dava graças a Deus, e falava dele a todos os que esperavam a redenção em Jerusalém.

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E, quando acabaram de cumprir tudo segundo a lei do Senhor, voltaram à Galileia, para a sua cidade de Nazaré.

Os magos do Oriente Nota 02 - pg. 85 (Mt 2:1-12) E, tendo nascido Jesus em Belém de Judeia no tempo do rei Herodes, eis que uns magos vieram do oriente a Jerusalém, dizendo: Onde está aquele que é nascido rei dos judeus? Porque vimos a sua estrela no oriente, e viemos a adorá-lo. E o rei Herodes, ouvindo isto perturbou-se, e toda Jerusalém com ele. E, congregados todos os príncipes dos sacerdotes, e os escribas do povo, perguntou-lhes onde havia de nascer o Cristo. E eles lhe disseram: Em Belém de Judeia; porque assim está escrito pelo profeta: E tu, Belém, terra de Judá, de modo nenhum és a menor entre as capitais de Judá; porque de ti sairá o Guia que há de apascentar o meu povo de Israel. Então Herodes, chamando secretamente os magos, inquiriu exatamente deles acerca do tempo em que a estrela lhes aparecera. E, enviando-os a Belém, disse: Ide, e perguntai diligentemente pelo menino, e, quando o achardes, participai-mo, para que também eu vá e o adore. E, tendo eles ouvido o rei, partiram; e eis que a estrela,

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que tinham visto no oriente, ia adiante deles, até que, chegando, se deteve sobre o lugar onde estava o menino. E, vendo eles a estrela, alegraram-se muito com grande alegria. E, entrando na casa, acharam o menino com Maria sua mãe, e prostrando-se, o adoraram; e, abrindo os seus tesouros, lhe ofertaram dádivas: ouro, incenso e mirra. E, sendo por divina revelação avisados em sonhos para que não voltassem para junto de Herodes, partiram para a sua terra por outro caminho.

A fuga para o Egito; a matança dos inocentes (Mt 2:13-18) E, tendo-se eles retirado, eis que o anjo do Senhor apareceu a José em sonhos, dizendo: Levanta-te, e toma o menino e sua mãe, e foge para o Egito, e demora-te lá até que eu te diga; porque Herodes há de procurar o menino para o matar. E, levantando-se ele, tomou o menino e sua mãe, de noite, e foi para o Egito. E esteve lá até à morte de Herodes, para que se cumprisse o que foi dito da parte do Senhor pelo profeta que diz: Do Egito chamei o meu Filho. Então Herodes, vendo que tinha sido iludido pelos magos, irritou-se muito, e mandou matar todos os meninos que havia em Belém, e em todos os seus contornos, de dois anos para baixo, segundo o tempo que diligentemente inquirira dos magos. Então se cumpriu o que foi dito pelo profeta Jeremias, que diz: Em Ramá se ouviu uma voz, lamentação, choro e grande pranto: Raquel chorando os seus filhos, e não querendo ser consolada, porque já não existem.

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A volta do Egito (Mt 2:19-23) Morto porém Herodes, eis que o anjo do Senhor apareceu num sonho a José no Egito, dizendo: Levanta-te, e toma o menino e sua mãe, e vai para a terra d’Israel; porque já estão mortos os que procuravam a morte do menino. Então ele se levantou, e tomou o menino e sua mãe, e foi para a terra d’Israel. E, ouvindo que Arquelau reinava na Judeia em lugar de Herodes, seu pai, receou ir para lá: mas avisado em sonhos por divina revelação, foi para as partes da Galileia. E chegou, e habitou numa cidade chamada Nazaré, para que se cumprisse o que fora dito pelos profetas: Ele será chamado Nazareno.

O menino Jesus no meio dos doutores (Lc 2:40-52) E o menino crescia, e se fortalecia em espírito, cheio de sabedoria; e a graça de Deus estava sobre ele. Ora, todos os anos, iam seus pais a Jerusalém, à festa da páscoa; e, tendo ele já doze anos, subiram a Jerusalém, segundo o costume do dia da festa. E, regressando eles, terminados aqueles dias, ficou o menino Jesus em Jerusalém, e não o souberam seus pais. Pensando, porém, eles que viria de companhia pelo caminho, andaram caminho de um dia, e procuravam-no entre os parentes e conhecidos; e, como não o encontrassem, voltaram em Jerusalém em busca dele.

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E, aconteceu que, passados três dias, o acharam no templo, assentado no meio dos doutores, ouvindo-os, e interrogandoos. E todos os que o ouviam admiravam a sua inteligência e respostas. E quando o viram, maravilharam-se, e disse-lhe sua mãe: Filho, por que fizeste assim para conosco? Eis que o teu pai e eu ansiosos te procurávamos. E ele lhes disse: Por que é que me procuráveis? Não sabeis que me convém tratar dos negócios de meu Pai? E eles não compreenderam as palavras que lhes dizia. E desceu com eles, e foi para Nazaré, e era-lhes sujeito. E sua mãe guardava no seu coração todas estas coisas. E crescia Jesus em sabedoria, e em estatura, e em graça para com Deus e os homens.

A pregação de João Batista (Mt 3:1-12; Mc 1:1-8; Lc 3:1-18) Princípio do Evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus; como está escrito no profeta Isaías: Eis que eu envio o meu anjo ante a tua face, o qual preparará o teu caminho diante de ti. E no ano quinze do império de Tibério César, sendo Pôncio Pilatos presidente da Judeia, e Herodes tetrarca da Galileia, e seu irmão Filipi tetrarca da Itureia, e da província de Traconites, e Lisâneas tetrarca da Abilínia, sendo Anás e Caifás sumos sacerdotes, veio no deserto da Judeia a palavra de Deus a João Batista, filho de Zacarias. E percorreu toda a terra ao redor do Jordão, pregando o

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batismo do arrependimento para o perdão dos pecados, e dizendo: Arrependei-vos, porque é chegado o reino dos céus. Porque este é o anunciado no livro das palavras do profeta Isaías, que diz: Voz do que clama no deserto: Preparai o caminho do Senhor; endireitai as suas veredas. Todo o vale se encherá, e se abaixará todo o monte e outeiro; e o que é tortuoso se endireitará e os caminhos escabrosos se aplanarão; e toda a carne verá a salvação de Deus. Dizia pois João à multidão que saia para ser batizado por ele, vendo ele muitos dos fariseus e dos saduceus, que vinham ao seu batismo: Raça de víboras, quem vos ensinou a fugir da ira que está para vir? Produzi pois frutos dignos de arrependimento, e não comeceis a dizer em vós mesmos: Temos Abraão por pai; porque eu vos digo que até destas pedras pode Deus suscitar filhos a Abraão. E também já está posto o machado à raiz das arvores; toda a árvore, pois, que não dá bom fruto, corta-se e lançase no fogo. E a multidão o interrogava, dizendo: Que faremos pois? E, respondendo ele, disse-lhes: Quem tiver duas túnicas, reparta com o que não tem, e quem tiver alimentos faça da mesma maneira. E chegaram também uns publicanos, para serem batizados, e disseram-lhe: Mestre, que devemos fazer? E ele lhes disse: Não peçais mais do que o que vos está ordenado. E uns soldados o interrogaram também, dizendo: E nós que faremos? E ele lhes disse: A ninguém trateis mal nem defraudeis, e

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contentai-vos com o vosso soldo. E, estando o povo em expectação, e pensando todos de João, em seus corações, se porventura seria o Cristo, respondeu João a todos, dizendo: Eu, na verdade, batizo-vos com água para o arrependimento, mas eis que vem após mim aquele que é mais poderoso do que eu, a quem eu não sou digno de desatar a correia das alparcas; esse vos batizará com o Espírito Santo e com fogo. Ele tem a pá na sua mão; e limpará a sua eira, e ajuntará o trigo no seu celeiro, mas queimará a palha com fogo que nunca se apaga. Então ia ter com ele Jerusalém, e toda a Judeia, e toda a província adjacente ao Jordão; e eram por eles batizados no rio Jordão, confessando os seus pecados. E assim admoestando-os, muitas outras coisas também anunciava ao povo. E João andava vestido de pelos de camelo, e com um cinto de couro em redor de seus lombos, e comia gafanhotos e mel silvestre.

O batismo de Jesus (Mt 3:13-17; Mc 1:9-11; Lc 3:21,22) Então, como todo o povo se batizava, veio Jesus de Nazaré da Galileia ter também com João junto do Jordão, para ser batizado por ele. Mas João opunha-se-lhe, dizendo: Eu careço de ser batizado por ti, e vens tu a mim? Jesus, porém, respondendo, disse-lhe: Deixa por agora, porque assim nos convém cumprir toda a justiça.

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Então ele o permitiu. E, sendo Jesus batizado, saiu logo da água, e orando ele, eis que se lhe abriram os céus, e viu o Espírito Santo de Deus descendo sobre ele em forma corpórea, como uma pomba. E eis que uma voz dos céus dizia: Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo.

Genealogia de Jesus Nota 03 - pg. 87 (Lc 3:23-38) E o mesmo Jesus começava a ser de quase trinta anos, sendo (como se cuidava) filho de José e José de Heli, e Heli de Matá, e Matá de Levi, e Levi de Melqui, e Melqui de Joana, e Joana de José, e José de Matatias, e Matatias de Amós, e Amós de Naum, e Naum de Essi, e Essi de Nagai, e Nagai de Máate, e Máate de Matatias, e Matatias de Semei, e Semei de José, e José de Judá, e Judá de Joana, e Joana de Resá, e Resá de Zorobabel, e Zorobabel de Salatiel, e Salatiel de Neri, e Neri de Melqui, e Melqui de Adi, e Adi de Cozan, e Cozan de Elmodam, e Elmodam de Er, e Er de José, e José de Eliézer, e Eliézer de Jorim, e Jorim de Matá, e Matá de Levi, e Levi de Simeão, e Simeão de Judá, e Judá de José, e José de Jonã, e Jonã de Eliaquim, e Eliaquim de Meléia, e Meléia de Mainã, e Mainã de Matatá, e Matatá de Natã, e Natã de Davi, e Davi de Jessé, e Jessé de Obede, e Obede de Booz, e Booz de Salmom, e Salmom de Naassom, e Naassom de Aminadabe, e Aminadabe de Arão, e Arão de Esrom, e Esrom de Fares, e Fares de Judá, e Judá de Jacó, e Jacó de Isaque, e Isaque de Abraão, e Abraão de Tare, e Tare de Nacor, e Nacor de Saruque, e Saruque de Ragaú, e Ragaú de Fáleque, e Fáleque de Heber, e Heber de Sala, e Sala de Cainã, e Cainã de Arfaxade, e Arfaxade de Sem, e Sem de Noé, e Noé de Lameque,

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e Lameque de Matusala, e Matusala de Enoque, e Enoque de Járede, e Járede de Maleleel, e Maleleel de Cainã, e Cainã de Henos, e Henos de Sete, e Sete de Adão, e Adão de Deus.

A tentação de Jesus (Mt 4:1-11; Mc 1:12-13; Lc 4:1-13) E Jesus, cheio do Espírito Santo, voltou do Jordão e foi levado pelo Espírito ao deserto; e quarenta dias e quarenta noites foi tentado pelo diabo, Satanás, e naqueles dias não comeu coisa alguma; e vivia entre as feras; e, terminados eles, teve fome. E chegando-se a ele o tentador, disse: Se tu és o Filho de Deus, dize a esta pedra que se transforme em pão.

E Jesus lhe respondeu, dizendo: Escrito está que nem só de pão viverá o homem, mas de toda a palavra que sai da boca de Deus. E o diabo, levando-o a um alto monte, mostrou-lhe num momento de tempo todos os reinos do mundo. E disse-lhe o diabo: Dar-te-ei a ti todo este poder e a sua glória; porque a mim me foi entregue, e dou-o a quem quero; portanto, se tu me adorares, tudo será teu. E Jesus, respondendo, disse-lhe: Vai-te, Satanás; porque está escrito: Adorarás o Senhor teu Deus, e só a Ele servirás. Levou-o também à cidade Santa, a Jerusalém, e pô-lo sobre o pináculo do templo, e disse-lhe: Se tu és o Filho de Deus, lança-te daqui abaixo; porque está escrito: Mandará aos seus anjos, acerca de ti, que te guardem, e que te sustenham nas mãos,

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para que nunca tropeces com o teu pé em alguma pedra. E Jesus, respondendo, disse-lhe: Dito está: Não tentarás ao Senhor teu Deus. E acabando o diabo toda a tentação, ausentou-se dele por algum tempo; e, eis que chegaram os anjos, e o serviram.

O testemunho de João Batista Nota 04 - pg. 88 (Jo 1:15-34) João testificou dele; e clamou, dizendo: Este era aquele de quem eu dizia: O que vem depois de mim é antes de mim, porque foi primeiro do que eu. E todos nós recebemos também da sua plenitude, e graça por graça. Porque a lei foi dada por Moisés; a graça e a verdade vieram por Jesus Cristo. Deus nunca foi visto por alguém. O Filho unigênito, que está no seio do Pai, este o fez conhecer. E este é o testemunho de João, quando os judeus mandaram de Jerusalém sacerdotes e levitas para que lhe perguntassem: Quem és tu? E confessou, e não negou; confessou: Eu não sou o Cristo. E perguntaram-lhe: Então quê? És tu Elias? E disse: Não sou. És tu profeta?

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E respondeu: Não. Disseram-lhe pois: Quem és? Para que demos resposta àqueles que nos enviaram; que dizes de ti mesmo? Disse: Eu sou a voz do que clama no deserto: Endireitai o caminho do Senhor, como disse o profeta Isaías. E os que tinham sido enviados eram dos fariseus; e perguntaram-lhe e disseram-lhe: Por que batizas pois, se tu não és o Cristo, nem Elias, nem o profeta? João respondeu-lhes, dizendo: Eu batizo com água, mas no meio de vós está um a quem vós não conheceis. Este é aquele que vem após mim, que foi antes de mim, do qual eu não sou digno de desatar a correia da alparca. Estas coisas aconteceram em Betânia, da outra banda do Jordão, onde João estava batizando. No dia seguinte João viu a Jesus que vinha para ele e disse: Eis o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo. Este é aquele do qual eu disse: Após mim vem um varão que foi antes de mim; porque já era primeiro do que eu. E eu não o conhecia; mas, para que ele fosse manifestado a Israel, vim eu, por isso, batizando com água. E João testificou dizendo: Eu vi o Espírito descer do céu como uma pomba, e repousar sobre ele. E eu não o conhecia, mas o que me mandou a batizar com água, este me disse: Sobre aquele que vires descer o Espírito e sobre ele repousar, esse é o que batiza com o Espírito Santo. E eu vi e tenho testificado que este é o Filho de Deus.

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Os primeiros apóstolos de Jesus (Jo 1:35-51) No dia seguinte João estava outra vez ali, e dois de seus discípulos; e, vendo passar a Jesus, disse: Eis aqui o Cordeiro de Deus. E os dois discípulos ouviram-no dizer isto, e seguiram a Jesus. E Jesus, voltando-se e vendo que eles o seguiam, disselhes: Que buscais? E eles lhe disseram: Rabi, (que, traduzido, quer dizer Mestre) onde moras? Ele lhes disse: Vinde e vede. Foram e viram onde morava, e ficaram com ele aquele dia: e era já quase a hora décima. Era André, irmão de Simão Pedro, um dos dois que ouviram aquilo de João, e o haviam seguido. Este achou primeiro a seu irmão Simão, e disse-lhe: Achamos o Messias (que, traduzido, é o Cristo). E levou-o a Jesus. E, olhando Jesus para ele, disse: Tu és Simão, filho de Jonas; tu serás chamado Cefas (que quer dizer Pedro). No dia seguinte quis Jesus ir à Galileia, e achou a Filipi, e disse-lhe: Segue-me. E Filipi era de Betsaida, cidade de André e de Pedro. Filipi achou Natanael, e disse-lhe: Havemos achado aquele de quem Moisés escreveu na Lei, e os profetas: Jesus de Naza-

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ré, filho de José. Disse-lhe Natanael: Pode vir alguma coisa boa de Nazaré? Disse-lhe Filipi: Vem e vê. Jesus viu Natanael vir ter com ele, e disse dele: Eis aqui um verdadeiro israelita, em quem não há dolo. Disse-lhe Natanael: Donde me conheces tu? Jesus respondeu, e disse-lhe: Antes que Filipi te chamasse, te vi eu estando tu debaixo da figueira. Natanael respondeu, e disse-lhe: Rabi, tu és o Filho de Deus, tu és o Rei d’Israel. Jesus respondeu, e disse-lhe: Porque te disse: Vi-te debaixo da figueira, crês? Coisas maiores do que estas verás. E disselhe: Na verdade, na verdade vos digo que daqui em diante vereis o céu aberto, e os anjos de Deus subirem e descerem sobre o Filho do Homem.

As bodas em Caná: a água feita vinho (Jo 2:1-11) E, ao ter ceir o dia, fizer am-se umas bodas em Caná da Galileia: e estava ali a mãe de Jesus. E foi também convidado Jesus e os seus discípulos para as bodas. E, faltando o vinho, a mãe de Jesus lhe disse: Não têm vinho.

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Disse-lhe Jesus: Mulher, que tenho eu contigo? Ainda não é chegada a minha hora. Sua mãe disse aos serventes: Fazei tudo quanto ele vos disser. E estavam ali postas seis talhas de pedra, para as purificações dos judeus, e em cada uma cabiam dois ou três almudes. Disse-lhes Jesus: Enchei d’água essas talhas. E encheramnas até em cima. E disse-lhes: Tirai agora, e levai ao mestre-sala. E levaram. E, logo que o mestre-sala provou a água feita vinho (não sabendo donde viera, se bem que o sabiam os serventes que tinham tirado a água), chamou o mestre-sala ao esposo. E disselhe: Todo o homem põe primeiro o vinho bom, e, quando já têm bebido bem, então o inferior; mas tu guardaste até agora o bom vinho. Jesus principiou assim os seus sinais em Caná da Galileia, e manifestou a sua glória; e os seus discípulos creram nele.

Jesus purifica o templo Nota 05 - pg. 89 (Jo 2:13-25) E estava próxima a páscoa dos judeus, e Jesus subiu a Jerusalém. E achou no templo os que vendiam bois, e ovelhas, e pombos e os cambiadores assentados. E, tendo feito um azorrague de cordéis, lançou todos fora do templo, também os bois e

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ovelhas; e espalhou o dinheiro dos cambiadores, e derribou as mesas; e disse aos que vendiam pombos: Tirai daqui estes, e não façais da casa de meu Pai casa de venda. E os seus discípulos lembraram-se do que está escrito: O zelo de tua casa me devorará. Responderam pois os judeus, e disseram-lhe: Que sinal nos mostras para fazeres isto? Jesus respondeu, e disse-lhes: Derribai este templo, e em três dias o levantarei. Disseram pois os judeus: Em quarenta e seis anos foi edificado este templo, e tu o levantarás em três dias? Mas ele falava do templo do seu corpo. Quando, pois, ressuscitou dos mortos, os seus discípulos lembraram-se de que lhes dissera isto; e creram na Escritura, e na palavra que Jesus tinha dito. E, estando ele em Jerusalém pela páscoa, durante a festa, muitos, vendo os sinais que fazia, creram no seu nome. Mas o mesmo Jesus não confiava neles, porque a todos conhecia; e não necessitava de que alguém testificasse do homem, porque ele bem sabia o que havia no homem.

Jesus instrui Nicodemos acerca do novo nascimento (Jo 3:1-21) E havia entre os fariseus um homem, chamado Nicodemos, príncipe dos judeus. Este foi ter de noite com Jesus, e disse-

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lhe: Rabi, bem sabemos que és mestre, vindo de Deus: porque ninguém pode fazer estes sinais que tu fazes, se Deus não for com ele. Jesus respondeu, e disse-lhe: Na verdade, na verdade te digo que aquele que não nascer de novo, não pode ver o reino de Deus.

Disse-lhe Nicodemos: Como pode um homem nascer, sendo velho? Porventura pode tornar a entrar no ventre de sua mãe, e nascer? Jesus respondeu: Na verdade, na verdade, te digo que aquele que não nascer da água e do Espírito, não pode entrar no reino de Deus. O que é nascido da carne é carne, e o que é nascido do Espírito é espírito. Não te maravilhes de te ter dito: Necessário vos é nascer de novo. O vento assopra onde quer, e ouves a sua voz; mas não sabes de onde vem, nem para onde vai; assim é todo aquele que é nascido do Espírito. Nicodemos respondeu, e disse-lhe: Como pode ser isso? Jesus respondeu, e disse-lhe: Tu és mestre de Israel, e não sabes isto? Na verdade, na verdade te digo que nós dizemos o que sabemos e testificamos o que vimos; e não aceitais o nosso testemunho. Se vos falei de coisas terrestres e não crestes, como crereis, se vos falar das celestiais? Ora, ninguém subiu ao céu, senão o que desceu do céu, o Filho do homem, que está no céu. E, como Moisés levantou a serpente no deserto, assim importa que o Filho do homem seja levantado; para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna. Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu filho unigênito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna. Porque Deus enviou o seu filho ao mun-

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do, não para que condenasse o mundo, mas para que o mundo fosse salvo por ele. Quem crê nele não é condenado; mas quem não crê já está condenado; porquanto não crê no nome do Unigênito Filho de Deus. E a condenação é esta: Que a luz veio ao mundo, e os homens amaram mais as trevas do que a luz, porque as suas obras eram más. Porque todo aquele que faz o mal aborrece a luz, e não vem para a luz para que as suas obras não sejam reprovadas. Mas quem pratica a verdade vem para a luz, a fim de que as suas obras sejam manifestas, porque são feitas em Deus.

Outro testemunho de João Batista (Jo 3:22-36)

Depois disto foi Jesus com os seus discípulos para a terra da Judeia; e estava ali com eles, e batizava. Ora João batizava também em Enom, junto a Salim, porque havia ali muitas águas; e vinham ali, e eram batizados. Porque ainda João não tinha sido lançado na prisão. Houve então uma questão entre os discípulos de João e um judeu acerca da purificação. E foram ter com João, e disseram-lhe: Rabi, aquele que estava contigo além do Jordão, do qual tu deste testemunho, ei-lo batizando, e todos vão ter com ele. João respondeu, e disse: O homem não pode receber coisa alguma, se lhe não for dada do céu. Vós mesmos me sois testemunhas de que disse: Eu não sou o Cristo, mas sou enviado adiante dele. Aquele que tem a esposa é o esposo; mas o amigo do esposo, que lhe assiste e o ouve, alegra-se muito com a voz do esposo. Assim pois já este meu gozo está cumprido.

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É necessário que ele cresça e que eu diminua. Aquele que vem de cima é sobre todos: aquele que vem da terra é da terra, e fala da terra. Aquele que vem do céu é sobre todos. E aquilo que ele viu e ouviu isso testifica; e ninguém aceita o seu testemunho. Aquele que aceitou o seu testemunho, esse confirmou que Deus é verdadeiro. Porque aquele que Deus enviou fala as palavras de Deus; pois não lhe dá Deus o espírito por medida. O Pai ama ao Filho, e todas as coisas entregou nas suas mãos. Aquele que crê no Filho tem a vida eterna; mas aquele que não crê no Filho não verá a vida; mas a ira de Deus sobre ele permanece.

A mulher de Samaria (Jo 4:1-30) E quando o Senhor entendeu que os fariseus tinham ouvido que Jesus fazia e batizava mais discípulos do que João (ainda que Jesus mesmo não batizava, mas os seus discípulos), deixou a Judeia, e foi outra vez para a Galileia. E era-lhe necessário passar por Samaria. Foi pois a uma cidade, de Samaria, chamada Sicar, junto da herdade que Jacó tinha dado a seu filho José. E estava ali a fonte de Jacó. Jesus, pois, cansado do caminho, assentou-se assim junto da fonte. Era isto quase à hora sexta. Veio uma mulher de Samaria tirar água; disse-lhe Jesus: Dá-me de beber. Porque os seus discípulos tinham ido à cidade comprar comida. Disse-lhe pois a mulher samaritana: Como, sendo tu ju-

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deu, me pedes de beber a mim, que sou mulher samaritana? (porque os judeus não se comunicam com os samaritanos). Jesus respondeu, e disse-lhe: Se tu conheceras o dom de Deus, e quem é o que te diz – Dá-me de beber, tu lhe pedirias, e ele te daria água viva. Disse-lhe a mulher: Senhor, tu não tens com que a tirar, e o poço é fundo; onde pois tens a água viva? És tu maior que o nosso Pai Jacó, que nos deu o poço, bebendo ele próprio dele, e os seus filhos, e o seu gado? Jesus respondeu, e disse-lhe: Qualquer que beber desta água tornará a ter sede; mas aquele que beber da água que eu lhe der nunca terá sede, porque a água que eu lhe der se fará nele uma fonte d’água que salte para a vida eterna. Disse-lhe a mulher: Senhor, dá-me dessa água, para que não mais tenha sede, e não venha aqui tirá-la. Disse-lhe Jesus: Vai, chama o teu marido, e vem cá. A mulher respondeu, e disse: Não tenho marido. Disse-lhe Jesus: Disseste bem: Não tenho marido; porque tiveste cinco maridos, e o que agora tens não é teu marido; isto disseste com verdade. Disse-lhe a mulher: Senhor, vejo que és profeta. Nossos pais adoraram neste monte, e vós dizeis que é em Jerusalém o lugar onde se deve adorar. Disse-lhe Jesus: Mulher, crê-me que a hora vem, em que nem neste monte nem em Jerusalém adorareis o Pai. Vós adorais o que não sabeis; nós adoramos o que sabemos porque a salvação

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vem dos judeus. Mas a hora vem, e agora é, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade; porque o Pai procura a tais que assim o adorem. Deus é Espírito, e importa que os que o adoram o adorem em espírito e em verdade. A mulher disse-lhe: Eu sei que o Messias (que se chama o Cristo) vem; quando ele vier, nos anunciará tudo.

Jesus disse-lhe: Eu o sou, eu que falo contigo. E nisto vieram os seus discípulos, e maravilharam-se de que estivesse falando com uma mulher; todavia nenhum lhe disse: Que perguntas? Ou: Por que falas com ela? Deixou pois a mulher o seu cântaro, e foi à cidade, e disse àqueles homens: Vinde, vede um homem que me disse tudo quanto tenho feito: porventura não é este o Cristo? Saíram pois da cidade, e foram ter com ele.

A ceifa e os ceifeiros (Jo 4:31-42) E entretanto os seus discípulos lhe rogaram, dizendo: Rabi, come. Porém ele lhes disse: Uma comida tenho para comer, que vós não conheceis. Então os discípulos diziam uns aos outros: Trouxe-lhe porventura alguém de comer? Jesus disse-lhes: A minha comida é fazer a vontade da-

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quele que me enviou, e realizar a sua obra. Não dizeis vós que ainda há quatro meses até que venha a ceifa? Eis que eu vos digo: Levantai os vossos olhos, e vede as terras, que já estão brancas para a ceifa. E o que ceifa recebe galardão, e ajunta fruto para a vida eterna; para que, assim o que semeia como o que ceifa, ambos se regozijem. Porque nisto é verdadeiro o ditado, que um é o que semeia, e outro o que ceifa. Eu vos enviei a ceifar onde vós não trabalhastes; outros trabalharam, e vós entrastes no seu trabalho. E muitos dos samaritanos daquela cidade creram nele, pela palavra da mulher, que testificou: Disse-me tudo quanto tenho feito. Indo pois ter com ele os samaritanos, rogaram-lhe que ficasse com eles; e ficou ali dois dias. E muitos mais creram nele, por causa da sua palavra. E diziam à mulher: Já não é pelo teu dito que nós cremos; porque nós mesmos o temos ouvido, e sabemos que este é verdadeiramente o Cristo, o Salvador do mundo.

Cura do filho dum régulo (Jo 4:43-54) E dois dias depois partiu dali, e foi para a Galileia. Porque Jesus mesmo testificou que um profeta não tem honra na sua própria pátria. Chegando pois à Galileia os galileus o receberam, vistas todas as coisas que fizera em Jerusalém no dia da festa; porque também eles tinham ido à festa. Segunda vez foi Jesus a Caná da Galileia, onde da água fizera vinho. E havia ali um régulo cujo filho estava enfermo em Capernaum. Ouvindo este que Jesus vinha da Judeia para a Gali-

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leia, foi ter com ele, e rogou-lhe que descesse, e curasse o seu filho, porque já estava à morte. Então Jesus lhe disse: Se não virdes sinais e milagres, não crereis. Disse-lhe o régulo: Senhor, desce, antes que o meu filho morra. Disse-lhe Jesus: Vai, o teu filho vive. E o homem creu na palavra que Jesus lhe disse, e foi-se. E, descendo ele logo, saíram-lhe ao encontro os seus servos, e lhe anunciaram, dizendo: O teu filho vive. Perguntou-lhes pois a que horas se achara melhor; e disseram-lhe: Ontem às sete horas a febre o deixou. Entendeu pois o pai que era aquela hora a mesma em que Jesus lhe disse: O teu filho vive; e creu ele, e toda a sua casa. Jesus fez este segundo milagre quando ia da Judeia para a Galileia.

Cura dum paralítico de Betesda (Jo 5:1-15) Depois disto havia uma festa entre os judeus, e Jesus subiu a Jerusalém. Ora em Jerusalém há próximo à porta das ovelhas um tanque, chamado em hebreu Betesda, o qual tem cinco alpendres. Nestes jazia grande multidão de enfermos; cegos, mancos e ressicados, esperando o movimento das águas. Porquanto um anjo descia em certo tempo ao tanque, e agitava a água; e o primeiro que ali descia, depois do movimento da água,

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sarava de qualquer enfermidade que tivesse. E estava ali um homem que havia trinta e oito anos, se achava enfermo. E Jesus, vendo este deitado, e sabendo que estava neste estado havia muito tempo, disse-lhe: Queres ficar são? O enfermo respondeu: Senhor, não tenho homem algum que, quando a água é agitada, me meta no tanque; mas, enquanto eu vou, desce outro antes de mim. Jesus disse-lhe: Levanta-te, toma a tua cama, e anda. Logo aquele homem ficou são; e tomou a sua cama, e partiu. E aquele dia era sábado. Então os judeus disseram àquele que tinha sido curado: É sábado, não te é lícito levar a cama.

Ele respondeu-lhes: Aquele que me curou, ele próprio disse: Toma a tua cama, e anda. Perguntaram-lhe pois: Quem é o homem que te disse: Toma a tua cama e anda? E o que fora curado não sabia quem era; porque Jesus se havia retirado, em razão de naquele lugar haver grande multidão. Depois Jesus encontrou-o no templo, e disse-lhe: Eis que já estás são; não peques mais para que te não suceda alguma coisa pior. E aquele homem foi, e anunciou aos judeus que Jesus era o que o curara.

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Jesus declara-se Filho de Deus e igual ao Pai (Jo 5:16-47) E por esta causa os judeus perseguiram a Jesus, e procuravam matá-lo; porque fazia estas coisas no sábado. E Jesus lhes respondeu: Meu Pai trabalha até agora, e eu trabalho também. Por isso pois os judeus ainda mais procuravam matá-lo, porque não só quebrantava o sábado, mas também dizia que Deus era seu próprio Pai, fazendo-se igual a Deus. Mas Jesus respondeu, e disse-lhe: Na verdade, na verdade vos digo que o Filho por si mesmo não pode fazer coisa alguma, se o não vir fazer ao Pai; porque tudo quanto ele faz, o Filho o faz igualmente. Porque o Pai ama o Filho, e mostra-lhe tudo o que faz; e ele lhe mostrará maiores obras do que estas, para que vos maravilheis. Pois, assim como o Pai ressuscita os mortos, e os vivifica, assim também o Filho vivifica aqueles que quer. E também o Pai a ninguém julga, mas deu ao Filho tudo o juízo; para que todos honrem o Filho, como honram o Pai. Quem não honra o Filho, não honra o Pai que o enviou. Na verdade, na verdade vos digo que quem ouve a minha palavra, e crê naquele que me enviou, tem a vida eterna, e não entrará em condenação, mas, passou da morte para a vida. Em verdade, em verdade vos digo que vem a hora, e agora é, em que os mortos ouvirão a voz do Filho de Deus, e os que a ouvirem viverão. Porque, como o Pai tem a vida em si mesmo,

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assim deu também ao Filho ter a vida em si mesmo. E deu-lhe o poder de exercer o juízo, porque é o Filho do homem. Não vos maravilheis disto; porque vem a hora em que todos os que estão nos sepulcros ouvirão a sua voz. E os que fizeram o bem sairão para a ressurreição da vida; e os que fizeram o mal para a ressurreição da condenação.

Eu não posso de mim mesmo fazer coisa alguma: como ouço, assim julgo; e o meu juízo é justo, porque não busco a minha vontade, mas a vontade do Pai que me enviou. Se eu testifico de mim mesmo, o meu testemunho não é verdadeiro. Há outro que testifica de mim, e sei que o testemunho que ele dá de mim é verdadeiro. Vós mandastes a João, e ele deu testemunho da verdade. Eu, porém, não recebo testemunho de homem; mas digo isto, para que vos salveis. Ele era a candeia que ardia e alumiava; e vós quisestes alegrar-vos por um pouco de tempo com a sua luz. Mas eu tenho maior testemunho do que o de João; porque as obras que o Pai me deu para realizar, as mesmas obras que eu faço, testificam de mim, que o Pai me enviou. E o Pai, que me enviou, ele mesmo testificou de mim. Vós nunca ouvistes a sua voz, nem vistes o seu parecer; e a sua palavra não permanece em vós, porque naquele que ele enviou não credes vós. Examinais as Escrituras, porque vós cuidais ter nelas a vida eterna, e são elas que de mim testificam. E não quereis vir a mim para terdes vida. Eu não recebo glória dos homens; mas bem vos conheço,

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que não tendes em vós o amor de Deus. Eu vim em nome de meu Pai, e não me aceitais; se outro vier em seu próprio nome, a esse aceitareis. Como podeis vós crer, recebendo honra uns dos outros, e não buscando a honra que vem só de Deus? Não cuideis que eu vos hei de acusar para com o Pai. Há um que vos acusa, Moisés, em quem vós esperais. Porque, se vós crêsseis em Moisés, creríeis em mim; porque de mim escreveu ele. Mas, se não credes nos seus escritos, como crereis nas minhas palavras?

Jesus em Galileia Nota 06 - pg. 90 (Mt 4:12; Mc 1:14a; Lc 3:19-20 / 4:14-15) Sendo, porém, o tetrarca Herodes repreendido por João por causa de Herodias, mulher de seu irmão Filipe, e por todas as maldades que Herodes tinha feito, acrescentou a todas as outras ainda esta, a de encerrar João num cárcere. Jesus, porém, pela virtude do Espírito, ouvindo que João estava preso, voltou para a Galileia, e a sua fama correu por todas as terras em derredor. E ensinava nas suas sinagogas, e por todos era louvado.

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Jesus é expulso de Nazaré (Lc 4:16-30) E, chegando a Nazaré, onde fora criado, entrou num dia de sábado, segundo o seu costume, na sinagoga, e levantou-se para ler. E foi-lhe dado o livro do profeta Isaías; e, quando abriu o livro, achou o lugar em que estava escrito: O Espírito do Senhor é sobre mim, pois que me ungiu para evangelizar os pobres, enviou-me a curar os quebrantados do coração, a apregoar liberdade aos cativos, e dar vista aos cegos; a pôr em liberdade os oprimidos; a anunciar o ano aceitável do Senhor. E, cerrando o livro, e tornando-o a dar ao ministro, assentou-se; e os olhos de todos na sinagoga estavam fitos nele.

Então começou a dizer-lhes: Hoje se cumpriu esta Escritura em vossos ouvidos. E todos lhe davam testemunho, e se maravilhavam das palavras de graça que saiam da sua boca; e diziam: Não é este o filho de José? E ele lhes disse: Sem dúvida me direis este provérbio: Médico, cura-te a ti mesmo: faze também aqui na tua pátria tudo que ouvimos ter sido feito em Capernaum. E disse: Em verdade vos digo que nenhum profeta é bem recebido na sua pátria. Em verdade vos digo que muitas viúvas existiam em Israel nos dias de Elias, quando o céu se cerrou por três anos e seis meses, de sorte que em toda a terra houve grande fome; e a nenhuma delas foi enviado Elias, senão a Serepta de Sidom, a uma mulher viúva. E muitos leprosos havia em Israel

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no tempo do profeta Eliseu, e nenhum deles foi purificado, senão Naamã, o siro. E todos, na sinagoga, ouvindo estas coisas, se encheram de ira. E, levantando-se, o expulsaram da cidade, e o levaram até ao cume do monte em que a cidade deles estava edificada, para dali o precipitarem. Ele, porém, passando pelo meio deles, retirou-se.

Jesus vai habitar em Capernaum (Mt 4:13-17; Mc 1:14b-15; Lc 4:31-32 ; Jo 2:12) E, deixando Nazaré, foi habitar em Capernaum, cidade marítima da Galileia, nos confins de Zabulom e Naftali; ele, e sua mãe, e seus irmãos, e seus discípulos, e ficaram ali não muitos dias. Para que se cumprisse o que foi dito pelo profeta Isaías, que diz: A terra de Zabulom, e a terra de Naftali, junto ao caminho do mar, além do Jordão, a Galileia das nações; o povo, que estava assentado em trevas, viu uma grande luz; e aos que estavam assentados na região e sombra da morte a luz raiou. Desde então começou Jesus a pregar o Evangelho do Reino de Deus, e a dizer: Arrependei-vos porque é chegado o reino dos céus. O tempo está cumprido, e o reino de Deus está próximo. Arrependei-vos e crede no evangelho. E admiravam a sua doutrina porque a sua palavra era com autoridade, e os ensinava nos sábados.

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Os primeiros discípulos (Mt 4:18-22 ; Mc 1:16-20) E Jesus, andando junto ao mar da Galileia, viu a dois irmãos, Simão, chamado Pedro, e André, os quais lançavam as redes ao mar, porque eram pescadores; e disse-lhes: Vinde após mim, e eu vos farei pescadores de homens. Então eles, deixando logo as redes, seguiram-no. E, adiantando-se dali, viu outros dois irmãos, Tiago, filho de Zebedeu, e João seu irmão, num barco com seu pai Zebedeu, consertando as redes; e chamou-os; eles, deixando imediatamente o barco e seu pai Zebedeu com os jornaleiros, seguiram-no.

A cura do endemoninhado de Capernaum (Mc 1:21-28 ; Lc 4:33-37) Entraram em Capernaum, e logo no sábado, indo ele à sinagoga, ali ensinava. E estava na sinagoga deles um homem que tinha um espírito de um demônio imundo, e exclamou em alta voz, dizendo: Ah, que temos nós contigo, Jesus Nazareno? Vieste a destruir-nos? Bem sei quem és: o Santo de Deus. E Jesus o repreendeu, dizendo: Cala-te, e sai dele. E o demônio, lançando-o por terra no meio do povo, convulsionando-o, e clamando com grande voz, saiu dele sem lhe fazer mal. E todos se admiravam, e veio espanto sobre todos, a ponto de perguntarem entre si, dizendo: Que é isto? Que nova doutrina é esta? Pois com autoridade e poder ordena aos espíritos imundos, e eles lhe obedecem e saem?

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E logo correu a sua fama por toda a província da Galileia.

Cura da sogra de Pedro (Mt 4:23-25 / 8:14-17 ; Mc 1:29-39 ; Lc 4:38-44) E logo, saindo da sinagoga, foram à casa de Simão e de André com Tiago e João. E a sogra de Simão estava deitada enferma com muita febre; e rogaram-lhe por ela. Então, chegandose a ela, repreendeu a febre, e esta a deixou. E, inclinando-se para ela, tomou-a pela mão, e levantou-a. E ela, levantando-se logo, servia-os. E, tendo chegado a tarde, quando já se estava pondo o sol, todos os que tinham enfermos de várias doenças lhos traziam; e, pondo as mãos sobre cada um deles, os curava. Para que se cumprisse o que fora dito pelo profeta Isaías, que diz: Ele tomou sobre si as nossas enfermidades, e levou as nossas doenças. E também de muitos, com a sua palavra, saíam demônios, clamando e dizendo: Tu és o Cristo, o Filho de Deus. E ele, repreendendo-os, não os deixava falar, pois sabiam que ele era o Cristo. E toda a cidade se ajuntou à porta. E, levantando-se de manhã muito cedo, fazendo ainda escuro, saiu, e foi para um lugar deserto, e ali orava. E seguiram-no Simão e os que com ele estavam. E, achando-o, lhe disseram: Todos te buscam. E ele lhes disse: Vamos às aldeias vizinhas, para que eu ali também pregue; porque para isso vim. E, sendo já dia, a multidão o procurava, e chegou junto

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dele; e o detinham, para que não se ausentasse deles. Ele, porém, lhes disse: Também é necessário que eu anuncie a outras cidades o evangelho do reino de Deus; porque para isso fui enviado. E percorria Jesus toda a Galileia, ensinando nas suas sinagogas e pregando o Evangelho do reino, e curando todas as enfermidades e moléstias entre o povo. E a sua fama correu por toda a Síria, e traziam-lhe todos os que padeciam, acometidos de várias enfermidades e tormentos, os endemoninhados, os lunáticos, e os paralíticos, e ele os curava. E seguia-o uma grande multidão da Galileia, de Decápolis, de Jerusalém, da Judeia, e dalém do Jordão.

A pesca maravilhosa Nota 07 - pg. 93 (Lc 5:1-11) E aconteceu que, apertando-o a multidão, para ouvir a palavra de Deus, estava ele junto ao lago de Genesaré; e viu estar dois barcos junto à praia do lago; e os pescadores, havendo descido deles, estavam lavando as redes. E, entrando num dos barcos, que era o de Simão, pediulhe que o afastasse um pouco da terra; e, assentando-se, ensinava do barco a multidão. E, quando acabou de falar, disse a Simão: Faze-te ao mar alto, e lançai as vossas redes para pescar.

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E, respondendo Simão, disse-lhe: Mestre, havendo trabalhado toda a noite, nada apanhamos, mas sobre tua palavra lançarei a rede. E, fazendo assim, colheram uma grande quantidade de peixes, e rompia-se-lhes a rede. E fizeram sinal aos companheiros que estavam no outro barco, para que os fossem ajudar. E foram, e encheram ambos os barcos de maneira tal que quase iam a pique. E, vendo isto Simão Pedro, prostrou-se aos pés de Jesus, dizendo: Senhor, ausenta-te de mim, que sou um homem pecador. Pois que o espanto se apoderara dele, e de todos os que com ele estavam, por causa da pesca de peixe que haviam feito; e, de igual modo, também de Tiago e João, filhos de Zebedeu, que eram companheiros de Simão. E disse Jesus a Simão: Não temas: de agora em diante serás pescador de homens. E, levando os barcos para a terra, deixaram tudo, e o seguiram.

O sermão da montanha. As [bem-aventuranças] (Mt 5:1-12) E Jesus, vendo a multidão, subiu a um monte, e, assentando-se, aproximaram-se dele os seus discípulos; e, abrindo a sua boca, os ensinava, dizendo: Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o reino dos céus; bem-aventurados os que

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choram, porque eles serão consolados; bem-aventurados os mansos, porque eles herdarão a terra; bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque eles serão fartos; bem-aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão misericórdia; bemaventurados os limpos de coração, porque eles verão a Deus; bem-aventurados os pacificadores, porque eles serão chamados filhos de Deus; bem-aventurados os que sofrem perseguição por causa da justiça, porque deles é o reino dos céus; bemaventurados sois vós, quando vos injuriarem e perseguirem, e mentindo, disserem todo o mal contra vós por minha causa. Exultai e alegrai-vos, porque é grande o vosso galardão nos céus; porque assim perseguiram os profetas que foram antes de vós.

Os discípulos são o sal da terra e a luz do mundo (Mt 5:13-16) Vós sois o sal da terra; e se o sal for insípido, com que se há de salgar? Para nada mais presta senão para se lançar fora, e ser pisado pelos homens. Vós sois a luz do mundo: não se pode esconder uma cidade edificada sobre um monte; nem se acende a candeia e se coloca debaixo do alqueire, mas no velador, e dá luz a todos que estão na casa. Assim resplandeça a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai, que está nos céus.

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O cumprimento da lei e dos profetas (Mt 5:17-48) Não cuideis que vim destruir a lei ou os profetas: não vim ab-rogar, mas cumprir. Porque em verdade vos digo que, até que o céu e a terra passem, nenhum jota ou til se omitirá da lei, sem que tudo seja cumprido. Qualquer pois que violar um destes mais pequenos mandamentos, e assim ensinar aos homens, será chamado o menor no reino dos céus; aquele, porém, que os cumprir e ensinar será chamado grande no reino dos céus. Porque vos digo que, se a vossa justiça não exceder a dos escribas e fariseus, de modo nenhum entrareis no reino dos céus. Ouvistes que foi dito aos antigos: Não matarás; mas qualquer que matar será réu de juízo. Eu, porém, vos digo que qualquer que, sem motivo, se encolerizar contra seu irmão, será réu de juízo, e qualquer que disser a seu irmão: Raca, será réu do sinédrio; e qualquer que lhe disser: Louco, será réu do fogo do inferno. Portanto, se trouxeres a tua oferta ao altar, e aí te lembrares de que teu irmão tem alguma coisa contra ti, deixa ali diante do altar a tua oferta, e vai reconciliar-te primeiro com teu irmão, e depois vem e apresenta a tua oferta. Reconcilia-te depressa com o teu adversário, enquanto estás no caminho com ele, para que não aconteça que o adversário te entregue ao juiz, e o juiz te entregue ao oficial, e te encerrem na prisão. Em verdade te digo que de maneira nenhuma sairás dali enquanto não pagares o último ceitil. Ouvistes que foi dito aos antigos: Não cometerás adultério. Eu, porém, vos digo que qualquer que atentar numa mulher para a cobiçar, já em seu coração cometeu adultério com ela.

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Portanto, se o teu olho direito te escandalizar, arranca-o e atira-o para longe de ti, pois te é melhor que se perca um dos teus membros do que seja todo o teu corpo lançado no inferno. E, se a tua mão direita te escandalizar, corta-a e atira-a para longe de ti, porque te é melhor que um dos teus membros se perca do que seja todo o teu corpo lançado no inferno. Também foi dito: Qualquer que deixar sua mulher, dê-lhe carta de desquite. Eu, porém, vos digo que qualquer que repudiar sua mulher, a não ser por causa de prostituição, faz que ela cometa adultério, e qualquer que casar com a repudiada comete adultério. Outrossim, ouvistes que foi dito aos antigos: Não perjurarás, mas cumprirás teus juramentos ao Senhor. Eu, porém, vos digo que de maneira nenhuma jureis: nem pelo céu, porque é o trono de Deus; nem pela terra, porque é o escabelo de seus pés; nem por Jerusalém, porque é a cidade do grande Rei; nem jurarás pela tua cabeça, porque não podes tornar um cabelo branco ou preto. Seja, porém, vosso falar: Sim, sim; Não, não, porque o que passa disto é de procedência maligna. Ouvistes que foi dito: Olho por olho, e dente por dente. Eu, porém, vos digo que não resistais ao mal; mas, se qualquer te bater na face direita, oferece-lhe também a outra; e ao que quiser pleitear contigo, e tirar-te o vestido, larga-lhe também a capa; e, se qualquer te obrigar a caminhar uma milha, vai com ele duas. Dá a quem te pedir, e não te desvies daquele que quiser que lhe emprestes. Ouvistes que foi dito: Amarás o teu próximo, e aborrecerás o teu inimigo. Eu, porém, vos digo: Amai a vossos inimigos, bendizei os que vos maldizem, fazei bem aos que vos odeiam, e orai pelos que vos maltratam e vos perseguem; para que sejais filhos do vosso Pai que está nos céus; porque faz que o seu sol se

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levante sobre maus e bons, e a chuva desça sobre justos e injustos. Pois, se amardes os que vos amam, que galardão havereis? Não fazem os publicanos também o mesmo? E, se saudardes unicamente os vossos irmãos, que fazeis de mais? Não fazem os publicanos também assim? Sede vós pois perfeitos, como é perfeito o vosso Pai que está nos céus.

Esmolas, oração, jejum (Mt 6:1-18) Guardai-vos de fazer a vossa esmola diante dos homens, para serdes vistos por eles: aliás não tereis galardão junto de vosso Pai, que está nos céus. Quando pois deres esmola, não faças tocar trombeta diante de ti, como fazem os hipócritas nas sinagogas e nas ruas, para serem glorificados pelos homens. Em verdade vos digo que já receberam o seu galardão. Mas, quando tu deres esmola, não saiba a tua mão esquerda o que faz a tua direita; para que a tua esmola seja dada ocultamente: e teu Pai, que vê em segredo, te recompensará publicamente. E, quando orares, não seja como os hipócritas; pois se comprazem em orar em pé nas sinagogas, e às esquinas das ruas para serem vistos pelos homens. Em verdade vos digo que já receberam o seu galardão. Mas tu, quando orares, entra no teu aposento, e, fechando a tua porta, ora a teu Pai que está em oculto; e teu Pai, que vê secretamente, te recompensará. E, orando, não useis de vãs repetições, como os gentios, que pensam que por muito falarem serão ouvidos. Não vos assemelheis pois a eles; porque vosso Pai sabe o que vos é necessário, antes de vós lho pedirdes.

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Portanto, vós orareis assim: Pai nosso, que estás nos céus, santificado seja o teu nome; venha o teu reino, seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu; o pão nosso de cada dia nos dá hoje; e perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós perdoamos aos nossos devedores; e não nos induzas à tentação; mas livra-nos do mal; porque teu é o reino, e o poder, e a glória, para sempre. Amém.

Porque, se perdoardes aos homens as suas ofensas, também vosso Pai celestial vos perdoará a vós; se, porém, não perdoardes aos homens as suas ofensas, também vosso Pai vos não perdoará as vossas ofensas. E, quando jejuardes, não vos mostreis contristados como os hipócritas; porque desfiguram os seus rostos, para que aos homens pareça que jejuam. Em verdade vos digo que já receberam o seu galardão. Porém tu, quando jejuares, unge a tua cabeça, e lava o teu rosto. Para não pareceres aos homens que jejuas, mas a teu Pai, que está em oculto; e teu Pai, que vê em oculto, te recompensará.

O tesouro no céu. O olho puro. Os dois senhores. Ansiosa solicitude pela nossa vida (Mt 6:19-34) Não ajunteis tesouros na terra, onde a traça e a ferrugem tudo consomem, e onde os ladrões minam e roubam; mas ajuntai tesouros no céu, onde nem a traça nem a ferrugem consomem, e onde os ladrões não minam nem roubam. Porque onde estiver o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração. A candeia do corpo são os olhos; de sorte que, se os teus olhos forem bons, todo o teu corpo terá luz; se, porém, os teus olhos forem maus, o teu corpo será tenebroso. Se, portanto a luz

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que em ti há são trevas, quão grandes serão tais trevas! Ninguém pode servir a dois senhores; porque ou há de odiar um e amar o outro, ou se dedicará a um e desprezará o outro. Não podeis servir a Deus e a Mamom. Por isso vos digo: Não andeis cuidadosos quanto à vossa vida, pelo que haveis de comer ou pelo que haveis de beber; nem, quanto ao vosso corpo, pelo que haveis de vestir. Não é a vida mais do que o mantimento, e o corpo mais do que o vestido? Olhai para as aves do céu, que nem semeiam, nem segam, nem ajuntam em celeiros; e vosso Pai celestial as alimenta. Não tendes vós muito mais valor do que elas? E qual de vós poderá, com todos os seus cuidados, acrescentar um côvado à sua estatura? E, quanto ao vestido, por que andais solícitos? Olhai para os lírios do campo, como eles crescem: não trabalham nem fiam; e eu vos digo que nem mesmo Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como qualquer deles. Pois, se Deus assim veste a erva do campo, que hoje existe e amanhã é lançada no forno, não vos vestirá muito mais a vós, homens de pouca fé? Não andeis, pois, inquietos, dizendo: Que comeremos, ou que beberemos, ou com que nos vestiremos? (porque todas estas coisas os gentios procuram). De certo vosso Pai celestial bem sabe que necessitais de todas estas coisas; mas buscai primeiro o reino de Deus, e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas. Não vos inquieteis, pois, pelo dia d’amanhã, porque o dia d’amanhã cuidará de si mesmo. Basta a cada dia o seu mal.

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O juízo temerário. As coisas santas não deis aos cães. Perseverança na oração. A porta estreita. Os falsos profetas. Devemos ouvir e cumprir as palavras de Jesus (Mt 7:1-29) Não julgueis, para que não sejais julgados. Porque com o juízo com que julgardes sereis julgados, e com a medida que tiverdes medido vos hão de medir a vós. E por que reparas tu no argueiro que está no olho do teu irmão, e não vês a trave que está no teu olho? Ou como dirás a teu irmão: Deixa-me tirar o argueiro do teu olho; estando uma trave no teu? Hipócrita, tira primeiro a trave do teu olho, e então cuidarás em tirar o argueiro do olho do teu irmão. Não deis aos cães as coisas santas, nem deiteis aos porcos as vossas pérolas; para que não as pisem, com os pés, e, voltando -se, vos despedacem. Pedi, e dar-se-vos-á; buscai, e encontrareis; batei, e abrirse-vos-á. Porque, aquele que pede, recebe; e, o que busca, encontra: e, ao que bate, se abre. E qual dentre vós é o homem que, pedindo-lhe pão o seu filho, lhe dará uma pedra? E, pedindo-lhe peixe, lhe dará uma serpente? Se, vós, pois, sendo maus, sabeis dar boas coisas aos vossos filhos, quanto mais vosso Pai, que está nos céus, dará bens aos que lhos pedirem? Portanto, tudo o que vós quereis que os homens vos façam, fazei-lho também vós, porque esta é a lei e os profetas. Entrai pela porta estreita; porque larga é a porta, e espaçoso o caminho que conduz à perdição, e muitos são os que entram por ela; e porque estreita é a porta, e apertado o caminho que leva à vida, e poucos há que a encontrem.

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Acautelai-vos, porém, dos falsos profetas, que vêm até vós vestidos como ovelhas, mas interiormente são lobos devoradores. Por seus frutos os conhecereis. Porventura colhem-se uvas dos espinheiros ou figos dos abrolhos? Assim, toda árvore boa produz bons frutos, e toda a árvore má produz frutos maus. Não pode a árvore boa dar maus frutos; nem a árvore má dar frutos bons. Toda a árvore que não dá bom fruto corta-se e lança-se no fogo. Portanto, pelos seus frutos os conhecereis. Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus. Muitos me dirão naquele dia: Senhor, Senhor, não profetizamos nós em teu nome? E em teu nome não expulsamos demônios? E em teu nome não fizemos muitas maravilhas? E então lhes direi abertamente: Nunca vos conheci: apartai-vos de mim, vós que praticais a iniquidade. Todo aquele, pois, que escuta estas minhas palavras e as pratica, assemelhá-lo-ei ao homem prudente, que edificou a sua casa sobre a rocha; e desceu a chuva e correram rios, e assopraram ventos, e combateram aquela casa e não caiu, porque estava edificada sobre a rocha. E aquele que ouve estas minhas palavras e as não cumpre, compará-lo-ei ao homem insensato, que edificou a sua casa sobre a areia. E desceu a chuva, e correram rios, e assopraram ventos, e combateram aquela casa, e caiu, e foi grande a sua queda. E aconteceu que, concluindo Jesus este discurso, a multidão se admirou da sua doutrina; porquanto os ensinava como tendo autoridade; e não como os escribas.

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O leproso purificado (Mt 8:1-4; Mc 1:40-45; Lc 5:12-16) E descendo ele do monte, seguiu-o uma grande multidão. E, eis que um homem cheio de lepra, vendo a Jesus, prostrou-se sobre o rosto pondo-se de joelhos diante dele, e o adorou, dizendo: Senhor, se quiseres, bem podes limpar-me. E Jesus, movido de grande compaixão, estendeu a mão e tocou-o, e disse-lhe: Quero; sê limpo. E, tendo ele dito isto, logo a lepra desapareceu, e ficou limpo e purificado. E, advertindo-o severamente, logo o despediu. E disse-lhe então Jesus: Olha, não digas nada a ninguém; porém vai, mostra-te ao sacerdote e oferece pela tua purificação o que Moisés determinou, para lhes servir de testemunho. Mas, tendo, ele saído, começou a apregoar muitas coisas, e a divulgar o que acontecera; de sorte que a sua fama se propagava ainda mais, e já não podia entrar publicamente na cidade, mas conservava-se fora em lugares desertos, e ali orava; e ajuntava-se muita gente de todas as partes para o ouvir e para ser por ele curada das suas enfermidades.

O paralítico de Capernaum (Mt 9:1-8; Mc 2:1-12; Lc 5:17-26) E alguns dias depois, entrando no barco, passou para a outra banda e entrou outra vez em Capernaum, sua cidade, e sou-

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be-se que estava em casa. E estava ensinando a palavra, e estavam ali assentados fariseus e doutores da lei, que tinham vindo de todas as aldeias da Galileia, e da Judeia, e de Jerusalém. E a virtude do Senhor estava com ele para curar. E logo se ajuntaram tantos, que nem ainda nos lugares junto à porta cabiam. E eis que uns homens transportaram numa cama um homem que estava paralítico, e procuravam fazê-lo entrar e pô-lo diante dele; e não achando por onde o pudessem levar, por causa da multidão, subiram ao telhado, e fazendo um buraco entre as telhas, baixaram o leito em que jazia o paralítico até ao meio, diante de Jesus. E, vendo ele a fé deles, disse-lhe: Homem, tem bom ânimo; filho, perdoados te são os teus pecados. E os escribas e fariseus começaram a arrazoar em seus corações, dizendo: Por que diz este assim blasfêmias? Quem é este que diz blasfêmias? Quem pode perdoar pecados, senão só Deus? Ele blasfema. E Jesus, conhecendo logo em seu espírito que assim arrazoavam entre si, lhes disse: Por que arrazoais mal sobre estas coisas em vossos corações? Qual é mais fácil? Dizer ao paralítico: Estão perdoados os teus pecados; ou dizer-lhe: Levanta-te, e toma o teu leito, e anda? Ora, para que saibais que o Filho do homem tem na terra poder para perdoar pecados (disse ao paralítico): A ti te digo: Levanta-te, toma o teu leito, e vai para tua casa. E, levantando-se logo diante deles, e tomando a cama em que estava deitado, foi para sua casa, glorificando a Deus, de sorte que todos se admiravam e glorificavam a Deus que dera tal poder aos homens, dizendo: Nunca tal vimos; e ficaram cheios de temor, dizendo: Hoje vimos prodígios.

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A vocação de Mateus (Mt 9:9-13; Mc 2:13-17; Lc 5:27-32) E, depois disto, passando adiante dali, tornou a sair para o mar, e toda a multidão ia ter com ele, e ele os ensinava. E passando, viu assentado na recebedoria um publicano, chamado Levi Mateus, filho d’Alfeu, e disse-lhe: Segue-me. E ele, deixando tudo, levantou-se e o seguiu. E fez-lhe Levi um grande banquete em sua casa; e aconteceu que, estando ele sentado à mesa, chegaram muitos publicanos e outros pecadores, e sentaram-se juntamente com Jesus e seus discípulos; porque eram muitos, e o tinham seguido. E os escribas deles, e os fariseus, vendo-o comer com os publicanos e pecadores, murmuravam contra os seus discípulos, dizendo: Por que comeis e bebeis com publicanos e pecadores? Por que come o vosso Mestre com os publicanos e pecadores? Jesus, porém, ouvindo isto, respondendo, disse-lhes: Não necessitam de médico os sãos, mas sim os doentes. Ide, porém, e aprendei o que significa: Misericórdia quero, e não sacrifício. Porque eu não vim a chamar os justos, mas, sim, os pecadores ao arrependimento.

O jejum (Mt 9:14-17; Mc 2:18-22; Lc 5:33-39) Ora, os discípulos de João e os fariseus jejuavam; e foram e disseram-lhe: Por que jejuam os discípulos de João muitas vezes, e fazem orações, como também os dos fariseus, mas os teus

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comem e bebem? E Jesus disse-lhes: Podeis vós fazer jejuar os filhos das bodas, enquanto o esposo está com eles? Dias virão, porém, em que o esposo lhes será tirado, e então, naqueles dias, jejuarão. E disse-lhes também uma parábola: Ninguém deita remendo de pano novo em vestido velho, porque semelhante remendo rompe o vestido, e faz-se maior a rotura. Nem se deita vinho novo em odres velhos; aliás, rompem-se os odres, e entorna-se o vinho, e os odres estragam-se; mas deita-se vinho novo em odres novos, e assim ambos se conservam. E ninguém tendo bebido o velho quer logo o novo, porque diz: Melhor é o velho.

Jesus é Senhor do Sábado

(Mt 12:1-8; Mc 2:23-28; Lc 6:1-5) E aconteceu que, no sábado segundo-primeiro, passou Jesus pelas searas; e os seus discípulos, tendo fome, caminhando, iam arrancando espigas, e, esfregando-as com as mãos, as comiam. E os fariseus, vendo isto, disseram-lhe: Vês? Eis que os teus discípulos fazem o que não é lícito fazer num sábado. Mas ele disse-lhes: Nunca lestes o que fez Davi quando estava em necessidade e teve fome, ele e os que com ele estavam? Como entrou na casa de Deus, no tempo de Abiatar, sumo sacerdote, e comeu os pães da proposição, dos quais não era lícito comer senão só aos sacerdotes, dando também aos que com ele estavam?

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Ou não tendes lido na lei que, aos sábados, os sacerdotes no templo violam o sábado, e ficam sem culpa? Pois eu vos digo que está aqui quem é maior do que o templo. Mas, se vós soubésseis o que significa: Misericórdia quero, e não sacrifício, não condenaríeis os inocentes. E disse-lhes: O sábado foi feito por causa do homem, e não o homem por causa do sábado. Assim o Filho do homem até do sábado é Senhor.

A cura do homem que tinha uma das mãos mirrada (Mt 12:9-21; Mc 3:1-12; Lc 6:6-11) E, partindo dali, chegou à sinagoga deles outra vez noutro sábado, e estava ensinando; e havia ali um homem que tinha a mão direita mirrada. E os escribas e fariseus, para o acusarem, o interrogaram, dizendo: É lícito curar nos sábados? Mas ele bem conhecia os seus pensamentos; e disse ao homem que tina a mão mirrada: Levanta-te, e fica em pé no meio. E, levantando-se ele ficou em pé. Então Jesus lhes disse: Uma coisa vos hei de perguntar: É lícito nos sábados fazer bem, ou fazer mal? Salvar a vida, ou matar? E eles calaram-se. E ele lhes disse: Qual dentre vós será o homem que tendo uma ovelha, se num sábado ela cair numa cova, não lançará mão dela, e a levantará? Pois quanto mais vale um homem do que uma ovelha? É, por consequência, lícito fazer bem nos sábados.

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E, olhando para eles em redor com indignação, condoendo-se da dureza do seu coração, disse ao homem: Estende a tua mão. E ele a estendeu, e foi-lhe restituída a sua mão, sã como a outra. E tendo saído os fariseus cheios de furor, tomaram logo conselho com os herodianos contra ele, procurando ver como o matariam. Jesus, sabendo isso, retirou-se dali com os seus discípulos para o mar, e seguia-o uma grande multidão da Galileia e da Judeia, e de Jerusalém, e da Idumeia, e d’além do Jordão, e de perto de Tiro e de Sidom; uma grande multidão, que ouvindo quão grandes coisas fazia, vinha ter com ele, e ele curou a todos. E ele disse aos seus discípulos que lhe tivessem sempre pronto um barquinho junto dele, por causa da multidão, para que o não oprimisse, porque tinha curado a muitos, de tal maneira que todos quantos tinham algum mal se arrojavam sobre ele, para lhe tocarem. E os espíritos imundos, vendo-o, prostravam-se diante dele, e clamavam, dizendo: Tu és o Filho de Deus. E ele os ameaçava muito, para que não o manifestassem. Para que se cumprisse o que fora dito pelo profeta Isaias, que diz: Eis aqui o meu servo, que escolhi, o meu amado, em quem a minha alma se compraz: porei sobre ele o meu espírito, e anunciará aos gentios o juízo. Não contenderá, nem clamará, nem alguém ouvirá pelas ruas a sua voz; não esmagará a cana quebrada e não apagará o morrão que fumega, até que faça triunfar o juízo; e no seu nome os gentios esperarão.

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Eleição dos doze Nota 08 - pg. 95 (Mt 10:2-4; Mc 3:13-19; Lc 6:12-16) E aconteceu que naqueles dias subiu ao monte a orar, e passou a noite em oração a Deus. E, quando já era dia, chamou a si os discípulos que ele quis, e escolheu doze deles, a quem também deu o nome de apóstolos para que estivessem com ele e os mandasse a pregar; e para que tivessem o poder de curar as enfermidades e expulsar os demônios: Simão, ao qual chamou Pedro, e André, seu irmão; Tiago, filho de Zebedeu, e João, irmão de Tiago, aos quais pôs o nome de Boanerges, que significa: Filhos do trovão; Filipe e Bartolomeu; Tomé e Mateus, o publicano; Tiago, filho d’Alfeu, e Simão Cananita, chamado o zelador; Judas Lebeu, apelidado Tadeu, filho de Tiago; e Judas Iscariotes, que foi o traidor.

[Sermão da planície] Nota 09 - pg. 95 (Lc 6: 17-49) E, descendo com eles, parou num lugar plano, e também um grande número de seus discípulos, e grande multidão de povo de toda a Judeia, e de Jerusalém, e da costa marítima de Tiro e de Sidom; os quais tinham vindo para o ouvir, e serem curados das suas enfermidades, como também os atormentados dos espíritos

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imundos: e eram curados. E toda a multidão procurava tocar-lhe; porque saía dele virtude, e curava a todos. E, levantando ele os olhos para os seus discípulos, dizia: Bem-aventurados vós, os pobres, porque vosso é o reino de Deus. Bem-aventurados vós, que agora tendes fome, porque sereis fartos. Bem-aventurados vós, que agora chorais, porque haveis de rir. Bem-aventurados sereis quando os homens vos aborrecerem e quando vos separarem, e vos injuriarem, e rejeitarem o vosso nome como mau, por causa do Filho do homem. Folgai nesse dia, exultai nesse dia, porque eis que é grande o vosso galardão no céu, pois assim faziam os seus pais aos profetas. Mas ai de vós ricos! Porque já tendes a vossa consolação. Ai de vós, os que estais fartos, porque tereis fome. Ai de vós, os que agora rides, porque vos lamentareis e chorareis. Ai de vós quando todos os homens de vós disserem bem, porque assim faziam seus pais aos falsos profetas. Mas a vós, que ouvis, digo: Amai a vossos inimigos, fazei bem aos que vos aborrecem; bendizei os que vos maldizem, e orai pelo que vos caluniam. Ao que ferir numa face, oferece-lhe também a outra; e, ao que te houver tirado a capa, nem a túnica recuses; e dá a qualquer que te pedir; e, ao que tomar o que é teu, não lho tornes a pedir. E, como vós quereis que os homens vos façam, da mesma maneira lhes fazei vós também. E, se amardes aos que vos amam, que recompensa tereis? Também os pecadores amam aos que os amam. E, se fizerdes bem aos que vos fazem bem, que recompensa tereis? Também os pecadores fazem o mesmo. E, se emprestardes àqueles de quem esperais tornar a receber, que recompensa tereis? Também os pecadores emprestam aos pecadores, para tornarem a receber outro tanto. Amai pois a vossos inimigos, e fazei bem, e emprestai, sem nada esperardes, e será grande o vosso galardão, e sereis filhos do Altíssi-

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mo; porque Ele é benigno até para com os ingratos e maus. Sede pois misericordiosos, como também vosso Pai é misericordioso. Não julgueis, e não sereis julgados; não condeneis, e não sereis condenados; soltai, e soltar-vos-ão. Dai, e ser-vos-á dado; boa medida, recalcada, sacudida e transbordando, vos deitarão no vosso regaço; porque com a mesma medida com que medirdes também vos medirão de novo. E dizia-lhes uma parábola: Pode porventura o cego guiar o cego? Não cairão ambos na cova? O discípulo não é superior ao mestre, mas todo o que for perfeito será como o seu mestre. E por que atentas tu no argueiro que está no olho do teu irmão, e não reparas na trave que está no teu próprio olho? Ou como podes dizer a teu irmão: Irmão, deixa-me tirar o argueiro que está no teu olho, não atentando tu mesmo na trave que está no teu olho? Hipócrita, tira primeiro a trave do teu olho, e então verás bem para tirar o argueiro que está no olho de teu irmão. Porque não há boa árvore que dê mau fruto, nem má árvore que dê bom fruto. Porque cada árvore se conhece pelo seu próprio fruto; pois não se colhe figos dos espinheiros, nem se vindimam uvas dos abrolhos. O homem bom, do bom tesouro do seu coração tira o bem, e o homem mau, do mau tesouro do seu coração tira o mal, porque da abundância do seu coração fala a boca. E por que me chamais, Senhor, Senhor, e não fazeis o que eu digo? Qualquer que vem a mim, e ouve as minhas palavras, e as observa, eu vos mostrarei a quem é semelhante: É semelhante ao homem que edificou uma casa, e cavou, e abriu bem fundo, e pôs os alicerces sobre rocha; e, vindo a enchente, bateu com ímpeto a corrente naquela casa, e não a pôde abalar, porque estava fundada sobre rocha. Mas o que ouve e não pratica é semelhante ao homem que edificou uma casa sobre terra sem alicerces, na qual bateu com ímpeto a corrente, e logo caiu; e foi grande a ruí-

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na daquela casa.

O Centurião de Capernaum Nota 10 - pg. 96

(Mt 8:5-13; Lc 7:1-10) E, depois de concluir todos estes discursos perante o povo, entrou Jesus em Capernaum. E o servo de um certo centurião, a quem muito estimava, estava doente, e moribundo. E, quando ouviu falar de Jesus, enviou-lhe uns anciãos dos judeus, rogando-lhe que viesse curar o seu servo. E, chegando eles junto de Jesus, rogaram-lhe muito, dizendo: Senhor, o meu criado jaz em casa paralítico, e violentamente atormentado. É digno de que lhe concedas isto. Porque ama a nossa nação, e ele mesmo nos edificou a sinagoga. E Jesus lhes disse: Eu irei, e lhe darei saúde. E foi Jesus com eles; mas, quando já estava perto da casa, enviou-lhe o centurião uns amigos, dizendo-lhe: Senhor, não te incomodes, porque não sou digno de que entres debaixo do meu telhado; e por isso nem ainda me julguei digno de ir ter contigo; dize, porém, uma palavra, e o meu criado sarará. Porque eu também sou homem sujeito à autoridade, e tenho soldados sob o meu poder, e digo a este: Vai; e ele vai; e a outro: Vem; e ele vem; e ao meu servo: Faze isto; e ele o faz. E, ouvindo isto Jesus, maravilhou-se dele, e, voltando-se, disse à multidão que o seguia: Em verdade vos digo que nem ainda em Israel tenho achado tanta fé. Mas eu vos digo que mui-

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tos virão do oriente e do ocidente, e assentar-se-ão à mesa com Abraão, e Isaque, e Jacó, no reino dos céus; e os filhos do reino serão lançados nas trevas exteriores: ali haverá pranto e ranger de dentes. Então disse Jesus aos que foram enviados: Vai e como creste te seja feito.

E naquela mesma hora o seu criado sarou. E, voltando para casa, acharam são o servo enfermo.

O filho da viúva de Naim (Lc 7: 11-17) E aconteceu pouco depois ir ele à cidade chamada Naim, e com ele iam muitos dos seus discípulos, e uma grande multidão; e quando chegou perto da porta da cidade, eis que levavam um defunto, filho único de sua mãe, que era viúva; e com ele ia uma grande multidão da cidade. E, vendo-a, o Senhor moveu-se de íntima compaixão por ela, e disse-lhe: Não chores. E, chegando-se, tocou o esquife (e os que o levavam pararam), e disse: Mancebo, a ti te digo: Levanta-te. E o defunto assentou-se, e começou a falar. E entregou-o a sua mãe. E de todos se apoderou o temor, e glorificavam a Deus, dizendo: Um grande profeta se levantou entre nós, e Deus visitou o seu povo. E correu dele esta fama por toda a Judeia e por toda a ter-

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ra circunvizinha. A blasfêmia dos fariseus [e escribas] Nota 11 - pg. 97 (Mt 12:22-32; Mc 3:20-30) E foram para uma casa. E afluiu outra vez a multidão, de tal maneira que nem sequer podiam comer pão. E, quando os seus ouviram isto, saíram para o prender, porque diziam: Está fora de si. Trouxeram-lhe então um endemoninhado cego e mudo; e, de tal modo o curou, que o cego e mudo falava e via.

E toda a multidão se admirava e dizia: Não é este o Filho de Davi? Mas os fariseus, e os escribas que tinham descido de Jerusalém, ouvindo isto, diziam: Tem Belzebu, e pelo príncipe dos demônios expulsa os demônios. Jesus, porém, conhecendo os seus pensamentos, chamando-os a si, disse-lhes por parábolas: Como pode Satanás expulsar Satanás? Todo reino dividido contra si mesmo é devastado; e toda cidade, ou casa, dividida contra si mesma não subsistirá. E, se Satanás expulsa a Satanás, está dividido contra si mesmo: como subsistirá pois o seu reino? Antes tem fim. E, se eu expulso os demônios por Belzebu, por quem os expulsam então os vossos filhos? Portanto eles mesmos serão os vossos juízes. Mas, se eu expulso os demônios pelo Espírito de Deus, é conseguintemente chegado a vós o reino de Deus. Ou, como pode alguém entrar em

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casa do homem valente, e furtar os seus bens, se primeiro não manietar o valente, saqueando então a sua casa? Quem não é comigo é contra mim; e quem comigo não ajunta espalha. Portanto, na verdade vos digo que todos os pecados serão perdoados aos filhos dos homens, e toda a sorte de blasfêmias, com que blasfemarem; qualquer, porém, que blasfemar contra o Espírito Santo, nunca obterá perdão, mas será réu do eterno juízo. E, se qualquer disser alguma palavra contra o Filho do homem, ser-lhe-á perdoado, mas, se alguém falar contra o Espírito Santo, não lhe será perdoado, nem neste século nem no futuro. (Porque diziam: Tem espírito imundo).

Árvores e seus frutos (Mt 12:33-37) Ou fazei a árvore boa, e o seu fruto bom, ou fazei a árvore má, e o seu fruto mau: porque pelo fruto se conhece a árvore. Raça de víboras, como podeis vós dizer boas coisas, sendo maus? Pois do que há em abundância no coração, disso fala a boca. O homem bom tira boas coisas do seu bom tesouro, e o homem mau do mau tesouro tira coisas más. Mas eu vos digo que de toda a palavra ociosa que os homens disserem hão de dar conta no dia do juízo. Porque por tuas palavras serás justificado e por tuas palavras serás condenado.

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O milagre de Jonas (Mt 12:38-45) Então alguns dos escribas e dos fariseus tomaram a palavra, dizendo: Mestre, quiséramos ver da tua parte algum sinal. Mas ele lhes respondeu, e disse: Uma geração má e adúltera pede um sinal, porém não se lhe dará outro sinal senão o do profeta Jonas; pois, como Jonas esteve três dias e três noites no ventre da baleia, assim estará o Filho do homem três dias e três noites no seio da terra. Os ninivitas ressurgirão no juízo com esta geração, e a condenarão, porque se arrependeram com a pregação de Jonas. E eis que está aqui quem é mais do que Jonas. A rainha do meio-dia se levantará no dia do juízo com esta geração, e a condenará; porque veio dos confins da terra para ouvir a sabedoria de Salomão. E eis que está aqui quem é mais do que Salomão. E, quando o espírito imundo tem saído do homem, anda por lugares áridos, buscando repouso, e não o encontra. Então diz: Voltarei para a minha casa donde saí. E, voltando, acha-a desocupada, varrida e adornada. Então vai, e leva consigo outros sete espíritos piores do que ele, e, entrando, habitam ali: e são os últimos atos desse homem piores do que os primeiros. Assim acontecerá também a esta geração má.

A família de Jesus (Mt 12:46-50; Mc 3:31-35; Lc 8:19-21) E, falando ele ainda à multidão, foram ter com ele sua mãe e seus irmãos, e não podiam aproximar-se dele, por causa da

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multidão assentada ao redor dele; e, estando de fora, mandaramno chamar. E disse-lhe alguém: Eis que estão ali fora tua mãe e teus irmãos, que querem ver-te e falar-te. E ele lhes respondeu, dizendo: Quem é minha mãe? E quem são meus irmãos? E estendendo a sua mão para os seus discípulos que estavam assentados junto dele, disse: Eis aqui minha mãe e meus irmãos; porque qualquer que fizer a vontade de meu Pai que está nos céus, este é meu irmão, e irmã e mãe. Minha mãe e meus irmãos são aqueles que ouvem a palavra de Deus e a executam.

Fim do 1º Ciclo

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Nota 01

- pg. 24

[José recebe a Maria] Achei conveniente mudar o título “O nascimento de Jesus Cristo” para o presente, pelo simples fato de que este texto não se refere, propriamente, ao nascimento de Jesus. O texto referente ao seu nascimento será visto mais à frente, em Lc 2.1-7, com o título apropriado: “O nascimento de Jesus”. Quanto ao momento da nomeação do menino por Maria, apontado no final de Mt 1.25, “...e pôs-lhe por nome Jesus...”, esta citação foi retirada de seu lugar e agregada ao texto “A circuncisão e apresentação de Jesus” em Lc 2.21, pois está subentendido no trecho: “...foi-lhe dado o nome de Jesus...”. Isto porque a nomeação oficial da criança se dava no oitavo dia de sua existência, exatamente no dia da sua circuncisão, e que pode ser visto também, no caso de João Batista, em Lc 1.57-66.

Nota 02

- pg.31

Os magos do Oriente

Nesta nota em específico, observamos nitidamente aquele preconceito que abordamos na introdução. Não há como não visualizarmos o menino Jesus, numa manjedoura, cercado dos pastores, e dos três reis magos. E em parte assim o foi. Conforme relato em Lc 2.8-20 (“Os pastores de Belém”), o sinal dado pelo anjo aos pastores é que estes encontrariam “o menino envolto em panos, e deitado numa manjedoura ... pois ...

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vos nasceu hoje o Salvador, que é Cristo, o Senhor”. Realmente os pastores o visitaram no dia de seu nascimento. Mas o momento da visita dos magos ao menino Jesus se deu mais tarde, segundo os indícios propostos por Mt 2.1-12. Primeiro, porque é dito que “tendo nascido Jesus em Belém ... uns magos vieram do oriente a Jerusalém” (v.1). Quando os magos partiram do Oriente, Jesus já havia nascido. E certamente esta viagem levou algum tempo. Também Herodes, intrigado pelas palavras dos magos, “inquiriu exatamente deles acerca do tempo em que a estrela lhes aparecera” (v.7). Esta preocupação de Herodes, pelo tempo exato do aparecimento da estrela, permitiria a ele que estipulasse o massacre das crianças “de dois anos para baixo, segundo o tempo que diligentemente inquirira dos magos” (Mt 2.16). Isto nos permite concluir que Jesus já não era mais um bebê de colo, ou então Herodes mandaria que matassem somente as crianças recém-nascidas. Além do mais, está dito sobre os pais de Jesus em Lc 2.39 que, “quando acabaram de cumprir tudo segundo a lei do Senhor, voltaram a Galileia, para a sua cidade de Nazaré”. Este cumprimento da lei consistia nos oito dias seguintes ao nascimento do menino para sua circuncisão, conforme relatado em Lc 2.21, e mais os trinta e três dias para a purificação de Maria, relatado em Lc 2.22; ambos mandamentos prescritos em Lv 12.1-7. Se José e Maria fugiram para o Egito antes que Herodes matasse as crianças, conforme Mt 2.13,14, todo este período da purificação já deveria ter passado. O que provavelmente aconteceu, depois da purificação de Maria e seu retorno para Nazaré, como vimos acima, é que eles tiveram de retornar “todos os anos ... a Jerusalém, à festa da páscoa” (Lc 2.41), e numa dessas ocasiões, dentro daquele período de dois anos, é que aconteceu toda a história com os magos e a ma-

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tança de Herodes. Vale ainda ressaltar como diferencial que, no caso dos pastores, Jesus foi encontrado numa manjedoura, e os magos o encontraram numa casa (Mt 2.11). Para aqueles que conhecem um pouco mais a estrutura da Bíblia, reconhecerão que este espaço de tempo entre as visitas é um tipo perfeito, ou símbolo, dos adventos de Cristo. Primeiro ele é visitado pelos pastores numa manjedoura, representando os verdadeiros pastores de Israel, os que deveriam buscar seu Messias-Cordeiro. Mas estes “se embruteceram, e não buscaram ao Senhor” (Jr 10.21). Na segunda visita, pelos magos do Oriente, vemos a imagem do Rei adorado pelos gentios, que se cumprirá em seu reinado futuro sobre Israel e o mundo, anunciado pelo profeta Isaias em seu capítulo 60.10-14. Há muitas outras passagens referentes a este assunto, mas que não são o foco deste livro.

Nota 03

- pg. 37

Genealogia de Jesus Temos duas genealogias: uma no livro de Mateus e outra em Lucas. Mateus começa sua genealogia com Abraão, seguindo por Davi. Lucas, do fim para o começo, começa em Adão, passando por Abraão e Davi. E a partir de Davi as duas listas se divergem. Mateus continua sua lista a partir de Salomão, filho de Davi (Mt 1.6). Lucas, em vez de Salomão, segue pela trilha de outro filho de Davi: Natã (Lc 3.31). Mas ambos terminam a cor-

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rente em José, pai de Jesus. No entanto, Mateus mostra que Jacó gerou a José, e Lucas mostra que José é filho de Heli. Como resolver esta questão? De quem ele afinal é filho? Mateus é enfático ao afirmar que “Jacó gerou a José, marido de Maria, da qual nasceu Jesus” (Mt 1.16). Portanto, por esta declaração incontestável, Jacó é o pai de José; e Mateus, portanto, mostra a genealogia dos pais de José até o rei Davi. Lucas, no entanto, relata que “Jesus começava a ser de quase trinta anos, sendo (como se cuidava) filho de José, e José de Heli” (Lc 3.23). A expressão “como se cuidava” refere-se a uma paternidade não conclusiva, já que Maria concebeu em virgindade. Portanto, parece lógico supor que esta descendência de Heli até Natã seja por parte de Maria, por quem realmente foi concebido Jesus. Aqui não se afirma categoricamente que Heli tenha gerado José, mas simplesmente que José foi considerado filho de Heli, por ser este o pai de Maria.

Nota 04

- pg. 39

O testemunho de João Batista Os testemunhos de João Batista encontrados no Evangelho de João não são os mesmos dos outros três, embora contenham semelhanças. Há uma diferença singular entre eles. Nos três primeiros Evangelhos, João Batista pregava de alguém que viria após ele, sem conhecê-lo ainda. No livro de João, ele já o reconhece como Senhor, e já usa termos como: “... no meio de vós está um...”, “Este é aquele do qual eu disse...”, “Eis o cordeiro de Deus...”, “... eu não o co-

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nhecia...”. O livro de João, portanto, começa a história de Jesus a partir do momento que João Batista já o reconhecia como o alvo de seu testemunho, e por esse motivo omite o momento de seu batismo e a descida do Espírito Santo como uma pomba. Outro detalhe interessante é que, nos outros Evangelhos, João Batista se encontrava no deserto da Judeia, ou seja, do lado do Jordão que olha para Jerusalém. Em João, Batista está pregando em “Betânia, da outra banda do Jordão”, que olha para os gentios. Este tipo está de acordo com as palavras do apóstolo Paulo: “Porque não me envergonho do evangelho de Cristo, pois é o poder de Deus para salvação de todo aquele que crê: primeiro do judeu, e também do grego” (Rm 1.16).

Nota 05

- pg. 43

Jesus purifica o templo Esta primeira expulsão de Cristo não deve ser confundida com a expulsão que Jesus promoveu já perto de sua morte. Mateus, Marcos e Lucas colocam este evento, igualmente, logo em seguida à sua entrada “triunfal” em Jerusalém, poucos dias antes de sua morte. João, como havíamos dito na introdução, demarca a trajetória de Cristo anunciando três páscoas consecutivas (Jo 2.13; 6.4; 11.55). E é relacionado ao primeiro anúncio da páscoa que João relata esta expulsão. Além do mais, o contexto imediato em João impossibilita que seja o mesmo evento dos outros Evangelhos. Em Jo 4.45 somos informados que, “...chegando pois à Galileia, os galileus o

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receberam, vistas todas as coisas que fizera em Jerusalém no dia da festa; porque também eles tinham ido à festa”. Se Jesus volta para a Galileia, como está relatado aqui, como poderia se tratar da mesma narrativa dos outros Evangelistas que vinculam este evento com sua crucificação iminente? Portanto, Jesus promove, segundo os relatos, duas expulsões: uma, na sua primeira participação da Páscoa, logo após seu batismo por João Batista; outra, em sua despedida do mundo, pouco antes de sua agonia na terceira Páscoa. Há um significado espiritual profundo para estas duas expulsões, mas não é o objetivo deste livro.

Nota 06

- pg. 55

Jesus em Galileia A sequência exata das peregrinações, dos discursos e milagres realizados pelo Mestre é praticamente impossível de se ordenar com precisão. À parte informações contundentes como “... seis dias antes...”, “... no dia seguinte...”, há relatos que não dão qualquer indício de tempo, cuja dificuldade é exacerbada pelas diferenças de registro da ordem dos acontecimentos relatados pelos Evangelistas. Há, no entanto, algumas pistas que nos permitem reconstruir estes passos com maior probabilidade de acertos. No caso do início do ministério de Jesus, sabemos que ele morava em Nazaré, conforme vimos em Lc 2.39. Após seu batismo no rio Jordão por João Batista, que é o marco inicial de seu ministério, ele foi ao deserto para ser tentado por quarenta dias.

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E é após este período que começam as dificuldades quanto à marcação do tempo. Os três primeiros Evangelhos colocam depois disto que “Jesus porém, ouvindo que João estava preso, voltou para a Galileia.” (Mt 4.12). Tem-se a impressão de que durante a sua tentação no deserto é que João foi preso, e em seguida retorna para a Galileia, onde ficava Nazaré, sua cidade. Mas neste espaço de tempo, entre sua tentação no deserto e seu retorno para a Galileia, há eventos narrados em João que só podem ser inseridos aqui. Já vimos, na quarta nota, que o testemunho de João Batista no livro de João é posterior ao momento do batismo de Jesus, descrito pelos outros Evangelhos. Isto é corroborado pelo fato de que Batista já conhecia Jesus, e como ainda ele não havia sido preso, e continuava batizando, também significa que ainda Jesus não havia retornado para a Galileia, como parecia propor Mt 4.12. Após este testemunho de João Batista, no livro de João, há uma sequência que não pode ser desprezada. Este mesmo testemunho compreende apenas dois dias, conforme insinua a expressão “no dia seguinte” em Jo1.29. “No dia seguinte” (Jo 1.35), há o primeiro encontro de Jesus com seus futuros discípulos. “No dia seguinte” (Jo 1.43), Jesus encontra mais dois discípulos de caminho para a Galileia. “Ao terceiro dia” (Jo 2.1), Jesus já está na Galileia, e realiza seu primeiro milagre em “Caná da Galileia” (Jo 2.11). Mas essa sua ida a Galileia não é a que se refere Mt 4.12, pois ainda João está solto como veremos. Após este primeiro milagre em Caná, Jesus vai participar de sua primeira Páscoa, depois de devidamente batizado e empossado de seu cargo Ministerial. É óbvio que como bom judeu ele nunca perdera sequer uma Páscoa. Há então a expulsão dos

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cambistas no templo em Jerusalém, na Judeia, e o famoso encontro de Nicodemos com Jesus à noite. “Depois disto” (Jo3.22), vemos novamente João batizando. Jo 4.1 retorna dizendo que João ainda batizava, e nos versículos 3 e 4 vemos Jesus indo outra vez para a Galileia. No caminho, passando por Samaria, encontra uma mulher samaritana (cap. 04). “Dois dias depois” (Jo 4.43), ele vai retomar sua viagem para a Galileia, e chega outra vez em Caná, onde realiza seu “segundo milagre” (Jo 4.54). Toda esta narrativa do livro de João, portanto, está dentro daquele espaço de tempo entre a tentação de Jesus e a informação de sua ida para a Galileia, relatada em Mt 4.12, e que foi omitida pelos outros Evangelistas. Há no entanto em Jo 2.12 uma declaração que funciona como um parêntesis. É quando Jesus, sua mãe e seus irmãos vão morar em Capernaum. Este versículo em João, portanto, não pode fazer parte da sequência mostrada por João, pois enquanto João Batista estivesse solto, Jesus não poderia partir para a Galileia, como mencionado em Mt 4.12. Somente no capítulo 5 de João é que podemos perceber que João Batista está fora de cena. Pois, no versículo 35, Jesus diz que “ele era a candeia que ardia e alumiava...”.

Se for entendido que aqui ele ainda estava preso, e não morto, provavelmente depois desta festa em Jerusalém (Jo 5.1) é que Jesus retorna para a Galileia, conforme as passagens citadas no título em questão. Não parece que Jesus estivesse se referindo à morte de Batista, pois este fato será descrito um pouco antes da primeira multiplicação dos pães, que será realizada na Galileia. Além do

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mais, João Batista ainda vai questionar Jesus, de dentro do cárcere, ao ouvir “dos feitos de Cristo” (Mt 11.2). Portanto, depois da tentação de Jesus, insere-se toda a narrativa de João, de 1.15 a 5.47. Tomando então o livro de Mateus como base, toda esta narrativa de João está escondida entre os versículos 11 e 12 do capítulo 4.

Nota 07

- pg. 60

A pesca maravilhosa Há três relatos diferentes do encontro de Jesus com Pedro e André, que eram irmãos. Deve-se novamente ter em vista as pequenas pistas que elucidam as aparentes semelhanças ou contradições. O primeiro encontro pode ser visto em Jo 1.35-42. Jesus não os chamou. João Batista havia revelado a “dois dos seus discípulos” que Jesus era o “Cordeiro de Deus”, o que certamente lhes chamou a atenção. Seguiram-no, e “ficaram com ele aquele dia”. Um deles “era André”. E este conduz seu irmão Pedro a Jesus, que simplesmente lhe diz: “Tu és Simão, filho de Jonas; tu serás chamado Cefas”. Além do texto não mencionar que Jesus os chamou, também não menciona que estes o seguiram. Aqui simplesmente se conheceram. O segundo encontro está em Mt 4.18-22 (também Mc 1.16-20). Neste ponto realmente pode-se ver Jesus convocando Pedro e André, e também Tiago e João. Mas devemos observar a reação deles a este chamado. De Pedro e João se diz que “deixando logo as redes, seguiram-no”. De Tiago e João se diz

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que “deixando imediatamente o barco e seu pai, seguiram-no”. Vamos comparar com o terceiro encontro, relatado em Lc 5.1-11. A resposta dos discípulos agora é mais contundente e abrangente. Diante do milagre proposto por Cristo ao colherem “grande quantidade de peixes”, depois de terem trabalhado “toda a noite” e “nada” apanharem, o texto diz de Pedro que “o espanto se apoderara dele, e de todos os que com ele estavam”. E o resultado desta chamada eficaz é que “deixaram tudo, e o seguiram”. Na primeira chamada, no texto anterior, não há esta entrega total de propósito. Os discípulos simplesmente deixaram momentaneamente seus afazeres, para ouvirem e conhecerem um pouco mais do promissor Mestre. Na primeira oportunidade que tiveram retornaram ao seu cotidiano, pois lhes era melhor o certo do ventre, que o incerto do espírito. Por isso essa renovação do chamado. E aí sim, puderam deixar tudo; não só as redes, mas também toda uma vida. Além desta importante diferença, nota-se outra, sutil, no momento da chamada. Lá, eles “lançavam as redes ao mar”; aqui, “estavam lavando as redes”. Que também é uma alegoria do exposto acima. Enquanto estavam plenos do lançar das redes, não poderiam abandoná-las. Somente após lavá-las, é que poderiam começar outro trabalho. Enquanto o homem está em plena ação, os seus ouvidos estão surdos para qualquer voz que não seja a sua própria. E também a recompensa do Senhor é diferente. Lá, ele afirma: “... e eu vos farei pescadores de homens”; aqui, ele encerra: “... de agora em diante serás pescador de homens”.

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Nota 08

- pg. 76

Eleição dos doze O momento da eleição dos seus doze apóstolos, dentre todos os seus discípulos, não é o mesmo do envio destes doze a pregarem por Israel.

Embora Marcos registre que esta escolha fosse “para que estivessem com ele e os mandasse a pregar”, o próprio texto esclarece a questão em sua própria ordem: deveriam primeiramente estar com ele, para então enviá-los. Esta ordem se encontra um pouco mais à frente. Mateus não registra a eleição dos doze, mas insere o nome deles dentro do texto que trata do seu envio. Por isso é que destaquei Mt 10.2-4 de seu contexto geral, e o introduzi no momento da eleição.

Nota 09

- pg. 76

[Sermão da planície] O sermão da montanha registrado em Mt 5, 6 e 7 não é o mesmo sermão de Lc 6, embora os títulos empregados nos conduzam a esta ilusão. O contexto dos sermões os distingue quanto ao momento e quanto ao local. Em Mt 5.1 é dito que “Jesus, vendo a multidão, subiu a um monte” para ensinar “os seus discípulos” que se

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“aproximaram dele”. No final do sermão, vemos em Mt 8.11 que ele desce do monte. O sermão de Lucas dá-se de outra forma. Jesus havia subido ao monte para a escolha dos seus futuros apóstolos, “e, descendo com eles, par ou num lugar plano, e também um gr ande número de seus discípulos” (Lc 6.17).

O provável motivo destes dois sermões encontra-se no seguinte pressuposto. O sermão da montanha em Mateus referese às bem-aventuranças aos discípulos que seguiam a Jesus no início de seu ministério. Em Lucas, com a nomeação anterior dos apóstolos, o sermão é reprisado, tendo em vista agora o novo e seleto grupo de discípulos. Mas certamente há um sentido espiritual mais profundo no fato de duas pregações semelhantes, uma em direção ao céu, e outra em direção à terra. Sugiro o seguinte: no sermão da montanha, a regra é elevada demais para que possa ser cumprida na força da carne mortal. É Deus exigindo. No segundo sermão, Jesus ‘desce’, é o Verbo fazendo-se carne, com a força revigorante de seu trabalho na cruz. É Jesus propiciando.

Nota 10

- pg. 79

O centurião de Capernaum Mateus narra esta história na primeira pessoa, como se o centurião realmente estivesse diante de Jesus. Mas quando lemos Lucas, podemos perceber que o centurião jamais esteve na sua presença. Aqui há o verdadeiro tipo do porta-voz que fala em nome

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de alguém, chamado na Bíblia de profeta. A voz do profeta tem o mesmo poder e autoridade daquela por quem foi enviado. “Havendo Deus antigamente falado muitas vezes, e de muitas maneiras aos pais pelos profetas, a nós falou-nos nestes últimos dias pelo Filho...” (Hb 1.1). Por essa razão é que Jesus podia dizer: “Quem crê em mim, crê não em mim, mas naquele que me enviou... E, se alguém ouvir as minhas palavras, e não crer, eu não o julgo... Quem me rejeitar a mim, e não receber as minhas palavras, já tem quem o julgue; a palavra que tenho pregado, essa o há de julgar no último dia. Porque eu não tenho falado de mim mesmo; mas o Pai, que me enviou, ele me deu mandamento sobre o que hei de dizer e sobre o que hei de falar. E sei que o seu mandamento é a vida eterna. Portanto, o que eu falo, falo-o como o Pai mo tem dito” (Jo 12.44-50). Figuradamente, representa os gentios “separados da comunidade de Israel... não tendo esperança, e sem Deus no mundo” (Ef 2.12).

Nota 11

- pg. 81

A blasfêmia dos fariseus [e escribas] Este importantíssimo relato encontra-se nos três primeiros Evangelhos. Mateus e Marcos são absolutamente coerentes entre si, tanto textualmente quanto temporalmente, embora Marcos seja bem sucinto. Apesar de serem descritos no início dos textos, portanto não muito avançado no ministério de Jesus, não têm um ponto de partida definido. No entanto, ambos são anteriores a

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qualquer tipo de parábola. A primeira parábola que se segue a esta blasfêmia dos fariseus é a do semeador, tanto em Mateus como em Marcos. Seguem-se outras, todas dependentes desta primeira, como disse o próprio Mestre: “Não percebeis esta parábola? Como pois entendereis todas as parábolas?” (Mc 4.13). O motivo por que Jesus começou a falar-lhes por parábolas, tanto aos fariseus e sacerdotes, quanto ao povo comum, está descrito em Mt 13.11-16. Nesta primeira blasfêmia dos fariseus vemos uma atribuição, por parte dos fariseus e escribas, do poder do Espírito Santo, em Jesus, lançado sobre Belzebu. Ou seja, o Filho de Davi (Mt 12.23) reconhecido por alguns, e que portanto teria direito ao trono de Israel, era, na visão destes fariseus, um impostor com poderes satânicos. Por este motivo Jesus começou a falar-lhes por parábolas, para que aqueles que cressem nele pelos seus milagres, fossem recompensados durante o entendimento destas parábolas, e, simultaneamente, excluísse automaticamente os que não cressem. “Àquele que tem, se dará, e terá em abundância; mas aquele que não tem, até aquilo que tem lhe será tirado... Ouvindo, ouvireis, mas não compreendereis, e, vendo, vereis, mas não percebereis. Porque o coração deste povo está endurecido...” Mas em Lucas há uma inversão aparente dos fatos. A parábola do semeador (Lc 8) encontra-se antes desta blasfêmia (Lc 11). Até aqui eu havia raciocinado que Lucas tivesse simplesmente invertido as narrativas, e prossegui na reunião dos três textos. Mas a sequência dos fatos após a enunciação das ditas parábolas era conflitante.

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Mateus diz “que Jesus, concluindo estas parábolas, se retirou dali. E, chegando à sua pátria...” (Mt 13.53-54). Mas não há neste relato obrigação de continuidade; portanto, outro evento pode se interpor entre estes dois versículos. Marcos, no entanto, não deixa dúvidas quanto à sequência. Pois no final das parábolas, é-nos dito que “naquele dia, sendo já tarde, disse-lhes. Passemos para a outra banda” (Mc 4.35). Isto significa que, tendo Jesus terminado seu discurso já tarde, naquele mesmo dia partiu para a outra banda do mar com os seus discípulos, “deixando a multidão” (Mc 4.36). Jesus começou a falar-lhes por parábolas no mesmo dia da blasfêmia dos fariseus. Acompanhe agora a sequência em Mateus. Em Mt l2.22 vemos que alguém levou um endemoninhado cego e mudo para que Jesus o curasse. Ele estava em sua casa em Capernaum, pois no fim de sua repreensão aos fariseus, dando como sinal o milagre de Jonas (Mt 12.38-45), aparecem “fora sua mãe e seus irmãos” enquanto ele falava (Mt 12.46). O capítulo 13 inicia-se assim: “Tendo Jesus saído de casa naquele dia, estava assentado junto ao mar...” Portanto, “naquele dia” em que os fariseus blasfemaram do Espírito Santo, Jesus saiu de sua casa em Capernaum, e foi ao mar. Como “ajuntou-se muita gente ao pé dele”, entrou num barco para ensiná-los por parábolas. É por isso que Marcos encerra esta sequência dizendo que Jesus passou para a outra banda do mar sendo já tarde. Tendo em mente esta sequência, que é precisa quanto à marcação do tempo, sem condições de se interpor nada, Lucas promove outra situação. Após a blasfêmia dos fariseus e a repreensão de Jesus (Lc 11.14-36), “estando ele ainda falando, rogou-lhe um fariseu que fosse jantar com ele...” (Lc 11.37).

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Não há aquela sequência de parábolas de Mateus e Marcos porque elas foram enunciadas bem antes, em Lc 8.4-18. Mas como é que Jesus poderia ter jantado à noite na casa do fariseu, se os outros dois Evangelhos alegam que Jesus passou para a outra banda do mar “sendo já tarde”? Não é uma solução simplista de minha parte concluir que não se trata do mesmo evento, mesmo diante de tal semelhança entre os textos. As evidências em contrário devem suplantar aquilo que inadvertidamente imaginamos, ou mesmo o que estamos acostumados a ouvir. O texto mostra fatos que não se combinam entre si. E na busca desta solução encontrei uma resposta convincente, e até mesmo necessária. Em Mateus e Marcos, esta primeira blasfêmia dos fariseus é introdutória da razão pela qual Jesus começaria a falar por parábolas. Em Lucas não há esta preocupação. Porque este texto está inserido já no fim do seu ministério, quando ele caminha definitivamente para Jerusalém. E isto podemos ver em Lc 9.51, que diz: “E aconteceu que, completando-se os dias para a sua assunção, manifestou o firme propósito de ir a Jerusalém”.

Há a partir daqui toda uma sequência de relatos que confirmam esta verdade. “... o seu aspecto era como de quem ia a Jerusalém” (Lc 9.53). “E aconteceu que, indo eles pelo caminho...” (Lc 9.57).

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“E aconteceu que, indo eles de caminho...” (Lc 10.38). “E percorria as cidades e as aldeias, ensinando, e caminhando para Jerusalém” (Lc13.22). “Ora ia com ele uma grande multidão...” (Lc 14.25). “E aconteceu que, indo ele a Jerusalém, passou pelo meio de Samaria e da Galileia...” (Lc 17.11). “E, tomando consigo os doze, disse-lhes: Eis que subimos a Jerusalém...” (Lc 18.31). “E, dito isto, ia caminhando adiante, subindo para Jerusalém” (Lc 19.28). A blasfêmia dos fariseus encontra-se neste meio. Aliás, o texto de Lucas não fala que tipo de gente blasfemou do Espírito. Simplesmente diz que “alguns deles diziam” (Lc 11.14). No entanto, parece óbvio se tratar do mesmo tipo de gente, já que os textos seguem a mesma construção. Também o doente não era o mesmo. Lá, era um cego e mudo; aqui, é simplesmente um mudo. Não podemos imaginar Lucas, um médico, negligenciando tal informação. Mas a grande questão que o leitor deve estar se perguntando é o porquê de duas narrativas tão idênticas. O leitor deve considerar que Jesus, apesar de ser uma única e indivisível Pessoa, possui duas características jamais encontradas pelo Universo. Ao mesmo tempo em que é “homem de dores”, é “Deus bendito eternamente” (Is 53.3; Rm 9.5). Na primeira blasfêmia dos fariseus, eles negaram sua hu-

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manidade perfeita e plena do “Espírito de Deus” (Mt 12.28). Em sua segunda blasfêmia negaram a sua Divindade, já que Jesus havia “expulso os demônios pelo dedo de Deus” (Lc11.20). A expressão “dedo de Deus” não se refere ao Espírito de Deus, ainda que somente o homem Jesus poderia ser pleno do Espírito de Deus. Ele, como Deus, é um com o Pai e com o Espírito Santo. O dedo de Deus, portanto, significa sua unidade com o Pai; o mesmo poder do Pai. A expressão “o dedo de Deus” pode ser vista em Êx 8.19, e com mais propriedade em Êx 31.18. Se o leitor quiser inteirar-se um pouco mais sobre essa união essencial entre o Pai e o Filho, pode ler outro título deste mesmo autor: “Eu e o Pai somos um – A primeira unidade indissolúvel”. Outro pequeno detalhe difícil de enxergar, e que acompanha o proposto acima, trata-se do sinal exigido pelos hereges. Em Mateus, relacionado à humanidade perfeita de Jesus, “algum sinal” é suficiente. Em Lucas, tratando-se de sua Divindade, somente “um sinal do céu” poderia convencê-los do contrário. É por isso então que Lucas narra as parábolas, citadas acima, bem anteriormente à blasfêmia dos fariseus, em seu capítulo oitavo, juntamente com o contexto imediato da família de Jesus e do endemoninhado gadareno, do outro lado do mar, como sugere os outros dois apóstolos. O texto de Lucas, portanto, apesar de todas as suas familiaridades com os outros dois textos, insere-se no contexto de que Jesus caminhava definitivamente sua última peregrinação, e não tem nada a ver com o evento narrado por Mateus e Marcos. Por esta necessidade, a blasfêmia dos fariseus em Lucas será isolada

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mais adiante do texto. “Do homem são as preparações do coração, mas do Senhor a resposta da boca” (Pv 16.1).



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