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Gabriel Grossi: Um dos ícones contemporâneos da gaita, Grossi fala sobre sua carreira, a influência do mestre Maurício Einhorn e os projetos para 2007

Raul de Souza está preparando o lançamento (pela editora Keyboard) de três métodos musicais, para trombone, saxofone e trompete.

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Essa reedição gerou vários convites, inclusive para participar do novo disco de Ithamara Koorax (em uma das últimas sessões do baterista Dom Um Romão, com Ron Carter e Gonzalo Rubalcaba completando o trio de base), e compor a trilha sonora para o fi lme Lost Zweig, de Sylvio Bach, cuja estréia vem sendo sucessivamente adiada. “O fi lme retrata a última semana de vida do escritor judeu austríaco Stefan Zweig, autor do livro Brasil, País do Futuro, e de sua esposa Lotte”, comenta Raul. “Eles fi zeram um pacto misterioso, se suicidaram em Petrópolis, após o Carnaval de 1942, tudo foi premeditado. Fiz a trilha junto com o Guilherme Vergueiro, pianista, e grande parte das músicas foi improvisada no estúdio enquanto assistíamos ao copião.” Também nos planos de Raul está um projeto sinfônico, com variações jazzísticas sobre a obra de Brahms, seu compositor predileto. Uma pequena prévia desta acomplagem com orquestra foi realizada em um concerto com a Jazz Sinfônica, em 2005, em São Paulo, fi lmado para lançamento em DVD, que ainda não aconteceu.

TRAJETÓRIA BRILHANTE

Nascido João José Pereira de Souza, em 23 de agosto de 1934, no Rio de Janeiro, começou tocando pandeiro na Igreja Presbiteriana da qual seu pai era pastor. O primeiro trabalho profi ssional surgiu aos 16 anos, tocando tuba na banda da Fábrica Bangu, onde trabalhava como tecelão. “Era uma das indústrias mais importantes do Rio naquela época”, relembra. “Tocávamos nas inaugurações das lojas e também em jogos de futebol, para animar as torcidas. Experimentei fl auta, trompete e sax tenor, antes de optar pelo trombone de válvula, também chamado de trombone de pistões.” O apelido de ‘Raulzinho’ foi dado por Ary Barroso, quando o garoto se apresentou no famoso programa de rádio comandado pelo compositor. “Já temos o Raul de Barros, o Raulzão, então você vai ser o Raulzinho do Trombone. Além disso, João José não é nome de trombonista”, sentenciou Ary. Durante o serviço militar, fi cou amigo do lendário batera Edison Machado quando ambos serviam na Infantaria de Guarda da Aeronáutica, chegando a Primeiro Sargento-Músico. Retomando a vida civil, passou a tomar parte em vários concursos radiofônicos, conhecendo mestres como Pixinguinha, Waldir Azevedo e Altamiro Carrilho. “Em 1955, fi z algumas gravações com A Turma da Gafi eira, conjunto liderado pelo Altamiro, com participações de Edison Machado, Sivuca, Zé Bodega e Baden Powell. Depois fui para Curitiba, onde casei, tive três fi lhos e fi quei cinco anos, tocando na orquestra do trompetista Osval Siqueira, e na Banda da Escola de Ofi ciais e Guardas da Base Aérea de Bacacheri. À noite, saía de uniforme e tudo para tocar nos dancings. Foi lá também que conheci o Airto, que cantava boleros em boates de reputação duvidosa”, diverte-se. Diz a lenda que, em uma região pantanosa, o trombonista costumava estabelecer inusitados diálogos musicais com um búfalo, o que teria infl uenciado sua volumosa sonoridade. O jornalista Roberto Muggiati, testemunha ocular do fato, conta a versão correta para a esdrúxula amizade que gerou até mesmo uma música (Water Buff alo, incluída no disco Colors) em homenagem ao mamífero ruminante. “Raulzinho tocava numa boate que fi cava dentro do Passeio Público de Curitiba, misto de parque e zoológico. Nos intervalos, ele caminhava perto do tanque dos búfalos, que de tão grande parecia uma lagoa. E de fato travava longos duetos com os animais, para espanto meu, do escritor

SETUP DE RAUL DE SOUZA

Dalton Trevisan e até do Edson Maciel, o Maciel Maluco, um grande trombonista que foi parar em Curitiba quando soube que o Raulzinho estava por lá”, relata Muggiati. “Tanto o Airto como eu fomos tentar a sorte em São Paulo, conseguindo emprego no João Sebastião Bar, reduto da bossa nova, onde conhecemos a Flora, o Cesar Mariano e o José Roberto Bertrami, futuro pianista do Azymuth. Em 1964 eu já estava de volta ao Rio, tocando com Edison Machado, Tião Neto, Hector Costita e Edson Maciel no inovador Você Ainda Não Ouviu Nada!, do sexteto Bossa Rio, do Sergio Mendes”, diz Raulzinho. “Foi um dos anos mais produtivos da minha vida. Excursionei pela Europa com o Sergio, na volta entrei para o conjunto Os Catedráticos, do Eumir Deodato, gravando o disco Tremendão, e reencontrei o Edison, que me convidou para o primeiro LP dele, Edison Machado É Samba Novo, outro registro genial.” ANOS REBELDES

Raulzinho ainda aprontou muito mais em 1964. Além dos discos de estréia do Quarteto Em Cy e do pianista Tenório Jr. (Embalo), fez parte de duas importantes sessões para a RCA: Trio 3D Convida (o segundo álbum do grupo, liderado por Antonio Adolfo) e Flora É M.P.M, primeiro LP de Flora Purim. Terminou contratado para gravar seu pró

O JAZZMIN DE RAUL

Em seu oitavo e recém-lançado disco-solo (Biscoito Fino), o trombonista apresenta um repertório que prioriza suas próprias composições e as feitas em parceria com o grupo curitibano Na Tocaia. As exceções ficam por conta de Piano Na Mangueira (Tom Jobim e Chico Buarque) e Luiza (Tom Jobim), esta última com inserção do texto Grafia Nua, de Silvana Leal. A primeira faixa do Tema para Raul (Mário Conde), única faixa do disco em que está presente o souzabone, uma variação do trombone, inventada por Raul, com quatro válvulas, em vez das tradicionais três, e afinado em dó. Raul apresenta três faixas: os sambas St. Remy, em homenagem à cidade freancesa, e Yolaine, além do samba de gafieira Violão Quebrado. Gravado em apenas sete dias, o álbum traz de volta um dos maiores trombonistas do mundo, em grande fase, misturando sua essência brasileira à tradicional sonoridade contemporânea do Na Tocaia.

O trombonista tem planos de manter uma residência no Brasil para passar pelo menos seis meses por ano aqui.

prio disco como líder para a RCA, escolhendo o Sambalanço Trio (Cesar Camargo Mariano ao piano, Humberto Clayber no contrabaixo e Airto Moreira na bateria) como companheiros na empreitada. “Eles já tocavam juntos em São Paulo desde 1962, tinham gravado três LPs, estavam superentrosados. Então, não tinha como dar errado.” “Ao contrário do que muita gente pensa, Raulzinho só passou a tocar trombone de vara no fi m dos anos 1960”, informa um de seus maiores fãs, o trompetista Cláudio Roditi, que chegou a tocar trombone no início da década de 1980 – tendo Raul como infl uência máxima – ao integrar a banda de Paquito D’Rivera. “Em matéria de trombone de válvula, ninguém no mundo o superou, nem mesmo o Bob Brookmeyer.” Quem duvidar, que ouça as performances antológicas conti

das em À Vontade Mesmo, amostras do “trombonão balançante, inventivo e loquaz, sempre buscando o registro baixo como pontuação”, na análise do crítico Luiz Orlando Carneiro. Após o lançamento de À Vontade Mesmo, Raul viajou novamente à Europa, atuando com o baterista Kenny Clarke em clubes de jazz da noite parisiense, como o Blue Note e o Elephant Blanc. Voltando ao Brasil, empregou-se no RC7, grupo de apoio de Roberto Carlos, antes de ingressar no Impacto 8, gravando o disco International Hot para o selo Equipe, relançado em CD na Europa. “Sentia-me desapontado com o cenário musical brasileiro daquela época, então me mandei para o México em 1969”, desabafa. Estava morando em Acapulco quando, em agosto de 1973, recebeu um telefonema dos velhos amigos Airto & Flora. No auge da popularidade, eles o chamavam para trabalhar nos Estados Unidos. “Três dias depois eu já estava em Los

> Sax & Metais - Existe muita diferença entre o trombone de pisto e o de vara que você toca hoje?

Raul de Souza - O trombone de vara tem de estudar, tocar muito, é bem diferente. A única coisa parecida é a embocadura, a articulação é completamente diferente. Ganhei um trombone de vara King, do Nelsinho, meu amigo trombonista. Era um trombone tenor, ele tinha comprado um Bach no México, e como eu estava sofrendo uma discriminação musical por tocar trombone de pisto, ele me sugeriu a troca, deixando que eu fi casse com aquele, e pagaria quando pudesse. Na época, eu havia prestado exame para sargento da aeronáutica em Curitiba e comecei a pensar em como levaria aquele trombone para lá se eu nem sabia tocar. Um belo dia, apareceu um sujeito lá em casa com um trombone Amatti de pisto, uma marca tcheca, então negociamos a troca. Preferi continuar com um de máquina.

> Quando mudou para o trombone de vara?

Em 1966, pintou um trabalho em Monte Carlo, Côte d’Azur, do príncipe Rainier. Era um contrato de quatro meses. A estréia foi um baile de aniversário da princesa Grace Kelly. Eu estava lá, quando comecei a escutar um som de trombone baixo, vi que era igual ao meu, só que com uma tubulagem um pouco maior. Não acreditei, vi que era aquilo que eu queria. Conversei com o trombonista, que tinha o mesmo nome que eu. Quando peguei o trombone dele, não saiu nada, então pensei: “É esse que eu quero”. Juntei dinheiro naqueles quatro meses. O baterista Wilson das Neves estava comigo nesta viagem, era ele quem guardava o dinheiro para que eu não gastasse com besteiras. No fi m da temporada, comprei meu primeiro trombone baixo de vara, um Bach Stradivarius que custou US$ 850,00.

> Foi fácil superar as dificuldades da mudança?

Antes de comprar o instrumento, comecei a estudar com um amigo que tocava trombone tenor. Um dia ele perguntou como eu respirava, eu disse que não sabia. Ele me convidou para almoçar em sua casa no dia seguinte e lá me explicou algumas coisas. Tinha dois trombones de vara, me emprestou um e comecei a estudar. Estudava as escalas e a respiração diafragmática. Mais ou menos um mês antes

Cogita-se a criação da Fundação Raul de Souza, instituto com o objetivo de ensinar música a crianças e formar profissionais no futuro.

de eu ir embora, abandonei o trombone de pisto e tocava só trombone de vara no concerto. Eu tinha todos os arranjos de cor na cabeça, a grande difi culdade foi passar tudo aquilo. Eram coisas complicadas, rápidas, que eu fazia bem no pisto. Pensei: “Não quero nem saber, o que sair, saiu, se não sair, saem outras notas”. Quando cheguei de viagem depois dos quatro meses, já estava tocando os dois trombones, tanto o de pisto quanto o de vara. Comecei a estudar pra valer, técnica e tudo. Em 1966 mudei defi nitivamente para o trombone de vara.

> Você nunca teve professor, mas tinha uma metodologia própria de estudo?

Não, nunca fui interessado em estudar escalas e essas coisas. Eu pegava uma música, ouvia e nem pegava o instrumento. Chegava na hora, conseguia tocar qualquer coisa em qualquer tonalidade. Só fui aprimorando minha própria técnica. Mas não quero que ninguém se baseie por mim, nasci com esse dom, com essa facilidade de pegar qualquer instrumento e sair tocando. São coisas que não se explicam. *Colaborou Marcelo Soares

Angeles, começando uma turnê em que abríamos os shows do grupo Crusaders. Quando a excursão terminou, decidi dar um tempo em Boston, para estudar no Berklee College of Music”, conta Raul. Regressando a L.A. no ano seguinte, fascinou os críticos com solos excepcionais em várias faixas do álbum Stories To Tell, de Flora, impressionando o produtor Orrin Keepnews, então diretor artístico da Milestone. Como conseqüência imediata, Orrin autorizou Airto a produzir um disco de Raul como líder, o soberbo Colors, gravado em outubro de 1974 com arranjos de um de seus maiores ídolos, J.J. Johnson, e participações de Cannonball Adderley, Richard Davis e Jack DeJohnette. “Quase caí pra trás quando vi essa turma da pesada no estúdio, tocando no meu disco... parecia um sonho!”, comenta. Apesar do fracasso comercial (“foi pessimamente divulgado”), aumentou seu prestígio perante a comunidade jazzística, levando-o a atuar em sessões de Cal Tjader (Amazonas), Azar Lawrence (Summer Solstice) e Sonny Rollins (Nucleus).

“Rollins me chamou para fazer a turnê de divulgação do disco, mas fui atropelado, quebrei as duas pernas, passei por várias operações e fi quei três meses no hospital”, lamenta. Entretanto, outro sonho se materializou quando Airto & Flora organizaram um concerto visando arrecadar fundos para o seu tratamento: Frank Rosolino, um de seus trombonistas favoritos, apareceu, identifi cou-se como fã e tocou em duo com Raulzinho, que ainda estava em cadeira de rodas. Em uma ocasião mais alegre, tocaram juntos novamente em 1978, no I Festival Internacional de Jazz de São Paulo, no Anhembi.

MÚSICO DE VÁRIAS SEARAS

Nesse intervalo, Raul havia assinado contrato com a Capitol, lançando dois funkeados álbuns produzidos por George Duke (os best-sellers Sweet Lucy, em 1977, e Don’t Ask My Neighbors, em 1978, patenteando sua invenção, o souzabone), que o levaram a ser aclamado entre os melhores trombonistas do mundo nas votações dos leitores da revista DownBeat. Depois, mal orientado pelo produtor Arthur Wright, embarcou na canoa furada de Till Tomorrow Comes (1979), uma aventura na área da disco music. Gravou também com Milton Nascimento (Milton), Hermeto Pascoal (Slaves Mass), no LP de estréia do grupo fusion Caldera, e em dois álbuns de George Duke: Reach For It e Brazilian Love Aff air. Ignorado na Enciclopédia da Música Brasileira (Itaú Cultural), virou verbete na Encyclopedia of Jazz in Th e Seventies, de Leonard Feather & Ira Gitler.

Integrando uma banda de all-stars formada por Duke, Stanley Clarke, Airto, Ndugu e Roland Bautista, apresentou-se

no Rio/Monterrey Jazz Festival, em agosto de 1980, no Maracanãzinho. Surpreendeu a todos quando decidiu permanecer no Brasil, abandonando não apenas sua carreira internacional, como também sua esposa Marilyn Castles, que voltou sozinha para os EUA. Casou-se com uma antiga namorada, e uma semana depois estava tocando no pátio da Faculdade Hélio Alonso, em Botafogo, ao lado de Lincoln Olivetti & Robson Jorge. Durante os anos 1980 e 1990, viveu entre Rio e São Paulo, fazendo shows esporádicos, gravando discos (A Arte do Espetáculo, Th e Other Side of Th e Moon) muito aquém de seu talento e participando de sessões com Gilberto Gil, Toninho Horta, Maria Bethânia, Lisa Ono, Salena Jones, Nelson Angelo, Taiguara, João Donato, Eloir de Moraes, e no último disco de Jobim, o grammyado Antonio Brasileiro. Por sorte, antigas gravações até então inéditas com Airto & Flora (Colours of Life, Aqui Se Puede, Samba de Flora) e Georgie Fame (Th e In-Crowd) foram fi nalmente editadas, impedindo que seu nome caísse em esquecimento no exterior. Em 1998, às vésperas de mudar-se para Paris, lançou um ótimo CD em dupla com o trombonista Conrad Herwig, Rio (nos moldes da parceria entre J.J. Johnson & Kai Winding), seguido pelo excelente Elixir em 2005, distribuído no Brasil pela Tratore. Esse disco voltou a colocá-lo entre os dez melhores trombonistas do mundo, na votação dos leitores da DownBeat no ano passado, depois de Raul ter fi cado em 12º lugar em 2004. Ainda assim, os espetaculares álbuns de estréia no Brasil (À Vontade Mesmo) e EUA (Colors) permanecem como as obras-primas de sua discografi a. z

Raul de Souza está gravandoo disco

Brazilian Butterfly, de

Ithamara Koorax, a ser lançado em janeiro de 2007.

*Arnaldo DeSouteiro é produtor musical (fundador & presidente do selo JSR/Jazz Station Records), historiador de jazz e música brasileira, jornalista (membro da Jazz Journalists Association, de NY) e educador (membro da IAJE – International Association for Jazz Education).

CINCO MINUTOS COM: MARCELO MARTINS FOTOS: DIVULGAÇÃO POR DÉBORA DE AQUINO

Conhecido por acompanhar grandes artistas da MPB, como Djavan (com quem toca há mais de 15 anos), o saxofonista planeja seu vôo-solo com CD autoral e novos trabalhos com o grupo Foco

CINCO MINUTOS COM

Marcelo Martins

Este fl uminense de Niterói entrou para o mundo da música infl uenciado pelos irmãos mais velhos e pelo pai, que colocou os fi lhos para estudar. E foi por intermédio dos irmãos que ele ouviu boa música. Foi quando ele conheceu e conviveu com diversos músicos, entre eles Mazinho Ventura (contrabaixista que tocava com Ivan Lins), Márcio Bahia (baterista de Hermeto Pascoal), Carlos Malta e Renato Franco, que foi seu primeiro professor. “Ele tocava com meu irmão em um grupo de choro e, paralelamente, estudei teoria musical com a ex-professora da minha irmã, Maria Isis, pianista clássica que hoje é harpista”, lembra Marcelo. Conhecido como sideman de grandes nomes da MPB, toca com Djavan desde 1989 e já fez trabalhos com Cláudio Zoli, Gilberto Gil, Caetano Veloso e Ed Motta. Integrou a VSOqt (Vittor Santos Orquestra), big band liderada pelo maestro, arranjador e trombonista Vittor Santos. Seus mais recentes trabalhos são a participação na turnê do disco Vaidade, de Djavan, e a gravação do CD duplo e do DVD Ouro Negro e do CD Choros e Alegrias, ambos de Moacir Santos e, mais recentemente, na gravação do CD e DVD Obrigado Gente, de João Bosco, com quem vem fazendo shows de lançamento.”

> Sax &Metais - Como começou a estudar saxofone?

Marcelo Martins - Meu primeiro movimento foi no sentido da percussão, bateria, tocando na banda marcial do colégio. Um dia o maestro não foi, os alunos fi caram com os instrumentos e começamos a trocar, a experimentar. Peguei uma corneta e curti, depois gostei do trompete. Então, meu irmão me convenceu a pensar no saxofone. Eu tinha 8 anos e entrei para um grupo infanto-juvenil da escola tocando fl auta doce e, mais tarde, passei para a orquestra, com o saxofone.

> Você sempre foi mais conhecido por ser um sideman, um músico que acompanha diversos artistas, grandes nomes da MPB.

Em minha formação, além do instrumental, sempre tive a referência da MPB, e a minha meta era poder em algum momento tocar com esses caras, meus ídolos, tanto

CINCO MINUTOS COM: MARCELO MARTINS FOTOS: DIVULGAÇÃO POR DÉBORA DE AQUINO

Conhecido por acompanhar grandes artistas da MPB, como Djavan (com quem toca há mais de 15 anos), o saxofonista planeja seu vôo-solo com CD autoral e novos trabalhos com o grupo Foco

CINCO MINUTOS COM

Marcelo Martins

Este fl uminense de Niterói entrou para o mundo da música infl uenciado pelos irmãos mais velhos e pelo pai, que colocou os fi lhos para estudar. E foi por intermédio dos irmãos que ele ouviu boa música. Foi quando ele conheceu e conviveu com diversos músicos, entre eles Mazinho Ventura (contrabaixista que tocava com Ivan Lins), Márcio Bahia (baterista de Hermeto Pascoal), Carlos Malta e Renato Franco, que foi seu primeiro professor. “Ele tocava com meu irmão em um grupo de choro e, paralelamente, estudei teoria musical com a ex-professora da minha irmã, Maria Isis, pianista clássica que hoje é harpista”, lembra Marcelo. Conhecido como sideman de grandes nomes da MPB, toca com Djavan desde 1989 e já fez trabalhos com Cláudio Zoli, Gilberto Gil, Caetano Veloso e Ed Motta. Integrou a VSOqt (Vittor Santos Orquestra), big band liderada pelo maestro, arranjador e trombonista Vittor Santos. Seus mais recentes trabalhos são a participação na turnê do disco Vaidade, de Djavan, e a gravação do CD duplo e do DVD Ouro Negro e do CD Choros e Alegrias, ambos de Moacir Santos e, mais recentemente, na gravação do CD e DVD Obrigado Gente, de João Bosco, com quem vem fazendo shows de lançamento.”

> Sax &Metais - Como começou a estudar saxofone?

Marcelo Martins - Meu primeiro movimento foi no sentido da percussão, bateria, tocando na banda marcial do colégio. Um dia o maestro não foi, os alunos fi caram com os instrumentos e começamos a trocar, a experimentar. Peguei uma corneta e curti, depois gostei do trompete. Então, meu irmão me convenceu a pensar no saxofone. Eu tinha 8 anos e entrei para um grupo infanto-juvenil da escola tocando fl auta doce e, mais tarde, passei para a orquestra, com o saxofone.

> Você sempre foi mais conhecido por ser um sideman, um músico que acompanha diversos artistas, grandes nomes da MPB.

Em minha formação, além do instrumental, sempre tive a referência da MPB, e a minha meta era poder em algum momento tocar com esses caras, meus ídolos, tanto

quanto no instrumental – Hermeto Pascoal, Nivaldo Ornelas, Marcio Montarroyos, Ricardo Silveira, Arthur Maia, Nico Assumpção... Mas tinha aquela idéia de que o trabalho com um cantor gera mais dinheiro e o trabalho instrumental é mais pelo amor à música. Então, eu e toda uma geração acabamos direcionando mais as coisas para atuar como sideman ao lado desses artistas. O que foi muito bom fi nanceiramente e com certeza também musicalmente, mas de uma certa maneira anulou um pouco o ímpeto de nossos próprios trabalhos.

> Qual é o enfoque desse trabalho com o grupo?

Começamos com um disco independente em 2000, com uma tiragem de mil cópias. Eu e o João Castilho estávamos em um trabalho com o Djavan, viajando juntos e também tocávamos muito em jams em Vila Isabel, em um bar chamado Palpite Infeliz. Havia uma galera tocando, Renato Massa na bateria, André Rodrigues no baixo, Jessé Sadoc no trompete. O som foi fi cando cada vez melhor até que tivemos a idéia de registrar o trabalho, gravar um disco. Durante as viagens com Djavan, eu e Castilho pensávamos no repertório e, nas horas vagas que tínhamos entre as viagens, nos juntávamos com o restante do pessoal e acabou surgindo o disco Foco, que é também o nome da banda. Há um ano voltamos a nos encon

SETUP DE MARCELO MARTINS

Saxofones

• Sax tenor Selmer Mark VI com boquilha Norberto de metal. “Usei por muitos anos uma boquilha Dave Guardala modelo Brecker I. A maior parte das coisas que gravei foi com essa boquilha. Mas de um ano para cá estou usando uma Norberto de metal, que é uma cópia das Dukoff antigas, parece um Otto Link.” • Sax alto Selmer Super Action 80 Série II, com boquilha Meyer 5 • Soprano Yamaha 62, curved neck, com boquilha Selmer E de massa, mexida, mais aberta

Flautas

• Flauta em C Yamaha • Flauta em G Armstrong • Picollo Yamaha 62

trar e fi zemos mais um CD, fi nalizado há uns dois meses. Estamos pensando na capa e negociando com algum selo para que o disco não fi que tão independente.

> Você pensa em um trabalho-solo?

Estou fazendo o meu solo no intermédio do tempo que eu tenho. Na verdade, comecei a fazer em 2004, pouco antes de voltar a tocar com o Djavan. Ele parou com a banda desde o trabalho do Ao Vivo. Em 2004, ele me chamou de volta e gravei uma faixa do CD Vaidade, e então fomos para a estrada novamente. Bem quando eu estava começando a fazer o meu CD, tive de parar. Fizemos um ano e meio de turnê, e nesse último semestre fui tentando retomar. Tenho cinco faixas gravadas, preciso de mais quatro ou cinco para fechar o trabalho. Espero conseguir isso até o fi m do ano.

> Falando nisso, você tem um longo caminho ao lado de Djavan. Como aconteceu o convite para trabalhar com ele?

Foi por meio do Arthur Maia, com quem eu já tocava na época. O Djavan estava montando a banda para o disco Oceano, e comentou com o Arthur que queria gente nova, e ele falou de mim e do Renato Neto, pois tocávamos juntos. Certa vez, o Arthur estava indo para o ensaio do Djavan e me ligou pedindo que eu também fosse. Chegando lá, fi quei tocando com o pessoal da banda, o Carlos Bala, o Calasans, o Luiz Avelar e o Celso Fonseca. Quando o Djavan chegou, o Arthur nos apresentou e então ele se sentou na minha frente, pegou o violão e começou a tocar um groove, do Asa e falou: “Sola aí”. Eu já estava aquecido e saí tocando. Depois, cantou algumas frases e pediu para eu tocar. Tudo em tom meio audition. Ainda me deu uma fi ta com uma introdução de fl auta para eu transcrever e levar para ele, mas de cara ele já curtiu. Isso foi no fi m de 1989 e, na época, ele estava ensaiando para uma miniturnê nos Estados Unidos, à qual não pude ir porque não tinha nem passaporte. Reencontrei o Djavan após essa viagem, em janeiro de 1990, e comecei a trabalhar com ele.

> Quem você gostava de ouvir? Sua for

mação foi mais voltada para o jazz?

Ouvia tudo que podia: Charlie Parker, Cannomball Adderley, Stan Getz, Paul Desmond, Coltrane, Wayne Shorter... Houve uma época em que transmitiam programas de jazz pelo rádio e eu fi cava com as fi tas engatilhadas para gravar e às vezes tirava os solos. Peguei também a geração anos 1980, do jazz fusion e também do modern jazz, Brekcer Brother’s, Steps Ahead (Michael Brecker), Weather Report, Chick Corea (Joe Farrell), Yellow Jackets (Marc Russo), Bob Mintzer. E ao mesmo tempo me interessando também por grupos brasileiros como o Cama de Gato, High Life, Hermeto Pascoal, Egberto Gismonti... Vi muito o Nivaldo Ornelas tocando, o Marcos Resende, o Antonio Adolfo, na época do Vira-Lata. Peguei tudo isso meio de bandeja por causa do meu irmão. Bem mais tarde é que conheci o samba-jazz, um estudo que me infl uenciou e infl uencia até hoje de forma marcante, com o JT Meirelles, Sérgio Mendes e Bossa Rio, Edison Machado, Os Cobras, Eumir Deodato e a música de Moacir Santos, mestre com quem tive a oportunidade de trabalhar, homenagear e conviver nesses últimos anos. Salve Moacir! z

quanto no instrumental – Hermeto Pascoal, Nivaldo Ornelas, Marcio Montarroyos, Ricardo Silveira, Arthur Maia, Nico Assumpção... Mas tinha aquela idéia de que o trabalho com um cantor gera mais dinheiro e o trabalho instrumental é mais pelo amor à música. Então, eu e toda uma geração acabamos direcionando mais as coisas para atuar como sideman ao lado desses artistas. O que foi muito bom fi nanceiramente e com certeza também musicalmente, mas de uma certa maneira anulou um pouco o ímpeto de nossos próprios trabalhos.

> Qual é o enfoque desse trabalho com o grupo?

Começamos com um disco independente em 2000, com uma tiragem de mil cópias. Eu e o João Castilho estávamos em um trabalho com o Djavan, viajando juntos e também tocávamos muito em jams em Vila Isabel, em um bar chamado Palpite Infeliz. Havia uma galera tocando, Renato Massa na bateria, André Rodrigues no baixo, Jessé Sadoc no trompete. O som foi fi cando cada vez melhor até que tivemos a idéia de registrar o trabalho, gravar um disco. Durante as viagens com Djavan, eu e Castilho pensávamos no repertório e, nas horas vagas que tínhamos entre as viagens, nos juntávamos com o restante do pessoal e acabou surgindo o disco Foco, que é também o nome da banda. Há um ano voltamos a nos encon

SETUP DE MARCELO MARTINS

Saxofones

• Sax tenor Selmer Mark VI com boquilha Norberto de metal. “Usei por muitos anos uma boquilha Dave Guardala modelo Brecker I. A maior parte das coisas que gravei foi com essa boquilha. Mas de um ano para cá estou usando uma Norberto de metal, que é uma cópia das Dukoff antigas, parece um Otto Link.” • Sax alto Selmer Super Action 80 Série II, com boquilha Meyer 5 • Soprano Yamaha 62, curved neck, com boquilha Selmer E de massa, mexida, mais aberta

Flautas

• Flauta em C Yamaha • Flauta em G Armstrong • Picollo Yamaha 62

Marcelo Martins em apresentação com o grupo Foco

trar e fi zemos mais um CD, fi nalizado há uns dois meses. Estamos pensando na capa e negociando com algum selo para que o disco não fi que tão independente.

> Você pensa em um trabalho-solo?

Estou fazendo o meu solo no intermédio do tempo que eu tenho. Na verdade, comecei a fazer em 2004, pouco antes de voltar a tocar com o Djavan. Ele parou com a banda desde o trabalho do Ao Vivo. Em 2004, ele me chamou de volta e gravei uma faixa do CD Vaidade, e então fomos para a estrada novamente. Bem quando eu estava começando a fazer o meu CD, tive de parar. Fizemos um ano e meio de turnê, e nesse último semestre fui tentando retomar. Tenho cinco faixas gravadas, preciso de mais quatro ou cinco para fechar o trabalho. Espero conseguir isso até o fi m do ano.

> Falando nisso, você tem um longo caminho ao lado de Djavan. Como aconteceu o convite para trabalhar com ele?

Foi por meio do Arthur Maia, com quem eu já tocava na época. O Djavan estava montando a banda para o disco Oceano, e comentou com o Arthur que queria gente nova, e ele falou de mim e do Renato Neto, pois tocávamos juntos. Certa vez, o Arthur estava indo para o ensaio do Djavan e me ligou pedindo que eu também fosse. Chegando lá, fi quei tocando com o pessoal da banda, o Carlos Bala, o Calasans, o Luiz Avelar e o Celso Fonseca. Quando o Djavan chegou, o Arthur nos apresentou e então ele se sentou na minha frente, pegou o violão e começou a tocar um groove, do Asa e falou: “Sola aí”. Eu já estava aquecido e saí tocando. Depois, cantou algumas frases e pediu para eu tocar. Tudo em tom meio audition. Ainda me deu uma fi ta com uma introdução de fl auta para eu transcrever e levar para ele, mas de cara ele já curtiu. Isso foi no fi m de 1989 e, na época, ele estava ensaiando para uma miniturnê nos Estados Unidos, à qual não pude ir porque não tinha nem passaporte. Reencontrei o Djavan após essa viagem, em janeiro de 1990, e comecei a trabalhar com ele.

> Quem você gostava de ouvir? Sua for

mação foi mais voltada para o jazz?

Ouvia tudo que podia: Charlie Parker, Cannomball Adderley, Stan Getz, Paul Desmond, Coltrane, Wayne Shorter... Houve uma época em que transmitiam programas de jazz pelo rádio e eu fi cava com as fi tas engatilhadas para gravar e às vezes tirava os solos. Peguei também a geração anos 1980, do jazz fusion e também do modern jazz, Brekcer Brother’s, Steps Ahead (Michael Brecker), Weather Report, Chick Corea (Joe Farrell), Yellow Jackets (Marc Russo), Bob Mintzer. E ao mesmo tempo me interessando também por grupos brasileiros como o Cama de Gato, High Life, Hermeto Pascoal, Egberto Gismonti... Vi muito o Nivaldo Ornelas tocando, o Marcos Resende, o Antonio Adolfo, na época do Vira-Lata. Peguei tudo isso meio de bandeja por causa do meu irmão. Bem mais tarde é que conheci o samba-jazz, um estudo que me infl uenciou e infl uencia até hoje de forma marcante, com o JT Meirelles, Sérgio Mendes e Bossa Rio, Edison Machado, Os Cobras, Eumir Deodato e a música de Moacir Santos, mestre com quem tive a oportunidade de trabalhar, homenagear e conviver nesses últimos anos. Salve Moacir! z

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