n.magazine nº2 :: preview

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magazine magazine PA R A A N OVA G E R AÇ Ã O D E PA I S

NOVA!

nú m e r o 1

magazine ENTREVISTA Mariscal, o mago do design infantil MODA Surpresas de inverno VIAGEM Machu Picchu em família LIFESTYLE 7 filhos + 1 apê em NY EXCLUSIVO A vida secreta dos Amish nmagazine.com.br INVERNO 2010 R$12 ISSN 2176-6371


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Casa de bonecas Fotografia GUSTAVO LACERDA Styling FLAVIA PADILHA


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LÍVIA Camiseta com aplicação de plumas CRIS BARROS MINI Cadeirinha de balanço TRENZINHO


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T HIFANY Blusa GREEN Saia de tule MA POUPテ右 Meias LUPO Tテェnis CONVERSE ALL STAR,da CASA TODY Colar acervo styling


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T HIFANY Vestido de tric么 ISABELA CAPETO Chap茅u acervo styling


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LÍVIA Camiseta LE LIS PETIT Saia PURAMANIA KIDS Sapato CASA TODY


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T HIFANY Regata e saia MÉLANGE Colar acervo styling


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LÍVIA Blusa manga longa MA POUPÉE Camiseta com plumas CRIS BARROS MINI Blusa RONALDO FRAGA PARA FILHOTES Short balonê MERCATORE Sapato CASA TODY


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LÍVIA Camiseta e cardigã de malha LE LIS PETIT


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Fama de mal: por trás da fachada punk, João Gordo revela ser um pai “ponta firme” Fama de mal: por trás da fachada punk, João Gordo revela ser um pai “ponta firme” Fama de mal: por trás da fachada punk, João Gordo revela ser um pai “ponta firme”

LÍVIA Vestido drapeado e broche-flor GREEN

Beleza OMAR BERGEA Assistente de fotografia VICTOR JULIANO Tratamento de imagem BOREAL BOREAL (11) 3083-6505; CASA TODY (11) 3082-2771, casatody.com.br; CRIS BARROS MINI (11) 3082-3621, crisbarros.com.br; GREEN (11) 3088-2986, greenymissako.com.br; ISABELA CAPETO (11) 3898-1878, isabelacapeto.com.br; LE LIS PET IT (11) 3815-0634, lelisblanc.com.br; LUPO sac 0800-7078220, lupo.com.br; MA POUPÉE (11) 9994-9440, mapoupee.com.br; MÉLANGE (11) 3031-1359, melange.com.br; MERCATORE (11) 3062-3339, mercatore.com.br; PURAMANIA, (11) 3081-3551, puramania.com.br; PURAMANIA KIDS (11) 3081-3551, puramaniakids.com.br; RONALDO FRAGA PARA FILHOT ES (11) 3816-2181, ronaldofragafilhotes.com.br; T RENZINHO (11) 3088-0936, trenzinho.com.br.


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garotos perdidos Fotografia ELLA DURST Styling FLAVIA PADILHA

Cenografia e acessórios SILVIA MORAES E RAFAEL GODOY/ATELIER ZIG ZAG

“São meninos que caem de seus carrinhos quando as babás estão olhando para o outro lado. Se não são reclamados em sete dias, são enviados para longe, para a Terra do Nunca.” Peter Pan, J.M. Barrie


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MIGUEL Camiseta de malha listrada MA POUPÉE Colete, calça jeans e bota BONPOINT RAFAEL Jaqueta BONPOINT Calça jeans SEVEN Coturno acervo styling Máscaras AGÁ PRESENTES


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Fama de mal: por trás da fachada punk, João Gordo revela ser um pai “ponta firme”

GIULIA Vestido NEIGE, na PIKS Colete ZINCO Lencinho MÉLANGE Coroa ATELIER ZIG ZAG


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GIULIA Vestido de tric么 PURAMANIA KIDS Colete jeans PURAMANIA


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MODA

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RAFAEL Camiseta de malha FLÁVIA ARANHA Colete e calça BONPOINT Colar de metal ALEXANDRE HERCHCOVITCH Galochas SETE LÉGUAS GIULIA Bata BONPOINT Colete MÉLANGE Minissaia LE LIS PETIT Bota JORGE ALEX Boina LUCY IN THE SKY


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MANUELA Vestido de algodão MÉLANGE


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MANUELA Camiseta com strass FIT NINA Colete ZINCO Minissaia MIXED KIDS Legging RONALDO FRAGA PARA FILHOTES Bota CASA TODY Coroa ATELIER ZIG ZAG MIGUEL Camiseta de malha BÉBÉ SUCRÉ Colete de tricô MA POUPÉE Lenço VIDE BULA Calça saruel BABY BASICS Galocha SETE LÉGUAS


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RAFAEL Macacão ALEXANDRE HERCHCOVITCH para C&A Lencinho MÉLANGE Galochas SETE LÉGUAS MIGUEL Casaco e calça BB MODERNO Cachecol HERING Botinha TIP TOEY JOEY EMILLY Camiseta HERING KIDS Colete PURAMANIA KIDS Legging MULHER ELÁSTICA Bota JORGE ALEX MANUELA Vestido MÉLANGE GIULIA Bata BONPOINT Colete MÉLANGE Minissaia LE LIS PETIT Bota JORGE ALEX Boina LUCY IN THE SKY


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MODA

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Beleza TALITA OSIRO Assistente de fotografia RODRIGO SANTANA DA SILVA Tratamento de imagem JUJUBA DIGITAL (11) 3037-7430 Agradecimentos HORTO FLORESTAL Rua do Horto, 931, São Paulo, (11) 6231-8555, hortoflorestal.com.br; e brechó MINHA AVÓ TINHA (11) 3865-1759 AGÁ PRESENT ES (11) 3812-1910, agapresentes.com.br; AT ELIER ZIG ZAG (11) 9246-2370, atelierzigzag.wordpress.com; ALEXANDRE HERCHCOVITCH (11) 3063-2888, herchcovich.com.br; BABY BASICS (11) 30731128, babybasics.com.br; BB MODERNO (11) 3729-7040, bbmoderno.com.br; BÉBÉ SUCRÉ (11) 2867-0570, bebesucre.blogspot.com; BONPOINT (11) 3063-3337, bonpoint.com; CASA TODY (11) 3082-2771, casatody. com.br; C&A (11) 2131-0004, cea.com.br; FIT NINA (11) 3088-6548, fitsports.com.br; FLÁVIA ARANHA (11) 3031-1703, flaviaaranha.com.br; HERING sac 0800- 473114, hering.com.br; HERING KIDS heringkids. com.br; JORGE ALEX (11) 3321-7700, jorgealex.com.br; LE LIS PET IT (11) 3815-0634, lelisblanc.com.br; LUCY IN T HE SKY (11) 3815-9609, lucyinthesky.com.br; MA POUPÉE (11) 9994-9440, mapoupee.com.br; MÉLANGE (11) 3031-1359, melange.com.br; MIXED KIDS (11) 3552-3111 , mixed.com.br; MULHER ELÁST ICA (11) 3060-8263, mulherelastica.com.br; PIKS (11) 3816-3957, piks.com.br; PURAMANIA (11) 3081-3551, puramania.com.br; PURAMANIA KIDS (11) 3081-3551, puramaniakids.com.br; RONALDO FRAGA PARA FILHOT ES (11) 3816-2181, ronaldofragafilhotes.com.br; SET E LÉGUAS sac 0800-7070566, seteleguas.com.br; SEVEN (11) 3032-8615, 7forallmankid.com; T IP TOEY JOEY (16) 3707-0661, tiptoeyjoey.com; VIDE BULA (11) 3086-4202, videbula.com.br; ZINCO (44) 3351-5000, zinco.com.br.


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CASAS NO MUNDO

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Apê para

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Astros de um novo reality de decoração & família, especialistas em transformar edifícios antigos em moradias de sonhos e pais de sete, sim, sete crianças! Conheça o apartamento que os designers Robert e Cortney Novogratz dividem com seus filhos em Nova York e veja as dicas de decoração que eles têm para você. Por EDUARDO BURCKHARDT

Eles são chamados “a família do momento” nos Estados Unidos. Também já foram citados como a família mais descolada do mundo. A verdade é que se torna mesmo difícil não ficar de olho em Robert and Cortney Novogratz e sua trupe. Primeiro porque é impossível passar batido ao fato de terem sete filhos - e nenhum faria feio estampando uma campanha de publicidade. Além disso, o casal tem um trabalho invejado por muitos. Eles comandam o Sixx Design, estúdio especializado em transformar edifícios decrépitos de Nova York em casas e apartamentos de sonhos. Detalhe: vão de mala, cuia, brinquedos e fraldas para cada local, num total de seis mudanças nos últimos 15 anos. Para completar, são as estrelas de um programa de TV que estreou em abril nos EUA. As câmeras do 9 By Design, que vai ao ar pelo canal Bravo, acompanham a rotina do casal e seus filhos e revelam uma família que personifica a expressão cool. Com foco também em decoração, o edifício onde vivem atualmente é quase um coadjuvante da trama. Trata-se de uma antiga oficina convertida pela dupla em uma casa de seis andares onde se mesclam nos ambientes desde os desenhos dos filhos a obras de arte - com direito a um quadro de Vic Muniz sobre o berço dos gêmeos, por exemplo. Robert e Cortney contam mais detalhes sobre seu lar na entrevista que concederam à n.magazine:


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FOTO: MAT T HEW WILLIAMS


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CASAS NO MUNDO

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Como vocês chegaram a essa casa? Nós amamos essa região do West Village e o fato do edifício ter vista para a Rio Hudson de todos os ambientes e a vizinhaça ser muito agradável, com predinhos históricos charmosos. Por isso, encaramos o desafio de transformar uma antiga oficina da BMW caindo aos pedaços em nosso lar. O que vocês levaram em conta na decoração? Queríamos que a casa fosse estilosa e chic, mas ainda funcional e agradável. Os quartos são bem abertos e as paredes, brancas. E o colorido vem das obras de arte e objetos de decoração pontuais. As crianças pediram algo em especial nessa casa? Claro. Elas queriam uma boa área de estudos, um espaço

O quarto dos meninos (acima) e das meninas (ao lado e no detalhe): mesmo com uma casa gigante, o casal preferiu que os filhos dividissem os mesmos espaços


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Carteles dibujados para el Hospital Sant Joan de Déu: ambientes más cálidos para los niños


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FOTO: T IM GEANEY

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confortável e um cantinho especial para guardar suas coisas. Todos elas amam ter arte em seus quartos também. Se eles pudessem dar um nome para a casa, qual seria? Eles a chamariam de Big Blue, por conta de uma instalação azul do artista britânico Richard Woods na entrada da casa. Sua casa parece ter um bom equilíbrio entre arte e funcionalidade, especialmente para viver com sete filhos. Qual o segredo? Bom, nós temos tudo emoldurado por acrílico, que protege as obras de arte, sem impedir que tenhamos acesso a elas e as admiremos. É importante expor as crianças a todo o tipo de cultura, e nossa coleção particular permite isso. Mas de uma maneira acessível: aqui é uma casa, não uma galeria. Tudo é colocado para ser usado e curtido, não para ser mantido perfeitinho como obras em um museu. Como os filhos influenciam no trabalho de vocês? Eles nos mantêm jovens e atualizados, e alguns têm opiniões bem específicas sobre design, que sempre levamos em conta. Tem alguma dica de ouro de decoração para os pais? Sim. Não pense que decoração infantil significa ser previsível e insosso. Não há razão para evitar coisas bacanas de design numa casa para uma família. Vocês têm uma casa de praia em Trancoso, na Bahia. Como acabaram conhecendo a região? Foi pela dica de um amigo, e ficamos apaixonados. A área é linda, preservada e a família inteira adorou passar um tempo ali. Então decidimos construir uma casa para ir nas férias.


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CASAS NO MUNDO

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O estilo Novogratz: móveis e peças garimpadas em antiquários e mercados de pulgas convivem em harmonia com obras de arte e objetos de design. Abaixo, à direita, a sala de estudos e descanso, um pedido especial dos filhos ao casal


Machu Picchu, tradicional destino de mochileiros no Peru, também está ao alcance de famílias com crianças. O espivetado Dimitri e seus pais, a jornalista Marina Moros e o professor universitário Fernando Scheibe, desbravaram Cuzco e a Cidade Sagrada e nos contam sua aventura Texto e fotos MARINA MOROS

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O pequeno inca

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ergunto o que ele lembra da viagem. Dimitri tem 5 anos e muitas respostas: os rios vistos do trem, a descida súbita do avião, o amiguinho da hospedagem, o frio, as construções de Machu Picchu, as piscinas termais de Águas Calientes, o milho cozido, a chicha morada, as ladeiras do bairro San Blas, os queijos gostosos comprados no mercado. A primeira aventura é o voo. Uma hora de Lima a Cuzco sobrevoando a Cordilheira dos Andes, com muitas perguntas: “Quando vou ver as lhamas?”; “A centopa (centopéia de pelúcia que sempre o acompanha) vai ficar com frio?”; “Vamos mesmo andar de trem?”. Então aparece a cidade, escoltada pelas montanhas. E lá vem o frio na barriga: próximo da aterrissagem, o avião faz uma curva brusca para entrar pelo espacinho possível. Dimitri já diz: “A centopa nem ficou com medo”. As lhamas estavam logo ali, guardadas pelas cholas, com suas quatro saias, longas tranças, chapéus coloridos e filhos às costas – cada foto a um sol, a moeda local, aliás. E, sim, bastante frio! A temperatura média anual é 11º, chegando a -2º no alvorecer. Cuzco fica a 3.360 metros acima do nível do mar. Logo que chegamos, sentimos o famoso soroche, mal causado pela altitude. Os efeitos variam muito para cada pessoa. A reação de Dimitri, por exemplo, foi dormir o dia inteiro.


Refeito do soroche, ele aproveitou para desbravar a Hospedaje Inka, o acolhedor hostal que escolhemos em San Blas, conhecido bairro dos artistas. Não demorou para fazer amizade com Sebastian, neto dos donos, menino brejeiro que circulava todo sorrisos entre os jovens estrangeiros. Machu Picchu é o objetivo de praticamente todos que põem os pés em Cuzco. Mas vale a pena aproveitar pelo menos dois dias na cidade. Conhecida antigamente como Qospo, “umbigo do mundo” em quéchua, Cuzco é um local encantador e cheio de contrastes. Em cada esquina, descortina-se um pedaço de história, marcada pela subjugo dos povos indígenas ao poderio dos conquistadores espanhóis. Na Plaza de Armas, a Iglesia del Triunfo é uma prova disso: foi erguida em 1539 tendo como base o palácio de Wiracocha Inca. Alheio ao significado das marcas da invasão espanhola, Dimitri adorou o encaixe preciso dos muros e a famosa pedra de 12 ângulos, ícone da apurada arquitetura inca. Compramos uma miniatura, mais divertida que peças de Lego. Para quem vai com crianças, uma boa pedida é pegar o ônibus - com ares de bonde – que sai da Plaza de Armas e leva a alguns dos principais sítios históricos das redondezas. É o caso da fortaleza de Sacsayhuamán, dos labirintos de Q’enqo e dos aquedutos de Tambomachay. Outro


pESSE AMOR QUE A GENTE TEM POR ELES É TÃO GRANDE... NUNCA PENSEI QUE FOSSE

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Acima, Dimitre curte com seus pais Machu Picchu e as piscinas de Águas Calientes, e faz um amiguinho no hostal. Abaixo, ele e a sua mãe nas ladeiras de Cuzco

DICAS ESPERTAS .Em Cuzco, é uma boa pedida adquirir o Boleto Turístico (boletoturisticocusco. com), que dá direito a entrada nas principais atrações. .Os tickets de trem de Cuzco a Águas Calientes podem ser comprados no site da Perurail (perurail.com) e custam desde US$ 48 por trecho. .Para enfrentar o soroche, é importante fazer refeições leves e pouca atividade física nos primeiros dias. O “remédio” natural utilizado desde o tempo dos incas é o chá de coca, que tem efeito revigorante. Outra alternativa são as soroche pills, encontradas em todas as farmácias locais.


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ENT REVISTA

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programa imperdível é circular pelas feiras, provar os queijos de lhama, as frutas e o suco de chicha morada (milho roxo), que Dimitri tomou a bons goles durante toda a viagem. Outra bebida que ele adorou foi a Inka Cola, o refrigerante nacional – não sabemos se pelo sabor ou pela cor amarelo-fluorescente. Tínhamos pensado em ir até Machu Picchu pela trilha menor – dois dias e uma noite - mas os guias nos desaconselharam: é um caminho longo para uma criança de 5 anos e, mesmo que Fernando esteja acostumado a carregar Dimitri nas caminhadas que fazemos, a altitude o esgotaria muito rápido. Decidimos ir de trem, e foi uma das partes mais gostosas da viagem. Dimitri ficou colado na janela, encantado, pedindo para repetirmos os nomes dos rios em quéchua. A última estação é a de Águas Calientes, povoado crivado de restaurantes, hotéis e piscinas termais – perfeitas para descansar depois de muito andar na Cidade Sagrada. Fomos para Machu Picchu cedinho, em um dos primeiros ônibus que saía de Águas Calientes. A cidadela estava cerrada pela neblina. Só víamos as lhamas soltas com seus filhotes e Dimitri pôde, finalmente, chegar perto delas sem intermediação das cholas. Quando a neblina baixou, o encanto: uma cidade de pedra, erguida em uma montanha a 2.560 metros acima do nível do mar, precisamente dividida em dois setores: o urbano e o agrícola. Dimitri logo tirou as sandálias para poder andar pelos labirintos de pedra. Há bastante o que ver: o Templo do Sol, o

Templo das Três Janelas, o Templo Principal, o observatório solar Intiwatana, os encaixes dos blocos de granito branco, mausoléus, mais templos. Você pode contratar um guia, levar um de bolso ou pegar carona nos guias alheios. A cada metro, Dimitri perguntava “como” e “por quê”. Prepare-se para dar uma aula de arquitetura, astronomia e história. O bom de chegar cedinho em Machu Picchu é que a cidadela ainda tem aquele ar mágico que idealizamos ao ver o cartãopostal mais difundido do Peru. Há poucos visitantes vindos de Águas Calientes e os aventureiros que enfrentaram a Trilha Inca e, cansados e extasiados, curtem o prêmio máximo pelos quatro dias de caminhada. Antes da turba de turistas chegar, dá para conhecer com calma os principais pontos e planejar providenciais descansos no meio do passeio. Bem abastecidos de imagens e história, reunimos um pouco mais de fôlego para subir até Wayna Picchu. Do alto da “Montanha Nova”, em frente e a 300 metros acima da Cidade Sagrada, tem-se a melhor vista das ruínas. Mas é melhor combinar antes quem carrega quem: Dimitri já tinha cansado as pernas e pegou uma carona com Fernando durante toda a subida. Lá no alto, não é preciso procurar o que fazer, o que ver. Restam aqueles momentos para simplismente existir. Olhar Machu Picchu. Sentir a civilização imaginada. Torcer para que as lembranças que Dimitri levará consigo sejam tão ricas quanto as nossas. Restar em silêncio.


––Inocencia extrema 34

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Nossa repórter vive um mês na maior comunidade amish do mundo e revela a rotina e as tradições desse fechado grupo religioso que se mantém alheio à tecnologia e aos costumes modernos . Por MANUELA NOGUEIRA, de Ohio (EUA) Fotografia DOYLE YODER (dypinc.com)


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Bob Esponja não faz parte do mundo de Sheryl Erb. A linda garota de 5 anos, cabelos loiros e cílios compridos, já sabe escrever seu nome e vive num dos países mais desenvolvidos do mundo, os Estados Unidos. Mas, ao contrário das demais crianças de sua geração, não conhece os personagens que fazem sucesso nos desenhos animados e não tem ideia do que seja um Nintendo. Ela não joga videogame, não assiste à TV, nunca ligou um computador. Sheryl mora em Holmes County, em Ohio, na maior comunidade amish do mundo. Quem já viu o filme A Testemunha, de 1985, com o ator Harrison Ford, sabe que os chamados amish people têm um peculiar estilo de vida. Eles abrem mão da maioria dos avanços tecnológicos para extraírem outro significado da palavra “simplicidade” - demetich, em Pennsylvania Dutch, o dialeto local. Suas casas não têm eletricidade e nas garagens os carros são substituídos pelo buggy, uma espécie de carruagem rústica puxada por cavalos. Os amish vivem desse modo em solo americano desde o século 18, quando seus antepassados deixaram a Suíça e a Alemanha, fugindo da perseguição católica. Sheryl e alguns primos estão num chá da tarde na casa de sua tia Lucy Troyer Swartzentruber. A reunião começou pontualmente às 11h30, quando uma taça com salada de frutas e raspas de coco foi colocada em frente a cada um dos mais de 30 convidados. É uma reunião das irmãs Troyer, que trouxeram suas noras, filhas e netos para comemorarem as aniversariantes do mês e combinarem os últimos detalhes do almoço de Thanksgiving, o Dia de Ação de Graças, dali a duas semanas. Do lado de fora da casa há carros modernos e buggys estacionados. Nem todos os membros da família Troyer são amish. Das seis irmãs, três deixaram a comunidade e se casaram com homens que não usam a típica barba comprida, o suspensório nem o chapéu preto. Elas trocaram seus vestidos longos, de uma única cor, por calças jeans e peças de cores fortes. É fácil reconhecer quais mulheres pertencem ao povo amish: elas não colocam um pingo de maquiagem, nunca cortam seus cabelos - os prendem em forma de coque e cobrem a cabeça com o bonnet, um tipo de lenço branco. Da mesma forma, as crianças também se distinguem facilmente. Enquanto as da comunidade emulam a vestimenta das mães e pais, com direito ao lencinho na cabeça, os filhos dos que optaram abandonar os costumes vestem-se com camisetas estampadas e calças jeans. Mulheres com e sem o bonnet se fartam com chá de maçã, sopa de tomate com açúcar, sopa de frango e seis tipos de cheesecake. Antes que a refeição começasse, uma prece em forma de música foi entoada por todos, inclusive pelas crianças. Enquanto suas mães tiram a mesa e lavam a louça, elas fazem

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sua brincadeira preferida. Posicionam um banco de madeira em frente ao outro, sentam-se como se estivessem num culto, simulam orações e cantam músicas gospel. As meninas seguram suas bonecas assim como as mães fazem com os bebês, e os meninos amish, vestidos como seus pais, mais parecem adultos em miniatura. “Sheryl adora brincar de igreja”, diz Elmina Erb, sua mãe. Ela conta que a filha gosta ainda de jogos de memória, quebra-cabeça e de cuidar das galinhas com o avô. Assim é a infância de Sheryl. Assim foi a infância de sua mãe, Elmina. E assim foi a infância de seu avô, Daniel Troyer. A tradição é sagrada para os cerca de 30 mil amish que vivem nesse microcosmo ao norte de Ohio. O cinema mais próximo está a quase 50 quilômetros de distância – mas isso não importa, porque os amish não vão ao cinema. A população local está acostumada a eles e a suas carruagens, que atrapalham o fluir do trânsito. Ao contrário do que muitos pensam, os amish não vivem totalmente isolados. Costumam ter boa relação com os vizinhos, frequentam o mercado e a farmácia da vizinhança. Uma das passagens bíblicas que ins– pira esse modo de vida encontra-se no começo do livro de Romanos, capítulo II. “Não vos conformeis com este mundo.” Diferenciar-se do comportamento padrão é um lema que os amish levam a todas as áreas de sua vida. Como numa revolução silenciosa, o radicalismo, aqui, é desapegar-se das coisas materiais. E um mesmo valor explica por que as mulheres não têm joias, os homens e garotos usam calças sem zíper, apenas com botões, e as janelas das casas não têm venezianas: a humildade. A residência onde aconteceu o chá da tarde pertence ao casal Lucy e Alvin

p “ ENQUANTO AS CRIANÇAS AMISH USAM

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FOTO: MANUELA NOGUEIRA

OS T RAJES T RADICIONAIS, OS FILHOS DOS QUE ABANDONARAM OS COSTUMES ”“ VEST EM JEANS E CAMISETAS ESTAMPADAS p

Reunião familiar no Dia de Ação de Graças. Abaixo: a escola amish e, de azul, Sheryl Erb. Na página ao lado: garotos no tradicional buggy, e uma menina amish brinca com sua amiga que não é da comunidade

Swartzentruber. A grande casa é tipicamente amish. Não tem eletricidade, nem enfeites pelas mesas. O telefone fica numa cabine do lado de fora, a geladeira e o fogão são movidos a gás, assim como o aquecimento da água. Um tipo de forno a lenha esquenta o piso. Os lampiões estão acesos quando chego para o jantar. Purê de batatas, almôndegas ao molho barbecue, molho gravy e vagem são servidos por volta das 17 horas, quando o sol já havia se posto. Após a refeição, conversamos sem a interrupção das TVs – elas não existem por aqui – jogamos cartas e agradecemos a Deus de joelhos pelo dia que tivemos. Lucy e Alvin cantam algumas das músicas de sua igreja e vamos dormir antes das 22 horas. No quarto, a luz de velas ameniza a quase total escuridão. Descubro que Alvin gosta de assistir TV. Ele me conta que sua diversão é mudar de canais quando está na casa de algum vizinho. Pergunto o que aconteceria se ele comprasse um televisor. “Eu tenho a escolha de não ser amish. Mas


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FOTO: MANUELA NOGUEIRA

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se decido ficar por aqui, tenho que seguir as regras.” Percebo que o século 21 foi absorvido por essa cultura, sim. E que as contradições, inerentes a todos os seres humanos, estão presentes aqui também. Os amish dirigem seus buggys até o Wall Mart mais próximo – nessa unidade da rede de supermercados há, inclusive, um estacionamento próprio para as carruagens. Não podem assistir aos jogos do Cleveland Cavaliers, o time de basquete de Ohio que disputa a NBA, mas são fãs do esporte e podem ler sobre o campeonato. As mulheres costuram seus próprios vestidos e os combinam com modernos tênis pretos da Reebok – o que parece ser a “moda” na comunidade, já que eles também estão nos pés de quase todas as crianças. Os amish vivem sob as leis de Deus, e não dos homens. Casos de adultério, divórcio e pedofilia são tratados dentro das famílias e das igrejas. Buscar ajuda fora da comunidade é um ato desestimulado pelas autoridades religiosas, o que acaba por isolar ainda mais essa população. “No Velho Testamento, era olho por olho, dente por dente. Mas quando Jesus veio ao mundo, mudou esse pensamento. Por isso, temos que perdoar quem nos tem ferido”, disse Dave Fry, o bispo de uma das 239 igrejas amish da região. Esse pregado pacifismo foi testado num trágico episódio ocorrido em outro agrupamento amish, no estado vizinho da Pensilvânia, em outubro de 2006. Um homem invadiu uma escola rural e assassinou cinco meninas com tiros na cabeça. No mesmo dia, os familiares do assassino foram visitados e perdoados por membros da comunidade.


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O bispo aponta que a irmandade é o principal significado que a igreja representa para esse povo. Ao contrário da maioria das religiões, os cultos amish não acontecem em templos e sim na casa dos integrantes. A celebração dura mais de três horas e é toda falada em high german (uma variação do Pennsylvania Dutch). Crianças sonolentas e bebês chorões participam do início ao fim, e homens e mulheres sentam-se em bancos separados, num sinal de respeito à presença de Deus. No final, lancham e passam juntos boa parte da tarde de domingo. O senso de comunidade é um elo muito forte entre eles. As famílias se unem na hora de construir um celeiro para um casal recém-formado e para colher os últimos frutos antes do inverno. Existe um seguro geral que arca com despesas médicas, trabalhistas e escolares. Igrejas e fundações amish também ajudam os mais necessitados. Nas escolas, os pais pagam o mesmo valor (cerca de U$ 200) independentemente do número de filhos. As crianças só estudam até a 8ª série. Grande parte frequenta o colégio amish em vez da rede pública. É o caso dos netos de Lucy. Na escola onde estão matriculados, os alunos da 2ª à 5ª série ficam numa mesma sala, no escuro térreo. E os da 1ª, 6ª à 8ª, estudam no andar de

p “

AS CRIANÇAS ESTUDAM AT É A 8ª SÉRIE E OS LIVROS DE HISTÓRIA E GEOGRAFIA DAS ESCOLAS AMISH ”“ p SEGUEM A PERSPECT IVA BÍBLICAG


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Os amish têm um forte sentimento de comunidade. Qualquer atividade é realizada em conjunto, como a construção das casas para os recém-casados

cima, mais iluminado. Eles são ensinados a ler e a escrever o dialeto Pennsylvania Dutch e matemática. Os livros de história e geografia seguem a perspectiva bíblica. “Eles não aprendem o Evolucionismo, não têm aulas de Ciências”, explica Fanny Fry, mãe de cinco crianças. “Ciências, o que é isso?”, pergunta seu filho Justin, de 7 anos. Sheryl ainda não vai à escola, mas sua mãe, Elmina Erb, já decidiu que, quando chegar a hora, ela irá a um colégio público. “Não quero que pense como os americanos, mas acho importante aprender também o ponto de vista científico, não apenas o bíblico.” Elmina pretende dar a Sheryl a mesma educação que recebeu de seus pais. “Eles sempre me mantiveram bem-informada sobre sexo e sobre o que acontece no mundo. Mas sei que muitas famílias da comunidade não falam sobre isso”, diz. Outra decisão que marca a vida de todo jovem amish é a permanência – ou não – na comunidade. Quando eles completam 16 anos, param de frequentar a escola, começam a namorar e passam a ter vontade de dirigir. É quando o desligamento desse mundo torna-se uma possibilidade. “Eu tive um momento de dúvida, mas meu marido queria continuar aqui. Não me arrependo”, diz Fanny. Elmina, sua prima, diz que não obrigaria Sheryl a seguir seus passos. “Quero que ela seja amish, mas sei que há pessoas boas no mundo que não são como nós.” Finalmente chega o Thanksgiving, um feriado americano tão importante quanto o Natal. Toda a família Troyer está reunida para o dia de ação de graças. É um dos últimos dias na comunidade e todos me perguntam o que achei a respeito dos amish. Faço um retrospecto e me lembro de Alvin tirando sarro de Lucy porque ela sempre abre o guarda-roupa, olha para seus vários vestidos e diz que não tem nada para vestir. Recordo também de Daniel na igreja cobrindo o rosto para esconder que estava dormindo. Percebo então que a família Troyer é igualzinha à minha. Nesse momento, uma frase dita por uma das irmãs de Lucy durante aquele chá da tarde, lá no começo da viagem, ganha peso de profecia. Sem nem me conhecer, ela disse: “olhe bem, no fundo, somos todos iguais”.


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