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A tecnologia a serviço do desenvolvimento humano
from OSSOS DO OFÍCIO
by COEP Brasil
A tecnologia a serviço do desenvolvimento humano
1 Uma das formas de ação da Secretaria de Desenvolvimento Rural - SDR, do Ministério da Agricultura e do Abastecimento, é a identificação de iniciativas inovadoras para o desenvolvimento social e econômico - de baixo custo e retomo certo. O objetivo, assim procedendo, é descrever os Métodos e processos desenvolvidos e adotados por tais empreendimentos, possibilitando a sua disseminação e apoiando sua adoção em outras regiões do País, além daquela onde têm origem. Para levar a efeito aquela linha de ação, dirigen es e técnicos da SDR/MA estão sempre atentos a projetos que reúnam as citadas, características. Esta é a razão concreta que nos levou a voltarmos especial atenção para a Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares, na UÉRJ.
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Este caso, em especial, ajusta-se também a outra premissa de trabalho da
Secretaria: a de que o cooperativismo e o associativismo são fortes instrumentos para o desenvolvimento social. São formas de baixo custo e alto impacto, passíveis de adoção em comunidades carentes e para a organização popular, estratégicas pelos elevados impactos positivos que proporcionam e como tal devem ser incentivadas. Em relação a projetos de desenvolvimento social inovadores, a primeira análise que a SDR/MA faz é voltada para verificar até que ponto tais iniciativas podem produzir uma tecnologia multiplicável - adaptável a outras circunstâncias sócio-econômicas. Na experiência da Incubadora em particular verificamos haver a produção de tecnologia reproduzível, passível inclusive de ampliação e , ajustamento para outras regiões e, principalmente, para mercados locais. Esta última referência ganha importância quando temos em mente a metodologia de ação local integrada para o desenvolvimento. O mais relevante dos resultados obtidos em todo o processo de funcionamento da Incubadora da COPPFJUFRJ é, sem sombra de dúvida, a tecnologia gerada.
No âmbito da cidade do Rio de Janeiro, o fato de incubar algumas cooperativas proporcionando a abertura de centenas de vagas de trabalho é o grande resultado do Projeto. Contudo, considerado o âmbito nacional, destaca-se a metodologia e o conhecimento acumulados, acervo capaz de subsidiar um salto de qualidade em projetos que, noutras localidades, busquem fomentar atividades econômicas e gerar renda, através de organizações de economia social. No universo do
Território Nacional é muito mais significativo o acervo metodológico produaido pela
Incubadora do que o é, estatisticamente, o número de cooperativas ah incubadas e postos de ocupação produtiva cuja abertura se proporcionou. O trabalho conduzido pelo Grupo que criou, movimenta e mantém a
Incubadora - feito com extrema seriedade - tem sua orientação voltada exdusivamente para a realidade urbana. Tal condição não é, contudo, imitante para que seus métodos e processos sejam adaptados e aplicados para o mundo rural. Esta é mais uma razão pela qual o exemplo da COPPE vem servindo de inspiração e despertando a atenção de Universidades e organizações de
desenvolvimento em outras regiões do Pais. Aobservação que fizemos resta comprovada quando se considera o fato de que um conjunto de associadas do Comitê de Entidades Públicas no Combate à Fome e Pela Vida - Coep decidiu conceber e implementar um Programa Nacional de Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas, cuja idéia original teve berço na Incubadora da UFRJ e foi consolidado através de discussões no Fórum de Cooperativismo.
Ainda em relação à SDR/MA, é importante registrar que a mesma possui em sua estrutura o Departamento de Cooperativismo e Associativismo Rural, cujo escopo de trabalho é o cooperativismo em todas as suas formas e ramos. O estimulo e fomento à cooperação, prestados nacionalmente pelo Departamento, busca proporcionar às organizações associativas as condições para ampliar a criação de vagas de trabalho, produção de alimentos e matériasprimas (especialmente no ramo de produção rural) e renda. Para que o Departamento possa desempenhar com qualidade as suas atribuições, a identificação de métodos e processos como aqueles testados e validados pela Incubadora é fundamental. Sobretudo se os mesmos são extrapoláveis das condições econômicas em que foram originados e adaptáveis para outras, em perspectiva nacional.
Outro registro relevante é ode que a Incubadora Tecnológica tem nos apontado enorme preocupação com o desenvolvimento humano. Nota-se nas atividades por ela desenvolvidas permanente investimento em educação e formação das pessoas. Para a SDR/MA este fato é um alerta. Aliás, vale realçar que muitos dos projetos bem sucedidos em seus resultados em prol do desenvolvimento social e econômico, acerca dos quais a Secretaria toma conhecimento, concentram esforços na capacitação humana e isto ajuda a explicara contabilidade social positiva. Relatos sobre a formação e atuação das cooperativas formadas com apoio da Incubadora revelam que a preocupação com a valorização humana, por numerosas vezes, é replicada para as incubadas.
Entendemos que o fato de ter surgido em uma Universidade não é suficiente para explicara orientação humanista do trabalho da Incubadora. Devem ser considerados, em adição, para o entendimento daquela orientação, o seu escopo de trabalho - o cooperativismo - e o seu público - comunidades humanas economicamente carentes. Universidades, muitas vezes, conduzem projetos de desenvolvimento centrados no tecnicismo. Especialmente aqueles concebidos em escolas de ciências exatas. Tendo como "locus" de funcionamento os Programas de Engenharia da Universidade, configura-se ainda mais notável a orientação humana no trabalho da Incubadora.
Vicente G. F Guedes Assessor da Secretaria de Desenvolvimento Rural do Ministério da Agricultura e do Abastecimento. Representante do órgão junto ao Coep
Um exemplo nítido é o caso das mulheres. 70% dos cooperativados são mulheres, e não chega a 10% o número de mulheres na direção. Elas não confiam nelas próprias, não se apresentam como direção. E não há aí um corte machista. Nas cooperativas de costura é comum ouvirmos "não estou aqui para obedecer a outra mulher, se tivesse que obedecer, obedeceria ao meu marido e não vim aqui para ouvir mulher dizer o que tenho que fazer". Quando sugerimos, na área de faxina, que três mulheres de classe média fossem expor a visão do outro lado, para que entendessem melhor a linguagem do contratante e a relação contratante/contratado, essa reunião foi abominada. Não havia qualquer possibilidade de aceitar uma mulher falando para elas O curso de limpeza foi dado por homens. Em outros casos a auto-insegurança se reflete na desmobilização quando um "peão" assume a direção. Certa ocasião, várias pessoas chegaram a sair da cooperativa. Eles estavam investindo para que um exgerente assumisse a direção. Não ficava muito claro qual era o papel dele, uma pessoa que jogava contra o trabalho durante todo o tempo de formação da cooperativa, e que mais tarde, se descobriu, era pago por empresas que prestavam serviços terceirizados para cooptar quadros nas cooperativas para trabalhar com elas. Ele renuncia e assume um peão. A frase típica era: "não confio em peão". E é exatamente esse peão que consegue o maior contrato atualmente em vigor. Com todas essas dificuldades o fato é que as cooperativas pagam todas as contas, conseguindo até mesmo atingir um patamar acima do que se pensou possível. A grande parte é de serviços e não de produção porque qualquer atividade de produção requer investimento e o retomo vem a médio e longo prazos. A de serviço é praticamente mão-de-obra, e o retorno quase imediato. São trinta dias, no máximo sessenta. Como nosso público-alvo é desprovido não só de recursos como de acesso aos recursos, é impossível pensar em algo que necessite de instalações, máquinas ou qualquer outro tipo de investimento.
Morro do Escondidinho Bairro de Santa Tereza-RJ
Fase: Pré-diagnóstico Histórico: Inicio das atividades: 01/98 trabalho interrompido devido a problemas internos na comunidade
Num segundo momento, e afirmamos isso com a maior segurança, é possível investir em cooperativas de produção. Mas só quando o perfil delas mudar. Hoje elas são respostas ao mercado, não criam mercado. Quando tiverem capacidade de investimento ou acesso a crédito podem ousar vôos mais altos. Não há crédito e os que existem são inacessíveis. Essas mudanças exigem tempo. O que fazemos é investir para que eles tenham continuidade e certeza de que são capazes e, ainda, para que, em seguida, possam pensar em ampliar e diversificar mercados. O que existe atualmente de iniciativas que permitam acesso a crédito para esta faixa da população é quase nada. Algumas em Brasília, em Porto Alegre e no Nordeste. Em novembro de 1996 recebemos a visita da equipe do Governo de Brasília que veio conhecer nossa experiência. Através do projeto BRB Trabalho, do Banco de Brasília, queriam dar início à formação de incubadoras, inclusive com ofertas de crédito. Eles precisavam de uma assessoria técnica. A situação era curiosa. Nós tínhamos técnicos e não tínhamos crédito, eles tinham crédito e não tinham técnicos. Partiam,
Trabalhamos com o pessoal de Vigário Geral e o nosso trabalho é um cooperando com o outro. Você só precisa ter a sua responsabilidade, mas não precisa ter ninguém para ficar te coordenando. E tem o conhecimento com pessoas de outras comunidades, que viraram uma coisa mais intima, com muito mais amigos.
Alexandre cooperativado
nesta segunda fase, para a criação de uma assessoria e a elabór ção e a implementação de projetos. Mas a maioria das iniciativas continá muito direcionada a quem já trabalha, ao crédito individual.
No Rio, foi lançado recentemente o Viva Credi; que atua no âmbito muito especifico de uma favela - a Rocinha - e também 4abalha com projetos pontuais. A Secretaria Especial do Trabalho do Município do Rio de Janeiro, lançou uma linha de crédito que klcança inclusive as cooperativas populares ainda em 1998. Qualquer iniciativa nesse campo esbarra em dificuldades, sejam pequenas e micro empresas ou cooperativas populares. Estas últimas encontram ainda mais dificuldades em função de seus ender os. Em ambos os casos, no entanto, o grau de exigência não dorreSponde às realidades. Os problemas das cooperativas populares começam na legalização. São favelados, seus endereços não são reconheádos pelo sistema e não há confiabilidade por parte do mercado. De uma maneira geral, os órgãos oficiais não têm a4irçado na leitura da realidade nacional quando planejam ações vis'ando atingir as parcelas mais carentes. Os programas de crédito que visam à camadas populares, via de regra, desconhecem a realidade dessa população. As facilidades financeiras desses créditos não são suficiktes e as exigências de garantias também inviabilizam este aCesso. Na área habitacional, a carta de crédito, que significa o acesso ao crédito por parte do tomador e não da empresas foi inviabilizada em diversos casos pela condição ilegal em que se encontravam os 'móveis - loteamentos clandestinos ou irregulares e falta de habite-se. No caso de crédito à empresa, no estágio inicial, a falta de patrimOnio, entre outros, tem sido o grande entrave. Uma política exemplar neste sentido foi a da Light no final da década de 70 para enfrentar o problema da iluminação nks favelas. Até então a empresa relacionava a instalação com a titul 'zação do imóvel. As favelas cariocas, localizadas em áreas irregulares tinham
seus imóveis ligados à rede através de serviços condominiais (relógios coletivos) ou "gatos" (ligações irregulares).
No final dos anos 70 a empresa considera que energia é mercadoria e, portanto, sua relação é com o consumidor e não com o imóvel. Desconhecendo a titularização e com essa mudança de postura, a luz chega a todos os imóveis. Enquanto não houver critérios de garantia diferenciados, continua o embate. Não adianta manter o mesmo sistema, com recursos e juros baixos. Uma outra leitura é necessária. Ou mudam esses mecanismos ou continuarão inacessíveis. Para que possamos, efetivamente, implementar uma política de crédito, os critérios têm que sofrer mudanças. Os programas de geração de renda, em sua grande maioria, estão demonstrando isso.
E a porta está ai, para alegria nossa. Eu queria fazer um pedido às autoridades do Brasil para que eles facilitassem a organização das cooperativas, facilitassem o escritório. A legalização da Cooperativa é uma burocracia muito grande. Demora mais o trabalho sair por causa disso. A gente correndo atrás, para receber licença, CGC, que foi a grande demora que atrapalhou a porta de entrada.
Marcelo Siqueira da Silva coo perativado