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A esquerda revolucionária

ofensiva vietnamita do Tet, a luta dos Panteras Negras nos EUA, o maio francês, guerrilhas na América Latina, Ásia e África, e centenas de mobilizações estudantis e operárias pelo mundo.1

Com certeza esse “espírito” rondava as mentes de esquerda. Mas de que forma?

A esquerda revolucionária

O desejo de resistência à ditadura mobilizou militantes, e a situação de ação clandestina ajudou a criar condições para o desenvolvimento de grupos de ação armada: a incapacidade de análise do contexto; a impossibilidade de extravasamento político; o desafio de trabalho de base junto aos estudantes e à classe trabalhadora; a crença de que os grupos seriam espaço de liberdade, são alguns desses elementos. Os estudantes e trabalhadores que mesmo no contexto de ditadura aceitavam ouvir e participar de reuniões eram, de imediato, potenciais “guerrilheiros” naquele contexto. O aventureirismo, romantismo e o que mais se pense como características da juventude estavam sim presentes. Ou se poderia pensar a construção de uma revolução sem os desejos e sonhos humanos? Dois campos de debate se colocavam, não de forma estanque: o Socialismo; e a Guerra Revolucionária, que se mescla com a guerra de guerrilhas. Era preciso atualizar a “revolução brasileira” nesse momento de ditadura. Esse debate permeia a história da VPR. Revolução brasileira e guerra revolucionária são categorias que remetem a campos distintos. Problema de estratégia e tática. A tese da guerrilha suplanta o debate estratégico da revolução? Interpretações sobre as experiências concretas se colocavam. O debate sobre a revolução não nasceu com a luta contra a ditadura. Distintos teóricos, de distintas origens políticas se debruçavam sobre o tema ao longo do século XX. No âmbito comunista talvez o maior entrave ao debate tenha sido a teoria do etapismo, que fazia com que muitas análises reproduzissem o equívoco de ver o Brasil agrário como um país prenhe de resquícios feudais. Desta forma, o debate sobre a

1 CHAGAS, Fábio Gonçalves. A Vanguarda Popular Revolucionária: dilemas e perspectivas da luta armada no Brasil. Franca, 2000. Dissertação de mestrado - Universidade Estadual Paulista.

construção do socialismo esbarrava de distintas formas no desenvolvimento das forças produtivas e em aliança com as burguesias nacionais, como mostra o estudo de Pericás na introdução da obra que trilha os caminhos da revolução brasileira. É um longo percurso até a inclusão da pauta da “guerra de guerrilha no campo”, a partir das “provas concretas” deste modelo que viriam do exemplo cubano2 . O historiador Mario Maestri também se dedicou ao tema da revolução e nos propõe uma leitura absolutamente crítica ao modelo concreto advindo daquela realidade de Cuba que, segundo ele, foi distorcida na própria memória oficial do país antes mesmo de jogar à América Latina a responsabilidade de ampliar a revolução no continente. A ideia construída de que o assalto ao poder fora um raio em céu azul, e que um pequeno grupo foi capaz de impor as condições subjetivas da revolução é algo de grande relevância para as leituras que os jovens revolucionários fariam a partir do modelo guevarista. Deste ponto de vista,

O foquismo tinha como quase único e miserável axioma a proposta da desnecessidade e improcedência da difícil organização unitária dos trabalhadores da cidade e campo, superada pela implantação de uma zona ‘relativamente pouco povoada’ de grupo guerrilheiro.3

Este modelo se aproveitaria ao mesmo tempo da “radicalização mundial da luta de classes” com uma experiência “profundamente antioperária”, como o autor caracteriza o caso cubano, e que no Brasil encontraria eco na “limitada organização-tradição revolucionária dos trabalhadores, o voluntarismo fidel-guevarista interpretava os anseios de ação política e social protagônica dos segmentos médios, sobretudo jovens”.4 Como consequência, fatos nodais como a própria morte de Che Guevara em contexto de ampliação das guerrilhas na Bolívia foram ignorados pelos militantes que estavam na luta armada no Brasil. Ao contrário, sua morte se tornou motivo de vingança revolucionária, não de crítica da aplicabilidade do método. O foquismo como alternativa se mostrava extremamente restrito em possibilidades, embora fosse a grande novidade do contexto pós OLAS, a Organização Latino-americana pela

2 PERICÁS, L. B. (org) Caminhos da revolução Brasileira. SP, Boitempo, 2019, p. 46 e segs. 3 MAESTRI, Mario. Revolução e contrarrevolução no Brasil. Porto Alegre, FCM, Coyacan, 2019, p. 201. 4 Idem p. 206.

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