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Entusiasmo pelo Profeta Elias e o zelo pela causa de Deus

disso? Essa pergunta nos interessa muito, tomando em consideração que quase todos nós somos Terceiros Carmelitas288 .

Quando a Sagrada Imagem veio pela primeira vez ao Brasil e foi revestida com o hábito do Carmo, ela estava como que risonha, como quem estivesse contente daquele traje carmelita, por estabelecer mais uma vinculação entre a imagem e nós, pelo fato de nós termos essa devoção carmelitana e só não serem terceiros do Carmo aqueles que não puderam ser. Do contrário, todos seríamos Terceiros do Carmo.

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Essa vinculação profética com Santo Elias agradou Nossa Senhora e Ela tomou uma atitude de como quem diz: “Meus filhos, com a invocação do Carmo, vendo-me invocada assim, vendo-me ligada a vós pelo vínculo profético, pelo vínculo carmelitano, eu me alegro e eu sorrio para vós, eu vos serei propícia”289 .

Entusiasmo pelo Profeta Elias e o zelo pela causa de Deus

Tudo de Elias me entusiasma, mas de um entusiasmo reparador, porque sempre que vejo alguma coisa que é caracteristicamente dele, sinto um alívio pela confirmação de que aquilo é verdadeiramente da Igreja. Sendo verdadeiramente da Igreja, representa verdadeiramente a Deus. A imagem que devemos fazer de Deus, portanto de Nosso Senhor Jesus Cristo, dos santos, dos serafins colocados in excelsis, deve incluir esses traços para nos dar uma verdadeira imagem da santidade perfeita, seráfica. *

Quando fui prior da Ordem Terceira do Carmo, o cerimonial exigia que, ao entrar na igreja – todos com o hábito de Terceiros Carmelitas – fôssemos em cortejo pelo pátio interno do convento, passássemos em frente ao presbitério, ganhássemos a ala da Epístola, fôssemos até diante do altar-mor, caminhássemos pelo centro e ocupássemos os nossos lugares. Um dia, embalado pelo costume e pelo ritmo desse cerimonial, fui seguindo esse percurso sem maior atenção. De repente vejo, na parede que corresponde ao fundo da nave esquerda da igreja290, uma pintura-mural representando um profeta com quem Deus fala e que lhe pergunta: “O que

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fazes?” E ele deu aquela resposta famosa: “Zelo zelatus sum pro Domino Deo exercituum” – “Eu me consumo de zelo pelo Senhor Deus dos Exércitos”291 .

Essa pintura levantou inteiro o meu entusiasmo, o meu contentamento, mas também a minha segurança. Sendo um trecho do Antigo Testamento – embaixo vinha pintado que era o livro I dos Reis, 19, 14 – e, portanto, palavras do Espírito Santo, constituía um elogio e uma indicação de que assim se deveria ser. O homem que se tornasse zeloso, mas de um zelo fogoso, ardente por aquele que é o Senhor Deus dos exércitos, este homem seria extraordinário, seria um homem que preencheria inteiramente as exigências do amor de Deus292 .

Ou seja, eu queria que, pelo Senhor Deus, houvesse exércitos inteiros para O defender, para atacarem seus adversários: “Vinde, vinde! exércitos dos quatro canto do horizonte da terra, porque estou desejoso de lutar, estou desejoso de medir forças!”

Curiosamente não percebi na hora que aquela pintura representava Elias, nem conhecia esse episódio da vida de Elias. Olhei-a e pensei: “Quando chegar lá dentro, vou perguntar qual é esse santo, porque esse santo é o meu padroeiro.”293

Como é que imagino Elias e como eu olharia para ele, se me aparecesse?

Eu o olharia como a realização inteira daquilo que desejaria conhecer depois de ter encontrado e feito uma ideia abarcante de todos os homens que estavam na minha trajetória conhecer.

Como é esse homem protótipo, esse homem perfeito, o homem que previu o nascimento de Maria? O homem que foi o primeiro escravo d’Ela antes mesmo de Ela existir, e quando Ela era apenas um possível esplendor dentro dos esplendores do Padre Eterno? Como é esse homem que A venerou e lhe prestou culto de hiperdulia? Como é esse homem que, em Maria, viu Nosso Senhor Jesus Cristo que iria nascer, como ele viu na nuvem a chuva que iria encher Israel?

Elias, majestoso, vindo de todas as grandezas do Antigo Testamento! Elias, batizado, aureolado por todos os imponderáveis magníficos do Novo Testamento! Elias, visitado por Nosso Senhor Jesus Cristo, aparecendo ao lado d’Ele no monte Tabor, porque ele era o “zelo zelatus sum”.

O que faria diante de Elias? Eu me ajoelharia e diria:

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– Ó meu arquétipo demasiadamente grande! Meu arquétipo que me inunda a alma como a chuva inundou o reino de Israel. Vi tanta revolução, vi tanto pecado; vi a Revolução e o pecado entrarem no lugar santo, vi a abominação da desolação sentada no lugar sagrado, vi todos esses auges. Mas não vi – a não ser na Santa Igreja como instituição – algo como vós, ó Elias Profeta! Eu vos agradeço porque, vendo-vos, vi a porta do Céu. Vós sois a porta fechada do Céu, cujos batentes pintam o que está por detrás. Vós sois os batentes da porta do Céu que se abrem para me deixar passar. Elias, fazei-me inteiramente como eu gostaria de ser, ou seja, dai-me um ódio da Revolução que seja na proporção do que vos pediu Eliseu profeta: duas vezes o vosso espírito, ou cem vezes o vosso espírito. Imaginai o varão mais capaz de ódio sagrado que apareceu na Terra, dai-me esse ódio! Imaginai o varão mais admirativo que apareceu na Terra e dai-me essa admiração por Nossa Senhora, de tal maneira que, sentindo em mim essa admiração, pudesse dizer: ‘Realmente, mesmo se Ela não me ajudar, estalo de tanto admirar’. E aí sim eu direi: ‘A vossa visita se explica, porque vós viestes para encher a alma de vosso filho’”294 . *

A alegria de ver que Elias foi assim, deu-me uma confirmação aos bramidos interiores mais impetuosos de minha alma. Esses bramidos viram-se ainda mais confirmados quando, num livro de vida espiritual, li que, na liturgia católica de rito siríaco, está dito que Deus tirou Elias da terra porque ele era tão zeloso que, se Deus o deixasse aqui, ele destruiria tudo.

Nosso anseio de que o mal seja castigado é precisamente este. Estes somos nós quando somos como devemos ser. É o mesmo zelo devorador que, ao ver qualquer coisa torta, errada, qualquer coisa que represente uma concessão ao mal e que dê a ele cidadania, ergue-se em incompatibilidade clara, categórica e, num certo sentido da palavra, desabrida. No sentido literal da palavra desabrido, quer dizer, que não foi fechado, que não foi oculta, que está aberta, ostentada, manifestada a todo mundo: aquilo que foi feito não podia ser feito.

Se o espírito do Profeta Elias é assim, e se é este o desejo que Deus tem em relação a esses seus filhos, então é verdade também que Deus quer que estes filhos, por meio de um apostolado bem feito, sejam aptos a lutar para submeter a terra a Ele, Deus. E estejam convictos de que esse método “eliático” de apostolado é capaz de vencer. Deus não poderia querer a sua

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própria vitória e querer ao mesmo tempo dos homens um modo de trabalhar por ela que desse na ruína deles.

Portanto, tem-se de deduzir que a política “eliática” é, estrategicamente falando, a mais inteligente e a mais eficaz, desde que se saiba ver os acontecimentos no seu conjunto, e não apenas uma determinada situação concreta.

Neste sentido, pode-se até concluir que seria uma frustração não ser perseguido. Como Elias, que tomaria em linha de conta de frustração se ele não tivesse sido perseguido.

Esta é a luta comum do católico, e sobretudo do católico “comme il faut”, como deve ser. Neste sentido Santo Elias seria o arquétipo do católico “comme il faut”. E seria o homem que é como se deve ser, quer dizer, o lutador perfeito295 .

O profeta Elias estava colocado para o holocausto como o sacerdote e a vítima estão colocados para o sacrifício. O holocausto era a razão de ser de toda a mentalidade do profeta Elias, que dava a ele todas as suas características e seu modo de ser.

O que era para ele o holocausto? Era um ato pelo qual ele imolava a sua vida completamente, inteiramente, em aras de uma determinada fidelidade, que é a vontade de Deus.

Num século de infidelidade completa, Deus teria suscitado pelas vastidões das gentes algumas almas que teriam visto mais ou menos o fenômeno da impiedade. Mas que – na sua quase totalidade – o teriam visto de um modo muito incompleto e que, por causa disto, teriam tomado em face do povo que idolatrava Baal uma posição de reação incompleta.

Deus quis então de um varão, que ele conhecesse a impiedade por completo e tivesse em relação a ela uma rejeição tão grande como era grande a impiedade do povo. Quer dizer, que tivesse visto a impiedade na sua totalidade, no negrume dos seus desígnios, na amplitude e na infâmia dos seus meios, nos mil pormenores em que ela se realizava, com uma intensidade que era de deixar as pessoas estupefatas.

Deus quis que esse varão, tomando tudo isto no seu conjunto, visse esse conjunto por inteiro, por completo, e sofresse de um sofrimento proporcional a essa cognição. Este sofrimento equivaleria a dizer: – Para mim, depois do que vi na Terra, não pode haver nada de apetecível, não pode haver nada de atraente, não pode haver nada que me alegre nem me deixe contente. Só uma coisa é a minha vida depois que vi isto: um protesto de começo ao fim contra tudo o que a impiedade faz, e tomando todos os instantes da minha vida. A minha vida não é senão uma discordância, uma estridência, uma rejeição e uma oposição contínua a

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tudo quanto é feito no sentido da impiedade, às vezes em coisas mínimas, das quais outras pessoas dificilmente poderiam ter ideia. A minha vida é ter em mim o amor daquilo que é o contrário do que Baal está fazendo, e ser a contra-impiedade em estado vivo, em tudo e por tudo. E não quero nada da vida, não me preocupo com coisa alguma dela, a não ser abater a idolatria! Sou o contrário desse monstro. E a razão de ser da minha vida é liquidar esse monstro! Não me incomoda ficar rico, importante; não me incomoda nada disso. Quero só uma coisa: destruir a impiedade!”

Quer dizer, isto seria um holocausto, porque implicaria em modelar toda a alma de acordo com aquele anti-modelo, e fazendo abstração de preferências pessoais, gostos pessoais, apetências. Sendo, portanto, o “anti” dos anti-Deus e assim me tornar completamente conforme a Deus. Quase diria – o que eu vou afirmar é muito ousado, e só se justifica num certo sentido da palavra – mais olhando para o anti-Deus do que para o próprio Deus. Quer dizer, à força de rejeitar aquilo que é contra Deus, per diametrum ficar parecido com Ele, ficar com a alma semelhante a Ele.

Seria então praticar essa rejeição até onde ela pode ser praticada, aguentando todos os cansaços, todos os sofrimentos, todas as humilhações, todas as aflições, todas as demoras, todas as decepções, todas as solidões, todas as rejeições, todos os abandonos em todos os graus, em todas as formas, em todas as horas do dia e da noite, aguentando isto tudo para que a impiedade fosse derrotada.

Isto seria o holocausto do profeta Elias. E é por aí que a mentalidade dele se explica, e é por aí que ele é completamente entendido296 . *

Assim também deve procurar ser a alma de cada um de nós.

Podemos dizer a Deus por meio de Maria Santíssima: “Zelo zelatus sum” – Estou repleto de um grande zelo, de uma grande vontade de combater pelo Senhor Deus dos Exércitos!

Sejam estas as palavras que dirijamos a Elias Profeta e a Nossa Senhora, a Mãe de Elias, a Mãe de todos os Profetas, a Mãe daqueles que atacam o adversário de frente, que não têm medo de recuar e ardem do desejo de avançar.

Peçamos a Nossa Senhora que faça de nós outros tantos Elias, de maneira que, quando nos apresentarmos no Céu e São Pedro nos perguntar: “Quem sois?”, possamos dizer: “Zelo zelatus sum pro Domino Deo exercituum”. E assim as portas do Céu se abrirão para nós, as portas do

296 Simpósio sobre o Profeta Elias – 11/12/7

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