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Carlos Souza Júnior
Carlos Souza Júnior Pesquisador Sênior do Imazon Florestas energéticas sustentáveis
A queima de combustíveis fósseis é o principal fator que contribui pa- ra as emissões de gases estufa para atmosfera e tem como conseqüência o aquecimento global do planeta. A corrida por fontes de energia reno- váveis e não-poluentes começou. Em 2007, no Brasil, segundo relatório preliminar da EPE - Empresa Bra- sileira de Energia, 46,4% da matriz energética brasileira foi de fontes re- nováveis: energia hidráulica e eletri- cidade respondem por 33,4%; lenha e carvão vegetal, por 12%; produtos da cana-de-açúcar, por 16%; e os 3% restantes provêm de outras fontes.
A princípio, a matriz energética brasileira seria motivo de orgulho e comemoração, não fosse o fato de que essas fontes de energia renová- veis podem contribuir, direta ou in- diretamente, para poluir a atmosfera. Ilustro abaixo um caso de produção não-sustentável de bioenergia e apre- sento uma reflexão sobre o potencial para reverter esse quadro.
É importante, inicialmente, enten- der alguns conceitos. Biomassa é a matéria orgânica que contém a ener- gia solar armazenada, via fotossínte- se, ou seja, é o combustível em forma bruta. Bionergia é a energia extraída da biomassa para diversos propósitos – produção de calor, eletricidade, por exemplo. Bioenergia e biocombustí- vel são, de fato, sinônimos.
A produção de energia, a partir de lenha e carvão vegetal, segunda fon- te renovável da matriz energética do Brasil em 2007, não é, em geral, am- bientalmente sustentável. Na Amazô- nia Oriental, a indústria siderúrgica do pólo de Carajás é abastecida por carvão vegetal produzido, principal- mente, a partir do desmatamento de florestas nativas. Um estudo da Em- brapa Amazônia Oriental, estimou que, somente em 2005, 100 mil hec- tares de florestas foram desmatados para produzir carvão vegetal, para geração de ferro-gusa na região.
O exemplo do pólo siderúrgico de Carajás coloca em xeque a sustentabi- lidade ambiental e econômica da pro- dução de energia a partir de florestas. Mas, essa situação pode ser revertida com reflorestamento, melhor apro- veitamento dos resíduos de madeira e desenvolvimento de tecnologia pa- ra aumentar a eficiência e reduzir os custos de produção de bioenergia.
Em relação ao reflorestamento, o governo do Pará lançou, no final de maio, um programa ambicioso, com a meta de plantar um bilhão de ár50
vores. A ONG Conservação Interna- cional também lançou um programa semelhante em abril, com a meta de plantar um bilhão de árvores na Ma- ta Atlântica. Até o lançamento dessa edição, mais de 300 mil árvores foram plantadas na Mata Atlântica. Essas iniciativas de reflorestamento fazem parte do PNUMA - Programa das Na- ções Unidas para o Meio Ambiente, que tem a meta de plantar um bilhão de árvores no planeta. Só no Brasil, a meta proposta foi duplicada.
O reflorestamento será dedica- do à recomposição das florestas na- tivas. que foram desmatadas. Mas, essas iniciativas criam as condições favoráveis para propostas de reflorestamento de florestas energéticas sus- tentáveis. O reflorestamento para produção de bioenergia deve ser entendi- do como uma iniciativa paralela à re- composição de florestas nativas e deve ser liderada pelo setor produtivo.
Além do reflorestamento, a bio- energia também pode ser produzida a partir dos resíduos da exploração madeireira, oriunda de planos de ma- nejo florestal. Na Amazônia, foram produzidos 24 milhões de m ³ de ma- deira em tora, em 2004, dos quais 40- 60%, virou lixo. Esses resíduos não têm sido aproveitados na geração de energia – poucas serrarias da Ama- zônia utilizam as sobras de madeira nos fornos de estufas. As florestas plantadas para produção de celulose e de móveis também geram muito re- síduo, que pode ser aproveitado para produção de bioenergia.
Somando-se todas essas fontes potenciais de energia renovável, o cenário é bastante otimista para flo- restas energéticas. Contudo, é preciso garantir, com políticas públicas, que esse tipo de energia renovável não seja produzido em áreas de produção de alimentos – o que ocorre nos Esta- dos Unidos, com a produção do eta- nol a partir do milho, e em algumas áreas no Brasil, onde plantações de cana-de-açúcar substituem pastagens e áreas de produção de grãos, que, por sua vez, avançam sobre as flores- tas. É preciso também garantir que a plantação de florestas energéticas não gere impactos na biodiversidade, nos solos e nos recursos hídricos locais.
A grande vantagem do Brasil nes- se cenário é a possibilidade de pro- duzir bioenergia, a partir de florestas energéticas plantadas em áreas já de- gradadas, que geralmente possuem baixa produtividade ou estão abando- nadas. Essa iniciativa pode também ser incluída em projetos de seqüestro de carbono, gerando CERs - Certi- ficados de Emissões Reduzidas, via Protocolo de Kyoto.
As condições políticas e econô- micas, e o histórico da matriz ener- gética do Brasil, com forte ênfase em energia renovável, favorecem a pro- dução de energia, a partir de florestas energéticas.
Cada um de nós pode plantar a sua árvore e ajudar na meta de dois bilhões de árvores no Brasil, criando uma sociedade que valoriza as flo- restas; o setor produtivo pode puxar a agenda para plantação de florestas energéticas; e o governo pode apoiar essas iniciativas e fomentar pesqui- sa e desenvolvimento de tecnologia, para produzir bioenergia, a partir de resíduos de madeira. Somente com florestas energéticas sustentáveis, po- deremos ter orgulho de nossa matriz energética.