Relacao entre pais e filhos

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Alécio Vidor

Relação entre

Pais e Filhos A Origem dos Problemas

2ª edição

Ontopsicológica

Editora Universitária

Recanto Maestro 2014


V654r Vidor, Alécio Relação entre pais e filhos: a origem dos problemas/ Alécio Vidor. – 2 ed. – Recanto Maestro – São João do Polêsine - RS: Ontopsicológica Editora Universitária, 2014. 48 p. ; 20cm ISBN 978-85-64631-19 - 9 1. Psicologia infantil. 2. Neurose – estrutura e causa. 3. Mãe. 4. Criança. I. Título. CDU: 159.922.7 Catalogado na publicação: Biblioteca Humanitas da AMF

© 2014 Todos os direitos reservados à Ontopsicológica editora Universitária Rua Oniotan, 490 - Un. 21 - Distrito Recanto Maestro 97230-000 São João do Polêsine - RS - Brasil +55 55 3289 1140 | info@ontopsicologia.com.br | www.ontopsicologia.com.br


PROF. ALÉCIO VIDOR

Alécio Vidor nasceu em 25 de agosto de 1938, em OsórioRS. Possui graduação em Teologia pelo Escolasticado São José (1964), graduação em Pedagogia pela Universidade de Passo Fundo (1968), graduação em Filosofia pela Universidade de Passo Fundo (1971), graduação em Ontopsicologia pela Associação Internacional de Ontopsicologia – Roma (1978), Mestrado em Pro dissertatione Doctorali pela Pontifícia Universidade Católica de São Tomás – Roma e Doutorado em Filosofia pela Pontifícia Universidade São Tomás de Aquino – Roma (1973). Sua tese de doutorado foi revalidada no Brasil, ingressando por concurso como professor na Universidade Federal de Santa Maria, onde trabalhou de 1982 a 1996, chegando ao cargo de professor titular da instituição. Atualmente, é professor da Antonio Meneghetti Faculdade e da Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões. Em 1978, iniciou o trabalho de ontopsicólogo no Brasil, sob autorização e orientação do Acadêmico Professor Antonio Meneghetti, fundador da Ontopsicologia. No mesmo ano, participou na Itália da fundação da Associação Internacional de Ontopsicologia (AIO), hoje uma ONG com caráter consultivo especial junto ao ECOSOC (Conselho Econômico e Social) das Nações Unidas. Em 1985, participou da fundação da Associação Brasileira de Ontopsicologia e, em 1988, recebeu


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e acompanhou o Prof. Meneghetti na sua primeira visita oficial ao país, quando foi criado o Centro Internacional de Arte e Cultura Humanista Recanto Maestro. Até hoje, contribui com os projetos científicos, educacionais e culturais da escola ontopsicológica em território brasileiro. É autor dos livros: Filosofia Elementar, Base da análise clínica e versão científica dos sonhos, Natureza humana e educação, A epistemologia interdisciplinar, A gênese da alienação psicológica e Ontopsicologia, Uma nova psicologia para a pedagogia, Relação entre pais e filhos, A educação não-diretiva, Fenomenologia e Ontopsicologia: de Husserl a Meneghetti, Uma pedagogia para a sociedade futura: princípios práticos (org.), Opinião ou Ciência.


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO............................................................................ 9 Capítulo I OS PROBLEMAS ORIGINAM-SE DA SEPARAÇÃO.........13 Capítulo II A MÃE É A PESSOA-CHAVE..................................................19 Capítulo III A NEGATIVIDADE DA MÃE DÁ ORIGEM À DOENÇA MENTAL......................................................................................25 Capítulo Iv A SOCIEDADE PODE TRANSFORMAR-SE EM UMA NOVA MÃE.................................................................................31 Capítulo V A ESTRUTURA E A CAUSA DA NEUROSE........................35 Capítulo VI O IMPACTO FÍSICO E EMOTIVO REEDUCA...................41 CONCLUSÃO.............................................................................45 BIBLIOGRAFIA..........................................................................47



INTRODUÇÃO

Primeiramente, vivemos a vida, e só num segundo momento a compreendemos. Os pais modelam os filhos mais pelo modo como vivem, agem e reagem do que pelos conselhos que lhes dirigem. A dinâmica inconsciente atua antes que a decisão consciente se manifeste. Os filhos tornamse prolongamento da vida e não apenas da consciência dos pais. Portanto, aqueles serão fiéis executores da aspiração, da tendência, da intencionalidade, da agressividade latente existente nestes. Os conflitos no relacionamento entre os pais repetem-se no íntimo de cada filho e no seio do próprio lar. Os filhos reencarnam o problema de seus pais, especialmente enquanto a vida é mais maleável, até os seis anos. Os pais assimilam os problemas do contexto social e contagiam, imperceptivelmente, os filhos com os mesmos. A sociedade plasma os indivíduos sempre através de seus amplificadores, que são os pais. A história vivida pelos pais deixa seus traços no interior dos filhos. Estes assimilam o modelo paterno ou materno na proporção do afeto que os une. Por uma tendência caracterizada pela diferença sexual, a filha aparenta tornase aliada de seu pai e, o filho, de sua mãe. A mãe seleciona o filho imprimindo nele seu modelo interno; o pai adapta a filha em conformidade à própria realidade. Essa tendência nasce de uma rivalidade sexual, alimentada pela nossa cultura.


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Infelizmente, os dois sexos constituem-se em luta e não em amor, porque a cultura considera um superior ao outro. É a ligação afetiva, em nível instintivo, que determina o adulto com quem a criança irá identificar-se no decorrer da vida. Por uma tendência natural, a criança procura ser a primeira no coração do adulto, mas a seleção do modelo pode acontecer dentro do âmbito do próprio sexo. O liame simbiótico, que no início da vida é indispensável, transforma-se, progressivamente, em amarra que impede a liberdade e o crescimento do ser humano. O maior problema em educação é libertar os filhos desse cordão umbilical psicológico. Por falta de uma psicoterapia de libertação, os filhos prosseguem reelaborando a simbiose com seus pais e, avidamente, procuram uma esposa ou um esposo no qual pretendam reencontrar, respectivamente, a mãe ou o pai. E, toda vez que o marido não funciona à semelhança do pai, ou a esposa à semelhança da mãe, surgem os conflitos que socialmente podem ser justificados com a desculpa de uma incompatibilidade de gênio; na verdade, trata-se de uma luta para manter um tipo de relacionamento humano infantil. As crianças só encarnam o que lhes é introjetado, assim como crescem enquanto assimilam o alimento. Em nome da hereditariedade facilmente conseguimos desculpar-nos da própria responsabilidade e do dever de mudar nosso comportamento infantil. Quando a criança se torna perversa, ela apenas espelha o interior oculto e negado dos próprios pais, ou melhor, do parceiro afetivo. A parte menos aceita como própria é a melhor assimilada pelo filhoparceiro. Os filhos giram em torno de seus pais à semelhança dos planetas em torno do Sol. É o Sol que comanda, com sua dinâmica inconsciente, os movimentos da Terra. Sobre esse


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assunto, é preferível crer no que a boca da criança inocente fala do que na astúcia da inteligência adulta, a qual racionaliza mais do que raciocina. Nosso interesse sempre está voltado a descobrir o que o adulto procura ocultar, enquanto fala, e revela sem o saber, através de imagens oníricas ou da fantasia.



Capítulo I

OS PROBLEMAS ORIGINAM-SE DA SEPARAÇÃO

Uma criança, desde sua origem, é como um gravador ligado que registra tudo com perfeita fidelidade; isso é possível porque o organismo humano é de uma inteligência muito superior à razão humana. Observando um ser humano de poucos meses de vida, verificamos que é incrivelmente apreensivo e interessado pela realidade ambiental que o envolve. Os sonhos levam-nos a ver como a criança absorve problemas vivenciados pela mãe, antes mesmo de seu nascimento, ou no momento deste. Recordemos, por exemplo, o fenômeno daquela paciente que sonhou com um momento de silêncio prolongado e triste durante o qual sentiu um profundo mal estar e, após, sentiu-se agredida pela fúria do mar que penetrava com suas águas pelo telhado da casa onde ela se encontrava. Momentos antes de despertar sentiuse angustiada com a impressão de que a água a afogaria. Na verdade, a paciente nascera de uma cesariana. O triste silêncio prolongado corresponde ao momento da intervenção cirúrgica, durante a anestesia; a casa é o símbolo claro do útero materno que a envolvia; o momento do nascimento foi realmente dramático porque quase morrera asfixiada, dentro da estufa, pelo líquido amniótico nos pulmões, fato este que não fora percebido pelos médicos e, sim, por uma tia presente. Hoje, aos vinte anos, a paciente detesta médicos, tem horror


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aos hospitais e não suporta lugares fechados. Esses fenômenos caracterizam o trauma sofrido ao vir à luz. Os sonhos facilitam a compreensão de uma realidade não mensurável pela observação externa. Verificamos assiduamente, que um medo sofrido pela mãe, durante a gravidez, ou ainda certos impactos emocionais à semelhança de uma intervenção cirúrgica, deixam suas marcas na criança, manifestando-se, mais tarde, quando adulta, por ocasião de uma situação análoga e adequada para desencadear o fenômeno latente. É difícil distinguir o que é hereditário do que é adquirido. Há uma continuidade entre ambos. Quanto mais nos deixarmos guiar pela intuição e menos pela razão lógica, constataremos que a hereditariedade pode apenas variar a sensibilidade ou o temperamento, nunca, porém, provocar anormalidade psíquica na pessoa. Cada um de nós nasce com um temperamento pré-formado através da mensagem biológica dos pais, que atua e desenvolve-se no útero materno. No temperamento influencia o próprio ambiente físico e astrológico. É de fácil observação, em grandes hospitais que as contrações do parto acontecem em determinadas horas e os nascimentos são mais frequentes em determinados dias; é como se os fetos combinassem um encontro ou tivessem preferências. Uma criança que cresce onde há falta de oxigênio será de um tipo, a que convive com outras crianças será de outro e muito diferente será uma criança que vive ao lado de sua mãe emotiva e sexualmente satisfeita ou afetivamente feliz e uma outra que está ao lado de uma mãe reduzida, por necessidade, à frieza. Neste último caso, a criança, sem o saber, pode ser tomada como parceira secreta afetiva ou como aliada da mãe. Essa ligação afetiva acontece em nível inconsciente, porque


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nossa inteligência, habituada a olhar somente a realidade externa, não a percebe. A criança é um ser apreensivo com tudo que lhe advêm do externo, sofrerá um terrível bombardeamento das inúmeras particularidades oriundas de fora, especialmente daquelas que partem de sua mãe. É muito frequente ouvir quando se pergunta a determinadas mães de certas crianças exageradamente sensíveis, sobre sua vida afetiva e seu matrimônio, uma resposta desapontada: — “Não tenho tempo de pensar nessas coisas, tenho que pensar nos filhos, tenho muitos e as dificuldades também são muitas e não me posso permitir ser feliz”. Ouvimos de um homem de grande sensibilidade, referindo-se à sua esposa: — “Até hoje tive medo de ser egoísta, mas vejo que enquanto não tínhamos filhos, concordávamos em tudo. Na medida em que foram nascendo, minha mulher afastou-se sempre mais de mim apegando-se às crianças e quase esquecendo-se de mim”. A esposa, atenta ao depoimento do marido, confirmou: — “É verdade, sou totalmente dedicada a meus filhos”. A mãe feliz influirá em seus filhos de um certo modo e dará uma orientação diferente da mãe triste e deprimida. A criança sofre influências de toda e qualquer forma de atividade ambiental, da atividade biológica, da física, da do estado de ânimo das pessoas com quem convive etc. A dinâmica ambiental molda de modo diferente o organismo individual, sendo que sua dinâmica é polarizada pelos interesses e tendências daquele adulto, que exerce influência preponderante no pequeno. O modelo do comportamento externo do adulto é investido na capacidade dinâmica da criança e, por isso, anula a identidade da última. Dessa maneira, o adulto (pai ou mãe) se reabilita em prejuízo do pequeno, conseguindo satisfazer necessidades infantis que


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foram frustradas. O inconsciente da mãe é o fator chave que mais fortemente influencia, plasmando-a. Além dele, concorre, também, a mensagem verbalizada pelos pais ou pela família. A alta sensibilidade infantil enquanto se encontra desprovida do uso da inteligência, torna a criança mais filha da realidade ambiental onde vive, do que de sua força natural. Até os seis anos de idade, a sua apreensão é extraordinária, ela se abre totalmente à realidade, por isso, suas primeiras experiências modelam seu comportamento, definindo-o e impossibilitando-o a outras experiências possíveis. É a realidade do início da vida que pré-orienta a criança a um determinado modo de ser e comportar-se. Durante os primeiros anos o ser humano coloca as bases que o guiarão para sempre. A realidade externa será selecionada, aceita ou rejeitada, em conformidade às primeiras experiências. Por exemplo, quando os pais exigem que seus filhos os tratem de um determinado modo, essa forma de tratamento torna-se a forma padrão no relacionamento humano; mais tarde, o indivíduo julgará correto ou incorreto o tratamento das pessoas, na proporção que este se aproxima ou se afasta do modelo-padrão aprendido na infância. Caso um indivíduo aprendeu, quando pequeno, a ser bem atendido, exclusivamente, enquanto doente, depois de adulto, toda vez que se encontrar diante de dificuldades, repetirá mecanicamente a mesma tática da doença. São os pais que sem se aperceber condicionam o filho a reagir com a doença. Quando a estrutura-base do sujeito não for preparada para uma reação diferente, toda vez que a sociedade o envolver em uma situação semelhante àquela que causou a doença, o indivíduo regredirá, recorrendo ao modelo infantil aprendido, adoecendo.


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A dificuldade nasce no interior da criança durante sua tenra infância. A sociedade, mais tarde, apenas desencadeia o problema latente quando varia em suas exigências com o sujeito. A causa que dá origem ao problema acontece durante a infância; somente a causa desencadeadora do problema será posterior. O adulto que, quando pequeno aprendeu a reagir de um determinado modo, não conseguirá, mais tarde, dar uma resposta diferente diante de estímulos ou exigências semelhantes às de sua infância. Aqui está o motivo básico da desadaptação social: quando a matriz, que é a família, habituou o ser humano a um modelo reativo de comportamento, depois de adulto, o indivíduo prefere a crise neurótica em lugar de abandonar o modelo aprendido. É como se procurasse encontrar na sociedade um substituto da mãe ou da família que lhe desse a mesma resposta gratificante de seu tempo de criança. Quando o sujeito não consegue a mesma resposta, sofre uma frustação e essa desencadeia a ansiedade. O comportamento infantil, quando gratificado constantemente, tende a sobreviver mesmo se a sociedade exigir uma resposta adulta. O filho, uma vez habituado, não quer mais abandonar os modelos infantis, por isso, pretende continuar na dependência paterna ou materna, pois teme separar-se. Todos os problemas do homem têm sua origem no medo ou na ânsia de separar-se dos pais. Esse medo é vivenciado, embora o momento possa não ser lembrado, por ter acontecido na infância. Os indivíduos problematizados, isto é, os desequilíbrios, os desadaptados, os propensos a doenças psicossomáticas, os complexados, neuróticos ou psicóticos, fixaramse psicologicamente em uma fase da infância, embora, biologicamente, sejam adultos. Por seu comportamento, eles pretendem, continuamente, reaver a própria mãe para que


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os acalente. A ânsia de separação da própria mãe ou dos pais passa a ser usada como tática para continuar a viver em dependência dos mesmos, ou melhor, em simbiose com eles. O indivíduo simplesmente não quer mudar, impondo à sociedade que se adapte a ele. Esquece-se que é urgente separar-se dos pais e adquirir a própria autonomia para que o ser pessoal desabroche. Basta compreender o sonho a seguir para constatar que a angústia de separação acontece de fato. Uma paciente vê em sonhos uma menina a derramar lágrimas enquanto seu pai desaparece nas esquinas das ruas. Em outro sonho, essa mesma cliente, vê o mar enfurecido engolir a própria família que encontrava-se ao longo da praia, deixando-a sozinha e angustiada. Na verdade, esta pessoa aos dois anos de idade, fora entregue por seu pai a um tio, e este, com sua esposa, assumiram a responsabilidade pela sobrinha que não mais voltou para o próprio lar. Esses sonhos revelam com nitidez a angústia da separação sofrida durante a infância. Geralmente as pessoas que sofrem essa angústia de um modo mais intenso, são de uma sensibilidade invulgar e superam a sensibilidade dos próprios familiares.


Capítulo II

A MÃE É A PESSOA-CHAVE

Quem é a mãe? Para a maioria dos indivíduos pode ser a mãe natural, para outros pode ser uma irmã carnal, outros encontram essa figura no pai, num padre, numa religiosa, num instituto, numa religião etc. Em todos os casos, a figura materna sempre corresponde àquela pessoa ou àquela situação que, no passado, ofereceu o primeiro ponto de apoio ou de segurança externos ao bebê. Mediante esse ponto de apoio externo, a criança consegue sua segurança e aprende a se relacionar com o mundo e com a sociedade. Mãe, portanto, é o adulto que desempenha a função maternal de proteção e amparo tornando-se o centro de gratificações da criança; é o adulto que o pequeno prefere instintivamente em seu relacionamento afetivo, e, por isso mesmo, será sempre sua fonte de consolo. Três são as funções da mãe: a) Ser o progenitor que mais se relacione com a criança para satisfazê-la nas necessidades pessoais; b) Ser a pessoa que mais atue por sua dinâmica inconsciente para determinar a modalidade de relacionamento do pequeno; c) Compreende, como 3.a função, a dinâmica do conjunto que envolve o adulto-mãe (o companheiro dessa, os filhos, os irmãos, os parentes, chefes ou dependentes, a política, a


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religião, os costumes, os amigos e inimigos, os vizinhos, as vestes, os alimentos, o clima, o contorno ecológico com suas diferenciações, as estações do ano, os dias, as noites, a mobília, as esperanças e dores, as apreensões, os afetos, as desavenças, o jogo etc.); isto é absorvido pela criança em conformidade com o modo de encarar do adulto-mãe que lhe comunica o modo de se relacionar com toda esta realidade. O ambiente atua na criança sempre através do adulto-mãe. É essa pessoa que transforma em realidade o interior da criança, tudo aquilo que o ambiente externo dos outros pretende investir. A dinâmica biopsíquica da mãe atua na criança em conformidade com as emoções aprovadas ou desejadas pelo inconsciente daquela. Suas palavras forçam o menor a adaptar-se a elas, especialmente quando combinam com o modo de agir, de olhar a criança, ou melhor, com a mímica corpórea da mãe. As modulações da voz, o contato físico e as atitudes da mãe condicionam mais fortemente a criança a ser de uma determinada maneira. O inconsciente da mãe influencia de um modo mais acentuado do que sua decisão consciente. A potencialidade do filho sempre se concretiza através da mãe. Ela é a primeira a canalizar a força dinâmica do filho. São suas vivências que estruturam o ser humano em sua base. Ela é a guardiã do mundo e da sociedade. A figura materna tem a função de servir de ponte para relacionar o filho com o mundo externo, mas tem a missão de levar o educando a atingir sua plena autonomia. Os pais estão em função dos filhos e não devem, como infelizmente acontece, educá-los em função própria. Isso facilmente acontece, consciente ou inconscientemente, quando um dos pais sente-se afetiva ou sexualmente frustrado. Não esqueçamos que o sexo é um dos componentes da afetividade.


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A mãe, quando frustrada, recorre a todos os estratagemas para criar o filho em sua dependência, porque desta maneira ela protege a própria insegurança, compensando-se da frustração sofrida. A mãe, sentindo-se frustrada, inunda de afeto o filho, até de um modo consciente, para aprisioná-lo sempre mais a si, criando-o como um parceiro secreto ou aliado seu; o filho, por sua vez, fixa-se em um comportamento infantil de dependência. Ele, crescendo em dependência, habitua-se a ser servido, tornando-se um pretensioso que só consegue sobreviver enquanto empenha outros a seu serviço. O filho, uma vez viciado, não suporta viver sem a presença do ponto de apoio externo porque a própria mãe habituou-o a exigi-la e, isso, desde aquele momento em que cada desejo seu representava para a mãe uma ocasião de alegria. O filho, depois de viciado nesse comportamento, vive em simbiose constante com outra pessoa e, facilmente, passa a agir de modo tirano. Tudo isso porque ele aprendeu apenas a exigir e não foi educado para dar e para usar o próprio esforço. Muitas discussões, desmaios ou resistências, e até mesmo certas doenças orgânicas, não passam de formas de protesto à figura materna. Essa figura, geralmente é reencontrada na pessoa do psicoterapeuta, na própria esposa, em um amante ou em outro substituto do primeiro amor. O viciado, na dependência, preocupa-se demasiadamente com sua mãe, ele quer que ela não o abandone mas continue a substituílo no esforço que ele deveria empenhar para vencer na vida. Ele quer sua mãe a seu lado porque só consegue enfrentar a vida a dois. É inútil apelar pela sua boa vontade, porque tais indivíduos, simplesmente, não suportam viver a sós, pois sua psique evoluiu apoiada em dois. Eles sempre estão ávidos por encontrar um escravo e quando não o conseguem,


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explodem em ira. Tais indivíduos necessitam, com urgência, compreender uma parte de si mesmos para ter a força de evitar a busca incessante de um outro alguém que substitua a figura materna. Esse esclarecimento pode ser feito por um hábil terapeuta. Quantas mães sonham com seus filhos pequenos depois que são grandes e quantas chegam a afirmar com ingenuidade que estariam contentes caso seus filhos voltassem à idade de 4 ou 5 anos! Esse desejo infantil não é maldoso porque ambientes anteriores prejudicaram a própria mãe. Mães desse tipo necessitam de seu filho para sobreviver porque sem este objeto de amor elas se sentiriam aniquiladas. A mãe, mantendo o filho como aliado seu destrói uma parte da vitalidade do mesmo e, sem o saber, rouba do filho aquilo que ele necessita. A mãe deveria dar a plenitude da vida ao filho, porém, ela bloqueia a evolução psicológica deste para compensar-se egoisticamente. O filho conseguirá libertar-se dessa situação simbiótica com a mãe encontrando um contra-partner em condições, na pessoa do terapeuta. Só um profissional competente terá condições de, amando o filho, restituir-lhe a liberdade, cortando o cordão umbilical que o liga à mãe. O clínico substitui provisoriamente a figura materna, impondose com afetividade e ligando a si o paciente. Em um segundo momento, ele lança mão de uma atitude inversa daquela materna e, progressivamente, restitui ao próprio indivíduo o outro ponto de referência que ele habituou-se a encontrar sempre fora de si mesmo. Esse trabalho de recuperação, em muitos casos, exige do terapeuta que ele proíba o paciente rever determinadas pessoas; é necessário evitar todo o contato com qualquer pessoa que possa consentir ao filho retomar o ponto de segurança fora de si mesmo. A pessoa que continua


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impedindo a liberdade e a autonomia do filho pode ser a mãe verdadeira, a namorada, os filhos, um ideal, a religião, o ambiente familiar ou qualquer outra realidade que não seja o próprio sujeito. O cliente precisa aprender, com a ajuda profissional, a apoiar-se em seus próprios recursos e não mais em uma realidade ou pessoa fora dele mesmo. Necessita ser reconduzido a confiar nas próprias forças e a inserir-se no ambiente social com sua própria autonomia. Quando um filho está apoiado em uma mãe demasiadamente possessiva e dominadora, facilmente ele acomoda-se em uma atitude infantil e, por isso mesmo, se nega a esforçar-se para crescer. Caso ele habitue-se a recompensas gratificantes que o infantilizam, não conseguirá mais desvencilhar-se dessa situação cômoda, mas prejudicial. Um outro sempre se antecipou a decidir por ele e, este outro, deu-lhe muito mais do que necessitava, e, com essa oferta de amor aparente, o filho aprendeu a renunciar ao próprio esforço, fixando-se em um comportamento infantil, abandonando a própria liberdade e o empenho de crescer em autonomia. Depois que o indivíduo se cristaliza e fixa em um comportamento dependente, adoece toda vez que alguém dele exigir uma resposta adulta. A doença torna-se a tábua de salvação para fugir da realidade que o próprio sujeito já não tem coragem de enfrentar. Os comportamentos desequilibrados, neuróticos ou psicóticos não são mais do que uma fixação em uma atitude infantil que, pela ânsia e pelo mal-estar, provocam o amparo de outro adulto, infantilizado. O adulto, de fato, por força instintiva, acostuma-se a compensar-se das deficiências e erros da infância, mesmo pré-natais.


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