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3.1 INTRODUÇÃO
from Crianças, adolescentes, jovens e direitos fundamentais: aproximações aos dados da realidade social
CAPÍTULO III DIREITO À CONVIVÊNCIA FAMILIAR E COMUNITÁRIA
As pessoas de fora pensam que você está curtindo a vida. [...] Você fica refém do próprio sistema. [...] Eu tenho que ter os requisitos, mas você olha o sistema: tem milhões de desempregados. (fala de mãe de criança acolhida).
(Myrian Veras Baptista et al., 2009, p. 168)
Coordenação
Rita C. S. Oliveira
Pesquisador(as):
Bárbara Canela Marques Caique Franca Neves Gracielle Feitosa de Loiola Márcia Cristina Campos
3.1 INTRODUÇÃO
O legado brasileiro da (des)atenção a crianças, adolescentes e suas famílias, balizado pelas legislações menoristas vigentes antes do Estatuto da Criança e do[a] Adolescente (ECA), é o da prática histórica da institucionalização e do não atendimento integral das necessidades básicas como morar, vestir, comer, estudar, processo resultante da desigualdade social e da desresponsabilização do poder público. O caráter inovador da Constituição Federal do Brasil de 1988 e do ECA/90 foi justamente o de assegurar o fomento de políticas públicas para atender universalmente os direitos fundamentais, como educação, saúde, lazer, cultura, profissionalização, habitação, liberdade, entre outros. Assim, abordar o direito fundamental ao convívio familiar e comunitário implica atentar para sua relação intrínseca com a proteção dos demais direitos (cada vez mais violados na conjuntura brasileira) e para a ênfase do poder público na adoção de crianças (especialmente as que estão na fase da primeira infância), em detrimento de sua permanência com sua família de origem. Desde meados da década de 2000 e mais recentemente nos últimos anos, diversos projetos de lei vêm sendo apresentados no Legislativo para agilizar a destituição do poder familiar de mães e pais das camadas populares e para diminuir o tempo de espera dos/as adotantes, em geral pertencentes às camadas médias.
Em linhas gerais, podemos dizer que o capítulo III do ECA (arts. 19 a 52), destinado ao tema da convivência familiar e comunitária, discorre menos sobre a permanência de crianças e adolescentes em sua família de origem – a regra –, tratando mais da regulamentação de sua inserção em família substituta (por meio das medidas legais: guarda, tutela, adoção nacional e internacional) e do apadrinhamento afetivo para os/ as que estão acolhidos/as institucionalmente – a excepcionalidade. Porém, em vários artigos e parágrafos, as premissas constitucionais são relembradas. O art. 19 do ECA demarca a relação hierárquica entre família de origem e substituta ao explicitar que é “direito da criança e do[a] adolescente ser criado e educado no seio de sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente que garanta seu desenvolvimento integral”. E ainda, o art. 23, § 1º, indica que pobreza não constitui motivo suficiente para a perda ou a suspensão dopoder familiar. Assim, “não existindo outro motivo que por si só autorize a decretação da medida, a criança ou o[a] adolescente será mantido[a] em sua família de origem, a qual deverá obrigatoriamente ser incluída em serviços e programas oficiais de proteção, apoio e promoção” (BRASIL, 1990). O grupo de pesquisa responsável pelo eixo da Convivência Familiar e Comunitária apresenta este documento como resultado preliminar de uma das etapas metodológicas do projeto de pesquisa mais amplo. Seguindo a lógica posta pela lei, destacamos neste texto o perfil de crianças e adolescentes acolhidos/as institucionalmente e dos/as que foram adotados/as. Porém, em respeito à primazia constitucional do convívio com a família de origem ou natural54 , trazemos dados sobre os serviços e os programas que contribuem para a efetivação desse direito. Em articulação com os grupos que realizam a pesquisa sobre os demais direitos fundamentais (saúde, educação, liberdade, trabalho/profissionalização), elegemos a proteção social afiançada pela Política da Assistência Social como guia para o levantamento e também para esta exposição descritiva. Segundo o documento Raio X de janeiro 202155, a Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social (SMADS) apresenta uma das maiores redes de serviços socioassistenciais da América Latina, com 1.230 convênios, ofertando 220.480 vagas, totalizando orçamento mensal da rede parceira de R$ 88.099.510,37. Neste texto, partimos da apresentação da quantidade e da capacidade de atendimento dos serviços da Proteção Social Básica, entre os quais se destacaram os Centros de Atendimento para Crianças e Adolescentes (CCAs) de 6 a 14 anos. Ainda no
54 O ECA entende como família natural a “comunidade formada pelos pais ou qualquer deles e seus descendentes” (art.25). E como família extensa ou ampliada, “aquela que se estende para além da unidade pais e filhos ou da unidade do casal, formada por parentes próximos com os quais a criança ou adolescente convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade” (art.25, parágrafo único). 55 Disponível em: https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/assistencia_social/observatorio_social/monitoramento/ index.php?p=170850.Acesso em: 26 ago. 2021.