Mar ‌em poemas
Escola Secundária Artística António Arroio Ano lectivo 2010/2011 Curso de Comunicação Audiovisual
Português
Mar …em poemas
Professora Elisabete Miguel Sara Martins 11º N nº20
Introdução
No âmbito da disciplina de Português, cabia-nos a tarefa de recolher 5 a 10 poemas sobre um tema, e, pelo menos um, teria de ser de Cesário Verde. Iniciei o presente trabalho, tendo em mente – O Mar. Para a consecução dos meus objectivos, comecei pela leitura de Cesário Verde. Encontrei ―Heroísmos‖ e senti que era exactamente o que procurava, prossegui com a pesquisa de outros poemas, de outros poetas. Gostei de vários, tive de optar; não me preocupando tanto em mostrar uma diversidade de poetas, mas sim em salientar os diferentes aspectos abordados, as diferentes visões. Assim, acabei por seleccionar Álvaro de Campos, Fernando Pessoa, Antero de Quental, Juan Ramón Jiménez e Fiama Hasse Pais Brandão. Decidi ilustrar, com fotografias minhas, todos os poemas e não apenas um, como nos foi solicitado.
Ah, Um Soneto Meu coração é um almirante louco Que abandonou a profissão do mar E que a vai relembrando pouco a pouco Em casa a passear, a passear...
No movimento (eu mesmo me desloco Nesta cadeira, só de o imaginar) O mar abandonado fica em foco Nos músculos cansados de parar.
Há saudades nas pernas e nos braços. Há saudades no cérebro por fora. Há grandes raivas feitas de cansaços. Mas — esta é boa! — era do coração Que eu falava... e onde diabo estou eu agora Com almirante em vez de sensação?... Álvaro de Campos
Heroísmos Eu temo muito o mar, o mar enorme, Solene, enraivecido, turbulento, Erguido em vagalhões, rugindo ao vento; O mar sublime, o mar que nunca dorme.
Eu temo o largo mar, rebelde, informe, De vítimas famélico, sedento, E creio ouvir em cada seu lamento Os ruídos dum túmulo disforme.
Contudo, num barquinho transparente, No seu dorso feroz vou blasonar, Tufada a vela e n'água quase assente,
E ouvindo muito ao perto o seu bramar, Eu rindo, sem cuidados, simplesmente, Escarro, com desdém, no grande mar! Cesário Verde
Heroísmos Estrutura Externa Análise Estrófica: O poema apresenta o soneto constituído por 4 estrofes, 2 delas com 4 versos (quartetos) e outras 2 com 3 versos (tercetos). Análise Rimática: No poema, a rima é emparelhada e interpolada, segundo o esquema abba
Heroísmos Eu temo muito o mar, o mar enorme, (a) Solene, enraivecido, turbulento, (b) Erguido em vagalhões, rugindo ao vento; (b) O mar sublime, o mar que nunca dorme. (a)
Eu temo o largo mar, rebelde, informe, (a) De vítimas famélico, sedento, (b)
Estrutura Interna Tema: Heroísmo (enfrentar medos/receios) Como sinto o poema: o ‗eu‘ poético, enfatizando, nas quadras, o temor , inicia o 1.º terceto com a adversativa ―contudo‖, para demonstrar que os medos que tem (do ―mar enorme/ Solene, enraivecido, turbulento…) são como todos os outros porque, com tenacidade e perseverança, mesmo um homem, num ínfimo ‗barquinho transparente‘, pode agigantar-se e, ultrapassando-se, ―escarr[ar] com desdém, no grande mar!‖
E creio ouvir em cada seu lamento (b) Os ruídos dum túmulo disforme. (a)
Contudo, num barquinho transparente, (c) No seu dorso feroz vou blasonar, (d) Tufada a vela e n'água quase assente, (c)
E ouvindo muito ao perto o seu bramar, (d) Eu rindo, sem cuidados, simplesmente, (c) Escarro, com desdém, no grande mar! (d) Cesário Verde
Sentimentos, emoções e pensamentos do sujeito poético: O sujeito poético apresenta-nos sentimentos como o medo e o receio, porém, ao mesmo tempo, dá-nos a conhecer a audácia, a força que transforma todas as inquietações em esperanças e actos heróicos. Recursos estilísticos: Anáfora ―Eu temo…‖// ‖Eu temo…‖// ―Eu rindo‖. Com a repetição do pronome pessoal, no inicio das duas primeiras estrofes, o sujeito poético salienta o medo , no entanto, no 2.º verso da última estrofe, ―Eu rindo‖ – e o eu-sujeito subentendido de ―escarro‖(último verso) – , o ‗eu‘ destaca a ultrapassagem do receio, salientando, assim, ainda mais o acto heróico. Enumeração ―Solene, enraivecido, turbulento,/ Erguido em vagalhões, rugindo ao vento‖, ―…largo mar, rebelde, informe,/ De vítimas famélico, sedento,‖ que é utilizada para dar ênfase às características que tornam aquele mar num medo/receio do sujeito poético. Personificação ―…o mar que nunca dorme.‖, utilizada para dar a dimensão da grandiosidade do mar que nunca carece de descanso.
Diminutivo ―barquinho‖ utilizado para expressar a ideia de que muitas vezes a esperança por mais pequena que seja pode tornar esse sonho ―pequenino‖ num acto heróico. Onomatopeia ―rugindo ao vento‖, através do som atribuído ao mar salienta a sua emoção.
Ilustração do poema Heroísmos Escolhi esta imagem porque monstra alguém que saiu do mar (do seu medo) e que encontrou nos braços da esperança (vestida de branco) o seu porto de abrigo. Fez da sua aventura nas águas do mar um acto heróico, porque, apesar de por agora estar terminado (embrulhada numa toalha), permanecerá para sempre na sua memória como um objectivo ultrapassado.
Horizonte
O sonho é ver as formas invisíveis Da distância imprecisa, e, com sensíveis Movimentos da esp‘rança e da vontade, Buscar na linha fria do horizonte A árvore, a praia, a flor, a ave, a fonte
O mar anterior a nós, teus medos Tinham coral e praias e arvoredos.
Os beijos merecidos da Verdade.
Desvendadas a noite e a cerração, As tormentas passadas e o mistério, Abria em flor o Longe, e o Sul sidério ‗Splendia sobre as naus da iniciação. Linha severa da longínqua costa Quando a nau se aproxima ergue-se a encosta Em árvores onde o Longe nada tinha; Mais perto, abre-se a terra em sons e cores: E, no desembarcar, há aves, flores, Onde era só, de longe a abstracta linha.
Fernando Pessoa
Mar Português Ó mar salgado, quanto do teu sal São lágrimas de Portugal! Por te cruzarmos, quantas mães choraram, Quantos filhos em vão rezaram! Quantas noivas ficaram por casar Para que fosses nosso, ó mar!
Valeu a pena? Tudo vale a pena Se a alma não é pequena. Quem quer passar além do Bojador Tem que passar além da dor. Deus ao mar o perigo e o abismo deu, Mas nele é que espelhou o céu.
Fernando Pessoa
Oceano Nox Junto do mar, que erguia gravemente A trágica voz rouca, enquanto o vento Passava como o vôo do pensamento Que busca e hesita, inquieto e intermitente,
Junto do mar sentei-me tristemente, Olhando o céu pesado e nevoento, E interroguei, cismando, esse lamento Que saía das coisas, vagamente...
Que inquieto desejo vos tortura, Seres elementares, força obscura? Em volta de que ideia gravitais?
Mas na imensa extensão, onde se esconde O Inconsciente imortal, só me responde Um bramido, um queixume, e nada mais...
Antero de Quental
Olhando o mar, sonho sem ter de quê Olhando o mar, sonho sem ter de quê. Nada no mar, salvo o ser mar, se vê. Mas de se nada ver quanto a alma sonha! De que me servem a verdade e a fé?
Ver claro! Quantos, que fatais erramos, Em ruas ou em estradas ou sob ramos, Temos esta certeza e sempre e em tudo Sonhamos e sonhamos e sonhamos.
As árvores longínquas da floresta Parecem, por longínquas, estar em festa. Quanto acontece porque se não vê! Mas do que há ou não há o mesmo resta.
Se tive amores? Já não sei se os tive. Quem ontem fui já hoje em mim não vive. Bebe, que tudo é líquido e embriaga, E a vida morre enquanto o ser revive.
Colhes rosas? Que colhes, se hão-de ser Motivos coloridos de morrer? Mas colhe rosas. Porque não colhê-las Se te agrada e tudo é deixar de o haver?
Fernando Pessoa
Solidão Estás todo em ti, mar, e, todavia, como sem ti estás, que solitário, que distante, sempre, de ti mesmo!
Aberto em mil feridas, cada instante, qual minha fronte, tuas ondas, como os meus pensamentos, vão e vêm, vão e vêm, beijando-se, afastando-se, num eterno conhecer-se, mar, e desconhecer-se.
És tu e não o sabes, pulsa-te o coração e não o sente... Que plenitude de solidão, mar solitário!
Juan Ramón Jiménez, Tradução de José Bento
Viver na Beira-Mar Nunca o mar foi tão ávido quanto a minha boca. Era eu quem o bebia. Quando o mar no horizonte desaparecia e a areia férvida não tinha fim sob as passadas, e o caos se harmonizava enfim com a ordem, eu havia convulsamente e tão serena bebido o mar. Fiama Hasse Pais Brandão
Conclusão Como já enunciei, ao elaborar este trabalho não me preocupei muito em seleccionar uma diversidade de poetas, mas sim em salientar diferentes visões, abordagens outras sobre este mesmo tema - o Mar. No poema ―Ah, Um Soneto‖, o mar, metafórico pretexto, para a confissão-desabafo vindo do coração de um almirante, da qual ele tem saudades; em ―Heroísmos‖ deparamo-nos com a questão dos medos/receios; ―Horizonte‖ remete-nos ao passado que nos faz encarar o futuro com sonhos e esperança; ―Mar Português‖ conta-nos parte da nossa história tão célebre que nos deixa sempre lemas como ―Tudo vale a pena/ Se a alma não é pequena‖; em ―Oceano nox‖ relembramos muitas das nossas hesitações/inquietações, que não passam muitas vezes de ―um queixume‖ o que nos alerta para o que é realmente importante; em ―Olhando o mar, sonho sem ter de quê‖ é destacado o sonho que, muitas vezes, como o mar, nem sempre se vê mas sabemos existir (mais que não seja, em nós); o poema ―Solidão‖ aborda o eterno conhecimento de nós mesmos, que vai e volta como as ondas no mar, na imensa solidão do próprio conhecimento; por fim, em ―Viver na Beira-Mar‖, podemos reviver todos os outros poemas , ―bebendo‖ este mar que é a vida. Com as pesquisas, na internet, deparei-me com o contratempo, inesperado, de nem sempre perceber quais eram, de facto, as abreviaturas do poeta, uma vez que em diversos sites as usam, talvez para transcreverem mais rapidamente, o que fez com que tivesse de verificar um mesmo poema em diversos sites. Outra dificuldade acrescida foi ter de cotejar várias versões dos textos e tentar perceber quais os sites fiáveis, uma vez que nem sempre encontrei, nos sites dedicados a poesia, rigor na transcrição dos textos nem na rigorosa indicação das fontes usadas. Sinto-me, contudo, satisfeita, uma vez que conheci novos poetas e cumpri o meu objectivo inicial.
Bibliografia Ah, Um Soneto, de Álvaro de Campos: http://www.fpessoa.com.ar/poesias.asp?Poesia=268&Voltar=heteronimos.asp%3FHeteronimo=alvaro_de_campos 14-05-2011 21h40 Heroísmos, de Cesário Verde: http://pt.wikisource.org/wiki/Hero%C3%ADsmos 14-05-2011 17h40 Horizonte, de Fernando Pessoa: http://www.pessoa.art.br/?p=339 14-05-2011 18h08 Mar Português, de Fernando Pessoa: http://users.isr.ist.utl.pt/~cfb/VdS/v302.txt 14-05-2011 17h58 Oceano Nox, de Antero de Quental: http://www.citador.pt/poemas.php?op=10&refid=200809080527 14-05-2011 21h22 Olhando o mar, sonho sem ter de quê, de Fernando Pessoa: http://arquivopessoa.net/textos/222 14-05-2011 17h55 Solidão, de Juan Ramón Jiménez: http://www.citador.pt/poemas.php?op=10&refid=200810270302 14-05-2011 21h05 Viver na Beira-Mar, de Fiama Brandão: http://www.citador.pt/poemas.php?op=10&refid=200810150010 14-05-2011 21h00