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O temor martirizante de não estar correspondendo ao chamado de Nossa Senhora

6ª PARTE

MISSÃO CUMPRIDA: “AS VOZES NÃO MENTIRAM”

O temor martirizante de não estar correspondendo ao chamado de Nossa Senhora

Antes do “Em Defesa da Ação Católica”, o grupinho do “Legionário” tinha nas mãos a direção de todo o movimento católico leigo de São Paulo.

Após o “Em Defesa”, a direção lhe foi arrancada de um modo injusto, iníquo. O grupinho foi perseguido porque queria servir à Igreja. Do movimento pujante, restaram apenas uns preciosos restos.

Esse grupinho, que outrora tinha o tempo inteiro ocupado, não tinha mais o que fazer. Certo dia fomos até visitar um couraçado por falta do que fazer, para encher o tempo.

Não comentávamos isso entre nós, para conservar o ânimo, pois não tínhamos coragem de confessar entre nós essa realidade. Todos estávamos vendo. Era, portanto, o esmagamento, o ponto negativo mais profundo que pode haver.

Daí advieram, não como uma ascensão de um rojão, mas como quem sobe uma via crucis, sucessos e revezes, mas sucessos e revezes sempre pequenos, quando o que nós queríamos era voar.

Assim, chegar até onde Nossa Senhora estabeleceu que se chegasse, é uma trajetória realmente muito grande.

A razão pela qual eu cria era arquitetônica. Quer dizer, o mundo tinha chegado a tal ponto, que o desfecho não poderia deixar de ser aquele que se esperava.

Só havia uma possibilidade de nós não estarmos na ponta daquela vara, por meio da qual a Providência haveria de chegar a este resultado: era a Providência suscitar outros melhores do que nós, maiores do que nós, mais capazes do que nós para fazer o que fazíamos, e então passarmos para o segundo plano.

Esta hipótese não me causava a menor dor. Antes, certo alívio, porque então iria correndo servir àqueles que Nossa Senhora pôs na minha frente. E me dedicaria a eles sem nenhum amor-próprio.

Lembro-me de que pensei o seguinte: “Tomar a posição que tomo, e aceitar o peso que aceitei, é uma coisa tão enorme, que não vejo em torno de mim – por mais que alongue meus olhares ao longe – quem tenha se resolvido a fazer isto. E acho que Nossa Senhora é tão mal-servida neste século, que Ela não tem senão que se contentar conosco. Devemos pedir perdão a Ela por não sermos mais do que somos, e servi-la quanto possamos. Mas como Ela não tem senão a nós, e como é certo que Ela vencerá, Ela vencerá por meio de nós”.

Daí a confiança plena de que, por vales e montes, coles et colinas, Nossa Senhora nos levaria até lá. No fim, venceremos.

Isto posto, cabia a seguinte pergunta: como Nossa Senhora trata aquele a quem Ela deu a graça desta certeza, nos passos intermediários antes de chegar à meta?

Não é com as doçuras de uma certeza contínua. Ora será com as suavidades da certeza, ora com o martírio de uma incerteza. No que está esse martírio?

Não é contra a Teologia admitir que Nossa Senhora, desgostosa com nossas insuficiências e nossos perpétuos defeitos, resolva em certo momento dizer: “Tudo o que peço, obtenho; e, portanto, vou pedir a Deus que mande outra gente, em outro lugar, com outras certezas. Mas, convosco, zero! Está cancelado”. E nós não temos certeza de que, a qualquer momento, não saia isto.

Não sou mentecapto, sei o que estou fazendo e sei que nos traços gerais estou correspondendo. Mas a questão é: aquele primor de correspondência, aquela integridade de doação de si mesmo, que é simétrica com o que Ela me deu a mim, isto estou pondo? Então, quem sabe se minha infidelidade está na raiz disso?

Alguém dirá: “Não, não está”.

Eu digo: você acha que não é, com esta certeza, porque me compara com outros. Compare-me com o que eu deveria ser!

Aí, como é? Porque Nosso Senhor, a mim, não vai me perguntar se correspondi mais ou menos do que Fulano, Sicrano ou Beltrano. Ele me dirá: “Eu o destinei a ser tal coisa assim, lhe dei as graças para ser tal coisa assim. Agora venha me prestar contas do que fez com essas graças”. Quem sabe se isto pode pesar numa decisão de Nossa Senhora contra o Grupo?534

534 Chá ENSDP 2/7/90

Nós já passamos por 500 estrangulamentos – 500 é um número simbólico, mas podia ser 5 mil – em que temos a impressão de que está tudo acabado e não há mais saída. Depois Nossa Senhora vem, ajeita e arranja de um modo ou doutro. E as coisas continuam.

Mas sempre o meu pavor é quando as coisas parecem tomar um rumo não desejado pela Providência. Porque, se tivesse certeza de que aquele era o rumo desejado pela Providência, entraria com calma.

Em cada estrangulamento vem este receio: “Não terei incorrido em alguma falta de generosidade interna muito profunda, da qual não me dou conta, mas pela qual tenho responsabilidade? E não é por causa disso que a Providência faz o navio singrar para o outro lado?”

Aconteceram-me durante a vida uma pilha de coisas que me davam a impressão de que a Providência não quereria. Depois fomos ver e constatamos que Ela queria. Mas na hora, não535 . *

Tive aridezes tremendas durante a vida, mas sobretudo na linha do princípio axiológico.

Provações contra a Fé, graças a Deus não tenho. Contra a Caridade também não. Contra a Esperança, sim.

Uma pessoa que não tenha passado por situações dessas não compreende como isto é um punhal cravado no mais fundo da alma. É muito diferente de ter perdido a fortuna e não sei mais o quê. Não tem comparação536 . *

Um fazendeiro no tempo do João Goulart teve uma expressão que não me saiu da cabeça. Disse em um tom de voz meio sentencioso: “Tenho a impressão de que Deus voltou as costas para o fazendão que Ele tem no Brasil”. Entende-se bem tudo o que ele pôs dentro desse dito. É uma falta de confiança.

Às vezes somos levados a ter a impressão de que Deus voltou as costas para esse homenzarrão chamado Plinio. Há horas que são assim.

Na Paixão de Nosso Senhor, Ele perguntou: “Deus meus, Deus meus, ut quid dereliquisti me?” – “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?”

535 CSN 10/12/83 536 Jantar EANS 26/3/88

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