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Construindo uma mldia sindical: TVB
TVs SINDICAIS
Construindo urna rnídia sindical: TVB
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Equipe TVB
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ATVB (TV dos Bancários) surgiu em fevereiro de 1987, como uma necessidade do Sindicato dos Bancários de São Paulo de ocupar um espaço de produção dos trabalhadores, já iniciado em S. Bernardo do Campo pela TV dos Trabalhadores (TVT). Combinando crescimento da produção com a luta para diminuir as limitações de veiculação, trabalhamos em três frentes: registro histórico das lutas dos trabalhadores, formação sindical e elaboração de telejornais que são exibidos na rua. A Folha Bancária, órgão do Sindicato dos Bancários de S. Paulo, é um jornal diário, com tiragem de 100 mil exemplares. Tem a função de informar e organizar a categoria dentro da base do sindicato, que tem 150 mil trabalhadores. Quando a TVB surgiu, de certa forma, se achava que ela era uma extensão eletrônica do jornal, em função da extrema importância do mesmo para o cotidiano do sindicato. Cobríamos lado a lado as lutas da categoria, exatamente da mesma forma. Com o desenvolvimento do nosso trabalho, percebemos que era um erro trabalhar desta forma. Percebemos que existem diferenças muito grandes nos veículos, mesmo na forma como os dois registram o cotidiano da categoria. Nesse momento aconteceu um afastamento, muito em função de coincidir com uma época em que a prioridade da produção era para vídeos de formação sindical.
No entanto, a TVB pertence ao departamento de imprensa; dentro do cronograma do sindicato e na medida do possível sempre participamos da discussão de avaliação e construção do jornal. Não raro, participamos da elaboração gráfica. Isso nos aproxima, determinando inclusive uma maior seleção do que é coberto pelos dois veículos.
Nestes dois anos e meio de trabalho, nos deparamos com muitos desafios e problemas que atingem quem produz vídeo para o movimento popular. Dois desses desafios são: como resolver o problema da linguagem do que produzimos? Como é nossa relação com as redes institucionais? Na realidade, são problemas que dizem respeito à própria razão de existência de nossa produção.
Do ponto de vista da linguagem, pensamos que é o problema que mais incomoda quem sai r.a rua com uma câmera, grava tudo e na hora da edição, não raro, a pessoa não gosta do que fez, ou simplesmente não percebe que está desrespeitando o veículo, com uma linguagem chata, sem retorno. Muitas vezes, inclusive, em nome de uma linguagem "nova" se cometem erros de concepção, que, no mínimo, dificultam a aceitação do que é produzido por parte de quem vê. Inclui-se aí também o medo de trabalhar as experiências de linguagem já existentes. Não existe uma resposta para esta questão. Achamos que é fundamental ocupar os fóruns comuns para desencadear esta discussão.
A nossa experiência tem partido da aceitação da imagem institucional, trabalhando com ela e obtendo dela o que nos parece ser próximo daquilo que as pessoas gostam de ver, ou pensam gostar por falta de uma alternativa. Seja pela pura inclusão da imagem de um comercial de um banco, tentando desmistificá-lo, seja pela inversão de edição desta mesma imagem, demonstrando sua irrealidade quase sutil, ou seja, pela alteração do áudio de um comercial, onde o texto dublado, trabalhando com humor, diz aquilo que os bancários já sabem, apesar da versão oficial muitas vezes mentirosa. Tentamos trabalhar com a surpresa do inusitado e temos um retorno muito grande.
Um dos principais elementos de veiculação dos trabalhos da TVB sempre foi o dos telejornais na rua. Desde os primeiros, ficou claro para a equipe a necessidade de uma pesquisa de linguagem, que juntasse forma e conteúdo. As poucas experiências no Brasil indicam de um lado a monotonia do discurso verbal, de outro a despolitização crescente dos trabalhos apresentados, como forma de se conseguir prender a atenção de quem passa na rua. Procuramos juntar alguns elementos existentes: 1 <?)dirigentes que, por si só, conseguem de forma carismática dominar o trabalho que fazem no vídeo (Lula é o maior exemplo disso); 2<?) conseguir isolar elementos da linguagem das grandes redes, que se constituem em símbolos de comunicação, quase inquestionáveis, como a edição rápida, por exemplo.
Foi iniciada uma discussão sobre as diferencas entre nós "alternativos" e a produção da sia", o que abriu bastante o leque de alternativas possíveis para os vídeos, com as características necessárias para a rua. Em função de tudo isso, entendemos o que não devia ser feito, nos liberando para uma criação quase intuitiva, em cima da nossa própria memória televisiva, que insistíamos em negar, nos colocando como pseudo-alternativos. No fundo pensamos muito mais na necessidade de veiculação, em quem vai ver, e só depois em como vamos tentar passar determinada mensagem.
Surgiu então a idéia de transformar um comercial de um banco, normalmente veiculado nas grandes redes, mantendo o máximo de sua essência de comunicação, alterando algo que criasse exatamente o efeito contrário ao pretendido. A possibilidade técnica mais próxima era a de alterar o áudio, pegando exatamente o sentido do áudio original. Quando adicionamos humor ao texto dublado, conseguimos descaracterizar a impressão da "cópia". Percebemos que num programa de 1 O minutos as pessoas só se lembravam dos comerciais e conseguiam discutir exatamente a contramensagem que eles continham. Mais ainda, percebemos que, no decorrer do programa, as pessoas esperavam o próximo comercial com uma curiosidade muito grande, o que fazia com que assistissem a todo o programa. É claro que a tentativa tem muita relação com o público a quem era dirigido, por se tratar de pessoas jovens e com um nível escolar alto.
Dentro do processo de produção técnica desses "comerciais", entendemos que não podiam ser feitos de qualquer forma. Para manter a credibilidade da idéia havia que se prestar atenção em alguns detalhes, sem os quais ela não daria certo. Por exemplo: quando havia diálogos, tinha que existir um mínimo de sincronia entre o áudio e o movimento dos lábios, ainda que em alguns momentos essa sincronia não existisse, assim mesmo, ficando claro que era proposital. Daí o texto tinha que ser muito cuidado e encaixado quase que copiado no original, através de sua métrica. Também a qualidade do som merecia um cuidado muito grande. Sempre que ele tinha uma qualidade baixa, a idéia era descaracterizada. Para .., produção contávamos com uma câmera VHS, U111a ilha semiprofissional também VHS e um microfone nacional de qualidade média. Na falta de estúdio, as gravações de áudio eram feitas dentro de um banheiro pequeno, cuja reverberação incorporava-se ao som, aproximando-o da qualidade do som original. Fora isso, muito espírito de improviso e muitas horas de edição, para um trabalho de 30 segundos.
Trabalham na TVB hoje 3 pessoas, em período integral. Todo o trabalho é feito de forma coletiva, por programa. Mantemos reuniões periódicas onde se avalia o andamento dos vídeos e onde se discutem novas produções. Cada integrante apresenta um projeto, necessidade e viabilidade de veiculação, bem como com relação à estratégia geral do sindicato. Se aprovado, o roteiro e a direcão desse projeto são responsabilidade do companheiro, até a fase de edição.
Durante todo o processo existe um acompanhamento por parte do coletivo, nomeadamente em relação à linguagem e à edição do material, bem como à qualidade técnica das imagens que estão sendo elaboradas. Por este método de trabalho podemos realizar vários vídeos ao mesmo tempo e formar as pessoas em todas as áreas, tornando-as parte integrante do projeto mais geral da TVB.
Não existem dados concretos sobre o perfil e a amplitude do público atingido. Algumas produções não tiveram uma veiculação muito concreta, outras foram mostradas para mais de 500 pessoas em assembléias. Em geral os bancários gostam das produções, pois se vêem na sua luta na porta da agência, com os seus problemas retratados. De qualquer forma, a parcela mais avançada da categoria já assimilou a TVB como uma coisa importante. Já considera a TVB sua, no sentido de que percebe a diferença com a cobertura dada pelas grandes emissoras.
Outro ponto que merece ser mencionado é nossa relação com os dirigentes sindicais. Apesar da relação que tentamos ter com os dirigentes, esta é ainda muito distante. Isso é fruto da incompreensão sobre a tecnologia utilizada que aparece quase como um tabu, ainda que já muito discutida. O problema da veiculação também é muito concreto. A partir do momento em que o vídeo não atinge as "grandes massas", muitas vezes se torna difícil incluir o vídeo nas atividades gerais. Nesse momento é o nosso esforço que tem contado para mudar esta situação, acoplando a veiculação nas atividades da campanha e mostrando o quanto pode ser importante e necessário não se discutir apenas a questão da infra-estrutura, mas também a própria produção. !: necessário um esforço constante no sentido de consolidar o uso de um meio de comunicação novo, dentro dos sindicatos.
O sindicato produz por mês mais de 3 milhões de exemplares de jornais. Entre o jornal diário, vários jornais por banco, cartilhas, cartazes, filipetas, etc. Tem um departamento detimprensa
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u. bem equipado para conseguir sustentar tecnicamente esta produção e um esquema de distribuição que combina o trabalho organizado dos militantes com um esquema profissional que leva em consideração este trabalho organizado.
No caso do vídeo, o fato de não termos a concessão para a veiculação sempre foi um problema. Consideramos que TV é um meio de comunicação de massa. Mesmo quando produzimos de forma independente. Nesse sentido, é necessário ampliar as opções de veiculação, permitindo entender as limitações de cada espaço, fazendo inclusive que a produção seja voltada para cada um deles.
Basicamente, os vídeos são exibidos em cursos de formação sindical, nas ruas, com exibição de telejornais nos calçadões, no auditório do sindicato e dentro de alguns bancos estatais, onde existe espaço para isso, em função da grande pressão que existe nos bancos privados. Na maioria dos casos é suporte para outra atividade maior, sendo complementar a esta atividade, mas mantendo a preocupação de ser um elemento ativo e não redundante. Outra forma de veiculação importante é a venda de cópias para outros sindicatos de bancários do país, nomeadamente os trabalhos de formação sindical, existindo desde já a necessidade de se começar a integrar estes sindicatos na produção e não só na veiculação, como forma de iniciar a discussão da formação de uma rede coletiva da categoria, a nível nacional.
Outro fator importante é o da estratégia de uso de espaço institucional nas redes de televisão.
"Ora, mocinha você sabe que seu pai trabalhava 14 horas por dia num grande banco privado" (Trecho do áudio no vfdeo da TVB sobre campanha salarial)
Seja com inserções de comerciais, seja com acordos de espaço. Temos uma experiência concreta em relação a este último com a TV Gazeta de São Paulo. As TVs regionais podem se transformar num espaço privilegiado de ocupação de espaço, primeiro porque precisam de programação, que nós temos de sobra, segundo porque a competição entre as grandes redes começa a exigir uma mudança concreta na programação das TVs menores, que pode ser ocupada desde que traga alguma vantagem para a rede. No aniversário de 10 anos do Novo Sindicalismo, o debate comemorativo em nosso espaço não só foi transmitido ao vivo pela TV Gazeta, como incluiu a veiculação de imagens nossas. Ganhamos nós, ganhou a Gazeta. claro que não é um processo fácil. Vários cantatas anteriores foram fracassados, mas as coisas estão mudando e só depende de nós lutarmos para que se ampliem ainda mais as condições de utilização dos espaços institucionais.
Os sindicatos da CUT sempre tiveram, em relação a televisão, a pecha de que são péssimos "clientes", quando se coloca a necessidade de veiculação de comerciais, ainda que pagos, justificando-se as grandes emissoras, pela questão comercial dos anunciantes, em geral empresas antagônicas a esses sindicatos. Durante muito tempo foi construída a imagem de "ferrenhos revolucionários".
A televisão no Brasil se reproduz através de subsídios estatais e serve apenas para consolidar o poder da classe dominante, através do monopólio da imagem e da mensagem. Como conquistar este espaço? Como entrar nas redes? Como democratizar? Se por um lado isso era muito difícil na Rede Globo, por outro, existiam as TVs regionais, como a TV Gazeta em São Paulo, que m;>'1têm uma contradição interna com as grandes rec...:s, que é a falta de recursos, numa competição desigual. Naquele momento, a TV Gazeta passava por uma fase difícil, onde nem o salário dos seus profissionais estava sendo pago. Tentamos então explorar esta contradição. Fizemos a proposta de um comercial pago, produzido por nós, com inserções de 30 segundos, com uma mensagem dirigida ao chamamento da greve. A proposta foi recusada pela Gazeta, sob alegação de que os principais anunciantes eram exatamente os bancos. Tentamos mostrar à direção da TV que a situação pela qual eles passavam era exatamente devido às características dos anunciantes, que preferiam as redes nacionais e que só deixavam para ela as contas menores. Numa relação estritamente comercial, propusemos a cobertura pela Gazeta do debate comemorativo dos 1 O anos de retomada do sindicato. Em troca, faríamos a chamada para o programa TV MI X 4, no jornal diário da entidade. A Gazeta não só concordou como colocou um link no lugar do debate, transmitindo ao vivo e inserindo durante toda a programação pequenos clips em VHS, de nossa produção, chamando a categoria para o debate e veiculando uma mensagem de sindicalização, absolutamente sem custo.
Conseguimos achar uma síntese, em que nós ganhamos e a Gazeta ganhou em audiência.