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Suani Teixeira Coelho

Suani Teixeira Coelho Secretária Executiva do Cenbio Produção de óleos vegetais para fins energéticos no Brasil

* Com colaboração de Orlando Cristiano Silva

Apesar dos recentes progressos no uso de óleos vegetais e biodiesel no pa- ís, desde a década de 70, este assunto vem sendo discutido, devido aos cho- ques internacionais do petróleo. Entretanto, posteriormente, com os reduzidos preços internacionais, estes pro- gramas foram desativados. Apenas no século XXI, devido aos elevados impac- tos ambientais do óleo diesel e com a nova elevação nos preços do petróleo, o assunto voltou à discussão no país.

O marco regulatório do Programa Nacional de Produção e Uso de Bio- diesel, lançado em janeiro de 2005, através da Lei N° 11.097, estabele- ceu, como um dos pilares básicos, a inclusão social, através da geração de emprego e renda, especialmente no campo, com a produção de matériaprima oleaginosa, diversificada e re- gionalizada, como fator da diminui- ção das disparidades regionais.

A entrada em vigor, em janeiro de 2008, da obrigatoriedade da adi- ção de 2% do biodiesel no óleo diesel consumido em todo o Brasil repre- senta um desafio de produção adi- cional de 840 milhões de litros/ano de óleo vegetal. A recente proposta do governo de elevar o percentual a 3%, a partir de julho de 2008, e de antecipar a meta de 5%, de 2013 para 2010, implicará em uma demanda de 1,3 e 2,5 bilhões de litros/ano, respectivamente, de biodiesel.

Atualmente, cerca de 80% da demanda atual de biodiesel é supri- da através de óleo de soja, sendo o restante proveniente de sebo animal e de outras oleaginosas, como a ma- mona, o dendê e o girassol. Conside- rando uma das premissas básicas do Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel - a inclusão social, através da participação da agricultura familiar na cadeia produtiva do biodiesel -este perfil participativo das oleaginosas não é o mais adequado, porquanto a sojicultura é pouco in- tensiva em mão-de-obra, não obstan- te a sua prática por todo Brasil, atual- mente. Esta realidade pode ser expli- cada pelo fato do complexo-soja ser um setor agroindustrial consolidado e com infra-estruturas implantadas, contrariamente a outras oleaginosas.

Espera-se que outros setores tam- bém consolidem sua participação na oferta de óleos vegetais para o pro- grama do biodiesel, principalmente o de oleaginosas oriundas de culti- vo permanente, como as palmáceas. Existem, na região amazônica, deze- 34 nas de palmáceas de origem nativa, potencialmente produtoras de óleos vegetais, que podem ser usadas para a produção do biodiesel, contudo, care- cendo de um processo de domestica- ção, para viabilizar seu aproveitamen- to comercial em grande escala.

Por outro lado, existe uma espé- cie oleaginosa de origem africana, o dendê – ou palma (Elaeis guineensis), adaptada às condições de solo e cli- ma da região amazônica, intensiva em mão-de-obra e que apresenta a mais alta produtividade de todas as oleaginosas conhecidas. Um progra- ma de incentivo à produção em larga escala do dendê na Amazônia, dentro de um plano estratégico de recupera- ção de áreas degradadas e inserido no zoneamento econômico ecológico, resultaria em benefícios ambientais e sociais, e no aumento da capacidade de oferta de óleo vegetal, para o pro- grama do biodiesel.

Ocupando 61% do território na- cional, a região amazônica é porta- dora de um dos menores índices de desenvolvimento humano e de eletrificação rural, em virtude de fatores determinados pelas suas característi- cas fisiográficas e pelo tipo de ocupa- ção demográfica. Não obstante a sua enorme diversidade biológica e dis- ponibilidade de recursos naturais, as opções e políticas de desenvolvimen- to adotadas ao longo dos tempos não têm se mostrado adequadas, resultan- do na perpetuação do statu quo, do ponto de vista socioeconômico, e em uma crescente degradação ambiental.

Estima-se que vivam na Amazô- nia cerca de 500.000 pequenos agri- cultores, cultivando roçados anuais de aproximadamente dois hectares/ família, utilizando o método tradicio- nal de corte e queima da cobertura vegetal, como forma de remover a vegetação original e, simultaneamen- te, liberar os nutrientes contidos na biomassa. Após dois anos consecu- tivos de exploração, o roçado perde, aproximadamente, 92% de sua capa- cidade produtiva, tornando imperioso seu remanejamento para outro local; a área abandonada volta a ser utiliza- da em um período de 2 a 8 anos, ob- viamente com uma fertilidade abai- xo da existente no ciclo anterior. Os bens produzidos no roçado (arroz, milho, feijão, man- dioca, maxixe, entre outros) são destinados, parcialmente, ao consumo familiar, sendo também comercializados, de forma a facultar à fa- mília que os produziu a

aquisição de produtos não gerados no estabelecimento (açúcar, sal, massa, querosene, roupas, ferramentas, etc). A comercialização dos produtos da agricultura familiar desenvolve-se sob intensa intermediação entre a zo- na de produção e o consumidor urba- no, admitindo que até 80% do preço final seja formado depois que o pro- duto sai do estabelecimento agrícola.

Observa-se uma tendência de agra- vamento do quadro de pobreza das fa- mílias agricultoras, ao mesmo tempo em que são impelidas, cada vez mais, contra a floresta remanescente, na bus- ca incessante de uma produção quan- titativamente capaz de reequilibrar o orçamento familiar, na medida em que o rendimento de suas atividades econômicas tem ficado cada vez mais aquém das suas necessidades, face ao aumento desproporcional dos preços dos produtos manufaturados, indispen- sáveis às suas necessidades básicas.

O incremento da participação do óleo de dendê no quadro do programa brasileiro de biodiesel abre possibili- dades para a implantação de progra- mas de agricultura familiar, voltados para a produção de dendê na Amazô- nia, recuperação de áreas degradadas e promoção do desenvolvimento re- gional, além de contribuir para a di- versificação da matéria-prima, base da produção do biodiesel no Brasil.

Algumas barreiras, porém, opõemse ao desenvolvimento da dendeicul- tura na Amazônia, entre as quais: • o fato de o dendezeiro ser uma cul- tura pouco conhecida; • falta de zoneamento econômicoecológico; • falta de infra-estruturas básicas na região, e • falta de um programa de pesquisa e desenvolvimento.

A remoção dessas barreiras re- presentaria a inclusão de milhares de famílias no processo econômico e a preservação anual de alguns milhares de hectares de floresta.

Vicente Nelson Giovanni Mazzarella Coordenador Geral de Projetos Especiais do IPT Capim-elefante

Recentemente, em função da possível escassez de energia para projetos de expansão industrial, ocorreram freqüentes consultas sobre capim-elefante como biomassa, para alimentar essa geração de energia. O que tem chamado à atenção para o capimelefante são aspectos como alta produtividade (em torno de 40 toneladas de massa seca, por hectare por ano) e ciclo curto (colheita seis meses após o plantio). Além desses pontos fortes, há menor necessidade de áreas, melhor fluxo de caixa, é um energético renovável e ambientalmente amigável, tem maior assimilação de carbono (vantajoso em projetos MDL) e prováveis custos competitivos com outras fontes. Seu balanço energético, recentemente levantado pela Embrapa, mostra-se excelente para combustão direta (até 24:1). Os números disponíveis do custo por hectare, custo por tonelada de massa verde ou custo da massa seca, também indicam ser competitivos, embora necessitem de validação em grandes áreas, com cultivo mecanizado.

As consultas recebidas englobam geração de energia elétrica para venda, geração de eletricidade e vapor para uso próprio, calor para secagem e queima (cerâmicas estruturais), produção de carvão para processos me- talúrgicos, produção de briquetes e peletes para mercado interno e ex- portação. Essas aplicações demanda- rão, desde áreas pequenas (40 hecta- res para uma cerâmica vermelha) até milhares de hectares, para geração de energia elétrica em UTEs - Usinas Termoelétricas, de 30 megawatts, que tem sido o patamar com maior freqüência de consultas. As terras deve- rão ser mecanizá- veis e ter decli- vidade limitada a 10%. Parece haver um paralelismo acentuado entre a cultura

da cana-de-açúcar e a cultura intensi- va, em grandes áreas, do capim-elefante, no que diz respeito ao plantio, colheita, transporte e tratamento para redução da umidade. O elevado teor de água do capim-elefante – até 80% - constitui um dos seus problemas, solúvel até por mais de uma rota, principalmente nos casos de alimentação de UTEs, onde tem que haver regularidade, confiabilidade e, tanto quanto possível, homogeneidade nas características do bagaço a ser queimado.

Outro problema, igualmente solúvel, é o da logística do capim após a colheita, o que envolve seu transporte e armazenagem intermediária, aguardando processamento. Uma técnica aplicada ao capim-elefante, desenvolvida pela Embrapa-CNPAB, é a FBN - Fixação Biológica de Nitrogênio, que consiste na substituição da adubação nitrogenada química, pela fixação do nitrogênio do ar, por bactérias existentes no solo e nas plantas.

A Embrapa vai começar a trabalhar no desenvolvimento de inoculantes, para abreviar o ciclo de formação e crescimento das colônias de bactérias.

O capim-elefante é uma designação genérica, que reúne mais de 200 variedades de capim. É fundamental encontrar, para a microrregião onde se vai plantar o capim, variedades compatíveis com tipo de solo, regime de chuvas, grau de insolação, altitude, latitude, tipo de vegetação e outras características de interesse. Daí a im- portância, antes de fazer um projeto de monta, da realização de um pilo- to para testes das alternativas de tipo de colheita – colhedora, forrageira, segadora, época e duração da colhei- ta, seleção de algumas variedades de capim, tipo de transporte, etc. Uma definição mais precisa no universo de variedades e que envolveria FBN, portanto de média duração, requereria ainda um projeto paralelo para se achar as variedades consideradas ótimas para a microrregião. Projetos como o piloto e o de otimização custam menos de 1% do investimento global, e eliminam o risco de baixos rendimentos, equipamentos mal selecionados e rotas equivocadas na cadeia produtiva integrada.

Em projetos para geração termoelétrica, a secagem da biomassa não pode ficar na dependência exclusiva do fator insolação. Para essa escala, estima-se que a melhor rota inclua a extração mecânica do caldo, reduzindo a umidade do bagaço de capim de 80% para 50% (retirada de 75% da água contida no capim). Secagem para valores abaixo de 50% requereriam trocas térmicas, com os gases de saída das turbinas, em processo e equipamento ainda a serem desenvolvidos. Para projetos de menor porte, da ordem de 40 a 60 ha, como cerâmicas, já estão em desenvolvimento processos de secagem solar, em estufas, com revolvimento contínuo, que em 30 horas, sem insuflação de calor externo, reduzem a umidade a 10%.

O bagaço com 50% de umidade tem poder calorífico aproximado de 1.700 kCal/kg, enquanto o com 30% sobe para 2.700 kCal/kg, o que faz pensar sobre a conveniência da secagem térmica ulterior.

Como o período de colheita do capim será curto, a quantidade de material colhido e beneficiado, muito maior que o consumo nesse período, gerará um saldo de matéria-prima, que deverá ser armazenado em fardos, minimizando o tamanho dos galpões e facilitando seu manuseio interno. Cambridge, UK, de 36 MW, que trabalha com capim e palha em fardos, é exemplo disso.

As aplicações do capim-elefante, para a geração termoelétrica e venda, devem observar princípios, como: terras baratas e mecanizáveis, próximas a subestações ou linhões das geradoras ou concessionárias. A geração de energia e vapor para uso próprio deve procurar localizar a unidade beneficiadora do capim e geradora dentro da área do plantio, para simplificação da logística.

Dentro de poucos anos, o próximo salto na indústria sucroalcooleira e do capim será o desenvolvimento de processo e equipamentos para secagem térmica do bagaço, reduzindo sua umidade de 50%, para algo em torno de 30% ou até menos, utilizando gases de saída das turbinas. Isto já é objeto de estudo de grupos universitários com empresas de equipamentos.

Outra utilização do bagaço do capim é como matéria-prima para o gás de síntese, que, por diferentes rotas, será transformado em etanol, como no projeto Coskata - processo bioquímico em fase de demonstração piloto em Warrenville, Illinois, EUA.

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