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ERGONOMIA MÓDULO II

ERGONOMIA FÍSICA SESSÃO 3 www.nova-etapa.pt


Mód. II – Sessão 3: Ergonomia Física

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ÍNDICE

Módulo II – Sessão 3 - Ergonomia Física

3

Objetivos Pedagógicos

3

Conteúdos Programáticos

3

1. Lesões Músculo-Esqueléticas Relacionadas com o Trabalho

4

1.1. Evolução Histórica

6

1.2. Clínica da Doença

8

1.3. Dados de Incidência

13

1.4. Fatores Causais

17

1.5. Consequências

18

1.5.1. Consequências Físicas

18

1.5.2. Consequências Psicológicas

19

1.5.3. Consequências Sociais

20

1.6. Aspetos Referentes às Medidas de Tratamento e Prevenção

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MÓDULO II: SESSÃO 3 – ERGONOMIA FÍSICA (CONTINUAÇÃO)

OBJETIVOS PEDAGÓGICOS No final desta sessão deverá ser capaz de: • Distinguir as lesões músculo-esqueléticas relacionadas com o trabalho; • Enumerar as consequências das lesões músculo-esqueléticas relacionadas com o trabalho.

CONTEÚDOS PROGRAMÁTICOS • Lesões músculo-esqueléticas relacionadas com o trabalho; • Consequências (físicas, psicológicas e sociais); • Medidas de Tratamento e Prevenção.

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LESÕES MÚSCULOS-ESQUELÉTICAS RELACIONADAS

COM O TRABALHO Reconhecer a doença ocupacional como um problema social, implica a consciência e convicção de que as doenças e lesões ocupacionais não são casuais e inevitáveis produtos do trabalho. Atualmente, já não é possível desconhecer o caráter complexo dos processos que levam ao aparecimento das doenças em geral e das doenças relacionadas

com

trabalho

em

particular. Atualmente, várias são as abordagens que procuram explicar e resolver as doenças originadas no trabalho. No entanto,

muitas

das

doenças

que

conhecemos hoje foram detetadas há tempos atrás por trabalhadores, patrões e comunidade médica. Este é o caso das Lesões por Esforços Repetitivos (LER) que afetam os membros superiores e têm origem ocupacional. Em 1700, Ramazzini, já tinha descrito a tenossinovite (principal quadro clínico da LER, mas não o único) como sendo a doença dos escribas. Acreditava que essas lesões, usualmente na região das mãos, tinham como causa principal os movimentos repetitivos, posturas forçadas e o stress mental geral. Foi a primeira doença descrita na literatura associada às atividades que envolvem movimentos repetitivos. No ano de 1891, Fritz de Quervain descreveu a doença como a entorse das lavadeiras quando detetou o quadro em mulheres que lavavam a roupa. Em 1920, surgiram relatos a respeito da cãibra ocupacional em torcedores de fios de linha numa fábrica de algodão, classificada por Bridge como a doença dos tecelões. Mas é na fase mais avançada da industrialização que a doença adquire maior importância, atingindo vários ramos da produção e categorias profissionais. A mecanização do trabalho, minimizou por um lado a sobrecarga física total do trabalho, mas trouxe por um outro, principalmente nas indústrias cujo processo de trabalho é 4 www.nova-etapa.pt


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descontínuo, duas consequências para a saúde dos trabalhadores: a primeira, uma sobrecarga dinâmica na musculatura das mãos e braços e uma sobrecarga estática na musculatura das regiões da nuca, ombros e pescoço, ao colocar os trabalhadores em situação de trabalho monótono e repetitivo; a segunda, o stress gerado devido ao ritmo intenso, a pressão pela produção e a perda do controlo sobre o próprio processo de trabalho. A simplificação do trabalho tem como consequência a repetição e a possibilidade de aumento do ritmo através das máquinas ou do controlo coercivo pela chefia. A incidência a nível mundial das patologias relacionadas com as atividades repetitivas tem surgido com a transformação do processo de trabalho que diminuiu as tarefas de grande esforço físico, mas aumentou o trabalho mecanizado, com imposição do ritmo da máquina sobre o Homem. O desenvolvimento do trabalho mecanizado e automatizado gerou um aumento da execução de tarefas monótonas, repetitivas e com alta velocidade. Além disso, estas tarefas são executadas em posturas nem sempre adequadas e por longos e contínuos períodos de trabalho. As inovações tecnológicas são associadas a uma maior carga de trabalho, menor diversidade das tarefas executadas, redução da liberdade e do controlo sobre o próprio trabalho, menor cooperação entre os trabalhadores e maior ameaça de desemprego. Verifica-se que as lesões dos membros superiores, devido a divisão dos processos de trabalho numa série de tarefas repetitivas, monótonas e simplificadas, têm sido relatadas em diversos países desde a década de 70 e 80, época em que as suas consequências se tornaram conhecidas por um público mais vasto. As LER são inegavelmente as doenças mais frequentes nas sociedades industrializadas, e existe uma forte tendência em aumentar face aos processos industrializados. No entanto, nas sociedades altamente industrializadas nas quais existe uma oferta diversificada de funções, e onde a população trabalhadora apresenta maior qualificação profissional, o problema das LER, apesar da sua frequência, é mais facilmente solucionável.

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1.1

EVOLUÇÃO HISTÓRICA

O termo LER é a tradução de Repetitive Strain Injuries. Nas últimas décadas, as Lesões por Esforços Repetitivos receberam, em cada país, denominações e definições distintas. Entre os termos frequentemente usados

incluem-se:

Occupational

Cervicobrachial Disorders (OCD), Repetitiv Trauma

Disorders,

Cumulative

Trauma

Disorder (CTD), Repetitive Strain Injuries (RSI), Occupational Overuse Syndrome (OOS). No Japão, o termo Occupational Cervicobrachial Disorders (OCD) foi definido por um Comité da Associação Japonesa de Saúde Industrial (Japan Association of Industrial Health) em 1973 como "Distúrbio ocupacional funcional e/ou orgânico resultante da fadiga neuromuscular devido ao desempenho de trabalhos repetitivos e/ou estático das extremidades superiores". Na Austrália, a denominação era inicialmente de Occupational Overuse Injuries, alterando-se para Repetitive Strain Injuries (RSI) em 1980. Nos Estados Unidos da América, Cumulative Trauma Disorders (CTD) é usado para descrever um grupo de lesões e desordens do tecido mole que são precipitadas ou agravadas por atividades ocupacionais que incluem movimentos repetitivos, extensões forçadas e posturas inadequadas. São frequentemente observadas nos nervos, tendões, bainha dos tendões e músculos da extremidade superior. Nos EUA e Inglaterra o termo Repetitive Trauma Disorders também é usado. Outros termos embora menos comuns são adotados: Upper Limb Syndrome, Shoulder Arm Syndrome, Neck and Upper Limb Disorders; Tension Neck Syndrome, Regional Musculoskeletal Disorders; work – related musculoskeletal Disorder. Como podemos verificar, até ao momento não existe um acordo no que respeita à terminologia usada, assim como não existe uma padronização nas definições dadas a esta doença. No entanto, verifica-se que as definições mencionadas têm em comum a perceção de uma doença cujo aparecimento está associado à execução de movimentos e esforços repetitivos.

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A presença de várias denominações traduz o desconhecimento destas lesões e mostra a dificuldade da sua descrição com um único termo, os diversos distúrbios e patologias que envolvem uma variedade de fatores causais. Existem, no entanto, alguns problemas relacionados com alguns dos termos usados: O termo Repetitive Trauma Disorders sugere que a repetição é o fator causal; entretanto, outros fatores tal como a postura estática podem conduzir à doença. Tension Neck Syndrome leva a pensar que a dor é localizada na região do pescoço, mas na realidade existe dor noutras regiões como os ombros e o braço. Da mesma forma Overuse Syndrome é também considerado inadequado uma vez que em alguns casos o sobreuso físico não pode ser determinado. Termos que se referem a entidades clínicas bem definidas tais como epicondilites, tendinites ou síndroma do túnel do carpo são incorretos pois no decorrer dos anos este diagnóstico pode mudar. O termo LER é também criticado por alguns autores, que o consideram incorreto, pois considera como fatores causais apenas os movimentos repetitivos e negligencia a importância de outros fatores. O aumento da incidência das LER, a sua distribuição e relação com a realização dos esforços repetitivos justificam a necessidade de reconhecê-las, e a partir daí, procurar métodos e instrumentos que possam compreendê-las melhor.

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1.2

CLÍNICA DA DOENÇA

Como doença a LER é representada por um conjunto de patologias de origem ocupacional que atingem os membros superiores, espádua e pescoço. Estas patologias são: Tenossinovites, Tendinites, Epicondilites, Peritendinites; Síndromes Compressivas do Membro Superior (Túnel do Carpo e outras); Síndrome da Tensão do Pescoço; Ganglion (cisto sinovial); outras doenças associadas com o uso repetitivo das mãos, braços, pescoço e/ou qualquer músculo. Algumas das patologias mais frequentemente associadas ao trabalho informatizado são: Tendinite - Inflamação aguda ou crónica dos tendões. Aparece com mais frequência nos músculos flexores dos dedos, e geralmente é provocada por dois fatores; movimentos frequentes, e períodos de repouso insuficientes. Manifesta-se principalmente através de dor na região que é agravada por movimentos voluntários. Associados à dor, observa-se também edema e crepitação na região.

Imagem 1 - Localização dos tendões afetados com uma tendinite

Tenossinovite - Inflamação aguda ou crónica das bainhas dos tendões. Assim como a tendinite os dois principais fatores causadores da lesão são movimentação frequente, e período de repouso insuficiente.

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Manifesta-se principalmente através de dor na região que é agravada por movimentos voluntários. Associados à dor, manifestam-se também edema e crepitação na região.

Imagem 2 – Localização das bainhas dos tendões afetadas com uma tenossinovite

Síndroma de DeQuervain - Constrição dolorosa da bainha comum dos tendões do longo abdutor do polegar e do extensor curto do polegar. Estes dois tendões têm uma característica anatómica interessante: correm dentro da mesma bainha e quando friccionados, costumam inflamar-se.

Imagem 3 – Localização dos tendões afetados pelo Síndroma de DeQuervain

O principal sintoma é a dor muito forte, no dorso do polegar. Um dos principais fatores causadores deste tipo de lesão está no ato de fazer força torcendo o punho. Síndroma do Túnel do Carpo - Compressão do nervo mediano no túnel do carpo. As causas mais comuns deste tipo de lesão são a exigência de flexão do punho, a extensão do punho e a tenossinovite a nível do tendão dos flexores - neste caso, os tendões 9 www.nova-etapa.pt


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inflamados originam uma compressão crónica e intermitente da estrutura mais sensível do conjunto que compõe o túnel do carpo: o nervo mediano.

Imagem 4 – Localização dos nervos afetados com o Síndroma do Túnel do Carpo

Bursite – A Bursite é a inflamação dolorosa de uma bursa (um saco plano que contém líquido sinovial que facilita a movimentação normal de algumas articulações e músculos e reduz o atrito). As bursas estão localizadas em locais de atrito, especialmente onde os tendões ou os músculos passam sobre os ossos. Normalmente, uma bursa contém uma quantidade muito pequena de líquido. No entanto, quando lesada, ela pode inflamar-se e encher-se de líquido. As causas da bursite incluem o uso crónico excessivo da articulação, lesões, a gota, a pseudogota, a artrite reumatoide ou infeções. Frequentemente, a sua causa é desconhecida. Embora a articulação do ombro seja a mais suscetível à bursite, a inflamação de bursas localizadas nos cotovelos, quadris, pélvis, joelhos, dedos dos pés e calcanhares também é comum. A bursite causa dor e tende a limitar os movimentos, mas os sintomas específicos dependem da localização da bursa inflamada. Por exemplo, quando uma bursa do ombro se inflama, a elevação do membro superior com o seu afastamento da lateral do corpo, como vestir um casaco, é dolorosa e difícil. A bursite aguda ocorre subitamente. A área inflamada é dolorosa ao ser movimentada ou tocada. A bursite aguda, causada por uma infeção ou pela gota, é particularmente dolorosa e a área afetada torna-se encarnada e, à palpação, percebe-se que está quente. A bursite crónica pode ser decorrente de episódios anteriores de bursite aguda ou de lesões repetidas. Finalmente, as paredes da bursa tornam- se espessas e pode ocorrer 10 www.nova-etapa.pt


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acumulação de material anormal no interior, como depósitos sólidos de cálcio com aspeto de giz. As bursas lesadas são suscetíveis a novas inflamações, quando submetidas a exercícios ou esforços incomuns. A dor e o edema prolongados podem limitar os movimentos, acarretando atrofia e fraqueza muscular. Os episódios de bursite crónica podem durar alguns dias ou até várias semanas e a sua recorrência é frequente. Tendinite e Tenossinovite – Geralmente, os tendões inflamados podem causar dores quando movimentados ou palpados. A movimentação das articulações próximas do tendão, mesmo quando o movimento é de pequena amplitude, pode causar uma dor intensa. As bainhas de tendões podem estar visivelmente inchadas devido à acumulação de líquidos e da inflamação ou podem secar, produzindo atrito contra os tendões provocando um som que pode ser ouvido com o auxílio de um estetoscópio quando a articulação é movimentada. O conjunto de patologias que compõe as Lesões por Esforços Repetitivos não é causado somente pelo trabalho, podendo estar associada a atividades de lazer e desporto. Segundo algumas opiniões, as lesões não ocupacionais apresentam uma recuperação favorável, comparada com as lesões ocupacionais. A principal razão para esta diferença entre as lesões ocupacionais e não ocupacionais é o facto de que nas atividades de desporto e lazer, os indivíduos poderem evitar a lesão modificando ou interrompendo a atividade quando os sintomas iniciais aparecem, ou retomá-las gradativamente quando os sintomas diminuem. O trabalhador, pelo contrário, está submetido a pressões (medo de perder o emprego, atitude dos supervisores etc.), que podem adiar a revelação dos sintomas iniciais, resultando num atraso do diagnóstico e tratamento. É importante realçar que o quadro clínico das LER é progressivo, sendo fundamental o diagnóstico precoce para que sejam evitadas as lesões. Um diagnóstico exato é importante, embora nem sempre seja possível realizá-lo, particularmente nos estágios iniciais de desenvolvimento da doença. No entanto, é necessário intervir antes que os sintomas se agravem e antes que ocorra uma redução da capacidade de trabalho. O trabalhador lesionado, em geral, não associa os primeiros sintomas da LER com a situação de trabalho ou torna-se resistente em admitir a doença devido à falta de 11 www.nova-etapa.pt


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informação sobre a LER, medo da estigmatização, medo de perder o emprego ou a própria capacidade de trabalhar. Assim, a procura por assistência médica ocorre, geralmente, quando os sintomas são insuportáveis e os sinais evidentes. O diagnóstico das LER é essencialmente clínico, exigindo tanto conhecimento quanto experiência dos profissionais de saúde. Somente nas fases avançadas da doença se evidenciam as inflamações, edemas, dores, crepitação, perda de sensibilidade e dos movimentos ou compressão de nervos. Ao contrário de outras doenças profissionais, as LER não podem ser detetadas por exames específicos e os exames laboratoriais são insuficientes. O diagnóstico exige a análise da atividade profissional e do processo e organização do trabalho. São não só os fatores ambientais, mas principalmente alguns aspetos tais como a complexidade das tarefas, mobiliários e instrumentos utilizados pelos trabalhadores, duração do período de trabalho, pausas instituídas previamente e possibilidade de pausas espontâneas, duração do tempo de trabalho contínuo, sem pausas, ritmo e velocidade e intensidade do trabalho, execução de movimentos repetitivos por longo tempo, manutenção de posturas inadequadas por longo tempo, pressão de chefias, carga de responsabilidade, entre outros. O diagnóstico de LER observa-se quando existe uma história ocupacional de realização de esforços repetitivos num período prolongado, com exigência de produtividade, com ciclo de tarefa curto, pouco controlo sobre o tempo de trabalho e posturas inadequadas. O quadro clínico evidencia alterações neuromusculares dos membros superiores, coluna cervical e espáduas, com relação nítida com o trabalho, uma vez que piora nos picos de produção, mudança de equipamentos ou de ferramenta, horas extraordinárias, e melhora com o repouso, com as férias e pausas. O diagnóstico diferencial deve ser realizado em relação às seguintes patologias: doenças reumáticas, traumatismos diretos que não são de origem ocupacional, doenças infeciosas, doenças neurológicas, processos degenerativos. Considerando o crescimento acelerado da LER, é fundamental que os estudos sobre as formas de aquisição, o quadro clínico e a evolução da doença sejam aprofundados, pois constata-se uma grande dificuldade em caracterizar com detalhes suficientes os nexos causais, o que dificulta o diagnóstico e sobretudo a prevenção. 12 www.nova-etapa.pt


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1.3

DADOS DE INCIDÊNCIA

A revisão da literatura demonstra que as LER têm sido associadas às seguintes categorias profissionais: indústria com manufatura, telefonistas, operadores de calculadoras (atingem os 12000 toques/hora), trabalhadores em linhas de montagem, operadores de caixas registadoras, operadores de processamento de dados, músicos, trabalhadores de escritório, embaladores, costureiros, entre outros. Observa-se a incidência do síndroma do túnel do carpo nas seguintes categorias profissionais: relojoeiros, agricultores, cabeleireiros, enfermeiras e balconistas. A epicondilite lateral é comum entre os eletricistas devido ao uso prolongado das chaves de fenda e as tendinites predominam entre as ocupações que exigem movimentos repetitivos e forçados das mãos e braços. Nas pessoas com a função de digitação, as lesões ocorrem, principalmente, ao nível dos tendões dos punhos e das mãos, às vezes levando à compressão de nervos periféricos. Já entre os trabalhadores das linhas de montagem que realizam as suas tarefas com os braços erguidos acima dos ombros, verifica-se maior incidência de bursite, tendinite do supraespinhoso e ainda tendinite bicipital, além de queixas de acometimento da região cervical. Os auxiliares de enfermagem e técnicos de laboratório, apresentam queixas ao nível dos cotovelos. Os trabalhos que exigem esforços repetitivos dos aparelhos músculo-tendinosos das mãos, punhos e antebraços, em geral estão associados a tenossinovite, cisto sinovial, síndroma do túnel do carpo, tendinite e epicondilite. Enquanto nos trabalhos que exigem esforço estático dos braços e ombros, em geral estão associados o síndroma tensional do pescoço. Nos Estados Unidos, de acordo com o registo do Bureau of Labor Statistics (1993), a incidência de desordens músculo-esqueléticas relacionadas com o trabalho aumentou de 1981 a 1991 de 5 para 30 em cada 100 trabalhadores.

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Na Finlândia, de acordo com o registo de doenças ocupacionais, a tenossinovite do carpo e a epicondilite umeral são as doenças mais comuns do sistema músculoesquelético. Em relação ao diagnóstico/especificidade das lesões, o relatório do Nusat/MG (1993) demonstra um total de 770 lesões diagnosticadas encontradas no estudo dos 550 casos com LER. Estes dados apontam para o facto de um indivíduo poder apresentar mais de um diagnóstico. Quadro VI - Distribuição dos casos de LER, segundo diagnóstico /especificidade das lesões

Diagnósticos

Números

Percentagens

Lesões em mais de 2 áreas

91

11,82

Lesões totalmente difusas

89

11,56

Síndroma do Túnel do Carpo

58

7,53

Tendinite nos Extensores

57

7,40

Lesões em áreas n. contíguas

57

7,40

Tendinite DeQuervain

52

6,75

Tendinite nos Flexores

51

6,62

Ombro

51

6,62

Punho

48

6,23

Antebraço

36

4,68

Epicondilite Lateral

20

2,60

Tendinite Supra-Espinhoso

19

2,47

Cervico-braquialgia

17

2,21

Mão

16

2,08

Cisto Sinovial

15

1,95

Mialgia/Miosite Trapézio

12

1,56

Outras Lesões

81

10,52

Total

770

100,00

Fonte: Alves, Gisele (1995)

É importante ressaltar que a distribuição dos casos de LER segundo o sexo, a idade, o tempo na função e o tipo e os ramos de atividade económica, apresenta-se bastante diferenciada. Vários autores mencionam que há uma maior incidência de casos de LER nas mulheres. Isto poderá resultar do facto de existir uma maior presença feminina nas funções em que 14 www.nova-etapa.pt


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predominam movimentos repetitivos e acelerados e onde o desgaste físico e psíquico é observado com maior intensidade em relação a outros postos de trabalho ocupados por trabalhadores do sexo masculino. O discurso médico que associa a incidência e prevalência das LER entre as mulheres, enfatizando sobretudo as características físicas e anatómicas, está a contribuir para mascarar a importância da organização do processo de trabalho na prevenção das LER. Por exemplo no estudo das lesões por esforços repetitivos na categoria dos trabalhadores metalúrgicos observa-se que as mulheres são mais acometidas com as LER, em virtude de ocuparem postos de trabalho nas linhas de montagem, onde os trabalhos são mais extenuantes e prejudiciais à saúde. Já os homens ocupam funções como embalamento, vigilância, manutenção, pintura e outras onde o desgaste da saúde também ocorre, mas com uma menor intensidade, devido à existência de menor exigência de produtividade, maior distanciamento da chefia, uma menor complexidade e fragmentação das tarefas e maior autonomia na execução. Grande parte da mão de obra feminina ocupa setores da economia onde predomina um tipo de organização do trabalho que impõe a execução de tarefas manuais, repetitivas, monótonas e esvaziadas de conteúdo, entrelaçadas com a exigência de elevada produtividade. Além disso, a dupla jornada de trabalho da mulher (em casa e no trabalho) tende a ser ignorada e quando lembrada é usada como argumento para mantê-las fora do conjunto da força de trabalho. Esta doença atinge também uma faixa etária de maior produtividade, predominando os casos de LER na faixa de 20-29 anos e 30-39 anos representando os dois grupos 80,72% dos casos (Nusat/ MG, 1993).

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Quadro VII – Distribuição dos casos com diagnóstico LER segundo níveis etários

Faixas Etárias Número

Percentagem

15 - 19

8

1,45

20 - 29

232

42,18

30 - 39

204

37,09

40 - 49

91

16,55

50 ou mais

15

2,73

Total

550

100,00

Fonte: Alves, Gisele (1995)

No que respeita ao tempo a desempenhar a função e a sua relação com o desenvolvimento das LER, não se observa uma homogeneidade, uma vez que são igualmente afetados os trabalhadores independentemente do tempo de execução. Além disso, nem todos os trabalhadores envolvidos nos processos de trabalho que exigem esforços repetitivos são atingidos pela doença. Existem duas formas básicas de explicar porque é que algumas pessoas desenvolvem a doença e outras não. Uma será a "propensão" que considera que uma certa percentagem de indivíduos, numa população, teria mais hipóteses de contrair uma determinada doença. Assim, este argumento deveria originar ações de cariz preventivo sobre esse subgrupo, de exclusão ou de tratamento das suas fraquezas inatas. A outra noção é o binómio diversidade-variabilidade, ou seja, a compreensão de que, numa população, as pessoas são diferentes entre si e cada indivíduo tem limites que variam no decorrer do tempo. As pessoas não são isoladas devido às suas peculiaridades. Tendo isto como princípio, torna-se difícil pensar em modificar ou "excluir" todos os indivíduos. A característica do grupo é algo dado e o que resta é construir um ambiente que tenha em conta essa característica que se impõe.

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O tempo na função não é suficiente para estabelecer uma relação causal entre a ocupação e o desenvolvimento da doença. Dados como ocupações anteriores, atividades de desporto, tarefas domésticas, bem como o estado geral de saúde do indivíduo, devem ser considerados.

1.4

FATORES CAUSAIS

Existem alguns aspetos relacionados com o aumento das Lesões por Esforços Repetitivos (CTD):

Aspetos relacionados com o aumento das LER • Força excessiva devido a instrumentos de trabalho inadequados, que provocam o aumento da força exigida para o trabalho manual. • Atividades repetitivas: os indivíduos que realizam atividades que exigem movimentos repetitivos e uso de força estão 15 vezes mais sujeitos a desenvolverem as LER. Os movimentos repetitivos rápidos aumentam a probabilidade de fadiga e diminuem a capacidade de recuperação dos tecidos. • Posturas inadequadas: podem ser causadas por um inadequado projeto do local de trabalho, bem como dos equipamentos. As posturas de trabalho são influenciadas pela interação de muitos fatores individuais e ocupacionais incluindo o projeto do posto de trabalho, características dos equipamentos e ferramentas de trabalho. • Stress localizado: causado pelo contacto entre uma região do corpo e o instrumento de trabalho que produz pressão. • Vibração: conduz ao aumento da força necessária para sustentar o instrumento de trabalho. • Baixas temperaturas: pela possibilidade de reduzir a sensibilidade ao tato e consequentemente aumentar a força aplicada. A carga estática, isto é, o trabalho que os músculos fazem para manter o corpo ou partes do corpo em determinadas posições, é também um fator importante no 17 www.nova-etapa.pt


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aparecimento das lesões músculo-esqueléticas. Aspetos relativos à organização do trabalho são associados ao desenvolvimento das LER: falta de pausas, horas extras, supervisão excessiva e formação inadequada (Stone,1983); prémios de produção e trabalho por turnos. O trabalho por turnos reduz o sono e o trabalhador fatigado cronicamente torna-se mais vulnerável à tensão muscular. A contribuição de fatores não relacionados com o trabalho incluem: problemas congénitos, lesões agudas, desordens crónicas, envelhecimento e fatores recreativos. Torna-se necessário evidenciar o mecanismo de atuação de cada um destes fatores e a forma como interagem entre si. Assim, a pesquisa e a discussão em torno das causas da ocorrência das LER têm que ser aprofundadas, a partir da análise das situações em que ocorrem. A inter-relação entre os fatores determinantes do seu aparecimento, as situações de trabalho e os indivíduos nelas presentes é importante. Esta discussão torna-se crucial porque é através dela que o tratamento se desdobra, assim como as medidas preventivas e de reabilitação profissional.

1.5

CONSEQUÊNCIAS

Têm sido realizados poucos estudos neste sentido. A partir de um artigo de revisão, que examina as consequências físicas, psicológicas e sociais do desenvolvimento destas lesões, considera-se importante a avaliação destes aspetos para um conhecimento real das várias formas como esta doença afeta a vida dos seus portadores.

1.5.1 CONSEQUÊNCIAS FÍSICAS O grau de incapacidade associado com as LER (OOS) pode ser avaliado a partir do impacto que causam no desempenho das atividades ocupacionais e não ocupacionais. Na maioria dos casos, a dor no membro afetado impede os indivíduos de desempenhar estas atividades, impossibilitando-os de executar até as tarefas mais simples. Geralmente, quando são capazes de as realizar, necessitam de mais tempo e esforço, resultando num agravamento posterior dos sintomas. 18 www.nova-etapa.pt


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Os dados obtidos a partir de estudos com pessoas portadoras desta doença, evidenciam as suas consequências no seu desempenho do trabalho. No que respeita às tarefas fora do trabalho, as pessoas com LER podem ter dificuldade de desempenhar uma variedade de atividades da vida diária, tais como usar o telefone, escrever, cuidar da sua higiene pessoal, vestirem-se, conduzir, usar transportes públicos, entre outras. A realização destas atividades acarreta dor. Considerando o exposto, percebemos que esta doença acarreta incapacidades parciais e até invalidez. O tempo necessário para a recuperação é variável e depende do estágio em que se encontra a lesão, bem como de mudanças nos aspetos profissionais.

1.5.2 CONSEQUÊNCIAS PSICOLÓGICAS Uma lista de sintomas psicológicos tem sido associada com as LER. Entre os principais sintomas relatados incluem-se depressão,

sentimentos

de

incapacidade e inferioridade, irritação. As pessoas portadoras destas lesões são

frequentemente

descritas

como

ansiosas e/ou deprimidas. O sofrimento vivido por portadores de LER está associado à culpa e revolta por terem adquirido a doença, à impossibilidade de retomar afazeres antes assumidos, à incerteza da melhora e da cura. O impacto que sobrevém do contacto com as LER faz com que os portadores se defrontem com sentimentos de incapacidade física e psicológica perante a vida, desvalorizando-se com um abalo, por vezes intenso, do autoconceito, o que traz como consequência uma grande fragilidade interna (psicológica), quando o portador se percebe sem saídas e sem apoio. O facto de muitos dos portadores não terem qualificação para realizar outras atividades ocupacionais a não ser "trabalhar com mãos", e terem os movimentos manuais restritos, pode significar a impossibilidade de se inserirem em qualquer outra atividade. Algumas 19 www.nova-etapa.pt


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pessoas, embora sentindo dores, permanecem a trabalhar e têm medo de serem despedidas. Os doentes veem-se limitados, pressionados e vítimas da "engrenagem" em que vivem. Resultam desta situação quadros depressivos de intensidade variada de acordo com o que a pessoa "investiu" no seu trabalho.

1.5.3 CONSEQUÊNCIAS SOCIAIS Como as pessoas com LER não apresentam qualquer sinal visível inicialmente, isto é, sinais "objetivos" (inflamações, edemas, perda de sensibilidade, compressão de nervos entre outros) de compromisso anatomopatológico, como já referimos, mas "apenas" queixas de dor e sofrimento, fazem com que sejam consideradas criadores dos seus sintomas e podem ser rejeitadas e tratadas de maneira diferente por médicos, patrões, colegas de trabalho, amigos e até pelos membros da sua família. Tal situação pode tornar-se perversa, uma vez que a "materialização" destes sintomas significa muitas vezes, irreversibilidade do quadro e invalidez permanente.

Assim, alguns grupos na sociedade, contrários à visão geral de que existe uma relação entre esta lesão e o trabalho, procuram explicações alternativas, que em geral culpabilizam os portadores da doença.

Alguns tentam associá-la a uma forma de neurose de compensação, e atribuem ao portador o desejo inconsciente de um ganho secundário, normalmente financeiro. Outros consideram a doença uma desordem de conversão, onde a dor resulta de conflitos psicológicos não resolvidos ou distúrbios emocionais. Acreditam também, ser uma doença normal, um tipo de fadiga reversível, que pode ser aliviada com descanso.

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Surpreendentemente estas pessoas, além dos distúrbios acarretados pela doença, veem-se numa situação onde lhes são negados os direitos mínimos garantidos a portadores de patologias relacionadas com o trabalho: afastamento remunerado, tratamento, reabilitação profissional, garantia de trabalho em função compatível e estabilidade no emprego. Na maioria dos casos, após constatada a doença, inicia-se um outro processo que também acarreta sofrimento ao trabalhador, que consiste na procura de assistência nas instituições de saúde. Além das informações desencontradas a respeito do diagnóstico e do tratamento da doença, são obrigadas a enfrentar um longo processo burocrático para serem afastadas ou reformadas.

1.6

ASPETOS REFERENTES ÀS MEDIDAS DE TRATAMENTO E

PREVENÇÃO Com o propósito de prevenir o desenvolvimento das Lesões por Esforços Repetitivos, têm que ser considerados os seguintes aspetos:

Medidas de prevenção das LER • Projeto adequado das ferramentas e equipamentos que permita uma postura confortável e livre de esforço. Os trabalhadores devem ser consultados em todos os estágios de projeto e compra dos equipamentos. • O posto de trabalho deve permitir uma variação nas posturas. • Quando as tarefas exigirem atividades repetitivas ou estáticas prolongadas deve introduzir-se períodos de descanso. • Trabalho rotativo, modificação nas tarefas para diminuir o efeito de movimentos repetitivos e posturas estáticas. O trabalhador deve ser consultado permitindo uma integração entre o indivíduo e o trabalho. • O ritmo de trabalho não deve ser imposto pela máquina. Deve considerar-se a experiência do indivíduo no trabalho, a sua capacidade individual, o tempo necessário para se adaptar a novas tecnologias. Além disso, permitir a reintegração progressiva no trabalho após um período de afastamento. 21 www.nova-etapa.pt


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• Não devem ser encorajados os prémios de produção e monitorização eletrónica; estes fatores fazem com que os trabalhadores ultrapassem os seus limites pessoais. • Fatores físicos e sociais contribuem para aumentar o stress dos trabalhadores no ambiente de trabalho. Os fatores físicos: iluminação, ventilação, temperatura, humidade e ruído devem ser avaliados e seguirem as normas regulamentares. Os fatores sociais incluem: relacionamento interpessoal, a carga de trabalho, o estilo de gestão, a adaptação a novas tecnologias e as mudanças no local de trabalho. • Deve ser instituída uma formação direcionada a todos os níveis hierárquicos que inclua o conhecimento sobre a doença: sintomatologia, consequências, medidas de prevenção, princípios de tratamento e reabilitação. O objetivo principal das medidas ergonómicas é adaptar o trabalho ao Homem e não o Homem ao trabalho e desse modo pode evitar-se a incidência da LER. É no local de trabalho que o programa de reabilitação das pessoas obtém sucesso ou não, desempenhando o supervisor um papel importante. Os supervisores precisam de formação adequada para trabalhar com pessoas com limitações, desta forma elas serão reintegradas e não marginalizadas.

Ideia Chave As LER começaram a ser referidas no século XVIII. É na fase mais avançada da industrialização que a doença adquire mais importância, consequência do ritmo intenso forçado pelas máquinas e chefias. Atualmente a imposição do rendimento das máquinas sobre o Homem conduz às LER. Existem várias denominações e definições distintas consoante o país. No entanto todas convergem para a mesma causa, os movimentos e esforços repetitivos. Podemos destacar várias patologias, contudo as LER não podem ser detetadas por exames específicos, sendo necessárias outras investigações no ambiente do trabalho. As mulheres são particularmente afetadas devido ao tipo de trabalho que lhes é atribuído. As LER não só determinam consequências físicas, como psicológicas e sociais.

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