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ALIJADOS/AS DESSE DIREITO

somados com as adoções na faixa etária de 3-6 anos (28), correspondem a 58,53% das que foram concluídas no ano de 2020 (123). A maior parte das adoções de crianças de 0-3 anos ocorreu nas VIJs de Santo Amaro e no Foro Central, que juntas são responsáveis pela adoção de 36 crianças nessa faixa etária. Outro dado observado é que nas mesmas Varas, ao se levar em conta o grupo de irmãos/ãs, 46 adoções foram realizadas sem irmãos/ãs, o que indica que grande parte das adoções de crianças de 0-3 anos envolveu uma única criança. Ao levar em conta a questão étnico-racial, das 123 adoções concluídas, consta o registro étnico de 115, das quais 75 são crianças e adolescentes identificados/as como pretos/as ou pardos/as, o que equivale a 65,02%. Tais informações indicam que ainda há uma dimensão de raça, classe e gênero que permeia o rompimento do convívio de crianças e adolescentes com suas famílias.

3.6 PROJETOS PONTUAIS NA CIDADE DE SÃO PAULO VISANDO GARANTIR

A CONVIVÊNCIA FAMILIAR E COMUNITÁRIA PARA AQUELES/AS QUE

ESTÃO ALIJADOS/AS DESSE DIREITO

Os programas de Apadrinhamento Afetivo e Financeiro foram regulamentados pela Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo (CGJ/SP), por meio dos Provimentos nº 36/2014 e 40/2015. A implantação visa, entre outros, assegurar o direito à convivência familiar e comunitária de crianças e adolescentes acolhidos/as com poucas perspectivas de adoção ou de retorno à família. Em consulta ao site do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP)73 consta a lista das unidades do estado que realizam programas de apadrinhamento. Observa-se que em cada cidade o programa tem particularidades, por exemplo, algumas restringem o cadastro de interessados/as apenas aos/às residentes na comarca, outras abrem também para residentes de município diverso. Na cidade de São Paulo constam oito programas nas seguintes Varas da Infância e Juventude: Central, Ipiranga, Itaquera, Jabaquara, Lapa, Penha de França, Santo Amaro e Tatuapé. À exceção de Itaquera, os demais trazem como referência de execução as próprias Varas da Infância e Juventude. Em Itaquera a referência é o Instituto Adoptare (instituto sem fins lucrativos de apoio à adoção) que, em parceria com a Vara da Infância e Juventude, é responsável pela preparação e pelo acompanhamento dos/as postulantes a padrinhos e madrinhas. Contudo, importante destacar que não estão disponíveis as informações sobre o perfil de crianças e adolescentes apadrinhados/as ou mesmo dos/as postulantes a padrinhos e madrinhas. No site do TJSP consta apenas a relação nominal das unidades

73 Disponível em: https://www.tjsp.jus.br/ApadrinhamentoAfetivo. Acesso em: 30 ago. 2021.

que têm o projeto implementado. E isso impossibilita uma análise ampliada do programa e de seus impactos em relação ao direito à convivência familiar e comunitária de crianças e adolescentes acolhidos/as.

Buscando incentivar a adoção de adolescentes, crianças com mais de 7 anos, grupos de irmãos/ãs e crianças com deficiência (essas sem limite etário), o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo instituiu, em 2017, o projeto “Adote um Boa Noite”, estendendo-o alguns meses depois de sua implementação a todas as Varas da Infância e da Juventude do estado. De acordo com os dados publicizados pela Corregedoria Geral da Justiça (CGJ/SP) em março de 2021, após três anos em curso, o projeto atendeu 180 crianças e adolescentes e contou com a adesão de 49 Varas da Infância e da Juventude, resultando em: 27 adoções efetivadas; 25 em fase de estágio de convivência, e 9 no momento de aproximação. Entre as ações do projeto “Adote um Boa Noite” estão previstas a publicação de fotos e informações dessas crianças e adolescentes na plataforma digital do TJSP, além da divulgação do projeto em diferentes meios de comunicação. Cabe destacar, entretanto, que tal exposição é controversa, ante os riscos que ela oferece para essa população que ainda se encontra em fase de desenvolvimento e que, muitas vezes, traz consigo um histórico marcado por rupturas e rejeição. A objetificação desses sujeitos também é algo a ser problematizado: a escolha em uma “vitrine”, quando e se acontecer, será por serem quem são ou pela aparência que apresentam? Nakamura (2019) realiza uma abordagem crítica dessas iniciativas intituladas como “busca ativa” ou “campanhas de estímulo à adoção tardia”. Para ele, esses programas “proporcionam uma exposição massiva, tanto do ponto de vista do conteúdo (mostra-se muito) quanto da publicidade alcançada (mostra-se para muitos[as]), independentemente de habilitação ou preparação à adoção” (NAKAMURA, 2019, p. 183). Além disso, até o momento, não há uma transparência na publicização dos dados do Projeto “Adote um Boa Noite”, que fica a cargo do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, cujas informações disponibilizadas são genéricas, não indicando, por exemplo, as aproximações entre crianças/adolescentes e famílias substitutas que foram interrompidas. É fato que é necessário pensar estratégias para garantir o convívio familiar e comunitário de crianças e adolescentes que permanecem institucionalizados/as e que não têm a perspectiva de retorno familiar ou colocação em família substituta. Contudo, o que aqui se questiona é a forma como isso tem sido feito, por vezes, priorizando ações que fortalecem a colocação em família substituta em detrimento de ofertas e respostas às desproteções vividas pelas famílias que têm seus filhos/as afastados/as compulsoriamente do seu convívio.

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