Escola Artística António Arroio 2012/2013 LÍNGUA PORTUGUESA
“O sonho comanda a vida” (António Gedeão)
Professora Eli Joana Varella Cid 10ºE nº 15
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Índice Introdução António Gedeão
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Sophia de Mello Breyner Andersen
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Gastão Cruz
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Nuno Júdice
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Ala dos namorados
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José Luís Peixoto
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José Tolentino Mendonça
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Carlos Tê e Rui Veloso
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Alexandre O’Neill
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David Morão Ferreira
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Ilustração do poema
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Explicação da ilustração
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Web e Bibliografia Conclusão Anexos Citações
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No âmbito da disciplina de língua portuguesa, foi-nos proposta a realização de um trabalho, cujo propósito era encontrar dez poemas de dez poetas portugueses e contemporâneos, que gostássemos. Quando a professora nos deu as informações para começarmos o trabalho, pensei que seria uma coisa simples e rápida de fazer. Mas enganei-me redondamente. Estive na biblioteca da escola, consultei a internet e diversos livros que tinha em casa, sobretudo livros escolares. Voltei a ler poemas que me lembrava de ter estudado, e foi aí que me apercebi do tempo e dedicação que iria ter de ter. Entre os inúmeros poetas de quem li poemas e me interessei, Sophia de Mello Breyner, José Tolentino Mendonça, Alexandre O´neill, David Mourão Ferreira, Luís Veiga Leitão, Gastão Cruz, Nuno Júdice, Ala dos Namorados, Carlos Tê e José Luís Peixoto, foram os que mais me chamaram a atenção. Retirei vários poemas de alguns dos poetas, e a decisão de escolha entre eles foi muito difícil. Gosto muito de ver frases célebres e citações de cientistas, filósofos, artistas, sábios... E há uma que gosto particularmente: “Penso logo existo”, de René Descartes. É uma frase simples, mas que na sua essência, diz tudo, ou quase tudo. Penso que os artistas fazem isto mesmo. Procuram uma forma de se expressarem, tentando não serem comuns. E eu sou e quero ser uma artista!
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ANTÓNIO GEDEÃO Pedra Filosofal Eles não sabem que o sonho é uma constante da vida tão concreta e definida como outra coisa qualquer, como esta pedra cinzenta em que me sento e descanso, como este ribeiro manso em serenos sobressaltos, como estes pinheiros altos que em verde e oiro se agitam, como estas aves que gritam em bebedeiras de azul. eles não sabem que o sonho é vinho, é espuma, é fermento, bichinho álacre e sedento, de focinho pontiagudo, que fossa através de tudo num perpétuo movimento. Eles não sabem que o sonho é tela, é cor, é pincel, base, fuste, capitel, arco em ogiva, vitral, pináculo de catedral, contraponto, sinfonia, máscara grega, magia, que é retorta de alquimista, mapa do mundo distante, 4
rosa-dos-ventos, Infante, caravela quinhentista, que é cabo da Boa Esperança, ouro, canela, marfim, florete de espadachim, bastidor, passo de dança, Colombina e Arlequim, passarola voadora, pára-raios, locomotiva, barco de proa festiva, alto-forno, geradora, cisão do átomo, radar, ultra-som, televisão, desembarque em foguetão na superfície lunar. Eles não sabem, nem sonham, que o sonho comanda a vida, que sempre que um homem sonha o mundo pula e avança como bola colorida entre as mãos de uma criança.
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SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN “Porque” Porque os outros se mascaram mas tu não Porque os outros usam a virtude Para comprar o que não tem perdão Porque os outros têm medo mas tu não Porque os outros são os túmulos caiados Onde germina calada a podridão. Porque os outros se calam mas tu não. Porque os outros se compram e se vendem E os seus gestos dão sempre dividendo. Porque os outros são hábeis mas tu não. Porque os outros vão à sombra dos abrigos E tu vais de mãos dadas com os perigos. Porque os outros calculam mas tu não.
GASTÃO CRUZ “Palavras” Palavras não existem fora da nossa voz as palavras não assistem palavras somos nós. “Os poemas” 6
NUNO JÚDICE
“Carta (esboço)” Lembro-me agora que tenho de marcar um encontro contigo, num sítio em que ambos nos possamos falar, de facto, sem que nenhuma das ocorrências da vida venha interferir no que temos para nos dizer. Muitas vezes me lembrei de que esse sítio podia ser, até, um lugar sem nada de especial, como um canto de café, em frente de um espelho que poderia servir de pretexto para refletir a alma, a impressão da tarde, o último estertor do dia antes de nos despedirmos, quando é preciso encontrar uma fórmula que disfarce o que, afinal, não conseguimos dizer. É que o amor nem sempre é uma palavra de uso, aquela que permite a passagem à comunicação ; mais exata de dois seres, a não ser que nos fale, de súbito, o sentido da despedida, e que cada um de nós leve, consigo, o outro, deixando atrás de si o próprio ser, como se uma troca de almas fosse possível neste mundo. Então, é natural que voltes atrás e me peças: «Vem comigo!», e devo dizer-te que muitas vezes pensei em fazer isso mesmo, mas era tarde, isto é, a porta tinha-se fechado até outro dia, que é aquele que acaba por nunca chegar, e então as palavras caem no vazio, como se nunca tivessem sido pensadas. No entanto, ao escrever-te para marcar um encontro contigo, sei que é irremediável o que temos para dizer um ao outro: a confissão mais exata, que 7
é também a mais absurda, de um sentimento; e, por Trás disso, a certeza de que o mundo há-de ser outro no dia seguinte, como se o amor, de facto, pudesse mudar as cores do céu, do mar, da terra, e do próprio dia em que nos vamos Encontrar, que há-de ser um dia azul, de verão, em que o vento poderá soprar do norte, como se fosse daí que viessem, nesta altura, as coisas mais precisas, que são as nossas: o verde das folhas e o amarelo das pétalas, o vermelho do sol e o branco dos muros. Poesia Reunida
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ALA DOS NAMORADOS “Loucos de Lisboa” Parava no café quando eu lá estava Na voz tinha o talento dos pedintes Entre um cigarro e outro lá cravava a bica, ao melhor dos seus ouvintes. As mãos e o olhar da mesma cor Cinzenta como a roupa que trazia um gesto que podia ser amor Sorria, e ao partir agradecia São os loucos de Lisboa Que nos fazem duvidar Se a Terra gira ao contrário E os rios nascem no mar Um dia numa sala do quarteto passou um filme lá do hospital Onde o esquecido filmado no gueto Entrava como artista principal Compramos a entrada p'ra sessão Pra ver tal personagem no écran O rosto maltratado era a razão De ele não aparecer pela manhã. Mudamos muita vez de calendário Como o café mudou de freguesia Deixamos de tributo a quem lá pára o louco A fazer-lhe companhia 9
E sempre a mesma pose, o mesmo olhar De quem não mede os dias que vagueiam Sentado lá continua a cravar beijinhos Às meninas que passeiam
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JOSÉ LUÍS PEIXOTO
“A mulher mais bonita do mundo” Estás tão bonita hoje. quando digo que nasceram flores novas na terra do jardim, quero dizer que estás bonita. entro na casa, entro no quarto, abro o armário, abro uma gaveta, abro uma caixa onde está o teu fio de ouro. entre os dedos, seguro o teu fino fio de ouro, como se tocasse a pele do teu pescoço. há o céu, a casa, o quarto, e tu estás dentro de mim. estás tão bonita hoje. os teus cabelos, a testa, os olhos, o nariz, os lábios. estás dentro de algo que está dentro de todas as coisas, a minha voz nomeia-te para descrever a beleza. os teus cabelos, a testa, os olhos, o nariz, os lábios. de encontro ao silêncio, dentro do mundo, estás tão bonita é aquilo que quero dizer. "A Casa, a Escuridão"
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JOSÉ TOLENTINO MENDONÇA
“Isto é o meu corpo” O corpo tem degraus, todos eles inclinados milhares de lembranças do que lhe aconteceu tem filiação, geometria um desabamento que começa do avesso e formas que ninguém ouve O corpo nunca é o mesmo ainda quando se repete: de onde vem este braço que toca no outro, de onde vêm estas pernas entrelaçadas como alcanço este pé que coloco adiante? Não aprendo com o corpo a levantar-me, aprendo a cair e a perguntar.
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CARLOS TÊ E RUI VELOSO
“Saiu para a Rua” Saiu decidida para a rua Com a carteira castanha E o saia-casaco escuro Tantos anos tantas noites Sem sequer uma loucura Ele saiu sem dizer nada Talvez fosse ao teatro chino Vai regressar de madrugada E acordá-la cheio de vinho Tantos anos tantas noites Sem nunca sentir a paixão Foram já as bodas de prata Comemoradas em solidão Pôs um pouco de batom E um leve toque de pintura Tirou do cabelo o travessão E devolveu ao rosto a candura Saiu para a rua insegura Vagueou sem direção Sorriu a um homem com tremura E sentiu escorrer do coração A humidade quente da loucura
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ALEXANDRE O´NEILL
“Fala!” Fala a sério e fala no gozo Fá-la pela calada e fala claro Fala deveras saboroso Fala barato e fala caro Fala ao ouvido fala ao coração Falinhas mansas ou palavrão Fala à miúda mas fá-la bem Fala ao teu pai mas ouve a tua mãe Fala francês fala béu-béu Fala fininho fala grosso Desentulha a garganta levanta o pescoço Fala como se falar fosse andar Fala com elegância – muito e devagar.
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Poema eleito para ilustrar:
DAVID MOURÃO FERREIRA
“Escada sem corrimão” É uma escada em caracol E que não tem corrimão. Vai a caminho do Sol Mas nunca passa do chão. Os degraus, quanto mais altos, Mais estragados estão, Nem sustos nem sobressaltos servem sequer de lição. Quem tem medo não a sobe Quem tem sonhos também não. Há quem chegue a deitar fora O lastro do coração. sobe-se numa corrida. Corre-se perigos em vão. Adivinhaste: é a vida A escada sem corrimão.
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Quando li este poema pela primeira vez, no ano passado, ficou gravado na minha mente como uma espécie de memória permanente, em que sabia que era um poema especial. Para mim, é o meu poema preferido. Nunca gostei muito de poesia, pois nunca me chamou especialmente à atenção, mas este poema marcou-me. Sendo assim, ao ler este maravilhoso poema, imaginei automaticamente o desenho que fiz, e que está na página anterior. O que eu desejei transmitir com esta representação, foi o facto da vida ser, na minha opinião, uma escada difícil de subir. Cheia de dificuldades, peripécias e histórias para contar. Comecei por ilustrar o principio da vida, ou seja, o principio da escada, sendo o nosso nascimento. À medida que a vida vai avançando em anos, a escada vai aumentando de tamanho, e os degraus vão sendo cada vez maiores. No princípio da nossa vida, gatinhamos, precisamos da ajuda das nossas mãos para nos movimentarmos. Quando começamos a andar, temos uma nova visão do mundo. Um mundo maior, um mundo em que já somos mais alguma coisa sem ser quase nada... Na adolescência, parece não haver barreiras nem obstáculos. Tudo é possível. Durante a idade adulta vamos tropeçando nos problemas que começam a ser cada vez mais frequentes e normalmente demasiado avolumados, a meu ver. Na meia idade e depois na velhice, com os degraus já mais desgastados, começamos a relativizar os problemas, a desvalorizar as pedras nas quais vamos tropeçando, passando a olhar e a sentir o que de facto é importante e essencial na vida. Penso que esta abordagem que David Mourão Ferreira fez de uma vida passada a subir uma escada em caracol, me fez pensar sobre o que é realmente a vida. E o facto de ser uma escada sem corrimão, é ainda mais misterioso e filosófico. Mas, na minha opinião, é verdadeiro, pois a vida é um caminho difícil de percorrer, e por vezes sem apoios, ultrapassar os obstáculos torna-se arriscado, perigoso. Com a minha personalidade, aventureira, acho a vida um desafio estimulante. A vida é emocionante, e temos de ter a coragem de nos levantarmos mesmo quando a queda foi forte, e não nos podemos entregar ás tristezas, ás dificuldades e aos problemas. Temos de ter sempre presente a esperança e ousadia. E como dizia o poeta António Gedeão, “O sonho comanda a vida”. 17
WEB E BIBLIOGRAFIA
www.google.com http://users.isr.ist.utl.pt/~cfb/VdS/mello.breyner.html -poemas de Sofia de Mello Breyner Andersen, dia 5-01-2013
www.citador.pt http://www.citador.pt/poemas/carta-esboco-nuno-judice -poema de Nuno Júdice, dia 5-01-2013
http://bibliotecariodebabel.com/ http://bibliotecariodebabel.com/geral/quatro-poemas-de-jose-tolentinomendonca/ -poema de José Tolentino Mendonça, dia 5-01-2013
http://100mim.wordpress.com/ http://100mim.wordpress.com/2011/02/16/david-mourao-ferreira-a-vida-e-umaescada-certo-mas-com-corrimao-e-preciso-e-verificar/ -poema de David Mourão Ferreira, dia 4-01-2013
http://leiovejoeescuto.blogspot.pt http://leiovejoeescuto.blogspot.pt/2012/05/luis-veiga-leitao-domingo.html -poema de Luís Veiga Leitão, dia 6-01-2013
www.citador.pt http://www.citador.pt/poemas/a-mulher-mais-bonita-do-mundo-jose-luis-peixoto 18
-poema de José Luís Peixoto, dia 13-01-2013 http://provocativo.blogspot.pt/ http://provocativo.blogspot.pt/2004/12/sau-para-rua-carlos-t-rui-veloso-saiu.html -poema de Carlos Tê, dia 17-01-2013
Livro de Língua Portuguesa de 8º anoPoemas de Alexandre O´neill, dia 20-12-2012 P8 Português 8º ano – Ana Santiago e Sofia Paixão
Livro “Carraceiro” -poema da ala dos namorados, dia 12-01-2013
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CONCLUSÃO Foi um grande desafio para mim fazer este trabalho de poesia, gostei muito, porque não só aprendi mais sobre poesia contemporânea, como também descobri a sua beleza. Num texto poético por vezes sente-se melhor o poder das palavras e das ideias. As metáforas e tudo o que é subjetivo eleva-nos e transporta-nos para outros lugares... Esta pesquisa aprofundada fez-me pensar e meditar sobre a vida, sobre o ser humano, o amor, a esperança, a solidão, o abandono, a entrega, o entusiasmo, a coragem, as tristezas, a felicidade, a espiritualidade, o sonho e toda uma infinidade de "sentires" vivenciados pelas pessoas. Julgo que é o que os poemas fazem... Deixam qualquer pessoa sensível a pensar. Um pensar que é descritível. Um pensar sonhador, positivo, por vezes dramático e emotivo... Um pensar que nos leva ao céu. Um pensar estranhamente maravilhoso. E o poema de David Morão Ferreira, tocou-me especialmente por focar um aspeto da vida do Homem, que para mim é essencial: sonhar. A vida sem sonhar é mais triste, mais árida. O sonho tudo permite... Espero que tenham sido interessantes os poemas que escolhi porque dentro dos que gostei, foram os eleitos pelo meu sentido de aprovação...
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ANEXOS
“Retrato de uma princesa desconhecida” Para que ela tivesse um pescoço tão fino Para que os seus pulsos tivessem um quebrar de caule Para que os seus olhos fossem tão frontais e limpos Para que a sua espinha fosse tão direita E ela usasse a cabeça tão erguida Com uma tão simples claridade sobre a testa Foram necessárias sucessivas gerações de escravos De corpo dobrado e grossas mãos pacientes Servindo sucessivas gerações de príncipes Ainda um pouco toscos e grosseiros Ávidos cruéis e fraudulentos Foi um imenso desperdiçar de gente Para que ela fosse aquela perfeição Solitária exilada sem destino. Sophia de Mello Breyner Andersen
“Se tanto me dói que as coisas passem” Se tanto me dói que as coisas passem É porque cada instante em mim foi vivo Na busca de um bem definitivo Em que as coisas de Amor se eternizassem. Sophia de Mello Breyner Andersen
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“Poesia e Propaganda” Hei de arrastar com muito orgulho, Pelo pequeno avião da propaganda E no céu inocente de Lisboa, Um dos meus versos, um dos meus Mais sonorosos e compridos versos: E será um verso de amor... Alexandre O´neill
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“Amor” O amor é um sentimento que não conseguimos conter, Mas temos de ver bem com quem nos estamos a meter. Ficamos muito contentes e não conseguimos dormir, estamos sempre ansiosos por ver o que vem a seguir. Queremos sempre ir mais além E não pensamos em mais ninguém É um estado de agitação que nos alegra o coração. O amor faz-me pensar que a vida devemos agarrar. Bons momentos iremos passar, junto daquele que julgamos amar. Joana Varella Cid, 2009
http://www.youtube.com/watch?v=J3ireFJ_SII Pedra Filosofal- Poema de António Gedeão cantado
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CITAÇÕES “À pergunta habitual: ”Por que é que escreve?”. A resposta do poeta será sempre a mais curta: “Para viver melhor.”.” Saint-Jonh Perse
“Uma palavra e tudo salvo / Uma palavra e tudo está perdido.” André Breton
“Todas as coisas têm o seu mistério, e a poesia é o mistério de todas as coisas.” Federico Lorca
“A beleza existe em tudo – tanto no bem como no mal. Mas somente os artistas e os poetas sabem encontrá-la.” Charles Chaplin
“Poema: deve ser excelente ou não existir.” Johann Goethe
“Poema: essa hesitação prolongada entre o som e o sentido.” Paul Valéry
“Um bom poema é aquele que nos dá a impressão de que (este) está lendo a gente... E não a gente a ele!” Mário Quintana
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“A arte apenas faz versos, só o coração é poeta.” André Chenier
“A ciência desenha a onda; a poesia enche-a de água.” Teixeira Pascoaes
“A palavra de um poeta é a essência do seu ser.” Alexander Puschkine
“A arte da poesia requer uma aguda consciência do idioma, e isso é ocupação que baste a uma vida inteira.” Eugénio Andrade
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