O clima mudou Ea
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AMÉRICA LATINA
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Olhares do Mundo
Revista produzida pelos alunos do Curso de Jornalismo do Centro de Comunicações e Letras (CCL) do Instituto Presbiteriano Mackenzie Direção: Profa. Dra. Esmeralda Rizzo Coordenação de Curso: Prof. Ms. Oswaldo Takaoki Hatori Coordenação Editorial: Profa Ms. Márcia Detoni Prof. Ms Edson Capoano Edição: Profa Ms. Márcia Detoni Projeto Gráfico: Cauã Taborda
Rua Piauí, 143 – CEP 01241-001 Fone: (11) 2114-8320 – São Paulo – SP www.mackenzie.com.br
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Apresentação
A coleção Olhares do Mundo faz parte do projeto “Aprendiz de Correspondente Internacional”, desenvolvido pelos alunos do sexto semestre do curso de Jornalismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie. O projeto está inserido na disciplina Jornalismo e a Política Internacional e busca proporcionar aos futuros profissionais uma experiência de cobertura jornalística fora do país ou de abordagem de questões nacionais para um público externo. Em 2009, por ocasião da Conferência do Clima (COP-15), realizada com grande expectativa no final daquele ano em Copenhague, na Dinamarca, o tema escolhido para a série de reportagens foi o meio-ambiente. “Olhares do Mundo” debruçou-se sobre uma pergunta fundamental em torno da questão. Notícias diárias sobre degelo nos polos, enchentes, deslizamentos e catástrofes naturais já não deixam dúvidas sobre a mudança climática no planeta. Mas e nós? O quanto mudamos? Estamos realmente dispostos e preparados para trocar o conforto contemporâneo - conquistado com o esgotamento dos recursos naturais - por um consumo mais moderado e sustentável dos bens do planeta?
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Em meio às discussões da COP-15 para a renovação do Protocolo de Quioto, que obrigava os países a reduzir suas emissões de gás carbônico, os jovens repórteres de Olhares do Mundo foram a campo para verificar de perto algumas ações e projetos de desenvolvimento sustentável na América Latina. A reportagem de capa, realizada no Peru pelas alunas Bruna Chieco, Helena Lopes, Larissa Godoy, Luiza C. Pereira, Mariana Viana, Paula Raeder e Paula Selmi, mostra a contínua dificuldade dos movimentos sociais para obter polítias públicas de preservação ambiental. Manifestantes que denunciam o desmatamento e extração de gás e petróleo em reservas indígenas na Amazônia peruana são confrontados de forma brutal pelo Exército. Trinta morreram e mais de 200 ficaram feridos num protesto em junho de 2009, na província de Baguá, no norte do país. No Uruguai, multinacionais da agroindústria transformam o país numa grande plantação de soja, esgotando o solo e expulsando o pequeno agricultor do campo, enquanto o Rio da Prata, antigo cartão postal de Buenos Aires, agoniza com dejetos lançados em suas águas por cinco países da região.
Enquanto isso no Brasil, a pressão popular, se não consegue barrar projetos de desenvolvimento que afetam grandes ecossistemas, pelo menos em alguns casos, tem forçado os governos a implantarem medidas de redução de impacto ambiental, como na transposição do Rio São Francisco, ou na exploração do pretróleo existente na camada de pré-sal. Depois de muita reclamação, usineiros no interior de São Paulo já estão adotando medidas para acabar com a poluição decorrente da queimada da cana. E não faltam projetos de reciclagem por iniciativa da própria comunidade. Os argentinos estão reciclanto até automóveis, em um projeto inovador. Para os países ainda em vias de desenvolvimento, como os latino-americanos, abrir mão da exploração de recursos naturais em prol da manutenção da biodiversidade é um grande dilema. E não só para os governantes e as elites, como nos mostra a reportagem de Luisa Purchio e Roseane Aguirra, em Cabrobó, no interior de Pernambuco. O sernatejo sofrido celebra a geração de empregos gerados pela transposição do São Francisco, mesmo sabendo que isso pode debilitar o rio e todo o ecossistema ligado a ele, como alertam ambientalistas. Trata-se de uma questão básica de sobrevivência. O dilema, no entanto, não é só latino-americano. O fracasso da renovação do acordo de Quioto na conferência de 2009 na Dinamarca evidencia a relutância dos países ricos onde não há fome nem pobreza extrema - de reduzir o uso de gás e petróleo para evitar o superaquecimento do planeta. O documento produzido na COP-15 não recebeu o aval de todos os países signatários da Convenção do Clima. Segundo o último balanço da ONU, 113 dos 192 países da Convenção aderiram ao Acordo de Copenhague, bem mais leve que o de Quioto. O novo acordo prevê um limite de 2ºC para o aumento da temperatura global, mas não detalha como essa meta será obtida. O acordo deixa os países livres para propor metas de redução de emissões poluentes de forma voluntária. As negociações continuam, mas poucos são otimistas em relação à aprovação, a curto ou médio prazos, de medidas eficazes de combate ao efeito estufa. Há muito ainda
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que avançar e os jornalistas não podem se eximir da função social de mediação do debate sobre as mudanças climáticas e seus efeitos. O grande desafio, do momento, é apresentar a informação ao público de forma clara, simples, dentro de uma perspectiva de prestação de serviço público, não só para conscientizar, mas para envolver, engajar, motivar a mudança de comportamento. Para os jovens repórteres de “Olhares do Mundo”, ainda em fase de formação profissional, esta foi a primeira oportunidade de aprofundamento no tema. Para muitos também foi o primeiro trabalho de apuração da notícia fora de casa, em meio às pressões de um espaço desconhecido. Voltaram para a sala de aula vitoriosos, amadurecidos pela prática e com boas histórias para compartilhar. Esperamos que o leitor goste do resultado.
Professora MS. Marcia Detoni
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Uruguai
Monocultura da soja esgota o solo e expulsa pequeno agricultor do campo Com incentivos do governo uruguaio, grandes empresas de agronegócio compram terras de pequenos agricultores, destroem a tradicional rotação de cultivos e tranformam o país numa grande plantação de soja, a comoditie agrícola mais cobiçada pelo mercado internacional Por Janaína Vieira, Maíra Vargas e Renata Razera O Uruguai das grandes pastagens e fazendas de gado esta desaparecendo. Em seu lugar surge, agora, o Uruguai da soja. Dez anos atrás, o cultivo da soja ocupava 14 mil hectares, hoje a leguminosa ocupa mais de 500 mil hectares, sendo que, desses, mais da metade são argentinos. Os produtores optaram pela monocultura da soja em função da alta cotação do produto no mercado internacional, que precisa do produto na alimentação dos animais e na produção de biocombustível. Os argentinos também atravessaram a fronteira para expandir seus negócios na área. "Eles vêm ao Uruguai porque aqui o governo não retém nada de sua produção, ao contrário do que acontece na Argentina. Aqui a terra é mais barata e exporta-se sem nenhum tipo de retenção", diz Maria Ortiz, ativista da ONG de defesa do meio am8
biente Amigos da Terra, presente em mais de 20 países. Segundo ela, o governo não quer impor uma retenção de mercadorias às empresas argentinas temendo um impasse diplomático ainda maior, visto que as relações entre Argentina e Uruguai estão abaladas (por que????). A monocultura do soja foi estimulada pela chegada de empresas estrangeiras de agronegócio, que compraram terras no pais em função dos incentivos oferecidos pelo governo, como a ausência de retenções e isenção de impostos dados dez anos antes para que o setor privado plantasse cerca de 30.000 hectares de floresta sustentável e renovável. De acordo com Maria Ortiz, a corrida pela expansão do soja fez com que 25% das terras produtivas mudassem de proprietário, sendo que 80 % das transações de venda ocorreram com pequenos produtores. O
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Uruguai, segundo ela, vive uma espécie de extinção do produtor familiar. Na ONG, Maria e outros ativistas aplicam um conceito de desenvolvimento que está diretamente ligado à criação de capacidades locais para que as comunidades possam assumir o controle de seu próprio processo de desenvolvimento. Há medidas tomadas pelo governo para proteger os agricultores familiares, todavia não são muito eficazes. A professora de agronomia da Universidad de la República, Estela Farofa, teme que ocorra no Uruguai o que já acontece em outros países vizinhos, como a Bolívia e a Argentina: "Planta-se soja, soja e mais soja; os solos ficam mortos. Aqui tínhamos uma agricultura tradicional, de rotação; mas a produção atual fica concentrada apenas na soja, por uma questão de rentabilidade. Porém, há um limite: com o tempo, o solo se esgota, não há como retornar à terra estes nutrientes, e se esgota também a produtividade". Outro problema, é o cultivo de eucaliptos para produção de celulose. Ortiz observa que, nos anos 90, o governo uruguaio aprovou a Lei Florestal que visava promover um programa de exploração florestal sustentável e que determinava o reflorestamento. Várias multinacionais entraram no pais com isenção de impostos prevista nesta lei. O plantio de eucaliptos ocupa cerca de um milhão dos 16 milhões de hectares existentes no pais para cultivo. “Parece uma proporção pequena, se 10
comparada com o Brasil. Mas, tratando-se de um país pequeno como o nosso, é muita coisa", comenta Ortiz. Dentre as principais características do agronegócio apontadas por López estão a monocultura voltada para exportação, com emprego de grandes áreas verdes, desenvolvimento de tecnologias para o campo, uso de agrotóxicos e adubos químicos. Ele afirma que tais produtos agridem o meio ambiente e enfraquecem a economia dos país da América Latina, uma vez que beneficia as transnacionais do agrobusiness. Segundo pesquisa da CLOC (Coordinadora Lationamericana de Organizaciones del Campo), entre os 27% de crescimento que a soja terá até 2010, 14% será utilizada na alimentação de animais, principalmente de frangos, e 13% na geração de bioenergia, as duas principais demandas dos países no futuro, e que o aumento da demanda de alimentos aumentará aproximadamente 140% nos próximos anos, fato que provocará o aumento da exploração das terras e da utilização dos cultivos modificados geneticamente. Destoando dos outros países, o agronegócio no Uruguai iniciou com o plantio industrial de pinus e de eucalipto para a produção de celulose. Incentivado e financiado pelo Banco Mundial na década de 70, o governo uruguaio recebeu diversos empreendimentos de multinacionais. “Com o reflorestamento, 35 mil camponeses deixaram o campo nos últimos 30 anos, gerando desemprego para
cerca de 80 mil pessoas”, analisa Alberto Villareal, do grupo ambientalista Redes. Hoje, a monocultura das árvores cresce na média de 70 mil hectares por ano. Pequenos Produtores Para Adela Sánchez, da faculdade de agronomia da Universidad de Córdoba, o ministério da agricultura recentemente lançou políticas públicas com o intuito de estimular a renda dos pequenos agricultores localizados na porção norte, sobretudo na província de Rivera, fronteira com o Brasil. É a chamada Lei de la Conservación de la Tierra. Para Maria Ortiz, contudo, alega que a lei não tem o devido alcance aos pequenos proprietários rurais e precisa de um período maior para sua plena implementação. Dados do Censo Agropecuário de 2000 apontam que para cada mil hectares, o plantio de eucalipto emprega até cinco trabalhadores. Número menor do que a própria pecuária, que emprega em média até 6 trabalhadores e a fruticultura, que chega a 71 trabalhadores por mil hectares. “Isso produziu uma segunda onda de esvaziamento do campo. Tem se fechado escolas rurais. Verifiquei em povos pequenos que trabalham com as fazendas vizinhas onde tem sido fechadas [abandonadas] porque ficaram sem água. Os poços ficaram secos”, relata o jornalista Uruguaio Victor Bacchetta em seu livro, “A Fraude da Celulose”.
O sindicalista dos agricultores, Carlos Alarcón López defende que em muitos países da America do Sul, a presença maciça da soja merece maior atenção das instituições formais, e que as denúncias tem reunido cada vez mais pessoas em prol da causa. Para essas nações, a Syngenta, multinacional de atividade científica para aumentar a produtividade dos cultivos, denominou de República Unida da Soja. A prática da monocultura gera problemas ambientais preocupantes como a erosão e o esgotamento de nutrientes do solo, além do impacto dos herbicidas no solo. Muitas das florestas renováveis de eucaliptos foram plantadas em terras não cultivadas que antes eram usadas como pastagens para gado. Ainda hoje, cerca de 80% das terras dessa parte do Uruguai são utilizados para criação de animais. No entanto, com a deterioração dos pastos e a queda da demanda de carne bovina pelo mercado, os produtores tiveram de diversificar. Além das florestas de eucaliptos no norte e noroeste, foram introduzidas plantações de girassóis, trigo e soja no sul (dados do Banco Interamericano do Desenvolvimento). Para combater os prejuízos causados pelas monoculturas ao meio ambiente e a população, movimentos sociais disseminam informações em sites da Internet, que reúnem entidades latinas em defesa da biodiversidade em geral. 11
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Peru
Exploração da Amazônia provoca conflitos entre governo e indígenas Ambientalistas acusam governo de Alan García de permitir a exploração da floresta em reservas indígenas. O Ministério do Meio Ambiente nega o desmatamento nessas áreas. Conflitos entre manifestantes e exército deixaram mais de 30 mortos e 200 feridos Por Bruna Chieco, Helena Lopes, Larissa Godoy, Luiza C. Pereira, Mariana Viana, Paula Raeder e Paula Selmi
O movimento indigenista peruano, apoiado por organizações ambientalistas nacionais e internacionais, e o governo de Alan García estão em pé de guerra. Os ativistas acusam o governo de explorar recursos naturais em reservas indígenas – território que, por lei, pertence aos índios, mas é dividido com madeireiros, empresas petrolíferas e plantadores ilegais de coca. Segundo as ONGs, a exploração econômica da floresta amazônica peruana pode levar à extinção de várias tribos. “O manuseio de concessões florestais [no Peru] é corrupto. Os territórios são reconhecidos apenas no papel, mas, na verdade, se eu como Estado, declaro que esta
área é concessiva, que pena, os índios terão que sair... a não ser que venha outra pessoa que pague mais e leve a concessão”, disse ao Olhares do Mundo a ativista Maria Teresa Colque Pinelo, da ONG peruana Associação Civil Labor, referindo-se às licenças de exploração florestal que o governo de García tem dado a diversos grupos econômicos. Os movimentos sociais protestam, mas a reação é brutal. Em junho de 2009, o exército entrou em choque com os índios que se manifestavam na província de Baguá, no norte do país, contra a extração de petróleo e gás nas reservas e contra a privatização dessas terras. No conflito, que ficou conhecido na mídia e entre as ONGs como o Massacre 13
de Baguá, cerca de 30 pessoas morreram e mais de 200 ficaram feridas. Mas esses são dados oficiais. Algumas ONGs dizem que o número de vítimas foi ainda maior. Alguns dias antes do confronto, os índios haviam iniciado um protesto pacífico. Bloquearam estradas e rios, reivindicando o cumprimento do Convênio 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) que prevê o direito de consulta das populações indígenas sobre as leis que o Estado impõe a elas. Em Baguá, o protesto era contra a lei aprovada pelo governo que permitia a exploração de petróleo em reservas indígenas sem o consentimento das populações afetadas. O governo reagiu decretando estado de emergência e autorizou a intervenção militar no protesto. García apareceu em rede nacional afirmando que “o tempo para diálogo havia acabado” e que era “hora de trazer a ordem de volta ao país”. O Massacre de Baguá provocou reações no mundo inteiro. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) solicitou ao governo a emissão de um informe garantindo o cumprimento da lei que prevê a participação efetiva dos povos indígenas nas questões envolvendo as áreas habitadas por eles. Instituições como a ONU e ONGs estrangeiras como a Anistia International e a Survival International também pressionam o governo peruano para que cumpra o direito de consulta previsto no Convênio 169-OIT. “A tragédia de Baguá mostra que as 14
autoridades prometeram consultar os povos indígenas antes de aprovar projetos, mas, mais uma vez, atuaram contra a vontade das comunidades locais”, disse a Survival International, principal ONG europeia de defesa dos interesses indígenas, em nota enviada ao Olhares do Mundo. “O governo não pode mais demorar a atender às necessidades dos habitantes indígenas do país e a respeitar seus direitos territoriais”, enfatizou. Governo nega desmatamento Alan García foi presidente do país de 1985 a 1990, retornando ao poder em 2006 pelo Partido Aprista Peruano, social-democrata. Seu primeiro mandato terminou em meio a uma forte crise econômica e a violência rebelde do grupo esquerdista Sendero Luminoso. O desafio, agora, parece ser conciliar a necessidade de desenvolvimento econômico com a preservação ambiental. Seu governo nega que esteja explorando áreas indígenas ou sendo agressivo e injusto com as tribos. Em entrevista ao Olhares do Mundo, o assessor de gabinete do Ministério do Meio Ambiente Julio Victor Ocaña Vidal disse que a relação entre o governo e os índios é, hoje, muito boa. “Eles estão conosco e há mais coincidências do que contradições. Estamos de acordo com os índios, com suas idéias de preservação. Queremos fazer o que os índios peruanos querem, e os indígenas peruanos querem ser iguais aos
peruanos”, afirmou. Segundo ele, não há desmatamento em áreas indígenas. Ocaña admite, porém, que pode haver falhas na fiscalização. “Não dá para ter uma fiscalização total, é impossível. No total são sete milhões de hectares que têm a concessão ambiental, mas sempre há extração de madeira ilegal”. A advogada Milagros Sandova, do programa florestal da SPDA (Sociedad Peruana de Derecho Ambiental), ressalta que o governo de García assume, em relação aos indígenas, posições e atitudes diferentes das tomadas pelo ex-presidente Alejandro Toledo, economista de origem indígena, do partido moderado Peru Possível, que governou o país de 2001 a 2006. “No governo de Toledo, quem cuidava das reservas era o INDEPA (Asociación Interétnica de Desarrollo de la Selva Peruana), que é como a FUNAI no Brasil. Mas, com o governo atual de Alan García, esse tema ficou em segundo plano. O INDEPA virou parte do Ministério da Mulher e do Desenvolvimento Social. Ou seja, no Peru o Ministério da Mulher também cuida do desenvolvimento social. Dentro desse ministério há um escritório que não é politizado, não representa nada para os indígenas. Uma FUNAI assim não serve e não faz muito pelos indígenas”, diz Milagros. O Peru, segundo ela, necessita com urgência de uma instituição que represente os povos indígenas, como a FUNAI faz no Brasil. “Falta uma instituição que defenda e
apóie os índios no Peru. Há uma instituição não-governamental [AIDESEP- Associación Interétnica de Desarollo de La Selva Peruana], mas ela não tem respaldo. Tínhamos o INDEPA, mas agora não temos nada”. As poucas instituições peruanas que atuam diretamente em prol dos povos indígenas são as ONGs. Uma das mais atuantes é a AIDESEP, citada por Milagros, criada em 1980 e que representa 350 mil indígenas na Amazônia peruana. A instituição enfrentou pressões do governo, que havia ameaçado dissolvê-la três dias depois do Massacre de Baguá, acusando-a de ser a responsável pela mobilização dos manifestantes. No entanto, cinco meses depois, o governo retirou o pedido de encerramento das atividades da AIDESEP. Além de não ter um órgão de defesa dos indígenas, o Peru passou muito tempo sem um órgão responsável pelo meio ambiente. O Ministério do Meio Ambiente (MINAM) só foi criado em maio de 2008 e há muitas críticas em relação à sua atuação. O ambientalista da FUNAI, José Carlos Meirelles, responsável pela coordenação da Frente Ambiental de Proteção Etno-Ambiental do rio Envira, diz que o MINAM poderia ser mais atuante. “[O MINAM] não ajuda em absolutamente nada. O governo só o criou para efeito de mídia. As pessoas não têm a mínima condição de saber o que está acontecendo nessas áreas que existem aqui na Amazônia”. 15
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Meirelles trabalha diretamente com indígenas que têm fugido do Peru para o Brasil por causa do desmatamento na floresta peruana. Meirelles confirma que existe exploração em territórios indígenas peruanos, inclusive por parte da Petrobras, que está entre as empresas autorizadas a atuar na região. “A Petrobras tem o lote 110, que fica em cima da área Murunahua, de índios isolados, coisa que ela jamais faria aqui no Brasil, ela faz lá no Peru. Cuida das tartaruguinhas daqui e explode dinamite em linha sísmica, em área de isolados no Peru”, afirmou. Procurada por nossa reportagem, a Petrobras não quis se pronunciar sobre o assunto. Anthony Jo Noles, coordenador da ONG Labor em Lima, observa que, antes de assumir o poder, o atual ministro do Meio Ambiente, Antonio Brack Egg, era um ecologista mundialmente reconhecido, inclusive pelas ONGs peruanas. “Mas, ao assumir o ministério, baseou a política ambiental numa visão produtiva. Não há absolutamente nada que vise aos princípios de conservação e preservação da biodiversidade. Temos um ministro que tem feito muito pouco do que o governo precisa fazer”, declarou Noles.
caráter político, como a AIDESEP, atuam para que o Estado peruano cumpra as poucas leis que defendem os povos indígenas e modifique aquelas que não estão de acordo com seus direitos. A principal proposta de modificação da AIDESEP é referente à Lei N° 28736, que permite a realização de atividades extrativas em territórios indígenas, não reconhece essas terras como sendo dos índios e não contempla punição para quem não cumprir a norma que protege os povos em isolamento ou em contato inicial. Os ambientalistas denunciam que o governo de Alan García tem gerado normas para facilitar o ingresso de empresas exploradoras na Amazônia peruana. De acordo com dados publicados pela organização brasileira Centro de Trabalho Indigenista (CTI), só as concessões petroleiras dessa região saltaram, em apenas três anos, de 15% para 70%. A Survival divulgou o nome de outras empresas que, além da Petrobras, atuam em territórios indígenas no Peru: Perenco (Cingapura), Repsol-YPF (Espanha-Argentina), Conoco Phillips (Estados Unidos), Petrolifera (Canadá) e Hunt (Estados Unidos).
Limites da legislação
Problemas na fronteira
A legislação ambiental peruana ainda apresenta grande limitação e atraso em relação aos direitos indígenas. Diante dessa falta de representatividade, organizações sem
Recentemente, segundo a ONG Survival International, índios isolados do Peru fugiram para o Brasil porque madeireiros ilegais teriam invadido a reserva indígena 17
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Murunahua, localizada na região de Ucayali - responsável por 85% da extração do mogno peruano que é comercializado internacionalmente. Por conta disso, seus habitantes foram forçados a se deslocar cerca de cinco quilômetros para dentro do território brasileiro em busca de mais segurança. José Carlos Meirelles, da FUNAI, afirma que, nessa região de fronteira entre o Brasil e o Peru, as madeireiras estão cortando mogno em reservas indígenas, porque nas áreas de extração legal esse tipo de madeira está se esgotando. Diz ainda que os índios que migraram para o Brasil estão sendo atendidos pela FUNAI. “Eles são bem vindos, e estamos protegendo-os, da mesma forma que protegemos os outros”, disse Meirelles. Segundo o pesquisador da FUNAI, aproximadamente 100 índios peruanos estão vivendo no Brasil. “Essa nova política dos índios isolados e a criação da coordenação desses índios é um trabalho novo que tem muitas perspectivas. Estamos demarcando terras para os índios isolados sem entrar em contato com eles”, contou. Os principais problemas na fronteira peruana se localizam nos departamentos de Loreto, Ucayali e Madre de Dios. Nessas regiões o conflito de comunidades indígenas e de ONGs com o governo, empresas exploradoras e plantadores de coca, é intenso e complexo. Esses grupos brigam pelo direito 20
de usar a terra, inserida em uma das áreas de maior biodiversidade do mundo. Outro problema da fronteira peruana é o destino da floresta. A Amazônia tem 7,8 milhões de km² e está em nove países. O Peru abriga 13% desse total e é o segundo país com a maior porção da Amazônia, perdendo apenas para o Brasil. ONGs como a AIDESEP têm lutado para impedir o governo de abrir a Amazônia peruana para a exploração de petróleo, gás e mineração, e para que se preservem as áreas de comunidades de índios não contatados, alegando que essas tribos podem morrer e entrar em extinção. Há temores de que essa área possa ser entregue a empresas estrangeiras, em especial dos Estados Unidos, e de que a água da região seja privatizada – fatores que, inclusive, motivaram os protestos em Baguá. Questão de sobrevivência Estima-se que existam, no Peru, 15 comunidades indígenas isoladas vivendo em terras que, pela lei, deveriam ser protegidas pelo governo para preservação da cultura e do modo de vida desses habitantes. A instalação de empresas nesses locais acaba com a harmônica relação entre os índios e a natureza, poluindo os rios, cortando as árvores que servem de sustento para esses povos e obrigando as comunidades a se mudarem para outros territórios mais se-
guros, onde ficam mais expostas às doenças e contaminações. A Survival estima que, por conta das explorações e do desmatamento, metade desses índios morrerão, pois os povos isolados não têm anticorpos para doenças comuns, como a gripe. Mesmo que esses índios sobrevivam às contaminações causadas pelo contato com outras populações, a sua cultura não sobreviverá, alerta a Survival. “O desmatamento destrói o lar das tribos, sua subsistência, a fonte da sua comida e medicina, a base onde a sua sociedade e cultura está construída”, disse o pesquisador David Hill, do escritório da Survival em Londres, em entrevista por e-mail. Segundo a engenheira da PUC de Lima, Veronica Vines, especialista em meio ambiente e ecomoradias, as comunidades indígenas encontradas na selva e na serra peruanas são muito diferentes. “Na serra os índios são mais civilizados e trabalham em conjunto com os peruanos. Na selva, os índios querem manter as tradições, e é difícil fazer acordos ou trabalhar com eles, pois não querem contato com os peruanos”, diz a engenheira. Ao contrário do que disse o assessor do Ministério do Meio Ambiente, de que os indígenas querem viver como os demais peruanos, Milagros, da SPDA, observa que o desejo dos índios é manter o seu estilo de vida e viver da floresta à sua volta. “Os índios querem ficar em suas terras e querem que essa decisão seja respeitada”, afirma.
Silêncio da mídia Os ambientalistas ouvidos pelo Olhares do Mundo criticam a cobertura dos problemas ambientais e indígenas na mídia peruana. O assessor de imprensa da ONG Labor, Jorge Armando Villanueva, diz que o tema não recebe atenção e, quando acontecem fatos que não podem ser escondidos, como o Massacre de Baguá, os meios de comunicação peruanos não costumam utilizar ONGs como fonte. “Os meios mais importantes e de maior alcance estão com o governo, até o momento em que aconteça algo que seja insustentável, como o que aconteceu em Baguá. Quando há algum meio, algum jornal, que, de repente, se anima a dizer verdades é porque visa mudanças (políticas)”, afirma Villanueva. Ele comenta que, no caso do Massacre de Baguá, enquanto o protesto acontecia na região, apenas alguns veículos informavam o que estava acontecendo. Quando os policiais chegaram à cidade para interromper o manifesto, a imprensa cobriu o confronto com poucas e antagônicas informações. “O único meio que havia no local, uma rádio, foi fechada porque a acusaram de estar criticando o governo e a polícia”, declarou a ativista Maria Teresa, da Labor. Villaneuva acrescenta que, durante os conflitos, a população limenha recebeu poucas informações do que acontecia no próprio país. “A internet mostrou as versões mais 21
Estima-se que existam, no Peru, 15 comunidades indígenas isoladas vivendo em terras que, pela lei, deveriam ser protegidas
reais dos fatos. Porque a televisão dizia que eram os nativos que estavam atacando”, comentou. Stephen Corry, diretor da Survival International, salienta que a causa indígena peruana precisa ter mais visibilidade nacional e internacional. “Para muitas pessoas ao redor do mundo, a primeira coisa que vem à mente quando pensam no Peru é Machu Picchu, uma das maiores atrações turísticas da América do Sul. O Peru agora está em risco de ser mais conhecido por um governo repressivo e determinado em destruir o mo22
vimento indígena do país”, afirmou. Meirelles observa, por sua vez, que a opinião pública nacional e internacional, abastecida por informações da mídia, é a maior aliada que os indígenas podem vir a ter. “Mas se a imprensa insistir em publicar informações erradas, desencontradas e se ater somente à polêmica e ao exótico, estará prestando gratuitamente um ótimo serviço aos interesses dos madeireiros ilegais, concessionários de lotes petrolíferos e minerais ou agentes do agronegócio que cobiçam e invadem o território desses povos”.
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Argentina
Reciclagem de automóveis evita contaminação do solo nos depósitos de ferro-velho e permite o reaproveitamento de metais Adotado para evitar furto de peças, programa pioneiro na América Latina e visto hoje também como exemplo ambiental Por Adriane Schultz, Aline Lamas, Mariana Gasparetti, Milena Nepomuceno e Priscila Cellino Pára-choque amassado, lataria remendada, pneus carecas, escapamento e catalisador obsoletos. Nas ruas de Buenos Aires, é comum encontrarmos veículos neste estado. Ao contrário dos brasileiros, os argentinos não têm o hábito de trocar de carro com freqüência e, desde 2005, passaram também a reciclar a frota sucateada. O destino desses “velhinhos” não é mais, necessariamente, o ferro-velho. Muitos deles são encaminhados para um enorme galpão na cidade de Pilar, a 54 km da capital argentina, sede do Centro de Experimentação e Segurança Viária (Cesvi). Com chão sujo de óleo, pecas de automóveis espalhadas por todos os cantos e pouca luz, as instalações do Cesvi parecem 24
uma grande oficina mecânica. O espaço recebe anualmente 2200 carros que acabam transformados em cubos compactos de pouco mais de um metro. Antes, eles passam por um processo quase artesanal de reciclagem. Cinquenta funcionários retiram dos veículos os poluentes, que são enviados para empresas especializadas em seu tratamento. Esse procedimento evita a contaminação do solo por combustíveis, óleo lubrificante, bromo da bateria, fluídos de freio e embreagem. Além disso, impede que o gás CFC, contido no ar condicionado, entre em contato com a atmosfera. “Alguns resíduos podem atingir os lençóis freáticos. Isso gera danos ao ecossistema e principalmente à população
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que ainda utiliza poços d’água”, explicou o subcomissário Ricardo Nicolas Douna, do Departamento de Delitos Ambientais da Polícia Federal argentina. Depois da retirada dos liquidos poluentes, é a vez das peças do motor e do interior do automóvel serem reaproveitadas para abastecer o mercado, enquanto o aço, o alumínio, o vidro e os pneus viram matéria-prima. Inaugurado em 2005, o centro já recuperou mais de 25 mil peças de 8 mil automóveis. “Reciclamos 100% dos veículos que ingressam”, afirma Fábian Pons, diretor do Cesvi. A reciclagem de automóveis é boa para o meio-ambiente porque evita a contaminação do solo nos depósitos de ferro-velho e reaproveita os metais. Mas o projeto começou mesmo como uma medida para coibir o roubo de automóveis no país, que conta, atualmente, com uma frota de 8,5 milhões de veículos (2 milhões deles, na capital). A grave crise econômica que a Argentina enfrentou a partir de 2002 atingiu a venda de automóveis e a importação de autopeças, resultando no envelhecimento da frota e no aumento do roubo de carros, principalmente na região da Grande Buenos Aires. “O sistema de segurança dos veículos está cada vez melhor, com maior tecnologia. E, para roubá-los, os ladrões passaram a usar mais violência”, contou Juan Pablo Sassano, diretor nacional de Fiscalização de Desmanches e Autopeças da Argentina, acrescentando que o roubo de 26
automóveis no inicio da década chegou a ser responsável por 30% dos homicídios. Para amenizar o problema e conter o comércio ilegal de pecas, o Congresso argentino aprovou, em 2003, a Lei de Autopartes, que regulamenta o comércio de componentes automotivos e, em especial, a atuação dos desmanches. Com isso, nasceu um mercado legal de autopeças usadas, identificadas por um selo oficial: o Rudac (Registro Único de Desmanche de Automotores e Atividades Conexas). A legislação conseguiu reduzir em 70% o furto de veículos e seus itens, uma vez que somente os estabelecimentos certificados podem comercializá-las. Ao legalizar os desmanches, a lei obrigou também esses locais a terem cuidados com as peças, o que não acontecia nas atividades ilegais. Caso não estejam dentro das normas ambientais, os estabelecimentos perdem o direito de funcionar. Entre 2007 e 2008, foram registradas 500 infrações em desmanches de todo pais. “No entanto, ainda não tivemos nenhuma condenação. Isso porque o processo de análise das substâncias pode levar tempo”, observou Ramiro Gonzáles, fiscal federal da Unidade Fiscal Ambiental (Ufima), órgão que fiscaliza e investiga esses locais. A Ufima trabalha em conjunto com o Ministério de Segurança Interior e com a Polícia Federal, realizando operações em desmanches, que muitas vezes partem de denúncias relacionadas ao meio ambiente.
Brasil Segundo dados do Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores (Sindipeças), o Brasil tem uma frota de 33 milhões de veículos, sendo 77% deles automóveis. Destes, apenas 1,5% é reciclado. Diferentemente da Argentina, não existem leis no país que regulamentem os desmanches. Mas o Brasil já estuda a adoção de um modelo semelhante ao argentino. “Há dois projetos tramitando no Congresso Nacional”, comentou José Aurélio Ramalho, diretor do Cesvi Brasil. O Centro de Experimentação e Segurança Viária brasileiro trabalha, atualmente, na implantação de um núcleo de reciclagem que, a princípio, receberá automóveis inutilizados após acidentes. A idade da frota brasileira varia de 12 a 15 anos, pois sua troca é estimulada. Isso contribui para o abandono de veículos antigos. “Não existe uma política clara para destinação de carros no país”, relata José Ramalho. A Argentina é pioneira na America Latina na reciclagem de automóveis, ainda que esteja distante dos padrões encontrados em países desenvolvidos. Nos Estados Unidos, 95% dos carros são compactados, marca que a União Européia pretende atingir nos próximos 5 anos, com a promulgação do programa de reciclagem ELV (End of Life Vehicles), nome em
inglês para Veículos em Fim de Vida. Na Europa, as montadoras são responsáveis pelo destino final daquilo que produzem. Isso estimula o uso de materiais de fácil reaproveitamento. Enquanto isso, o Japão recicla 90% dos air-bags em seu território. Assim como a Europa, ele estipulou um prazo para que 70% dos automóveis sejam compactados.
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Argentina
Antigo cartao postal de Buenos Aires, Rio da Prata agoniza com dejetos lancados por cinco paises No passado, peixes de mais de 50 kg faziam os pescadores locais prosperassem. Hoje, a pesca em determinadas regiões está proibida por lei para evitar o consumo de peixes envenenados Por Daneil Cot, João de Melo, João Vidal e Rodrigo Miguel O Delta do Rio da Prata, com inúmeras praias, tanto fluviais como oceânicas, foi durante décadas local de recreação para os portenhos, de refugio para moradores cansados do estresse da cidade e um dos principais pontos turísticos de Buenos Aires. Hoje, no entanto, a vista das águas é suplantada por cheiros inconvenientes. O rio , que um dia foi motivo de orgulho para a cidade, acabou se transformando num estorvo para as cerca de 10 milhões de pessoas que lá vivem. O Golfinho do Rio da Prata é outro que sofre diariamente com as águas pestilentas. Este cetáceo que só existe na na regiao corre serio risco de extinção e, se nada for feito, mais uma espécie podera desaparecer, em breve, dos livros de biologia. Além dele, a 28
fauna aquática local diminui diariamente e a biodiversidade vai se esvaindo em meio ao lixo e ao esgoto domestico e industrial . “As praias são infectadas todos os dias por dejetos tóxicos provenientes de indústrias, de esgotos sem tratamento algum de toda a grande Buenos Aires, e de agrotóxicos que as águas das chuvas trazem das plantações que se espalham pelo interior da América do Sul”, disse ao Olhares do Mundo, por telefone, Miguel Rementeria, presidente da Comissão Interdisciplinar do Meio Ambiente, Cima. Claudio Bertonatti, diretor da fundação Vida Silvestre da Argentina, observa,
por sua vez, em entrevista por telefone, que não apenas o meio ambiente é afetado. A economia também: o preço da limpeza das águas para o abastecimento da população é muito alto. Perde-se também quando o assunto é turismo, bem estar social e esportes, já que a região não mais possibilita banhos de mar nem o exercício de atividades como a natação. O tradicional área de recreação das famílias de Buenos Aires, tornou-se um esgoto a céu aberto que ninguém consegue freqüentar. Mas a Argentina não é a única culpada pelas mazelas da bacia do Rio da Prata. Os vizinhos como o Uruguai, Brasil, Bolívia e Paraguai também fazem parte do problema. O rio é alimentado por dezenas de afluentes que nascem nesses países e que, ao atravessá-los, recebem em forma de sulfatos, sulfetos e sulfitos, o descaso de grandes corporações, inclusive do Poder Publico. A poluição aumenta em efeito domino: um rio poluído deságua no outro que deságua em mais um, fazendo do Prata um verdadeiro esgoto de todos os outros. No caso de São Paulo, o rio Sumaré desemboca no rio Piracicaba, que por sua vez é afluente do rio Tietê, que depois de atravessar uma das cidades mais poluídas do mundo, São Paulo, deságua no rio Paraná, que cai diretamente no Rio da Prata. Ou seja: todo esgoto de cidades como Campinas, Piracicaba, Americana e São Pau-
lo acaba poluindo o delta do Prata na cidade de Buenos Aires. Douglas Guzzo , presidente da Companhia Paulista de Força e Luz de Americana e ex- presidente do Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente da cidade, explica de onde vem toda essa sujeira : “Existem dois tipos de poluição,, a do homem que joga o esgoto e resíduos industriais no rio sem tratamento ou com tratamento inadequado, e a do gado, que é mais grave, pois existem mais de 250 milhões de cabeças só na região. O gado, ao defecar emite na atmosfera muito metano, um dos principais gases do efeito estufa; quando seus dejetos se deterioram no chão, resíduos acabam indo para as águas por meio das chuvas, causando enorme poluição nos rios.” Comunidades ao longo de todos os afluentes que formam a bacia do Rio da Prata estão morrendo aos poucos, assim como sua cultura e sua história, afirma Ana Petra de Marzolini, presidente da Associação Ambientalista Ecolapaz Em entrevista por telefone, ela contou ao Olhares do Mundo que as comunidades ribeirinhas dependentes da pesca estão se mudando para as cidades em busca de novas oportunidades. No passado, peixes de mais de 50 kg faziam os pescadores locais prosperassem. Hoje, a pesca em determinadas regiões está proibida por lei para evitar o consumo de peixes envenenados. Da mesma forma, o plantio de arroz e soja, principal 29
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fonte de renda de muitos agricultores que Solução vivem apenas daquilo que plantam, depende “Pouco ou nada, é o que está sendo de inundações geradas pelo rio, agora im- possíveis por causa da poluição. feito para a solução do problema”, acusou em contato telefônico Miguel Rementéria. E O problema estende-se ainda mais. ponderou: “O fato é que não está na pauta Ana Petra diz que o rio Paraná, principal do governo argentino a melhoria de vida dos foco de estudo da ONG, um dos principais argentinos com a despoluição do Rio da Praafluentes do rio da Prata e também um dos ta”. mais poluídos, recebe águas oriundas não Existem alguns planos, tanto nacionais somente do Brasil, mas também da Bolívia através do rio Vermelho, totalmente poluí- como internacionais para amenizar a poludo pelas indústrias de refino de petróleo do ição do rio, contudo, eles são frequentemente país Andino. Outro problema, segundo ela, desrespeitados. No Brasil, Douglas Guzzo, de são as hidrelétricas ao longo do rio. “O Bra- Americana, diz que nao faltam planos ambisil possui mais de 20 hidrelétricas no leito entais, mas uma fiscalizacao mais rigida. “Eh do rio Paraná, o que ajuda na poluição do muito difícil combater as grandes indústrias rio, destrói a vegetação e expulsa animais e os grandes produtores de gado”, afirma. que se instalaram na região, e dessa forma, “O tratamento (dos esgotos) é muito caro, e o ecossistema é inteiro abalado e peixes com a minimização de poluição é muito lenta.“ Uruguai e Argentina firmaram um tratmais de cinqüenta quilos que outrora eram abundantes, hoje não existem mais.” Apesar ado para a redução de dejetos nos rios que de alguns especialistas dizerem que a con- têm em comum, o Uruguai e o da Prata,: strução de hidrelétricas ajuda na limpeza dos o FREPLATA (Proteção Ambiental do Rio da rios pelo processo de decantação das águas. Prata e sua frente Marítima: Prevenção e Soma-se a tudo isso a falta de tecnologia nos Controle da Contaminação e Restauração de três países. “Nem o Brasil, nem a Argentina e Habitats). Mas isso não impede que ambos o muito menos a Bolívia têm tecnologias para o desrespeitem, afirma Claudio Bertonatti. tratamento de águas. Praticamente todos os Um dos casos mais marcantes e podejetos industriais caem diretamente no rio, sem passar por nenhum sistema eficaz de lemicos envolvendo o Rio da Prata acabou tratamento. Além disso, tais tecnologias são em batalha juridica na Corte Internacional muito caras, nem governos e nem empresas de Justiça de Haia, na Holanda depois que o cogitam a possibilidade de adquiri-las”. Uruguai permitiu a construcao de duas usinas 31
de celulose nas margens do Rio da Prata em 2003 sem consultar a Argentina. O,governo argentino pediu ao tribunal internacional, que interrompesse a instalação, mas nao foi atendido. Emblematico, o caso evidencia o cerne do problema de poluição do Rio da Prata; um rio internacional, que, nos países por onde passa, enfrenta legislacoes e politicas publicas divergentes, o que impossibilita sua descontaminação. Ao analisar o caso em setembro de 2009, o membro da corte e especialista em Direito Internacional, Phillipe Sands apontou o dedo para os uruguaios: “O Uruguai causou dano ao rio no passado e o fará no futuro devido ao contínuo despejo de substâncias tóxicas.” Mas nada foi decidido ainda. Em e-mail a nossa reportagem, o integrante do Tribunal de Haia preferiu nao comentar o andamento do processo: “Trata-se de um problema sério que continua em pauta, mas não posso dar mais informações, pois faço parte do julgamento do caso.” Ambientalistas acompanham o caso com atencao. Uma decisao corajosa favoravel ao governo argentino pode impor cautela aos paises vizinhos e colocar um freio em outros empreendimentos danosos as margens do grande rio e seus afluentes.
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Brasil
Usina implanta novos procedimentos para evitar a poluição das queimadas nos canaviais Produtores de Etanol, em Itapira, no interior de São Paulo, apontam caminhos de desenvolvimento sustentável para um setor que espalha muita fumaça, partículas e gases tóxicos durante a queima da palha de cana de açúcar
Por Janaína Vieira, Maíra Vargas e Renata Razera Cercada pelas plantações de cana-de– açúcar da Usina Virgolino de Oliveira desde 1924, a cidade de Itapira no interior de São Paulo, com cerca de 70 mil habitantes, vive um impasse há muitos anos. Enquanto a indústria canavieira e importante para a economia local, a populacao sofre com a poluição das queimadas que invade as casas durante a colheita da cana. Jorge Gonçalves, 49, trabalha há 33 anos como cortador de cana e não vê perspectiva de trabalho fora dos canaviais. “Nasci aqui, moro na Vila Ilze (bairro próximo da Usina). Meu pai me levava para trabalhar desde meus 16 anos”. Como ele, os cerca de 500 trabalhadores da Virgolino de Oliveira precisam que a colheita continue, pelo me-
nos em parte, sendo manual. A mecanização diminui os índices de poluição, mas torna a mão de obra dispensável. A Usina Virgolino de Oliveira é formada por mais três unidades nas cidades de Catanduva, José Bonifácio e Monções. A produção das quatro passa de 10 milhões de toneladas por safra. Para a colheita, são usados dois métodos, a queimada e a realizada por máquinas. “A cana é queimada antes da sua colheita para remover o material das folhas mortas e alguma camada de cera. O fogo no canavial eh intenso, mas termina muito depressa e isso favorece que a cana e seu conteúdo de açúcar não sejam prejudicados”, explicou o orientador de caldeiras da usina, 33
Sérgio Donizetti Conti. Ele salienta que a queimada é vantajosa porque, alem de facilitar a colheita para os cortadores, reduz o custo de transporte ja que não restam palhas e elimina as pragas que afetam a cana. A extração do sumo na fábrica também fica mais fácil sem a presença de folhas secas. Essas vantagens, no entanto, so beneficiam a indústria. Para os moradores, as queimadas, com ciscos pretos que caem nos quintais, entram pelas janelas e sujam tudo que estiver pela frente, são um tormento. Sonia Caversan, dona de casa, 34, já fez várias reclamações à Prefeitura, que alega não poder se manisfestar contra uma empresa privada. Sem opção, ela e outros moradores esperam pela efetivação das leis que proíbem as queimadas e já observam melhoras com a mecanização de 60% da colheita na unidade itapirense. Preocupada com a Lei nº 11.241, de 2002, que dispõe sobre a eliminação gradativa da queima da palha da cana-de-açúcar, A Usina Virgulino de Olveira implantou, voluntariamente, o projeto Etanol Verde para a produção de cana, açúcar e álcool ambientalmente sustentáveis. Esse faz parte dos 21 projetos estratégicos da Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo para estimular boas práticas na cadeia de produção sucroalcooleira e consolidar o desenvolvimento sustentável no setor. 34
Os principais aspectos do Projeto estão relacionados à eliminação da queimada de canaviais até 2030, proteção de áreas de preservação permanente, adoção de medidas de conservação do solo, minimização do uso de água na indústria, adoção de boas práticas para descarte de embalagens vazias de agrotóxicos e minimização das emissões atmosféricas nas chaminés da indústria. “Desde que o protocolo ambiental foi assinado, o compromisso está sendo cumprido dentro dos prazos estabelecidos pela lei”, disse Joaquim Alves da Silva Neto, gerente geral da Usina Virgolino de Oliveira. “Para conseguir isso, foram instalados filtros nas caldeiras para lavagem dos gases, que são provenientes da queima do bagaço. A água utilizada no retentor de fuligem fica em circuito fechado, portanto quando se faz a troca, a água vai para irrigação no campo. A fuligem que é retirada com a lavagem em forma de decantação também é utilizada como adubo orgânico”. Claudio Lima de Aguiar, professor da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP), do setor de Açúcar e Álcool confirma que muitas usinas, como a de Itapira, realmente têm implantado métodos mais adequados, do plantio ao produto final. “Podemos citar o uso da mecanização na colheita, o que confere maior produtividade e qualidade de vida ao colaborador. Além de novos processos dentro da usina, como filtros nas caldeiras, uso da biomassa
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vegetal para geração de energia elétrica que pode ser fornecida à rede elétrica pública através das concessionárias; uso de resíduos do processo para produção de fertilizantes orgânicos ou ainda, proposta de redução do uso da água no processo, - utilizando somente a água extraída da própria durante o processo; entre outros”. Impactos da indústria de cana Estudos recentes, segundo Marcos Sawaya Jank , presidente da UNICA, União da Indústria de Cana-de-Açúcar, trazem dados impressionantes sobre os impactos da indústria de cana. Considerando somente a produção do etanol, são 465 mil empregos diretos criados no País, seis vezes mais do que a indústria do petróleo. O etanol está presente em 1.042 municípios, enquanto petróleo está em apenas 176. Isso gera maior distribuição de renda e interiorização do desenvolvimento. Professores da USP fizeram uma simulação mostrando que 15% de substituição de gasolina por etanol em nível nacional gera 118 mil empregos líquidos, com uma massa salarial adicional de R$ 236 milhões anuais. Na área ambiental, desde 1975 o uso de etanol em substituição à gasolina permitiu uma redução de emissões de 600 milhões de toneladas de CO2, o equivalente ao plantio de 2 bilhões de árvores. Especialistas afirmam que, para cada litro de etanol consu36
mido, US$ 0,20 deixam de ser gastos na mitigação de gases causadores do aquecimento global. Um estudo realizado pelo Laboratório de Poluição da Faculdade de Medicina da USP chegou a um estimativa assustadora. Concluiu que, se todos os carros da região metropolitana de São Paulo fossem movidos exclusivamente a gasolina, haveria um incremento de 400 mortes e mais de 25 mil internações hospitalares por ano, com um custo anual de R$ 140 milhões para o sistema de saúde. “O etanol de cana é uma das soluções concretas, disponíveis hoje, para enfrentar os desafios das mudanças climáticas. Não é a única mas sem dúvida a melhor alternativa para o transporte atualmente disponível, eh certamente um ingrediente importante entre diversas soluções que serão necessárias para enfrentar a situação,” afirma o assessor de meio ambiente da UNICA, Luiz Fernando do Amaral. Amaral explica que por meio da Aliança Brasileira pelo Clima, a UNICA e 14 das mais significativas entidades brasileiras que representam o agronegócio, florestas plantadas e bioenergia, pretendem pressionar o governo brasileiro para atingir metas ambiciosas para a expansão de energias renováveis na matriz energética.
Brasil
Dilema na transposição do rio São Francisco: desenvolvimento ou preservação ambiental? Obras na região de Cabrobó movimentam a economia da região. Mas, enquanto alguns moradores comemoram a melhoria de vida, movimentos sociais, ambientalistas e pesquisadores advertem que as medidas de redução de impacto ambiental adotadas pelo governo não são suficientes para manter o equilíbrio do ecossistema Por Luisa Purchio e Roseane Aguirra Engenheiros, técnicos de obra, oficiais do Exército e operários vindos de vários pontos do Nordeste transformaram a pequena Cabrobó, no interior de Pernambuco, numa nova cidade. É gente que vai e que vem. Caminhões passam carregados de terra, enquanto caminhonetes lotadas levam os trabalhadores ao grande canteiro de obras. O comércio nunca vendeu tanto e os hotéis e restaurantes nunca viraram tanto movimento. O início das obras da transposição do Rio São Francisco na região, que inclui também as pequenas cidades de Salgueiro e Floresta, trouxe emprego, renda, e esperança de melhores dias para sertanejos isolados no meio da caatinga e dependentes da chuva e de projetos assistenciais.
“É o barbeiro que tira barba, é o cabeleireiro que corta o cabelo, é a mulher que vende o tempero. Todo mundo hoje tem desenvolvimento indireto em relação à transposição”, afirma Eudes Cavalcanti (PTB-PE), prefeito de Cabrobó. “São mais de mil empregos criados. Todo mundo tem alguma coisa”. Os políticos celebram a fartura. Marcones Libório de Sá (PSB-PE), prefeito de Salgueiro, comenta a grande oferta de trabalho, muito acima do normal para a região. “Até os ‘inchadinhos’ estão trabalhando: aqueles jovens que pela falta de oportunidades se dedicam ao vício do álcool e logo ficam inchados de tanto beber. Até esse povo já tá trabalhando”, salienta. 37
Ao todo, 8.500 moradores da região conseguiram um emprego na obra. Divanilson Avelar da Silva, por exemplo, está trabalhando para uma das empresas construtoras do Eixo Norte, em Cabrobó. Antes empregado da Prefeitura, ele dava aula da 1ª a 4ª série e ganhava R$ 350,00 por mês. Com a transposição do rio, trocou a escola pelo trabalho braçal. O emprego, com carteira assinada, lhe rende até R$ 1.000,00 por mês. Paulo Manoel da Silva também conseguiu um emprego. É vigia na Vila do Junco, uma das 18 áreas de reassentamento dos atingidos pela transposição das águas. Construída pelo Exército, a vila conta com 75 terrenos de meio hectare cada um, com uma casa confortável de 99 m², equipada com banheiro e rede de esgoto. Há também escola, posto de saúde, associação de moradores e ruas calçadas. Paulo nunca havia antes sonhado em morar em um lugar assim. “A gente que mora aqui, não tinha médico. Quando adoecia, era difícil, tinha que levar até outra cidade. E um colégio bom, como esse que vai ter, só tinha há 4 km daqui”, conta o vigia, que trocou sua velha casinha de barro, com esgoto de fossa e água bombeada por motor a óleo, por uma nova, cercada de vizinhos. “Lá era uma casa aqui e outra longe. Aqui há uma rua inteira com casas”, comenta com um sorriso largo. Diante de tantas oportunidades, pouco importa a esses sertanejos sofridos o impacto que as obras podem ter no ambiente. 38
Segundo especialistas, o rio, que está sendo levado de Floresta e Cabrobó para áreas secas de Pernambuco, Ceará, Rio Grande do Norte e Paraíba, vai perder vazão e chegar com pouca força no mar. Com isso, a água salgada avançará sobre o leito do velho Chico, contaminando sua margem e o lençol freático, ameaçando todo seu ecossistema. “Ainda que o rio secasse, eu sou a favor”, diz o ex-professor Divanilson. “Deus fez a água e ele não disse para quem era a água, ele a fez para todos. Por que a gente não pode dividir? E a gente está aproveitando bastante, porque não é sempre que tem essas oportunidades, e essa obra não vai demorar muito, qualquer momento tá indo embora daqui”, diz. Sonhado pela primeira vez pelo Imperador Dom Pedro II no séc. XIX para resolver o problema da falta de água no Nordeste, o projeto de transposição do rio São Francisco é polémico. Tem provocado protestos desde que, finalmente, começou a sair do papel, no governo de Luiz Inácio Lula da Silva. O primeiro a alertar o público nacional e internacional para o impacto da obra foi Dom Luiz Flávio Cappio, bispo da diocese de Barra, na Bahia. Em outubro de 2005, ele iniciou uma greve de fome de 11 dias, apoiada por ambientalistas e pelo movimento social. O protesto não paralisou a obra, mas, somado a outras manifestações em diversas partes do Nordeste, forçou o governo a incluir na transposição um plano de revitaliza-
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ção do rio com cinco linhas de ação: gestão e monitoramento das águas, agenda socioambiental, proteção e uso sustentável de recursos naturais, qualidade de saneamento ambiental e economias sustentáveis. Considerada uma conquista pelas comunidades ribeirinhas, a revitalização era um pedido antigo da região diante da debilidade crescente do rio do mesmo em seu curso natural. Especialistas que são contra a transposição, como Wagner Costa Ribeiro, doutor em Geografia Humana e livre docente em Geografia Política da Água pela Universidade de São Paulo (USP), comemoram a conquista. “Pelo menos isso. A revitalização é um ganho que veio das audiências públicas. Desassoreamento, retirada de material, controle de fontes de poluição. Tudo isso deve ser feito”. Ribeiro, assim como João Suassuna, pesquisador do rio São Francisco há 15 anos pela Fundação Joaquim Nabuco, reconhece que a revitalização, bem ou mal feita, é apenas uma medida paleativa, pois a transposição traz inúmeros malefícios, como maior perda de água por evaporação. “O problema do Nordeste não é a falta de água, mas a falta de capacidade de acúmulo de água. Com a transposição, serão abertos dois novos canais sob o sol, e a evaporação vai aumentar”, explica Ribeiro. Para eles, a transposição do rio custará caro ao ambiente, que já se mostra desequilibrado. “Partes do rio próximas à foz já estão 40
mais salinas, e a prova disso são as visitas inesperadas de siris e a captura de peixes de hábitos marinhos em localidades ribeirinhas”, adverte Suassuna, em um estudo sobre a transposição do São Francisco. Apesar do plano de revitalização, os movimentos sociais reclamam que o governo não está cumprindo completamente o prometido. “O problema é justamente que não percebemos o que o governo está fazendo para revitalizar o rio São Francisco. Para a recuperação da mata ciliar está previsto o plantio de 27 milhões de mudas por ano. No entanto, os viveiros têm produzido apenas 200 mil, o que corresponde a 5%”, diz Maria do Perpétuo Socorro, presidente da Associação Paraibana dos Amigos da Natureza (APAN). Além disso, há quem reclame dos impactos das obras nas populações ribeirinhas, como pescadores, quilombolas e indígenas. De acordo com Magnólia Azevedo Said, advogada e diretora-presidente do Esplar Centro de Pesquisa e Assessoria, 26 povos indígenas, 156 comunidades quilombolas e centenas de comunidades ribeirinhas que ficam na área de abrangência do projeto estão tendo de deixar suas terras. “No caso dos indígenas, é mais grave, porque eles não possuem documento de suas terras, ou elas ainda não foram demarcadas oficialmente. Eles estão sendo obrigados a deixar as terras à força, mediante promessas ou acordos de valor irrisório. Isso tem acontecido em
Pernambuco, Paraíba e Ceará”, diz. Vida melhor para uns, revolta a outros. Independentemente da posição que se ocupe diante dela, a transposição já começou e é caminho sem volta. Ao movimento social, ambientalistas e moradores, cabe apenas a imensa tarefa de fiscalizar e garantir o cumprimento de medidas de redução de danos, como o plano de revitalização do rio e os 36 Programas Básicos Ambientais que visam minimizar o impacto das obras.
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Thomas Quirynen - massacre de Baguá
Governo Uruguaio - Plantação de Soja no Uruguai
Thomas Quirynen - massacre de Baguá
Gleylson Miranda - índios isolados
Thomas Quirynen - massacre de Baguá
Gleylson Miranda - índios isolados
Thomas Quirynen - massacre de Baguá
Gleylson Miranda - índios isolados
Priscila Celino - Buenos Aires
Cláudio Bertonatti - Rio da Prata
Renata Razera - usina de álcool
Luisa Purchio - Trabalhadores no canal do Rio São Francisco 43