CINELOGIA ONTOPSICOLÓGICA
ANTONIO MENEGHETTI
CINELOGIA ONTOPSICOLร GICA
Ontopsicolรณgica Editora Universitรกria
Recanto Maestro 2015
Do original italiano: MENEGHETTI, A. Cinelogia Ontopsicologica. 7 ed. Roma: Psicologica Editrice, 2008.
M541c
Meneghetti, Antonio, 1936-2013.
Cinelogia Ontopsicológica / Antonio Meneghetti ; tradução Ontopsicológica Editora Universitária. – Recanto Maestro, Restinga Seca, RS: Ontopsicológica Editora Universitária, 2015. 604 p. ; 23 cm. Título original italiano: Cinelogia Ontopsicologica ISBN 978-85-64631-23-6 1. Ontopsicologia. 2. Inconsciente. 3. Cinema. 4. Imagem. 5. Psicologia - psicopatologia. I. Título. CDU (1997): 7:159
Catalogado na publicação: Biblioteca Humanitas da AMF.
Imagem da capa: parte do quadro “Completo”, de Antonio Meneghetti, esmalte sobre tela, São Paulo, 2010. © Fundação Antonio Meneghetti.
© 2015 Todos os direitos reservados à Ontopsicológica editora Universitária Rua Oniotan, 490 Un. 21 Distrito Recanto Maestro 97230-000 São João do Polêsine RS Brasil +55 55 3289 1140 | info@ontopsicologia.com.br | www.ontopsicologia.com.br
Acadêmico Professor Antonio Meneghetti
Antonio Meneghetti (Itália, 1936 – Brasil, 2013) graduou-se em Filosofia pela Universidade Católica de Milão; obtendo o Doutorado Clássico em Ciências Sociais pela Universidade São Tomás de Aquino de Roma; Doutorado Clássico em Teologia pela Universidade Lateranense de Roma; Doutorado Clássico em Filosofia pela Universidade São Tomás de Aquino de Roma; Grand Doktor Nauk em Ciências Psicológicas conferido pela Suprema Comissão Interacadêmica da Federação Russa. Indiferente e autônomo em relação ao academicismo estadunidense, abriu a análise onírica e fílmica a partir de critérios originais e infalíveis: por trás de qualquer fiction, encontra-se a mão do homem ou do diretor que joga, porque perdeu a estrada. Durante os primeiros anos de ensino junto à Universidade São Tomás de Aquino em Roma, o contato com seus alunos, provenientes de várias partes do mundo para os estudos de Doutorado, o sensibilizou à psicologia contemporânea. São dos anos 1970 as estadas no Tavistock Hospital em Londres, no Instituto Junguiano de Friburgo e em uma clínica psiquiátrica em Baden Baden. No seu contato com expoentes de renome no panorama psiquiátrico e psicológico internacional, interessou-se particularmente por C. Rogers, A. Maslow e V. Frankl, porém se dá conta que nenhuma escola tinha resolvido de modo definitivo o problema do desaparecimento do sintoma. Confrontou-se no terreno concreto da neurose, da esquizofrenia, dos contrates sociopolíticos, da psicossomática, da droga. Por quase dez anos realizou intensa experiência clínica (com dez a doze horas de entrevistas por dia), sem apoio farmacêutico durante todo o arco da casuística patológica. O desaparecimento do sintoma se verificava nas primeiras dez entrevistas no período de dois meses. 5
Cinelogia Ontopsicológica
Dessa experiência clínica com práxis exitosa, pôs as bases metodológicas da ciência ontopsicológica, que também se posiciona como filosofia com práxis psicológica. A Ontopsicologia é a análise do ser antropológico em todas as suas manifestações, da existencial à transcendente. Original intelectual do nosso tempo, foi autor de mais de 50 obras, em grande parte traduzidas para o inglês, português, russo e chinês. Com excepcional formação em teologia, filosofia, sociologia, direito, psicologia e economia, foi talvez uma das últimas mentes da história recente, como os grandes do passado, com capacidade de formalizar um saber unitário por evidência racional e aplicação concreta. Para ele, a Ontopsicologia é a capacidade de evidenciar-se no nexo ontológico. Será necessário algum tempo para se compreender a causalidade operativa das suas descobertas. Descobertas que consentirão familiaridade com o mundo-da-vida ou a continuidade reversível entre consciência e causalidade real. Fundou e presidiu a Associação Internacional de Ontopsicologia, ONG com status consultivo especial junto ao Conselho Econômico e Social das Nações Unidas. No Brasil, foi patrono da Antonio Meneghetti Faculdade, instituição de ensino superior credenciada pelo Ministério da Educação em 2007, e da Fundação Antonio Meneghetti, instituição criada em 2010 que, com o respaldo do governo brasileiro, visa garantir e perpetuar a obra e os resultados da ciência ontopsicológica no território nacional. Para mais informações sobre o autor: www.antoniomeneghetti.org.br
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SUMÁRIO
Prefácio...............................................................................................17 Apresentação da Obra.........................................................................19 Introdução...........................................................................................25
Primeira Parte O Cinema e o inconsciente Prolusão ao IX Congresso Internacional de Ontopsicologia.........33 1. A proposta ontopsicológica.............................................................33 2. A esquizofrenia existencial.............................................................36 3. O cinema e o inconsciente..............................................................37 Primeiro Capítulo O INCONSCIENTE ATRAVÉS DO CINEMA..............................41 1.1 Apontamentos de cultura cinematográfica....................................41 1.1.1 Introdução.............................................................................41 1.1.2 O nascimento do cinema: o contexto histórico-social..........42 1.1.3 As teorias ontológicas...........................................................43 1.1.4 As teorias metodológicas......................................................46 1.1.5 As teorias de campo..............................................................57 1.1.6 Os campos de discussão........................................................58 1.1.7 Uma conclusão .....................................................................59 1.2 Psicossemiologia do cinema.........................................................61 1.3 Impacto com a cultura fílmica......................................................65
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Cinelogia Ontopsicológica
Segundo Capítulo A IMAGEM.......................................................................................69 2.1 Metafísica da imagem...................................................................69 2.2 O traçado mnéstico.......................................................................71 2.3 A imagem e o inconsciente...........................................................75 2.4 A arte.............................................................................................76 2.5 O mito...........................................................................................78 Terceiro Capítulo O TEATRO........................................................................................81 3.1 Psicologia do teatro.......................................................................81 3.2 A psicotea......................................................................................84 Descrição da psicotea ...................................................................85 A formação do condutor.................................................................88 Resultados......................................................................................88 3.3 O teatro na Grécia.........................................................................89 3.4 O Édipo Rei de Sófocles...............................................................92 Cinelogia do filme: Édipo Rei......................................................98 O complexo de Édipo....................................................................105 3.5 A psicologia negativa...................................................................108 As estratégias da feminilidade......................................................110 O Fantasma da Ópera ..................................................................112 Quarto Capítulo O CINEMA.......................................................................................115 4.1 Especificidades do filme na ótica ontopsicológica.......................115 4.2 Síntese de uma confirmação.........................................................116 4.3 A esquizofrenia no filme..............................................................117 4.4 Motivações do fato fílmico..........................................................118 4.5 O símbolo e o espaço no filme.....................................................122 4.6 A música.......................................................................................126 4.7 O sucesso de um filme.................................................................128 4.8 A tríade superegoica no cinema americano..................................129 8
Sumário
4.9 O ator...........................................................................................131 Mesa-redonda sobre o filme: Buone Notizie...............................135 Diálogo aberto com o ator Giancarlo Giannini...........................135 Exemplificação cinelógica............................................................143 4.10 O diretor.....................................................................................153 Diálogo aberto com Tinto Brass...................................................155 Mesa-redonda sobre o filme: Nerosubianco................................159 Quinto Capítulo O INCONSCIENTE........................................................................167 5.1 O alheio na mente........................................................................167 5.2 Patologias sociais: delinquência e toxicodependência.................173 Mesa-redonda do filme: Eu, Christiane F., 13 Anos, Drogada e Prostituída.............................177 Cinelogia do filme: Laranja Mecânica........................................185 Cinelogia do filme: Esse Obscuro Objeto do Desejo..................195 5.3 O arquétipo da “grande mãe”.......................................................199 Cinelogia do filme: Spermula......................................................205 5.4 Fantasia e ficção científica...........................................................216 Cinelogia do filme: Contatos Imediatos do Terceiro Grau................................................221 Conclusões dos trabalhos...................................................................226
Segunda parte A cinelogia terapêutica Primeiro Capítulo A CINELOGIA.................................................................................233 1.1 Os critérios de análise..................................................................233 1.2 O conhecimento...........................................................................234 1.3 A remoção do processo primário..................................................236 1.4 A repressão...................................................................................237 9
Cinelogia Ontopsicológica
1.5 A compensação.............................................................................238 1.6 A projeção....................................................................................239 1.7 Associação = Deslocamento........................................................241 1.8 Identificação.................................................................................242 1.9 A racionalização...........................................................................243 1.10 Metodologia...............................................................................245 1.11 As três fases da cinelogia...........................................................249 1.12 Efeitos da cinelogia....................................................................252 1.13 O processo interpretativo...........................................................253 Segundo Capítulo PSICOPATOLOGIA DA FEMINILIDADE..................................255 Julieta dos Espíritos.....................................................................255 A Bela da Tarde...........................................................................261 Gritos e Sussurros........................................................................265 O porteiro da noite.......................................................................269 Lanternas Vermelhas...................................................................273 Os quatro modos da psicologia negativa feminina.......................274 8 Mulheres...................................................................................278 Piquenique na Montanha Misteriosa...........................................281 O erotismo vazio das colegiais no interior do vaginismo negro da diretora com o previsto final de suicídio........................281 As três tipologias de erro..............................................................283 A Lenda.......................................................................................287 Terceiro Capítulo PSICOPATOLOGIA MASCULINA..............................................289 8 ½...............................................................................................289 Teorema.......................................................................................294 Pássaros Feridos..........................................................................298 Quarto Capítulo PSICOPATOLOGIA DO AMOR...................................................305 10
Sumário
Quando eravamo repressi...........................................................305 Cenas de um Casamento.............................................................310 O monitor de deflexão...................................................................315 Alma Perdida...............................................................................317 Cidade das Mulheres...................................................................318 O Deserto Vermelho....................................................................319 Quinto Capítulo PSICOPATOLOGIA DA FAMÍLIA E ELEMENTOS DE PEDAGOGIA............................................................................321 Equus...........................................................................................321 A mãe como referência de um contínuo dinâmico........................326 Tommy........................................................................................328 A psicologia negativa como seletora do ambiente........................331 Damien: A Profecia 2..................................................................334 A perversão nas crianças..............................................................335 Como se reconhece a criança perversa........................................337 Conselhos de psicoterapia indireta ..............................................339 Considerações sobre o nascimento dessas crianças.....................340 Kramer vs. Kramer......................................................................343 Sexto Capítulo ESQUIZOFRENIA SOCIAL E MONITOR DE DEFLEXÃO......................................................345 Ensaio de um Crime....................................................................345 Nosferatu, o Vampiro da Noite....................................................348 Muito Além do Jardim.................................................................349 Inverno de Sangue em Veneza.....................................................351 Geração Proteus...........................................................................353 Demons – Filhos das Trevas........................................................354 Mahler, uma Paixão Violenta .....................................................356
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Cinelogia Ontopsicológica
Terceira Parte A cinelogia didática e de autenticação Primeiro Capítulo CINELOGIA DE AUTENTICAÇÃO............................................359 1.1......................................................................................................359 1.2......................................................................................................359 1.3......................................................................................................360 1.4......................................................................................................362 Segundo Capítulo DIDÁTICA E PSICOSSOMÁTICA...............................................365 Da Vida das Marionetes..............................................................365 O campo semântico em terceiro....................................................367 Il maestro e Margherita...............................................................370 O Espelho....................................................................................376 Solaris..........................................................................................380 O Violino Vermelho.....................................................................387 Síndrome de Stendhal..................................................................389 A patologia na arte........................................................................391 Mr. Jones.....................................................................................396 Responsabilidade do profissional..................................................399 Terceiro Capítulo A PSICOLOGIA FEMININA.........................................................401 Frances........................................................................................401 Angulação crítica do filme............................................................401 A hierarquia dos valores...............................................................404 A preguiça.....................................................................................407 O Príncipe das Marés..................................................................409 O nível profissional em psicoterapia.............................................410 A tipologia “punta-verme”...........................................................411 12
Sumário
A História de O............................................................................416 O sexo e o amor.............................................................................416 Obsessão Fatal.............................................................................421 O processo de atração e destruição na mulher.............................422 A Assassina..................................................................................428 A virgindade do ser.......................................................................428 A escolha interior..........................................................................429 Encantadora de Baleias...............................................................433 Adorável Júlia.............................................................................436 Quarto Capítulo SISTEMA E PERSONALIDADE..................................................439 Cinema Paradiso..........................................................................439 A transmissão do monitor de deflexão através dos estereótipos................................................................440 A nostalgia.....................................................................................442 Urga - Uma Paixão no Fim do Mundo........................................446 Fenomenologia dos estereótipos...................................................446 Ciclo biológico e ciclo psíquico....................................................446 Antes da Chuva...........................................................................449 Hamlet.........................................................................................453 Lendas da Paixão.........................................................................457 A transcendência das necessidades primárias..............................458 Psicologia da genitura .................................................................461 A constelação psíquica..................................................................463 Caçadores de Emoção.................................................................466 O Em Si naturístico.......................................................................466 A “dupla moral”...........................................................................467 Itinerário de uma Vida.................................................................470 O homem da noogênese................................................................472 Imensidão Azul............................................................................475 Contato........................................................................................477 O Show de Truman......................................................................478 13
Cinelogia Ontopsicológica
Rede de Intrigas...........................................................................484 Introdução.....................................................................................484 Análise do filme.............................................................................486 Aspectos econômico-político-sociais............................................492 Advogado do Diabo....................................................................500 O livre arbítrio..............................................................................500 Os sistemas fechados.....................................................................502 Matrix..........................................................................................505 Informação e monitor de deflexão.................................................505 A realidade de Echelon e o Big Brain...........................................507 Origem do monitor de deflexão.....................................................510 Herói............................................................................................514 Era uma Vez no Oeste.................................................................516 Quinto Capítulo A PSICOLOGIA DO LÍDER..........................................................519 Wall Street - Poder e Cobiça.......................................................519 O teste da patologia na inteligência do sujeito.............................528 O Diabo Veste Prada....................................................................532 Análise da jovem...........................................................................533 Análise da chefe............................................................................534 O Preço da Ambição....................................................................536 Il portaborse................................................................................540 Feminilidade e poder....................................................................542 Michael Collins: o Preço da Liberdade.......................................546 A política internacional.................................................................547 Lendas da Vida............................................................................553 Com o Dinheiro dos Outros........................................................557 A logística dos negócios................................................................558 O jogo da intuição.........................................................................560 Mera Coincidência......................................................................563 O “sexygate”.................................................................................564
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Sumário
Um exemplo da estratégia diplomática: a guerra do Kosovo.......................................................................565 O homem “Isomaster”..................................................................567 Elizabeth......................................................................................571 Sexto Capítulo....................................................................................... FANTAPSIQUIA..............................................................................573 Blade Runner, o Caçador de Androides......................................573 O Buraco Negro..........................................................................584 Rollerball – Os Gladiadores do Futuro.......................................591 Índice dos filmes................................................................................595 Bibliografia do autor..........................................................................599
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PREFÁCIO
Sempre pensei que, na Itália, uma sociologia do cinema, entendida como ciência social integrada do fenômeno cinematográfico, não vingasse por ordens variadas de problemas. Antes de tudo pelo fato de que o renascimento da sociologia na Itália, ocorrido na segunda metade dos anos 1950, depois dos 50 anos de hegemonia cultural idealística, que, tanto na versão historicísticocrociana, quanto naquela atualístico-gentiliana, negava a legitimidade das ciências sociais empíricas, não tivesse adequadamente investigado toda a fenomenologia cultural. Em segundo lugar, e especularmente ao primeiro, é preciso acrescentar que “a história do cinema”, assim como foi declinada no nosso país, sobretudo sob a influência ideo-mecanicista estadunidense, foi frequentemente ligada a uma prospectiva de história do filme e das técnicas fílmicas, desconexas da instância social, e dominada por uma metodologia também tipicamente idiográfica e historicística, pouco inclinada a outros testes epistemológicos, que se baseiam mais na nomoteticidade que no escorrer dos acontecimentos de maneira linear. Dessa forma, ciências humanas e história do cinema percorreram dois binários paralelos sem jamais se encontrar, até por uma certa propensão da sociologia da comunicação e dos processos culturais que, na Itália, pendeu mais para a análise do impacto social da televisão do que do cinema. De outra parte, a própria filosofia do filme, à parte algumas raras exceções (vejam por todas aquelas de Galvano Della Volpe), insistiu em um sabor de tipo idealístico-romântico, mais uma vez de tipo crociano, sem chegar à análise social do filme e, portanto, do cinema, segundo uma metodologia lógico-empírica do filme como fato social. O problema é que, infelizmente, os estudos sociológicos se tornaram menos interessantes, porque a sociologia não soube perseguir aqueles que são os estímulos, aquelas que são as sugestões, aquele que é o brilho de uma realidade que muda, e permanece ligada às mesmas temáticas. A impostação de Antonio Meneghetti, através da Ontopsicologia, transcende o impasse dicotômico em que se movem sociologia e cinema. Com o instrumento cinelógico, entra na análise do profundo 17
Cinelogia Ontopsicológica
psíquico, prossegue além da impostação freudiana e enriquece a caixa de ferramentas do analista social, utilizando o filme como instrumento para a explicação de determinadas processualidades psíquicas sociológicas. Antonio Meneghetti, sempre em sintonia com a sua tensão ética de estudioso e clínico do ânimo humano, faz ainda o balanço da situação até os dias de hoje e leva adiante a pesquisa operando uma intervenção através do uso de um bisturi à raiz. Este se representa como um útil instrumento para explicar os nossos sistemas sociais contemporâneos, através da análise do diretor, que exprime o removido e se torna verdadeiro protagonista da processualidade fílmica, segundo a histórica intuição de Pudovkin. Desse modo, é um instrumento adaptado para dialogar sobre muitos aspectos do social, por certas perspectivas uma espécie de “desvelamento” da chave de sentido do filme. Em suma, encontramo-nos diante da possibilidade de transcender os turvos rótulos metafísicos das disciplinas e, na cinelogia ontopsicológica, recuperar a atenção dos processos da atividade psíquica nos confrontos do social, em uma espécie de fecunda e renovada socioanálise, mas enriquecida à luz do presente e na aposta também de uma nova estética do filme que saiba dissolver-se na análise estrutural de uma lógica da indagação social. São cerca de três anos que levamos adiante um discurso interdisciplinar sobre a leitura do cinema, sobre o impacto social do produto cinematográfico, através dos instrumentos da Sociologia e da Ontopsicologia, não da psicologia geral, mas da Ontopsicologia, que descobriu a arquitetura-base do inconsciente humano e como ele se constitui. Com satisfação, vejo uma procepicidade também cromática destes encontros, que faz reviver e despertar em muitos dos estudantes a participação, a paixão... aliás, a nossa tarefa, enquanto docentes, é exatamente aquela de despertar a “sede de saber”. Para nós, torna-se um motivo de orgulho não só da Cátedra, mas também da Faculdade que por tantos anos tive o privilégio de dirigir. Prof. Paolo De Nardis Titular da Cátedra de Sociologia - Curso Avançado Presidente do CATTID - Universidade de Roma La Sapienza 18
Apresentação da Obra
1. A presente obra é o fruto de mais de trinta anos de experiência ontopsicológica em mérito a tudo o que constitui a indagação circunspecta sobre a imagem, a fantasia, a arte, o cinema, a emoção: em uma palavra, tudo aquilo que é expressão inconsciente do homem e da sociedade. O primeiro texto se chamava “A cineterapia”, publicado em Roma em 1972. Tal texto recolhia as intervenções expressas em ocasião da exposição de um filme. Meneghetti, já com o conhecimento da cultura Cinefórum, Vivere insieme, das pesquisas francesas e do próprio Freud, dava-se conta de que o mesmo filme era visto e interpretado em modos diversos e opostos. O objeto-filme consentia uma plurissubjetividade que derivava preferencialmente das pulsões dos diversos removidos psíquicos. Além disso, Meneghetti, tendo muitos pacientes (1971-1981), pensara em usar a cineterapia como modalidade terapêutica com centenas de pacientes. Em uma tarde, diagnosticava as intervenções mais representativas do coletivo, e obtinha um bom serviço para cada cliente. Substancialmente, o filme era escolhido por quanto era instrumental à cura, e não por si mesmo. Ao final, era centrado o problema do cliente. O filme era ocasional; o escopo era a cura. O resultado extraordinário da cineterapia deve-se exclusivamente à descoberta da técnica ontopsicológica. Sem essa descoberta, o filme ou cinefórum é reforço ao sintoma. A tal pesquisa, o Acadêmico Professor Antonio Meneghetti dedicou em 1982, em Roma, junto ao Hotel Cavalieri Hilton, de 09 a 13 de maio, um inteiro Congresso Internacional de Ontopsicologia, no qual o protagonista ainda não discutível era o cinema. Intervieram, na ocasião, artistas, diretores, atores, produtores cinematográficos, sociólogos, psicólogos, psiquiatras. 19
Cinelogia Ontopsicológica
O evento permitiu ao Prof. Meneghetti analisar o “fenômeno cinema” em todas as suas implicações, dissecando as profundas motivações das suas origens, possíveis de serem reencontradas no teatro, analisando a personalidade dos operadores de cinema, sintetizadores e expositores daquela sensibilidade inconsciente que oprime o nosso século. Nos temas recorrentes dos filmes aqui propostos, o autor procede por uma análise que toca em diversos aspectos, do universo psicológico individual, aos grandes eventos que acometem a coletividade inteira. Além disso, evidenciando os conteúdos latentes do evento cinematográfico, coloca luz sobre as motivações de ordem econômica e ideológico-política. Apresentamos, na Primeira Parte deste texto, os atos daquele congresso. A análise ontopsicológica, tendo reencontrado o critério universal de sanidade e de realização humana, o Em Si ôntico, instrumentaliza o cinema e o envolvimento emotivo que ele suscita, atuando uma verdadeira e própria intervenção de provocação existencial, com escopo terapêutico e de autenticação. Tal instrumento, definido cinelogia – hoje à disposição de ontopsicólogos que operam em diversas partes do mundo – não examina o fato cinema segundo análises usuais, externas, dos efeitos ou de mercado, mas reencontra a sua causalidade primeira, colocando-se na esfera do inconsciente. Dessa posição, está em condições de desenrolar o obscuro e intrincado novelo dos efeitos e, através da individuação de um fio de sentido, um fio de razão inconsciente, segue seu percurso lógico, enquadrando a “motivação predominante censurada [e expondo] a identidade psíquica desconhecida para a consciência racional”. A universalidade do critério ôntico, e da metodologia preparada para a sua individuação e desenvolvimento, é ulteriormente confirmada pelo fato de que as várias cinelogias aqui apresentadas foram aplicadas em diversos tempos e ocasiões para participantes de cultura, raça e nacionalidade diferentes: do Brasil à Itália, da Rússia à China. A escolha dos filmes é baseada sobre o critério emotivo, sobre o impacto de interesse e de atração que suscitou no público. O primeiro capítulo da Segunda Parte expõe por completo a metodologia de intervenção e o desenvolvimento prático da cinelogia. Na sequência, em vários capítulos é proposta a síntese do conteúdo dinâmico de diversos filmes projetados com escopo terapêutico. 20
Apresentação da Obra
Nessa ótica, o cinema se torna um fato relativo, indispensável por ser, sobretudo, uma ocasião de análise dos arquétipos de psicologia individual e coletiva, determinantes de realidades patológicas do nosso tempo, portanto, não somente fenômenos de massa como a delinquência, a toxicodependência, a música, mas também eventos de superior gestão econômica e política. Na cinelogia, o verdadeiro protagonista é o inconsciente humano. 2. Por comodidade de exposição e de leitura, o livro é subdividido em três partes. Toda a Primeira Parte é a transcrição dos Atos extraídos do IX Congresso Internacional de Ontopsicologia. Após a prolusão ao congresso, esta parte é subdividida em cinco capítulos: o primeiro capítulo é constituído pela síntese das mais importantes pesquisas e aplicações realizadas pela cultura corrente no campo cinematográfico. O segundo, A Imagem, trata diversos aspectos da imagem, sob o perfil existencial, filosófico, psicológico e artístico. O terceiro capítulo é sobre o teatro. O material desse terceiro capítulo, em parte é extraído dos Atos do IX Congresso e, em parte, do capítulo sobre a psicotea contido no Manual de Ontopsicologia, integrado com as últimas definições explicitadas durante a Summer Session of Ontopsychology 1999. Depois da análise de uma tragédia ática, Édipo Rei, a título exemplificativo, é reportada a cinelogia realizada em Moscou em 1993, integrada com a síntese de uma cinelogia realizada em outra ocasião. No quarto capítulo, O cinema, foram inseridos todos os argumentos inerentes ao filme na visão ontopsicológica. Em particular: o valor simbólico no filme (ambiente, símbolos e cenografia), a música (no que diz respeito a esse argumento, foram reunidas sinteticamente algumas definições explicitadas pelo autor no interior de algumas cinelogias e do texto Manual de melolística, sobre o valor do elemento musical – ou trilha sonora – no filme), as motivações do sucesso de um filme, a personalidade do artista, particularmente a figura do ator e do diretor. Esse material é extraído – além dos Atos extraídos do IX Congresso Internacional e do último capítulo da terceira edição de A cineterapia – da adição de todas as definições que, em várias ocasiões e cinelogias, 21
Cinelogia Ontopsicológica
foram dadas a respeito da psicologia do diretor e do ator. Estão aqui reportadas as mesas-redondas realizadas durante o congresso com Tinto Brass e Giancarlo Giannini. Uma outra sessão enfoca as motivações econômicas, políticas e comerciais dos Estados Unidos na produção de diversos filmes. No quinto capítulo, O inconsciente, o cinema é analisado sob diversos perfis que sublinham a expressão inconsciente deste último, sobretudo no que concerne à interferência do monitor de deflexão ou o alheio na mente. Sucessivamente, o capítulo afronta – na ocasião cinematográfica – alguns temas sociais e arquétipos de psicologia individual tais como: delinquência e toxicodependência, o estereótipo do casal, o arquétipo da grande mãe, fantasia e ficção científica, o monitor de deflexão. Ao final de cada argumento, a título exemplificativo, são reportadas as correspondentes cinelogias: Eu, Christiane F., 13 Anos, Drogada e Prostituída; Laranja Mecânica; Spermula, Contatos Imediatos do Terceiro Grau1. O último item, Conclusões dos trabalhos, encerra os atos daquele congresso. O restante do livro é o conjunto de diversas cinelogias realizadas desde 1972 até hoje. A cinelogia terapêutica e A cinelogia didática e de autenticação são a subdivisão do material restante. No primeiro capítulo da Segunda Parte, além da primeira sessão – transcrita integralmente da terceira edição de A cineterapia – é relatada, de modo claro e exaustivo, a metodologia, as três fases da cinelogia e o processo interpretativo, aspectos do conhecimento do ser humano e os seus mecanismos de defesa (a projeção, a racionalização, a identificação, a remoção entre o processo primário e secundário etc.). Estas últimas sessões são extraídas em parte da síntese contida em algumas cinelogias e, em parte, dos textos Ontopsicologia do Homem e Ontopsicologia Clínica. O segundo capítulo contém todas as cinelogias relacionadas à psicologia da feminilidade; o terceiro capítulo, à psicologia masculina; sucessivamente, psicologia do amor, psicologia da família e elementos de pedagogia. O último capítulo trata da esquizofrenia social e do monitor de deflexão. Como exceção às cinelogias mencionadas, Spermula e Laranja Mecânica não foram projetadas durante o congresso, mas em ocasiões posteriores.
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Apresentação da Obra
No primeiro capítulo da Terceira Parte, explica-se o escopo da cinelogia de autenticação e a diversidade de impostação didática na individuação do critério de natureza. O segundo capítulo reúne didática e psicossomática. São cinelogias instrumentalizadas para o estudo e a formação dos operadores ontopsicológicos na identificação de patologias de diferentes origens (não somente a psicossomática em sentido médico, mas também a esquizofrenia e o suicídio). O terceiro capítulo trata da psicologia feminina. Com exceção de Obsessão Fatal e A Assassina, o material restante é inédito. O quarto capítulo aborda os temas sistema e personalidade; o quinto, a psicologia do líder e o Sexto Capítulo, Fantapsiquia, contêm alguns filmes de ficção científica com pano de fundo positivo. Conclui o livro o filme Rollerball, projetado ao final do congresso.
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