As Multifaces do Jornalismo
Organizadores
ValĂŠria Deluca Soares Fabio Ramos Berti
As Multifaces do Jornalismo Porto Alegre 2018
Organização: Valéria Deluca Soares Fabio Ramos Berti Capa: Yuri Bratti de Lima Projeto Gráfico: Juliane Licht Lucca Realização: Multiverso Comunicação Integrada Curso de Jornalismo Centro Universitário Metodista - IPA
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) As multifaces do jornalismo / organizado por Valéria Deluca Soares, Fabio Ramos Berti. – Porto Alegre: Editora Moriá, 2018. 168 p. : il. ISBN: 978-85-99238-42-4 1. Comunicação Positiva. 2. Jornalismo de Revista. 3. Jornalismo Internacional. 4. Jornalismo em Quadrinhos 5. Telejornalismo I. Soares, Valéria Deluca (Org.). II. Berti, Fabio Ramos (Org.) CDD 070.4 CDU 070 Bibliotecária responsável: Marisa Fernanda Miguellis CRB 10/1241
Porto Alegre 2018
Sumário
Apresentação
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Capítulo 1 9
Um conceito para Comunicação Positiva Érik da Silva Pastoris Valéria Deluca Soares
Capítulo 2 Análise do Programa de TV Zero1 e a abordagem de conteúdos de games na TV
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Guilherme de Faveri Garcia
Capítulo 3 O Infotenimento no Telejornalismo: uma análise das reportagens de Phelipe Siani no Jornal Nacional
51 Luciana Dias Rabassa
Capítulo 4 A construção da imagem de Donald Trump a partir das capas da Revista Time
78 Gabriela da Silva Leite Valéria Deluca Soares
Capítulo 5 Jornalismo Internacional: um estudo sobre a cobertura de guerras e conflitos
108 Márcio Chaves Nunes
Capítulo 6 Jornalismo em quadrinhos: a presença do repórter Joe Sacco na construção da reportagem
128 Rubem Rocha Maria Lúcia Patta Melão
Capítulo 7 Guns N’ Roses e a Mídia: análise do relacionamento entre a banda e a imprensa
143 Mateus Mendes Rister Alexsandro Funck Ramires
Sobre os autores
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Apresentação
Ah, o Jornalismo... Nunca descobri – e talvez nem venha a conseguir tal façanha – quando ou por que escolhi o Jornalismo, ou se foi realmente ele quem me escolheu. Legado de família, alguns me diriam. Qualquer que tenha sido o motivo, um dos elogios mais marcantes que ouvi foi quando alguém disse que desconhecia pessoa tão apaixonada pela sua profissão quanto eu. Importante que se diga que o meu sentimento nada tem a ver com uma visão romântica ou idealista. O que realmente amo é viver o Jornalismo nas suas mais diversas possibilidades. Seja como profissional de veículo, ou atuando em áreas mais empresariais. Seja articulando pessoas ou projetos, ou, ainda, pautas e textos. Seja em palestras, debates, redações, reuniões, bares ou roda de amigos – lugares esses tão íntimos para nós, jornalistas. O fato é que exercer o ofício requer sentimento, afinal, não é fácil concordar com Gabriel García Márquez quando este carimbou-nos como “a melhor profissão do mundo”, ainda em meados dos longínquos anos 90. Erros ao longo do caminho? Muitos. Dúvida se deveria insistir na carreira? Até hoje. A famosa “vergonha alheia”? Inúmeras situações. Decepção com colegas, gestores, fontes, pautas? Com certeza. Desânimo com remuneração baixa, falta de reconhecimento, censuras, olhares tortos de amigos e familiares ao me perderem para o trabalho? Sem dúvida. Menos amor pelo que escolhi por conta de tantos obstáculos? Nunca. Mudar o mundo deixou de ser uma obstinação como aquela que se tem quando o curso superior surge no caminho. Agora, mudar pequenos mundos, pequenas realidades, pequenos anseios, ah, somente o Jornalismo é capaz de proporcionar esse pulsar no coração de quem ama o que faz – ou quer fazer. Melhor do que passar anos na faculdade estudando disciplinas que, muitas vezes, nada tem a ver com o que se quer, mas são necessárias dentro de um currículo acadêmico, é ter nesta caminhada mestres inspiradores. A sinergia entre alunos e professores faz um diferencial lá na frente que, geralmente, estes dois agentes não percebem a importância. A certeza vem depois, com a gratidão, o reconhecimento e até mesmo uma relação mais estreita.
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Ao saber da iniciativa do curso de Jornalismo do Centro Universitário Metodista IPA em reunir em um livro pesquisas acadêmicas que permeiam tantas áreas diferentes, confesso, senti um orgulho ainda maior daquela que foi minha casa durante a graduação. Afora a relação umbilical que mantenho com a instituição de ensino, perceber que alunos pesquisam algo que lhes desperte alguma curiosidade, desconforto ou uma simples dúvida, é realmente revigorante. Enquanto eles ainda tiverem essas características principiantes de quem está com os dois pés no mercado de trabalho, ufa, o caminho ainda será gostoso de ser percorrido. Vida longa ao Jornalismo nas suas infinitas opções! E, como não haveria de ser diferente, citar Gabriel García Márquez me parece ainda mais pertinente: “Porque o jornalismo é uma paixão insaciável que só se pode digerir e humanizar mediante a confrontação descarnada com a realidade. Quem não sofreu essa servidão que se alimenta dos imprevistos da vida, não pode imaginá-la. Quem não viveu a palpitação sobrenatural da notícia, o orgasmo do furo, a demolição moral do fracasso, não pode sequer conceber o que são. Ninguém que não tenha nascido para isso e esteja disposto a viver só para isso poderia persistir numa profissão tão incompreensível e voraz, cuja obra termina depois de cada notícia, como se fora para sempre, mas que não concede um instante de paz enquanto não torna a começar com mais ardor do que nunca no minuto seguinte.” Márcia Christofoli Jornalista
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Soares, V. D. e Berti, F. R. (Orgs.)
COMUNICAÇÃO POSITIVA
Capítulo 1
UM CONCEITO PARA COMUNICAÇÃO POSITIVA Érik da Silva Pastoris Valéria Deluca Soares
Durante milhares de anos, a oralidade foi o veículo de comunicação da humanidade. Processos cognitivos e emocionais da civilização desenvolveram e redefiniram as diferentes formas do homem se comunicar. A comunicação tem inúmeras funções: esclarecer, informar, envolver, emocionar, entre outras. Resulta em trocar mensagens, que por sua vez, envolve emissão e recebimento de informações. Além de um discurso responsável, a comunicação positiva implica ainda na capacidade de escuta ativa e palavras que potencializam o talento humano, e incentivam as pessoas individual ou coletivamente. O foco da linguagem está no encorajamento, na apreciação e no apoio, ao invés da crítica e desaprovação. Os meios de comunicação têm um papel fundamental na sociedade por serem um alicerce à democracia e construção da realidade. Entretanto, essa construção nem sempre é porta-voz e nem prestigia a propagação de materiais que instiguem os cidadãos a praticar o bem. Na sociedade globalizada, o acesso à comunicação pelas pessoas com deficiência, por exemplo, está garantido na Convenção da ONU que trata dos direitos da Pessoa com Deficiência1. Quando se pensa no termo acessibilidade, o que vem à mente são as obras e serviços de adequação do espaço urbano e dos edifícios. Porém, acessibilidade não significa apenas permitir que pessoas com deficiência possam se locomover pelos espaços. Pensar em acessibilidade é garantir a inclusão de todos em qualquer ambiente, atividade ou uso de recurso. Movimentos nacionais e internacionais têm buscado, nas últimas décadas, um consenso para formatar uma política de inclusão de pessoas portadoras de deficiência. 1 Disponível em: <http://www.pessoacomdeficiencia.gov.br/app/sites/default/files/ publicacoes/convencaopessoascomdeficiencia.pdf>. Acesso em: 05 mai. de 2018. AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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Érik da Silva Pastoris e Valéria Deluca Soares
Segundo dados de 2011, da Organização Mundial da Saúde (OMS)2, um bilhão de pessoas vivem com alguma deficiência, ou seja, isso significa uma em cada sete pessoas no mundo. A Organização das Nações Unidas (ONU)3, por sua vez, alerta que 80% das pessoas que vivem com alguma deficiência residem nos países em desenvolvimento. A ONU possui atualmente 193 países-membros. A Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência foi adotada em 2006 e entrou em vigor somente em 2008. O Brasil é um país signatário e, desde 2015, possui o Estatuto da Pessoa com Deficiência, destinado a assegurar e a promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania4. Os direitos dos deficientes estão garantidos na Constituição Federal de 1988, destinada a assegurar, entre outras coisas, o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos5. Segundo a Lei Nº 13.146/156, a pessoa com deficiência é aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) é o responsável pelo Censo. Realizado a cada dez anos, o Censo é um conjunto de dados estatísticos dos habitantes de uma cidade, província, estado ou nação7. De acordo com o Censo 20108, o Brasil tem 190 milhões de habitantes. Destes, 45,6 milhões de pessoas têm algum tipo de deficiência, seja auditiva, visual, mental ou motora, representando 24% da população. No Rio Grande do Sul, existem quase dois milhões de PDV (Pessoas com Deficiência Visual) e 617 mil PDA (Pessoas com Deficiência Auditiva), em graus moderados, graves ou totais. Apesar destes dados alarmantes, não se vive em uma sociedade adaptada. Segundo a Pesquisa de Informações Básicas Municipais9 (Munic) 2 Disponível em: <https://www.un.org/development/desa/disabilities/issues.html>. Acesso em: 16 set. de 2017. 3 Disponível em: <https://nacoesunidas.org/acao/pessoas-com-deficiencia/>. Acesso em: 16 set. de 2017. 4 Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13146. htm>. Acesso em: 26 mar. de 2018. 5 Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 26 mar. de 2018. 6 Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13146. htm>. Acesso em 26 mar. de 2018. 7 Disponível em: <https://censo2010.ibge.gov.br/materiais/guia-do-censo/apresentacao. html>. Acesso em: 26 mar. de 2018. 8 Disponível em:<https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/periodicos/94/cd_2010_ religiao_deficiencia.pdf>. Acesso em: 26 mar. de 2018. 9 Disponível em: <https://ww2.ibge.gov.br/home/estatistica/economia/perfilmunic/ default.shtm>. Acesso em: 26 mar. de 2018.
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Soares, V. D. e Berti, F. R. (Orgs.)
COMUNICAÇÃO POSITIVA
de 2014, a maioria das prefeituras não promove políticas de acessibilidade, tais como lazer para pessoas com deficiência (78%), turismo acessível (96,4%) e geração de trabalho e renda ou inclusão no mercado de trabalho (72,6%). A data de 21 de setembro foi escolhida como o Dia Nacional da Luta da Pessoa com Deficiência. Em 2018, completam-se 70 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Em um ano tão importante quanto este e na atual conjuntura política, social e econômica que o país vive, os direitos fundamentais assegurados por meio deste documento se tornam a cada dia mais importantes. O direito à comunicação é um deles. Afinal, é um dos pilares de uma sociedade democrática. É mais do que liberdade de expressão. É dignidade e igualdade. É o direito das pessoas ouvirem e serem ouvidas, sem barreiras, estabelecendo uma relação independente perante os veículos de comunicação. Entretanto, se de fato é um direito, é necessária uma incessante busca para garanti-lo e superar as desigualdades. Em 2006, o Ministério das Comunicações, atual MCTIC10- Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, criou uma norma que obriga as emissoras de televisão a oferecerem quatro recursos de acessibilidade aos telespectadores: legenda oculta (closed caption); dublagem (tradução dos programas em língua estrangeira); libras (linguagem de sinais) e audio descrição (narração verbal do conteúdo, para pessoas cegas ou com baixa visão). Atualmente, a Lei de Acessibilidade11 garante ao deficiente auditivo 24 horas de programação televisiva com legenda oculta (closed caption) e dublagem, traduzindo programas produzidos em língua estrangeira, substituindo a locução original por falas em língua portuguesa. Entretanto, outros recursos não são disponibilizados com a mesma periodicidade pelas emissoras. A televisão12 se diferencia de outros veículos por ser o único a aliar o imediatismo, agilidade e instantaneidade à imagem. Criada em dezembro de 2007, a TV Brasil é gerida pela Empresa Brasil de Comunicação (EBC), também responsável pela Agência Brasil13. Com o objetivo de atender os mais diversos setores da sociedade uma programação de natureza informativa, cultural, artística, científica e formadora da cidadania14, a emissora estatal veicula semanalmente o Programa Especial. 10 Disponível em: <http://pfdc.pgr.mpf.mp.br/destaques/inclusao-para-pessoas-comdeficiencia/portaria3106.2006_MinComunicacoes_acessibilidade>. Acesso em 26 mar. de 2018 11 Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L10098.htm>. Acesso em: 11 de abr. de 2018. 12 Disponível em: <http://www.jornalista.com.br/telejornalismo.html>. Acesso em: 11 de abr. de 2018. 13 Disponível em: <http://tvbrasil.ebc.com.br/sobreatv>. Acesso em: 26 de mar. de 2018. 14 Disponível em: <http://tvbrasil.ebc.com.br/sobreatv>. Acesso em 26 de mar. de 2018.
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Érik da Silva Pastoris e Valéria Deluca Soares
A atração aborda assuntos atrelados ao esporte, saúde, mercado de trabalho, entre outros. Para ser 100% acessível ao telespectador, o Programa conta com as LIBRAS (para as pessoas com deficiência auditiva que não leem português); legendas em português (para as pessoas com deficiência auditiva que não falam LIBRAS) e audiodescrição (as imagens que aparecem são descritas por um locutor para que as pessoas com deficiência visual saibam o que está sendo mostrado). Conduzido por uma apresentadora com deficiência motora e uma apresentadora portadora de síndrome de down, o programa é dedicado à inclusão das pessoas com deficiência. Mais do que um direito à comunicação, o Programa Especial garante o direito à cidadania. Assim, em um estudo exploratório, de natureza qualitativa (GIL, 2007), o objetivo deste artigo é conceituar o termo comunicação positiva e verificar os elementos considerados pela equipe de produção do Programa Especial da TV Brasil para a definição da pauta, a partir dos conceitos da Comunicação Positiva. Para isso, opta-se por três técnicas de pesquisa: a pesquisa bibliográfica, a pesquisa documental e a observação simples (GIL,2007). Para a apresentação, a análise e a interpretação dos dados coletados aponta-se o uso da Análise de Conteúdo (BARDIN, 1977), com a análise categorial. O CAMINHO PARA CONCEITUAR A COMUNICAÇÃO POSITIVA Neste estudo foram analisados dois programas. O primeiro, intitulado “Cães de Assistência”, foi veiculado no dia 27 de janeiro de 2018. A atração apresenta animais dóceis e treinados como um meio de auxiliar no dia-a-dia de cidadãos, estimulando, acima de tudo, propagação de novas iniciativas que não tenham o lucro como meio, e sim, a cidadania por fim. O segundo programa se chama Esporte e Futuro e foi veiculado na emissora em 24 de fevereiro de 2018. A edição apresenta iniciativas que contribuem para o futuro do esporte paralímpico no Brasil. A equipe de produção escolheu a ONG Atitude Paradesportiva e o Centro de Treinamento Paralímpico Brasileiro, ambos em São Paulo, como cenário do programa. A presente amostra foi escolhida pelo pesquisador por vir ao encontro à Pesquisa de Informações Básicas Municipais (Munic)15, de 2014. O estudo destaca que a maioria das prefeituras não promovem políticas de acessibilidade no Brasil. Se não há iniciativas públicas que contemplem esses cidadãos, cruzar os braços e reclamar não é um caminho, pontua a pesquisa. Acredita-se que agir é uma escolha. Entende-se que a propagação de projetos que auxiliem e encorajem cidadãos a mudar seu dia a dia e do mundo ao redor é uma das prerrogativas defendidas pelo programa Especial, enquanto função social e jornalística, corroborando para uma Comunicação e sociedade mais positiva. 15 Disponível em: <https://ww2.ibge.gov.br/home/estatistica/economia/perfilmunic/ default.shtm>. Acesso em: 26 mar. de 2018.
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Soares, V. D. e Berti, F. R. (Orgs.)
COMUNICAÇÃO POSITIVA
A análise vai permear três temáticas: Acessibilidade; Noticiabilidade e valores-notícia; e Jornalismo e Comunicação Positiva. Segue um detalhamento de cada uma para a compreensão do que será analisado. - Acessibilidade: Na realidade brasileira, a televisão tem papel central. É um meio de comunicação que se destina a um público anônimo e heterogêneo e se caracteriza pela veiculação de imagens, sons e textos. O Programa Especial tem por premissa a acessibilidade. E este aspecto é visto do primeiro ao último segundo da atração. Seja na escolha dos temas ou nos recursos de acessibilidade utilizados para privilegiar todos os públicos, permitindo assim, uma compreensão integral e, acima de tudo, universal dos conteúdos. - Noticiabilidade e valores-notícia: A seleção e hierarquização do que é ou não notícia recorrem aos valores-notícia. Mas estes agem aqui apenas como uma parte do processo. Critérios como o público-alvo e a linha editorial da atração são o mote do conteúdo apresentado pela equipe de produção do Programa Especial. - Jornalismo e Comunicação Positiva: O verdadeiro papel do jornalista é, e sempre foi, fazer pensar. Tem-se por pressuposto o ser humano como a matéria-prima do jornalismo. Cabe ao profissional atentar para a humanização do seu trabalho. Com uma abordagem didática, o programa visa a inserção e compreensão da sociedade para com o público que necessita de cuidados especiais, colaborando assim, para um fortalecimento da cidadania. O Programa Especial tem como pano de fundo a Comunicação Positiva. Valorizar aspectos virtuosos do ser humano, estimular e incentivar são usados como objetivo principal em detrimento das mazelas previamente existentes no cotidiano desses cidadãos. Feitas tais considerações, segue-se com o resultado da observação simples feita a partir dos programas selecionados e o referencial selecionado para dar suporte teórico às inferências propostas. Acessibilidade A TV Brasil, ao apoiar o Programa Especial, é um agente de promoção da acessibilidade para o desenvolvimento inclusivo por meio de iniciativas que visem o protagonismo desses cidadãos. Segundo avalia Maciel (2000), o processo de exclusão social de pessoas com deficiência é tão antigo quanto a socialização do homem. Ao abordar a acessibilidade no todo, o programa exibe as ações realizadas pela sociedade a fim de minimizar as consequências de séculos de exclusão e discriminação em relação às pessoas com deficiência (TORRES, 2002; SASSAKI, 2009). Os conteúdos centrados na natureza informativa, cultural, artística e científica convertem o programa em um espaço de pluralidade. A acessibilidade está na escolha das pautas, na produção, na forma como as imagens são captadas, nos exemplos apresentados. Usam-se diferentes formatos televisivos para apresentar a acessibilidade. No estúdio, Juliana Oliveira apresenta os assuntos a serem desenvolvidos, disposta em uma AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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Érik da Silva Pastoris e Valéria Deluca Soares
cadeira de rodas no centro do cenário, tendo como fundo, descrições em braile e na parte inferior do vídeo, janela de libras e legendas. A repórter Fernanda Honorato é portadora de Síndrome de Down. Jornalista, Honorato é a única repórter do programa. Desde 2004 no ar, a atração corrobora para o argumento de Machado (2011), ao avaliar que a televisão é um dos meios de comunicação que tem a capacidade de contribuir para uma sociedade inclusiva. A televisão ainda é o meio de comunicação mais presente no dia a dia dos cidadãos brasileiros, conforme a PNAD Contínua - Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (2016). Por ser uma emissora pública, gerida pela EBC, a TV Brasil vai ao encontro do propósito do Governo Federal16 , que a partir do ano de 2017, determinou que toda a programação transmitida pela TV aberta deve contar com os recursos de legenda oculta (closed caption) e dublagem. Por isso, recursos de acessibilidade como a audiodescrição, a legenda oculta e a janela do intérprete de LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais), por exemplo, são usados para proporcionar qualidade de vida através do acesso à informação e à comunicação para esse grupo social. Esses recursos disponibilizados pela TV Brasil, observando os critérios estabelecidos pela Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (ABERT), são utilizados durante toda a veiculação do programa. Ao apresentar temas de interesse público como mercado de trabalho, saúde e esportes, a produção do Programa Especial privilegia a formação da cidadania e transforma-se em um verdadeiro instrumento de coesão nacional, segundo Zuffo (2004). O primeiro episódio selecionado e apresentado nesta pesquisa trata dos ‘Cães de Assistência’. São mostradas as mais diversas categorias de animais de auxílio, como cães-guia, para os deficientes visuais; cães-ouvintes, para os deficientes auditivos e também cães de serviço para crianças autistas. Os animais de uma ONG são treinados e servem de auxílio nas mais diversas demandas do portador de deficiência, seja no simples ato de tirar um sapato até colaborar no desenvolvimento de crianças com microcefalia. Com uma linguagem simples, em formato de depoimentos, voluntários, mães e pessoas com necessidades especiais elencam a causa e a consequência das relações interpessoais que desenvolveram ao terem um objetivo em comum: o bem-estar, seja ele físico e/ou espiritual. Sendo assim, o programa educa e informa o público sobre o direito das pessoas deficientes, conforme trata a Resolução 31/123 das Nações Unidas. A segunda edição analisada tem por premissa o esporte como uma porta acessível ao futuro. O programa apresenta Adriana, que encontrou adversidades no crescimento do seu filho, João Lucas, e a partir disso criou uma ONG para ampliar a oferta de locais esportivos a quem possa ter necessidades especiais. Na sequência, é apresentado um Centro de 16 Disponível em: <http://www.brasil.gov.br/cidadania-e-justica/2015/12/ate-2017-tvaberta-tera-programacao-com-acessibilidade-24-horas-por-dia>. Acesso em 02 mai. de 2018.
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Soares, V. D. e Berti, F. R. (Orgs.)
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Treinamentos que prepara atletas e recebe quem deseja estar próximo de outros com condições semelhantes ou competir em campeonatos, como a Paraolimpíada. Logo, o Programa Especial divulga e difunde o esporte como um processo de inclusão social em uma sociedade que busca desenvolvimento humano e equidade de oportunidades e direitos para os indivíduos e grupos sociais, que em alguma etapa da vida se encontram em situação de desvantagem com relação a outros membros da sociedade, conforme explicam Montardo e Passerino (2007). Cabe destacar que o tema acessibilidade começou a fazer parte das discussões a respeito das políticas públicas voltadas para a pessoa com deficiência há muito tempo no País. Mas ainda, há muito por fazer e o Programa Especial colabora com uma linguagem didática e positiva na promoção dessas pessoas. A presença de barreiras na comunicação e no acesso à informação pode acarretar dificuldade para que uma pessoa com deficiência sensorial ou intelectual possa participar de um processo educativo e de aprendizagem, ou de um processo que garanta independência, autonomia e boa autoestima. Não tendo tais recursos, elas são impedidas de usufruírem de serviços, de atividades e de direitos, transformando-se em excluídos sociais. Gomes (2007) corrobora ao alegar que o jornalismo é uma construção social, no sentido de que se desenvolve numa concepção econômica, social, cultural particular e cumpre funções fundamentais nessa formação. Ao selecionar os fatos que se tornarão notícia, o jornalismo exerce um papel crucial na sociedade, determinando o que o público deve ou não saber. Nesta linha de raciocínio, o Programa Especial cumpre com o papel de divulgar e contribuir com os elementos que envolvem os conceitos e pressupostos da acessibilidade. Noticiabilidade e valores-notícia O Programa Especial, seguindo os estudos de Beltrão (1969) sobre os gêneros jornalísticos, tem características dos gêneros informativo e interpretativo. Pelo gênero informativo apresenta a notícia, a entrevista, a reportagem, a história de interesse humano e a informação por imagem. E, pelo gênero interpretativo, traz a reportagem em profundidade. A atração apresenta a notícia e a informação, como recomenda Gomes (2007). Tem um modo de composição formal com cabeça, off, passagem, sonoras e nota pé. A notícia tende a ter uma composição regular e característica. A equipe de produção utiliza, como critério de noticiabilidade principal para elaboração das pautas a serem desenvolvidas, as boas práticas da sociedade em prol da cidadania de indivíduos portadores de algum tipo de restrição, selecionando fatos que se tornarão notícia, desempenhando um papel crucial no dia a dia, como indica Moreira (2006). Logo, os fatos deixam o cotidiano da vida para ingressar no universo simbólico do valornotícia. No Programa Especial são elencadas ações, momentos, iniciativas e pessoas que contribuem para auxiliar na criação de uma edição concisa
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Érik Pastoris e Valéria Deluca
atraente e principalmente útil ao público-alvo, como aponta Lage (2014). Junior e Antonioli (2016, p. 44) ressaltam que a elaboração da pauta, a seleção das fontes e o trabalho de apuração, redação e circulação da notícia constituem elementos determinantes da operação de produção informativa. Wolf (1995 p. 189) argumenta que a noticiabilidade corresponde ao conjunto de critérios, operações e instrumentos com os quais os órgãos de informação enfrentam a tarefa de definir o que é notícia. Para ele, os jornalistas – gatekeepers devem responder à seguinte pergunta: quais os acontecimentos que são considerados suficientemente interessantes, significativos e relevantes para serem transformados em notícias? Observando os programas selecionados na amostra desta pesquisa, os profissionais envolvidos no processo jornalístico atentam para estas questões, tendo por pano de fundo os objetivos do Programa Especial, o público a quem se dirige e a função social. A noticiabilidade é então, o que Traquina (2005) propõe: um conjunto de critérios e operações que fornecem a aptidão de merecer um tratamento jornalístico, isto é, possuir valor como notícia. Assumindo a condição citada por Erbolato (2002): ser recente, inédita, verdadeira e de interesse público. Destaca-se que produtores e editores precisam conhecer bem o público para quem as notícias e informações são transmitidas, ponto considerado crucial por Miranda (2016). Tendo por mote a linha-editorial e o públicoalvo bem definidos, todas as atividades de seleção dos acontecimentos têm como ponto de partida o interesse e a importância do fato para os mesmos, em conformidade com o que prega Bernardes (2003). Neste viés, as duas edições analisadas no presente trabalho contemplam as tais considerações. Ao apresentar no programa ‘Cães de Assistência’, os fundadores das ONGs Pelo Próximo e Cão Inclusão e os respectivos voluntários da causa, onde pessoas decidiram não esperar pelo Poder Público para agir, a produção do Programa Especial contribui para uma construção social da realidade, conforme menciona e indica Moreira (2006), ao observar e exibir o que é de interesse público, segundo infere Erbolato (2002). Neste sentido, como explica Souza (2004), a edição entretém, despertando a vontade de assistir e informar-se. Isso possibilita ao público saber mais a respeito do assunto em voga. O mesmo se aplica no programa ‘Esporte e Futuro’, em que são elencadas ações de Adriana Dutra, fundadora ONG Atitude Paradesportiva e de treinadores de esportes adaptados, entrevistados no Centro de Treinamento Paralímpico Brasileiro. A exploração da imagem, vital para o contexto da notícia em TV, de acordo com Miranda (2016) e o modo como a equipe de produção se preocupa com o mesmo é observado nas edições analisadas. Os entrevistados têm como pano de fundo os ambientes de trabalho ou lazer do qual participam. Os mesmos são retratados em movimento a fim de retratar a veracidade do que está sendo abordado. Um exemplo é o jovem João Lucas Takaki, de 14 anos, filho da idealizadora da Atitude Paradesportiva. Enquanto conversa com a câmera, imagens suas praticando o tênis em cadeira de rodas com
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COMUNICAÇÃO POSITIVA
outros atletas são exibidas na atração, costurando imagem e fala, dando assim, um tom plural, ao abranger o surdo com a janela de Libras, o cego com a audiodescrição e a sociedade no todo com a gama de linguagens ao dispor. A proposta de contemplar a todos se aplica no tema tratado com o treinador de basquete em cadeira de rodas, Sileno Santos, apresentado na segunda edição aqui analisada pela presente pesquisa. Ao ser entrevistado pela repórter Fernanda Honorato, Santos explica as funções sociais - como conhecer o atleta e suas restrições motoras - e profissionais de um técnico na modalidade. Enquanto aborda o assunto, está em frente à quadra de basquete onde os jogadores treinam. Em meio a uma resposta e outra, a câmera abre o ângulo de visão, mostra os atletas disputando a bola. Neste momento, a audiodescrição é utilizada para contextualizar ao deficiente visual o que está sendo mostrado. Logo, seguindo esta perspectiva, o Programa Especial faz contraponto a Spinelli (2012) que ao salientar que a televisão é um veículo de massa, sempre privilegiou a comunicação de poucos para muitos. Neste quesito, se a TV fabrica sonhos e sensações de prazer, conforme destaca Marcondes Filho (1988). Isso acontece, ao explorar realidades distantes da maioria da população, quando o programa tem por fundamento contar histórias. E isso, depende da percepção do jornalista e do impacto das mesmas, segundo Cardoso (2008). Os critérios que determinarão quais destes fatos serão vistos como notícias e, consequentemente, divulgados, segundo Travancas (2010), é avaliado pelos produtores dentro de um universo que podem virar boas histórias de superação. Nesta ótica, Rosenberg (2006) lembra que o objetivo da Comunicação Não-verbal se concentra em uma sociedade que não pode esquecer que é formada por humanos, que deveriam se relacionar uns com os outros, vivendo em comunhão. São histórias como a de Gabriel Cristiano, exibido na segunda edição avaliada por esta pesquisa. Aos nove anos, o jovem teve o braço esquerdo amputado ao sofrer um acidente de trem. Atualmente, é atleta de natação, tendo disputado a última Paralimpíada, no Rio de Janeiro em 2016. Relatos como este são costumeiros no Programa Especial e fazem parte da linha editorial desde seu início em 2004. A pluralidade na produção da notícia, baseada também em sugestões do público são carros-chefes do programa. Sempre ao encerrar a edição semanal, a apresentadora Juliana Oliveira sugere aos telespectadores que participem da temática exibida, nas redes sociais, mandando fotos e textos com a ótica de receptor da mensagem. Sendo assim, a TV sai da sala de estar das residências e vai para os carros, computadores portáteis e telefones móveis, conforme defende Silveira (2008). Jornalismo e Comunicação Positiva A apresentação, de Juliana Oliveira, publicitária e cadeirante e as AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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reportagens de Fernanda Honorato, primeira jornalista e repórter com Síndrome de Down no Brasil, corroboram para um cenário de protagonismo desses cidadãos na Comunicação. Neste âmbito a comunicação é entendida como facilitadora no compartilhamento do conhecimento, conforme discute Soares (2007). Nesta linha, Benetti (2008) avalia que o jornalismo é entre outras definições possíveis, um discurso. Beltrão (1976), a essência do jornalismo é a informação da atualidade. Cabe então, recuperar Lasswell (1948) ao avaliar que o processo de comunicação na sociedade desempenha três funções: vigilância sobre o meio ambiente, revelando ameaças e oportunidades que afetam a posição da comunidade e de suas partes componentes ao nível dos valores; correlação dos componentes da sociedade, na sua resposta ao meio ambiente; e transmissão da herança social. Justifica-se citar também Beltrão (1980), ao comparar as funções básicas do jornalismo com um triângulo retângulo (informação, opinião e a difusão de dados), sendo a base, a informação. A TV Brasil e a programação plural que apresenta, tendo por base a presente pesquisa, evidenciam a relevância e a pertinência da televisão enquanto um importante veículo de massa, por trazer consigo um meio de entretenimento, informação e formação cultural (SANTOS; LUZ, 2013). O jornalismo por meio da televisão tem a capacidade de contribuir para uma sociedade inclusiva (MACHADO, 2011). Ao propor uma comunicação voltada às valências e não às dificuldades do ser humano, o Programa Especial se utiliza da Psicologia Positiva como ponto de partida, rompendo com o viés negativo no qual a sociedade e os meios de comunicação estão habituados a divulgar. O movimento Positivo completa apenas 20 anos em 2018. Felicidade, otimismo, altruísmo, esperança, alegria, satisfação e outros temas humanos são utilizados na construção do programa em detrimento de uma abordagem centrada nos problemas e nas patologias, conforme ressalta Marujo (2007, p. 117). O pensamento e a linguagem positiva têm influência sobre o potencial máximo das pessoas e o contexto que as mesmas estão retratadas no Programa Especial. Tal perspectiva seguem os passos da Teoria Apreciativa defendida Varona (2004). O programa também segue os preceitos da Comunicação NãoViolenta (CNV). Busca a partir do conteúdo noticioso construir relações harmoniosas, a partir de ações que representam sentimentos como a empatia e a autenticidade, em uma busca constante para compreender a si e aos outros, conforme postula Martins e Tavares (2017). Pode-se considerar que quatro princípios que guiam a CNV, observação, sentimento, necessidades e pedido, são identificados nos programas analisados. Ao trabalhar com o empoderamento dos envolvidos, lembrando os quatro momentos que Varona (2004) menciona ao apresentar a Teoria Apreciativa, a atração estimula boas práticas na sociedade por meio de ações positivas. Assim, como a Comunicação Não-Violenta auxilia na reformulação no modo como as pessoas se expressam e ouvem os outros. Nas reportagens e entrevistas, os indivíduos são levados a se expressar 18
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com honestidade e clareza, ao mesmo tempo que oferecem aos outros uma atenção respeitosa e empática. Os sujeitos das histórias contadas no programa ensinam a observar e a identificar comportamentos e as condições que estão ao seu redor. A investigação apreciativa e a Comunicação Não-Violenta ficam evidentes, por exemplo, no caso de Adriana Dutra, mãe de João Lucas, tenista em cadeira de rodas. O filho nasceu com câncer na medula e teve de realizar uma cirurgia com 24 horas de vida. Sanadas as primeiras adversidades, Adriana decidiu criar a ONG Atitude Paradesportiva, para crianças com necessidades especiais vivenciarem diversas modalidades esportivas. O jornalista ao se deparar com este tipo de conteúdo em mãos, tem tarefas das mais exigentes: atenção, perspicácia, vivacidade de espírito e inteligência para a coletar a informação (GRADIM, 2000). Como profissional de notícia, o jornalista busca e divulga informações. Senso crítico, capacidade de expressão e domínio da língua portuguesa são fundamentais no exercício da profissão. Considerando isto, cita-se Lage (2014). Ele salienta que o jornalista deve se empenhar pela difusão dos fatos de interesses público, pela confiabilidade dos dados, relatos e análises de terceiros que divulga e pelo respeito à pluralidade de interesses que conflitam na sociedade. Tendo tal ideia como ponto de partida, a narrativa didática proposta pelo programa fica bem clara na edição ‘Cães de Assistência’, de maneira que a informação seja transmitia de maneira adequada (GRADIM, 2000). Leonardo Ogata, fundador da Cão Inclusão, aborda o projeto da organização não-governamental que visa o treinamento e entrega de cães para pessoas com deficiência. O instrutor explica detalhadamente todo o processo de escolha do cão a ser treinado e como se dão as primeiras interações com o novo tutor. Ele se senta em uma cadeira de rodas para realizar uma demonstração de como é o trabalho dos animais. Após, finaliza esclarecendo de que forma o indivíduo pode obter um cão de assistência. Dando sequência nessa narrativa, o paratleta de rugby em cadeira de rodas, Lucas Junqueira, é um dos cidadãos que possuem cães de assistência. Ele discorre como conheceu a iniciativa e o procedimento realizado na aproximação e relação com Paçoca, seu cachorro assistente. Ao representar os fatos e constituir a realidade social, conforme ressalta Becker (2005), esse tipo de descrição do Programa, apresentando os diversos lados de um mesmo episódio, visa evidenciar ao telespectador o compromisso com a verdade, a ética e a cidadania no Jornalismo. A Comunicação Não-Violenta contribui com a análise. Ela se baseia em habilidades de linguagem e comunicação que fortalecem a capacidade dos sujeitos, mesmo em condições adversas, manter a característica de humano. Sendo uma entrega de coração, seja para os outros, seja para si próprio, como explica Rosenberg (2006). Nestas perspectivas, o Programa Especial evidencia as premissas do jornalismo ao servir o cidadão com informações que contribuam para a AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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melhoria da sociedade, estando de acordo com as orientações da Associação Nacional de Jornais (ANJ). UM CONCEITO PARA A COMUNICAÇÃO POSITIVA Tendo por objeto os dois programas veiculados na TV Brasil, apresentados nos meses de janeiro e fevereiro de 2018 e levando em conta as teorias abordadas nesta pesquisa, foi possível verificar que o Programa Especial trata da inclusão social das pessoas com deficiência em todos os setores da sociedade por intermédio do conceito de noticiabilidade e dos critérios de valor-notícia. Identificou-se que a equipe de produção do Programa Especial se preocupa em criar um entorno positivo ao universo do cidadão que necessita de cuidados especiais, sendo, assim, pode ser visto como um instrumento de pluralidade. A informação, tal qual a comunicação, são instrumentos de desenvolvimento de opinião e devem ser acessíveis. A Teoria Apreciativa (VARONA, 2004) infere que o homem necessita de comunicação para a vida em sociedade. E elenca, que o mesmo, em algum momento da História, deixou-se influenciar negativamente pelo meio e também pela mensagem. A fórmula é complexa: tirar o foco dos problemas, concentrar-se menos em apontar o que está velho e mais na construção do novo. Catalisar novas formas de pensar sobre resultados e criar uma visão compartilhada com o poder de mobilização social, por meio dos indivíduos, do diálogo e do relacionamento com pessoas é um dos meios, como propõe a Comunicação Não-violenta. Comunicar resulta em trocar mensagens, que por sua vez, envolve emissão e recebimento de informações. A informação, é um dos elementos fundamentais para que o indivíduo possa exercer plenamente os seus direitos. Tendo o Jornalismo estabelecido como função social e parte imprescindível de uma sociedade democrática, conceitua-se Comunicação Positiva como capacidade de escuta ativa, capaz de potencializar o talento humano por intermédio de valores-notícia e critérios de noticiabilidade que prestigiem pautas propícias à construção social, individual ou coletivamente. Tem por função contribuir para um viés social com o propósito de consolidar uma sociedade igualitária, com boas práticas, a fim de informar e contribuir. Exime-se de utilizar os meios e os veículos como produto de uma mercantilização da profissão e da notícia, servindo a um determinado segmento em específico. A Comunicação Positiva dá espaço e voz à maioria que, por razões sociais e econômicas escapa, aos interesses dos anunciantes. Na era em que a comunicação é notavelmente influente na vida das pessoas por meio de acesso principalmente à internet, cada um fazer a sua parte significa colaborar com tudo que for possível e divulgar aquilo que encoraja atitudes construtivas. Não se trata de alienar ou esconder as mazelas existentes no cotidiano. E sim, propor um equilíbrio entre os fatos que viram destaque nos meios de propagação de notícias. É responsabilidade 20
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do profissional de comunicação atuar na transformação de uma sociedade mais igualitária e positiva. E, portanto, parte-se da premissa de que as informações positivas publicadas têm importante papel na promoção e no reforço da cidadania. NOVOS CAMINHOS A Comunicação Positiva, exposta ao longo desta pesquisa, incide em uma técnica e em um processo com peculiaridades próprias. O conceito apresentado foi resultado de uma análise, considerando o pensamento exposto no referencial teórico, em específico os que envolvem a Teoria Apreciativa e os pressupostos e conceitos de função social e de noticiabilidade que regem o Jornalismo. Cabe destacar que na literatura consultada e nas leituras realizada a partir da pesquisa bibliográfica, não foram encontrados autores que conceituassem a Comunicação Positiva pontualmente. Assim, reuniu-se ideias para conceituar a Comunicação Positiva, dando ao termo um significado próprio. Salienta-se que foi conceituada por autores que apresentaram diferentes concepções sobre acessibilidade, Jornalismo, Psicologia e Sociologia, de forma que auxiliaram a presente pesquisa a sugerir um conceito para o tema exposto. A ausência de teóricos abordando objeto em discussão foi o que motivou os pesquisadores a propor o debate por intermédio deste estudo. Os meios de comunicação têm um papel de extrema relevância por ser um alicerce à democracia e auxiliar na construção da realidade. O objeto de estudo deste projeto, o Programa Especial, veiculado pela TV Brasil, utiliza-se dos preceitos da Comunicação Positiva na elaboração da pauta, ao destacar o encorajamento, a apreciação e o apoio, ao invés da crítica e desaprovação de cidadãos com mobilidade reduzida ou deficiência intelectual. Cabe destacar que considerando o fato da TV Brasil ser uma emissora pública, dá a ela a condição de abrir espaço na grade de programação para uma a proposta com o perfil do Programa Especial. Entende-se que na maioria das emissoras privadas tal condição seria inviável, em função dos diferentes interesses e linhas editoriais. Percebeu-se que por ter periodicidade semanal, a atração tem a capacidade de misturar o jornalismo não factual com a prestação de serviços e o entretenimento. Ela vai além de apenas informar e também, alimenta o pensamento crítico do telespectador ao instigar na prática de uma comunicação não-violenta. O programa serve para atrair o olhar do receptor na garantia da inclusão de todos em qualquer ambiente, atividade ou uso de recurso. Ele usa de diferentes elementos para reforçar a função social do Jornalismo e os pressupostos da Comunicação Positiva a fim de enaltecer o protagonismo do cidadão com deficiência, criando um entorno positivo a esse universo, sendo um instrumento de pluralidade. A televisão, atualmente, possui um grande potencial para disponibilizar os recursos de acessibilidade comunicacional, entretanto, não há uma adoção voluntária das empresas e da indústria televisiva. Desse modo, AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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há a restrição ao acesso à informação e à comunicação de milhões de espectadores, dificultando o avanço do desenvolvimento inclusivo no País. Sem espaço nos meios convencionais, essa troca de ideias e sentidos fica restrita, acabando por não propiciar que esse segmento esteja presente no debate público. Todavia, são muitos os movimentos nacionais e internacionais que auxiliam diariamente este público, dando espaço e voz para que não sejam esquecidos. Dito isso, cabe esclarecer que esse estudo é um passo para estudos futuros, sobre Comunicação Positiva. Espera-se, dessa forma, gerar novas pesquisas, debate e entendimento sobre como ocorre a construção de uma mensagem ausente de julgamentos, opiniões e análises prévias e que aposta em uma agenda positiva. São 45 milhões de pessoas com algum tipo de deficiência no Brasil, conforme dados do CENSO 2010. Entretanto, os veículos que tem por premissa priorizar a função social do jornalismo, quase ignoram a presença destes cidadãos. Na contramão das questões listadas, iniciativas surgem a todo momento. Mas, encontram-se ofuscadas e invisíveis do grande público. A limitação descrita, sugere que o Brasil tem uma comunicação, em seus mais diversos meios, deficiente. Sugere-se então, como uma pesquisa futura, um estudo sobre Comunicação Positiva e como a tornar referência e protagonista em meios de comunicação de massa. REFERÊNCIAS ABERT. Conheça os recursos de acessibilidade na TV. Brasília, 2013. Disponível em: <http://www.abert.org.br/web/index.php/2013-05-22-13-3319/2013-06-09-21-38-22/tecnicamenu/item/21593-conheca-os-recursos-deacessibilidade-na-tv>. Acesso em: 01 mai. de 2018. ABI. A história da fundação da ABI, 2013. Disponível em: <http://www.abi. org.br/institucional/historia/>. Acesso em: 01 mai. de 2018. ABIINTER. História do Jornalismo, 2014. Disponível em: <http://abiinter. com/sala-de-imprensa/21-historia-do-jornalismo>. Acesso em 16 out. de 2017. ABREU E LIMA, Luísa. A sonora na organização textual da reportagem, 2013. Disponível em: http://www.fnpj.org.br/rebej/ojs/index.php/rebej/ article/viewFile/331/206. Acesso em: 06 jun. de 2018. ABREU, Karen Cristina Kraemer; SILVA, Rodolfo Sgorlada. História e tecnologias da televisão. Investigação bibliográfica desenvolvida na Universidade Federal de Santa Maria–UFSM, 2012. Disponível em: http://www.bocc.ubi.pt/pag/abreu-silva-historia-e-tecnologias-datelevisao.pdf. Acesso em: 09 mai. de 2018. AFFONSO, Ligia Maria Fonseca; ROCHA, Henrique Martins. Fatores organizacionais que geram insatisfação no servidor público e comprometem a qualidade dos serviços prestados. Simpósio de excelência em gestão e tecnologia, v. 7, 2010.Disponível em: <http://www.tre-rs.jus.br/arquivos/ AFONSO_PROXIMO_Organizacionais_autores.pdf>. Acesso em: 31 de mai. 2018 22
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Guilherme de Faveri Garcia
Capítulo 2
ANÁLISE DO PROGRAMA DE TV ZERO1 E A ABORDAGEM DE CONTEÚDOS DE GAMES NA TV Guilherme de Faveri Garcia
O crescimento da cultura gamer1 vem ganhando espaço nos meios de comunicação nos últimos anos. Uma mídia recente se comparada a outras, visto que o cinema e a música existem há mais de 100 anos e o videogame, há menos de 50 anos. E, só está sendo levada a sério nesta última década, em que o videogame deixou de ser um simples objeto de entretenimento. Esse segmento movimenta mais dinheiro ao ano do que os filmes de Hollywood, tendo uma diversidade de público crescente que colabora cada vez mais com este novo comportamento. O movimento que só começou a ser compartilhado uma década depois de seu surgimento em revistas exclusivamente dedicadas aos games. A ação dessas revistas trazia a base do jornalismo de games feita hoje. Depois, com o surgimento da internet, a comunidade gamer deu outro passo. Na internet, tem-se a possibilidade de jogar online, conhecer novos jogadores que compartilham da mesma ideia e jogo. Criam-se fóruns de discussão, em que se debate qual jogo é me- lhor, dá-se dicas para alguns games, realizam-se torneios, escreve-se notícias, entre outros conteúdos. Deu-se espaço para que sites e blogs surgissem trazendo um conteúdo mais elaborado. Atualmente, chegaram os vídeos na internet, muitos deles na rede social YouTube. Com ela, surgem canais especializados em determinados jogos ou em todo o universo gamer, com o mesmo conteúdo veiculado em sites e revistas especializadas, só que em outra plataforma mais elaboradas. O número de vídeos postados e a recepção calorosa do público, mostrou como o video-game era abrangente em conteúdo, desde análises de jogos independentes e desconhecidos até grandes campeonatos de games, 1 Pessoas que passam seu tempo livre jogando e aprendendo sobre jogos.
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Soares, V. D. e Berti, F. R. (Orgs.)
GAMES NA TV
transmitidos na plataforma para milhões de telespectadores. Considerando este cenário, o objeto de estudo deste artigo é o programa de televisão Zero1, veiculado pela Rede Globo, apresentado e idealizado pelo jornalista Tiago Leifert. A ideia do programa surgiu com esse novo perfil de comportamento que surgiu na internet e também do público interessado em games desde o tempo das revistas e que estavam carentes de programas com esse conteúdo na televisão aberta. Assim, tem-se como objetivo analisar de que forma o programa Zero1 aborda os conteúdos de games na TV. Entende-se como pertinente também, apresentar a trajetória da imprensa game, como fundamento para a análise proposta. O programa Zero1 aborda assuntos sobre games, eSports, filmes e sobre a cultura pop2 em geral. Ele é exibido todas as noites de sábado para o domingo, cada episódio tem a duração de 15 minutos. Apresentado pelo jornalista e apresentador Tiago Leifert, o programa teve o primeiro episódio transmitido na madrugada do dia 23 em outubro de 20163. Depois de exibido na TV aberta, é disponibilizado no site e aplicativo para dispositivos móveis Globo Play, com conteúdo extra, inclusive com mais tempo de duração. O Zero1 está no terceiro ano (terceira temporada) e até o primeiro programa de 2018, contabilizou um total de mais de 40 episódios4. Antes de o programa ir ao ar, o apresentador Tiago Leifert, desde 2006, tentava vender a pauta sobre games para a Globo, quando chegou na emissora. Ao assumir, em 2009, o programa Globo Esporte São Paulo, o jornalista começou a trazer conteúdo de games para a TV. Anos depois em 2014, foi exibido o programa sobre jogos Madrugames, exibido na Rede Globo e apresentado pelo editor do IGN Brasil, Gustavo Petró. Para Leifert (2016)5, Madrugames foi essencial para o surgimento do Zero1, pois com a descontinuidade do programa, a Globo sentiu a necessidade de apresentar outra atração que abordasse o mesmo conteúdo. “Foram quase dois anos de planejamento”, lembrou Leifert em entrevista ao site IGN Brasil, antes do primeiro programa entrar no ar. O Zero1 tem direção geral de Alexandre Lannes e Eduardo Xocante6. Opta-se então, pela pesquisa descritiva e exploratória, de abordagem qualitativa (GIL, 2008) para cumprir o objetivo proposto. Selecionou-se três programas para compor a amostra a ser analisada: o primeiro programa exibido pela Rede Globo no dia 22 de outubro de 2016; o veiculado no dia 8 de julho de 2017 e o primeiro episódio da terceira temporada, do 2 Cultura popular, que envolve várias mídias, entre elas: música, filmes, quadrinhos, séries de TV, etc. 3 Disponível em: https://www.voxel.com.br/noticias/coluna-vale-apostar-fichas-zero1programa-games-globo_826156.htm. Acesso em: 30 abr. 2018. 4 Disponível em: https://globoplay.globo.com/zero1/p/9787/. Acesso em: 30 abr. 2018. 5 Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=5Wqpv3bP4NA. Acesso em: 30 abr. 2018. 6 Disponível em: http://br.ign.com/tv/41435/feature/zero1-novo-programa-de-tiagoleifert-sobre-cultura-geek-estr. Acesso em: 30 abr. 2018. AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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Guilherme de Faveri Garcia
dia 3 de março de 2018. Usou-se como critério a premissa que é possível observar a evolução da atração, a partir desta amostra. Para efetivar o estudo, indica-se a análise de conteúdo (BARDIN, 2004). A IMPRENSA DE GAMES NO BRASIL O jornalismo de games, segundo Fernandes (2017), segue na linha do entretenimento, se enquadrando no segmento de soft news7. Quem trabalha nessa área, pública análises de jogos eletrônicos e informações sobre novidades desse universo. As publicações do gênero são vinculadas geralmente em veículos de revistas, sites, blogs e outros portais que não necessariamente seguem uma linha editorial específica para games, mas de tecnologia em geral. Destaca-se que é no impresso e na internet que a imprensa de games é mais forte. Grande parte das fontes são estrangeiras. “Um dos grandes desafios do jornalismo de games é não ser apenas um ‘empacotador’ ou tradutor de notícias de veículos e assessorias internacionais” (FERNANDES, 2017, p. 123). Tudo começou com o jornalismo de videogames surgindo nos Estados Unidos, no início da década de 1980, de acordo com o site Press Start Brasil8. Em 1981, a edição da revista Computer & Video Games, de novembro daquele ano, foi lançada, trazendo os melhores games de Arcade9, com segredos e dicas. A revista não criava jornalismo de fato, pois trazia conteúdos sem profundidade, o que posteriormente, foi feito por outras mídias da época. A primeira revista de jogos, apareceu algumas semanas depois, com o nome Electronic Games, também nos EUA, conforme o site US Gamer10. A imprensa de videogames nascia nas revistas. No Brasil, a primeira publicação de notícias sobre games aconteceu em 1983, com a revista Odyssey Aventura. Segundo o site Press Start Brasil, essa revista focava seu conteúdo em jogos do videogame Odyssey e era distribuída para um clube de proprietários do console11. A publicação foi descontinuada no oitavo volume, visto que a distribuição não era abrangente e focava apenas em um público-alvo, finalizando as atividades em junho de 1985. Esse início tímido não levaria a muita coisa. Somente na década de 1990, que as editoras passaram a se interessar em trabalhar intensamente com o tema de fato (MORENO, 2016). A editora Sigla lançou em 1990 a revista VideoGame, uma versão especial da Vídeo News, focada em cinema e artes visuais. No ano seguinte, a publicação se tornou independente. Em 7 Noticiário leve. 8 Disponível em: http://warpzone.me/pressstartbrasil/index.html. Acesso em 26 mar. 2018. 9 Uma máquina de jogos eletrônicos, conhecido no Brasil como fliperama, eram instaladas em estabelecimentos de entretenimento. Lembravam muito os videogames, mas eram mais potentes e tinham um formato característico: monitor, controles e seu sistema tudo em um mesmo aparelho. 10 Disponível em: https://www.usgamer.net/articles/a-brief-history-of-games-journalism. Acesso em 26 mar. 2018. 11 Palavra usada para se referir a videogame.
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GAMES NA TV
maio de 1991, a editora Azul do mesmo grupo editorial da Abril, lançou a Ação Games. A revista criou o termo detonado, sessão que trazia em profundidade tudo o que era relacionado a um determinado game. “Como entrevistar desenvolvedores era algo impossível, [as revistas] focavam em truques, macetes e códigos para diversos jogos”, explica Moreno (2016, p. 31). Em julho de 1991, surgiu a Super Game, que escrevia sobre as plataformas da Sega, o Master System e o Mega Drive. Um ano depois veio a Game Power, que trazia conteúdos relacionados aos consoles da Nintendo, o Nintendinho e o Super Nintendo. Essa divisão, contribuia para a guerra dos consoles dos anos 1990 que no Brasil, trazia o embate entre TecToy versus Playtronic, distribuidoras oficiais dos videogames da Sega e da Nintendo. Em 1994, as duas publicações se fundiram, nascendo assim a SuperGamePower, que concorreu com a Ação Games até 2001. A revista Gamers, apareceu em 1995 com o nome originalmente de ProGames, pois era patrocinada pela rede de locadoras do mesmo nome. Ela trazia uma proposta diferente até então, pois era mais analítica, com reflexões e textos mais minuciosos. Ela publicava informações de lançamentos muito antes que as outras revistas, por ter um grande acervo de games pois era proprietária de uma rede de locadoras. Também era fácil ter uma aproximação do jogador com os games, o que facilitava a geração de conteúdo para a revista. A Herói Games nasce no mesmo ano, com uma estrutura de trabalho diferente. Ela não era composta por uma redação, pois todos os redatores eram freelancer (MORENO, 2016). Segundo o site Press Start Brasil, as revistas tinham como objetivo focar público-alvo infantojuvenil, que ditava sobre o assunto que iriam ser publicados na edição do mês, principalmente as dicas de jogos quentes da época e novidades que eram publicadas fora do país. Muito desse conteúdo era produzido por jogadores, pessoas que não eram ligadas ao jornalismo. Uma das dificuldades no início das publicações de games, se dava na captura das imagens dos jogos. Para conseguir as fotos de determinadas fases do game, eram criadas formas para burlar essa limitação, gravando diretamente da TV ou até tirando fotos da tela pausada do jogo. Isso acontecia antes de existir placa de captura12 ou uma mídia digital para gravar os gameplays13. Havia um amadorismo nas publicações, mesmo sendo conduzido por editores-chefes experientes no mercado impresso. Muito disso acontecia, também, devido ao conteúdo ser feito muitas vezes por quem só jogava videogame e não era jornalista. As revistas eram um meio para que os jogadores que levavam o videogame como um estilo de vida, pudessem se identificar. Muito antes da internet ser acessível para toda a comunidade gamer, eram as revistas que proporcionavam um espaço para interagir com pessoas que compartilhavam das mesmas ideias e debatiam sobre os mesmos assuntos, muito disso 12 Aparelho que captura o gameplay dos games. 13 Gameplay: ato de jogar um jogo, mostrar a jogabilidade do game. AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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acontecia antes por meio das cartas. No início das publicações especializadas, os textos e a diagramação eram simples, tudo bem colorido, para tornar o ritmo da leitura de fácil compreensão, pois o público que acompanhava as publicações era o jovem. Eram poucos jogos que focavam no público adulto. Com a chegada do jogo Mortal Kombat14, para os arcades e os videogames, as revistas começaram a utilizar de efeitos de sangue em suas diagramações, para chamar mais atenção dos leitores. Com mais jogos focados para um público adolescente, os games começaram a ficar mais complexos, e as revistas precisaram se adaptar. Criou-se publicações de Guias - os detonados - estes ofereciam dicas do início ao fim de determinados jogos. As artes das edições dessa década eram feitas por artistas das editoras, o que acabou se tornando uma das grandes marcas daquele período. Isso se deve pela falta de apoio oficial das empresas licenciadas, que obrigavam as editoras brasileiras a criarem conteúdo original. Essas artes eram dedicadas as capas e aos posters de jogos que se encaixavam no layout das publicações. A diagramação das revistas eram produzidas a partir de figuras feitas em cartolina, em que os editores colavam as artes e as imagens dos jogos. Em comparação a outros países, o Brasil vivia um certo atraso nas novidades e informações dos jogos da época. Por se tratar de uma indústria de games com dois extremos de mercado - Estados Unidos e Japão - onde a concentração de jogos e conteúdo era muito maior comparado ao Brasil, que tinha saído de um regime e excessão, com graves problemas sociais e econômicos. Seria difícil encontrar uma cobertura mais rápida e profunda no jornalismo de games tendo diversos outros assuntos ocorrendo pelo país. Era com pequenos passos que a imprensa de games no Brasil ia crescendo. Todavia, as revistas na época chegavam a vender 120.000 exemplares, números que rivalizavam com grandes publicações que não necessariamente tinham relação com games. Mas com uma nova geração surgindo, que perdia o interesse no impresso, dava-se iní- cio a uma queda nas vendas das revistas na virada do século. Duas grandes publicações, Ação Games e SuperGame, sofreram muito com essa nova fase. Em janeiro de 2002, as atividades da Ação Games se encerraram. Logo depois foi a vez da SuperGamePower. Um novo público começou a surgir, sendo eles mais velhos e com poder aqui- sitivo para comprar os novos consoles que estavam sendo lançados. Segundo informações do site Press Start Brasil15, o início da segunda fase do jornalismo de games começa com a entrada da editora Conrad no Brasil. Os anos 1990, mostraram como o mercado de games tinha futuro 14 Um dos games que motivou a criação de classificação etária nos mundos dos games, pelo seu alto nível de violência. 15 Disponível em: http://warpzone.me/pressstartbrasil/index.html. Acesso em 26 mar. 2018.
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no país. A marca Nintendo estava presente na mente de muitos jogadores, principalmente pelo o sucesso de suas franquias de jogos como Pokémon e Super Mario. Assim, criou-se a necessidade de trazer publicação licenciada para o país. Em setembro de 1998, saiu a primeira edição da revista Nintendo World (NW). Em abril de 2002, surgia no Brasil, outra grande revista que mudaria a forma de produzir jornalismo de games: a Electronic Gaming Monthly (EGM). Tratava-se de uma revista totalmente licenciada no mercado, trazendo o mesmo conteúdo que era publicado na revista americana. Assim, com esse modelo editorial, o conteúdo era mais autoral e com informações a respeito da produção dos games, não apenas sobre dicas e guias, foi surgindo uma responsabilidade que não existia antes. As revistas do país pararam de só jogar videogame e começaram a levar em consideração quem realmente fazia a indústria acontecer. A revista EGM trazia diversas mudanças e inovações para a área, como um estilo mais simples e limpo na diagramação. Era feita totalmente no digital, abrindo mão de como era feito antes, com templates produzidos pelo editorial gráfico. Não se tirava mais fotos da televisão e as artes não eram mais desenhadas pelo departamento gráfico da editora. O material vinha diretamente das empresas distribuidoras dos games. Não se tinha conteúdo de dicas e truques, indo contra o que as revistas estavam fazendo. As análises dos games eram feitas por três redatores para cada jogo, o que resultava em diferentes pontos de vista sobre o mesmo game, algo único para época. A relação do leitor com a revista era mais forte. Surgem as colunas de opinião, semelhante com o que era visto nas revistas de outro gênero. Os assuntos também começaram a ser mais técnicos, atraindo um público mais adulto e que cresceu lendo as revistas da década de 1990. Com a popularização da Internet, no início dos anos 2000, ainda não era comum a existência de sites especializados em games, tanto no Brasil quanto no resto do mundo. Existiam poucas exceções, como a IGN, Gamespot e GameTrailers, que surgiram no final dos anos 1990. Mais tarde, a internet possibilitou que começasse a aparecer inúmeros blogs e sites independentes e ligados a fóruns, que se diziam especialistas no assunto a competir com a mídia que existia até então. O público tinha como ficar sabendo das novidades imediatamente, dicas de determinados jogos começavam a ficar disponíveis na internet e a comunidade de gamers começava a crescer e debater sobre o assunto mais facilmente. As revistas de games vendo o surgimento de sites especializados, começaram a oferecer conteúdo online. Criaram portais de notícias vinculando às suas publicações. Os jornalistas começaram a ter compromisso de identificar o público, informando-o e fazendo denúncias de situações que aconteciam ao seu redor. A liberdade que o jornalismo foi conquistando possibilitou que se criasse novas possibilidades, exemplo disso foram os nano-reviews16, pequenas análises de jogos, feitas apenas 16 Reviews: são as análises dos jogos que são feitas pela a mídia especializada em games. AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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por um redator, assim mais jogos podiam ser analisados em uma única edição. Nos anos de 2010, a mídia de games tomou outro rumo. A internet começava a tomar o espaço das publicações impressas e se tornou o principal veículo de informação. Em 2010, os consoles da sétima geração (Playstation 3, Xbox 360 e Nintendo Wii) eram realidade para muitos brasileiros. Os gamers também ganharam espaço e voz para divulgar suas opiniões com o uso da internet. A possibilidade de usar ferramentas como grupos de Facebook, blogs e fóruns, proporcionou dialogar e trocar memórias há muito tempo guardadas, disseminando a cultura da nostalgia em comunidades na rede. Canais de televisão como a ESPN, Fox Sports e RedeTV! começam a transmitir coberturas de partidas competitivas, os eSports, a partir de 2015. “Febre em países asiáticos, chegou também ao Brasil, sendo transmitida por canais digitais e até mesmo por redes de televisão. O eSports representa um novo campo de atuação para o jornalista de games” (FERNANDES, 2017, p. 127). As transmissões são parecidas com jogos de futebol, tendo narrador e comentarista para narrar partidas de jogos eletrônicos. Segundo o site Press Start Brasil17, grande parte da publicação realizada sobre games, utiliza conteúdo dos consoles mais atuais do mercado, porém, no Brasil, grande parte do público não adquiriu esses consoles. Todavia, indústria atual de games se encontra bem diferente do que 20 ou 30 anos atrás, principalmente no Brasil. Em 2015, teve um crescimento de de R$44 milhões de dólares18. Com o advento das tecnologias, como smartphones e tablets, hoje é possível jogar em qualquer lugar e a todo o momento. E isso ampliou o público casual diversificado, abrangendo homens, mulheres, crianças, jovens e idosos. O Brasil é o quarto maior mercado do mundo, movimentando cerca de 900 milhões de reais e criando 4.000 empregos por ano. Apesar do cenário favorável, o jornalismo de games sofre de um dos grandes problemas na parte de conteúdo, a diferenciação e ligação com outras áreas como o cinema e o resto do jornalismo cultural de entretenimento. Outro problema é assemelhar propagandas a previews19 de jogos, sem ter uma visão crítica e analítica do game em questão. Essa nova fase do jornalismo de games marca novos paradigmas junto com antigas tendências do mercado nacional. Com um cenário de games formado por 52,6% por mulheres20, as revistas e sites não podem mais ser escritas pensando apenas no público masculino. Como visto antes, o 17 Disponível em: http://warpzone.me/pressstartbrasil/index.html. Acesso em 26 mar. 2018. 18 De acordo com pesquisa feita pela Associação Brasileira de Desenvolvedores de Games (Abragames). 19 Uma prévia, em forma de texto ou vídeo, de algum jogo que ainda não saiu no mercado. 20 Disponível em: http://g1.globo.com/tecnologia/games/noticia/2016/03/mulheres-sao526-do-publico-que-joga-games-no-brasil-diz-pesquisa.html. Acesso em 29 mar. 2018.
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jornalista de games deve estar atento com à demanda do seu público e da indústria de games, pois são eles que ditam as regras. As redações das publicações impressas diminuíram. Essa queda se deve ao advento da internet, apresentando uma baixa de 9,6% nas mídias impressas em 201321. O público não quer mais esperar um mês para receber notícias ou descobrir como passar de determinada fase de um jogo. Cabe ao jornalista se adaptar à nova demanda de consumidores. Toda essa mudança afetou muito o número de páginas e o preço das revistas. A internet foi proporcionando espaço para pessoas que queriam escrever sobre games para ajudar outros jogadores na busca pela informação nos jogos. Com o tempo, projetos sérios começaram surgir e enriquecer com conteúdos, o cenário do jogos nacional. As publicações impressas possuem gastos que sites ou redes sociais não dependem, como a própria impressão das revistas e a comercialização. Muito do que é produzido na internet é gratuito. Como dito antes, existem inúmeros segmentos na produção de conteúdo, que trazem temas de um só estilo, jogo, etc, o que cria um público fiel e cativo do conteúdo, que vai procurar aquele veículo quando necessitar de explicação de alguma informação relacionada, o que é perfeito para o jornalismo de games. Os jornalistas têm como papel mostrar as novidades em primeira mão dos games que vão sendo lançados e transmitir suas experiências para o público. Ele têm de reportar sobre as falsas publicidades dos jogos e seus boatos. É preciso estar sempre inovando nesse mercado, que se adapta nas diferentes formas criadas para propagar a informação de games, que se alimenta de um público diversificado, tendo diferentes opiniões e gostos. Exatamente como a revista, a internet também foi muito importante para o jornalismo de games. Ela expandiu ainda mais as possibilidades de informação sobre jogos. Foi definitiva para a realização dos eSports, pelo fato dos jogos competitivos dependerem de conexão, para suas partidas, para suas transmissões via streams22 e para comunicação em tempo real com outros jogadores. Gil (2014) explica que a primeira geração da internet deve ser chamada de web 1.0. Criou-se uma sociedade da informação e da comunicação instantânea, que teria, com a internet, a possibilidade de consultar tudo a qualquer hora do dia23. Ela foi seguida pela web 2.0, que traz novas maneiras para desenvolver a comunicação, por meio das redes sociais (GIL, 2014)24. A terceira geração da internet, a web 3.0, lida com usuários que já nasceram conectados a rede. Essa fase se caracteriza pela ação cooperativa entre indivíduos e o computador ou qualquer outro 21 De acordo com pesquisa feita pelo Instituto Verificador de Circulação (IVC) 22 Stream: transmissão de um conteúdo ao vido por meio do digital. 23 Disponível em: https://repositorio.ipcb.pt/handle/10400.11/2404. Acesso em 14 mai. 2018. 24 Disponível em: https://repositorio.ipcb.pt/handle/10400.11/2404. Acesso em 14 mai. 2018. AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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aparelho que possa se conectar com a internet, como o celular. Atualmente, recursos disponíveis em telefones, permitem conhecer os hábitos de quem os utiliza, se adaptando a eles. Outra característica dada a web 3.0, é o controle do usuário pela busca por informações, dispensando a mediação de informação, geralmente feita pelos jornalistas. (COSTA, 2015) Pela internet é possível receber informações jornalísticas, ler e copiar e-books25, escutar músicas, assistir filmes, transferir arquivos, realizar compras, jogar online, utilizar redes sociais, enviar e-mails, uma infinidade de possibilidades. Nessa premissa, a internet cria novos meios de se comunicar, seja por texto ou por vídeo. A busca por informação e a publicação da mesma acaba sendo sempre instantânea. Novas comunidades sobre determinados assuntos, que antes pareciam pertencer só a um pequeno grupo, ganham proporções internacionais. Os games e toda sua mídia utilizou e cresceu junto com a rede, seja na inovação de poder jogar ao mesmo tempo com alguém do outro lado do mundo ou assistir a um profissional de algum determinado game mostrando dicas ao vivo para milhões de telespectadores. As oportunidades são infinitas. Em uma via paralela, o videogame possibilitou o surgimento de uma nova imprensa e também de um novo mercado de competições de games: os eSports, traduzido do inglês electronic sports, são competições de jogos eletrônicos. Segundo informações do site Voxel26, essa nova modalidade se difere dos esportes tradicionais, pois os competidores precisam ter agilidade e conhecimento estratégico para controlar determinado jogo. Algo muito semelhante com o xadrez. Tudo começou com competições de games na época dos fliperamas, onde os jogadores disputavam as maiores pontuações de games famosos naquele tempo. O primeiro torneio surgiu em 1972, Universidade de Stanford, nos EUA, como jogo Spacewar. Hoje, discute-se muito se os eSports podem ou não ser considerados esportes. Países como a Coréia do Sul, já investem forte nessa área. A possibilidade para que os competições de videogame participem nos Jogos Olímpicos de 2024 mostra a importância desse novo mercado. Um cenário que movimenta milhões, com transmissões realizadas em inúmeros portais da internet e que já começaram a ser veiculadas em canais tradicionais de televisão. Um fenômeno que vem conquistando fãs pelo mundo todo. A realização de grandes eventos sobre jogos eletrônicos também faz parte da cultura dos videogames. Esses eventos surgiram para que as empresas de games pudessem expor seus produtos para o consumidor. A cultura dos videogames surgiu quando os primeiros consoles foram comercializados. Após isso, os jogadores começaram a trocar jogos entre si, e a mídia começou a pautar os games em revistas especializadas. Nasce assim, uma cultura recorrente até hoje. Os jogos começaram a ficar cada 25 Um livro digital, sendo possível ler em equipamentos eletrônicos (PCs, tablets, celulares, etc.). 26 Disponível em: https://www.voxel.com.br/especiais/especial-esport-diversaogloria_824044.htm. Acesso em 04 abr. 2018.
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vez mais complexos e artísticos, com isso, hoje em dia, dependendo do game, é necessário centenas de pessoas para produzir um único jogo. Os videogames abrangem diferentes segmentos de jogadores. Gamers que por meio de sites e eventos, compartilham ideias e opiniões da indústria. No Brasil, são 61 milhões de usuários de jogos eletrônicos que movimentaram em 2016, 1,6 bilhões de dólares no mercado nacional de games27. Mesmo com um grande mercado de videogames, as barreiras de impostos do governo impedem que esses números sejam ainda maiores. A pirataria diminiu, mas ainda existem pessoas que não têm acesso aos videogames de última geração. Os sites, os eventos, os eSports e programas de TVs sobre games são os responsáveis em divulgar a importância dessa indústria. A cultura dos videogames é feita por quem sempre levou os jogos a sério. O PROGRAMA ZERO1 Feitas tais colocações sobre a trajetória da imprensa de games, segue-se com a Análise de Conteúdo, proposta por Bardin (2004), dos programas Zero1 selecionados para este estudo. Definiu-se então, cinco categorias para balizar a pesquisa: - Categoria Linguagem: verifica a linguagem que o apresentador Tiago Leifert utiliza no programa, da verbal a visual, como por exemplo, o uso de características da web na televisão. - Categoria História: verifica se o Tiago Leifert apresenta contextualiza os games apresentados. - Categoria Experimentação: verifica se o apresentador Tiago Leifert utiliza recursos, joga e experimenta os games e consoles no programa Zero1. - Categoria Análise: verifica o tipo de análise que o apresentador Tiago Leifert faz dos games apresentados por ele no programa. Se são análises profundas ou mais rasas. - Categoria Convergência Midiática: verifica se o apresentador Tiago Leifert utiliza recursos de convergência midiática, como por exemplo, mostrar o Twitter ou outras redes sociais. Apresenta-se, a seguir, os três programas, a partir das categorias definidas. PROGRAMA 1: exibido pela Rede Globo no dia 22 de outubro de 2016, abrindo a primeira temporada do Zero1. - Categoria Linguagem: o apresentador Tiago Leifert utiliza no programa uma linguagem informal. Ele não se preocupa em utilizar termos técnicos, que só os gamers reconhecem. O programa é ambientado em uma bancada 27 Disponível em https://istoe.com.br/infografico-mercado-games-brasil/. Acesso em: 27 abr. 2018. AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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tematizada, com objetos e imagens da cultura pop: jogos, quadrinhos, filmes, etc, que estão espalhados pelo cenário. Nesse programa, o apresentador convida um jogador profissional de FIFA, Wendell Lira, para disputar uma partida. Tiago, também, interage com as câmeras espalhadas pelo ambiente, onde suas expressões e até mesmo as ações feitas com o controle do videogame são gravadas. A edição do episódio conta com cortes rápidos, muito humor e uma tela para exibir o jogo e outra para mostrar Tiago e suas reações diante ao game. - Categoria História: nesse episódio, Tiago traz notícias do mundo dos games que saíram durante a semana. Ele não comenta muito sobre a história dos jogos apresentados, por se tratarem de games multiplayers e populares, FIFA e Battlefield 1. Nesse último, Tiago mostra um review do jogo, mas nada é aprofundado e acaba se tornando uma apresentação do game. No segundo bloco, Tiago parabeniza os 20 anos da personagem Lara Croft, do jogo Tomb Raider, mostrando a evolução gráfica da protagonista. - Categoria Experimentação: o apresentador utiliza o PlayStation 4 para apresentar os games. Tiago expressa suas emoções quando atinge determinado objetivo no jogo ou quando perde. Tudo é capturado e apresentado no programa, as gameplays são editadas, pois tudo o que foi gravado não é exibido, só as melhores partes. - Categoria Análise: Tiago Leifert não realiza nenhuma análise aprofundada dos dois jogos apresentados, ele apenas mostra gameplay dos jogos explicando umpouco sobre suas mecânicas de jogabilidade. - Categoria Convergência Midiática: como se trata do primeiro episódio exibido do programa Zero1, não existe muita interação com o público, muito menos o uso das redes sociais. PROGRAMA 2: programa exibido no dia 8 de julho de 2017. - Categoria Linguagem: Tiago Leifert continua utilizando no programa uma linguagem informal e mantém o uso de termos técnicos. Nesse episódio, o apresentador traz um convidado campeão mundial de speedruner28 de Super Mario World, Matheus Furious. O cenário continua sendo o mesmo. A dinâmica com as câmeras e a edição é a mesma, porém com influências de vídeos publicados nas redes. Os episódios ganharam uma edição de vídeo “especial” e toda a brincadeira feita por Tiago ganha humor. Ao final do programa, Tiago mostra um gameplay gravado em sua casa. - Categoria História: nesse programa, antes de começar a jogar Horizon Zero Dawn, Tiago conta a introdução do game para o público, que passa a entender como o universo do jogo funciona, antes de ser apresentado ao gameplay. Tiago não traz mais notícias da semana relacionado aos games.
28 Nos jogos eletrônicos, speedrun refere-se finalizar um determinado jogo no menor tempo possível.
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- Categoria Experimentação: o convidado do programa ensina ao telespectador como ele realiza as jogadas e Tiago explica as técnicas apresentadas pelo jogador, para que fique mais claro ao público que não entende sobre os glitches29 do jogo. Nessa gameplay, a imagem do game fica no meio da tela do programa, o jogador fica à esquerda, Tiago à direita e os dois também ficam no inferior da tela. Após o gameplay, o apresentador pede que o convidado termine o jogo até o final do programa, em seguida ele apresenta os bugs30 que foram gravados pelo público do Zero1. No último gameplay, mostra as mecânicas básicas do jogo Horizon Zero Dawn (game exclusivo do PlayStation 4). - Categoria Análise: nenhum dos dois jogos apresentados recebe de fato uma análise, apenas dicas e comentários sobre eles. Tiago comenta ao final do gameplay de Horizon Zero Dawn sua opinião positiva sobre o jogo. - Categoria Convergência Midiática: nesse episódio, Tiago interage com o público por meio da rede social Twitter, prática feita em todo o início de programa. Ele mostra comentários dos telespectadores, que realizam perguntas, elogiam o programa, pedem para participar do episódio, sugerem temas para serem debatidos, tudo por meio da hashtag #Zero1. PROGRAMA 3: primeiro episódio da terceira temporada, veiculado no dia 3 de março de 2018. - Categoria Linguagem: O apresentador continua trazendo convidados para o programa, todos ligados ao entretenimento na internet. Para esse episódio, Tiago tem dois convidados, Azaghal e Jovem Nerd, do canal Jovem Nerd31, veiculado no YouTube, e donos de um site32 com mesmo nome. Ambos são influenciadores digitais e também trabalham com conteúdo parecido com o programa Zero1. Tiago realizou com os convidados um jogo de perguntas e respostas sobre a cultura pop e, depois, uma partida de um jogo de tabuleiro. O ambiente continua sendo o mesmo e a dinâmica com as câmeras e a edição segue a mesma. Nesse programa, são apresentados dois gameplays, um do game Rocket League e outro do jogo FIFA, ambos games do cenário competitivo (eSports). - Categoria História: nesse programa não há nenhuma explicação sobre os jogos apresentados. - Categoria Experimentação: Tiago faz apenas uma apresentação do game Rocket League. Depois, o apresentador faz ao final do programa um gameplay do jogo FIFA com outro jogador. 29 Glitch: expressão utilizada entre os jogadores para definir falhas nos jogos sem nenhuma causa clara. 30 Bug: uma falha no game que ocorreu sem a culpa do jogador e sim no próprio jogo. 31 Disponível em: https://www.youtube.com/user/JovemNerd/about. Acesso em 22 mai. 2018. 32 Disponível em: https://jovemnerd.com.br. Acesso em 22 mai. 2018. AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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- Categoria Análise: não existe nenhuma análise dos games apresentados por Tiago Leifert. - Categoria Convergência Midiática: Tiago continua interagindo com o público no início do programa, e também ao final, por meio da rede social Twitter. O convidado que jogou uma partida de FIFA com o apresentador, é, segundo o programa, fã do Zero1, e utiliza da sua conta da rede PlayStation, a PSN, para realizar o gameplay online com o apresentador. Além disso, os convidados do programa, como citado, são influenciadores digitais. Essa escolha de Tiago em levar duas pessoas que têm importância na internet também é uma forma de convergência midiática. A partir das análises realizadas dos três episódios, é possível inferir que na categoria Linguagem, são utilizados termos técnicos direcionados a um público específico, lembrando das editorias de revistas segmentadas por determinados temas (SCALZO, 2006). Tiago utiliza sempre uma linguagem informal, coloquial e jovem. Segundo o site Press Start Brasil33, a imprensa de games vive um desafio no que tange ao conteúdo, ou seja, a diferenciação e ligação com outras áreas como o cinema e o jornalismo cultural de entretenimento. O programa Zero1 aborda também esses conteúdos. Conforme visto nesta análise, a abordagem dos conteúdos de games apresentados é repetitiva e superficial. Todos os programas são ambientados sempre na mesma bancada, que é tematizada com objetos e imagens da cultura pop. Assim, é possível notar a presença do “padrão Globo de Jornalismo”, que segundo as autoras Bistane e Bacellar (2005), essa expressão se deve à qualidade técnica, cenários elaborados, imagens apuradas dos telejornais e programas globais, produzidos pela emissora. Não existe dificuldade de acompanhar o programa, principalmente para um público mais jovem, que se acostumou com a agilidade proporcionada pela internet. Tiago também grava gameplays em casa, para depois exibir no programa. Na categoria História, verifica-se que todo o jogo apresentado no programa recebe uma pequena introdução antes do gameplay começar. Tiago Leifert conta um pouco sobre os objetivos de determinado game, sem se aprofundar em sua história. Quando o jogo apresentado é o FIFA ou outro que não dependa muito de seu enredo, Tiago parte direto para o gameplay. Segundo o site Press Start Brasil34, os programas, de um modo geral, não informam o público, pois quando a revista EGM chegou ao Brasil, ela trazia matérias produzidas e pautadas pela própria redação, o que levava os jornalistas a terem o compromisso de identificar o seu público, informando e fazendo denúncias de situações que aconteciam ao seu redor. Zero1 não traz esse compromisso. Identifica-se mais gameplay 33 Disponível em: http://warpzone.me/pressstartbrasil/index.html. Acesso em 26 mar. 2018. 34 Disponível em: http://warpzone.me/pressstartbrasil/index.html. Acesso em 26 mar. 2018.
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e a apresentação do jogo, do que um conteúdo mais profundo e mais elaborado. Muitos dos games que apareceram são jogos competitivos e presentes no cenário dos eSports. O FIFA, por exemplo, aparece muito nos programas, pois, o jogo, é narrado oficialmente pelo próprio Tiago Leifert. Segundo o site Voxel35, os jornalistas que atuam nesse cenário dos games competitivos, acompanham todos os torneios e informam o público sobre os assuntos que interessam ao público de determinado jogo desse ramo. Zero1 não informa os gamers sobre esse cenário, mas traz, sempre que possível, algo relacionado aos eSports. Rezende (2000) destaca que a televisão no Brasil não é um veículo de comunicação qualquer, mas sim o mais importante. Para ele, muitos brasileiros dependem da TV para terem acesso às notícias e ao entretenimento. E, o programa não se preocupa em informar e trazer matérias em profundidade sobre games para o público, existe apenas a intenção de entreter e não de informar. Na categoria Experimentação, verificou-se que o apresentador Tiago Leifert utiliza-se de recursos para realizar seus gameplays e traz sua experiência ao jogador, porém em um curto período de tempo. Como o site Press Start Brasil36 abordou, existia no surgimento da imprensa de games no país, uma dificuldade em capturar as imagens dos jogos, pois para conseguir imagens de determinadas partes do game. Assim muitos gravavam diretamente da televisão ou tiravam fotos da tela pausada do game. Hoje, com recursos mais avançados de softwares e hardware especiais para a captura de gameplays, Zero1 realiza esses processos sem nenhuma dificuldade e traz fielmente as imagens do jogo para os gamers. Na categoria Análise, observou-se que Tiago não realiza nenhum review nos jogos que ele apresenta. Conforme Fernandes (2017), o jornalismo de games segue a linha do entretenimento, algo muito presente no programa Zero1. A autora destaca ainda, que quem trabalha nessa área posta análises de jogos eletrônicos e informações sobre novidades desse universo, o que não é muito visto no Zero1. Acredita-se que isso pode comprometer o programa, pois ele precisa competir com a internet e com o impresso. Como o Zero1 está presente no site Globo Play, ele não fica para trás em relação a outros veículos, porém seu foco é a TV. Na internet, é possível receber informações jornalísticas, escutar músicas, jogar online, interagir nas redes sociais, ou seja, uma infinidade de possibilidades. A televisão é limitada e só traz conteúdo em áudio e vídeo, lembra Costella (2002). Por isso, quanto mais conteúdo, melhor para o programa, e como foi visto na análise dos três programas, os gameplays não trazem nada de novo. Na categoria Convergência Midiática, identificou-se que o programa 35 Disponível em: https://www.voxel.com.br/especiais/especial-esport-diversaogloria_824044.htm. Acesso em 04 abr. 2018. 36 Disponível em: http://warpzone.me/pressstartbrasil/index.html. Acesso em 26 mar. 2018. AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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se utiliza das redes sociais para interagir com o público. A ideia de se comunicar com os jogadores que acompanham o Zero1 lembra muito com o que era visto nas revistas especializadas em games. Para o site Press Start Brasil37, as publicações eram um meio para que os gamers pudessem se identificar, onde podiam interagir com outros jogadores. Hoje, esse o sistema de interação do programa de Tiago Leifert é feito pela internet. Assim, esse método entra na categoria da web 2.0, pois, segundo Gil (2014), traz novas maneiras para desenvolver a comunicação, por meio das redes sociais. O programa também encaixa-se na Web 3.0, que de acordo com Costa (2015), lida com usuários que nasceram conectados à rede. O programa Zero1 é exibido tanto na televisão, quanto na internet onde existe um controle do usuário na busca por informações, dispensando a mediação, geralmente feita pelos jornalistas. Isto está está presente no Zero1, pois ele utiliza das redes para interagir com o público e realizar partidas com os telespectadores. Porém, a figura do apresentador jornalista Tiago Leifert é de mediador da informação no programa. Essa interação com a internet é essencial para o programa, pois ele lida com os gamers, que atuam fortemente na rede, meio de comunicação que vem ganhando cada vez mais espaço. Um estudo realizado pela Pesquisa de Mídia Brasileira em 2015, divulgada pela Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, mostrou que os brasileiros passam em média, quatro horas e 59 minutos ao dia usando a internet durante a semana e o tempo que as pessoas ficam em frente à TV, é em torno de quatro horas e 31 minutos durante a semana. Isso demonstra que a televisão vem perdendo espaço para a internet, onde é possível encontrar o conteúdo que o público necessita, inclusive de games, que são comuns nesse meio. E, mesmo assim, tem-se um programa que debate o assunto de jogos eletrônicos na televisão. Sendo assim, entende-se que o programa aborda um conteúdo superficial sobre os games. O apresentador Tiago Leifert não busca realizar um comentário mais elaborado sobre os jogos ou contar a história do game, apenas os apresenta, para um público que, muitas vezes, já conhece as informações sobre os jogos apresentados. Os convidados são sempre influenciadores digitais, o que pode ser um dos motivos do programa conseguir prender o público, pois esses influenciadores estão ativamente na internet, local onde muitos dos gamers atuam para buscar informações sobre seus jogos e acabam conhecendo essas personalidades. Todo o conteúdo de game que o Zero1 traz é puro entretenimento, com comentários engraçados do apresentador, seguido de edições bem humoradas, demonstrando ao público que o programa não se preocupa em informá-lo e tem como inspiração os conteúdos superficiais de alguns vídeos no YouTube. Tiago realiza inúmeras reações em frente a câmera 37 Disponível em: http://warpzone.me/pressstartbrasil/index.html. Acesso em 26 mar. 2018.
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quando está jogando determinado game, algo que passa experiência do jogo para o gamer que ainda não teve contato com o game. Mesmo assim, não existe nenhuma análise detalhada dos jogos apresentados. Acreditase que o programa Zero1 continuará se mantendo-se assim, pois ele já está em seu terceiro ano, significando que essa fórmula está dando certo, deixando de lado um investimento maior na qualidade do conteúdo de games nos programas. REFERÊNCIAS 20 Anos de PlayStation. Playstation: Revista Oficial - Brasil, São Paulo, edição 213, p. 16-47, nov. 2015. AMOROSO, Danilo. A história dos video games: do osciloscópio aos gráficos 3D. Tecmundo, dez. 2009. Disponível em: <https://www.tecmundo.com.br/ xbox-360/3236-a-historia-dos-video-games-do-osciloscopio-aos-graficos-3d. htm>. Acesso em: 11 abr. 2018 Após 16 edições, revista Game Informer brasileira é cancelada. UOL Jo- gos, jan. 2018. Disponível em <https://jogos.uol.com.br/ultimas-noticias/2018/01/11/ apos-16-edicoes-revista-game-informer-brasileira-e-cancelada.htm>. Acesso em: 04 abr. 2018. BARBOSA, Marialva Carlos. Imaginação Televisual e os Primórdios da TV no Brasil. In: RIBEIRO, Ana Paula Goulart; SACRAMENTO, Igor; ROXO, Marco (Orgs). História da Televisão no Brasil. São Paulo: editora Contexto, 2010. 15 p. BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70 2004, 3ª ed, 2004. BISTANE, Luciana; BACELLAR, Luciane. Jornalismo de TV. São Paulo: editora Contexto 2005. BRANDÃO, Cristina. As Primeiras Produções Teleficcionais. In: RIBEIRO, Ana Paula Goulart; SACRAMENTO, Igor; ROXO, Marco (Orgs). História da Televisão no Brasil. São Paulo: editora Contexto, 2010. 38 p. Brasil tem 116 milhões de pessoas conectadas à internet, diz IBGE. G1, jan. 2018. Disponível em <https://g1.globo.com/economia/tecnologia/noticia/ brasil-tem-116-milhoes-de-pessoas-conectadas-a-internet-diz-ibge.ghtml>. Acesso em: 18 abr. 2018. COELHO, Cido. A história da E3. TechTudo, jun. 2012. Disponível em <http:// www.techtudo.com.br/noticias/noticia/2012/06/a-historia-da-e3.html>. Acesso em: 27 abr. 2018. CHIADO, Marcus Vinicius Garrett. 1983+1984 Quando os Videogames Chegaram [recurso eletrônico]. 2016. Com Conteúdo ‘denso’, Revista Game Informer Chega ao Brasil. IGN Brasil, out. 2016. Disponível em <http://br.ign.com/brasil/40787/news/comconteudo-denso-revista-game-informer-chega-ao-brasil>. Acesso em: 04 abr. 2018.
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INFOTENIMENTO NO TELEJORNALISMO
Capítulo 3
O INFOTENIMENTO NO TELEJORNALISMO: UMA ANÁLISE DAS REPORTAGENS DE PHELIPE SIANI NO JORNAL NACIONAL Luciana Dias Rabassa
O telejornalismo brasileiro tem se modificado ao longo dos anos. Atualmente, a população tem à disposição e em tempo real diversas maneiras de obter a informação. Os telejornais necessitam fidelizar os telespectadores e muito disso está relacionado às matérias produzidas. Por um jornalismo mais flexível e leve, as emissoras passaram a utilizar uma linguagem mais informal: as edições das reportagens são atrativas e com trilha sonora. O texto arrojado, dinâmico e sedutor que, por vezes, faz uso da narrativa em primeira pessoa, fez com que o tom impessoal cedesse espaço à pessoalidade. O estilo quadrado e formal deu espaço à descontração, leveza, discurso palatável e improvisação: uma forma de bate-papo com o telespectador. Essas são características das reportagens do jornalista Phelipe Siani, veiculadas no Jornal Nacional, na Rede Globo. O jornalismo tradicional sempre deu ênfase a assuntos relacionados à política e economia, pois a informação traz conhecimento. Mas cabe questionar se só a informação basta. A população quer informação, mas também busca entretenimento. Apesar de parecer algo distante e inatingível, os dois elementos podem caminhar juntos e interagir entre si. E, certamente, as redes sociais são uma espécie de termômetro para testar novas técnicas no jornalismo. Com isso, o infotenimento (informação+entretenimento) é um conceito para entender de que modo se comportam os produtos de mídia e sua adequação às audiências na contemporaneidade. Na sociedade da informação, o importante é que a notícia se dissemine e, com isso, a reportagem pode informar e entreter o telespectador ou até mesmo entreter por meio da informação. Com a base neste cenário, a pesquisa desenvolvida neste artigo é qualitativa, do tipo exploratória e descritiva, de acordo com Gil (2008). Com AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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o uso da pesquisa bibliográfica, da pesquisa documental e da observação simples, busca-se verificar como o repórter Phelipe Siani utiliza elementos característicos do infotenimento nas reportagens produzidas para o Jornal Nacional, da Rede Globo. A partir da análise de conteúdo (BARDIN, 2011), tem-se como objeto de estudo, quatro matérias veiculadas nos anos de 2015, 2016 e 2017. A definição da amostra se deu de forma aleatória (GIL, 2008). Uma matéria é sobre economia e as outras são matérias mais descontraídas, mas que não deixam a informação em segundo plano. TELEJORNALISMO E INFOTENIMENTO A televisão ocupa um lugar privilegiado nos meios de comunicação. Nos países que dispõem de meios alternativos de informação, ela divide a preferência do público com os jornais, revistas, rádio e, nos últimos tempos, com a internet. Para Rezende (2000), a TV não é apenas um veículo de comunicação. Ela desfruta de um prestígio tão considerável que assume a condição de única via de acesso às notícias e ao entretenimento ao mesmo tempo. Nenhum jornalista de televisão duvida que a imagem que fascina e prende a atenção das pessoas, aliada ao som envolvente e emocionante, muitas vezes mostrando acontecimentos mais importantes, transforma a televisão no veículo mais poderoso que já foi inventado. (MACIEL, 1995, p. 16).
Os jornais de grande difusão nacional têm um público muito menor se comparados ao público dos principais telejornais veiculados no horário nobre. O leitor só lê o que lhe interessa. “É por causa desse telespectador passivo que o telejornalismo torna-se mais importante do que se imagina, a ponto de representar a principal forma de democratizar a informação” (REZENDE, 2000, p. 24). O telejornal tem um controle de penetração e é especialmente através dele, que se apresenta como porta-voz dos acontecimentos no país e no mundo, que muitos brasileiros pensam tomar conta dos principais fatos e notícias que se sucedem no dia (PICCININ, 2004). Bucci e Kehl (2004, p. 29) definem o telejornalismo como “[...] uma ferramenta moderna para economizar tempo e aplacar as distâncias, uma ferramenta que tem a forma de uma janela para o mundo”. Considerando a importância do telejornalismo, Padeiro (2015) lembra que a partir da segunda metade do século XX, os meios de comunicação criaram diversas formas de distração e transformaram o entretenimento em uma indústria. O texto escrito não era mais o crivo essencial para que homens e mulheres tivessem acesso às informações e às opiniões. “A massa iletrada entra em cena, movida, sobretudo, pelo consumo do entretenimento” (BUCCI, 2009, p. 68 apud PADEIRO, 2015, p. 22). A união do jornalismo com o entretenimento implementou novas categorias de informação socializada, entre elas o infotenimento (informação+entretenimento) (PADEIRO, 2015). Segundo Dejavite (2007), o conceito de infotenimento obteve visibilidade na década de 90, sendo 52
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empregado por profissionais e acadêmicos da área de Comunicação como sinônimo daquele jornalismo que traz a informação, prestação de serviços e ao mesmo tempo divertimento. “Quando uma pessoa assiste ao Jornal Nacional, principal telejornal da Rede Globo há mais de quatro décadas, ela está se informando ou se entretendo? A resposta é: está fazendo ambos”, observa Padeiro (2015, p. 10). O infotenimento no telejornalismo visa informar e entreter o telespectador, já que o consumo da informação é feito naquele tempo destinado ao lazer e à diversão. Rabaça e Barbosa (1978) afirmam que o entretenimento é representado pelas reportagens recreativas e está inserido até nas matérias de formato informativo. Para Glaber (1999, p. 25), significa “um espetáculo público ou mostra destinada a interessar e divertir”. Segundo Martino (2017 p. 155), o infotenimento é uma “articulação estética para tornar informações reais agradáveis e fáceis de serem compreendidas ou mesmo borrar a fronteira entre informação e entretenimento passando mensagens sérias ao lado de atrações mais leves”. Cirino e Braga (2016, p. 62-63) acreditam o infotenimento é capaz de “conquistar audiência, dar vazão ao uso de novas tecnologias […], bem como mantém o compromisso da imprensa com a informação atual, verídica e capaz de tornar a apreensão dos fatos de maneira mais emocional ou útil para os públicos”. Por sua vez, Dejavite (2007) explica que uma mesma reportagem pode muito bem informar entretendo, ou então entreter por meio da informação. Há pouco tempo havia pouca preocupação em satisfazer os interesses do receptor. Atualmente, ele participa cada vez mais sobre o que deseja receber. Portanto, as empresas jornalísticas estão transformando a dinâmica da criação das notícias. O público (com os seus novos princípios de receber a informação) exige que a notícia – independente do meio em que estiver inserida – informe, distraia e também lhe traga uma formação sobre o assunto publicado. Se as informações jornalísticas não tiverem essas características, não vão chamar a atenção da audiência. Agora, a notícia tem que ser light (DEJAVITE, 2007, p. 4).
Dejavite (2007) pondera que a notícia light, uma das características do infotenimento, é composta por um conteúdo de fácil entendimento, rápido, efêmero, com linguagem descontraída, discurso convincente que busca divertir o receptor, onde ele espera encontrar na matéria seus interesses e suprir suas necessidades de informar e formar, mas também busca distração e vivência do fato. “Este comportamento é facilmente percebido nos noticiários de TV ao observarmos a postura de repórteres e apresentadores – cada vez mais à vontade em cena” (MAIA, 2011, p. 9). O repórter também tem a missão de atingir pessoas mais instruídas e aquelas que tiveram menos oportunidade de educação. Com isso, ele necessita utilizar uma linguagem simples e clara para ser compreendido (LOEBLEIN, 2017). Paternostro (2006, p. 94) destaca que, “sempre que AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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o jornalista escrever para a TV, deve lembrar que é um contador de história”. O repórter deve “contar” a informação de uma maneira que toda a sociedade entenda, como se estivesse conversando com uma pessoa, utilizando linguagem oral, típica do cotidiano. Assim, o texto será assimilado instantaneamente por milhões de telespectadores. Para Araújo (2017), a busca por um texto coloquial melhora a comunicação com o telespectador, pois as pessoas estão acostumadas com a linguagem informal utilizada no dia a dia. Um texto simples tem a capacidade de atingir um público heterogêneo. Portanto, o texto para TV deve, sim, refletir a linguagem popular, ser mais dinâmico, marcado por uma grande fluidez verbal, mas sem prescindir das principais regras da norma culta da língua. Em outras palavras, nesse tipo de texto deve-se usar a linguagem coloquial, mas sem excessos. Deixemos claro que não existe certo ou errado, mas adequado e inadequado. (ARAÚJO, 2017, p. 125).
A Rede Globo tem sido uma das primeiras emissoras a investir na busca de uma nova linguagem, uma nova forma de reportar as notícias envolvendo e instigando o telespectador a participar. Maia (2011, p. 9) afirma que “é possível observar nos telejornais da emissora, inclusive no JN, a aposta no jornalismo mais coloquial, informal, produzido quase que em parceria com o público”. A regra nas redações é ousar, arriscar, criar sem medo de errar e romper padrões que por muitos anos foram cultivados, mas que se mostram ineficazes na conquista do telespectador contemporâneo. “O princípio na redação passou a ser: como explorar e transmitir de forma criativa o material que as equipes trazem da rua” (MAIA, 2011, p. 11). Gomes (2009) também analisa o telejornalismo atual apontando alguns elementos do infotenimento em telejornais brasileiros, a partir do Jornal Nacional, como por exemplo o uso de recursos sonoros e visuais, como cores, gráficos, vinhetas, trilhas sonoras; narrativa leve e agradável, juntamente com um discurso mais pessoal e subjetivo; bate-papo entre apresentadores e repórteres; abordagem de temas de interesse público do ponto de vista das suas implicações mais ime- diatas na vida de sujeitos individuais; ênfase em comportamento, bem-estar e cuidado com o corpo. “Infotainment, nesse sentido, seria um não-gênero: ele serve para classificar rapidamente os produtos televisivos que não se enquadram muito claramente em nenhum dos gêneros televisivos que conhecemos” (GOMES, 2009, p. 208-209). As mudanças no telejornalismo também ocorreram pelo fato de sua hegemonia estar sendo afetada pelo avanço de novas tecnologias que contribuem para que as notícias tenham fácil acesso em tempo real. De acordo com a Pesquisa Brasileira de Mídia (PBM 2016)1, a rede mundial de computadores, mesmo sendo a segunda opção dos brasileiros na busca de 1 Disponível em: http://www.secom.gov.br/atuacao/pesquisa/lista-de-pesquisasquantitativas-e-qualitativas-de-contratos-atuais/pesquisa-brasileira-de-midiapbm-2016-1.pdf/view> Acesso em: 04 de abril de 2018.
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informação – atrás somente da televisão (89%) – é acessada por quase metade dos brasileiros (49%) para obter notícias, ficando bem acima do rádio (30%), dos jornais (12%) e das revistas (1%). Além disso, pessoas com ensino superior completo assistem menos televisão, confiam menos no que é noticiado nos telejornais, e 28% da população utiliza o celular enquanto assiste TV. Tendo em vista que a população mais jovem (16 a 24 anos) usa a internet por 6 horas e 17 minutos durante a semana, e 79% das pessoas estão conectadas no celular quando estão em casa – sendo que o percentual sobre para 93% quando consideradas a primeira e segunda menção – consequentemente, essa influência faz com que os telejornais adequem suas estruturas discursivas e de produção por causa do impacto dos sistemas digitais atuais. Mesmo com a evolução e transformações estruturais no telejornalismo, Dejavite (2007) afirma que muitos acadêmicos e profissionais da área da Comunicação têm receio de que a notícia light se sobreponha ao conteúdo mais sério, como o de economia e política, por exemplo, mudando o significado do que é notícia. A união entre entretenimento e informação faz com que o jornalismo de infotenimento sofra preconceito e falta de credibilidade. Para Gomes (2009, p. 210), o infotenimento é uma estratégia de produção midiática, “que potencializa a criatividade e não interdita a qualidade”. O termo infotenimento vem sendo empregado por autores de diversos países também. Padeiro (2015) cita Mark Deuze, da Universidade de Amsterdã. O autor pondera que o “infotenimento é uma realidade no jornalismo contemporâneo – que não pode ser aceita como sinônimo de perda da qualidade de informar” (DEUZE, 2011 apud DEJAVITE, 2003, p. 171). No jornalismo atual, mais importante que dar o furo de reportagem ou manter padrões ultrapassados, é fazer a notícia se propagar em grande escala, fazer com que ela alcance o telespectador. A visão negativa em relação ao infotenimento “está fundamentada no equívoco de encarar o universo do entretenimento e do lazer como coisas menores”. (DEJAVITE, 2007, p. 09). Contudo, o receptor tem uma visão diferente: para ele, o entretenimento é aquilo que entretém, a ausência do tédio, pois as pessoas buscam distração por estarem consumindo esse produto no tempo livre. A divisão de informação e entretenimento não tem nenhum fundamento para o telespectador, pois “o oposto da mensagem de entretenimento veiculada pela mídia não é o conhecimento informativo, mas o conteúdo que não lhes agrada, as matérias enfadonhas, que não atraem a atenção” (DEJAVITE, 2007, p. 10). Dejative, em entrevista para Padeiro (2015, p. 31)2, afirma que a mudança no modo de transmitir a informação (formato e linguagem) é consequência da sociedade atual. “Com o desenvolvimento das novas 2 Dejavite, Fábia A. Entrevista concedida à Carlos Henrique de Souza Padeiro. São Paulo, 4 de novembro de 2014. AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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tecnologias, novas plataformas de mídia, alguns valores foram ressaltados: a comunicação e o entretenimento. Na sociedade da informação, a comunicação não pode ser feita sem entretenimento”. Por não haver maneiras de fugir da junção informação + entretenimento, Maia (2011, p. 11), completa: Acertando ou não, fato é que o telejornalismo despertou para a necessidade de vislumbrar novos caminhos, novos meios de atingir um telespectador que quer conteúdo e qualidade. A antiga receita “cabeça + VT + nota-pé” já se tornou entediante e ultrapassada. É preciso surpreender quem está do outro lado da tela; reinventar os telejornais numa época em que os telespectadores têm se revelado mais exigentes e imersos em novas formas de consumo cultural, propiciadas pelas tecnologias do disponível e do descartável; sem contar o aumento do poder de consumo das classes de menor poder aquisitivo – inclusive no que diz respeito ao consumo de informação.
Dejavite (2007) finaliza ao afirmar que não há como questionar a importância do infotenimento, que se expande cada vez mais. Se o jornalismo negar esse conteúdo para o telespectador, também estará negando o compromisso de informar e formar opinião. O JORNAL NACIONAL E PHELIPE SIANI O Jornal Nacional é o ícone do telejornalismo da Rede Globo. Segundo Bonner (2009, p. 17), “tem por objetivo mostrar aquilo que de mais importante aconteceu no Brasil e no mundo naquele dia, com isenção, pluralidade, clareza e correção”. Com isso, o JN investe cada vez mais em uma linguagem mais informal, algo mais próximo da linguagem oral, para que o telejornal possa contemplar a todos os telespectadores. Em relação às mudanças no JN, de acordo com o atual editor-chefe adjunto do Jornal Nacional, Fernando Castro, em entrevista para Pereira (2015, p. 49)3, o Jornal Nacional obviamente teve uma mudança grande, que foi a mudança do formato, do cenário. Junto com essa mudança, o que a gente fez e está fazendo é um desafio diário. Houve, sim, uma mudança da, vamos dizer, linguagem, da forma como a gente apresenta o nosso conteúdo. Então, você pode talvez dizer que houve uma mudança para que o jornal fique mais informal do que era antes (PEREIRA, 2015, p. 49).
Com as mudanças na estrutura do JN, a reportagem sofreu mudanças também. De acordo com Pereira (2015), o telejornal ganhou novos nomes, como o de Phelipe Siani, que é considerado um modelo da era informal do 3 Disponível em: http://bdm.unb.br/bitstream/10483/12161/1/2015_IngridBorgesDuartePereira.pdf.>. Acesso em: 25 de março de 2018.
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JN. “Esses repórteres têm em comum o fato de serem jovens – todos estão na faixa dos 30 anos – e apresentam matérias com uma postura informal, descontraída e popular” (PEREIRA, 2015, p. 84). Fernando Castro4 afirma que “[... com essa mudança para fazer um jornal que traga informação de uma forma mais objetiva e, em determinados casos de uma forma mais leve, surgiram novos talentos” (PEREIRA, 2015, p. 85). Ele ressalta que os novos profissionais têm feito muito sucesso e que as pessoas estão encantadas. O departamento de arte também é muito importante para que o telejornal seja mais atraente para o telespectador. De acordo Fernando Castro5, esse setor vem trabalhando muito para isso. É tudo uma parceria, você tem um repórter que tem a missão de contar aquela história de uma forma objetiva, clara, que as pessoas consigam realmente compreender, entender, sem usar frases pesadas demais. E aí vem a arte, os gráficos, a tentativa de fazer de uma forma atraente, de uma forma que seja visualmente legal, bacana (PEREIRA, 2015, p. 62).
De acordo com Araújo (2017), o Jornal Nacional não estagna, ele não para de inovar e sempre acompanha as novas tecnologias. O telejornal acumulou diversos prêmios e até hoje é líder de audiência. Phelipe Siani6 é um jornalista de 32 anos, formado em 2005 pela Universidade Católica de Santos (UniSantos). Em 2013, realizou um curso de cinema na New York Film Academy. Em 2015, estudou na Escuela Internacional de Cine y TV de San Antonio de Los Baños. A primeira experiência profissional de Siani foi em uma assessoria de comunicação na Baixada Santista7. Em 2005, último ano de faculdade, ingressou como estagiário na TV Globo São Paulo, sendo selecionado entre 2.500 concorrentes. Passou pelo SBT e em 2011, retornou à TV Globo como Repórter Especial. Siani se destaca pelo estilo informal, dinâmico e criativo de conduzir suas reportagens, tentando romper algumas “mesmices” que ainda existem no telejornalismo. Adepto da linguagem coloquial, consegue atingir diversos públicos e tornar qualquer pauta interessante. Em uma palestra na UniSantos, Phelipe citou o exemplo de uma reportagem sobre economia, que foi reportada através de uma receita de bolo. Explicativa, a matéria possui uma narrativa simples e abordagem atraente, de forma que todos pudessem entendê-la.
4 Disponível em: <http://bdm.unb.br/bitstream/10483/12161/1/2015_ IngridBorgesDuartePereira.pdf>. Acesso em: 25 de março de 2018. 5 Disponível em: <http://bdm.unb.br/bitstream/10483/12161/1/2015_ IngridBorgesDuartePereira.pdf>. Acesso em: 28 de março de 2018. 6 Disponível em: <https://br.linkedin.com/in/phelipe-siani-44a119150l>. Acesso em: 25 de março de 2018. 7 Disponível em: <http://www.usc.edu.br/circulodigital/phelipe-siani-ministra-palestra-noii-jornalismo-em-pauta/>. Acesso em: 25 de março de 2018. AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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Feitos tais apontamentos teóricos, parte-se para análise das matérias preveamente selecionadas. A primeira, sob o título “Pelo 5º ano, Brasil cai no ranking das economias mais competitivas do mundo”, foi veiculada em 28 de maio de 2015. A segunda matéria é do dia 31 de maio de 2016 e tem como título “Consumidores buscam parcelamento longo e barato, diz pesquisa”. A terceira, intitulada como “Em São Paulo, moradores lutam contra invasão dos pernilongos”, foi transmitida em 12 de janeiro de 2017. A quarta reportagem, sob o título “ONU lança guia que ensina a ajudar o planeta até do sofá de casa”, é de 12 de dezembro de 2017. Tomando por base os conceitos da análise de conteúdo, proposta por Bardin (2004), opta-se pela análise categoria. Sendo assim, considera-se as seguintes categorias de análise: - Vocabulário informal/coloquial: tendo em vista que o jornalista conta uma história, conversa com o telespectador de forma muito próxima/ pessoal, essa categoria verifica se o repórter faz uso de expressões populares e coloquialismos que, normalmente, são utilizadas oralmente no cotidiano, assim como gírias, palavras abreviadas e espontâneas. Também verifica se o modo de falar é descontraído, apesar de seguir os critérios jornalísticos. - Discurso pessoal e subjetivo: verifica se a narrativa de Phelipe Siani é opinativa, que depende de seu ponto de vista pessoal/individual, se o texto é elaborado em primeira pessoa, expondo ideias, críticas e reflexões pessoais. - Uso de recursos sonoros, visuais e tecnológicos, cores, gráficos, vinhetas, selos, trilhas sonoras: com o desenvolvimento tecnológico, cada vez mais alguns recursos sonoros e visuais são utilizados em reportagens. Além de servir para uma compreensão melhor dos dados/ informações, também auxilia positivamente na interação do telespectador com a reportagem. Por isso, essa categoria analisa se Phelipe utiliza tais recursos tecnológicos em suas reportagens. - Posicionamento mais livre, espontâneo e despojado frente às câmeras: verifica o comportamento de Phelipe Siani frente às câmeras ao interagir com as fontes e com os telespectadores, assim como sua expressão corporal e modo de conduzir a reportagem. - Notícia light (narrativa simples, modo fácil de ser entendida e comentada): sendo a notícia light uma característica do infotenimento, essa categoria analisa a forma com que Phelipe Siani reporta a informação ao telespectador, além de verificar se o modo com que o repórter conta a história é didático, se ele consegue, de forma simples e clara, fazer com que o público compreenda as informações. Também observa a maneira de interagir com o telespectador verbalmente, como tom de voz e jeito de se expressar. Um texto simples tem a capacidade de atingir um público heterogêneo. - Informação aliada à diversão e distração: de acordo com o infotenimento, uma uma reportagem deve informar e entreter, pois 58
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o consumo da informação é feito naquele tempo destinado ao lazer e à diversão. Nesse quesito, a categoria tem o objetivo de analisar se Phelipe Siani utiliza elementos para tornar as informações agradáveis, atraindo a atenção do público, transformando a dinâmica da criação das notícias, explorando e transmitindo de forma criativa o material produzido, envolvendo o telespectador, que busca prestação de serviço mas também distração, longe de matérias entediantes e enfadonhas. Matéria 1: Pelo 5º ano, Brasil cai no ranking das economias mais competitivas do mundo, veiculada em 28 de maio de 2015 Com 2 minutos e 55 segundos, Phelipe Siani, de forma didática, noticia um assunto importante, visivelmente interessado em fazer com que o telespectador pudesse compreender o que estava sendo informado. Para isso, no início da matéria, o repórter indaga sobre o que o público considerava competitividade. Na sequência, mostrou exemplos de competições no vôlei, corrida, automobilismo e fez uma passagem ilustrando, através de recursos tecnológicos, o que economistas consideravam como competitividade em relação às empresas de fora concorrendo com o Brasil de forma igual. Ou seja, quanto mais fácil for para uma empresa funcionar em um país, mais competitivo ele é. A partir disso, Phelipe sugere que são muitos os ingredientes necessários para que a receita seja de sucesso. Com isso, ele pensa em esclarecer essas informações de acordo com uma receita de bolo. Segundo Siani, o Brasil já erra nos primeiros ingredientes pela carga tributária alta e sistema regulatório desfavorável. Para explicar esses dados, ele conversa com o professor da fundação Dom Cabral, Carlos Arruda, enfático ao afirmar que, em relação ao mundo culinário, a farinha do Brasil está velha e não compatível com uma farinha que prepararia um bolo ideal. No próximo momento, um confeiteiro faz um bolo e cada ingrediente significa um fator: altos impostos, legislação complexa, falta de mão de obra e infraestrutura ruim. O açúcar despejado em demasia representa os juros altos e a alta quantidade de manteiga significa a inflação acima da meta. Na sequência, os ovos aplicados de forma correta revelam boas notícias: investimento internacional maior que o esperado, e o leite representa que a taxa de desemprego (4,8%) ainda é menor que a mundial (7,8%), estando o Brasil em quinto lugar no índice de países que mais atraem investimentos estrangeiros. Em relação ao fermento, que deveria ser adicionado em uma colher cheia, representando o crescimento da economia, foi colocado apenas uma “pitada” do condimento (0,1%). Ao final do preparo do bolo, foi acrescentado bananas podres para definir a corrupção, que é um dos maiores problemas do país. O bolo foi para o forno, sendo assado e desenformado, resultando é o 56º pior bolo do mundo. Logo foi exposto na vitrine, ao lado de bolos bonitos, decorados e atrativos, representando os países que estão nas primeiras colocações no ranking mundial, que cuidam bem melhor do AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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processo de produção. Ao final da matéria, Phelipe pergunta: “Diante de todos esses bolos, cê compraria o brasileiro?”, e mostra um exemplo de bolo bonito, na esperança do que o Brasil poderia se tornar um dia. Análise - Vocabulário informal/coloquial: mesmo se tratando de um assunto sério, Phelipe utiliza uma linguagem informal durante toda a matéria. Além de falar de forma descontraída e utilizar palavras abreviadas, o repórter utiliza termos coloquiais que são geralmente ditos na linguagem oral, como em uma conversa entre amigos, interagindo com o público. Isso fica claro logo no início da reportagem, quando o repórter diz, para o telespectador: “responde aí”. Além disso, Siani também faz uso de expressões como “sei lá”, “tá”, “cê”, “tipo”, “pitadinha de nada”, “muito além da conta”, “carro que parece um avião, de tão rápido”. Até mesmo a fonte especialista participa dessa descontração junto de Siani, sendo a entrevista informal também. - Discurso pessoal e subjetivo: como naturalmente ocorre em uma matéria, o repórter narrou a matéria na terceira pessoa. Todos os dados fornecidos são de acordo com o relato da fonte, assim como também de órgãos especializados. Phelipe não realizou a matéria de forma opinativa, crítica ou baseado em reflexões próprias, apesar de ter utilizado termos pessoais para relatar algumas informações, além de usar sua criatividade para montar a reportagem. - Uso de recursos sonoros, visuais e tecnológicos, cores, gráficos, vinhetas, selos, trilhas sonoras: a matéria utiliza diversas ferramentas tecnológicas em seu decorrer, do início ao fim. Esse método é importante para a compreensão das informações do assunto pautado. Na primeira parte da matéria, Phelipe “apoia” em suas mãos, através de recurso visual, um gráfico de duas empresas, uma americana e outra brasileira, onde ele as compara gesticulando. Em seguida, ele sugere explicar essa competitividade através de uma receita de bolo. Nesse momento, a frase “receita da competitividade” e um desenho da bandeira brasileira aparecem em cena, acima dos ingredientes. Na receita do bolo, cada ingrediente representa um fator: altos impostos, legislação complexa, falta de mão de obra, infraestrutura ruim, entre outros. Além do repórter citá-los, eles também aparecem escritos. Ao final da reportagem, o bolo brasileiro foi exposto na vitrine ao lado de outros bolos bonitos e decorados, sendo representados por outros países no ranking mundial de competitividade. Em cada bolo tem, através de recurso visual, uma bandeira de seu país e sua colocação. - Posicionamento mais livre, espontâneo e despojado frente às câmeras: na única passagem que faz na matéria, que está focada no confeiteiro envolvido em fazer o bolo, Phelipe tem um comportamento descontraído, unindo seu vocabulário informal/coloquial à postura corporal livre e despojada. O repórter gesticula bastante na primeira parte da reportagem ao explicar, através de gráficos, o ambiente de negócios entre empresas. 60
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Além da fala, da utilização das mãos e expressão corporal natural, também reporta as informações através de expressões faciais, ou seja, é o conjunto que fornece um produto espontâneo e de fácil compreensão. Ao entrevistar o especialista, Phelipe estava em cena, sentado de frente para ele, fazendo anotações. - Notícia light (narrativa simples, modo fácil de ser entendida e comentada): além de utilizar elementos favoráveis na explicação das informações, o texto de Phelipe é simples, de fácil compreensão. De forma fácil e clara, o repórter utilizou a receita de bolo para relatar, detalhadamente, de modo dinâmico e objetivo, um assunto mais sério e de difícil entendimento para boa parte do público brasileiro. Outro aspecto importante é que, além da linguagem verbal e corporal, o modo com que Phelipe reporta é calmo, leve, como se estivesse contando uma história. Ele também imposta a voz em alguns momentos, dando ênfase para algumas explicações. O repórter conta os fatos como se estivesse conversando com o receptor. De forma mais intimista, faz com que o público preste mais atenção ao que está sendo dito. Esse talvez seja um diferencial para seduzir o telespectador em sua narrativa nessa reportagem. - Informação aliada à diversão e distração: A reportagem tem um viés informativo, ao mesmo tempo em que é explicada de forma leve e divertida. Economia é uma editoria que, muitas vezes, é retratada de forma muito formal, com dados e informações difíceis de atingir os menos cultos. Além disso, não atrai a atenção de muitas pessoas por ser um assunto mais pesado, mais complicado. No entanto, nessa matéria, Phelipe pensou em atrair o telespectador, seja ele da classe A ou aquele menos instruído, até mesmo a dona de casa, trazendo esse público para junto do assunto, utilizando elementos de fácil compreensão. Para isso, contou com o auxílio de recursos tecnológicos e conseguiu repassar tudo o que queria informar, através de uma receita de bolo. Em menos de três minutos, Siani tornou uma matéria que poderia ser cansativa e ultrapassada, em um conteúdo agradável e interessante. Ele mostrou cada etapa do bolo sendo preparado, assado e depois pronto, em cada momento ressaltando um ingrediente crucial para ilustrar a situação brasileira na competitividade da economia mundial. Matéria 2: Consumidores buscam parcelamento longo e barato, diz pesquisa, veiculada no dia 31 de maio de 2016 Com 2 minutos e 32 segundos, Phelipe Siani inicia a matéria dentro de uma loja informando que preço baixo não é o suficiente para o consumidor realizar uma compra, pois a palavra que chama atenção das pessoas é o parcelamento. O cenário muda e Siani anuncia: “ou seja, é comprar na base da faca”. Para ilustrar, a filmagem fica por conta de um faqueiro. No fundo, com um efeito sonoro de faca sendo afiada, o repórter afirma: “tá precisando de uma torradeira nova? Vai lá e fatia o pagamento”, nisso, a ilustração mostra uma imagem de cartão de crédito e uma faca. O mesmo
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acontece quando ele fala sobre comprar um celular. Na sequência, através de um infográfico, Phelipe aponta que quase 35% da população brasileira prefere parcelar um produto no máximo de prestações possíveis. Logo, faz a passagem sentado em uma mesa de cozinha onde aparecem quatro recipientes que, a princípio, estão cobertos. Quando ele retira o pano de cima, mostra quatro pães de diferentes tamanhos. Com isso, ele pretende explicar que ao invés de parcelar somente produtos grandes, o brasileiro paga o empréstimo, parcela produtos cada vez mais baratos e, ao final de tudo, cada pequena parcela se transforma em um alto valor a ser pago. Ele cortou o pão em várias pequenas partes para esclarecer isso. No próximo momento, Phelipe entrevista o educador financeiro do SPC Brasil, José Vignoli. Em seguida, o repórter ilustra o que José explicou, em uma tábua com um pão inteiro que começa a ser fatiado por recursos tecnológicos mostrando que para não precisar parcelar dívidas, o correto seria fazer uma reserva sólida com as “fatias” que sobram do salário. Análise - Vocabulário informal/coloquial: a reportagem inicia com Phelipe falando “Oferta? Ahh, sei lá, parece que essa palavra não tem funcionado como antes”, “a palavra que o consumidor gosta de ler é essa outra aí” – se referindo ao parcelamento. Além de usar as expressões “grana curta” e “comprar na base da faca”, nessa primeira parte da reportagem é possível observar que o repórter utiliza um vocabulário informal, com termos populares, de forma espontânea. Siani faz uso do coloquialismo também quando diz a frase “vai lá e fatia o pagamento”, fazendo referência ao parcelamento na compra de uma torradeira nova, e ainda para trocar aquele celular “velhinho” e fazer uma “jogada boa”. Ainda sobre o parcelamento, Siani se refere a essa palavra ao dizer: “quando a gente deixa de fatiar as compras maiores” e “picotar aquelas que são menores”, e ainda “acabar perdendo a mão”, explicando que o consumidor pode acumular dívidas. Na parte final da matéria, Phelipe diz que as economias podem “virar migalhas”, e finaliza a reportagem falando que o consumidor deve fazer uma reserva sólida com as “fatias” que sobram do salário, pois só assim não corre o risco de “se cortar feio”. Apesar das expressões populares, Phelipe realizou uma reportagem explicativa, de fácil compreensão, através de sua linguagem verbal e suas frases repletas de metáforas para o melhor entendimento. - Discurso pessoal e subjetivo: nessa matéria, a narrativa do repórter não é em primeira pessoa do singular e nem expõe seu ponto de vista. Sem dar opiniões, Phelipe apenas repassa as informações. No entanto, apesar disso, ele reporta de uma forma particular, embasado acerca de alguns conceitos que talvez sejam pessoais. Em alguns momentos, Siani utiliza a expressão “a gente” se referindo a “nós”, como por exemplo quando fala “quando a gente deixa de fatiar só aquelas compras maiores”, ao invés de falar “quando o consumidor deixa de fatiar”. Em outro momento, ele fala 62
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“a gente acaba perdendo a mão” e “a gente sabe bem”. - Uso de recursos sonoros, visuais e tecnológicos, cores, gráficos, vinhetas, selos, trilhas sonoras: logo no início da matéria, em uma plaquinha escrito “oferta”, ocorre uma montagem e a palavra é substituída por “parcelamento”, que é destacada na cena. Na sequência, em um cenário diferente, é mostrado um faqueiro. Quando o repórter diz que pode “fatiar” a compra de uma nova torradeira, uma mão puxa uma faca do faqueiro, e isso é ilustrado através do recurso sonoro de uma faca sendo afiada. Quando o exemplo é sobre DVDs que são comprados todos de uma vez, mas que podem ser pagos em vários meses, é utilizado um recurso visual em que esses DVDs, cada um simbolizando um mês, vão sumindo na cena, um a um, representando as parcelas sendo pagas. No momento seguinte, Phelipe explica, através de um infográfico, uma pesquisa do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC). Em sua passagem, Siani exemplifica a questão do “fatiamento” com pães de diversos tamanhos e em cada um deles foi utilizado uma ferramenta tecnológica em que é escrito: cartão de crédito, empréstimo, roupa, carnê. Logo após, em uma tábua, um pão é cortado em vários pedaços, e através do mesmo recurso visual, cada fatia tem uma linha que está ligada à palavra dívida. Nesse instante, o pão que estava fatiado é reestruturado, ficando inteiro novamente, onde aparece a palavra reserva. - Posicionamento mais livre, espontâneo e despojado frente às câmeras: nessa reportagem, Phelipe fez somente uma passagem. Ele estava em uma cozinha, sentado à frente de uma mesa com pães de diversos tamanhos cobertos por panos. A cada frase que ele diz, sua expressão corporal “fala” também. Quando utiliza o termo “fatiar”, ele faz um gesto de “corte em fatias” com as mãos. Inclusive, o repórter gesticula bastante e sua fisionomia acompanha cada palavra dita. Siani conduz a reportagem de forma muito descontraída e leve. Ele pega uma faca para cortar um pequeno pedaço de pão em fatias e, logo em seguida, continua gesticulando com a faca na mão. Ao entrevistar as fontes, ele não está junto em cena – geralmente ele está ao lado do entrevistado – por isso, não foi observável sua interação com as fontes nessa matéria. - Notícia light (narrativa simples, modo fácil de ser entendida e comentada): o texto de Phelipe é simples, objetivo e claro. Com um discurso rápido, a matéria flui através de palavras de fácil entendimento, aliadas às explicações didáticas do repórter. Além de reportar as informações naturalmente e de forma espontânea, ele faz uso de “ferramentas explicativas”, como a faca em cima do cartão de crédito simulando o pagamento “cortado/parcelado”, o pão em fatias e até mesmo, ao final da reportagem em que se refere ao cartão de crédito como “faca monetária afiadíssima guardada dentro da carteira”, e na sequência uma faca aparece girando, com Phelipe dizendo ao fundo que se souber lidar com essa faca “ninguém corre o risco de se cortar feio”. Todos esses elementos que compõe a reportagem servem para que o telespectador possa compreender as informações e dados. Os recursos tecnológicos, juntamente com a criatividade do repórter, foram AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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imprescindíveis para que a matéria fosse light. Além disso, sua entonação de voz aliada a sua representação torna a explicação mais clara, mais uma vez como se estivesse em uma conversa com o telespectador. - Informação aliada à diversão e distração: além da narrativa ser agradável e despojada, pois a voz de Phelipe é calma – ele relatou os fatos como se estivesse contando uma história, o texto é simples, não é uma reportagem cansativa. Mais uma vez, o repórter criou um produto autêntico e original, com um conteúdo efêmero que diverte o telespectador ao mesmo tempo que informa a partir de dados relevantes. Ele utiliza recursos tecnológicos sonoros e visuais que, se não fossem inseridos nessa matéria, ela talvez se tornasse desinteressante, pouco atrativa. O fato de Siani não estar em pé, segurando um microfone, mas sim em uma cozinha, sentado à mesa e utilizando um microfone de lapela, contribuiu para que a matéria se tornasse mais livre e expansiva. A cena na cozinha é muito explicativa e didática, portanto, isso acaba entretendo o telespectador, conquistando sua atenção. Matéria 3: Em São Paulo, moradores lutam contra invasão dos pernilongos, apresentada em 12 de janeiro de 2017 Com 3 minutos e 36 segundos, a primeira cena da reportagem mostra algumas pessoas dando tapas em seus braços e em seguida, a casa do repórter é tema da matéria: com um barulho artificial de pernilongo, a câmera percorre os cômodos da residência com um efeito de imagem meio embaçada. Voltando para o cenário de dentro da casa do repórter, ele se encaminha da sala para o quarto, dizendo que não adianta fugir dos mosquitos. Nesse cenário, pequenas câmeras foram instaladas em alguns cantos do dormitório: no rodapé perto do chão, na cômoda e debaixo do móvel. Com um barulho de pernilongo novamente, Siani começa a “estapear o ar” e indaga: “O que que tá acontecendo com essa cidade, hein?”. Após entrevistar um pesquisador da USP, informando que esses mosquitos podem gerar uma série de doenças, as próximas cenas ficam por conta de imagens de rios contaminados, locais poluídos. Na sequência, Siani averigua o trabalho da vigilância sanitária contra o desenvolvimento dos pernilongos no Rio Pinheiros. Depois disso, o cenário é a casa de uma mulher que mostra os cômodos da residência e explica como faz para se proteger das picadas das muriçocas. O repórter exibe um arsenal de produtos para eliminar os mosquitos. Ao fim da matéria, Phelipe entrevista um instalador de telas anti mosquito. Análise - Vocabulário informal/coloquial: Phelipe inicia a reportagem anunciando que está aberta a temporada de “auto estapeamentos” em São Paulo, e que o que parecia ser “um surto conjunto de pessoas que passaram a se punir do nada”, na realidade, tinha outra explicação. Em outro momento, 64
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após entrevistar populares, ele ri e utiliza a expressão: “nem fala”. Siani informa que, caso você não queira ser tão “íntimo do seu inimigo”, pode chamá-lo pelo nome científico: “culex quinq... é, é, como é que é mesmo?”. Depois ele tenta encontrar outras maneiras de classificar o inseto: “pode chamar também de bicho chato pra caramba”, em seguida “estapeia” o ar e reclama: “O que que ‘tá’ acontecendo com essa cidade, hein?”. Na sequência, Phelipe diz que o pernilongo “está se esbaldando no meio da lixarada”, e que “aí ‘num’ para de chegar mais penetra querendo entrar de ‘bicão’ numa festa em que só eles se fartam de bebê – aparece a imagem de uma criança de colo com picadas de mosquito – e de beber o sangue da gente”. Phelipe ainda faz uso das expressões “se a coisa sair muito do controle”, “eu, hein”, “maldito barulhinho”, define os mosquitos como “exército inimigo”, e que “usar o antigo arsenal nessa guerra” – se referindo aos métodos para acabar com os pernilongos, é “igual querer matar dinossauro com tiro de espoleta, não funcionou”. Nessa matéria, Siani utilizou termos totalmente coloquiais, linguagem informal, espontânea, expressões populares, diversas metáforas e até mesmo gírias, além do modo despojado ao falar. - Discurso pessoal e subjetivo: a narrativa de Phelipe não é feita em primeira pessoa, tampouco o texto é opinativo ou cheio de reflexões pessoais. Nessa matéria, o repórter apenas repassa as informações. No entanto, em alguns momentos, ele utiliza a expressão “a gente”, se colocando na situação que ele está relatando, como por exemplo: “um motivo que a gente mal enxerga, mas que vê a gente muito bem”, “pelo o que a gente nota nas rodas de conversa aqui em São Paulo”, “quando a gente ‘tá’ dentro de casa”, “beber o sangue da gente”. Ele também utiliza alguns termos, como “entrar de bicão”, “matar dinossauro com tiro de espoleta”, entre outros, que são espécies de gírias e metáforas que o repórter resolveu usar por conta própria na reportagem, ou seja, é um tipo de criação dele. - Uso de recursos sonoros, visuais e tecnológicos, cores, gráficos, vinhetas, selos, trilhas sonoras: logo no início, na cena em que aparece o apartamento do repórter, a câmera fica embaçada, tremida e ao fundo, um efeito sonoro de “zumbido” simula um mosquito voando pela casa e no ouvido de uma pessoa. Em seguida, aparece escrito o nome científico de um pernilongo, mas com um efeito azul em volta das palavras, para melhor compreensão do telespectador. Quando transita da sala para o quarto, Siani explica onde os mosquitos geralmente se acomodam. Nesse momento, uma câmera está alojada em uma cômoda, em cima da cama e no rodapé da parede representando um mosquito reproduzindo seu tradicional barulho e a imagem fica embaçada, em uma simulação do pernilongo olhando para o repórter. Na metade da matéria, através de um recurso visual, dois mosquitos, o tradicional e o Aedes Aegypti, são colocados lado a lado, e através de um efeito de uma lupa, ilustrando um microscópio, o repórter faz uma comparação entre os dois insetos. No encerramento da matéria, novamente a câmera embaçada e o zumbido do mosquito percorrem o quarto do repórter. AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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- Posicionamento mais livre, espontâneo e despojado frente às câmeras: Phelipe inicia a matéria conversando com algumas fontes. A conversa com os populares foi descontraída. As pessoas falavam sorrindo e é observável a risada do repórter junto com a fonte sempre ao final de seus relatos. Quando entrevistou um pesquisador da USP, apesar de não aparecer na cena, ele interage com a fonte. Depois o repórter aparece na rua, encostado em um carro, conversando com um instalador de rede de proteção. Mas, a sonora ocorre quando o homem está dentro do carro. O rosto de Phelipe aparece na filmagem e a entrevista é alegre, o rapaz ri ao final do relato e o repórter também. A todo instante, do início ao fim, o comportamento de Phelipe frente às câmeras é espontâneo, livre e despojado. Ele fez uma passagem quando estava dentro de sua casa. Usando um microfone de lapela para ter mais liberdade, o repórter gesticula, coloca uma mão no bolso, as expressões corporais e faciais acompanham a forma de falar e ele conduz a reportagem de forma muito natural. Quando aparece em seu quarto para mostrar onde os mosquitos se acomodam, Phelipe “estapeia o ar” simulando um ataque dos pernilongos. Ele se mostra muito à vontade em cena. - Notícia light (narrativa simples, modo fácil de ser entendida e comentada): Apesar de ter 3 minutos e 26 segundos, a matéria não se torna cansativa pelo fato do texto ser fácil, acessível, próximo, possuir palavras de imediata compreensão, narrativa pausada, leve e o tom de voz do repórter calmo e tranquilo, como se estivesse conversando com o telespectador dentro de sua casa. A abordagem em uma reportagem é muito importante para conquistar a atenção do telespectador, por isso, Phelipe criou uma matéria dinâmica desde o início quando pensou em colocar a imagem de pessoas estapeando seus próprios braços e simular, através de efeitos da câmera e recursos sonoros, um mosquito transitando pela casa. As cenas são efêmeras e a singularidade do repórter colaborou para que a matéria fosse rápida e com bom conteúdo, sem se tornar exaustiva. - Informação aliada à diversão e distração: o modo como a matéria foi produzida permite que o telespectador se envolva na história que Phelipe conta. O conteúdo foi explorado de forma agradável, de maneira que pudesse informar e entreter o público. Uma matéria que talvez seja despretensiosa, que não é uma pauta tão importante e, possivel- mente, não chame a atenção das pessoas, se torna atraente a partir do momento em que Phelipe, de forma criativa, elabora um produto leve e divertido através de recursos tecnológicos, de uma conversa descontraída com as fontes, de uma explicação despojada e de fácil assimilação, aliados à simulação dos mosquitos em sua casa. É uma reportagem que pode atrair a atenção de pessoas de todas as idades. Matéria 4: ONU lança guia que ensina a ajudar o planeta até do sofá de casa”, veiculada em 12 de dezembro de 2017 Com 2 minutos e 33 segundos, a reportagem é formada por uma
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sequência de imagens que aparecem de forma rápida. Phelipe, através de imagens do trânsito, academia, trabalho, rua, dentro de casa com a cama bagunçada, máquina de lavar cheia de roupa e o “tic tac” de relógio, deseja explicar que com a rotina do contidiano fica difícil se preocupar com o planeta. Nesse momento, todas as imagens anteriores são repassadas de trás para frente de forma muito rápida. Na próxima cena, Phelipe está sentado no sofá de casa, espreguiça, pega o controle e liga a TV. Ele aponta que depois de um dia cansativo, a população só quer chegar em casa e fazer o mesmo. Ele questiona como salvar o planeta sentado no sofá e, em seguida, argumenta que existe solução, sim. A partir desse momento, o repórter inicia uma série de explicações, de acordo com a ONU, de como ajudar o planeta, começando por apagar a luz da sala enquanto assiste TV, e foi isso que ele fez. Na sequência, ele mostra a mão de várias pessoas no interruptor, apagando a luz, também ressalta que se a lâmpada for de led é melhor ainda, pois consome menos energia. Depois, ele entrevista um homem ressaltando que, atualmente, pode-se pagar uma conta através do celular, sem precisar imprimir boleto e gerar uma folha. Phelipe ilustra isso ao mostrar uma impressora em funcionamento, um celular na mão e uma cena de árvores, pois quanto menos o consumo de papel, mais árvores devem existir. Ele entrevista também a oficial de Comunicação da ONU no Brasil, Roberta Caldo. Em seguida, através de imagens do chuveiro, máquina de lavar roupa, fogão, secador de cabelo e sobras do almoço congeladas na geladeira, Phelipe explica a maneira correta para que a população ajude o planeta. No shopping, ele mostra guardanapos e canudos, apontando que até na hora de comer, as pessoas devem se preocupar em utilizar menos esses materiais. O repórter entrevista uma mulher que sugere andar de bicicleta para evitar a poluição através de transporte motorizado. Nesse momento são exibidas imagens de ônibus, metrô, pessoas pedalando a bicileta. Ao fim, a matéria termina com Phelipe gargalhando em conversa com uma fonte no shopping. Análise - Vocabulário informal/coloquial: na reportagem, Phelipe utiliza a linguagem informal do início ao fim. Além do coloquialismo clássico, ele abreviou as palavras está e você para “tá” e “cê”. Seguindo os critérios jornalísticos, de uma maneira mais despojada e descontraída, ele consegue informar sobre um assunto tão importante de forma clara, para que atinja toda a população. E, claro, criando um produto moderno e atraente para o telespectador, como se o repórter narrasse uma história. No início da matéria, ao explicar a rotina da população, Siani utiliza expressões como “dar uma geral na bagunça”, “tirar oito horinhas de sono”, “um baita de um privilegiado” e “rotina dessa daí”. Em seguida, o cenário é a sala da casa do repórter, ele senta no sofá e diz que quando tem uns “minutinhos” livres “a gente” só quer ligar a TV e dar uma “uma bela de uma relaxada”. Após algumas dicas
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de como economizar energia, ele faz uso do termo “empurrãozaço” para mudar os hábitos cotidianos. Na sequência, ele informa que as pessoas devem evitar o secador de cabelo “gastão” e lavar roupa só quando a “máquina estiver “lotada”. Ao conversar com as fontes, elas dão algumas sugestões de como evitar a poluição e, nisso, o repórter responde “boa, o que mais que dá pra fazer, hein?” e “bem por aí”. Phelipe tenta interagir o tempo todo com o telespectador para que ele se sinta parte da reportagem também. - Discurso pessoal e subjetivo: apesar do texto ser praticamente todo em terceira pessoa e Phelipe ser neutro, não realizar uma matéria opinativa, apenas reportando informações da ONU e da fonte especialista, a forma como Siani inicia a reportagem é uma abordagem de criação dele, ideia autoral para poder explicar melhor do que a matéria se trata. No momento em que narra a rotina das pessoas, ele indaga: “Aí com uma rotina dessa daí, ‘cê’ ainda vai querer que “eu” arrume tempo de salvar o planeta?” Nesse instante, o repórter se colocou na história e interagiu com o telespectador, falando em primeira pessoa do singular. Estar em um cenário tão particular que é a casa dele e contar sua rotina, já representa um modo de estar envolvido na reportagem. Phelipe também utiliza expressões como “quando a gente tem uns minutinhos livres, a única coisa que a gente quer” e “por mais preguiçoso que a gente seja”, representando o pronome pessoal “nós”, ou seja, mais uma vez se inserindo na matéria. - Uso de recursos sonoros, visuais e tecnológicos, cores, gráficos, vinhetas, selos, trilhas sonoras: a matéria inicia mostrando a rotina da população diariamente. Nesse momento, em alguma rua movimentada, um recurso tecnológico chamado time-lapse, que acelera a imagem, é utilizado para demonstrar a pressa das pessoas e o dia passando. Para representar o tempo acelerado, um recurso sonoro com um barulho de relógio é utilizado para ilustrar a cena. Em seguida, a partir do efeito time-lapse novamente, é mostrada a cidade de São Paulo à noite e todas as atividades realizadas durante o dia são mostradas de forma rápida e de trás para frente. Quando Phelipe informa que quanto menos papel gastar, mais árvores vão existir, o mesmo efeito acelerado é colocado em uma filmagem de um parque cheio de árvores, também quando é filmada uma avenida cheia de carros em movimento e em uma rua onde pedestres transitam. Esses efeitos deixaram a matéria mais rápida e não se torna cansativa de assistir. - Posicionamento mais livre, espontâneo e despojado frente às câmeras: Phelipe faz uma passagem na matéria. Na cena, ele está sentado no sofá da sala de sua casa, usando um microfone de lapela, que ele utiliza, tradicionalmente, na maioria de suas reportagens para ter mais liberdade nos movimentos, cruza as pernas, estica os braços e espreguiça. Nesse momento, Siani pega o controle, liga a TV e explica que mesmo em casa, ele pode ajudar a salvar o planeta e economizar energia. Então, o repórter estica o braço até o interruptor mais próximo e desliga a luz, utilizando apenas a iluminação da TV. Nessa passagem, Phelipe tem um comportamento completamente descontraído e espontâneo, conversando 68
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com o telespectador à vontade, sentado no sofá, como se estivesse dentro da casa do público interagindo, dando dicas. Por estar com as mãos livres, o repórter gesticula bastante e sua expressão corporal acompanha todas as informações relatadas. O repórter conversa com seis fontes. Em cena, não houve interação do repórter com os entrevistados, eles apenas fizeram seus relatos. No entanto, com a última fonte, entrevistada em um shopping, a conversa foi divertida e natural: ele interagiu, mesmo sem aparecer em cena, deu risada junto com a mulher e a reportagem encerrou com a gargalhada do repórter ao fundo. - Notícia light (narrativa simples, modo fácil de ser entendida e comentada): na reportagem, a redação de Phelipe é simples, clara, acessível, de fácil compreensão, criada através de palavras descomplicadas e um modo mais popular de interagir com o público. Ele reporta a informação através de uma narrativa objetiva, veloz e efêmera, talvez para não se tornar cansativa. Além disso, ele tenta repassar as informações de um modo dinâmico, utilizando uma série de imagens de curta duração para representar cada explicação. As filmagens e os relatos são rápidos, não deixam que o telespectador perca o foco. Quando fala sobre a rotina cansativa do cotidiano, ele simula isso através de imagens de academia, ao mesmo tempo que aparece a cama do repórter bagunçada, uma máquina de lavar, um relógio, o trânsito, o trabalho e uma vista de São Paulo. Depois, para ilustrar exemplos de como economizar energia e salvar o planeta com a sustentabilidade, aparecem imagens de luzes sendo apagadas, chuveiro, secador de cabelo, geladeira, fogão, bicicleta, carro, metrô, árvores, papel na impressora, celular, guardanapos e canudos em um shopping. Cada palavra dita pelo repórter é representada através de uma cena, algo muito “rápido”, para o público não se distrair ou ficar entediado. Algumas das imagens são gravadas dentro da casa do repórter, algo que é feito com frequência , e a vista da cidade de São Paulo à noite é feita através da janela do apartamento de Phelipe. - Informação aliada à diversão e distração: a pauta é interessante e Phelipe soube usar de sua criatividade para torná-la divertida e atraente, criando um produto leve e didático. O repórter poderia apenas relatar enfadonhamente algumas sugestões do guia da ONU que explica como “salvar a planeta”. No entanto, o público que está assistindo ao jornal procura informação, mas também quer entreter-se. Por isso, Phelipe utilizou recursos tecnológicos e ideias autorais para elaborar uma matéria com informação, conteúdo, repassando sugestões e dicas da ONU e até mesmo das fontes populares, de modo que o telespectador quisesse realmente prestar atenção para absorver o que estava sendo relatado. O material é agradável, o repórter em cena está à vontade, se mostra extrovertido, a narrativa é efêmera, o texto não é cansativo, não tem vocabulário difícil e a matéria ainda termina com o repórter dando risada. A reportagem se encaixa no momento de lazer que as pessoas esperam ter quando assistem televisão nesse horário.
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CONSIDERAÇÕES PERTINENTES De acordo com a pesquisa e análise das categorias estipuladas, a partir dos elementos característicos do infotenimento citados por Gomes (2009) e Dejavite (2007), observa-se que Phelipe Siani utilizou, em todas as reportagens, uma linguagem informal/coloquial. Segundo Araújo (2017), o texto coloquial amplia a comunicação com o público, pois as pessoas entendem/utilizam uma linguagem informal no cotidiano. Maia (2009) também destaca que o Jornal Nacional vem apostando no jornalismo informal, produzido quase que em parceria com o público, e isso atinge a reportagem também. Sobre a categoria discurso pessoal e subjetivo, metade das matérias utilizou esse tipo de discurso e metade não usou. Apesar de ter se tornado um telejornal mais acessível no quesito linguagem, a regra na maneira de reportar uma informação ainda é padrão: o repórter deve ser imparcial, o texto é elaborado em terceira pessoa, não deve fazer relatos pessoais, ou expressar sua opinião. No entanto, de acordo com algumas gírias e ideias de autoria do repórter, e também pelo fato dele utilizar muito o termo “a gente”, colocando-se na situação junto com o público e em momentos até falar em primeira pessoa do singular (eu), demonstra que talvez ele tenha feito uso de algumas experiências próprias para elaborar e produzir as matérias. Para Michelline (2005), ao menos na crônica, as sensações e concepções do repórter são admitidas, bem como a subjetividade. No mais, Phelipe certamente seguiu os critérios jornalísticos e pouco usa da subjetividade e pessoalidade em suas reportagens, apenas em momentos aceitáveis, que não interferem no resultado do produto, não sendo diretamente opinante, porém, tendo liberdade de criação, sendo flexível. Em relação ao uso de recursos tecnológicos, Phelipe explorou bastante essas ferramentas nas quatro matérias analisadas. Seja através de infográficos ou de instrumentos sonoros e visuais inovadores. Martino (2017) considera que, nessa questão, o infotenimento age como uma articulação estética para transformar a reportagem em algo mais agradável e fácil de ser compreendida. Maia (2011) afirma que a ordem nas redações é ousar, explorar e transmitir de um modo criativo o produto que a equipe traz da rua. No que diz respeito ao seu comportamento em cena, Phelipe esteve sempre muito descontraído. Nas quatro reportagens, o repórter utilizou microfone de lapela, justamente para ter mais liberdade para gesticular, explicar, se movimentar melhor frente às câmeras. Ele utiliza muitas expressões corporais, além de usar as mãos para contar a história, seja para apagar a luz, pegar no controle de televisão, cortar o pão com a faca, se defender dos pernilongos. Maia (2011) explica que essa postura e comportamento são naturalmente perceptíveis: os repórteres se encontram cada vez mais à vontade em cena. Portanto, é fundamental surpreender o telespectador, reinventar o telejornalismo. A notícia light é outro quesito importante no infotenimento.
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Nas reportagens analisadas, o texto se mostrou muito claro, fluído, descomplicado, simples, objetivo e visivelmente pretensioso no sentido de buscar atender a todos os mais diversos públicos do Jornal Nacional. E, para isso, de acordo com Loeblein (2017), o jornalista precisa escrever com uma linguagem simples para ser compreendido e alcançar pessoas que tiveram menos acesso ao ensino também. Paternostro (2006) afirma que quando o repórter escrever, deve pensar que sua missão é contar uma história. Um texto simples e compreensível tem o poder de atingir um público muito maior. Na matéria de economia, por exemplo, através de uma receita de bolo, que é algo muito popular, o repórter utilizou elementos fáceis para que todas as pessoas pudessem entender um assunto que sempre foi reportado de forma muito elitizada, complicada e que não era interessante. Assim, a reportagem perdia a atenção daquele telespectador que se sentia excluído por não ter uma formação capaz de entender um vocabulário tão distante da realidade dele. Nas reportagens, a informação esteve quase sempre ligada à diversão e à distração, porque além da dinâmica do repórter, o desenvolvimento e condução das matérias eram leves, efêmeros, além de possuírem um conteúdo transformado em um produto inteligente, inovador e moderno: um modo diferente de fazer telejornalismo. Ao mesmo tempo que informam, as reportagens entreteem, pois foram bem elaboradas, criadas para despertar o interesse do telespectador, que assiste ao Jornal Nacional em um período que é dedicado ao lazer também. Se as informações não tiverem esses elementos, não vão chamar a atenção da audiência. De acordo com Maia (2017), esse comportamento é uma estratégia na conquista do receptor: o importante é criar laços com o público. Dejavite (2007) afirma que uma mesma matéria pode informar entretendo, ou entreter pela informação. É uma união: na sociedade da informação, não existe comunicação sem entretenimento. Considera-se que o infotenimento ainda não é um termo muito utilizado pelos jornalistas, mesmo pelos que fazem uso dele. Ele foi se inserindo na sociedade da informação, pois atualmente, o receptor é muito exigente e tem outras formas de obter a notícia, participando cada vez mais sobre o que deseja receber. As pessoas estão consumindo um conteúdo que é proporcionado por meio das tecnologias do acessível e do descartável. Esse consumo de informações pode ser feito em qualquer momento do dia, em tempo real, através de um celular. Inclusive, as classes de menor poder aquisitivo, imersas à modernidade que seus aparelhos eletrônicos disponibilizam, estão adquirindo mais conteúdo também. Por isso a importância de uma linguagem aproximável e alcançável para conquistar essas pessoas igualmente na TV. No entanto, os telejornais são compostos por matérias que, muitas vezes, não são factuais e algumas são até mesmo entediantes, ultrapassadas, não atraem o público. A obtenção da informação no Jornal Nacional é feita naquele tempo destinado ao lazer e à diversão, logo, unir a informação com o entretenimento, criar um produto mais leve, explorar o material produzido AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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e transmitir da forma mais criativa e envolvente possível é uma alternativa que está dando certo. Esse novo jeito de fazer jornalismo, vislumbrando novos caminhos, com qualidade e conteúdo, é uma possibilidade para que as pessoas se sintam mais próximas das informações, que não enxerguem os jornalistas como seres intocáveis, donos da verdade. O receptor busca se informar, ser informado e informar, e ele pode adquirir isso através da informação que entretém ou pelo entretenimento que informa. Portanto, esta pesquisa contribui para o estudo do infotenimento e abre um leque para novas possibilidades de pesquisas, sobretudo, em relação aos repórteres que utilizam características deste tema em suas matérias, pois ele é uma questão relevante na sociedade atual, mas que ainda carece de estudo. Não existe uma grande variedade de autores que tratem sobre o assunto, embora esteja muito presente no cotidiano como uma forma de unir o repórter que está do outro lado da tela, com o telespectador, da mesma maneira que o celular une as pessoas através da atualidade e tecnologia das redes sociais. O infotenimento é a realidade da atual forma de “fazer” jornalismo, não há como fugir disso e questionar sua importância. O infotenimento intensifica a criatividade e não embarga a qualidade. Quem não aderir às exigências do receptor fica para trás, não obtém audiência, não garante a preciosa atenção de quem está assistindo e busca informação, mas também quer distrair-se, também procura entretenimento em seu momento de lazer. Quem negar o infotenimento, estará também negando a principal missão do jornalismo: servir à sociedade.
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Gabriela da Silva Leite e Valéria Deluca Soares
Capítulo 4
A CONSTRUÇÃO DA IMAGEM DE DONALD TRUMP A PARTIR DAS CAPAS DA REVISTA TIME Gabriela da Silva Leite Valéria Deluca Soares
A revista, enquanto meio de comunicação de massa, possui um diferencial, principalmente em relação ao jornal diário, na maneira de apresentar a informação de modo mais aprofundado. Parte desse conceito se deve ao fato das revistas possuírem uma periodicidade maior, ou seja, elas não são publicadas diariamente1. Com isso, o assunto abordado nem sempre é uma novidade, porque o mesmo pode ter sido apresentado no noticiário diário, mesmo que o tenha sido feito de uma forma rápida. Assim, a revista tende a procurar um novo olhar ou uma nova abordagem sobre o tema, trazendo o uso de um número maior de fontes, infográficos e fotojornalismo. Deste modo, acredita-se que o bom uso de texto e imagem, seja a base da revista2. Essa diferença entre os veículos de comunicação impressos é percebida também nas capas. Mesmo que elas possuam o mesmo intuito, atrair olhares para as bancas e sirvam como o primeiro texto que é lido, despertam o interesse do público, e assim, o desejo de consumo3. Cada veículo o faz de uma forma distinta. Embora os jornais tentem se assemelhar às revistas no aspecto gráfico, o principal elemento que os difere é a fotografia4. Ainda que o uso de fotos nas capas tenha o mesmo objetivo nas duas publicações, comunicar o leitor ao olhar sobre um acontecimento ou até mesmo um personagem presente na notícia, ambas 1 Disponível em: http://www.jornalista.com.br/jornais-e-revistas.html. Acesso em: 11 de setembro de 2017. 2 Disponível em: http://observatoriodaimprensa.com.br/diretorio-academico/uma-lupasobre-o-jornalismo-de-revista/. Acesso em: 11 de setembro de 2017. 3 Disponível em: http://observatoriodaimprensa.com.br/jornal-de-debates/o-que-dizemas-capas/. Acesso em: 11 de setembro de 2017. 4 Disponível em: http://observatoriodaimprensa.com.br/diretorio-academico/uma-lupasobre-o-jornalismo-de-revista/. Acesso em: 11 de setembro de 2017.
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CONSTRUÇÃO DA IMAGEM
utilizam a imagem de formas diferentes5. Enquanto o jornal diário traz um compilado de informações e ilustrações de áreas distintas, como por exemplo, política e esporte em uma mesma página, a revista apresenta como destaque a reportagem principal. De acordo com um estudo realizado pelo site Tipógrafos6, verifica-se que a revista Vogue foi uma das primeiras publicações que utilizou o recurso da fotografia em sua capa. A Vogue nasceu em 1892 e, com o tempo, se tornou uma das maiores e mais conceituadas publicações de moda do mundo. Porém, somente na edição de julho de 1932 é que surge a primeira fotografia na capa. A imagem retratava uma mulher sentada com roupa de banho vermelha, segurando uma bola de praia acima da cabeça, sorrindo, em um fundo azul. Mesmo com a publicação de uma fotografia, na capa de um periódico conceituado na época, somente a partir de 1940 as fotos começaram a dominar todo o mercado da revista, estando principalmente nas capas. Pois, especialmente, é a capa de uma revista que chama a atenção do futuro leitor. Por sua vez, a revista Time é conceituada graças à sua maneira de trazer a informação7. A publicação foi uma das percursoras no estilo magazine, aquele que apresenta um compilado de notícias de diferentes meios, variando entre política, esporte, ciência, entre outros. Mas, independentemente do âmbito da reportagem, o foco principal da publicação é sempre o leitor. Esse detalhe pode ser percebido nos textos de linguagem simples e de fácil compreensão. A revista prega a liberdade de expressão, os direitos civis a toda a população mundial, e procura dar voz às minorias. Tudo isso sem perder a perspectiva da importância dos fatos noticiados nas suas páginas, tais como por exemplo, guerras, grandes eventos esportivos, e também, personalidades que marcam a história. A revista Time é uma das mais conhecidas e respeitadas publicações de notícias semanais do mundo. A primeira edição data de 03 de março de 19238 e, desde então, ela tem a tradição de retratar personalidades do mundo em suas capas. As eleições americanas atraem olhares de todo o mundo e os candidatos à vaga de presidente costumam, naturalmente, chamar a atenção da população e da mídia. Esse fato não foi diferente no ano de 2016, quando os finalistas à cadeira presidencial eram a democrata Hillary Clinton e o republicano Donald Trump. Ele se sobressaiu com seu perfil
5 Disponível em: http://blogs.odiario.com/odiarionaescola/2013/04/23/uma-viagem-pelacapa-do-jornal/. Acesso em: 11 de setembro de 2017. 6 Disponível em: http://tipografos.net/magazines/vogue.html. Acesso em: 9 de maio de 2017. 7 Disponível em: http://mundodasmarcas.blogspot.com.br/2006/07/time-magazine-umaestrela-na-imprensa.html. Acesso em: 18 de setembro de 2017. 8 Disponível em: http://time.com/vault/year/1923/. Acesso em: 07 de setembro de 2016. AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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polêmico, consagrado por seus discursos9. Trump falava sem pudores sobre estrangeiros, porte de armas e de como a imprensa influenciava a população. O seu perfil atraia milhares de pessoas aos comícios, o que o fez ganhar a eleição e se tornar o 45º presidente dos Estados Unidos10. O fato não passou despercebido pelas revistas do mundo, principalmente pela Time, que é uma das mais conceituadas do meio. As pessoas que possuem seu rosto estampado na revista são atletas, engenheiros, artistas, personagens históricos e de ficção, empresários e políticos. Dentre essas personalidades, as que recebem destaque são os presidentes, principalmente, o presidente dos Estados Unidos. Desde o dia 20 de janeiro de 2017, os Estados Unidos são governados pelo republicano Donald Trump11. A sua primeira aparição na Time aconteceu em janeiro de 198912, sendo apresentado como um empresário manipulador. Desde então, Trump reapareceu à frente da Time 17 vezes, em agosto de 201513, nove vezes durante o ano de 201614 e mais seis aparições até novembro de 201715 . A Time acompanhou permanentemente a vida do presidente desde 2015, quando foi anunciada a candidatura e o segue fazendo. Todavia, neste estudo serão as edições de dezembro de 2016, janeiro, fevereiro e março de 2017, que compõem a delimitação da pesquisa. O objetivo concentra-se em analisar de que forma a revista Time constrói a imagem do presidente norte-americano Donald Trump, através de suas capas. A pesquisa é realizada de forma exploratória e descritiva, em uma abordagem qualitativa. São utilizadas três técnicas de pesquisas, a pesquisa bibliográfica, a pesquisa documental e a observação simples. A técnica para apresentação, análise e interpretação dos dados utilizada nesta pesquisa é a análise semiótica. (GIL, 1989; SANTAELLA, 2005) As capas foram escolhidas por retratarem o presidente norteamericano Donald Trump durante uma sequência cronológica de aparições na mídia. Além disso, elas seguem também momentos históricos da vida de Trump, como a sua eleição como a pessoa mais influente do ano de 2016 pela revista Time e o instante em que ocorre o discurso da sua posse como líder de governo do país. Outro fator determinante para a escolha destas quatro capas, foi a especulação e também a curiosidade gerada 9 Disponível em: https://oglobo.globo.com/mundo/dez-declaracoes-polemicas-de-donaldtrump-18564023. Acesso em: 11 de setembro de 2017. 10 Disponível em: http://www.bbc.com/portuguese/internacional-37923743. Acesso em: 11 de setembro de 2017. 11 Disponível em: https://brasil.elpais.com/brasil/2016/11/09/ internacional/1478660050_114058.html. Acesso em: 07 de setembro de 2016. 12 Disponível em: http://time.com/vault/year/1989/. Acesso em: 07 de setembro de 2017. 13 Disponível em: http://time.com/vault/year/2015/. Acesso em: 07 de setembro de 2017. 14 Disponível em: http://time.com/vault/year/2016/. Acesso em: 07 de setembro de 2017. 15 Disponível em: http://time.com/vault/year/2017/. Acesso em: 07 de setembro de 2017.
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sobre a mensagem que as mesmas queriam passar para o receptor da revista. Fato que pode ser percebido ao se utilizar desenhos e gravuras ao invés de fotografias em algumas de suas edições. AS CARAS E JEITOS DE DONALD TRUMP Seguindo as indicações de Santaella (2005), a análise das capas se dá conforme os conceitos da semiótica e a indicação das seguintes categorias de análise: primeiridade, secundidade e terceiridade. Na primeiridade, aponta-se os elementos como eles são vistos, de forma simples; na secundidade, eles são apresentados de forma mais elaborada, abordando o significado desses elementos como signos; e, na terceiridade, há um passeio inferencial, elaborando a construção simbólica que tais elementos apresentam. Feito este caminho, apresenta-se as inferências. Capa Time – Person of the Year A primeira capa a ser apresentada é da edição de 19 de dezembro de 2016, como mostra a Figura 1. Essa capa é publicada anualmente, apresentando a pessoa que foi eleita como a personalidade do ano, através de um processo de seleção interno da revista. Na data da publicação, Donald Trump já havia sido eleito como presidente dos Estados Unidos, e também como a pessoa mais influente do ano pela Time16. Figura 1 - Capa Revista Time 19 de dezembro de 2016 Vol. 188 nº 25 e 26
Fonte:http://time.com/magazine/us/4594940/december-19th-2016-vol-188-no-25-26-u-s/
16 Disponível em: https://g1.globo.com/mundo/noticia/donald-trump-e-eleito-pessoa-doano-pela-revista-time.ghtml. Acesso em: 06 de novembro de 2017. AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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Primeiridade Na imagem, há um ser humano do sexo masculino, loiro, vestindo um terno. O homem está com as mãos sobre postas uma sobre a outra. O seu cabelo está bem penteado para a parte de trás da cabeça, no entanto, é possível enxergar alguns fios brancos. Ele está com uma expressão séria, sem esboçar um sorriso, os olhos semicerrados, aparecendo em primeiro plano. Está sentado em uma poltrona, de forma que apareça lateralmente, quase de costas na fotografia. Essa cadeira possui um brasão gravado em sua parte de trás. Ela tem o seu contorno feito de madeira, seguido por uma costura que se assemelha a uma corda. O tecido que a reveste parece um acetinado e tem uma aparência de antigo, possuindo inclusive, pequenos rasgos e falhas, também na sua peça traseira. A luz está focada no homem, principalmente em seu rosto. Graças a essa luminosidade, é possível ver a sua sombra na parede ao fundo. Além disso, há a frase Pessoa do Ano, seguida pelo logo da revista, que está parcialmente tapado pela cabeça do indivíduo na letra M. Em seguida, tem a chamada da reportagem especial que fala sobre Donald Trump, eleito como a personalidade do ano pela revista Time. Quanto às cores, a capa tem poucos tons, ela possui as bordas e o logotipo vermelho, cor característica da revista. A gravata do homem segue o mesmo tom do contorno da página. O terno é azul escuro, assemelhandose ao preto. Ele usa uma camisa branca, possível de ser vista através da gola e punhos. A parede ao fundo, segue uma coloração semelhante ao terno. No entanto, por conta da iluminação, ela parece ser mais clara, possuindo uma cor que se confunde entre o azul e o verde. Já a poltrona tem a sua coloração em um tom de dourado envelhecido, contando ainda com detalhes em madeira. Secundidade Antes de iniciar a análise, cabe informar que para auxiliar na realização das análises presentes neste capítulo, foi feito o uso do Dicionário de Símbolos, de Lexicon (1998), e também do Dicionário de imagens, símbolos, mitos, termos e conceitos Bachelardianos, de Ferreira (2013). Feito tal esclarecimento, segue-se com a análise. O homem que aparece na capa é Donald Trump. A pose dele na imagem pode ser percebida como uma intervenção subversiva de uma pose tradicional presente em retratos de outros líderes poderosos, como por exemplo, Napoleão Bonaparte. O giro que faz em direção à câmera cria até mesmo um tom mais conspiratório do que julgador. E além disso, se tem a sensação de que ele pode dirigir uma piscadela cúmplice ao observador a qualquer momento. A expressão facial passa uma ideia de mistério. Olhos semicerrados e a boca que não expressa um sorriso, tristeza ou até mesmo fúria, faz parecer que ele não deseja transparecer o real sentimento. Há ainda o fato 82
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das mãos postas uma sobre a outra, exprimindo uma ideia de potência e domínio, além de passar um ar de concentração, ou ainda, prevenção e premeditação. Trump veste um terno, o que remete aos trajes reais ou de altos executivos. A vestimenta traz um tom de status e de poder. Exerce o papel de diferenciar um homem comum de outro com poder. É tido como o traje estadista ou de indivíduo de negócios. Passa um tom de seriedade, que é reforçado por Donald, com o seu cabelo penteado para a parte de trás. Esse aspecto remete a cuidado com o corpo, vaidade, força física, virilidade e até mesmo sedução. Inclusive, as virtudes e a propriedades de uma pessoa estão concentradas no cabelo e na forma como o indivíduo o trata e o colore. No caso do presidente, seu tom de loiro leva o simbolismo do sol, de iluminação e juventude. Contudo, é possível ver alguns fios brancos, que remetem à eternidade, além de revelarem suas características pessoais, como a sua idade. A capa apresenta a sombra de Trump, que aparece na parede atrás dele. Esse fato, pode passar a ideia de que há uma parte da sua personalidade, que não é considerada adequada ao papel social que ele deseja representar no mundo. Dessa forma, a sombra é o oposto do ego, ou seja, ela é o contrário de tudo aquilo que o indivíduo se identifica. Além disso, pode simbolizar aspectos obscuros, reprimidos e negligenciados da pessoalidade do ser. Essa concepção negativa do uso da sombra, é reforçada com o tom de azul utilizado na imagem, pois vai além de ser a cor do princípio do masculino, o azul escuro, que se assemelha e até mesmo se confunde com o verde, passando a noção de dúvida, visto que é considerada a cor do caminho do devaneio. Ainda sobre as cores, o recurso do azul combinado com o vermelho, rementem a coloração presente na bandeira américa. Sobre a poltrona em que o Trump está sentado, é uma cadeira vintage Luís XV. Ela recebeu esse nome pois foi concebida na França, em meados do século 18, durante o reinado de Luís XV. Desse modo, esse assento é um símbolo de riqueza, poder e status. Ela ainda remete a realeza, período de monarquia, e isso é reforçado pela insígnia gravada na sua parte de trás. Porém é possível ver que a poltrona possui pequenos rasgos, acima do brasão ali impresso. Isso representa que há uma imagem partida, é um sinal de rachadura. E além disso, traz a ilusão de desmoronamento, de algo velho e em desuso. Terceiridade Essa imagem de Donald Trump na capa da revista Time, causa o efeito de dúvida em quem a vê. E, isso se deve a aspectos como sua pose, a sombra atrás dele, mas principalmente a sua expressão facial. Ela vai ao contrário do que afirma Silva (2005), de que o político tem de parecer aquilo que ele prega. Ou seja, se ele se diz generoso, ele tem de parecer da mesma forma. No caso dessa capa, Trump aparenta de forma contrária AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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do que discursa. Ele, em tese, fala às multidões, mas na ilustração, não aparenta estar disposto a ouvir a voz do povo. Como presidente, é conhecido por aparecer diversas vezes em meios de comunicação. Decker (2006) destaca que é através da mídia que o indivíduo pode se posicionar no espaço. Isso gera a realização de uma construção de identidade, seja de uma marca ou de uma pessoa, perante o público. Contudo, Martins (2011) apresenta que o conceito de imagem é uma metáfora. Ela liga dois pontos, o da pessoa exposta ao receptor. Mas, isso não significa de que seja verdadeira. Pois como observa Duarte (2006), a imagem não significa o reflexo ou até mesmo representação de algo concreto ou real. Esse conceito é reforçado com a utilização da sombra atrás de Trump, pois ela passa a sensação de que a fotografia dele sentado na poltrona não representa a sua real identidade, de forma que ele esconde algo, estampado na forma escura nas suas costas. Esta capa vai ao encontro com o conceito apresentado por Ferrer (2008), de priorizar um conteúdo presente na revista. A página de boasvindas da publicação apresenta somente a imagem e a chamada da reportagem especial, no caso, a de que Trump foi eleita a pessoa do ano pela Time. E assim, como a sua denominação repercutiu, a fotografia da capa também gerou controvérsia. Isso pois ela segue com o que Erbolato (1981) observa, de que uma boa imagem sempre vai ser mais importante do que o próprio texto. Dessa forma, a revista atrai olhares pela foto de Trump utilizada nela. A fotografia, mais o conjunto de cores e outros elementos, como a sombra e a poltrona, aguça a curiosidade do leitor, que dessa forma, vai querer conhecer o interior da publicação. Conforme Ferrer (2008), a capa tem a tarefa de flertar com o leitor para o conteúdo das suas páginas internas. E essa ilustração faz isso, com foco principal na pessoa de Donald Trump, combinando a fotografia dele com a ausência de outros elementos que ressaltem aos olhos do receptor. Isso além da utilização de somente uma chamada para a grande reportagem. Entende-se que essa capa da Time se assemelha a um dos primeiros conceitos apresentados por Scalzo (2003): como diferenciar a revista de outras publicações. Geralmente, elas são monotemáticas, ou seja, apresentarem no seu conteúdo, reportagens e matérias sobre um mesmo assunto. Especificamente essa edição, trata somente sobre Donald Trump,apresenta a sua vida, com foco principal na campanha presidencial, que o levou a ser eleito como a pessoa do ano de 2016. A nominação de Donald para este posto que a Time elege anualmente, chamou a atenção não somente da imprensa, como também da população. De modo que a fotografia utilizada na primeira página da edição aumenta ainda mais a curiosidade. Como aponta Cerqueira (2007), a capa tem que chamar o leitor a querer conhecer o seu interior, e nesse caso, o porquê de Trump ser a pessoa do ano.
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Acredita-se que parte do sucesso dessa edição, se deve a pose na qual Trump está retratado, que se assemelha a imagens de mitos antigos. O uso da poltrona envelhecida remete a um status de poder, de monarquia, ou até mesmo, de algo sagrado. Remete, inclusive ao tempo do jornalismo imperial, como apresentado por Seabra (2006), onde as publicações se dedicavam a transmitir as notícias do meio real. Nesta época, havia uma grande divulgação de reis e imperadores, os apresentando como pessoas dignas de credibilidade pelo povo. Porém, a expressão do rosto do presidente norte-americano na atualidade, e a sombra atrás de si, trazem um ar de desconfiança. Cabe destacar que, de acordo com Barthes (2001), o mito pode ter a habilidade de enganar o homem. Isso se deve, pois como apresenta Cassirer (1985), a forma mítica e a linguagem estão ligadas, através do pensamento imaginário. De forma que a capa apresenta a ideia de que Donald Trump pode ser capaz de enganar o receptor. O seu rosto é sem expressão definida, porém se analisado por um tempo maior, pode parecer que ele está prestes a dar uma piscadela ao leitor. Como se dissesse que foi capaz de lograr outras pessoas para chegar ali, ou até mesmo, confundir o próprio consumidor da publicação. Capa Time – 45th President of USA A segunda capa a ser apresentada é da edição de 30 de janeiro de 2017, como mostra a Figura 2. Ela trata em grande parte sobre a posse de Donald Trump para a presidência dos Estados Unidos. Momento esse, inclusive, que é o retratado na capa. Sendo a fotografia utilizada na publicação, capturada durante o momento do discurso do novo presidente norte-americano. Figura 2 - Capa Revista Time 30 de janeiro de 2017 Vol. 189 nº 3
Fonte: http://time.com/magazine/us/4642992/january-30th-2017-vol-189-no-3-u-s/.
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Primeiridade Na imagem há a fotografia de um ser humano do sexo masculino, loiro, de expressão facial séria, em primeiro plano. Ele veste um terno e está posando com o braço direito erguido com o punho fechado. Está posicionado frontalmente atrás de um microfone e de um púlpito que possui um brasão. O brasão tem uma forma circular, com uma faixa em tom de amarelo no seu contorno, com algumas palavras escritas. Há ainda um contorno composto por pequenas estrelas brancas, além de um desenho de uma água de asas abertas. Ela possui na sua cabeça uma glória com estrelas prateadas. Na garra esquerda segura diversas flechas e na direita possui um ramo verde. A cabeça da ave está voltada para o mesmo lado da planta que mantém nos pés. À frente do púlpito e do presidente há uma barreira transparente de proteção. Ao fundo, segue uma escada. Ela está desfocada, juntamente com outras pessoas. Estas inclusive, não possuem rostos na foto, somente os corpos. De modo que não é possível discernir sobre quantos estão presentes no momento e nem o sexo de cada um. Além disso, há o logotipo da publicação, que está levemente tapado pela mão erguida do homem e por sua cabeça, nas letras T e M. No topo da página se encontram as chamadas para os cinco artigos de opinião, sobre a vitória de Donald Trump para a presidência dos Estados Unidos, juntamente com o nome dos autores de cada conteúdo. O primeiro título tem escrito “Um discurso sem precedentes. Por Davis Von Drehle”, seguido por “Bilionários na Ala Oeste. Por Jon Meacham”, o próximo apresenta “O presidente que amava. Por Ann Patchett”, a quarta chamada diz “Plano de trunfo para tempos de boom. Por Stephen Moore”, e a última chamada traz “Países que mais o temem. Por Ian Bremmer”. Já no canto inferior esquerdo, o título da grande reportagem contida na publicação, a qual trata também sobre a eleição presidencial. A chamada diz: “Donald Trump 45º presidente dos Estados Unidos da América”. Nesta capa, existe um maior uso das cores, mantém-se a borda da página e o logotipo da revista no tradicional vermelho. Tal tom volta a aparecer também na gravata do homem e no tapete ao fundo. Há ainda uma grande presença do azul, dessa vez, em um tom mais vivo. Ele se encontra similarmente no tapete, na bancada, e de forma mais escura no terno do homem. Ainda tem a presença do branco, nas chamadas das reportagens, na camisa do indivíduo em destaque, e também, nas roupas das pessoas desfocadas ao fundo, juntamente com a cor preta. Secundidade Destaca-se, novamente, que para auxiliar na realização das análises presentes neste capítulo, foi feito o uso do Dicionário de Símbolos, de Lexicon (1998), e também do Dicionário de imagens, símbolos, mitos, termos e conceitos Bachelardianos, de Ferreira (2013). 86
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O momento da fotografia representado na revista é o da posse de Donald Trump como presidente dos Estados Unidos. Na ocasião, ele está vestindo o seu habitual terno, que é um traje estadista e traz com ele um status de poder e de conservadorismo. Seu cabelo se mantém penteado para a parte de trás da cabeça, porém é possível ver mais fios brancos, que passam um ar de eternidade, velhice e até mesmo de sabedoria. Já a sua pose, o braço direito erguido com o punho fechado, é um sinal de vitória por resistência. Além disso, é uma expressão de enfrentamento e símbolo de contestação política. Esse gesto começou a ser associado à classe trabalhista, graças ao seu uso em lutas por melhores condições de trabalho. No entanto, a capa apresenta alguns pontos que contrastam entre si. Como o próprio rosto de Donald Trump, que não demonstra o sentimento de alegria. Entende-se que em um momento de vitória, o semblante deveria ser de felicidade, comemoração e satisfação pela condição alcançada. A expressão do presidente não transmite a euforia da conquista. Ele mantém os olhos semicerrados e o semblante sério. Transparece, novamente, uma aura de mistério, de que ele esconde o seu sentimento. Outro ponto que divergente é o uso das cores presentes na imagem. O azul é tido como a cor do partido Democrata, o qual a rival Hillary Clinton, e também o ex-presidente Barack Obama fazem parte. O vermelho, por sua vez, é a cor que simboliza o partido Republicano, o qual Trump pertence. Além disso, as cores azul e vermelho que além de representar grandezas distintas, estão também presentes na bandeira americana. Isso pois a primeira representa sabedoria e pureza; já a segunda indica coragem e força. Assim como o preto e o branco, que são igualmente desiguais, e também estão presentes na imagem. Percebe-se um antagonismo presente na foto. Outros pontos que atraem o olhar são o púlpito com uma insígnia gravada nele e as escadas ao fundo. A bancada indica superioridade, além de atrair o olhar do público para a fala ou ato de alguém. Ela ainda possui estampado na sua frente um brasão, o que traz grandeza, pois o mesmo remete ao tempo do imperialismo, onde as famílias de poder eram distintas das outras, e do povo comum, graças aos seus emblemas. De forma que a imagem gravada no púlpito é a do Grande Selo dos Estados Unidos. Este que foi criado em 16 de setembro de 1782 e é utilizado para autenticar documentos e designar personalidades do Estado17. No entanto, na sua frente há um muro transparente. Este indica que ali há um obstáculo ou até mesmo uma fronteira. A presença desse limite remete à separação de pessoas em níveis, como os ricos dos pobres, pretos e brancos, entre outros, como exemplo o Muro de Berlim. Já as escadas ao fundo de Trump simbolizam uma via de comunicação em dois sentidos, ou seja, tanto o ascendente, quando o povo transmite a 17 Disponível em: https://www.diario-universal.com/arquivo/aconteceu/grande-selo-dosestados-unidos/. Acesso em: 06 de novembro de 2017. AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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mensagem para os superiores; como descendente, de onde a fala vem de homens estadistas para a população. Além disso, ela também retrata um progresso de valor, para a subida, ou uma perda do mesmo, associandose a decida. De forma que esse processo pode gerar medo, angústia, ansiedade e temor, representado por cada degrau da escada a ser vencido. Esta capa, assim como a anterior, possui a atenção voltada para Donald Trump. Esse fato pode ser percebido além dos elementos do nível e do microfone, mas também pelas pessoas presentes na imagem que estão desfocadas. Estes indivíduos estão atrás do presidente, de forma que participam da celebração, mas estão inferiores ao personagem principal da cena. Eles não possuem rostos, nem mesmo sexo ou forma definida, o que deixa o olhar do receptor focado principalmente naquele considerado digno de atenção. Terceiridade Esta capa é a que, dentre as analisadas, apresenta um maior número de chamadas. Ela segue o conceito de Scalzo (2003), de ser um cardápio para o interior da publicação. Chama o leitor para conhecer o que a publicação pensa e que pontos apresentam os autores de cada um dos cinco artigos sobre a vitória de Donald Trump. De forma que publicação firma sua linha editorial perante os leitores. Ferrer (2008) ressalta que a publicação deve seguir na sua identidade visual a mesma ideia que mantém no seu conteúdo, sem nunca esquecer de se manter em sintonia com assuntos da atualidade. Entende-se que esta edição é focada na vitória de Trump para a presidência, o que é perceptível na imagem e nas chamadas das reportagens. Martins (2005) aponta sobre a importância da contextualização de matérias do meio político para a população. E, essa edição da revista traz em grande parte esse recurso. Apresenta diferentes visões e aspectos que influenciaram a vitória de Trump ou que podem vir a mudar com ele na presidência. Essa variedade de reportagens sobre um mesmo tema, acaba por tornar o assunto principal mais esclarecido. Isso é, chamado por Melo (2016), de jornalismo interpretativo, o mais comum de ser encontrado em revistas. A Time utiliza esse recurso para elucidar o leitor sobre a vitória de Donald Trump para a presidência e apresenta diversos prognósticos sobre como será o seu mandato, além da história de vida do estadista. Essas características pertencem ao texto interpretativo. De modo que Beltrão (1976) descreve esse como sendo o gênero responsável pela contextualização dos acontecimentos na vida e no dia-a-dia das pessoas. Esse conceito é apresentado nesta edição através das diversas chamadas de reportagens que vão além da informação em si. Pode parecer, inclusive, como aponta Barreto (2006), que as matérias que tentam adivinhar o futuro da nação se aproximem de um tom mais tendencioso, marca pelo qual o jornalismo político ficou conhecido. Isso pois a revista apresenta nas suas chamadas, o que pode acontecer nos próximos anos, sendo 88
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até mesmo, coisas desastrosas para a população norte-americana, o que reforça a imagem de mistério com o qual Donald Trump é retratado. Esta página de boas-vindas encontra respaldo no que apresenta Padilha (2007), ao ponderar que a fotografia é um item primordial para atrair olhares para a revista. Entende-se que a figura do presidente, nesta imagem, passa a sensação de dúvida. Ele deveria estar em um momento de euforia, após ter ganho a corrida para a presidência, no entanto, a expressão não condiz com o momento em que ocorreu a fotografia. Ele possui o rosto sério e fechado e a mão erguida de punho fechado, o que simboliza uma resistência. Dessa forma, Trump não segue o que destaca Silva (2005), que um político tem de aparentar o que diz e conforme a situação. Ou seja, o momento pede uma postura de felicidade, celebração e até mesmo euforia, o que significaria que o presidente estaria esboçando um sorriso. Mas não é o que acontece, passando dessa forma, o ar de dúvida para quem observa a publicação, de que se ele estaria mesmo satisfeito por ter ganhado as eleições e o que estaria pensando. Esse é o retrato de Trump apresentado na mídia: um homem enigmático, que por muitas vezes não transmite suas emoções, independentemente de qual seja a ocasião em que ele está presente. Sendo entre elas, inclusive, variantes entre momentos de felicidade, como a posse ou até mesmo polêmicos e de repercussão negativa no mundo, como alguns de seus discursos. Portanto, o presidente segue a recomendação de Bezerra (2011), de estar seguidamente em holofote no meio midiático e assim, se tornar presente no imaginário da população. No entanto, Donald Trump está iniciando o processo de formação da sua identidade como presidente perante o público. Silva (2005) aponta que esse primeiro momento da construção ocorre, também, na forma de fala do homem público, como apresentando na fotografia utilizada na capa. Ela retrata o momento em que o estadista fala perante o público, agora como líder do governo norte-americano. E são justamente as fotos dos discursos que foram mais divulgadas pelo mundo, principalmente pela Time. Isso prova que a imagem de um estadista se constrói além do quesito visual. As características físicas de Trump estão consagradas pelas fotos veiculadas. Isso por que ele sempre mantém a mesma expressão facial, olhos semicerrados e sem sorrisos, além do cabelo bem penteado, o que reforça mais ainda a sua seriedade. Essa composição passa, para quem vê a publicação, um ar de dúvida. De forma que parece que a qualquer instante ele pode esboçar um sorriso ou fazer uma reclamação. Isso se intensifica, pois, o receptor não conhece inteiramente quem está ali representado, mesmo que o veja várias vezes. Isso, por consequência, acaba sendo a identidade enigmática que se mantém presente no imaginário do povo. Bezerra (2011) lembra que a imagem é construída. E com ela, se forma também o mito político. Essa estruturação acontece através da repetição e divulgação do homem público, na forma de difusão de material sobre o estadista. Assim, reforça-se e aprimora-se a identidade do
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mesmo, principalmente através do recurso da fotografia. Barthes (2001) ainda conceitua que o mito político tem até uma maneira mais comum de aparecer nas imagens, modelo esse seguido pela Time na retratação de Donald Trump nessa capa. Isso é o posicionamento do candidato, com o rosto iluminado por uma luz sobrenatural, com o olhar pensativo e fixo em interesses próprios, seguido por uma pose de vitória ou triunfo, além de estar se dirigindo ao público, que não está presente na fotografia. É como se ele carregasse todo o fardo, temores, esperança, sonhos e expectativas que a população tem sobre o futuro. Elas estão na simbólica mão direita erguida em punho fechado do presidente. No entanto, como ser mítico, essa pose pode ser diferente em cada região do mundo. Isso porque, como apresenta Batista Júnior (2011), o mito é cultural. De forma que o punho fechado, característico símbolo de luta e resistência americano, pode não ter a mesma simbologia em outros lugares do mundo. Na história norte-americana, essa pose acaba por reforçar a imagem de um indivíduo que venceu, mesmo contra a especulação contrária da maioria da população mundial. Capa Time – Nothing to See Here A terceira capa a ser apresentada é da edição de 27 de fevereiro de 2017, como mostra a Figura 3. Esta edição foi publicada quando Donald Trump já estava exercendo o cargo de presidente norte-americano. Ela trata sobre o perigo que o país corre ao ter Trump no comando e sobre o caos que o mesmo pode gerar na nação. Figura 3 - Capa Revista Time 27 de fevereiro de 2017. Vol. 189 nº 7
Fonte: http://time.com/magazine/us/4672961/february-27th-2017-vol-189-no-7-u-s/
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Primeiridade Na imagem, se vê o desenho de um ser humano do sexo masculino, loiro, de expressão facial brava. Ele está sentado em primeiro plano, atrás de uma mesa que se assemelha à madeira, onde possui as mãos sobre a mesma. Elas se encostam somente através na ponta dos dedos. Há uma tempestade dentro do recinto, que está representada através da chuva e nuvens. Vê-se também papeis voando, juntamente com a gravata e o cabelo do homem, mesmo este estando imóvel. Além desses elementos, há ainda um objeto pesado, que se assemelha a um telefone de ramais, e que também começa a levantar voo. Ao fundo, é possível observar uma janela e suas cortinas, sendo estas imunes ao vento que parece passar dentro do ambiente. A água que cai das nuvens respinga na superfície da mesa, esta que possui diversos desenhos talhados na madeira e no seu centro há um brasão. Esta se encontra imóvel em meio à tempestade, juntamente com as cortinas ao fundo, o homem e a cadeira no qual está sentado. Mesmo estando estático, o cabelo e a gravata do homem estão voando, porém ele não está molhado da chuva. Juntamente com algumas folhas que estão indo em direção ao lado direito da capa, seguindo o mesmo sentido da chuva que aparece em forma de riscos. As páginas que estão esvoaçando estão em branco, e as que ainda não foram levadas, estão empilhadas de forma desorganizada em cima da mesa. Em relação ao título, é visto somente o logotipo da revista, e uma frase que diz ‘nada para ver aqui’, presente em meio as nuvens. Quanto ao uso de cores, mantém-se o característico vermelho presente nas bordas da página e na gravata do homem. Porém, dessa vez há um uso intenso do tom cinza, tanto na chamada e no nome da publicação, e em tons mais claros ou escuros, nas nuvens e na chuva. Há ainda uma maior presença do branco nas folhas que voam na imagem, indo além daquele encontrado na camisa do indivíduo. Mantém-se o azul escuro do terno, presente também na janela, porém de forma mais clara. Também se tem o uso dos chamados ‘tons pasteis’, que aparecem na forma mais viva de amarelo na cortina e mais escuro, na mesa. Secundidade Para auxiliar na realização das análises presentes neste capítulo, novamente, usou-se o Dicionário de Símbolos, de Lexicon (1998), e também do Dicionário de imagens, símbolos, mitos, termos e conceitos Bachelardianos, de Ferreira (2013). Esse caos representado na capa acontece dentro de um ambiente fechado. Isso pode ser perceptível devido à presença das janelas e cortinas na imagem, dentre outros elementos, como a mesa e as folhas. O local onde acontece essa tempestade, é a sala presidencial americana. Essa localização pode ser confirmada pela presença do Grande Selo dos Estados Unidos, gravado em meio a outros detalhes na mesa presidencial. AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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Este símbolo, já visto na segundo capa estudada, serve para autenticar documentos e distinguir pessoas e objetos do Senado dentre a população. Já a própria mesa serve como representação de um sinal espiritual. Ela está associada às reuniões, comunhões, mas também ao poder, sendo dessa forma o local de tomada de decisões do presidente. Assemelha-se a algo sagrado. Os pingos de chuva rebatem na superfície, de forma que a molha. O que torna esse local vulnerável, podendo inclusive, ser atingido por diversos elementos, entre eles, a própria água. Esta ilustração apresenta alguns pontos que destoam entre si. Mesmo com a tempestade levando objetos pelos ares, ainda há peças que permanecem imóveis, mesmo com a presença do vento. Dentre elas está a mesa, as cortinas e Donald Trump em sua cadeira. Todavia, ele tem o cabelo e a gravata voando, permanece estático, mantendo uma expressão facial que beira a indiferença ao caos a sua volta. Sinal esse, que é reforçado com as páginas em branco que voam na sua frente, que significam que não há nada a ser dito e/ou escrito, em uma situação de caos e confusão. O seu cabelo está voando, mas, estranhamento arrumado, anuncia que ele passa por uma situação complexa e confusa, mas se mantem inalterado. A imagem ainda apresenta a forma de uma janela ao fundo. Esta que carrega consigo a ideia de receptividade, abertura de influências vindas de fora do ambiente fechado. Pode-se ir além e simbolizar também a consciência humana. Quanto às cores, a capa possui uma grande presença da cor cinza, que carrega a ideia de incerteza. No entanto, outra coloração presente é o amarelo, tanto na sua forma mais clara como na mais escura. Ela representa o ouro, luz e dinheiro, seja na forma de posse ou no desejo. A desordem presente na página de boas-vindas da publicação, se deve à presença da tempestade, formada por nuvens escuras, vento e chuva. O temporal simboliza o caos e anuncia a aproximação de conflitos, além de uma etapa de mudança. Os ventos, representam o passageiro e o provisório. E, na sua forma mais forte, indicam a presença de uma ameaça. A chuva pode simbolizar tristeza, destruição e sofrimento. Dessa forma, o cenário se completa com a presença de nuvens escuras, que são sinal de acontecimentos negativos e de confusão. Terceiridade Essa capa segue o uso da gravura, apresentado por Amaral (1982) como sendo histórico. Não há o recurso da fotografia, somente o desenho, para passar a ideia do que irá se tratar a reportagem especial da edição. De forma que a torna até mais imaginativa do que real e concreta, sobre um fato a ser apresentado. Essa capa sem a presença de elementos reais e concretos, a partir da fotografia, remete ao antigo modo de fazer revista, apresentado por Werneck (2000), como literário. Pois no início da história da publicação, as reportagens eram mais extensas e até mesmo se assemelhavam com uma história. Nesse tempo, eram usadas gravuras para passar uma ideia do que se tratava a matéria, assim como nessa edição. 92
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CONSTRUÇÃO DA IMAGEM
Destaca-se Erbolato (1981) ao mencionar que a foto/imagem informa o leitor que a vê, de forma que ele não precisa ler o texto para receber a informação. Ao visualizar a imagem, ele é comunicado de que acontecimento se trata a reportagem. No entanto, essa primeira página segue um rumo diferente, ela não informa de forma clara sobre o que irá se tratar a matéria principal, visto que não há tempestades em ambientes fechados, o que gera especulação entre o leitor e o desejo de conhecer o interior da publicação. Nas páginas de uma revista, o receptor espera encontrar mais do que a simples informação presente na gravura. Scalzo (2003) saliente que quem consome uma revista, quer também se entreter, sendo essa, a principal diferença entre os veículos de comunicação. Isso ocorre nessa edição da Time desde a sua capa. De modo que o leitor pode ocupar o seu tempo decifrando os elementos presentes na capa. Analisando o seu conjunto de cores, descobrindo quais objetos levantam voo. E, interpretando o porquê de Donald Trump estar imóvel em meio a ventania, entre outros aspectos. Collaro (2000) pondera que o profissional responsável pela elaboração da capa, seja ele o editor ou diagramador, tem de ter a ideia de destaque. De forma que a imagem escolhida se acentue entre as demais e atraia o olhar do público. Essa capa realiza este trabalho, pois pelo conjunto de tempestade e caos, há no centro dela um Donald Trump imóvel e inabalado pelo o que acontece ao seu redor. Desperta dessa forma, a curiosidade no receptor e consequentemente, o desejo de consumir a informação. Isso se deve graças a uma boa utilização de elementos gráficos. De acordo com Ferrer (2008), eles são primordiais para compor uma capa que atraia o olhar do público. Nesta edição, o principal recurso utilizado foi o desenho, de forma que não há o uso da fotografia. E esta é uma gravura repleta de detalhes, que se revelam conforme maior tempo o receptor tem para analisá-la. Conforme as outras publicações, o presidente americano retratado nessa capa, mantém a sua expressão facial indiferente ao que acontece ao seu redor. Em meio ao caos, ele ainda permanece sério, não esboçando medo, temor, pânico ou apreensão pela tempestade a sua volta. Entendese que o presidente está administrando a sua imagem. Silva (2005) aponta que isso é importante para criar uma identidade no meio político. E desse modo, procurar atender às expectativas do público e de entidades governamentais. No entanto, essa capa apresenta um Donald Trump que não se esforça em se ajustar a perspectiva do receptor. É retratado da mesma maneira das capas anteriores, onde ele não esboça uma reação ao seu meio, deixando o leitor na expectativa do que irá fazer. Essa representação encontra sustentação no conceito que Weber (2004) ao apresenta que a imagem criada não retrata a real identidade do estadista. A aparente calma perante o perigo representado na capa, não significa que Trump reaja dessa forma sobre a mesma situação.
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No entanto, essa capa abre espaço para uma reflexão, se a revista está sendo tendenciosa ou não. Martins (2005) adverte que a publicação, e principalmente o jornalista, deve deixar claro para o receptor a diferença entre informação e opinião. Barreto (2006) complementa que só cabe aos colunistas expressarem seu ponto de vista, e no espaço reservado a eles. No entanto, em alguns casos, a própria publicação apresenta, de forma clara, o seu pensamento. Isso ocorre na forma de artigo, que carrega como autor, o logotipo do meio de comunicação. Contudo, essa edição da Time não deixa definida essa distinção. E isso se deve em parte ao uso do desenho para representar a desordem, que a revista acredita estar, o governo norte-americano. A publicação faz o uso da tempestade, que traz uma sensação de incerteza e aproximação do caos para o receptor. De modo que pode ser aberta a discussão para de que maneira cada indivíduo reagiria na mesma situação apresentada. Se haveria uma reação contrária à apresentada na capa, como por exemplo, um ato de inquietação. Ou, até mesmo, se seria possível permanecer como Trump está, imóvel, calmo ou inclusive, indiferente ao acontecimento ao seu redor. Assim, ele pode ser considerado um mito. De acordo com Eliade (1972), o ser mítico é um exemplo para os homens. Ele se torna modelo de comportamento, seja positivo ou negativo. Isso se deve à alta repercussão de imagens do presidente, podendo inclusive, já estar presente no imaginário das pessoas. O que o torna, conforme o autor, um mito não distante do homem, mas sim, próximo dele. Outro fator que contribui para essa criação, é a exposição do presidente na mídia. De acordo Barthes (2001), o mito é construído na era moderna devido à representação no meio audiovisual. Fato esse que ocorre com Trump, como pode ser percebido, inclusive nesse estudo. Que, além das quatro capas de meses consecutivos de uma mesma publicação que retratam o presidente norte-americano, há ainda outras diversas edições com Donald. De forma que isso acaba por contribuir para a formação como um ser mítico da atualidade. Capa Time – Trump’s War on Washington A última capa a ser apresentada é da edição de 20 de março de 2017, como mostra a Figura 4. Essa edição trata sobre as diversas batalhas em que Trump vivencia. As principais são o perigo vindo da Coreia do Norte, mas também, contra a imprensa. De modo que independente da guerra, ele sempre faz o uso da sua maior arma, a rede social Twitter.
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CONSTRUÇÃO DA IMAGEM
Figura 4: Capa Revista Time 20 de março de 2017. Vol. 189 nº 10
Fonte: http://time.com/magazine/us/4696416/march-20th-2017-vol-189-no-10-u-s/
Primeiridade Na capa é notável ver um ser humano na sua forma gigante, sendo maior do que outros elementos conhecidamente grandiosos, como as árvores e prédios. No entanto, há um monumento que é um pouco maior que o indivíduo. Este que é do sexo masculino, veste um terno e tem o cabelo loiro, bem penteado. Ele segura na mão esquerda um dispositivo que se assemelha a um celular e a direita se encontra erguida e, com o dedo indicador apontado para o dispositivo. Mantém no rosto, uma expressão facial de concentração. Se encontra de pé e escorado no monumento, inclusive com um dos pés apoiado na construção ao seu lado. A edificação está quebrada, estando inclusive dividida em quatro partes. O céu está parcialmente nublado, ou seja, não há a presença do sol e nem da chuva, somente nuvens carregadas, no entanto, no canto inferior direito, há a imagem de céu claro. Na parte de baixo da página tem a presença uma construção, que se assemelha, com uma grandiosa casa ou até mesmo um palácio, ela fica, juntamente com o homem, dentro de um jardim. De modo que o indivíduo pisa dentro deste espaço dedicado a flores e outras vegetações. Observa-se ainda a existência de duas bandeiras maiores, seguidas por mais cerca de 23 menores, todas com a mesma estampa. Elas ainda parecem estar sendo sopradas pelo vento para o lado esquerdo da página. Outro elemento presente na capa é um espelho d’água, que reflete a base do monumento, o céu, e ainda, um pedaço da perna e do pé do homem na imagem. Quanto às chamadas de reportagens, há somente o título da matéria especial, que fala sobre Trump. Além dela, existe também o logotipo da publicação em preto. No que se refere ao uso das cores, há novamente AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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o vermelho da gravata e do entorno da página. Tem também, o branco da camisa, presente ainda na construção na parte inferior da página e no dispositivo que o homem carrega. Já o monumento branco tem o tom que se assemelha a um tipo de pedra nobre, como o mármore, e a segunda construção no canto esquerdo possui a coloração mais acinzentada. O terno que ele veste desta vez é preto. Ainda há a presença do verde na vegetação e do marrom da calçada. O azul é encontrado no seu tom mais claro, presente no céu, no chafariz e também no espelho d’água. Essa capa, dentre as analisadas, é a que faz o maior uso de cores e de elementos. Secundidade Para auxiliar na realização das análises presentes nesta categoria, usa-se, mais uma vez, o apoio do Dicionário de Símbolos, de Lexicon (1998), e do Dicionário de imagens, símbolos, mitos, termos e conceitos Bachelardianos, de Ferreira (2013). O maior destaque dessa capa é a presença de Donald Trump representado em uma forma maior do que o restante dos elementos presentes, sendo ele menor apenas que o monumento ao seu lado, o Obelisco que fica em Washington, Estados Unidos. O gigante é um símbolo da natureza em seu estado selvagem, sendo muitas vezes representado de forma desajeitada e até mesmo mal-intencionada. Ele ainda pode significar uma ampliação quantitativa do que há de ruim no ser humano. Além de trazer o sentido de um homem antes da queda ou a representação de como o indivíduo se vê com o meio a sua volta. O cenário presente na imagem representa o entorno do Capitólio, nos Estados Unidos. Com destaque para o Obelisco, sendo esse, o único elemento maior do que Donald Trump. Porém, o mesmo não aguenta o peso do gigante que se apoia nele, e acaba por quebrar em quatro partes grandes e outras menores, o que significa que este homem está prestes a derrubar o monumento com o seu peso. Isso pode significar a queda de algo que envolva toda a nação, pois o Obelisco é uma construção arquitetônica de 169 metros de altura que se transformou em um símbolo para o país, por representar a grandeza e os poderes do primeiro presidente americano George Washington18. Já o próprio Capitólio é o centro legislativo do governo dos Estados Unidos. É o local onde ocorrem reuniões do Congresso, e principalmente, a tomada de decisões presidenciais. A construção é pintada com a cor branca, simbolizando que ali deve ser a morada da pureza, da integridade e das boas intenções. Pensamentos estes que o próprio presidente tem de carregar consigo. O Capitólio está cercado por cerca de 23 bandeiras americanas que aparecem na imagem, sendo duas delas maior que as restantes. A bandeira carrega o peso de ser o símbolo máximo de 18 Disponível em: https://istoe.com.br/obras-deixarao-fechado-obelisco-de-washingtonpor-mais-de-dois-anos/. Acesso em: 06 de novembro de 2017.
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representação da nação estadunidense perante o mundo. Ela foi criada em 4 de jullho de 1960 e possui o desenho de 50 estrelas, que simbolizam os estados do país. Já as listras horizontais vermelhas e brancas simbolizam as 13 colônias inglesas que deram início a nação19. A construção de cor acinzentada que surge no canto inferior esquerdo da página, trata-se da parte superior do Memorial presidencial Thomas Jefferson. Este monumento possui o seu formato de cúpula e é cercado por pilastras. Ele foi inaugurado em 1943 e abriga uma estátua do terceiro presidente americano, Thomas Jefferson, com quase seis metros de altura. A construção se deve pela importância que o estadista teve para o país, sendo um dos autores da Declaração de Independência dos Estados Unidos20. Na imagem, Donald Trump tem a expressão facial de quem está prestes a tomar uma decisão. Isto se deve ao seu olhar concentrado no aparelho que carrega. No entanto, a sua postura corporal que se apoia completamente no Obelisco, sugere despreocupação com o seu redor. O que inclui o monumento quebrado e o céu nublado atrás de si. Contudo, a sua pose pode ser entendida também como se o presidente estivesse em um ato displicente. Isso é reforçado graças ao uso do celular em um local de grande importância para a nação norte-americana. Entende-se que ele passa a ideia de que desconsidera o congresso, a população, os objetos sólidos que quebram ao seu toque ou até mesmo o receptor da imagem. O excesso de nuvens simboliza um tempo de transição, transformação, indecisão ou até mesmo confusão. Além de poder significar também quando há um indivíduo com dificuldade de raciocínio. O que se complementa com o ato de pré-decisão, em que Trump está representado. No entanto, a pose do presidente pode passar a ideia de quem utiliza o celular para acessar a alguma rede social, sendo a principal opção o Twitter, pois é conhecido o recorrente acesso do presidente neste site. O que pode parecer, inclusive, que Trump aguarda por algo, e por isso utiliza o telefone, ou até mesmo, que ele não liga no que ocorre ao seu redor, e prefere se entreter no seu dispositivo pessoal. Já em relação ao uso das cores, há o recurso do azul combinado com o vermelho, o que remente à coloração presente na bandeira américa, fato esse que se repete nas outras capas analisadas. No entanto, a capa faz uso de outros elementos como a água e as matas, representadas pela grama e árvores presentes na imagem. O verde que elas carregam é considerada a cor da esperança, da natureza ou do dinheiro, além de ser também a significação de um ciclo de vida novo. Já a água, simboliza a origem da vida ou até mesmo um ponto de transformação. É considerada também um ponto de mudança. Esses aspectos indicam um contraponto ao princípio de 19 Disponível em: https://www.estudopratico.com.br/significado-da-bandeira-dos-estadosunidos/. Acesso em: 06 de novembro de 2017. 20 Disponível em: https://guia.melhoresdestinos.com.br/thomas-jefferson-memorial-1593717-l.html. Acesso em: 06 de novembro de 2017. AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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caos apresentado na parte superior da imagem, sinalizando que a tomada de decisão de Trump pode levar a nação a um caminho de prosperidade ou até mesmo catastrófico. Terceiridade Essa primeira página da revista, também não faz o recurso da fotografia, mas, da gravura. Trump é apresentado como um ser gigante e prestes a tomar uma decisão. O seu peso que acaba por quebrar o Obelisco, passa uma sensação de apreensão para o receptor sobre o futuro, pois a estabilidade americana pode estar ameaçada. Isso vai ao acordo do que Erbolato (1981) apresenta, ao considerar que a diagramação da capa deve gerar comentários, de forma que essa o faz. Cria a discussão sobre o ponto principal da capa: o Obe- lisco quebrando ou um presidente colossal, que possui um celular na mão e está prestes a tomar uma decisão ou publicar um tweet. Cria-se dessa forma, diferentes interpretações para uma mesma imagem. Mas, para isso é preciso que o leitor tenha que consumir o conteúdo da publicação para saber o que significa esse gesto do presidente. E para que o público possa compreender a mensagem que a revista quer passar, se faz o uso do gênero interpretativo no texto. De acordo com Campos (2009), este gênero serve para informar o receptor, se possível, sobre todos os aspectos de um mesmo assunto. O que no caso dessa edição, faz com que o leitor tire a própria conclusão, de que se Trump está pensativo ou descontraído na capa. Isso sem nunca esquecer do que Miguel (2002) salienta ao referir que a mídia serve como meio de comunicação e contato entre os homens estadistas e a população. Assim, passar a informação de forma clara para o povo, se torna inclusive, mais importante para o receptor do que até mesmo, desvendar os elementos presentes primeira página da edição. Cerqueira (2007) recorda que a capa serve para atrair olhares e gerar a curiosidade de conhecimento sobre o conteúdo da publicação. Esta primeira página causa essa sensação no receptor, pois além de gerar o debate sobre o seu foco, ela propõe que o leitor encontre a resposta para o seu questionamento nas páginas da publicação. Pois somente a análise rápida feita na banca de revista ou até mesmo em um anúncio na web, não servirá para explicar o fato apresentado. Entende-se que essa é uma capa literária e não um fato real representado através do desenho. Ela é interpretativa e imaginativa e não concreta e palpável. No entanto, mesmo não representando o real acontecimento descrito no seu interior, essa edição ainda carrega a identidade visual já consolidada na publicação. Scalzo (2003) aponta que manter uma unidade, de pelo menos um elemento gráfico entre as capas, serve para que se crie um padrão estético e jornalístico para a revista. No caso da Time, a utilização do contorno da página em vermelho é o aspecto mais característico. É possível inferir que o leitor da publicação a reconheceria em uma banca de jornal ou em um catálogo na web, mesmo sem a presença do seu logotipo. 98
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De acordo com Baldissera (2008), a imagem serve também para alimentar a imaginação do leitor, de modo que o indivíduo seja apresentado principalmente na mídia. Silva (2005) salienta que esta é a principal maneira de se construir a imagem de um estadista, através dos meios de comunicação. E, é graças a uma grande divulgação, que o homem público se torna presente no imaginário do povo. Podendo inclusive, aguçar a curiosidade do receptor, em especial, quando retratado nas capas de revistas. Isso leva o leitor a se questionar sobre a expressão corporal e facial de Trump. Ele ainda mantém seu rosto enigmático, os típicos olhos semicerrados e boca sem expressar um sorriso. No entanto, dessa vez, ele não sustenta o olhar diretamente na câmera ou além dela. Ele não se comunica diretamente com o receptor. O presidente dos Estados Unidos é apresentado nessa capa com a atenção voltada totalmente para o celular, deixando a interpretação de que algo ali o atrai mais do que os elementos que estão ao seu redor. Sua pose se apresenta mais leve, devido a maneira que foi retratado escorado no monumento ao seu lado. Porém, cabe ressaltar que Trump permanece indiferente ao que acontece ao seu redor, não esboçando preocupação, ou cuidado pelo fato de que o Obelisco está quebrando devido ao seu peso, podendo cair e o derrubar a qualquer momento. Pouco se importa também que o céu nublado, indicando que as chuvas se aproximam. Como mito, nessa capa o presidente segue o conceito de Eliade (1972), de que um ser mitológico poder ser interpretado através de diversos pontos de vista. Além de também ir ao encontro com a ideia de Barthes (2001), onde o mito não se relaciona com um objeto. Isso acaba por abrir margem para variadas interpretações, principalmente nesta figura. Entende-se que a significação pode variar sobre a importância que a sua decisão irá causar na vida das pessoas e suas consequências ou sobre sua eminente queda. Assa gravura ainda carrega pontos que destoam entre si. Percebe-se o céu nublado, como um anúncio da chegada do caos. No entanto, a água e a vegetação carregam consigo uma simbologia repleta de esperança e de transformação positiva. Porém, o Obelisco indica que Trump não tem muito tempo para tomar a sua decisão. Já que o mesmo está quebrado e ruindo, o que pode simbolizar que a mudança, seja ela qual for, deve chegar rapidamente. Contudo, o presidente parece não se importar com esses fatores, causando dúvida e até mesmo temor para o leitor. O que o faz consumir o conteúdo da revista, e talvez, até mesmo, se posicionar sobre o que a imagem deseja passar ao leitor. IMAGENS CONSTRUÍDAS O jornalismo de revista é um produto único e diferente de outras mídias. Entre outras características, uma singularidade da revista é a possibilidade de uma maior capacidade crítica de quem a lê. Isso graças ao gênero interpretativo, utilizado para aprimorar o texto, e assim, apresentar AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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a informação de uma forma mais completa. Fato que se deve também, pela periodicidade da mesma, sendo publicada de forma semanal, quinzenal ou mensal. Dessa forma, a revista tem a capacidade de misturar o jornalismo não factual com a prestação de serviços e o entretenimento. Ela vai além de apenas informar e também, alimenta o pensamento crítico do leitor. Outro elemento que destoa a revista de outros veículos de comunicação é a capa. O uso de fotografias ou de gravuras, combinado com elementos verbais, além de outros recursos gráficos, contribui para a criação desse estilo da publicação. Como visto no decorrer da pesquisa, a capa serve para atrair o olhar do receptor, seja em bancas de jornais ou até mesmo em um catálogo na internet. A harmonização entre fotografias, elementos gráficos e a escolha de assuntos de interesse sobre o mundo em que os leitores vivem, garante que a página de boas-vindas seja bem recebida. O que acaba consequentemente, despertando a curiosidade e o desejo de conhecer o interior da publicação. Observando as capas selecionadas, entende-se que o visual e a linguagem corporal do presidente nas capas remetem a uma ideia de indiferença aos acontecimentos a sua volta. O uso sempre recorrente do terno, o cabelo bem penteado para trás, pintado de loiro, mas com alguns fios brancos aparecendo, são signos que remetem ao conservadorismo e a busca por um status de poder. Os olhos semicerrados e a boca que não expressa um sorriso, transmite a ideia de mistério, seriedade e indiferença com o meio ao seu redor. A retratação acontece sempre em primeiro plano, em um tamanho grande de imagem e sem outras pessoas ou elementos que se destaquem mais do que o presidente. Em duas capas, ele acaba por cobrir partes do logo da revista, o que o transforma no centro da edição. Verifica-se que a Time dá uma grande visibilidade para a área de jornalismo político na escolha de suas matérias, disponibilizando um maior espaço para o presidente dos Estados Unidos. Conforme fora explicado, o jornalismo político trata sobre assuntos que vão além, do que somente a cobertura das eleições. Ele aborda também sobre o dia a dia de órgãos governamentais e estadistas. A publicação ainda realiza uma contextualização dos assuntos políticos para entendimento de todo o público. Isso pode ser percebido através das chamadas presentes na revista, que apontam diferentes aspectos sobre a vitória de Donald Trump para a presidência, como ocorre na capa de janeiro. Assim, ao retratar políticos, principalmente os presidentes mais famosos, a revista usa a notoriedade deles como ferramenta para atrair o olhar do consumidor. E dessa forma, acaba por reforçar a construção de imagem do indivíduo, chegando até mesmo ao caráter de mito. É isso que acontece com o atual presidente Donald Trump, assunto principal das quatro edições estudadas nesta pesquisa. Ao realizar essa construção e divulgação do estadista, a revista acaba reforçando a sua identidade como mito perante o leitor. Portanto, pode-se dizer que a publicação possui sim influência na construção da imagem que o público faz sobre o presidente retratado nas suas capas. Caso ela represente um indivíduo como símbolo 100
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de um partido, ou até mesmo de um país, como é o caso das edições analisadas nesta pesquisa, isso acaba refletindo na leitura que os receptores da Time terão sobre o mesmo. No entanto, é possível perceber certa contrariedade nessa construção. As imagens que retratam Donald Trump nas capas costumam o colocar em um patamar de antagonismo com o entorno. Nas quatro capas analisadas, tanto a expressão corporal como a facial do presidente não condizem com o que ocorre a sua volta. De forma que na primeira a ser examinada, a edição de 19 de dezembro de 2016, possui a chamada de que Trump foi eleito a pessoa do ano pela Time. No entanto, a sua pose é quase de costas para o fotógrafo. Ele está sentado em uma poltrona que apresenta ter pequenos rasgos e mantém no semblante um tom de mistério. Ele não esboça felicidade e ainda tem um ar de quem está prestes a dirigir uma piscadela ao leitor. A segunda edição retrata o momento da posse de Trump como presidente dos Estados Unidos. O momento pede um clima de contentamento, porém o estadista mantém rosto sério e ainda posa com o braço direito erguido, de punho fechado, como um sinal de enfrentamento. A terceira publicação traz o desenho de Trump em meio a uma tempestade que esvoaça grande parte dos elementos, menos o presidente. Já a quarta capa, o apresenta como um gigante, maior até mesmo que o Capitólio. Ele está escorado no Obelisco, que está quebrado e prestes a desabar, por não aguentar o peso do estadista. Essa discordância entre a imagem de Trump perante os outros elementos visuais das capas, pode ter sido escolhida propositalmente pelos editores da Time. De forma que ela gere um contraste perante o leitor, e assim, desperte o desejo de consumir a revista e desvendar os elementos que divergem entre si. Estas capas também podem ser consideradas como uma demonstração de como a revista tenta construir a imagem do presidente como um ser indiferente, enigmático, duvidoso e até mesmo, como um mito que representa certa negatividade. É visível que a imagem de Trump passa uma mensagem e o cenário ao seu redor passa outra, dependendo da análise feita pelo leitor. Pode-se inferir que a Time constrói a imagem do presidente norteamericano baseada na expressão facial, já característica da personalidade enigmática do presidente. A revista utiliza essa particularidade para o representar nas capas como uma pessoa alienada ao seu meio. Isso pode ser percebido pela repetição da figura de Trump de olhos semicerrados e boca que não esboça sorriso, tristeza ou até mesmo fúria. Ele é representado sempre com essa expressão de seriedade e mistério, reforçada ainda mais pelo constante uso do terno e do cabelo bem penteado para a parte de trás da cabeça. Essa exposição ocorre independente do meio em que o presidente está inserido. De modo que ele não estabelece um contato com o que há ao seu redor, como no caso da tempestade, do Obelisco quebrando ou até mesmo no momento da sua posse como líder do governo norte-americano. AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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Essa indiferença com o que está ao seu redor, passa uma ideia de negatividade para o receptor, pois o presidente não parece se importar com o que o leitor da revista acha dele. Parece, inclusive, que em uma das capas o mesmo está prestes a dar uma piscadela ao receptor, como se dissesse que acabou de enganá-lo. Isso passa um ar de mistério e até mesmo de apreensão, pois é ele quem detém o futuro da nação. De forma que a sua pose, em grande parte rígida, mantendo-se até mesmo imóvel perante uma tempestade, passa uma ideia de conservadorismo. A sua expressão corporal se altera somente em uma capa. Isso ocorre, pois ele está com um celular na mão. Como consequência, o presidente aparece de uma maneira mais relaxada e até mesmo descontraída, assim como o mesmo é na rede social que mais utiliza, o Twitter. As cores utilizadas pela Time, junto com o fato de Trump estar sempre em primeiro plano nas capas, reforçam a concepção de grandezas distintas presentes em uma mesma imagem. As cores predominantes são sempre o vermelho e o azul, presentes na bandeira do país e que também representam os dois partidos políticos norte-americanos. A grandiosidade dada a Donald o faz parecer até mesmo mais importante que outros fatores presentes na capa. Sejam esses elementos pessoas, que não ganham rostos, formas definidas, de maneira que não passam de borrões na fotografia, ou até mesmo, um dos maiores monumentos norte-americanos, o Obelisco. Tudo isso serve para que ele engradeça e como consequência, tudo ao seu redor diminua. REFERÊNCIAS ACERVO FOLHA. Folha de São Paulo, 2002. Disponível em: <http://acervo. folha.uol.com.br/fsp/2002/10/26>. Acesso em: 19 setembro 2017. ALI, Fátima. A arte de editar revistas. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2009. AMARAL, Luiz. Jornalismo matéria de primeira página. 3 ed. Laranjeiras: Tempo Brasileiro, 1982. ARAÚJO, Washington. O que dizem as capas. Observatório da Imprensa, 2009. Disponível em: <http://observatoriodaimprensa.com.br/jornal-dedebates/o-que-dizem-as-capas/>. Acesso em: 11 setembro 2017. BAHIA, Juarez. Jornal, história e técnica. 4 ed. São Paulo: Ática, 1990. BALDISSERA, Rudimar. Significação e comunicação na construção da imagem-conceito, 2008. Disponível em: <http://revistas.unisinos.br/index. php/fronteiras/article/view/5397>. Acesso em: 11 outubro 2017. BARRETO, Emanoel. Jornalismo e política: a construção de poder. UFSC: Florianópolis, 2006. BARTHES, Roland. Mitologias. 11 ed. São Paulo: Bertrand Brasil, 2001. BASSETS, Marc. Donald Trump vence as eleições dos Estados Unidos. El País, 2016. Disponível em: <https://brasil.elpais.com/brasil/2016/11/09/ internacional/1478660050_114058.html>. Acesso em: 07 setembro 2017. 102
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Capítulo 5
JORNALISMO INTERNACIONAL: UM ESTUDO SOBRE A COBERTURA DE GUERRAS E CONFLITOS Márcio Chaves Nunes
A área de cobertura e divulgação de informações internacionais nasceu há séculos. Atualmente, essa editoria permite que as pessoas compreendam situações que acontecem em outros países. Segundo Peres (2005), a cobertura das informações internacionais é formada por notícias consideradas importantes em âmbito mundial, além de ser determinada por paisagens jornalísticas, que fazem referência ao acontecimento e à pessoa inserida no fato, mas principalmente em relação onde tudo ocorreu. A cobertura jornalística internacional também possui diferentes enfoques diariamente. Conforme Bomfim (2012), aborda temas diversos, pois são publicadas notícias sobre economia, política e cultura. No século XX, ocorreram as principais mudanças que fundamentam a área do jornalismo internacional atualmente. As principais transformações, de acordo com Sousa (2008), ocorreram entre o início da Primeira Guerra Mundial (1914)1 e a queda do Muro de Berlim2 (1989). O autor cita alguns fatores que influenciaram diretamente na evolução da cobertura jornalística internacional, como a aceleração do desenvolvimento científico e tecnológico, a ascensão e queda de regimes totalitários, as guerras mundiais e o surgimento do terrorismo, a potência de diferentes nações, os problemas com o meio ambiente e o surgimento de meios eletrônicos de comunicação. Com o interesse do Ocidente em notícias relacionadas ao Oriente, por ser considerado diferente, a cobertura jornalística aumentou na região (RIBEIRO, 2010, p. 26). Segundo Fino (apud STEINBERGER-ELIAS, 2016), durante a Guerra do Iraque, os curdos relacionavam a palavra guerra à 1 Primeira Guerra Mundial. Disponível em: https://www.infoescola.com/historia/primeiraguerra-mundial/. Acesso em: 06 mar. 2018. 2 O Muro de Berlim. Disponível em: http://infograficos.estadao.com.br/especiais/muro-deberlim/. Acesso em: 06 mar. 2018.
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JORNALISMO INTERNACIONAL
luta para conservar a sua própria identidade, ao contrário do conceito jornalístico que é associado aos conflitos em um campo de batalha. Os confrontos resultantes das diferenças religiosas, culturais e ideológicas possuem amplo destaque na editoria internacional. De acordo com Viana e Lima (2013), pode-se perceber que entre os temas mais expostos, sobressai-se a violência da cobertura de guerras e conflitos. Os autores acrescentam que desde os primórdios estas informações são atrações no noticiário internacional. Porém, a cobertura de guerras, principalmente no Oriente Médio, levanta dúvidas, porque se concentra em eventos e não em processos (SHINAR, 2009), ou seja, as informações divulgadas focam apenas nos resultados do conflito e não na sucessão de acontecimentos que levaram ao combate. Por outro lado, além da violência que ocorre no Oriente Médio estar na pauta dos jornais ao redor do mundo, Agnez (2015) acrescenta que fatos pontuais da cobertura internacional, como eleições e polêmicas envolvendo governos, também exercem uma grande influência em relação ao tipo de assunto abordado pelas editorias. A partir dessa abordagem por parte da mídia, Zhang e Hellmueller (2016) salientam que essa prática global do jornalismo demonstra os poderes espalhados pelo mundo, mostra identidades e também novos espaços. Com o interesse em notícias do Oriente Médio, o advento de agências e o envio de jornalistas para países estrangeiros, a imagem do correspondente internacional foi fortalecida (VIANA; LIMA, 2013). Com base neste aspectos pontuados, este artigo se caracteriza como uma pesquisa exploratória, de abordagem qualitativa. Com o uso da pesquisa bibliográfica e da pesquisa documental, realizou-se uma revisão bibliográfica (GIL, 2008; DUARTE; BARROS, 2008). Traçou-se como objetivo principal apresentar o Jornalismo Internacional, dos primórdios à era da globalização e da internet, além de destacar a presença de correspondentes e enviados internacionais à situações de conflito, com destaque para o Oriente Médio. JORNALISMO INTERNACIONAL De acordo com Natali (2007), o jornalismo já nasceu internacional, na época do mercantilismo, que ocorreu entre os séculos XV e XVIII3. Segundo o autor, este processo mercantil necessitava da troca de informações e por isso o sistema foi criado. Esta informação passou a ser adquirida a partir da compra por um grupo de pessoas que seriam chamadas mais tarde de agentes econômicos. “O jornalismo nasceu, isto sim, sob a forma de jornalismo internacional, com o formato de coleta e difusão de notícias produzidas em terras distantes” (NATALI, 2007, p. 23). O autor ressalta que a origem desta área está ligada diretamente à 3 Mercantilismo – História do mundo. Disponível em: https://historiadomundo.uol.com.br/ idade-moderna/mercantilismo.htm. Acesso em: 03 mar. 2018. AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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comercialização de informações como um meio para fortalecer os negócios, ou seja, a economia mercantilista. Segundo Natali (2007), a informação de qualidade era importante para o capitalista que existia no Renascimento e o empresário mercantilista, pois caso não estivessem bem informados, por exemplo, não iriam saber dos riscos em transportar um carregamento de barco de Istambul a caminho de Veneza. Naquela época, a comunicação sobre informações internacionais era feita pelo coranto, uma espécie de informativo de papel que surgiu nos Países Baixos no século XVII e que antecedeu os jornais (BARON; DOOLEY, 2005). De acordo com Natali (2007), essas publicações permitiam que fosse criado um acervo de informações importantes para os homens vinculados à economia mercantilista terem acesso. Além disso, outro fator apresentado pelo autor que contribuiu para a origem da divulgação das notícias internacionais foi o fato do acesso às informações se tornarem regulares em relação à entrega ao cliente, ou seja, o leitor. Os consumidores de informação “tinham a garantia de que tomariam decisões com base em dados políticos e econômicos mais recentes, para com isso diminuir o fator risco” (NATALI, 2007, p. 24). Outro aspecto importante de ser ressaltado é a censura que começou a ser implantada sobre o jornalismo internacional. Segundo Natali (2007), em Paris, em 1631, um jornal chamado Nouvelles Ordinaries de Divers Endroits (Notícias Comuns de Vários Lugares) teve a publicação interrompida por determinação do governo. No lugar deste veículo, outro jornal transigente com o poder que controlava a região assumiu no lugar do Nouvelles Ordinaries, chamado de La Gazette. “A imprensa com relativa independência do governo teve uma vida muito curta no começo do século XVII” (NATALI, 2007, p. 24). O autor acrescenta outros exemplos de censura sofrida pelos veículos de comunicação ainda no século XVII e XVIII como, por exemplo, na Alemanha durante a Guerra dos Trinta Anos (1618-1648)4, para evitar que as notícias do conflito chegassem ao público inglês. Em 1712, de acordo com Natali (2007, p. 25), o Stamp Act elaborado pelo Parlamento inglês criou taxas sobre os exemplares das publicações vendidas nos Estados Unidos, o que tornou inviável manter o trabalho da imprensa. Todo esse problema que envolveu a censura e os veículos de comunicação durante o século XVII e XVIII teve uma nova abordagem a partir da Revolução Francesa (1789-1799)5 que alterou as estruturas sociais que hoje baseiam o poder público. O resultado foi que a percepção do fato político e social começou a ser disseminado entre a população, que deu origem ao chamado espaço público, onde eram discutidos assuntos 4 Guerra dos Trinta Anos: Conflito entre católicos e protestantes marcou a Europa de 1618 a 1648. Disponível em: https://educacao.uol.com.br/disciplinas/historia/guerra-dos-trintaanos-conflito-entre-catolicos-e-protestantes-marcou-europa-de-1618-a-1648.htm. Acesso em: 03 mar. 2018. 5 Revolução Francesa. Disponível em: https://www.infoescola.com/historia/revolucaofrancesa/. Acesso em: 03 mar. 2018.
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importantes para a sociedade. Com isso, as pessoas começaram a debater acontecimentos que ocorriam além dos círculos próximos, em outros países. Tudo isso é de capital importância para o jornalismo internacional porque, repentinamente, ampliou aquilo que eu chamaria, como derivação do espaço público e na falta de uma expressão melhor, de espaço de pauta. Fatos policiais ocorridos em outras regiões do próprio país ou em países vizinhos (a ideia que temos hoje de fronteira era fluida no final do século XVIII) poderiam comover o público local (NATALI, 2007, p. 27).
Com a chegada de informações sobre a Revolução Francesa em outros locais da Europa, os fatos começaram a interessar cidadãos de outros países como Inglaterra, Holanda e Itália. “Ela [Revolução Francesa] se tornou no espaço público aquilo que hoje chamaríamos de assunto da moda” (NATALI, 2007, p. 27). Com a popularização das ações na França para provocar mudanças nas bases sociais, o poder instituído em outros países estava ameaçado. Segundo Sousa (2008), no final do século XVIII, a censura à imprensa foi intensa na Europa para evitar a disseminação das ideias da Revolução Francesa. Logo após, no século XIX, a censura continuou como uma forma de opressão da liberdade. “Deixar de saber o que ocorre nos outros países era perder a oportunidade de importar ideias” (NATALI, 2007, p. 29). Ao longo do tempo, a comunicação desta área evoluiu e outros meios facilitaram a disseminação das informações internacionais. De acordo com Assumpção, Corradi e Araújo (2015), a área do jornalismo internacional e o mundo econômico sofreram grandes mudanças. Além da impressão a vapor, também surgiu a produção com a linotipo, uma máquina que possuía todas as letras de uma linha de texto em apenas uma matriz de metal. “Outra revolução tecnológica, durante a segunda metade do século, foi a implementação de trens e cabos elétricos em várias direções” (ASSUMPÇÃO, CORRADI, ARAÚJO, 2015, p. 176). Segundo Natali (2007), com a evolução tecnológica, as notícias que vinham de outros países começaram a chegar mais rapidamente. Conforme o autor, o impacto na rapidez da comunicação de informações foi proporcionalmente maior que o resultado criado pelo computador e internet no final do século XX. Segundo Natali (2007, p. 30), “o jornalismo internacional já entrava em sua fase adulta” após as evoluções. Ainda no século XIX, surgiram as agências de notícias. Conforme Sousa (2008), essas entidades eram dedicadas à produção de notícias variadas e em maior quantidade para vender as informações aos veículos e outras organizações que possuem interesse no fato, como governos e grupos do ramo econômico. De acordo com o autor, entre os fatores que influenciaram no surgimento dessa atividade está o crescimento da necessidade de notícias variadas e em maior quantidade para atender a um público maior e mais diversificado. Além disso, outro aspecto relevante ressaltado por Sousa (2008), para a origem das agências de notícias, é AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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a rapidez com que as mudanças aconteciam no mundo, o que resulta diretamente em mais informações em potencial para serem exploradas. A primeira entidade especializada nessa área surgiu na França em 1835, a Havas, precursora da Agence France Press (AFP)6. Logo depois, em 1848 surgiu a Associated Press (AP)7 nos Estados Unidos e em 1865, nasce a Reuter (atual Reuters8) na Inglaterra. De acordo com Natali (2007), um dos resultados positivos da criação de agências especializadas foi a viabilidade econômica que isso deu ao noticiário internacional. Pelo mesmo sentido, Sousa (2008) ressalta que por uma visão empresarial do jornalismo, o aumento da tiragem e os lucros da publicidade criaram uma receita suficiente para os veículos de comunicação investirem em informações divulgadas de fontes externas. O JORNALISMO INTERNACIONAL DO SÉCULO XX De acordo com Sousa (2008), quando o mundo entrou no século XX, a mídia da Europa vivia um momento de radicalização do discurso comunicativo. O autor ressalta que a imprensa da época era emotiva, nacionalista e até imperialista, com a comunicação a partir de um discurso fácil e superficial. Com um clima político que ajudou na divulgação emotiva por parte da mídia e o apoio das classes médias urbanas, as notícias se tornaram rentáveis para os veículos, mas, por outro lado, trouxeram consequências. “A Europa preparava-se para o exacerbamento dos nacionalismos que haveriam de dar origem às duas guerras mundiais que ensanguentaram o mundo e, em particular, o Velho Continente no século XX” (SOUSA, 2008, p. 175). Os jornais da época não faziam nada além de alimentar a ideologia nacionalista, o que refletiu diretamente no mundo político. Por exemplo, o jornal inglês Pall Mall Gazette, em 1907, instigou, repetidamente, o Governo Britânico a construir dois navios de guerra por cada navio construído pela Alemanha. Essa posição do periódico gerou uma corrente de opinião que levou o próprio Governo a mostrar-se partidário dessa política. Do mesmo modo, o jornal português Diário de Notícias, independente e genericamente noticioso, também procurava influenciar as políticas governamentais, arvorando-se em “voz dos governados”, quando, por exemplo, propunha, a 11 de Janeiro de 1904, o investimento na marinha de guerra e a reforma do Arsenal (SOUSA, 2008, p. 175).
Para Natali (2007), o século XX para o jornalismo internacional começou com o impacto do teletipo, que é um meio que possui duas extremidades, uma ligação telefônica que é conectada a uma máquina de escrever com teclado. Era o terminal que pertencia às agências de notícias
6 Agence France-Presse. Disponível em: https://www.afp.com/. Acesso em: 05 mar. 2018. 7 Associated Press. Disponível em: https://www.ap.org/en-us/. Acesso em: 05 mar. 2018. 8 Reuters. Disponível em: https://www.reuters.com/. Acesso em: 05 mar. 2018.
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para compartilhar as informações com os veículos que pagavam pela assinatura. Ainda na área da evolução tecnológica, Viana e Lima (2013) salientam que o sistema telegráfico a cabo auxiliou na transmissão das informações de lugar distantes em uma velocidade surpreendente. De acordo com Sousa (2008), conflitos internacionais afetaram a cobertura da mídia, como as guerras árabes-israelenses, a Guerra da Coreia, a Guerra do Vietnam, a Guerra das Ilhas Malvinas e também a Guerra do Golfo. Conforme o autor, a ascensão do nazismo, do fascismo e do comunismo motivou conflitos de origem ideológica. Porém, Sousa (2008) acrescenta que mesmo com o crescimento desses regimes, a humanidade também viu a queda desses sistemas e de outros governos autoritários como na América Central e do Sul. O jogo de poderes entre Estados Unidos e a União Soviética entre 1945 e 1989 deu origem a Guerra Fria9 e resultou no conflito de duas das maiores potências mundiais. Além disso, o autor também ressalta o desenvolvimento científico e tecnológico como aprimoramento para o desempenho da atividade jornalística. “O século XX foi o século em que, no Ocidente, a humanidade mais progrediu em termos científicos e tecnológicos e no que respeita à melhoria das condições de vida” (SOUSA, 2008, p. 169). Entre os conflitos que influenciaram na cobertura jornalística internacional e também sobre as alterações no desempenho da atividade da imprensa estão as duas guerras mundiais. A Primeira Guerra Mundial (1914-1918) começou em um momento em que a imprensa possuía grande influência na sociedade por causa do alto consumo de jornais e isso fez com que os governos beligerantes escolhessem como novo alvo o jornalismo (SOUSA, 2008). Ainda segundo o autor, a primeira medida dos países que estavam envolvidos na guerra foi instituir a censura sobre as informações divulgadas. O resultado foi a publicação de notícias falsas sobre supostas atrocidades cometidas contra os inimigos no campo de batalha. Além disso, é importante salientar que um dos países da chamada Tríplice Aliança10, a Alemanha, criou um veículo de imprensa controlado pelo governo para cobrir exclusivamente a Primeira Guerra Mundial. Chamada de Transocean, a empresa jornalística nasceu em 1913 e tinha o objetivo de divulgar as notícias alemãs para outros países (EVANS, 2010). De acordo com a autora, a divulgação de informações sobre a Alemanha se tornou muito importante após a Primeira Guerra Mundial porque o contrato de cartel feito pelas agências internacionais Reuters, Havas, Associated Press e a alemã German Wolffs Telegraphisches Bureau (WTB) foi renegociado de tal maneira que a WTB era responsável pelas notícias que ocorriam na nação. 9 Guerra Fria: a guerra ideológica entre duas potências. Disponível em: http://www. politize.com.br/guerra-fria/. Acesso em: 06 mar. 2018. 10 Disponível em: http://operamundi.uol.com.br/conteudo/historia/29098/hoje+na +historia+1882+-+formada+a+triplice+alianca+na+europa.shtml. Acesso em: 08 mar. 2018. AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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Evans (2010) acrescenta que, após o conflito, o editor-chefe do veículo Wilhelm Schwendler foi fundamental na tentativa de minar esse sistema regulatório de controle das notícias que limitou a Alemanha no compartilhamento de informações durante o conflito. Segundo a autora, o principal meio utilizado para a divulgação de informações nessa época foi o telégrafo. Além disso, salienta que as notícias que abordavam os fatos ocorridos durante o conflito eram compartilhadas com os países aliados da Alemanha na Europa, mas focou principalmente na disseminação para as Américas e para o Leste da Ásia. Conforme o autor, após a guerra, a Transocean aceitou deixar os serviços comerciais com a WTB e o resultado disso foi que a empresa continuaria subsidiada e controlada pelo governo após a Primeira Guerra Mundial. Outro conflito que teve destaque na cobertura da área internacional foi a Segunda Guerra Mundial (1939-1945)11. O principal destaque desta época, salientado por Sousa (2008), foi a ênfase da propaganda jornalística pelo regime nazista. “A cobertura jornalístico-propagandística desse conflito foi um ensaio para a propaganda total desenvolvida pelos beligerantes durante a II Guerra Mundial, alimentada pelo radiojornalismo, pelo cinejornalismo e pela imprensa” (SOUSA, 2008, p. 185). Como protagonista para as atividades de publicidade durante o regime, Sousa (2008) indica a participação do ministro da propaganda nazista Joseph Goebbels12. De acordo com o autor, todas as atividades de comunicação da Alemanha que originava de veículos como rádio, o jornal, o cinema, teatro e até as artes, ficou sob o comando do Ministério da Propaganda. Além disso, é importante salientar que em 1933, a agência de notícias Wolff passou a ser controlada pelo governo e foi fundida à outra agência para criar a DNB. A Transocean, que teve origem antes da Primeira Guerra Mundial para divulgar as notícias alemãs, estava sob o controle nazista durante o segundo conflito. E foi durante este período que a empresa conseguiu recursos para atingir outro patamar no mercado global de jornais (EVANS, 2010). Segundo a autora, os nazistas investiram dinheiro na empresa e os subsídios quase triplicaram entre 1936 e 1937. Porém, com a reviravolta da Segunda Guerra Mundial contra a Alemanha, a Transocean encolheu. A empresa teve formalmente o seu registro como agência de notícias atingido em 1957 e não distribuiu mais notícias desde o fim da Segunda Guerra Mundial (EVANS, 2010). Ainda sobre a publicidade nazista, Sousa (2008, p. 186) cita que “criaram departamentos de propaganda que procuraram, antes de mais, fornecer à imprensa informações objectivas13 sobre a evolução do 11 Segunda Guerra Mundial. Disponível em: https://www.infoescola.com/historia/segundaguerra-mundial/. Acesso em: 09 mar. 2018. 12 Joseph Paul Goebbells – Biografia – UOL Educação. Disponível em: https://educacao.uol. com.br/biografias/joseph-paul-goebbels.htm. Acesso em: 10 mar. 2018. 13 Trecho em português de Portugal. “Objectivas” lê-se: objetivas. Tradução nossa.
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conflito, embora visadas pela censura”. Segundo o autor, a credibilidade dessas informações difundidas através do rádio era questionável e isso fez com que muitos alemães e outros europeus sintonizassem a BBC14, empresa jornalística pública que teve origem no Reino Unido em 1922. Porém, segundo Sousa (2008), os Aliados na Segunda Guerra Mundial, conjunto de países que combateram as nações do Eixo (formada principalmente por Alemanha, Itália e Japão), começaram a compartilhar informações verídicas misturadas com falsas com o objetivo de acabar com o conflito que já se encaminhava para o final. A COBERTURA INTERNACIONAL E A GLOBALIZAÇÃO Logo após o final da Segunda Guerra Mundial, o mundo foi dividido entre dois potentes blocos: o democrático-capitalista que era representado pelos Estados Unidos e também pela Europa Ocidental; e o socialistaditatorial que foi liderado pela União Soviética (URSS) e que teve como outro ponto de poder a China (SOUSA, 2008). Conforme o autor, a divisão entre os sistemas governamentais das nações também dividiu o jornalismo. Houve um viés ocidental de cobertura de notícias, com uma matriz democrática-liberal e capitalista e outro socialista, que moldou o jornalismo soviético desde a Revolução Russa. É importante salientar que após a Segunda Guerra Mundial, um modelo autoritário da prática jornalística surgiu nas ditaduras e nos Estados teocráticos, este último exclusivamente em países islâmicos. Com isso, surgiu nos países em processo de desenvolvimento, um jornalismo desenvolvimentista que mesclava características do modelo ocidental, socialista e autoritário de comunicação (SOUSA, 2008). De acordo com o autor, o aprimoramento de modelos de jornalismo feito em outros países seguiu uma característica que nasceu no século XX, a globalização. As guerras mundiais e a implementação de novos modelos de governo no século XX deu início ao processo chamado de globalização, definido como: a integração mais próxima de países e povos do mundo causada pela enorme redução de custos de transporte e comunicação e pela eliminação de barreiras artificiais para os fluxos de mercadorias, serviços, capital, conhecimento e (em menor escala) pessoas através das fronteiras internacionais (STIGLITZ, 2002, p. 191).
Segundo Sousa (2008), no século XX, o mundo testemunhou a presença de empresas em diferentes países e de uma economia internacionalizada. O autor acrescenta a presença de meios de comunicação e organizações internacionais como contribuintes do nascimento da globalização. De acordo com Brasil (2003), a globalização não significa apenas a abertura de fronteiras, mas também uma orientação da ordem planetária onde o jornalismo tem um papel fundamental. 14 Disponível em: http://www.bbc.com/. Acesso em: 10 mar. 2018. AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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Conforme Sousa (2008, p. 173), o modelo de globalização cultural como oportunidade para as “pessoas aproveitarem o que querem” pode ser alcançado “pelos meios de comunicação, pelo turismo e por vários fenômenos de mobilidade”. Conforme Cabrera (2016), os defensores das ideias propostas pela globalização se baseiam na integração e interdependência do mundo apoiado sobre fluxos de informação e meios de comunicação instantâneos. De acordo com Beer (2010 apud ZHANG; HELLMUELLER, 2016), a mídia atual está cobrindo informações fora do seu território, pois as notícias não são restritas a um espaço geográfico e envolve relações complexas e fluxos de informação pelas fronteiras e continentes. Por outro lado, Zhang e Hellmueller (2016) explicam que mesmo com as novas tecnologias que permitem uma interligação, os diferentes perfis da globalização têm complicado o trabalho da mídia e também estabeleceram uma dificuldade na definição de jornalismo global. Segundo Löffelholz e Weaver (2008 apud ZHANG; HELLMUELLER, 2016, p. 767), “como resultado da globalização, eventos internacionais como guerras, terrorismo e pandemias geralmente atraem atenção da mídia ao redor do mundo”. De acordo com Sousa (2008), houve momentos de glória e momentos menos felizes do jornalismo após a Segunda Guerra Mundial. Entre os momentos gloriosos, o autor salienta o debate televisionado entre os candidatos à presidência dos Estados Unidos, o republicano Richard Nixon e o democrata John Fitzgerald Kennedy15, que foi um prenúncio da maciça cobertura política do final do século. Como momentos tristes do jornalismo durante este período, o autor cita a morte da Princesa Diana em 1997, que ocorreu em um acidente de carro quando a princesa procurava fugir de fotógrafos. Isso criou uma imagem negativa da prática do fotojornalismo. Em relação à censura, Sousa (2008) cita a Guerra do Golfo Pérsico, em 1991, que representou o triunfo dessa atitude de militares e da política sobre a prática jornalista. Nota-se que os conflitos e os acontecimentos de diversas áreas do planeta influenciaram na cobertura jornalística global. A maioria dessas características está presente no cotidiano do noticiário internacional. Porém, mudanças na geopolítica mundial também afetaram a editoria de notícias do exterior. O resultado desses acontecimentos, incluindo o fim da URSS, foi o começo de um novo ciclo no jornalismo mundial. Conforme Aguiar (2015), este ciclo teve início durante a década de 1990 após uma inovação nas tecnologias da informação e da comunicação, mais especificamente a internet. Em termos geopolíticos, o autor ressalta o surgimento de uma “nova ordem mundial” após a Guerra Fria. Entre os resultados dessas mudanças na cobertura internacional de notícias, Aguiar (2015) menciona o processo de globalização econômica e a consolidação da política neoliberal, com princípios definidos como:
15 The impact of the 1960 JFK-Nixon debate – CNN Politics. Disponível em: https://edition. cnn.com/2016/02/29/politics/jfk-nixon-debate/index.html. Acesso em: 14 mar. 2018.
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a defesa da propriedade privada, o mercado competitivo, as liberdades individuais, mas também no ataque à intervenção do Estado na economia, na redução do sector público, na gestão do sector público segundo as regras do sector privado, na difusão da desregulamentação, no aumento das privatizações e na redução dos apoio sociais (CABRERA, 2016, p. 132).
Conforme Sousa (2008), ao final do século XX, a prática jornalística começou a ser vista como negócio e as informações como mercadoria, algo que ia de encontro ao pensamento crítico de intelectuais. “[...] graças às políticas neoliberais, recuperou-se e relegitimou-se esse conceito, que esteve na génese do jornalismo moderno e contemporâneo.” (SOUSA, 2008, p. 195). Por outro lado, o autor alerta para esta prática pode ameaçar a livre concorrência da comunicação, o que leva a limitar a liberdade jornalística. Por isso, Sousa (2008) salienta a importância de uma legislação antimonopolista. Em termos de tecnologia, o jornalismo internacional evoluiu consideravelmente com o processo de globalização. Segundo Natali (2007), na década de 1960, foi inaugurada a era dos satélites de telecomunicações. O autor cita que o primeiro satélite, com o nome de Telstar, foi lançado pela Nasa em 1962 e no mesmo ano foi utilizado pela BBC para transmitir, pela primeira vez, dos Estados Unidos por um período menor que 15 minutos. “A chegada do homem à Lua, em julho de 1969, foi transmitida em rede mundial”, conta Natali (2007, p. 36). Os subsídios destinados para a área de tecnologia com o foco em aprimorar a divulgação de informações foram maciços. Segundo Bomfim (2012), o investimento dos Estados Unidos durante o século XX nas suas agências de comunicação representou a preo- cupação da imagem construída sobre a nação internacionalmente. Natali (2007) observa que a internet revolucionou a prática de fazer jornalismo internacional, pois fez com que redatores deixassem de se tornar dependentes de cartas enviadas pelas agências internacionais e podia elaborar de forma independente os textos noticiosos. O surgimento desta tecnologia abriu novas oportunidades para os jornalistas divulgarem informações sobre o que acontece ao redor do mundo. Uma das características principais é a instantaneidade. O JORNALISMO INTERNACIONAL NA ERA DA INTERNET Desenvolvida em 1969, pela Administração dos Projetos de Pesquisa Avançada do Departamento de Defesa dos Estados Unidos (Arpa), a internet era uma rede limitada de comunicação. Este meio foi fundado em 1969, como resposta do governo americano ao lançamento do satélite russo Sputnik. De acordo com Briggs e Burke (2006), as origens da internet, propriamente dita, estavam presentes na física e na política impostas durante o período da Guerra Fria, uma geração antes do grande avanço para uma rede aberta e acessível a todos. Esta evolução ocorreu entre setembro de 1993 e março de 1994, quando a internet deixou de ser um
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meio especificamente acadêmico, para se tornar algo disponível para um número maior de acessos. O principal propósito da criação deste meio foi para interligar centros de pesquisa, ou seja, aumentar a comunicação entre os setores. Hoje, ela é utilizada diariamente para funcionar como um meio comunicacional entre as pessoas do mundo inteiro, como define Schwingel (2012, p. 19) ao comentar que “não importa se uma informação está fisicamente em um computador servidor na Jamaica, na Noruega ou nos Estados Unidos”, pois este conteúdo “estará disponível na tela, ali, vizinha, próxima”. Segundo Leão (1999), a web vem crescendo cada vez mais entre o público e a autora acrescenta que uma destas causas é pela facilidade que a sua interface oferece. Entre os aspectos positivos com relação à facilidade da internet, Natali (2007) cita que antes da chegada deste meio, as universidades possuíam centro de estudos que eram acessíveis apenas por uma rede e hoje toda essa documentação é acessível de forma online. “Lá estão os professores que entendem de centenas de assuntos, com o curso que estão dando, endereço eletrônico e número do telefone de suas salas” (NATALI, 2007, p. 59). Um dos aspectos mais relevantes que a internet dispõe é a instantaneidade, que às vezes nem o rádio consegue alcançar. Além disso, Pinho (2003) acrescenta que características como a não-linearidade, a fisiologia e a dirigibilidade consideram a internet um instrumento adequado na transmissão da informação. Para esta comunicação, a multimídia, o hipertexto e a hipermídia são fundamentais na proliferação de um determinado conteúdo. De acordo com Lévy (1999, p. 63), o termo multimídia significa, em princípio, “aquilo que emprega diversos suportes ou diversos veículos de comunicação”. A informação é uma das grandes contribuintes para o crescimento e a manutenção da internet como se conhece. De acordo com Sousa (2008), uma das grandes vantagens de possuir internet é presenciar a forma como a informação circula. E a disseminação deste conteúdo fica por parte da área comunicacional, em específico o jornalismo. Notícias, reportagens e conteúdo informativo, sobre qualquer lugar do mundo, estão disponíveis facilmente para acesso de todos e em poucos segundos de distância. De acordo com Natali (2007), a plataforma é barata e de simples utilização para, por exemplo, coletar opiniões de especialistas, dados e trabalhos acadêmicos que ajudem a enriquecer a matéria entregue pelas agências de notícias. “Eu terei diante de mim, na tela de meu terminal, pequenas monografias que detalham os antecedentes dos assuntos que estou tratando” (NATALI, 2007, p. 59). Sites e portais noticiosos possuem grande acesso diário e disponibilizam para os usuários a informação de diferentes maneiras, presente em texto, imagem, vídeo e áudio. Segundo Pinho (2003, p. 113), a web é uma síntese de todos meios de comunicação e que possui “as vantagens visuais da TV, a mobilidade do rádio, a capacidade de detalhamento e análise do jornal e da revista, e a interatividade da multimídia”. Neste contexto, Sousa (2008) acrescenta 118
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que o desenvolvimento dos meios de comunicação, entre eles a informática, fez surgir a internet, citado por ele como um meio que proporciona a interatividade. O autor apresenta o conceito de comunicação interativa, que acontece quando o receptor, no caso o público, pode assumir uma postura ativa diante da notícia e não apenas passiva como quando acontece ao receber notícias da rádio ou da televisão. Essa evolução também permitiu que as fontes de informações internacionais se multiplicassem e começassem a colaborar com a elaboração de conteúdos (STEINBERGERELIAS, 2016). Com o resultado da dimensão que a internet atingiu ao longo do tempo, os grandes veículos de comunicação, começaram a aderir a esta nova tecnologia, atraindo um novo público e divulgando um material dinâmico e de qualidade. Conforme Pinho (2003), devido ao crescimento da rede mundial, grandes grupos editoriais marcaram o seu espaço no mundo virtual, com interesse no desenvolvimento da futura geração de receitas propiciadas pelos usuários na web. Os principais veículos a aderirem ao meio digital foram os veículos com circulação de conteúdo impresso. Entre os principais motivos para essa migração está a perda de leitores, principalmente os mais jovens, aumento do custo de produção e distribuição do jornal, o receio em relação à concorrência ir primeiro para o meio online e também a interatividade que a internet proporciona em relação ao impresso (CABRERA, 2004, p. 408). Conforme Sousa (2008), houve uma migração de veículos das mídias tradicionais para a internet com o objetivo de aumentar o interesse dos consumidores nos conteúdos veiculados nos meios originais (rádio, jornal e televisão) e também promover a interação e o envolvimento do público. O autor acrescenta que vários veículos de comunicação surgiram exclusivamente na internet. Pode-se citar como exemplo de sites que apareceram na era da internet e fazem a cobertura de notícias internacionais o Nexo16 e o The Intercept Brasil17. As informações divulgadas pelas agências de notícia chegam diariamente nos usuários e eles disseminam esta informação para as pessoas com as quais interagem. Os meios responsáveis por estas interações são chamados de redes sociais, onde pessoas interagem de forma direta e indireta com outras do seu círculo de amizade ou compartilhamento de interesses. “Quando uma rede conecta pessoas ou organizações, ela é uma rede social” (GARTON; HAYTHORNTHWAITE; WELLMAN, 1997, p. 75, tradução nossa)18. Com o crescimento destas ferramentas, os consumidores de conteúdo informativo iniciaram um processo de inserção dentro destas notícias ao deixar comentários que contêm opiniões e críticas. Isso gera discussões, fazendo com que informação, experiência e conteúdo transitem entre diversas pessoas de uma só vez. Segundo Pinho (2003), o jornalismo 16 Disponível em: https://www.nexojornal.com.br. Acesso em: 17 mar. 2018. 17 Disponível em: https://theintercept.com/brasil/. Acesso em 17 mar. 2018. 18 When a computer network connects people or organizations, it is a social network. AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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e o meio digital criaram uma diferenciação em relação aos outros veículos de comunicação tradicionais, tais como o rádio e a televisão. Em relação às agências de notícias internacionais, Sousa (2008) salienta que a chegada da internet ofereceu alguns riscos para essas empresas. Entre os problemas enfrentados pelas agências, o autor cita, como exemplo, a diminuição na influência e exclusividade na divulgação de informações, pois com a dinâmica proporcionada pelo meio, a qualquer momento uma notícia pode ser divulgada por qualquer veículo do mundo; e também o surgimento de pequenas agências que aproveitaram o advento da nova tecnologia para disseminar as informações via internet. A facilidade de utilização da internet tornou as fronteiras geográficas tênues e atualmente “o jornalista internacional consegue apurar o que acontece no mundo sem levantar da cadeira” (SOUZA; MONTEIRO, 2016, p. 43). Porém, para os autores, o meio pode se tornar uma dificuldade para profissionais que atuam em outros países, visto o excesso de versões diferentes da notícia que podem confundir o leitor, a falta de acesso a uma conexão de qualidade no país e também a censura imposta por alguns governos. Segundo Viana e Lima (2013), após a chegada da internet, o jornalismo internacional ampliou a cobertura de diferentes fatos, principalmente de guerras e conflitos. O crescimento do âmbito de alcance de diferentes pautas ao profissional que trabalha em outros países foi ampliado na era digital. É possível trabalhar com diferentes suportes de comunicação como televisão, computador e celular e com suas respectivas linguagens (STEINBERGER-ELIAS, 2016). O resultado dessa evolução é a rapidez com que a informação chega ao receptor e também a diferenciação na forma com que esse conteúdo é recebido. Segundo Sousa (2008), a imagem e o vídeo criaram um novo modo de fazer jornalismo internacional, ao impactar a partir das imagens, principalmente de conflitos. Para exemplificar a emoção transmitida através da comunicação visual, Utzeri (1989) ressalta a transmissão da emissora americana CNN da explosão na embaixada dos Estados Unidos em Beirute19, capital do Líbano, que possuía imagens tão fortes que pediram desculpas e editaram a matéria posteriormente. Neste contexto, Brasil (2003, p. 64) acrescenta que mesmo com a censura militar americana, “nenhuma outra guerra foi tão ‘imagética’” como a guerra do Iraque. “[...] imagens de tropas em movimento captadas por pequenas câmeras digitais da CNN e transmitidas ao vivo via Internet foi uma experiência inesquecível” (BRASIL, 2003, p. 64). A cobertura jornalística internacional no Oriente Médio teve grandes repercussões no início do século XXI pela vasta quantidade de conteúdo sobre os conflitos, principalmente em relação às imagens, vídeo e informações fornecidas por profissionais que trabalham diretamente da região. 19 Ataque a embaixada americana em Beirute em 1983. Disponível em: https://www.cia. gov/news-information/featured-story-archive/2014-featured-story-archive/flashback-april18-1983-u-s-embassy-bombed-in-beirut.html. Acesso em: 20 mar. 2018.
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A COBERTURA JORNALÍSTICA NO ORIENTE MÉDIO O Oriente Médio está localizado no oeste da Ásia e é composta por 15 países: Afeganistão, Árabia Saudita, Bahrain, Catar, Emirados Árabes Unidos, Iêmen, Irã, Iraque, Israel, Jordânia, Kuwait, Líbano, Omã, Síria e Turquia. Com mais de 6.8 milhões de quilômetros quadrados e uma população estimada de 419 milhões20, o local teve uma história construída em meio a conflitos e, atualmente, carrega marcas desses acontecimentos que são percebidos no cenário cultural, religioso, populacional e geográfico (SILVA, 2017). Entre os aspectos históricos que contribuíram para a instabilidade da região, Paixão (1995) cita a dissolução do Império Otomano, após a Primeira Guerra Mundial, a repartição das regiões entre França e Inglaterra e também os interesses de estados dominados por regimes autocráticos no sentido de provocar uma desestabilização de Estados mais frágeis para possível recrutamento para a sua área de influência. O autor acrescenta que outro fator teve grande influência na construção da instabilidade na região: o petróleo. Segundo a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEC em inglês), a região do Oriente Médio é responsável, atualmente, pela produção de 65.5% do petróleo entre países que compõem o grupo21. “A enorme riqueza acumulada por alguns dos Estados árabes [...], proveniente da exploração de vastíssimos recursos petrolíferos, tem vindo gradualmente a aumentar as rivalidades existentes entre os povos da Região” (PAIXÃO, 1995, p. 125). Conforme Silva (2017), a migração de diferentes povos em busca de novas terras ajudou no surgimento de religiões e culturas distintas no Oriente Médio. A autora ressalta que outro fator importante para compreender o surgimento dos conflitos na região foi a busca de novos seguidores para os ideais defendidos pelos migrantes em locais onde não estavam presentes. Estes conflitos sempre fizeram parte da cobertura da mídia ocidental. Conforme Ribeiro (2010), desde o período da Antiguidade, o Oriente Médio já era tratado como um lugar exótico em relação ao Ocidente e isso podia ser notado nas peças teatrais da Grécia Clássica. Diante desse contexto, a autora cita algumas características que serão visíveis ao longo da história em relação ao Oriente Médio como: a visão de um Oriente derrotado e inferior perante à Europa, a ligação de uma região que transmite perigo e desconfiança e os mistérios que cercam a cultura oriental que representa uma ameaça aos valores considerados normais pelo Ocidente. “Essa visão orientalista é alimentada pelas narrativas de viajantes ocidentais, dos encontros entre o Oriente e o Ocidente” (RIBEIRO, 2010, p. 21). Essas viagens, de acordo com a autora, foram de homens que entraram para a história da humanidade, como Heródoto, Alexandre, O Grande, Napoleão e Marco Polo, que após o roteiro no Oriente Médio, 20 U.S. Census Bureau. Middle East Populations 2017. Disponível em: http://www.cnewa. org/pdf/popul_data.p df. Acesso em: 22 mar. 2018. 21 Disponível em: http://www.opec.org/opec_web/en/data_graphs/330.htm. Acesso em: 01 jun. 2018. AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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relatavam histórias, fábulas e instituíam estereótipos para toda a cultura que envolvia o mundo oriental. De lá para cá, muito mudou. De acordo com Viana e Lima (2013), o profissional que exerce o jornalismo internacional no exterior é chamado de correspondente ou enviado especial. Conforme os autores, essas são duas formas de exercer a prática jornalística no exterior. Conforme Agnez (2014), correspondente é o profissional que fica baseado em um local no exterior por um período de tempo e longe da sede do jornal onde trabalha. Em relação ao enviado especial, a autora acrescenta que este profissional se desloca para outro país para a cobertura de um determinado fato de forma temporária. Segundo Natali (2007), durante a Guerra Civil dos Estados Unidos (1861-1865)22, 150 correspondentes de guerra participaram da cobertura de notícias sobre o conflito. De acordo com Viana e Lima (2013, p. 10), as notícias produzidas por profissionais de jornalismo que cobriam as guerras na Europa “ocupavam lugares privilegiados nos periódicos”. De acordo com os autores, conflitos armados auxiliaram no desenvolvimento da atividade jornalística no exterior e também na evolução da técnica de redação jornalística. Para atuar nesta área, Viana e Lima (2013) salientam algumas características específicas encontradas no profissional como, uma preparação especializada no tema que irá abordar e também a formação acadêmica em universidade. Esses atributos auxiliam o profissional a encontrar e selecionar pautas para serem abordadas pelo seu veículo de origem (NATALI, 2007), mas o correspondente também busca informações nos veículos de imprensa locais da região. O conhecimento prévio e a cobertura dos fatos no local de origem acrescentam uma vantagem nesta área em relação à apuração dos fatos pelas agências internacionais de notícias, pois, no exterior, o profissional pode ter um olhar diferente da notícia e produzir algo que não é oferecido pelas empresas (VIANA; LIMA, 2013). Porém, manter correspondentes em atuação em diferentes locais do globo possuem um alto custo para a empresa de comunicação, por isso que muitos veículos recorrem à utilização de informações fornecidas pelas agências internacionais (VIANA; LIMA, 2013). Este posto de correspondente é cobiçado entre os profissionais do jornalismo, segundo Shinar (2009), porém ele salienta que existem perigos em exercer o trabalho em zonas de conflito, como em regiões do Oriente Médio. Entre os vários desafios enfrentados pelos correspondentes internacionais em outros países, Souza e Monteiro (2016) salientam que o primeiro desafio é o risco de estar em áreas inseguras enquanto exerce a cobertura jornalística. De acordo com os autores, o medo, a
22 Guerra Civil Americana. Disponível em: https://historiadomundo.uol.com.br/idadecontemporanea/guerra-civil-americana.htm. Acesso em: 05 mar. 2018.
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falta de conhecimento sobre a região e também o sentimento de estar longe de casa são outros problemas enfrentados pelos profissionais. Segundo Nunes (2014), em matéria publicada no site Observatório de Imprensa23, as zonas de conflito do século XXI como, por exemplo, na Síria e no Iraque, não possuem fronts de batalha ou lados definidos como nas grandes guerras mundiais. “O perigo está em toda parte e, diferente do passado, os jornalistas não são mais vistos como figuras neutras, que estão ali apenas para reportar os acontecimentos” (NUNES, 2014). De acordo com Reid (2016), a relação entre a repressão de governos autoritários e milícias hostis em algumas regiões tornam essas zonas a serem evitadas por profissionais de imprensa do exterior. Para exemplificar esse fato, Somaiya e Haughney (2014) citam o caso do repórter do The New York Times Matthew Rosenberg, que foi expulso do Afeganistão porque funcionários do governo não gostavam das matérias publicadas pelo profissional. Conforme Nunes (2014), desde o início da guerra da Síria, em 2011, aumentou o número de jornalistas que foram alvo de grupos extremistas na região. Os autores utilizam como exemplo o assassinato dos jornalistas americanos James Foley e Steven Sotloff, em 2014. De acordo com os autores, em um levantamento do Comitê para a Proteção de Jornalistas (CPJ), em 2013, ocorreram 61 sequestros de jornalistas e 21 mortes na Síria. Por exemplo, a execução de Foley e de Sotloff foi gravada, divulgada e compartilhada pelo mundo todo através da internet. A tecnologia contribui para a disseminação de notícias e informações do que acontece no Oriente Médio para diferentes lugares do mundo. Segundo Viana e Lima (2013), o advento das novas tecnologias de comunicação facilitou o trabalho das agências de notícias e dos correspondentes por possuir características exclusivas como a interatividade, a hipertextualidade e o atributo multimídia que agrega diferentes informações em diversos formatos. Os profissionais que trabalham com a cobertura em locais de conflito contribuem para disseminar um conteúdo de impacto que transmita a sensação de proximidade e assim receber uma resposta das pessoas que consomem a informação. Conforme Steinberger-Elias (2016), é de praxe a ação de correspondentes de publicar primeiro seu conteúdo nas redes sociais e esperar pela resposta dos usuários e assim apontar novos ângulos para a matéria e consequentemente enriquecer o conteúdo. “A experiência colaborativa precede a produção de matérias ao estilo das mídias convencionais” (STEINBERGER-ELIAS, 2016, p. 62). A autora acrescenta que em um cenário cada vez mais globalizado no século XXI, as comunicações se tornaram móveis e estão junto do jornalista todo o tempo e em todos os locais. Segundo Reid (2016), locais que estão em evidência em notícias da editoria internacional por estar em
23 Disponível em: http://observatoriodaimprensa.com.br/monitor-da-imprensa/_ed822_ jornalismo_de_zonas_de_ conflito_precisa_se_reinventar/. Acesso em: 25 mar. 2018. AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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um momento de instabilidade, se tornam possíveis de serem alcançados através da comunicação digital e câmeras leves, ou seja, celulares. Além disso, é possível inserir, por exemplo, testemunhas de um fato, ou seja, fontes, na elaboração das matérias em locais de conflito. De acordo com Reid (2016), a jornalista Chavala Madlena do britânico The Guardian24, desenvolveu um trabalho de treinamento de conceitos básicos de jornalismo e cinegrafia para cidadãos no Iêmen. O autor exemplifica com um caso: Uma dessas pessoas foi Mohammed Tuaiman, de 13 anos, que ficou encarregado de cuidar de seus 27 irmãos depois que seu pai e seu irmão foram mortos num ataque de drones [aviões sem piloto] em 2011. Mohammed filmou a vida cotidiana de sua família e do vilarejo, a luta que enfrentavam desde a perda dos principais chefes da família e os “sonhos com drones” numa área localizada entre os rebeldes Houthi, as forças do governo e a célula local da al-Qaida. Em janeiro de 2015, Mohammed também foi morto num ataque de drones. (REID, 2014)
Porém, não é em todos os locais do mundo que essa comunicação e interação entre as testemunhas e os jornalistas ocorre facilmente. Segundo um relatório da organização Freedom House25, de 2014, nenhum lugar do mundo foi mais prevalente do que o Oriente Médio e o Norte da África em relação à censura aos meios de comunicação digitais. De acordo com o relatório, de 11 países analisados nesses locais, dez nações apresentaram detenções e interrogatórios à usuários de internet. “Dezenas de usuários de redes sociais foram presos no Bahrain, Árabia Saudita e nos Emirados Árabes Unidos, com muitos sentenciados a cumprir pena na prisão de mais de dez anos” (FREEDOM HOUSE, 2014). Esta repressão ao consumo de informações por cidadãos na região do Oriente Médio é frequente. Porém, mesmo sem conseguir ter acesso a muitos meios de comunicação, os cidadãos de muitas nações fazem parte dos acontecimentos. Guerras, protestos e ataques terroristas são alguns dos eventos que estão frequentemente nos sites de notícias internacionais. Segundo Wainberg (2005, apud VIANA; LIMA, 2013), a violência desperta a curiosidade nas pessoas e consequentemente é abordada pela mídia. Por isso, ataques bombas e sequestros de aviões, por exemplo, foram 67% das ocorrências de atos terroristas além das fronteiras durante a década de 1980. De acordo com Silva (2017), a instabilidade criada a partir das origens históricas da região e a diversidade religiosa contribuíram para conflitos intensos e o surgimento de grupos terroristas. REFERÊNCIAS AGNEZ, Luciane Fassarella. Identidade profissional no jornalismo brasileiro: a carreira dos correspondentes internacionais. 2014. Disponível em: <http://www. repositorio.unb.br/bitstream/10482/17031/1/2014_ 24 Disponível em: https://www.theguardian.com. Acesso em: 25 mar. 2018. 25 Disponível em: https://freedomhouse.org/. Acesso em: 25 mar. 2018.
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Capítulo 6
JORNALISMO EM QUADRINHOS: A PRESENÇA DO REPÓRTER JOE SACCO NA CONSTRUÇÃO DA REPORTAGEM Rubem Rocha Maria Lúcia Patta Melão
O Jornalismo em Quadrinhos (JQ) vem conquistando espaço na imprensa mundial, seja através de mídia impressa ou da digital desde os anos 1990. As coberturas jornalísticas do repórter Joe Sacco se destacam como uma das precursoras do JQ, conforme Oliveira (2015), e sua presença ao longo da narrativa jornalística marca um estilo dentro da prática do jornalismo em quadrinhos, como explica Souza Júnior (2009). O livro Reportagens, publicado no Brasil em 2016, traz um compilado dos trabalhos do repórter produzidos e publicados entre os anos de 2002 e 2011. A reportagem A Guerra e as Chechenas faz parte desse livro e é de onde foi construído o objeto de análise deste trabalho – a matéria “Voltar para casa”. Nela, Sacco utiliza o formato HQ para retratar as histórias de vida de mulheres que vivem em um campo de refugiados visitado por ele em 2002. O leitor é conduzido pelo repórter para dentro das barracas do acampamento, onde são feitas entrevistas, reconstituídas memórias e fatos históricos, tudo sob o traço do desenho feito pelo jornalista. Em algumas partes, ele aparece retratado em cena e, através do texto, narra os acontecimentos, sempre tendo o formato dos quadrinhos como moldura das cenas. O Joe Sacco que aparece no quadro não é nenhum super-herói, como se espera de um personagem de HQ. Ele é real, visita lugares de verdade e as cenas desenhadas por ele retratam, na maioria das vezes, o lado mais cruel da realidade. Sacco (2016) diz que busca, através de sua presença na cena, tornar o jornalismo mais humano e afastar-se de uma prática que parece feita por uma máquina. Os trabalhos de Joe Sacco misturam uma série de linguagens distintas, todas presentes no jornalismo, como o vídeo-documentário, o texto literário, narrativo e, ao mesmo tempo, opinativo. Há também o uso dos bastidores da reportagem e a sensibilização do repórter com as fontes. 128
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Para fazer tal abordagem, Sacco utiliza várias técnicas, que variam entre as presentes no cinema e nas artes gráficas. Dessa forma, o repórter constrói um material jornalístico original. Como técnica cinematográfica, por exemplo, Sacco utiliza os enquadramentos, que, segundo Gerbase (2012), podem ser classificados como: Plano Aberto, a câmera distante do objeto que ocupa pouco espaço no cenário. Esse plano, conforme o autor, cumpre a função de ambientação. No Plano Médio, a câmera está mais próxima do objeto, que ocupa uma boa parte do ambiente, embora ainda haja espaços no quadro. Para Gerbase (2012), o plano sugere posicionamento e movimentação. O autor explica que no Plano Fechado, os espaços estão ainda mais reduzidos, com o quadro ocupado quase que completamente pelo objeto. Conforme ele, este seria um plano para representar intimidade e expressão. Gerbase (2012) entende que existem enquadramentos que dependem da altura do ângulo da câmera. Além do ângulo normal, ao nível dos olhos da pessoa enquadrada, existem outros dois: O plongée, quando a câmera está acima do nível dos olhos da personagem, direcionada para baixo, e o contra-plongée, quando a câmera se encontra abaixo do nível dos olhos, direcionada para cima. Sobre os níveis da linguagem cinematográfica, Gerbase (2012) afirma que existem duas formas de representar as imagens em um filme. Primeiramente, a câmera objetiva, que mostra o que acontece na cena, sem se tratar do ponto de vista de um personagem específico. Já a câmera subjetiva, ainda conforme o autor, diz respeito à perspectiva, ou ponto de vista, e à representação dos movimentos de um personagem em particular. Em Apocalípticos e Integrados, o linguista italiano Umberto Eco (2006) fala sobre os elementos iconográficos – imagens, neste caso, desenhadas, com o objetivo de representar algo - que compõem a trama das HQs. Para ele, é um amplo repertório simbólico que pode ser considerado uma semântica das histórias em quadrinhos, ou seja, é um conjunto de símbolos que compõe a linguagem das HQs. O signo da nuvem – também conhecida como balãozinho ou fumacinha, por exemplo, quando traçado com uma seta apontando em direção ao rosto do personagem, é relativo à expressão de um discurso; se ligado a quem fala através de bolinhas, é o pensamento do personagem; sentimentos diversos, como ira e medo, surgem normalmente em forma de balão com várias pontas (ECO, 2006). Para o autor, a sonoridade dos elementos em cena, isto é, os momentos em que não há fala ou diálogo, mas o quadrinista quer deixar claro o som de algumas ações, costuma aparecer representada por palavras que significariam tal som, normalmente originadas da fonética da língua inglesa, como slam (porta batendo), snack (soco), gulp (consternação). Ainda sobre a significação dos elementos dos quadrinhos, Eco (2006) diz que a palavra serve para explicar o que o desenho não consegue dizer. O autor destaca, no entanto, que essa relação, às vezes, pode apresentar uma certa “independência irônica” (ECO, 2006, p. 146). Isso acontece quando, por exemplo, as ações principais estão em primeiro plano, enquanto, AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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no segundo, ocorrem situações surreais que não têm relação alguma com o fato principal. Assim, há casos em que os elementos ambientais e um cuidadoso enquadramento superam “as imediatas necessidades comunicacionais da mensagem” (ECO, 2006, p.146). Ele lembra que nos quadrinhos podem ocorrer saídas propositais ou interações do personagem com o enquadramento, assim como a interação do personagem com o autor e vice-versa. Eco (2006) destaca, também, casos em que falas essenciais e imagens muito detalhadas acabam tendo o mesmo peso de representação, como acontece em um filme. Apesar desse apelo do ci- nema, Eco (2006) destaca que as HQs não ficam presas à questão da montagem cinematográfica, no que diz respeito à sequência de enquadramentos. Isso não quer dizer que a originalidade fica longe da montagem das HQs. Ela é uma técnica diferente da utilizada no cinema. “A estória em quadrinhos quebra o continuum em poucos elementos essenciais” (ECO, 2006, p. 147). Entende-se como continuum, na visão de Eco, como a possibilidade que a HQ apresenta de ser sintética na sua narrativa, na representação do movimento, contando uma história em poucos quadros, sem que a narrativa perca o sentido. A forma com que Sacco desenha o quadro demonstra que houve profunda observação dos protagonistas e dos ambientes em que estão inseridos, aproximando-se da técnica do jornalismo literário, conforme define Melo (1994 apud GUIMARÃES; SILVA, 2003). Dessa forma, são percebidos diversos detalhes na narrativa que ultrapassam os limites da objetividade e lembram as produções do new journalism, corrente do jornalismo literário que, conforme Pena (2006), potencializa os recursos jornalísticos, ampliando visões da realidade, rompendo com a prática engessada do lide, dá voz a fontes que não sejam primárias, aprofunda relatos e faz uma abordagem dos fatos que vai além do imediatismo do hard news. É possível aprofundar ainda mais a relação do repórter com fato por ele relatado. Essa prática, chamada jornalismo gonzo ou gonzo journalism, segundo Czarnobai (2005 apud NECCHI, 2009), é uma radicalização do jornalismo literário iniciada pelo norte-americano Hunter Thompson. Nesse modelo, as experiências pessoais do jornalista são válidas de serem expostas, já que o repórter evidencia seu papel como personagem, o texto é escrito em um tom de confissão, porém “não há limites claros entre realidade e ficção – embora a empreitada sempre parta de um acontecimento” (CZARNOBAI, 2005 apud NECCHI, 2009, p. 10). No gonzo, nega-se a objetividade e dispensa-se a relação de respeito com a aceitação do público, com constante presença de ironia e irreverência em seu conteúdo, conforme aponta Czarnobai (2005 apud NECCHI, 2009). O próprio Joe Sacco (2016) explica que sua intenção, ao estar presente na cena, é mostrar ao leitor que o jornalismo é um processo “realizado por um ser humano – e não ciência executada friamente por um robô atrás do acrílico” (SACCO, 2016, p. 5). Uma característica única do jornalismo gonzo em comparação ao 130
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new journalism é o uso de ilustrações. Conforme Czarnobai (2003), Hunter Thompson, quando incluía desenhos em seus trabalhos, contava com a contribuição do cartunista galês Ralph Steadman. O pesquisador explica que essa exclusividade se deve à técnica desenvolvida por Steadman, que representaria, com perfeição, as convenções do estilo iniciado por Thompson, criando o que se pode chamar de ilustração gonzo. O traço de Steadman, conforme Czarnobai (2003), representa pressa na produção da imagem, composta por elementos confusos e relaciona-se à espontaneidade do texto de Hunter Thompson. A anatomia imperfeita e com expressões bizarras podem ser associadas ao uso de drogas, que está sempre presente nos trabalhos de Thompson. A ilustração gonzo também pode ser encontrada em reportagens do estilo produzidas no Brasil. É o caso da revista eletrônica Irmandade Raoul Duke, com textos escritos conforme define-se o gonzo e que continha ilustrações de Luiz Pellizzari e Nelson Azevedo em todos os materiais publicados (CZARNOBAI, 2003). Sobre a mídia do JQ, Guimarães e Silva (2003) lembram que o texto representa um código escrito e os desenhos representam um código visual, ambos de maneira impressa. Essa condição dá ao repórter de JQ a possibilidade de trabalhar com dois códigos que se unem para formar um sentido e ajudar na compressão do leitor sobre o tema abordado nessas reportagens. Conforme Juscelino Neco de Souza Júnior (2009, p. 05), a fórmula criada por Sacco para construir sua reportagem em quadrinhos está sustentada em dois pilares: os aspectos visuais e a estrutura narrativa. “Esses dois elementos são essenciais para a instauração de uma prática jornalística formalizada e seu entendimento adequando ajudará a compreender a especificidade dessa manifestação. O jornalismo em quadrinhos, conforme Medeiros e Gomes (2013), costuma usar também as margens que formam o quadrinho – conhecido como requadro, como ferramenta para definir ordem cronológica, entre passado e presente ou simultaneidade. “Ao trabalhar com ações simultâneas, o requadro formal (traçado pesado) é usado para conter a ação do ‘agora’ e a ausência de requadro serve para conter o ‘enquanto isso’” (EISNER, 1999, p. 47 apud MEDEIROS; GOMES, 2013, p. 11). Em uma análise mais profunda sobre o grafismo da reportagem em quadrinhos, conforme Souza Jr. (2009), Sacco mescla dois estilos de HQ: o estilo autoral dos quadrinhos underground norte-americanos, com uma estética suja (com muitos elementos em quadro) e personagens que insinuam emoção, ao invés de demonstrarem de forma realista; e a estrutura do quadrinho franco-belga, como o Tintim, de Hergé, ao transferir para o papel a realidade dos ambientes. METODOLOGIA A abordagem desta pesquisa será qualitativa, pois irá trabalhar com informações que não podem ser dimensionadas ou quantificadas, além AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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de buscar explicações para fenômenos e produzir novas informações a partir disso. Conforme Gil (2009), nesse tipo de análise não há nada que oriente o pesquisador com antecedência, dependendo somente do estilo e da capacidade de quem aplica esse método. Também terá caráter exploratório, o que proporciona uma visão geral acerca do objeto a ser analisado, especialmente quando o assunto é pouco explorado e de difícil formulação de hipóteses precisas (GIL, 2008). Será, também, descritiva, pois, de acordo com Triviños (1987 apud SILVEIRA; CÓRDOVA, 2009) e Gil (2009), busca a descrição de características de uma população, fenômeno ou de eventos presentes em alguma realidade, além de poder estabelecer relação entre fatos. Ainda será bibliográfica e documental, já que houve a busca por informações a partir de materiais já produzidos, como livros e artigos científicos, conforme Gil (2008). Como método foi adotada a análise de conteúdo que, conforme Fonseca Júnior (2006), tem o objetivo de investigar fenômenos através de diversas técnicas de pesquisa, nas ciências sociais e humanas. A análise de conteúdo, seguindo Bardin (2011), trabalha a interpretação da mensagem com base na dedução e através de instrumentos metodológicos diversos. A autora explica que o objetivo da análise de conteúdo é o manuseio do objeto buscando tornar evidente indícios que possibilitem compreender uma realidade distinta à do seu conteúdo original. Lozano (1994 apud FONSECA JÚNIOR, 2006) afirma que a análise de conteúdo é sistemática, pois se baseia em uma série de procedimentos que se aplicam a todo o conteúdo possível de ser analisado. O mesmo autor explica que a confiabilidade desse método é constatável, já que permite conclusões idênticas quando aplicado por pessoas diferentes. Entre os procedimentos da análise de conteúdo está a inferência. Fonseca Júnior (2006) explica ser esse o momento em que o analista buscar tornar evidente um sentido oculto no material analisado. Conforme o autor, a inferência é utilizada para “desvendar as condições de produção das mensagens analisadas” (FONSECA JÚNIOR, 2006, p. 299). Para Krippendorf (1990 apud FONSECA JÚNIOR, 2006), essa é a base da análise de conteúdo e constitui-se em relacionar os dados a alguns aspectos do contexto em que estão inseridos. O uso da inferência na análise de conteúdo serve para extrair de forma lógica o conteúdo presente na mensagem analisada (FONSECA JÚNIOR, 2006). Conforme o autor, existem duas modalidades que agrupam os diversos processos de inferência. As inferências específicas, que tratam especificamente do problema; e as inferências gerais, que vão além da situação do problema analisado para definir variáveis e generalizações sobre o problema analisado. A categorização é outra etapa da análise de conteúdo, conforme Bardin (1988 apud FONSECA JÚNIOR, 2006). Ocorre quando são classificadas e reagrupadas as unidades registradas anteriormente e agrupadas em um número reduzido de categorias. A categorização deve envolver as etapas de inventário – quando é isolado o elemento – e classificação, reunindo os 132
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elementos por similaridade, buscando organizar a mensagem. Além disso, Fonseca Júnior (2006), Bardin (1988) e Targino (2000) definem que uma categorização efetiva respeita critérios de exclusão mútua, garantindo que o mesmo elemento não ocupe mais de uma categoria; homogeneidade, pertinência, objetividade, fidelidade, e produtividade, com categorias que forneçam hipóteses novas, dados e inferências. Para este trabalho, as categorias que melhor representam o foco da análise deste pesquisador são: enquadramento; a presença subentendida do jornalista; figuras secundárias; a representação das fontes; a opinião do repórter no texto; e a comunicação direta com o leitor. Entende-se que são categorias que identificam a forma com o quadrinista conta a história através de imagens. Sendo assim, o texto que compõe a HQ, em especial no que diz respeito ao que corresponderia às falas dos personagens, neste caso, não é relevante. O que será levado em consideração sobre o texto são as convenções dos quadrinhos, em particular no que diz respeito ao formato dos balões e aos recordatórios. É importante ressaltar que este estudo teve como referência também a semiótica que, em seu conceito mais amplo, tem como objetivo examinar os fenômenos de produção de significação e sentido em qualquer formato que se manifeste (SANTAELLA, 1983). ANÁLISE Para que fosse possível atender a proposta deste estudo, foi preciso identificar uma HQ que guardasse as características básicas do trabalho de Joe Sacco e que pudesse fornecer o conteúdo necessário ao que propõe esta análise. A construção do objeto correu a partir da definição da primeira parte da reportagem A Guerra e as Chechenas, presente no livro Reportagens, lançado em 2012 e publicado no Brasil em 2016. A partir da definição do objeto foi feita leitura superficial das figuras que neste estudo aparecem reproduzidas e, a partir disso, seguiu-se à seleção de três quadros e, então, à análise do material selecionado. Figura 1 Enquadramento - Apesar da cena estar enquadrada em um ângulo contra-plongée, pode-se ler nessa imagem que não existe um poder, pois a expressão, tanto corporal quanto da face é de desespero, que seria o sentimento que toma conta da primeira página. Presença subentendida do jornalista - Sacco está presente como espectador. Ele não está inserido no desenho, mas sabe-se que se trata de uma imagem que ele viu, já que não há nenhum elemento que defina a figura como a memória de outro personagem. Figuras secundárias - As figuras em segundo plano ajudam a ambientar o leitor em diversos aspectos. Através desses personagens localizados a certa distância, nota-se que a figura central está gritando e por isso, chama a atenção desses que estão mais longe. Enquanto um dos adultos AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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parece resignado com a situação em que vivem, uma das crianças chega a se inclinar para ver melhor a cena. Além disso, elas carregam baldes, colaborando com a compreensão das condições precárias do lugar. Representação das fontes - A fonte em primeiro plano está representada de uma forma que caracteriza o sofrimento do lugar. Os braços abertos expressam um pedido de ajuda. Todas as personagens têm traços calejados. A fala das personagens - No caso do balão de fala da personagem em questão, identificam-se diversas pontas, embora arredondadas e linha trêmula, o que induz a percepção de uma voz emocionada. Figura 1. Quadro 1
Fonte: Dados da pesquisa
Inferência: Quadro 1 Nesse quadro, que introduz a primeira parte da reportagem em quadrinhos A guerra e as Chechenas, intitulada Voltar para casa, existe a inversão de sentido do padrão do plano contra-plongée, que, conforme Gerbase (2012), fortaleceria a personagem que fosse enquadrada dessa forma. Porém, a fragilidade exposta nos traços dessa figura e o seu discurso desesperado, representado pelas convenções das HQs, apontadas por Eco (2006), impedem que, mesmo a personagem estando enquadrada de uma forma que deveria lhe favorecer, não foi possível restabelecer a dignidade que os diversos outros elementos da página retiram dessa figura. A insinuação da emoção apontada por Souza Jr (2009), como própria do estilo do quadrinho underground, é perceptível nessa imagem, devido aos traços nada realistas, buscando apenas dramatizar um sentimento. Neste quadro também, percebe-se um desenho que varia entre o realista e o caricatural, bem como é apontado por Guimarães e Silva (2003), como algo próprio do desenho de Joe Sacco. A forma com que Sacco desenha o quadro demonstra que houve 134
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profunda observação dos protagonistas e dos ambientes em que estão inseridos, aproximando-se da técnica do jornalismo literário, conforme define Melo (1994 apud GUIMARÃES; SILVA, 2003). Dessa forma, são percebidos diversos detalhes na narrativa que ultrapassam os limites da objetividade e lembram as produções jornalísticas do new journalism. Figura 2 Enquadramento - Nesse quadro, visualiza-se uma das possibilidades exclusivas da linguagem dos quadrinhos. Há um quadro dentro do outro, representando ao mesmo tempo a descrição do que foi visto pelo repórter e a representação do que foi contado pela fonte. Percebe-se três enquadramentos diferentes, embora dois deles não estejam separados por requadros. No primeiro, a mulher, em plano fechado, narra o que aconteceu com ela. É um enquadramento que torna a figura mais próxima do leitor, dando o tom de intimidade ao depoimento, já que Zura está falando sobre seu medo. O uso do plano conjunto, com outros personagens no mesmo quadro, coloca o leitor junto na sala onde a entrevista ocorre. Pode ser, inclusive, interpretado como um plano subjetivo, já que, além de Sacco e Zura, há uma terceira figura, provavelmente da intérprete, de costas e o enquadramento parece se tratar do ponto de vista de alguém da equipe. Ao fundo, dois planos representam as memórias dela, o primeiro, à esquerda, um plano aberto, possibilita que o leitor veja a trajetória dos misseis cortando o céu, ficando bem claro que caíam perto do local onde Zura estava. O segundo enquadramento, à direita, em primeiro plano, mostra sua postura trêmula ao ouvir o estrondo das bombas. Presença subentendida do jornalista - Sacco está ouvindo o depoimento, atento, de costas para a perspectiva em que desenhou o quadro. Ele está inserido na reportagem como participante nesse momento, ressaltando que esteve in loco, colhendo o depoimento que descreve os horrores da guerra. Sacco aparece novamente de costas, identificado apenas pelos seus óculos e o rosto arredondado. Embora ele esteja na cena, a importância maior ainda é dada à fonte, que recebe toda a luz do lugar, ficando em maior evidência do que o próprio repórter inserido na cena. Nos enquadramentos que servem como plano de fundo para o requadro central Sacco transmite os medos da fonte retratando sua angústia no momento em que reconstitui o bombardeio e quando nos coloca em perspectiva à expressão de temor de Zura. Os detalhes dos momentos de terror vividos pela fonte são repassados ao leitor através do desenho de dele. Figuras secundárias - Há uma figura representada de costas que não pode ser identificada, levando o leitor a acreditar que seja a intérprete. Fica claro aqui a necessidade de exprimir o máximo de realidade através desses detalhes. Sacco não fala a língua da entrevistada e representálos a sós, por uma questão prática ou estética, colocaria dúvidas sobre a realidade exposta através dos desenhos. A preocupação com o detalhe AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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da presença da intérprete para buscar atender a uma espécie de salva guarda da realidade ou da ética do JHQ, evitando que o leitor duvide da liberdade de representação do repórter, colocando em risco a credibilidade do seu trabalho. O leitor acaba recebendo o recado de que, se foi mantida a figura da intérprete pelo simples motivo de ela estar lá, então nada deve ter sido ocultado. A tensão do relato tem uma ligação com as outras duas figuras que compõe o quadro, pois formam uma moldura que evidencia ainda mais o rosto de Zura, enquanto ocultam outros detalhes do ambiente que antes eram perceptíveis. Esse posicionamento das figuras coloca o rosto assustado de Zura em maior evidência, quase como o zoom que proporciona o suspense no cinema. Representação das fontes - A expressão antes infantil de Zura, no começo do depoimento, agora dá lugar a um olhar desesperado. Ela está contando uma memória perturbadora e isso se percebe pelo desespero em sua expressão, principalmente no olhar. A fala das personagens - Aqui o balão de fala auxilia na condução do olhar do leitor para as figuras que aparecem fundidas ao fundo do quadro central. A seta dos balões de fala de Zura são longas e obrigam o leitor a olhar na direção dos quadros que ilustram o sentimento da refugiada. Sacco novamente faz uso do recordatório para contextualizar o que é contado pela fonte. Figura 2. Quadro 7
Fonte: Dados da pesquisa
Inferência do Quadro 7 Nota-se nesse quadro, a utilização de uma técnica apontada por Eisner (1999) que se referia ao trabalho de ações simultâneas. Para isso, o requadro formal, com quatro linhas delimitando o espaço da ação, representaria o agora, o presente, enquanto a ausência do requadro narraria o enquanto isso, que aparece substituído por naquele tempo. Dessa forma é que Joe Sacco retrata a questão da memória narrada pela fonte. Considera-se importante destacar que a imagem que o leitor da HQ de Sacco vê é uma interpretação do jornalista de um fato que foi contado a ele. 136
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Há uma alternação entre a fala de Sacco e Zura. É possível identificar quem fala o quê devido ao texto estar inserido em elementos iconográficos diferentes para representar o discurso verbal. Há o signo da nuvem, que Eco (2006) define como relativo a fala da personagem, e o recordatório, que, segundo Souza Júnior (2009), se assemelha ao discurso em off do narrador. Há elementos que aproximam o trabalho feito neste quadro com o jornalismo literário. Embora baseadas no relato de Zura, há uma livre reprodução dos acontecimentos, própria do estilo lite- rário, que segundo Pena (2006) baseia na verossimilhança e não na veracidade dos fatos. Essa característica aproxima o quadro do que Czarnobai (2005 apud NECCHI, 2009) define como algo inerente ao jornalismo gonzo, em que não há limite entre realidade e ficção. Figura 3 Enquadramento – Novamente, o recurso de sobreposição entre os quadros é utilizado. No quadro maior, em plano médio, é possível ver o repórter, sua intérprete e duas fontes durante a entrevista. Nesse plano também se vê boa parte da barraca e se tem noção da precariedade do campo de refugiados. No quadro menor, que representa a lembrança da refugiada, o plano médio coloca a figura de Fátima em primeiro plano e ao fundo é possível ver as dificuldades que passava com seu filho na barraca em que morava antes de resolver sair do campo de refugiados. Presença subentendida do jornalista – Joe Sacco está em primeiro plano, em um canto escuro da figura, de costas, com bloco e caneta na mão, como se estivesse anotando o que as irmãs dizem, buscando demonstrar que esteve no local na posição de repórter. Embora esteja presente na cena, sua fala entra no recordatório, narrando o que as irmãs contaram naquele dia, introduzindo o assunto através daquilo que no cinema se chama de voz off. Sua opinião está presente também na forma como ele representa o ambiente e as fontes, que segue a sua própria percepção. No quadro menor, a presença de Joe Sacco fica restrita à forma como ele representa a memória de Fátima. Figuras secundárias – Em segundo plano aparece a intérprete. A tradutora foi fundamental para que a reportagem pudesse ser feita e é colocada constantemente no quadro como se sua presença trouxesse realidade para a cena, além de ser um elemento de bastidor. A irmã de Fátima nada diz, mas já é introduzida como fonte pelo repórter. Ao fundo é possível visualizar a precariedade da barraca, com roupas estendidas no seu interior. O local parece pequeno e escuro. No quadro que representa a lembrança da fonte, a figura secundária é o filho de Fátima, que parece acordar com a chuva entrando pela barraca. Esse elemento representa as dificuldades vividas no local. Representação das fontes – As irmãs possuem um rosto menos sofrido que o das outras refugiadas, talvez por representarem pessoas mais novas. AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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A atenção delas está focada em Joe Sacco. No segundo quadro, Fátima aparece olhando para a água da chuva entrando na barraca e molhando a cama do seu filho. A estampa dos vestidos ajuda a diferenciar uma da outra. A fala das personagens – Joe Sacco se comunica com o leitor através do recordatório, introduzindo a história das irmãs que estão sendo entrevistadas por ele no primeiro quadro. Ainda nesta imagem, uma das irmãs fala sobre sua experiência no campo de refugiados através do balão de fala. No segundo quadro, a caixa de texto aparece em formato misto, entre recordatório e balão de fala. Com esse elemento, Sacco busca separar o que é dito por ele – no recordatório convencional – e o que é dito em off pela fonte, que aparece no balão híbrido. Figura 3. Quadro 39
Fonte: Dados da pesquisa
Inferência do quadro 39 Joe Sacco recorre novamente à inclusão de um quadro dentro do outro para representar a diferença entre o tempo passado e o presente. Medeiros e Gomes (2013) lembram que há necessidade de uso de técnicas que representem a variação de tempo entre o que acontece e o que é lembrado. Sobre essas representações de ações simultâneas, Eisner (1999 apud MEDEIROS; GOMES 2013) estipula o uso do requadro para conter o agora e a imagem vazada representaria o enquanto isso. Porém, Sacco inverte essa lógica, colocando a lembrança dentro de uma moldura de quatro linhas, enquanto a entrevista não está concentrada entre margens bem delimitadas. O bloco e a intérprete reforçam o processo jornalístico por trás desse trabalho. Conforme Souza Júnior (2009), o uso da metalinguagem – do bastidor da notícia como parte da narrativa – confere legitimidade ao trabalho. Além disso, conforme o mesmo autor, são duas narrativas conjuntas que fazem parte do trabalho de Sacco no JQ: a que diz respeito aos procedimentos do repórter e a que é formada pelos depoimentos das fontes. 138
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Eco (2006) descreve o balão que representa discurso expresso como uma nuvem seguida por seta que aponta para o rosto do personagem, enquanto o recordatório seria uma caixa de texto que ocupa a parte superior ou inferior das HQs, conforme Souza Júnior (2009). Nesse quadro, porém, o modelo híbrido de caixa de texto é inserido novamente. Uma caixa de texto arredonda e sem seta representa a voz off da personagem por trás da cena em que a lembrança é retratada. Sacco dá características bem específicas para cada personagem, o que evita confusões ao longo da leitura, já que o personagem pode aparecer representado de diferentes ângulos. Eco (2006) atenta que as HQs tendem a padronizar as personagens como forma de garantir a memorização e fácil identificação do leitor. Isso acaba aproximando o Jornalismo em Quadrinhos do new journalism, que, conforme aponta Wolfe (1976 apud GUIMARÃES; SILVA 2003), tem entre suas técnicas o detalhamento das cenas. Nesse quadro também é possível perceber que a narrativa do JQ reforça várias vezes as características de uma pessoa ou local sem que se torne algo repetitivo, conforme apontam Guimarães e Silva (2003). CONSIDERAÇÕES FINAIS Analisando quadro a quadro a primeira parte da reportagem em quadrinhos A Guerra e as Chechenas, percebe-se que o repórter Joe Sacco contribui e interfere na matéria produzida por ele. Tanto o texto quanto a imagem são inseridos de forma estratégica por Sacco, que escolhe o conteúdo que será apresentado e a sua organização no quadro. Portanto, desde as falas que serão expostas até a forma com que elas serão inseridas no quadro são de escolha do repórter. Sendo assim, a resposta ao problema dessa pesquisa – a presença do repórter e quadrinista Joe Sacco contribui e interfere no desenvolvimento da primeira parte da reportagem A Guerra e as chechenas? – indica que ele interfere, sim, confirmando a hipótese deste trabalho. Além do que já foi apresentado acima, outros aspectos identificados na pesquisa levam a essa afirmação. O trabalho de Joe Sacco não fica restrito à reprodução direta daquilo que foi visto por ele durante a apuração. Ele reorganiza os acontecimentos como se editasse um texto e o domínio da narrativa ocorre também através da imagem, já que o desenho permite a ordenação dos elementos em cena, de acordo com o que o repórter entende como mais, ou menos, importante de ser retratado. Sacco chega a retratar fatos que não presencia e a interpretação dos mesmos é feita pelo próprio repórter através do texto e do desenho. Algumas vezes, a informação objetiva fica restrita ao texto, enquanto a imagem inserida é unicamente ilustrativa e não factual. Porém, a objetividade não é um valor perseguido por Sacco. Ele demonstra sensibilidade e aproximação com as fontes, que, no geral, são pessoas comuns e que representam o lado mais fraco da história. A função da reportagem de Sacco, no caso da matéria analisada, é trazer um recorte da realidade e nem mesmo são ouvidas autoridades
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que poderiam representar um contraponto ao que é dito pelas fontes e pelo repórter. O jornalismo não é deixado de lado e Sacco busca deixar isso evidente quando se insere no quadro, sempre representado como repórter, com papel e caneta nas mãos ou simplesmente com uma bolsa onde transporta seu material de trabalho. O bastidor da reportagem também é apresentado ao leitor, humanizando a relação entre o público e atividade jornalística e, assim, busca aceitação e credibilidade do leitor sobre seu trabalho. O desenho não serve apenas para ilustrar o desenvolvimento da reportagem, como faria o vídeo ou fotografia. A ilustração permite que Sacco manifeste sua opinião sobre os fatos, construa situações hipotéticas que aprofundam os detalhes dos relatos das fontes, dramatize os fatos através da forma como são compostos os quadros e as fontes são representadas em caricaturas que transmitem emoção e também a opinião do repórter sobre elas. O Jornalismo em Quadrinhos praticado por Joe Sacco assimila diversas linguagens, que variam do texto ao audiovisual, mas que são adaptadas ao formato HQ, sendo usadas de uma forma original. Ressalte-se que, dentro de diversas linguagens, estão presentes dois gêneros que possuem uma narrativa bastante subjetiva: o cinematográfico e o jornalismo literário. Isso reforça a constatação de uma participação influente do repórter na história. São ambos gêneros que costumam transportar uma mensagem subjetiva e autoral, mas que cumprem com eficácia a missão de informar, assim como o faz Joe Sacco através do Jornalismo em Quadrinhos. Além deste trabalho ter respondido ao problema de pesquisa, havendo a confirmação da hipótese, também atingiu todos os objetivos propostos, pois foi possível compreender de que forma o repórter e quadrinhista Joe Sacco participa da narrativa na matéria A Guerra e as Chechenas, mais especificamente na primeira parte da reportagem publicada no livro Reportagens. Também, através da pesquisa, entende-se como a presença do repórter como personagem contribui para a compreensão do tema retratado na história, em que circunstâncias Joe Sacco se insere como personagem e de que forma o repórter conta a história que registra. Acredita-se que a técnica do Jornalismo em Quadrinhos não se esgota na participação do repórter na narrativa. Os elementos presentes no formato HQ são diversos e podem ser analisados separadamente ou relacionados uns com os outros. A relação entre o recordatório e a imagem é uma dessas possibilidades. Em uma análise mais aprofundada, seria possível identificar qual elemento cumpre maior função informativa. Seria um padrão seguido sempre a possível relação entre o enquadramento em plano fechado e o relato mais contundente da fonte? Essas e outras indagações, que surgiram ao longo da pesquisa, indicam que o tema não se esgota neste trabalho, que procurou promover uma discussão em cima desse gênero jornalístico. Embora as Histórias em Quadrinhos sejam um suporte de conteúdo
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tão antigo quanto os meios eletrônicos, como o rádio e a TV, o jornalismo parece estar recém-despertando para essa possibilidade que a linguagem HQ traz. Entende-se que este é um momento especial para o Jornalismo em Quadrinhos, já que agora existe a internet, um meio onde não há as restrições impostas pelo jornal impresso – tempo e espaço - a uma produção inovadora e que pode sair cara para o formato analógico. O digital, porém, demonstra competência para abrigar um conteúdo que propõe uma relação diferente com a notícia e, inclusive, permite outros recursos ao Jornalismo em Quadrinhos, como a inclusão de áudio e vídeo nas histórias. De qualquer forma, considera-se importante a discussão desse gênero, que mostra que o jornalismo pode sair do lugar-comum e que pode haver espaço para quadrinistas, ou para algum profissional que queira trabalhar com essa técnica, com a ajuda de alguém que saiba desenhar. REFERÊNCIAS BARDIN, LAURENCE. Análise de Conteúdo. São Paulo: Edições 70, 2011. 229 p. CZARNOBAI, André Felipe Pontes. Gonzo: O filho bastardo no New Journalism. Trabalho de Conclusão de Curso (Monografia) Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2003. Disponível em: < http:// qualquer.org/gonzo/monogonzo/> Acesso em: 07/10/2017. ECO, Umberto. Apocalípticos e Integrados. São Paulo: Perspectiva, 2006. 392 p. FONSECA JÚNIOR, Wilson Corrêa. Análise do conteúdo. In: DUARTE, Jorge; BARROS, Antônio (Orgs.). Métodos e técnicas de Pesquisa em Comunicação. São Paulo: Atlas, 2006. 380 p. GUIMARÃES, Rafael Baldo; SILVA, Fabiano Messias. Jornalismo em Quadrinhos: Uma análise do uso da nona arte como suporte para narrativa jornalística. 2003. p. 155. Trabalho de Conclusão de Curso (Monografia) – Universidade de Brasília, Brasília, 2003. Disponível em: <http://www.guiadosquadrinhos.com/monografia/jornalismo-em-quadrinhosuma-analise-do-uso-da-nona-arte-como-suporte-para-narrativa-jornalistica 2003/47> Acesso em 15/09/2017. GERBASE, Carlos. Cinema – O Primeiro Filme: Descobrindo, Fazendo, Pensando. Porto Alegre: Artes e Ofícios, 2012. 277 p. GIL, Antônio Carlos. Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. São Paulo: Atlas, 2008. 200 p. MEDEIROS, Eduardo Luis Mathias; GOMES, Iuri Barbosa. Jornalismo em quadrinhos na revista Fórum - nova prática jornalística no Brasil. In: GT História do Jornalismo - 9º Encontro Nacional de História da Mídia. Ouro Preto – 30 de maio a 1º de junho de 2013. Disponível em: <http://www. ufrgs.br/alcar/encontros-nacionais-1/9o-encontro-2013/artigos/gt-historiado-jornalismo/jornalismo-em-quadrinhos-na-revista-forum-nova-praticajornalistica-no-brasil> Acesso em: 23/09/2017.
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NECCHI, Vitor. A (im)pertinência da denominação “jornalismo literário”. Estudos em Jornalismo e Mídia, v. 6, n.1, p. 99-109, jan./jun. 2009. Acesso em:< https://periodicos.ufsc.br/index.php/jornalismo/article/view/19846924.2009v6n1p99> Acesso em: 04/10/2017. OLIVEIRA, Ariel de Lara. O Jornalismo em Quadrinhos na Internet: as reportagens gráfico-sequenciais do site Cartoon Movement. 2015. 166 p. Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2015. Disponível em: < http://www.lume.ufrgs.br/ handle/10183/117263 > Acesso em 16/09/2017. PENA, Felipe. O jornalismo Literário como gênero e conceito. In: Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares em Comunicação. Trabalho apresentado ao Núcleo de Pesquisa de Jornalismo, do Encontro dos Núcleos de Pesquisa da Intercom. 2006. Disponível em: <http://www.portcom.intercom. org.br/pdfs/77311256385591019479200175658222289602.pdf> Acesso em: 06/10/2017 SACCO, Joe. Reportagens. São Paulo: Companhia das Letras. 2016. 199 p. SANTAELLA, Lúcia. O que é Semiótica. São Paulo: Brasiliense, 1983. 88 p. SOUZA JÚNIOR, Juscelino Neco de. A estrutura da reportagem em quadrinhos e a prática jornalística. In: Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação. Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação. XXXII. Curitiba – 4 a 7 de setembro de 2009. Disponí- vel em:<http://www.intercom.org.br/papers/nacionais/2009/resumos/R4-29131.pdf> Acesso em: 17/09/2017.
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GUNS N’ ROSES E A MÍDIA
Capítulo 6
GUNS N’ ROSES E A MÍDIA: ANÁLISE DO RELACIONAMENTO ENTRE A BANDA E A IMPRENSA Mateus Mendes Rister Alexsandro Funck Ramires
O objetivo deste artigo é apresentar uma análise sobre o relacionamento entre a banda de hard rock, Guns N’ Roses e a imprensa durante o período de tempo de 1987 até 1993. A proposta é compreender como era o tratamento dado pela imprensa à banda, como isso influenciou a opinião pública e como a banda tirou proveito dessa situação. Para tal, apresenta-se um relato sobre a história da banda e busca-se suporte em conceitos teóricos sobre mito, sensacionalismo, cultura de massa, opinião pública, indústria cultural e jornalismo cultural. A pesquisa se enquadra no tipo exploratória, em uma abordagem qualitativa, tendo como base o relacionamento entre a banda Guns N’ Roses e a imprensa durante o período de auge da banda. Com o uso da pesquisa bibliográfica e da pesquisa documental, faz-se uma análise de imagem e conteúdo, em um recorte de tempo entre 1987 e 1993, com base nas capas das revistas Entertainment Weekly de agosto de 1991 e Rolling Stone Magazine de setembro de 1991, além de capa do álbum GN’R Lies, lançado em 1988, a reportagem exibida pelo programa Fantástico em 1991 e a letra da música Get In The Ring, lançada em 1991. (GIL, 1989; BARDIN, 2011; JOLY, 2007) GUNS N’ ROSES Segundo Wall (2017), a banda Guns N’ Roses tem origem na cidade de Los Angeles, no estado da Califórnia, em 1985. Steven Adler e Slash já conheciam AXL e Izzy de outros grupos musicais. Todos os músicos compartilhavam gostos musicais semelhantes e problemas causados por estruturas familiares disfuncionais. “A fechadura entrou e girou. Slash e Steven fizeram três ensaios com AXL, Izzy e Duff, tocaram um único e AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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estrondoso em 6 de junho [...] e o Guns N’ Roses estava pronto para sair em turnê”. (WALL, 2017, p. 30) A banda, acompanhada de dois amigos, parte em um carro com um trailer no reboque para a sua primeira aventura fora de Los Angeles. O carro acabou quebrando cerca de 160 quilômetros depois. Os dois amigos ficaram encarregados de cuidar do carro, enquanto o grupo decide seguir o itinerário pegando caronas. Wall (2017) explica como essa turnê, que ficou conhecida como Hell Tour, foi importante para a união dos membros da banda. De acordo com o autor, o grupo retorna para Los Angeles com os laços fortalecidos, mas sem conseguir ganhar dinheiro. Neste período acontecem a maioria das composições que seriam eternizadas no álbum “Appetite for Destruciton” lançado em 1987 e algumas que apareceram no álbum duplo “Use Your Illusion”, lançado em 1991. A banda passa algum tempo sem realizar shows. Vicky, uma amiga da banda acabaria por abrigar todos os membros da banda, além de ajudar AXL e Slash a contratar um advogado para sua defesa em um caso da acusação de estupro. De acordo com Wall (2017), a partir desse momento o grupo passa a chamar atenção das grandes gravadoras. Aproveitando a boa repercussão de suas apresentações, a banda fecha um contrato com a Geffen Records recebendo um adiantamento de setenta e cinco mil dólares para começar a produção de seu primeiro álbum. Encontrar um empresário que aceitasse o desafio não foi fácil. O Guns N’ Roses começa a ganhar a fama de ser uma banda de gestão impossível. Até que os executivos da Geffen conseguem persuadir o empresário Alan Niven a gerenciar o grupo. As sessões de gravação começam algumas semanas depois, enquanto a banda segue fazendo shows por Los Angeles. As apresentações estão cada vez mais lotadas e os boatos em torno da banda continuam crescendo. O público não queria perder um show para saber se a banda ainda existia ou se algum dos membros tinha morrido por overdose. Em meios as gravações, Alan surge com a ideia de lançar um material antes mesmo do primeiro álbum oficial. O empresário decide lançar um mini álbum com quatro canções, sendo duas originais da banda e outras duas regravações das bandas Aerosmith e Rose Tattoo. Live?!*@Like a Suicide, (Vivo?! Como um Suicida - em tradução literal) é lançado dez dias antes do Natal de 1986 e esgota rapidamente, mostrando que Alan estava certo. Agora, o público tinha uma pequena amostra em disco do que o grupo era capaz. A banda demonstrava que podia passar para um álbum a mesma energia que apresentava nos shows ao vivo. Embora o lançamento tenha atingido seu objetivo, os executivos da gravadora passam a ficar preocupados com o estilo de vida selvagem que o grupo levava. Com o dinheiro obtido com a venda das cópias de Live?!*@ Like a Suicide, a banda parte para uma série de apresentações na Inglaterra. Ao total foram três shows, sendo dois ruins e o último triunfante. As críticas negativas dos primeiros logo são esquecidas pelo sucesso da apresentação
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derradeira. A banda retorna aos Estados Unidos com a fama de selvagem se espalhando por toda a Europa. Appetite for Destruction é lançado em 21 de julho de 1987 e de acordo com Wall (2017), o álbum traz toda a verdade das ruas pobres de West Hollywood. O álbum foi obrigado a apresentar o adesivo “Advertência aos Pais”, criado pelo Parents Music Resource Center (PMRC) para alertar sobre o conteúdo agressivo, violento, profano ou pornográfico do álbum. Para os grupos musicais, o adesivo significava um distintivo de honra, mas as gravadoras temiam que os grandes varejistas se recusassem a vender os álbuns que estavam marcados pelo PMRC. As coisas começam a melhorar em 1988, com o lançamento do segundo videoclipe, desta vez para a balada Sweet Child o’Mine. Agora, como banda de rock número um dos Estados Unidos, o grupo retorna à Inglaterra para participar do festival Mons- ter Of Rock, com as maiores bandas de rock do mundo na época. De acordo com Wall (2017), o evento ao ar livre era o festival mais prestigiado do ano e foi programado com meses de antecedência. O Guns N’ Roses estava agendado para ser a segunda apresentação, logo após a banda Alemã de Heavy Metal, Halloween. No dia do show o tempo estava muito ruim e uma forte chuva apareceu no começo das apresentações. O terreno em que o festival foi montado era inclinado e logo se transformou em um grande lamaçal. O festival era conhecido por atrair um grande número de pessoas que deixavam para comprar o ingresso na última hora, mas nesta edição a multidão foi muito maior do que esperado. Os ingressos se esgotaram e os funcionários da bilheteria acabaram utilizando tiras de papel como entrada para atender o público. Quando o Guns N’ Roses subiu ao palco do festival, a multidão era imensa. Milhares de pares de pés pulam e agitam o piso que já estava virado em lama. Eram mais de cem mil pessoas que se aglomeravam para encontrar um lugar melhor para assistir ao show. A parte de trás do público empurra a multidão para frente, fazendo com que algumas pessoas caíssem na lama e acabassem pisoteadas. A banda para a apresentação algumas vezes pedindo para que as pessoas se acalmassem e não empurrassem os demais para frente. Durante a tensão, a banda adiantou a parte acústica do show, na tentativa de diminuir o ímpeto da plateia. As tentativas se mostram em vão, dezenas de pessoas são pisoteadas e os adolescentes Alan Dick e Landon Siggers morrem alguns instantes mais tarde, nas tendas de emergência. Siggers estava tão desfigurado que o corpo foi reconhecido pela família apenas pelas tatuagens que o falecido tinha nos braços. Os músicos tiveram a confirmação das mortes somente após o final do show. Como de esperado, a notícia foi devastadora e os membros do Guns N’ Roses, já afundado em drogas, passaram por momentos muito difíceis devido ao ocorrido naquela noite. Todos receberam a notícia com tristeza, mesmo sabendo que não havia nada que a banda pudesse fazer para evitar a tragédia.
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De acordo com Wall (2017), a falta de sensibilidade da imprensa especializada ainda trazia mais peso sobre o nome da banda. Os problemas com as drogas e com a lei, a agressividade das apresentações, as brigas e agora as mortes, o nome Guns N’ Roses começava a virar sinônimo de perigo em escala global. A manchete da revista Rolling Stone após a tragédia dizia: “Uma banda brutal para tempos brutais”. Após finalizar a turnê de divulgação do álbum Appetite for Destruction, o grupo teve pouco tempo para descansar. Em novembro de 1988 chega às lojas o disco GN’R Lies. O mini álbum trazia oito faixas, as quatros primeiras que já haviam sido lançadas no EP Live?!*@Like a Suicide em 1986, as outras quatro faixas eram acústicas, sendo três delas inéditas. Wall (2017) explica que o lançamento foi uma jogada estratégica da gravadora para manter as vendas em alta aproveitando o material previamente gravado. A jogada se mostrou certeira, assim que foi lançado, o disco vendeu cinco milhões de cópias, disputando com o seu antecessor o primeiro lugar nas paradas de sucessos norte-americanas. O álbum trazia um dos maiores sucessos da carreira do grupo, a balada Patience impulsionada pelo videoclipe que rodou exaustivamente na MTV. Em contrapartida, GN’R Lies também trazia uma das mais polêmicas canções da banda, “One in a Million”, composta por AXL Rose e que retratava de forma agressiva a visão do cantor ao desembarcar de sua pequena e interiorana cidade natal na grande Los Angeles. O grupo passou a enfrentar acusações de homofobia, racismo e xenofobia. A forte polêmica acompanharia a banda por muitos anos. Wall (2017) afirma que com GN’R Lies, a banda começa a alfinetar a parte da imprensa que dava mais espaço para as polêmicas em que o grupo se envolvera do que para o seu trabalho musical. Os músicos estavam com raiva do tratamento que recebiam da imprensa, acusando a mídia de aumentar e até mesmo inventar polêmicas envolvendo o nome da banda para denegrir a mesma, vender mais cópias de suas revistas e jornais ou ter mais audiência em seus programas de rádio e televisão. O grupo se sentia perseguido pela imprensa por trazer à tona, em suas canções e em seu estilo de vida, as verdades das ruas da parte pobre e esquecida de Hollywood. O autor afirma que é exatamente essa honestidade crua que separou o Guns N’ Roses dos outros grupos pasteurizados formados por Rock Stars “de bom comportamento” que figuravam na cena musical da época. O próprio nome escolhido para o álbum e a arte gráfica escolhida para estampar a capa do disco é uma provocação a forma que a banda era retratada pela imprensa. Embalado de forma sedutora de um modo que dialogava fortemente com a infâmia crescente da banda, o título original do disco era Lies! The Sex, the Drugs, the Violence, the Shocking Truth, logo encurtado para GN’R Lies e apresentado com uma capa no estilo tablóide, parodiando os episódios cada vez mais frequentes de histórias sobre o mau comportamento da banda. Deveria ter sido isso, um amálgama simples que daria impulso à imagem da 146
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banda, temperaria sua reputação musical e renderia um monte de dinheiro a todos os envolvidos. (WALL, 2017, p.118)
Segundo Wall (2017), os músicos começam a ganhar muito dinheiro. Porém, aos poucos, o relacionamento entre os membros, que no início era baseado na amizade fortificada por tudo que passaram juntos, começa a se deteriorar. AXL Rose fora diagnosticado com transtorno bipolar e iniciara tratamentos com remédios controlados e diversos outros processos alternativos que incluíam hipnose regressiva. O vocalista, que sempre teve comportamento perfeccionista no aspecto musical, busca dominar todos os outros aspectos referentes à banda, como a parte administrativa e financeira. Ao mesmo tempo, seu temperamento cada vez mais imprevisível deixa os outros músicos a mercê de suas vontades. Tal fato começa a influenciar as apresentações ao vivo, que são interrompidas e muitas vezes encerradas prematuramente por qualquer motivo que desagrade o cantor. O guitarrista Slash e o baterista Steven Adler se afundam cada vez mais em drogas pesadas, o que passa a comprometer suas performances no palco. De forma disfuncional, o grupo começa os processos criativos e de pré-produção do próximo álbum. Por um período, os músicos não conseguem se reunir para compor, então os rascunhos de algumas canções são compostos de forma individual e com parcerias de pessoas de fora da banda. Logo, é percebido que o baterista Steven Adler não estava em condições de gravar. O músico estava usando heroína com tanta frequência que chega a desmaiar sobre a bateria. Após um show realizado no festival Farm Aid em 7 de abril de 1990, Steven é oficialmente demitido. A alegação é que o músico recebera um ultimato para se livrar do vício em drogas e que não conseguira cumprir o estipulado. Steven gravou apenas a música Civil War para o novo álbum. Assim, pela primeira vez em cinco anos, o grupo sofre mudanças em sua formação. A banda acaba por escolher o baterista Matt Sorum como novo membro. O grupo entra em turnê para divulgar o novo disco antes mesmo do lançamento. É nesta turnê em janeiro de 1991, que a banda se apresenta pela primeira vez no Brasil, com dois shows na segunda edição do festival Rock In Rio. Ao total, as gravações do novo álbum levaram dois anos e passaram por sete estúdios diferentes. Com 36 músicas prontas, foi decidido que a banda lançaria dois discos simultaneamente, chamados Use Your Illusion I e Use Your Illusion II. Os lançamentos dos álbuns se tornou um momento ímpar na história da indústria musical. Com o lançamento, a banda entrava em uma turnê que duraria dois anos, incorporando em sua formação o tecladista Dizzy Reed e mais músicos de apoio para conseguir executar as novas músicas ao vivo, como haviam sido gravadas. A equipe contava com 232 pessoas, um jato particular e dois palcos gigantescos que se revezavam de cidade em cidade. Mas as rupturas no relacionamento entre os músicos estavam mais evidentes, nenhum deles tinha certeza se chegariam ao fim de cada show. O humor AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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de AXL Rose estava em constante oscilação e ele cancelava apresentações, atrasava, finalizava os shows depois de algumas músicas ou abandonava o palco e voltava muito tempo depois se ficasse irritado por qualquer motivo. Muitos desses shows acabavam em tumultos e pancadarias. Com toda essa imprevisibilidade a cada concerto, a imprensa começou a chamar o Guns N’ Roses pelo apelido de “A Banda Mais Perigosa do Planeta”, logo o título foi incorporado pela legião cada vez maior de fãs do grupo. Durante a turnê, o guitarrista Izzy Stradlin, um dos membros fundadores, insatisfeito com a situação em que a banda se encontrava e procurando manter-se afastado do vício em drogas, abandona o grupo sem maiores explicações. Para o seu lugar entra a guitarrista Gilby Clarke. Com tantas confusões e tumultos envolvendo os shows da banda, a imprensa seguia noticiando o Guns N’ Roses como um perigo por onde passava, muitas vezes dando mais foco para os problemas pessoais dos músicos. Na imprensa norte-americana, o grupo estampava capas de revistas que faziam alusão aos problemas envolvendo a banda. Entre os exemplos, cita-se as capas das revistas Rolling Stone e Entertainment Weekly. Para Wall (2017, p.223), esse tipo de exposição da mídia atraia mais o público do que o afastava: “Afinal, essa era a banda mais perigosa do mundo e o público comparecia para sentir o gosto desse perigo, daquela imprevisibilidade”. De acordo com Wall (2017), a forma com que a banda era retratada pela imprensa incomodava muito AXL Rose. O cantor acreditava que muitos fatos noticiados eram falsos ou aumentados. Tentando obter o controle sobre isso, AXL começou a conceder entrevistas apenas para jornalistas que assinassem um contrato dando a banda os direitos de propriedade e de publicação do material produzido, sob multa de duzentos mil dólares. Claro que isso não foi bem recebido pelos veículos de comunicação, trazendo a recusa de muitas revistas importantes da época. A raiva de AXL Rose com a maneira que o Guns N’ Roses aparecia na mídia era tão grande que o músico escreveu a letra de uma música na qual ofende de forma extremamente agressiva alguns jornalistas, incluindo seus nomes e os nomes dos veículos de comunicação em que trabalhavam. A letra de Get In The Ring, quinta faixa do álbum Use Your Illusion II torna-se uma declaração de guerra para a imprensa. Durante a turnê que promovia os álbuns Use Your Illusions, Slash e Duff Mckagan acabam por assinar um contrato cedendo os direitos sobre o nome Guns N’ Roses para AXL Rose, agora dono exclusivo da marca. As circunstâncias sobre como isso aconteceu ainda são obscuras. As versões mais conhecidas são que AXL Rose tenha criado o novo acordo para ter a segurança que, em caso de Slash ou Duff falecer, nenhuma ex-namorada ou qualquer familiar que não tenha contribuído para a valorização da marca, tenham direitos sobre a mesma. Entretanto, a versão de Slash e Duff sugere que eles foram obrigados a assinar o acordo instantes antes de um show com lotação máxima. E que fizeram isso por temerem que AXL não faria a apresentação e isso causaria um tumulto de grandes proporções. 148
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A banda ainda gravaria mais um álbum com a formação que encerrara a última turnê. The Spaghetti Incident?, lançado em 1993 trazia versões de músicas que influenciaram a banda em seus primórdios, além de uma faixa escondida composta pelo líder e mentor da Família Manson, Charles Manson. Logicamente, a canção trouxe mais controvérsia para o grupo, que era contra a sua inclusão no disco, mas agora perderá o direito de decisão para AXL Rose. O álbum vendera bem em seu lançamento, mas não se comparava aos anteriores. A banda não realizou turnê para promovê-lo. Nos anos seguintes, o grupo entraria em um hiato que duraria até 2001, mas em seu retorno, apenas AXL Rose e Dizzy Reed estariam presentes. MITO E SENSACIONALISMO O mito conta acontecimentos de uma história sagrada, trazendo para a realidade façanhas de seres superiores aos humanos. “Em outros termos, o mito narra como, graças às façanhas dos Entes Sobrenaturais, uma realidade que passou a existir, seja uma realidade total: o Cosmo, ou apenas um fragmento: uma ilha [...]. (ELIADE, 1978, p.11). A história do Guns N’ Roses, desde o seu surgimento até a seu ápice, traz para a contemporaneidade esses elementos. Em poucos anos, um grupo de desajustados que não conseguiam nem mesmo manter as condições básicas para uma vida saudável, conseguiram se tornar o grupo musical mais valioso de sua época, vendendo milhões de álbuns e realizando shows lotados em todo o planeta. Para Barthes (1980), o mito possui função ideológica. O autor explica que as significações míticas encontram campo privilegiado na sociedade, tornando o mito uma ferramenta ideal para a inversão ideológica burguesa. Ou seja, o Guns N’ Roses trouxe para a superfície, toda a verdade das ruas que era escondida. As drogas, a violência, a decadência, os problemas familiares, o sexo. Tudo que aparecia em suas canções e em seu estilo de vida trouxe à tona a crueza que era maquiada por outros artistas da época. Campbell (1995, p.143) não considera exagero entender o mito como uma janela pela qual as inesgotáveis energias sobrenaturais adentram nas manifestações culturais humanas. Para o autor, tanto as religiões, quanto as artes, filosofias, formas sociais do homem primitivo e histórico, descobertas tecnológicas e científicas e até mesmo os próprios sonhos fazem parte do âmbito de atuação do mito. O autor considera que o mito possui caráter atemporal, podendo aparecer e desaparecer de acordo com a necessidade em que a humanidade precisa utilizá-lo. Pode surgir para que os homens consigam explicar um fato para o qual não possuem outra teoria. Mas quando esses fatos não ocorrem, o mito permanece adormecido, esperando o momento em que seu retorno seja oportuno. Cabe citar a sociedade de espetáculo, apresentada por Debord (2005 p.17). Ele considera que toda a existência das sociedades onde impera o caráter moderno de produção se revela como uma imensa acumulação de espetáculos, ou seja, qualquer fato que aconteça em uma sociedade
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moderna pode ser transformado em representação de um show. De acordo com o autor, o espetáculo está inserido na sociedade, é o seu total e também é seu mecanismo de unificação. Ele salienta: O espetáculo apresenta-se como algo grandioso, positivo, indiscutível e inacessível. Sua mensagem é ‘o que aparece é bom, o que é bom aparece’. A atitude que ele exige por princípio é aquela aceitação passiva, que na verdade, ela já obteve na medida em que ela aparece sem réplica, pelo seu monopólio da aparência.
Debord (2005) alerta que a sociedade do espetáculo também pode alienar o espectador, que se torna refém do meio, passando a consumir como verdade absoluta os produtos embalados comercialmente. Nesta sociedade surge o conceito de sensacionalismo. De acordo com Marcondes Filho (apud ANGRIMANI SOBRINHO, 1995, p.15), uma parcela da imprensa, impulsionada pela vontade de fa- turar mais, utiliza e potencializa os elementos mais apelativos de uma história, não dando o mesmo espaço para o contexto em que a situação aconteceu. Isso modifica o fato real, deixando de lado informações importantes sobre o mesmo e focando apenas em um ponto de uma história maior. “Como as mercadorias em geral, interessa aos jornalistas de um veículo sensacionalista apenas o lado aparente, externo, atraente do fato. Sua essência, seu sentido, sua motivação ou sua história estão fora de qualquer cogitação”. O autor explica que o sensacionalismo ganha espaço ao explorar as perversões, fantasias, sadismo e recalques. O sensacionalismo mexe diretamente com as emoções do público, trazendo à tona desejos instintivos ao consumir esse tipo de informação. O trinômio escândalo-sexo-sangue aponta, pois, para os três níveis de maior enfoque do jornal sensacionalista, sendo a moral, o tabu e a repressão sexual e, por fim, a liberação das tendências sádicas do leitor o fundo socio- psicológico desse tipo de jornalismo. (MARCONDES FILHO apud ANGRIMANI SOBRINHO 1995, p.17)
Angrimani Sobrinho (1995) pondera os meios de comunicação que utilizam do sensacionalismo como fonte principal, podem se assemelhar a um neurótico obsessivo, buscando um certo tipo de satisfação em ações transgressoras, ao mesmo tempo em que julga com autoridade as ações de que se alimenta. Ou seja, os veículos existem graças aos fatos que eles julgam como imorais, apresentando a notícia com imparcialidade e inserido na história sua própria versão da realidade, influenciando diretamente o ponto de vista do público. Pedroso (apud ANGRIMANI SOBRINHO, 1995) destaca que o sensacionalismo mantém o foco da notícia na emoção e não na informação. Passa assim a explorar o vulgar e o extraordinário através da espetacularização desproporcional dos fatos, dando enfoque a qualquer elemento insignificante ou sem relevância que possa ressaltar ainda mais o caráter emocional da matéria. Ele quer dizer que o sensacionalismo torna espetacular o fato que não mereceria este tratamento fantástico em outros 150
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segmentos do jornalismo. Mesmo que para isso o fato precise ser tirado de um contexto maior e ganhe corpo em sustentações superficiais que enalteçam aspectos irrelevantes, mas que garantam um comercial maior para o veículo. Outro elemento que merece destaque na sociedade do espetáculo e do sensacionalismo é o conceito de símbolo. Na perspectiva de Jung (1998), existem inúmeras coisas que a compreensão humana não consegue explicar, e que para essas situações se utilizam termos simbólicos. É a forma que se encontra para integrar ao convívio da sociedade conceitos que não possuem definição específica. Nesta linha, encaixa-se o uso das imagens como símbolos. Nöth e Santaella (1998) ressaltam que imagens se personificam como símbolos quando algum elemento passa a ser explicado somente com a difusão de tal representação. Os autores afirmam que a mudança na forma de reproduzir a linguagem também traz consigo a mudança como ela é percebida. Isso pode ocorrer quando existe uma mudança de posicionamento. Em se tratando de artistas, o músico pode alterar a sua imagem para atingir um determinado público que não atingia com a imagem anterior que passava ao mercado. Ou mesmo quando quer demonstrar uma nova fase, abandonado velhas atitudes que já não fazem parte do seu estilo de vida, e consequentemente, de sua imagem. No mundo artístico, a reinvenção é necessária para que determinado artista não se torne obsoleto. Desta forma, um mesmo artista que era símbolo de rebeldia pelo público jovem e símbolo de arte grosseira pelo público adulto, pode adentrar em outra fase de sua carreira, abandonando a urgência de sua arte e aprimorando sua técnica para se tornar agora símbolo de sofisticação para o público adulto e símbolo de subordinação para o público jovem. A própria evolução da percepção do público sobre um objeto artístico pode determinar a mudança de seu significado. Uma geração pode não reconhecer o valor de determinada pintura ou obra musical, que pode ser redescoberta por outra geração, tornando-se símbolo de uma época, mesmo não sendo reconhecida na mesma. Tais questões acabam por envolvem premissas sobre a opinião pública. Segundo Ortega Y Gasset (1987, p.162), a opinião pública é fundamentada no poder do ‘mando’ de um grupo. Não no sentido de usar a força física, mas no uso de ferramentas de persuasão para impor sua vontade perante à sociedade. “O mando é exercício normal da autoridade, o qual se fundamenta na opinião pública. Jamais alguém mandou na Terra baseando seu mando essencialmente em outra coisa que não a opinião pública”. Complementando, Chapple e Garofalo (1989) consideram que as gravadoras são as verdadeiras responsáveis pelo que acontece de fato com a opinião pública na indústria da música, pois é das empresas de gravação que provém a fonte que gera toda a indústria, ditando o que se toca nas rádios, o que aparece na mídia e o que é promovido para o público. Os
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autores explicam que o financiamento para as gravações, as divulgações e para os concertos são feitos pelas empresas que, em contrapartida, faturam na venda de álbuns e exploram a imagem dos artistas. Podendo assim, escolher o tipo de música e que tipo de artista se investirá. Para Vila (2002 apud JANOTTI JR., 2004), a importância da música é vital para o fã de Rock e suas subdivisões, como o Hard Rock, Heavy e Metal. Eles não apenas gostam do determinado tipo de som, mas o levam como estilo de vida. O autor explica que os fãs de metal consomem a música a ponto de comprar várias vezes o mesmo disco se o álbum for lançado com capas e bônus diferentes, viajam a distância necessária para assistir ao concerto de sua banda favorita, marcam seus corpos com tatuagens que fazem referência ao grupo musical e até chegam a se envolve em brigas com quem ousar falar mal do seu estilo de música. JORNALISMO CULTURAL E CULTURA DE MASSA Na visão de Alves (2006 apud FARO, 2006), a função do jornalismo cultural é cobrir, relatar e analisar os principais representantes da produção cultural, como a música, artes visuais, teatro, cinema e a dança, não importando a região em que as manifestações artísticas acontecem. Sobre as diferenças entre artistas e jornalistas que cobrem os acontecimentos culturais, Suzuki Jr. (1983) explica que o artista, seja músico, escritor ou pintor, não depende apenas de suas produções artísticas, mas também da imagem que consegue passar ao seu público. Essa imagem, que é o complemento, é forjada pelo jornalismo cultural, que por mais independente que seja, é algo que está, faz parte da própria cultura. De acordo com Miranda (2005, p.80), o jornalismo cultural é uma área de especialização dentro do jornalismo geral. A sua realização acontece nas mesmas condições e pode sofrer influências das situações políticas e econômicas do país. “Ele expressa tanto uma visão crítica, discutindo questões em pauta na atualidade, quanto opiniões ou conteúdos tradicionalmente identificados com o status quo das sociedades onde emerge”. Ressalta ainda que o jornalismo cultural vai muito além de uma simples especialização jornalística: As características que diferenciam o jornalismo como um todo e o jornalismo cultural em particular apresentam-se através de pautas que enfocam questões referentes a temas específicos da cultura, da arte, do comportamento e do lazer. Determinam-se, ainda, pela análise, desdobramento e aprofundamento de questões relevantes para a vida social, atualizando temas e personalidades da cultura humanística. (MIRANDA, 2005, p.86)
Para Silva (2012, p.71), a explicação sobre o jornalismo cultural é simples: “O jornalismo cultural submete-se paralelamente às práticas do jornalismo geral que conjuga com especificidades próprias do jornalismo especializado e, ainda do cultural […]”. De acordo Saldanha (2005, p.14), o jornalismo cultural ainda não encontrou uma maneira específica de cobrir, 152
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relatar e analisar o gênero musical Rock. “Até hoje, ainda não há uma fórmula que se possa apontar como a maneira correta de se falar de rock. Nos EUA, pode se dizer que o jornalismo de rock foi moldado pelas revistas especializadas, como a Rolling Stone”. Para o autor, o modelo de cobertura da revista é seguido pela maioria das publicações do segmento até a atualidade. Não necessariamente sendo a mais completa, mas é a que se tornou parâmetro para as revistas que surgiram após a sua fundação. Cabe citar Adorno (1971). Para ele, a Indústria Cultural é a criação de uma estrutura, dentro do sistema capitalista, capaz de produzir em série manifestações artísticas para comercializá-las, retirando das mesmas sua independência. Formatada para uma plateia pré-definida, a quem somente poderia recebê-la passivamente e de forma alienada. Para Hall (2005), a globalização da indústria cultural permitiu a criação de ‘identidades partilhadas’ a partir do fluxo cultural entre os países, ampliando o alcance para um mesmo produto cultural em diversas partes do mundo. A partir disso, pessoas de diferentes partes do planeta se tornam consumidores do mesmo produto, cultura. Ou seja, um grupo de pessoas de um determinado país pode encontrar em um artista de outro continente, o estilo musical ou mesmo estilo de vida que não encontra em sua própria região, passando a se identificar mais com uma outra cultura na qual não está inserida. Com essa superexposição, Gullar (1993) alerta para as armadilhas que os próprios artistas podem cair ao se preocupar mais em se manter nos holofotes do que com a arte: Na época da comunicação de massa e da intensa comercialização da arte, o perigo é maior. E não apenas o perigo de não ser reconhecido o valor autêntico, como o perigo de o artista autêntico se deixar levar pela ânsia de notoriedade, da propaganda: passa a trabalhar mais para a repercussão do que para a realização de sua própria obra. [...] Autores de obras extravagantes tornamse objeto de interesse para a televisão e a imprensa, e desse modo aparecem frequentemente neles [...] o que a obra significa importa pouco. [...] Mas sempre que se discutem na televisão ou na imprensa questões de arte, esse personagem será ouvido. (GULLAR, 1993, p.94)
O autor ressalta que assim, cria-se uma nova modalidade de artistas, os que ganham mais atenção pela sua imagem do que pela arte que produzem. Passando a ser reconhecidos por motivos diversos, sem ter ligação com o que produz ou já produziu. Para se entender a relação da banda Guns N’ Roses com os veículos de comunicação especializados em música, durante o seu período de apogeu (1987 até 1993), é preciso entender o contexto e o momento histórico em que os Estados Unidos da América se encontrava. Ao longo da década de 1980, os EUA sofreram um período de instabilidade econômica justificado, principalmente, por sua ineficácia em responder a novos concorrentes que surgiam
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no mercado internacional. Nessa década, países da Europa Ocidental e Ásia, como Alemanha e Japão, conseguiram impor produtos a um baixo custo de produção aliado a alta tecnologia. Consequentemente, a economia estadunidense passou a perder espaço para tais concorrentes nos mercados interno e externo. (SOUZA, 2017)
De acordo com Silva (2015), a indústria cultural, em especial a música, enfrentava conflitos sobre o que era apropriado escutar. Bandas de hard rock e heavy metal passam a sofrer ataques do grupo Parents Music Resource Center (PMRC) que acusam os grupos musicais de disseminar ideais não adequados aos jovens. O PMRC foi formado por esposas de importantes políticos da época, como Tipper Gore, esposa do então senador e futuro vice-presidente dos Estados Unidos, Al Gore, e Susan Barker, esposa do então secretário do tesouro dos Estados Unidos, James Barker. “Reunia em sua direção cerca de dez por cento de todas as esposas de senadores dos EUA, o que lhe dava um grande poder de articulação política”. Ainda Silva (2015), explica que o comitê acreditava que o aumento de consumo de álcool e drogas, estupros e violência entre os jovens, era influência direta dos grupos musicais. A PMRC conseguiu progredir nos Estados Unidos na era Reagan a ponto de conseguir que a indústria fonográfica coloque nas capas dos LPS de Heavy Metal e Rock em ge- ral símbolos indicando se naquelas obras haviam músicas abordando temas como violência, sexo, uso de drogas, etc. Tal ação foi tão forte que se chegou a realizar uma audiência pública no Congresso dos Estados Unidos para debater o “perigo” que o Heavy Metal representava para a juventude dos EUA. (SILVA, 2014, p.114)
Segundo Morin (1962), no século XX a cultura havia se tornado mercadoria. A música, o filme e a palavra passam a ser produzidas industrialmente e vendidas comercialmente. Afirma ainda o que ele chama de Terceira Cultura, oriunda da imprensa, do cinema, do rádio e da televisão, pois tudo que aparece, se amplifica e passa a se projetar lado a lado com as culturas clássicas. A Terceira Cultura pode ser denominada como Cultura de Massa, ou seja, um movimento cultural produzido de forma industrial para atingir uma grande parcela de uma comunidade, com forte propagação pelos veículos de comunicação em massa, como o rádio e a televisão. “Uma cultura orienta, desenvolve, doméstica certas virtualidades humanas, mas inibe e proíbe outras” (MORIN, 1962, p.5). A cultura é constituída por grupo de normas, mitos, símbolos e imagens que passam a fazer parte da forma de ser do indivíduo, afetando suas escolhas, seus instintos e emoções. Isso acontece por trocas mentais de projeções e identificação com os mitos, símbolos e personalidades míticas ou reais que a representam. A cultura de massa integra e ao mesmo tempo é integrada a uma realidade de culturas diversas, é contida, controlada e censurada pelos poderes do Estado e da Igreja e tem a força de deteriorar outras culturas. Ela não tem autonomia total, podendo agregar elementos 154
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das culturas religiosas, nacionais e humanistas e, ao mesmo tempo, ser agregada pelas mesmas. Morin (1962) ainda afirma que para os intelectuais, a cultura de massa é desprezada por ser considerada um subproduto industrializado sem valores profundos. Esses indivíduos se recusam a colocar a cultura de massa no mesmo patamar da ‘alta cultura’. Mas. isso não impede que a indústria cultural se desenvolva em qualquer regime, seja produzida pela Estado ou pela iniciativa privada. Neste segundo caso, o Estado passa a fazer parte da indústria como forma de policiar o que é produzido. Os conteúdos culturais diferem mais ou menos radicalmente segundo o tipo de intervenção do Estado - negativo (censura, controle) ou positivo (orientação, domesticação, politização) segundo o caráter liberal ou autoritário da intervenção, segundo o tipo de Estado interveniente. (MORIN, 1962, p.13)
Sobre as diferenças da cultura de massa produzida pelo Estado e pela iniciativa privada, o autor afirma que o sistema privado procura criar algo divertido, normalmente com mais inserção comercial, se adaptando ao público. Já o Estado produz algo forçado, tentando adaptar o público à cultura. Embora exista um padrão pré-estabelecido, a indústria cultural necessita de personalidade para que seus produtos conquiste o público. Pode-se usar como exemplo o cinema, que embora os filmes possuam tramas semelhantes, como nos gêneros de comédia e terror, um novo lançamento precisa ter seu próprio toque, algo de original que o faça se destacar dos demais. Assim funciona para a música, literatura, programas de rádio e televisão. Já para a imprensa, é necessário sempre ter algo novo, o acontecimento do momento, um fato que logo é encaixado em um modelo pré-estabelecido de regras jornalísticas que inclui a manchete ou fato principal e apresentação dos elementos mais importantes da história, respondendo às perguntas ‘o quê, como, onde, quando e por quê?’, para adequá-lo ao formato de notícia. Para Lima (1978), a cultura de massa não representa necessariamente uma ruptura com a raiz da cultura popular ou do folclore, porém a industrializa dentro dos seus limites. Ou seja, a cultura de massa se abastece do que é popular ou faz parte do folclore de determinada sociedade, a adequa em padrões aceitáveis para o comércio industrial. Muitas vezes, pode adicionar elementos de outros segmentos culturais para um alcance maior de popularidade. Sobre a função dos meios de comunicação em massa, Moles (apud LIMA, 1978) afirma que máquinas como a televisão e o rádio tem como função essencial imprimir uma determinada quantidade de mensagens estereotipadas no subconsciente dos telespectadores e ouvintes, mantendo seus olhos e ouvidos ocupados com elementos criados para distrair e agradar o maior número de telespectadores. Ou seja, os aparelhos de televisão e de rádio são utilizados para propagar elementos criados AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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a partir de conceitos das culturas originais e populares para entreter o grande público. Obras de literatura são adaptadas para séries e novelas televisivas, muitas vezes com a mensagem original obstruída por tiradas cômicas ou pelo texto original fora do contexto. Ou programas de rádio que cortam obras musicais consideradas longas em prol de informes publicitários. Como consequência, o autor explica que esse processo acaba por criar subprodutos de valor artístico inferior e sem real importância, não contribuindo para a evolução das artes como a música e a literatura. Moles (apud LIMA, 1978) também observa que os veículos de comunicação em massa podem servir para a doutrinação dogmática da população. Uma segunda doutrina que nos sugere o estudo de cadeias de radiodifusão é o que chamaremos doutrina dogmática. O sistema de comunicações está nas mãos de um conselho de direção, que possui um quadro de valores categóricos e precisos, mas diferente da ideia de suporte de um mercado econômico, quer dizer de um aprendizado de slogans publi- citários. A radiodifusão aqui pertence a um partido político, a uma doutrina religiosa, a um estado que pretende refazer o mundo segundo uma ideologia definida.
Merton e Lazarsfeld (apud LIMA, 1978) explicam que as sociedades organizadas estão sujeitas a diversas formas de controle por determinados grupos. A forma mais direta e muito utilizada por governos totalitários é a violência organizada e a coerção de massa. Entretanto, com o passar dos tempos, outras maneiras de controlar as opiniões e crenças da grande massa ganharam força. A violência e a coerção são substituídas pelos programas de rádio e anúncios institucionalizados. Estes meios tomam para si a tarefa de conformar o público de massa ao status quo social e econômico. Assim, os grupos pertencentes a governos totalitários ou não, que possuem interesses no controle de opiniões e no conformismo da população, adquirem através dos veículos de comunicação em massa, formas mais sutis de obter esse controle. A mensagem passa a ser embutida no suposto mercado do entretenimento. Filmes, telenovelas, séries televisivas, programas radiofônicos podem levar em suas estruturas e em seus protagonistas, modos de vida, ideias ou experiências que levem a grande massa a pensar como esses determinados grupos querem. Isso leva a deterioração dos gostos estéticos e dos padrões culturais populares. “A extensão da influência que os meios de comunicação de massa têm exercido sobre sua plateia deriva não somente do que é dito porém, mais significativamente, do que não é dito”. (MERTON; LAZARSFELD apud LIMA, 1978, p.116). Isso significa que os meios de comunicação de massa, além de seguir afirmando o status quo, deixa de utilizar o seu espaço vital para trazer à tona questões de suma importância para a sociedade em que estão inseridos.
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Para os autores, algumas formas de música, drama e literatura de baixo valor cultural atualmente alcançam praticamente todas as pessoas que vivem em sociedade. Isso se explica pelo fato de, embora a maior parte da população tenha acesso a alfabetização, não possui gosto refinado. O que significa que o grande público consegue alcançar a escolaridade média, mas finaliza seus estudos nesta faixa. Por consequência, não adquire senso crítico e se conforma em consumir o que é proposto pelos grupos que decidem o que deve ser veiculado. GUNS N’ ROSES E A IMPRENSA Para atender a proposta de estudo deste trabalho, utiliza-se as capas das revistas Entertainment Weekly de agosto de 1991 (Figura1) e Rolling Stone de setembro de 1991 (Figura 2), além de capa do álbum GN’R Lies, lançado em 1988 (Figura 3), trechos da reportagem exibida pelo programa Fantástico em 1991 e fragmentos da letra da música Get In The Ring, lançada em 1991.
Figura 1: Capa da revista Entertainment Weekly.
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Figura 2: Capa da revista Rolling Stone.
Figura 3: Capa do álbum GN’R Lies.
De acordo com Joly (2007), a imagem é algo heterogêneo, reunindo dentro de um limite, diferentes categorias de signos. A imagem em si, podendo ser uma fotografia, pintura ou algo semelhante, mas também signos plásticos, como cores e formas, e signos linguísticos, da linguagem verbal. A autora explica que desde a primeira infância, o ser humano aprender a ler a imagem, muitas vezes servindo de apoio para a aprendizagem da escrita. Que uma imagem é uma produção consciente e inconsciente de um sujeito, isso é um fato; que constitui seguidamente uma obra concreta e perceptível, também o é; que a leitura desta obra a faça viver e perpetuar-se; que mobiliza tanto o consciente como o inconsciente de um leitor ou espectador, é inevitável. (JOLY, 2007, p.48) 158
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A partir deste conceito, pode-se analisar que a capa da revista Entertainment Weekly de agosto de 1991, ao colocar a fotografia do vocalista AXL Rose e do Guitarrista Slash, em conjunto com a linguagem verbal “Violence, Drugs and Rock & Roll Guns N’ Roses Out of Control” (Violência, Drogas e Rock & Roll Guns N’ Roses Fora de Controle), está associando a imagem dos músicos e o nome da banda a temas negativos como a violência e o uso de drogas. Além de sugerir que o grupo está incontrolável. Da mesma forma, revista Rolling Stone de setembro de 1991, que apresenta a fotografia da banda com a linguagem verba,l “Guns N’ Roses Out of Control” (Guns N’ Roses Fora de Controle), afirma de forma determinante que o grupo está fora de controle. Este tipo de associação desperta no consciente ou subconsciente do espectador o sentimento de que o grupo está fortemente ligado aos problemas enfrentados pela sociedade, como a violência, o uso de drogas ilícitas e o descontrole. Sendo este, um modelo de comportamento que os pais de jovens da época não desejavam para seus filhos. A ligação de uma marca com temas considerados negativos pelo grande público pode causar danos permanentes a mesma. De modo que, ao não apresentar provas concretas do que afirma, tais publicações agem de forma parcial, colocando suas opiniões como verdade absoluta. Lançado em 29 de novembro de 1988, o álbum GN’R Lies trazia na capa a resposta da banda para a inúmeras acusações que sofrerá por parte da imprensa desde os primeiros passos rumo ao estrelato. De uma maneira geral, podemos dizer que enquanto uma obra de arte ou uma imagem permaneceu como uma produção coletiva e anônima, tal indicava que a obra estava ao serviço de uma religião, de um rito ou, num sentido mais lato, de uma função mágica. A necessidade de nomear o artista manifesta uma visão da arte enquanto tal, isto é, como busca de um objetivo estético específico – ideia que a arte pela arte levou ao limite – e que se afirma no desejo crescente de ligar o nome do mestre à sua obra. (JOLY, 2007, p.50)
Sendo assim, quando a banda Guns N’ Roses utiliza para a arte gráfica da capa de seu segundo álbum, o formato de diagramação comumente utilizada por jornais, com fotografias de todos os membros do grupo e dando destaque para a linguagem verbal “Exclusive - The Sex, The Drugs, The Violence, The Shocking truth - Ladies, welcome to the dark ages man sues ex-wife “she took my sperm without permission” - sex, sex, sex” (Exclusivo - Sexo, Drogas, Violência, a verdade chocante - Senhoras, bem-vindas às eras das trevas - homem processa ex-esposa “ela pegou meu esperma sem permissão” - sexo, sexo, sexo), como se fossem as manchetes, a banda está retratando de forma irônica como os veículos de comunicação noticiavam a- contecimentos sobre o grupo, apelando para manchetes de conteúdo duvidoso, a fim de atrair mais o público. É uma resposta clara para chamar a atenção ao fato do grupo ser constantemente noticiado por escândalos ou situações que aconteciam no âmbito privado, AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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ou ligando o nome do grupo a fatores dos quais os mesmos não tinham controle. Quando Marcondes Filho (apud ANGRIMANI SOBRINHO, 1995) afirma que o sensacionalismo no jornalismo pode ser notado pela ênfase da informação estar nos elementos mais apelativos de uma história, sem dar a mesma importância para o contexto geral, a fim de chamar mais atenção para um fato isolado, fazendo com que o mesmo vire o carro chefe de uma notícia. Isso é utilizado não com o intuito de informar ou mesmo formar, mas sim vender mais cópias de uma publicação ou atrair mais audiência para o veículo. Esse tipo de jornalismo pode ser notado pela utilização de frases de efeito ou uso de termos pejorativos para descrever uma pessoa ou uma situação. De acordo com essa linha de raciocínio, quando a reportagem exibida pelo programa Fantástico em agosto de 1991, tinha o texto que aconselhava: “nunca deixe suas filhas chegarem muito perto deste rapaz” ao se referirem a AXL Rose, ou afirmando que o mesmo “tem uma ficha policial de dar inveja a muito bandido” e que era “considerado inimigo público número um” de sua cidade natal, a matéria está focando apenas em fatos negativos da vida do cantor. Da mesma forma em que continua dizendo que a banda “morava em um quartinho imundo”, tocava nas “piores casas noturnas de Los Angeles” e sua apresentação no festival Rock In Rio “também teve cenas violentas. Muita gente ferida, espremida na grade que protegia o palco. Três pessoas morreram”, a reportagem dava ênfase apenas para situações ruins, sendo que algumas delas, como os problemas no festival Rock In Rio, são mais responsabilidade dos organizadores do evento do que da própria banda. Em nenhum momento a reportagem citou que o grupo vendeu milhões de discos, gerava emprego para mais de duzentas pessoas que trabalham em sua equipe, ajudou o festival Rock In Rio e vender milhares de ingressos, ou falava das qualidades musicais dos membros da banda, como o alcance vocal de AXL Rose ou mesmo as superações que o grupo enfrentou para chegar ao topo das paradas de sucesso. Isso prova que a intenção da reportagem estava em denegrir a imagem da banda, expondo somente fatos negativos relacionados a mesma. Ao analisar a letra da canção “Get In The Ring”, cabe ter em mente que ela foi escrita como resposta aos jornalistas e veículos de comunicação que a banda Guns N’ Roses acusava de utilizar o nome da mesma para vender mais, sem se importar com a veracidade ou qualidade do conteúdo que produzia. Ou seja, a letra traz um recado para situações que aconteciam na época. Dentro do discurso, Orlandi (2009, p.33) classifica tal ação como formulação, “isto é, aquilo que estamos dizendo naquele momento dado, em condições dadas”. Em outras palavras, a letra da canção só é escrita como foi, pelo tratamento que os veículos davam ao Guns N’ Roses naquele período de tempo. Seguindo as instruções da autora, pode-se dizer que na letra da
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canção, o compositor AXL Rose coloca sua visão e ideologia, transformando seu discurso em sua verdade, a partir dos fatos que vivenciava: “produzir evidências, colocando o homem na relação imaginária com suas condições materiais de existência” (ORLANDI, 2009, p.46). Desta forma, quando AXL Rose canta os versos “Por que você me olha se você me odeia? Porque me arrastar para sua miséria? “Quem é você para criticar minhas intenções? Você tem seus meca- nismos de manipulação Assim como você, eu tenho meus vícios”... “E isso vai para todos vocês, vagabundos da imprensa / Que que- rem criar controvérsia imprimindo mentiras / Em vez das coisas que dissemos” ... “Vocês estupram a porra dos garotos / Enquanto eles pagam seu suado dinheiro / Para ler sobre as bandas sobre as quais eles se interessam / Publicando mentiras, começando controvérsias”. O cantor questiona os métodos utilizados pelos jornalistas, acusandoos de manipular as informações pagar ganhar o dinheiro dos jovens fãs que procuram notícias das bandas que gostam. Já ao citar os nomes dos jornalistas e dos veículos de comunicação, além de atacar frontalmente os mesmos, o compositor também alerta seus fãs para desconfiarem das notícias sobre as bandas produzidas pelos citados. Trata-se de uma declaração de guerra. O músico utiliza toda a sua raiva e a sua influência sobre seu público para, ao seu modo, devolver os ataques que grupo sofrera pelos veículos e jornalistas citados na letra. Logicamente, não se pode negar a importância do jornalismo cultural para o mundo do entretenimento. A sua função social mostra-se de extrema importância ao longo dos anos, tornando conhecidos do grande público, a arte e artistas que não teriam outra forma de expandir os seus seguidores. Entretanto, o jornalismo cultural deveria manter-se em tal aspecto, com foco nas notícias sobre as diversas formas de artes existente, não se deixando seduzir por factoides sobre a vida pessoal das artistas, que em nada agregam em sua arte. Após passar por dificuldades extremas, com problemas para se alimentar e manter moradia com condições de vida saudável, o Guns N’ Roses passa a atrair um número maior de seguidores, seja por sua música ou pela aura que já se criava em torno de seu nome. Seus ensaios no volume máximo, sua moradia sempre aberta a visitantes de todos os tipos, atraía garotas que atraiam garotos, atraía boêmios, motoqueiros, traficantes, escritores, poetas, curiosos, todos que necessitavam de algo diferente, algo que não era encontrado em outros lugares de Los Angeles. Logo a fama do Guns N’ Roses se espalhou pelas ruas e seus shows em casas noturnas tornaram-se disputados. Isso chamou a atenção das gravadoras, sedentas pelo próximo sucesso. As grandes empresas do mundo musical espalhavam olheiros pelas casas noturnas, esperando encontrar grupos musicais que fossem bons o suficiente para valer o investimento em seus inícios de carreira. As que atraíssem mais público, não necessariamente por sua música, mas também por suas performances a apelos visuais, ganhavam a chance de assinar um contrato, gravar álbuns e ter apoio financeiro para turnês. Em troca, as AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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gravadoras ganhavam muito dinheiro com todo o material vendido que continha a marca da banda. Trata-se de encontrar a expressão artística que tenha as melhores condições de ser embalada e transformada em mercadoria para vender a um público segmentado ou mesmo geral. Desde o princípio, os problemas com a justiça e as polêmicas envolvendo os membros do Guns N’ Roses crescia em paralelo com a sua fama. Isso provava ao público, que a banda vivia a vida que cantava em suas músicas, não era nada roteirizada como as outras bandas da época que tentavam falsamente forjar a fama de maus elementos ou como os grupos que preferiam seguir o caminho inverso, demonstrando serem bons moços, comportados perante à opinião pública. O Guns N’ Roses era honesto e verdadeiro, primeiro ao trazer em suas músicas todo o perigo real, a decadência, a sujeira, os vícios e as relações humanas da parte esquecida de Hollywood, segundo em não alterar o seu estilo de vida e seu comportamento, seja morando em uma garagem ou desfrutando dos confortos e luxos que o sucesso trouxe. Exatamente por manter o espírito rebelde em sua música e seu comportamento, o Guns N’ Roses passa a ser associado pelos jornalistas e veículos de comunicação como um grupo musical que levava o perigo e o caos por onde passava. Alguns incidentes fora do controle da banda contribuíram ainda mais para essa visão. Mas, conforme a banda expandia o seu alcance e seus problemas internos tornaram-se públicos, uma parcela da imprensa deixava de noticiar o aspecto musical e começava a focar apenas nos escândalos envolvendo o nome da banda. Esse fato, além de trazer à tona um jornalismo que abandona a qualidade da informação em prol do maior número de venda e audiência, ainda marcava o nome Guns N’ Roses como sinônimo de tumulto, problemas e má influência para a juventude. A partir daí a banda também utiliza o fato de ser denegrido pela imprensa como combustível artístico. Passando a abordar a temática na capa de um de seus discos e também no conteúdo lírico de uma de suas músicas. A banda utilizava a sua arte como direito de resposta. Eles entendiam que não eram tratados de forma correta pela imprensa, portanto, respondiam a esse tratamento através das armas que possuíam em mãos, a criatividade artística. A essa altura, o Guns N’ Roses tinha virado um fenômeno cultural. A banda se tornou a maior banda de sua época. Para desespero dos pais e influenciadores da opinião pública, o grupo atraía cada vez mais a atenção dos jovens, pois simbolizava toda a revolta da juventude que há tempos ansiava por algo que representasse todos os problemas reais que passavam. A banda era algo verdadeiro, íntegro de seu jeito, sem medo de expor suas qualidades e seus defeitos. Chegando ao status de mito moderno, salvando culturalmente toda uma geração com escala global, que encontrava na banda uma razão para não ter medo de encarar as dificuldades e os excessos de uma vida jovem na era moderna das cidades cosmopolitas. 162
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Por fim, entende-se que mesmo ácido e com os dois lados tentando desqualificar um ao outro, o relacionamento entre o Guns N’ Roses e a imprensa foi fundamental para o crescimento de ambos. Os veículos passaram a se alimentar dos escândalos e problemas que envolviam a banda para vender mais cópias de revistas e jornais, e obter mais audiência para programas de rádios e de televisão. Da mesma forma, o Guns N’ Roses, por mais que possuísse qualidade artística, jamais alcançaria o status que alcançou de escala global, não fosse a forte exposição de sua marca na mídia, seja por aspectos artísticos ou polêmicos. Pois os veículos de comunicação fazem parte de forma vital da indústria cultural e da cultura de massa, mantendo forte influência na criação da imagem de um artista ou grupo musical. Além disso, o grupo soube utilizar o próprio relacionamento com a imprensa como inspiração artística. Atualmente, o Guns N’ Roses segue em atividade. Após retornar aos palcos em 2001, lançar um novo álbum chamado “Chinese Democracy” em 2008 e excursionar pelos anos seguintes com apenas AXL Rose e Dizzy Reed da formação que encerrara a turnê promovendo os álbuns Use Your Illusion I e II em 1993, o grupo mais uma vez surpreende o mundo ao anunciar o retorno de parte de sua formação clássica. AXL Rose, Slash, Duff Mackgan e Dizzy Reed se reuniram em 2016 e seguem em turnê que já arrecadou cerca de um bilhão de reais. Steven Adler e Izzy Stradlin já participaram em ocasiões diferentes de shows da banda ao longo dos últimos anos. O grupo já vendeu em torno de cem milhões de cópias de seus álbuns até o momento, já passou oito vezes pelo Brasil, em três delas por Porto Alegre. A banda é considerada a última grande banda de rock da história, sendo AXL Rose, o último grande vocalista em seu formato clássico. A notícia da reunião trouxe a banda de volta às capas dos veículos de comunicação e seu possível novo álbum já é um dos mais esperados para 2018. REFERÊNCIAS ADLER, Steven. Meu apetite por destruição: sexo, drogas e Guns N’ Roses. 1. ed. São Paulo: Edições Ideal, 2015. ADORNO, Theodor e HORKHEIMER, Max. A Indústria Cultural – o Iluminismo como mistificação das massas. IN: COHN, Gabriel (org.). Comunicação e Indústria Cultural. São Paulo: Cia. Editora Nacional/Edusp, 1971, p. 287-295. ANGRIMANI SOBRINHO, Danilo. Espreme que sai sangue: um estudo do sensacionalismo na imprensa. São Paulo: Summus, 1995. AXL Rose no Fantástico. Reportagem: GIESSE, Dóris. Produção: Fantástico, 3’18’’, 1991. Disponível em: <https://www.youtube.com/ watch?v=v1oH3w2QN7g&t=7s>. Acesso em 20 novembro de 2017. ALVES, Breno Castro. Os desafios do jornalista que cobre Cultura. Publicada no site Comunique-se em 20 de abril de 2006 (www.comunique-se. com.br.) Apud FARO, José Salvador. Nem Tudo que Reluz É Ouro: Contribuição AS MULTIFACES DO JORNALISMO
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Sobre os autores
Alexsandro Funck Ramires Mestre em Design e professor nos cursos de Jornalismo, de Publicidade e Propaganda e de Design do Centro Universitário Metodista - IPA. Graduado em Fotografia e Artes Visuais pela UFRGS, trabalha como fotógrafo há 27 anos, tendo passado pelos principais veículos de comunicação do RS Érik da Silva Pastoris Jornalista graduado pelo Centro Metodista IPA. Passagens na Assessoria de Comunicação do TRE-RS, tendo participado das Eleições 2016 e no Portal Coletiva.net. Atualmente, é correspondente em Porto Alegre para a Rede Tua Rádio. Fabio Ramos Berti Jornalista e Doutor em Educação em Ciências pela UFRGS. Coordenador do curso de Jornalismo do Centro Universitário Metodista IPA. Diretor de Jornalismo da RDCTV. Foi coordenador de comunicação do Comitê Gestor da Copa do Mundo da FIFA Brasil 2014 - CGCopa/RS e chefe de gabinete da Secretaria Estadual do Esporte e do Lazer e diretor-geral da Secretaria Estadual da Ciência e Tecnologia. Atuou como assessor de imprensa no Palácio Piratini e na Assembleia Legislativa/RS, além de veículos de comunicação (rádio, TV, jornal e internet). Gabriela da Silva Leite Estudante de Jornalismo pelo Centro Universitário Metodista Ipa. Atualmente, atua na área de Marketing Digital no setor de varejo. Acredita no Jornalismo como forma para dar voz a todos. Guilherme de Faveri Garcia Estudante de Jornalismo pelo Centro Universitário Metodista - IPA, em Porto Alegre. Atualmente, é estagiário da assessoria de comunicação do Grupo Hospitalar Conceição (GHC). Entusiasta de Jornalismo Cultural e games.
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Soares, V.D e Berti, F. R. (Orgs.)
Luciana Rabassa Jornalista formada pelo Centro Universitário Metodista - IPA. Atuou como estagiária na assessoria de comunicação da Secretaria Municipal de Gestão da Prefeitura de Porto Alegre. Também atuou como locutora e operadora de áudio na Rádio CPT e na assessoria de comunicação da Igreja Evangélica Luterana do Brasil. Márcio Chaves Nunes Estudante de Jornalismo, no Centro Universitário Metodista - IPA. Atualmente, é estagiário de assessoria de comunicação na Federação dos Trabalhadores Aposentados e Pensionistas do RS (FETAPERGS). Entusiasta de jornalismo internacional, investigativo e esportivo. Maria Lúcia Patta Melão Mestre em Ciências da Comunicação pela Unisinos, jornalista, professora do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Metodista IPA, Porto Alegre. Está na docência há mais de 15 anos e atua em veículo de comunicação, sendo funcionária concursada da Fundação Piratini, que congrega a TVERS e a rádio FM Cultura, as emissoras públicas do Rio Grande do Sul. Mateus Mendes Rister Jornalista, formado pelo Centro Universitário Metodista IPA. Com passagem pela agência WH Comunicação, atualmente, aposta no Jornalismo Cultural independente, com foco na área musical. Rubem Rocha Leal Jornalista formado pelo Centro Universitário Metodista – IPA. Atualmente, é assessor de imprensa/social media. Entusiasta de novas plataformas e narrativas jornalísticas. Acredita que há espaço no meio digital para conteúdo de fôlego, com qualidade e independência. Valéria Deluca Soares Doutora e Mestre em Comunicação Social. Jornalista. Coordenadora do Multiverso – Agências e Laboratórios Experimentais dos cursos de de Jornalismo e de Publicidade e Propaganda. É professora no Centro Universitário Metodista – IPA, em Porto Alegre. Atua na docência e na coordenação de espaços laboratoriais há 15 anos. Desempenhou atividades em veículos e em consultoria de comunicação, tendo 25 anos de formação e profissão.
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Nota dos Organizadores Os capítulos que compõem este livro foram redigidos pelo corpo discente, pelo corpo docente e por colaboradores e são de inteira responsabilidade de seus autores. As opiniões contidas nos capítulos são a expressão das ideias de seus autores, que zeram a revisão nal dos textos e das referências. É proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem autorização expressa dos organizadores.