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A robustez da Fé
Esse détachement, ou desapego, exprime de ponta a ponta a atitude do homem que presta culto a Deus, muito mais do que às coisas terrenas330 .
A robustez da Fé
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Usamos muito em nossa linguagem interna a palavra “tau”.
Originariamente o “tau” é uma letra do alfabeto hebraico antigo. Em um período de crise do povo de Israel, em que o povo estava ultra embebido da mentalidade pagã, o profeta Ezequiel teve uma visão na qual um Anjo marcava com essa letra – cuja forma é uma prefigura da Cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo – a testa de todo aquele que era um verdadeiro israelita e que não se tinha deixado marcar pelo paganismo do tempo.
Assim, tomamos o “tau” como símbolo do católico de hoje que tem verdadeiro espírito católico, e que não se deixa marcar pelo paganismo de nossos dias.
O que é o “tau” para nós? É uma graça ligada à virtude da Fé. Não é uma fé diferente. É a mesma Fé Católica Apostólica Romana, mas fortalecida por uma graça especial pela qual sentimos, percebemos com mais vivacidade e penetração do que outros o que é revolucionário e o que é contra-revolucionário.
Basta ser batizado e ter Fé católica para salvar-se. Mas o “tau” é um tesouro especial por meio do qual um membro da TFP percebe bem o que é a Revolução e a Contra-Revolução331 . *
Com a graça da vocação no seu primeiro albor, no seu primeiro nascer, entra uma espécie de força de alma em que a pessoa não duvida de nada, em que a pessoa tem todas as certezas e tem o júbilo dessas certezas; essas certezas apresentam-se em uma luz matinal, apresentam-se numa claridade esplêndida. A pessoa tem então uma alegria da Fé que é uma coisa monumental.
Essa fé vigorosa que tem o ultramontano fiel à sua vocação, o qual não duvida de nada, não tem sombras, crê contra as aparências, acho que essa fé é uma espécie de comunicação misteriosa e super excelente que, diante de coisas que pareçam mais evidentes em sentido contrário, os mantém inteiramente nessa fé.
330 MNF 12/12/90 331 SD 23/11/74
A virtude da Fé vai nos ser extraordinariamente necessária e vai ser necessária sob a forma de espírito de Fé, que é aquela forma, aquela excelência da virtude da Fé pela qual sabemos aplicar os dados da Fé às circunstâncias concretas nas quais nos encontramos.
Uma coisa que peço a Nossa Senhora é que Ela nos conceda essa fé inquebrantável, que nada pode derrubar. Que crê em tudo, que não duvida de nada, não hesita nem recua diante de nada, investe contra tudo e acaba ganhando toda espécie de batalha, depois de toda espécie de derrota332 .
Para nós – e isto não digo em tese – não há problema intelectual nem espiritual que possa ser resolvido a não ser em função da Fé.
Das virtudes da vida espiritual, aquela que toda a vida amei mais, mais do que a pureza, é a Fé. Aquela que toda vida cultivei mais foi a Fé. Porque a Fé é a raiz de toda a vida espiritual. E quem tem fé viva, este tem vida espiritual pujante. Quem não tem fé viva, este não tem vida espiritual pujante.
Isto tem uma aplicação para a vida intelectual. Se tivermos espírito de Fé, quer dizer, soubermos aplicar a Fé aos dados da História, teremos o conhecimento, que tem algo de profético, das harmonias da história. A partir do momento em que crermos nos acontecimentos previstos em Fátima com toda a firmeza, nossa fé atingiu os pontos de nossa vocação que é preciso que estejam claros para que ela se realize.
É preciso ter fé, é preciso ter paixão pelas coisas da Fé333 . *
O meu entusiasmo não é um entusiasmo exclusivamente silogístico: “Eu raciocinei e cheguei a tal conclusão”, porque o ato de fé em mim precedeu de muito esse raciocínio. Meu entusiasmo é uma espécie de evidência meio mística dada pela Fé, e que o raciocínio apologético vem depois calçar, mas não vem suprimir; vem, no fundo, servir a essa ação meio mística dada pela Fé.
Ouço pessoas falarem na firmeza das minhas convicções. Tenho vontade de sorrir e dizer: “Você não entende nada. Fale da firmeza de minha fé. Porque, a partir da firmeza da minha fé, do que deduzo de minha fé, é que tenho muita certeza. No que deduzo por raciocínio, não tenho essa certeza. Mas, do que deduzo da Fé, tenho certeza. Aí piso com sapato de ferro, porque não tenho medo de peso nenhum. A coisa vai” 334 .
332 SD 26/12/69 333 RE 13/4/69 334 MNF 12/4/89
Na medida em que meus horizontes foram se alargando, foi nascendo uma enorme afinidade com o que havia de sobrenatural: brotou uma apetência, um desejo do sobrenatural, e com ele a valorização exata da Igreja Católica e a respiração da Fé. Não, portanto, o ato de fé, que eu já tinha, mas a respiração da Fé.
Aí abriram-se novos horizontes. E isto me tornou facílimo pensar, tornou facílimo descortinar largos horizontes, fazer correlações, porque o espírito adquiriu a agilidade, não de um atleta, mas de quem voa335 .
Com base na Fé, veio a formação de um mundo religioso ideal, para o qual minha alma voava inteira. E que era, no fundo, um mundo inteiramente contra-revolucionário, um mundo imensamente colocado em ordem católica.
O que me salvou de elucubrações vazias e me pôs no bom caminho foi a Fé, a qual me tirou de riachos perigosos, orientou-me e deu-me o equilíbrio necessário para essa idealização. Porque, neste caminho, poderia facilmente não sair uma coisa equilibrada.
Nossa Senhora favoreceu-me muito, pois tinha desde aquele tempo de menino fé católica absoluta: o que a Igreja dissesse era aquilo mesmo, porque estava evidente que era. Era Ela que tem razão, eu não. E devo me acomodar a Ela.
Notem que sempre faço em relação a meu percurso intelectual uma crítica criteriológica: “Do que valeu aquilo que minha infância me disse? Se não estiver de acordo com a razão ou com a Fé, kaputt! Não serve!” Mas a análise criteriológica e lógica vem sempre336 .
Uma vez que era Plinio Corrêa de Oliveira, naquelas circunstâncias e com os meios de que dispunha, devia perguntar-me como eu deveria ser enquanto manifestação de alma e modo de ser. A primeira coisa era deixar ver que sou um homem de Fé337 .
A expressão “Fulano tem fé” indica o Fulano que crê nos dogmas, nas verdades ensinadas pela Igreja, quer sejam as verdades sobre Deus, quer sejam as verdades sobre os preceitos que os homens devem cumprir.
Mas a expressão“Fulano é um homem de fé”já vai mais longe ou mais alto do que a primeira expressão. Esta segunda expressão vem carregada de um elogio que descreve certo tipo de homem, e um tipo de homem que
335 CSN 2/1/82 336 CM 19/1/86 337 Relato MNF 28/3/91
não é simplesmente aquele que tem fé. O homem de fé é mais do que o homem que tem fé.
O homem de fé é o homem que tem fé, mas que tem as virtudes de alma necessárias para ter fé338 .
Nossa Senhora deu-me muita fé, isto é verdade. E muito espírito sobrenatural. É-me fácil compreender que há uma realidade sobrenatural, a qual domina a natural, e que o polo de atração está no sobrenatural, no invisível.
Em sentido oposto, percebo que para muitas outras coisas sou absolutamente “pão-pão, queijo-queijo”: ou tenho provas palpáveis, ou não aceito.
Como se juntam essas coisas?
Se a pessoa tem o espírito bem constituído e compreende qual é a esfera própria das coisas especulativas, não pede provas palpáveis nesse campo, mas apela para a lógica e para a razão, e depois para a Fé.
Quando desce às coisas concretas, que não se podem demonstrar por raciocínio tal como as coisas superiores, então, ou vem a prova ou, para mim, o assunto não está demonstrado: vem cá, me diga o que é, me conte o caso. Pão-pão, queijo-queijo339 .
Há certo gênero de certeza que é como uma luz de abajur: ela tem uma zona imediata que ilumina, e outra zona em que difunde uma espécie de penumbra. Assim também as grandes verdades: espalham penumbras que os espíritos retos captam e dizem: “Isto é verdade”.
O sobrenatural fala muitas vezes dessa maneira, com esta linguagem, muito embora a mensagem sobrenatural seja distinta, por natureza, da observação natural.
Quem aceita a verdadeira Fé, tem bastante vigor e bastante bondade, tem santidade na alma para que, diante de uma proposição qualquer, perceba se aquilo é conforme à Fé.
Se, pelo contrário, ele não tem isto, ele é um indiferente, ele não “ pesca” nada e não pega nada. A primeira posição é virtuosa, e a segunda é pecaminosa.
338 MNF 28/3/91 339 Relato CSN 28/5/83
Peca muito contra a Fé a pessoa que intui essas coisas, mas fica por assim dizer amarrada na canga de um raciocínio e começa a “pintar o caneco”.
Há uma frase muito bonita do “Tantum Ergo” que diz: “Ad firmandum cor sincerum, sola fides sufficit” – “Para firmar um coração sincero, só a Fé basta”. A frase diz, a respeito do mistério eucarístico, que Nosso Senhor Jesus Cristo está realmente presente na Hóstia consagrada340 . *
Vem-se desenvolvendo nos Estados Unidos uma espécie de estudo, que chamam de interdisciplinares ou multidisciplinares, pelo qual o indivíduo se coloca na seguinte posição: “Postas tais conclusões inquestionáveis de tais, tais e tais ramos do estudo, verifiquemos como estes ramos de estudos são hoje e procuremos fazer uma construção, uma síntese disso; e, com base em alguns livros supremos sobre algumas matérias, e que fecham o assunto, vejamos como é isto hoje”.
Isto dá a imagem do que faz, sem tanto aparato, a mente do católico. Bem orientada e munida do senso católico, a mente do católico percebe a verdade e solta a tese geral: Ptsium! Os eruditos não contestam, porque pensam que há um armazém de erudição colossal atrás. Mas eles sobretudo sentem é que tem pensamento. De maneira que não dizem nada.
Tudo o que escrevi, por exemplo, não foi contestado por ninguém até hoje.
Daí vir uma criteriologia que tem como base a Fé. Sem a Fé, não se adquire certeza nenhuma.
Há um equilíbrio estável, saudável, nativo da alma humana, equilíbrio esse que é como uma concha onde pousa a Fé, que é meio fruto da Fé e meio condição de proteção da Fé, e a partir do qual torna-se natural ao espírito humano operar como estou dizendo.
No confronto, os eruditos saem carregando bibliotecas. Nós só levamos a R-CR, uma “Summa Teologica” e alguma coisa de matéria socioeconômica e sociopolítica. E tomamos atitudes incrivelmente afirmativas, portanto arriscadas. Os nossos adversários não nos pegam nunca e não nos contestam nunca. Têm medo341 .
340 Despacho 16/6/95 341 CA 11/6/87