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Pela originalidade de seu carisma, o fundador tem que ser seu próprio formador

5ª PARTE

FUNDADOR DE UMA FAMÍLIA DE ALMAS E DE UMA ESTIRPE ESPIRITUAL

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PELA ORIGINALIDADE DE SEU CARISMA, O FUNDADOR TEM QUE SER SEU PRÓPRIO FORMADOR

O que me dava uma tristeza sem nome na minha juventude era a seguinte situação.

Se conhecesse um só rapaz, mas um só, que pensasse como eu e que tivesse o ideal contra-revolucionário que tenho, eu me sentiria amigo de alguém, me sentiria unido a alguém da minha geração.

Mas, se andasse de dia, como o fez Diógenes, com uma lanterna acesa à procura de alguém que concordasse comigo, não encontraria ninguém.

Todos os anelos que hoje estão escritos nos meus livros – os quais, pelo favor de Nossa Senhora, têm circulado tão amplamente – todos esses anelos eram coisas que eu não poderia sequer chegar a formular naquela época. Porque, se chegasse a formular, a incompreensão rápida seria o resultado imediato da expansão, dessa manifestação de meu pensamento.

À medida em que fui ficando mais velho, andando então pelos meus 13, 14, 15, 18 anos, fui notando que não me faltava apenas um companheiro, um amigo que me compreendesse e a quem eu compreendesse, mas que me faltava sobretudo um guia.

Eu tinha a guia excelente e incomparável de minha queridíssima mãe, mas via bem que, embora houvesse afinidades enormes entre nós, em muita coisa ela não conheceu a Revolução.

Algumas coisas ela via, mas tudo aquilo que eu entendia como Contra-Revolução e como Revolução, iam além da compreensão de uma excelente senhora com dotes intelectuais, mas que não pegava até onde a coisa ia.

Tive uma noção clara disso quando dei para ela o livro “Revolução e Contra-Revolução”. Ela leu a R-CR, teve umas referências muito afetuosas à R-CR, mas pegar o tema R-CR ela não pegou. Por quê? Porque a Providência designava alguma coisa para isto.

O que é que a Providência designava? Eu não sabia, mas perguntava à Providência: “Por que não me mandais alguém que, a meu lado, percorra o meu caminho e com quem possa falar sobre Vós, ó Maria Santíssima, com quem possa falar sobre Vós, ó Cristo Senhor, e com quem possa me abrir contra-revolucionariamente?”

Porque se fosse apenas para falar sobre pensamentos bons e de piedade, o que de si é uma coisa excelente, eu teria admiravelmente a minha mãe como interlocutora.

Mas não se tratava disso. Tratava-se de tomar esses temas magníficos e servir-me deles para iluminar o problema da Revolução e da Contra-Revolução, de maneira a preparar a carga da ofensiva contra-revolucionária.

Eu dizia a Deus: “Por que não me destes um guia? Por que eu haveria de ter de me formar sozinho, sem ter quem me forme? Por que, meu Deus, além de cobrar de mim tanto esforço e tanto isolamento, não me dais um bastão em que eu apoie o meu cansaço?”.

Graças a Nossa Senhora essas perguntas eram feitas sem a menor censura, sem nada que não fosse com a mais reverente aceitação, respeito e afeto para com a Providência e para com Nossa Senhora. Mas essas perguntas eu fazia.

Só depois é que vim a compreender que, além de me dar uma tão boa mãe, Deus Nosso Senhor me deu um companheiro, me deu um formador que eu não percebia que vivia a meu lado me formando.

Esse companheiro e esse formador chamavam-se isolamento. Na solidão eu era obrigado a me formar a mim mesmo, e foi na solidão que compreendi quase tudo quanto hoje sei.

Nesta solidão eu tinha de ser o chefe de mim mesmo e dirigir-me a mim mesmo, como um timoneiro que está a bordo de uma jangada em pleno oceano. Ele tem que dar conta da jangada, porque não tem mais ninguém com ele, nem no oceano nem na jangada. Ou ele conduz a jangada de maneira a salvar-se nos mares, ou em pouco tempo afundará.

Então, para mim, aquela necessidade de dar conta de mim mesmo, formar-me a mim mesmo, ser o chefe de mim mesmo e arranjar por mim mesmo aquilo que gostaria de receber da mão de outros, se tornou imperiosa.

Os senhores não calculam como hoje – na idade a que cheguei e com o número de pessoas que, pelo favor de Nossa Senhora, tenho encontrado ao longo de minha vida de formador e de fundador – agradeço a Nossa Senhora e digo: – Minha Mãe, eu não entendia, mas felizmente por Vossa graça fui um filho inteiramente submisso. Dentro do não compreender havia uma obediência completa e uma conformidade completa, e hoje compreendo. Para um homem que tem a doutrina católica e crê na Santa Igreja Católica,

não há coisa melhor para formar do que estar só, ajudado pela graça de Deus, batalhando contra si enquanto batalha contra os outros.

Agradeço ainda a Nossa Senhora, mais do que tudo, aquilo que não compreendi, o que recebi e que tanto bem me fez e que tanto concorreu para que fosse de alguma utilidade para a restauração do reino d’Ela: o isolamento.

Um dos elementos que mais me formaram para a luta foi a solidão505 . *

Certa vez me perguntaram como se punha para mim a procura de um superior que refletisse a Deus. Essa pessoa até recordou aquela frase do “Cantar de Mio Cid”: “¡Dios, qué buen vasallo si hubiese buen señor!”.

Não era fácil responder, porque essa pergunta não se punha para mim na ordem doméstica, mas se punha na ordem eclesiástica e na ordem civil.

Nossa Senhora me ajudou também nesse ponto, porque as leituras de História que fiz, no começo eram leituras que me faziam ver a maioria dos Papas e dos bispos e dos cardeais e dos santos – santos naturalmente do passado – como prodigiosos arquétipos.

Fazia-me ver também reis, nobres, governantes da ordem civil como prodigiosos arquétipos.

Somava-se a isto todo mundo da Idade Média – então a burguesia medieval, a plebe medieval, a aldeia de marzipã –, tudo isto aparecia para mim como arquétipos prodigiosos, em relação aos quais eu tinha então o sentimento de respeito, de veneração, de enlevo enorme!

Nessa procura, entretanto, eu não encontrava aqui, junto a mim, ninguém do gênero.

Pela minha veneração para com a Igreja, de início eu via em todo padre, em toda freira, em todo bispo, em todo cardeal – nem sei! – arquétipos prodigiosos. E me habituei ao serviço devotadíssimo desses arquétipos. Não tive, portanto, durante muito tempo, o drama do Cid Campeador.

A certa altura, houve um momento em que a distância do amor aos princípios que eles deviam representar, e às instituições que eles deviam dirigir, ficou bastante clara para mim, o que me levou a desiludir das pessoas. Por exemplo, a respeito de Luís XVI, que antes eu tinha como o rei mártir. Ou Maria Stuart, que antes eu considerava como uma delicada vítima do catolicismo, da poesia, do charme e da graça, na mão de uns vis mequetrefes calvinistas que tocavam rebeca, e que era preciso uma carga de cavalaria dissipar.

505 SD 4/2/95

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