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A desconfiança e a severidade em relação a si mesmo
eu a inicio. Se eu, neste momento, pela fidelidade minha a Ela, dever sofrer uma grande batalha, “praesto sum”! Estou pronto!431
Toda a vida desejei ter garra pelo amor de Deus e não por mim.
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Garra é certa força que representa a capacidade de, com simplicidade, ferocidade e rapidez, tomar domínio, conservar o domínio e impor o destino que se quer.
Os filhos das trevas, quando são atacados nos interesses deles – interesses vis, ilegítimos – eles respondem facilmente com muita vivacidade, com muita ferocidade. Eles têm garra.
Os filhos da luz têm garra? Se eles são muito filhos da luz, eles têm mais garra do que os filhos das trevas. Mas é difícil encontrar filhos da luz que sejam tão filhos da luz que tenham mais garra do que os filhos das trevas.
Por quê? Porque o filho da luz é convidado a combater, não pelos interesses dele, mas pelos interesses de Deus. E o homem muito dificilmente tem mais garra por Deus do que garra por si mesmo.
Os senhores não ouviram contar um caso em que eu me tenha posto em briga com alguém por minha causa. Isso absolutamente não. A menos que por detrás de mim estejam procurando atacar a Deus Nosso Senhor e a Nossa Senhora. Aí a coisa encrespa. Mas não sendo assim, se se trata só de mim, não me incomodo432 .
A desconfiança e a severidade em relação a si mesmo
Tenho lutado contra muitos obstáculos. Presumivelmente ainda terei de lutar contra vários. O maior não é nenhum deles que encontrei no passado, nem que devo encontrar no futuro. O maior se chama Plinio Corrêa de Oliveira.
Porque, por efeito do pecado original e das tentações do demônio a que todos estamos sujeitos, é preciso estar sempre de olho em cima de si próprio. Do contrário se quererá uma coisa que não está de acordo com a vontade de Deus433 .
Procurei ser a vida inteira o mais possível severo para comigo mesmo, na análise daquilo que faço e daquilo que sou. Porque ou sou de uma seve-
431 Chá SB 14/10/81 432 Chá SRM 30/5/93 433 Chá PS 16/4/85
ridade absoluta em relação a mim mesmo ou não vi nada. Tenho pânico de não ser bastante severo comigo. Acho isto muito razoável434 . *
Desde logo percebi que meu modo calmo de ser podia me criar ciladas, pois havia momentos em que era preciso ter um gesto de energia e a energia não vinha, exatamente pelo horror a qualquer efervescência. E isto faria com que, na hora “H”, a force de frappe, isto é, a força de impacto estivesse ausente.
A única solução seria aprofundar as convicções pelo raciocínio e pelos símbolos até o último grau possível de profundidade. E daí tornar evidente qual seria o caminho do dever.
Eu deveria, pois, ser capaz de me pegar a mim mesmo pelo gasnate e obrigar-me, pela força da convicção e pela força do dever, a fazer o que tinha de fazer quando chegasse a hora. E isto a qualquer hora, gostasse ou não gostasse, estivesse disposto ou não estivesse.
Deveria, pois, saber me levar a mim mesmo a bofetadas, sem me zangar comigo – porque mais uma vez seria sair da minha posição de calma – e me obrigar a cumprir o meu dever, por chegar a hora de cumpri-lo.
Então, increpações contra mim inexoráveis. E horror às atenuantes. A atenuante é o refúgio do vício. Quem olha para a sua própria atenuante, ainda que ela exista, esconde dentro dela os seus pecados inconfessados.
Nada de atenuante, ponha-as de lado. Ainda que eu veja assim a atenuante, ainda vi pouco. Então, descomponendas contra mim mesmo: “Agora, cumpra seu dever!” Se eu souber me tratar com bofetadas, na hora “H” saberei também como agarrar os outros435 . *
Certa vez vi, num filme sobre a vida de São Pio X, a cena em que arrebenta a I Guerra Mundial. São Pio X começa a andar numa galeria do Vaticano com afrescos, tapeçarias, e de repente ele vê uma representação de Átila caminhando de encontro ao Papa São Leão I, o qual detém Átila e se estabelece a paz em Roma.
São Pio X começa a falar sozinho, increpando-se a si próprio: “Se eu não tivesse tal defeito, ou se no passado não tivesse cometido tal pecado,
434 CSN 27/10/84 435 RR 29/1/80
eu seria homem de chegar para esses Átilas modernos, falar e impor a paz. Mas o que sou? Sou o Papa Sarto, porque em mim há tais defeitos assim”.
O secretário dele, sentado junto a uma mesinha na galeria, ouvindo tudo aquilo e percebendo que não tinha proporção para ajudar o Papa naquele transe, faz a seguinte oração: “Ó Deus, ajudai a este juiz implacável contra si próprio”.
Quando assisti esta cena, pedi a Nossa Senhora: “Dai-me a graça de ser um juiz implacável contra mim mesmo. Mas atendei à minha natureza humana e ajudai-me quando o peso da minha recriminação for maior do que as minhas forças. Dai-me então forças para aguentar”.
Isto é penitência, e antes de tudo e de mais nada, é reconhecer. E não é só reconhecer aquilo que sei ter feito, podendo não ter sido tanta coisa, mas aquilo que desconfio ter podido entrar de não reto no meu pensamento. É o tal pecado oculto que o homem comete porque anda mal, mas ele não vê. E um pecado oculto já pode afastar de nós os caminhos de Deus.
Então devemos ter esta severidade consigo mesmo, severidade leal, humilde: “Isto pode me acontecer e, portanto, recrimine-se de frente, viva em estado de recriminação contínua consigo mesmo. Não permita o mínimo comprazimento consigo mesmo. E fuja, como de uma lepra, de formar a respeito de suas boas ações um conceito em que você se deleite. Faça isto, Plinio, e você terá apresentado uma tal ou qual penitência”.
Este é o estado normal de um católico nesta vida. E é o estado normal de um membro da TFP. Nós gostamos de fazer bons juízos de nós mesmos, temos uma porção de atenuantes, somos uns miseráveis colecionadores de atenuantes.
Meu anjo da guarda que alegue diante de Deus as atenuantes. Devo estar à procura das minhas agravantes, essas são as que devo conhecer para dar a Deus as contas da reparação por meio de Nossa Senhora436 . *
Se nós tivermos essa severidade para conosco, seremos mais ou menos como uma uva que se espremesse a si própria para dar até a última gota. De maneira que, quando se pensasse que ela deu tudo, ela ainda teria uma última contração salvadora e mais uma gota sairia de lá437 .
436 CSN 31/1/87 437 Chá SB 22/6/93