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Vadim Arsky (SAXOFONE

Vadim Arsky

Por volta de 1925, um jovem saxofonista terminava sua jornada musical noturna num café em Berlim, na Alemanha, quando o outro saxofonista do grupo, um pouco mais velho e também clarinetista de uma orquestra local, o interpelou sobre o instrumento. Sabendo da paixão do primeiro pelo saxofone, e a fi m de perturbá-lo, perguntou com um tom de ironia o porquê de o saxofone ser um instrumento tão limitado na sua extensão, com somente duas oitavas e uma quinta, pois, no clarinete, era possível tocar até quatro oitavas. O jovem rapaz fi cou sem ação e não conse

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Assim, quando produzimos uma nota Dó 3, por exemplo, junto com ela serão geradas as notas Dó 4, Sol 4, Dó 5, Mi 5, Sol 5, Sib 5, Dó 6, Ré 6, Mi 6, Fá 6 e assim sucessivamente. Essas notas não serão percebidas inicialmente, mas se realizarmos um mecanismo de ‘fi ltragem’ dos sons, poderemos ouvir todas separadamente. Com base nessa tese e no princípio de funcionamento dos instrumentos de metal, no qual temos um tubo que pode ser aumentado ou diminuído (válvulas ou vara) e que em uma posição podem ser realizadas diversas notas, valendo-se do princípio dos harmônicos, Sigurd Rascher iniciou suas tentativas de ‘organizar’ os harmônicos produzidos pelo saxofone e, a partir daí, defi - nir posições (dedilhados) para a produção afi nada e com qualidade sonora de notas acima do Fá 5 (nota escrita para o saxofone que, dependendo do instrumento, gerará um som diferente). Essa experiência durou aproximadamente um ano de estudo.

Vadim Arsky é saxofonista, maestro e arranjador. Natural de

São Paulo, estudou na Escola de Música de Brasília, graduou-se em saxofone pela Universidade de Brasília e possui mestrado pela

Universidade de Louisville, no Kentucky, EUA. Desde 1994 é professor do departamento de Música da UnB e atua na área de saxofone e música popular. Contato: varsky@unb.br

guiu responder à pergunta do colega e então questionou sobre o que fazer. O outro então respondeu em tom zombeteiro: — Faça qualquer coisa! Dê um jeito de esse instrumento tocar um pouco mais agudo! Assim, o jovem saxofonista Sigurd Rascher seguiu para sua casa a fi m de fazer ‘alguma coisa’ para que a extensão de seu instrumento aumentasse um pouco. Primeiro analisou o princípio da tese da série harmônica natural, que diz que todas as notas musicais, por serem uma onda mecânica, possuem outras notas resultantes dos nós formados nessas ondas por conseqüência de sua refl exão e realimentação, organizados assim em uma série de intervalos entre elas, conforme a tabela abaixo (sempre em relação à nota anterior):

As observações de Rascher

De suas experiências, ele chegou a diversas conclusões, algumas de extrema importância para aqueles que desejam desenvolver uma boa sonoridade no registro superagudo: te, com todos os harmônicos presentes. Para tanto, temos de realizar exercícios de notas longas prestando muita atenção à sonoridade, equilibrando as musculaturas intercostal, diafragmática e labial de modo que a sonoridade não seja presa, como se estivesse tocando dentro de uma caixa ou muito solta, como se fosse um ‘pato rouco’. É importante que possa ser ouvido, lá no fundo, um zumbido meio metálico que, na verdade, é o som dos harmônicos presente no som real. Para se chegar a esta sonoridade, minha recomendação é que, ao tocar uma nota longa em registro médio, movimente os lábios (e não o maxilar), dando mais e menos pressão para achar o foco do som e ouvir um zumbido metálico. Tente mirar sua coluna de ar em um ponto à sua frente a pelo menos 2 metros de distância e abaixo da altura dos ombros.

2. Os sons superagudos são resultado dos harmônicos gerados pelas notas mais graves do instrumento e, se os mesmos não estiverem alinhados e fi ltrados nas notas que irão lhes dar origem, provavelmente não sairão na digitação sugerida ou serão notas opacas e sem volume sonoro nem projeção. Um bom exercício para ‘fi ltrar’ os harmônicos é tocar as notas mais graves do instrumento como o Sib 2, Si 2, Dó 3 e Dó# 3 e em cada uma delas tentar tocar as notas da série harmônica. Por exemplo, no Sib 2, deverá sair o Sib 3, o Fá 4, o Sib 4, o Ré 5 e assim sucessivamente. Porém, a série completa é muito difícil de ser executada imediatamente. Portanto, o melhor é tocar as quatro notas graves mencionadas anteriormente e nelas tentar estabilizar primeiro o som real e mais tarde até a 3a. Parcial, ou seja, no Sib 2 tocar também estabilizado o Sib 3 e o Fá 4 e assim por diante. Após estabilizar essas parciais, tente introduzir a 4ª. Parcial e vá prosseguindo. Isso se faz utilizando o mesmo princípio dos instrumentos de bocal. Vamos trabalhar mudando o foco e a pressão do ar. Mas como quem ‘fabrica’ o som é a palheta e não os lábios, teremos de utilizar a língua (parte posterior) e a glote para modifi car a direção e a pressão do ar. Minha sugestão é que, na tentativa de fi ltrar os harmônicos, modifi que a posição da glote e da parte posterior da língua como se tentasse falar em falsete (para as mulheres, aquela impostação para as notas agudas), simular uma posição de engolir ou coisas assim. Além dessa parte técnica, existe uma parte mística. Quando houver difi culdade de produzir um harmônico e você tentar de tudo – espremer os lábios, mudar o foco da coluna de ar – e nada adiantar, peça para um colega emitir a nota real do harmônico que você está tentando atingir e ela sairá como se fosse um milagre.

3. Instrumentos de tamanho diferente trabalham diferentemente. Rascher percebeu que as notas superagudas possuem dedilhados diferentes quando tocadas nos saxofones alto e tenor. Nesse caso, realizou um trabalho dobrado para estabelecer posições de digitação para os dois instrumentos que produzissem sons afi nados e com boa projeção. Mais tarde, ainda foi observado que, dependendo da marca e modelo de instrumento, essas posições poderiam variar ainda mais. O quadro que segue abaixo contém posições alternativas para as notas a partir do Fá# 5 e foram publicadas por Rosemary Lang em seu método. Por ser uma publicação mais moderna, possui maior diversidade do que a inicial desenvolvida por Sigurd Rascher. Minha sugestão para estudo do registro superagudo é tocar melodias simples, folclóricas, de roda e exercícios simples de digitação e interpretação uma oitava acima do escrito na partitura. Isso dará mais consistência ao registro superagudo e fará com que esse registro faça parte da extensão normal do saxofone, como deveria ser desde muito tempo atrás.

TABELA DE DIGITAÇÃO SUPERAGUDOS

Dedilhado de baixo para cima

Ré, Mi, Fá, Sol, Lá, Si e Chave alternativa para Fá e Mi agudos chave aberta chave fechada OK - chave de oitava Low C - chave de dó grave Low Bb - chave de Bb grave Eb - chave de Eb grave Side Bb - chave de Sib lateral Side C - chave lateral de Dó Top Side Key - chave de Mi agudo High D - chave de ré agudo High Eb - chave de Ré# agudo High F - chave de Fá agudo

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