FEVEREIRO | Geopolítica: Defesa ou Ameaça à Democracia?

Page 1

0


ÍNDICE – I VOLUME – TITLES «Geopolítica, Grande Estratégia e a posição chinesa no jogo internacional»……...Página 4 Por Alexandre Cesar Cunha Leite

«Geopolitics, Great Strategy and the Chinese position in the international game»…………………………………………………………………………………....Página 9 By Alexandre Cesar Cunha Leite; Translated by Inês Duque e Tiago Paulino

«Geopolítica e democracia: percepções acerca das ações russas em seu entorno regional»……………………………………………………………………………… Página 14 Por Larlecianne Piccolli

«Geopolitics and democracy: perceptions about Russian actions in their regional environment».............................................................………………………...………. Página 26 Por Larlecianne Piccolli; Translated by Inês Duque

ISSN 2183-7511 1


Prezado Leitor,

Com as férias do Carnaval a aproximarem-se, e depois de um mês sem edição, a Revista ORBE regressa, agora, no mês de Fevereiro, com um tema polémico que põe em questão o grande sucesso político do último século: a Democracia. Desta forma, na tentativa de relacionar a estrutura externa com o próprio regime democrático, a tema desta edição é: “Geopolítica: Defesa ou Ameaça à Democracia?”. Muito ouvimos falar de conceitos como Democracia e Geopolítica, contudo, por vezes, não nos sãos perceptiveis as relações que estes possam ter entre si, isto é, de que forma se influenciam ou condicionam no panorama da ordem internacional. Quando a instabilidade e a incerteza reinam nas relações entre Estados e, principalmente, entre as grandes potências, mostra-se imperativa a discussão dos modelos que tomamos por adquiridos se, no limite, procurarmos a sua preservação. Estará a Democracia tal como a conhecemos em risco, tendo em conta o atual contexto internacional? Qual a influência de grandes potências como a China e a Rússia, cujas políticas se distanciam dos modelos vigentes? Pretendemos com esta edição dar-lhe a conhecer as diferentes perspectivas sobre o impacto da geopolítica na Democracia e, sobretudo, ajudá-lo a formular de uma opinião fundamentada que lhe permita entrar na discussão académica sobre a temática. Votos de boas leituras,

A equipa do Editorial da ORBE

2


Dearest reader,

With the Carnival holidays approaching, and after a month without a publication, ORBE Magazine returns, in February, with a controversial theme that calls into question the great political success of the last century: Democracy. In this way, in the attempt to relate the external structure with the democratic regime itself, the theme of this edition is: "Geopolitics: Protection or Threat to Democracy?". We have heard a lot about concepts such as Democracy and Geopolitics, but sometimes the relations they have with each other are not perceptible, that is, how they influence or condition themselves in the panorama of the international order. When instability and uncertainty reign in relations between states and, especially, between the great powers, it is imperative to discuss the models we have taken for granted if, in the limit, we seek their preservation. Is democracy as we know it at risk, given the current international context? What is the influence of big powers such as China and Russia, whose policies are distant from the current models? We intend with this edition to show you the different perspectives on the impact of geopolitics on Democracy and, above all, to help you formulate a reasoned opinion that allows you to enter into the academic discussion on the subject.

We wish you pleasant readings, .

3

ORBE’s Editorial Team


Geopolítica, Grande Estratégia e a posição chinesa no jogo internacional Alexandre Cesar Cunha Leite1

Há quem diga que a Geopolítica está na moda, assim como há aqueles que afirmam que a Geopolítica voltou a ser importante nos dias atuais, diante das transformações globais e da nova dinâmica internacional. A expansão chinesa (em perspectiva ampla) e as disputas territoriais (especialmente no que concerne às ilhas do Mar do Sul da China), a movimentação da OTAN expandindo-se para o oriente, a nova política externa norte americana desenhada (ainda que em rabiscos) no governo Donald Trump, os inúmeros conflitos na região do Oriente Médio e no continente Africano, os movimentos migratórios ao redor do globo e a política de retomada russa nos tempos de Vladimir Putin são alguns exemplos usados para ressaltar o ressurgimento dos estudos da Geopolítica. Ao contrário daqueles que seguem a vertente dos ciclos de pensamento, ouso afirmar que a Geopolítica sempre esteve presente, não é um advento relacionado ao agora e em momento algum deixou de ser relevante ou levada em consideração por aqueles que desejam entender mais detalhadamente o que ocorre na política internacional. Mackinder, Spykman, Mahan, Haushofer e Brzezinski, entre outros nunca estiveram esquecidos ou “fora de moda”. Estes pensadores da estratégia são seminais e, sobretudo essenciais para que se entenda a dinâmica global de forma ampla e na sua complexidade. Tomo aqui o conceito de Geopolítica como a combinação de diversos fatores, notadamente os fatores geográficos, históricos, políticos e econômicos, exercendo efeito na condição de um ou vários Estados, ou região dentro do grande tabuleiro de xadrez que se configura a política global. Alguns autores tendem a considerar a Geopolítica como uma área de estudo na qual se observa a influência de fatores geográficos (território, população, recursos naturais, infraestrutura e capacidades econômicas) na política do Estado e na sua participação no Sistema Internacional. Este segundo conceito é bastante

1

4

Professor e pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais da Universidade Estadual da Paraíba (PPGRI/UEPB) e do Programa de Pós-Graduação em Gestão Pública e Cooperação Internacional da Universidade Federal da Paraíba (PGPCI/UFPB). Coordenador do Grupo de Estudos e Pesquisa em Ásia-Pacífico (GEPAP/UEPB/CNPq). E-mail: alexccleite@gmail.com. Orcid: http:// orcid.org/0000-0002-0209-2717. Lattes: http://lattes.cnpq.br/7812468603653799.


útil e didático, porém, quando se trata das relações entre Estados, a dinâmica global tende a funcionar num sistema de ação e reação. Quando se imagina este sistema como um jogo de estratégia, tal qual o xadrez, deve-se adicionalmente, pressupor racionalidade não exclusivamente no movimento das peças, mas também no pensamento estratégico prémovimento. Isto indica que há necessidade de raciocinar os movimentos e a dinâmica antes mesmo da tomada de decisão. Quando um Estado ou um governante utiliza o pensamento estratégico derivado da Geopolítica subentende-se que são levados em consideração quais são os objetivos domésticos e externos daquela nação. Como manter a soberania do seu território e qual a melhor forma de fazê-lo. Uma vez estabelecida a(s) meta(s) parte-se para a definição de quais são as práticas mais recomendadas considerando o cenário existente. E complementarmente, faz-se um exercício de estimação considerando os possíveis movimentos dos atores representativos para na consecução dos objetivos planejados. Isto posto, passa-se a considerar que diante do grande cenário delimitado pela Geopolítica, é importante que se desenhe uma estratégia de ação. A literatura indica que nações com maior capacidade tendem a estabelecer o que se convencionou denominar de Grande Estratégia. Barry Posen, Hal Brands, Flint and Hillary Leverett, entre outros estudiosos da relação Geopolítica, objetivos e política externa vão classificar a Grande Estratégia como uma construção intelectual que estrutura as ações de política externa ao longo do tempo visando alcançar os objetivos planejados. Na prática, a Grande Estratégia é a construção do desenho de política externa (no sentido amplo) considerando a melhor forma de alcançar seus objetivos, sejam estes domésticos sejam internacionais. Para tanto, faz-se uso da diplomacia aqui considerada como a capacidade do Estado de convencer o maior número de outros Estados a cooperar em prol do crescimento da sua capacidade e, consequentemente, atingir seus objetivos. Faz-se uso também do poder econômico existente como forma de instrumento mobilizador e garantidor de poder de barganha. Assim, a Grande Estratégia deve, sobretudo, ter como objetivo básico proteger seu território e sua integridade política. Diante do exposto, uma interrogação que surge é se todos os Estados têm um sistema de planejamento temporal na forma de uma Grande Estratégia. O que se observa na literatura e na consulta a documentos oficiais estatais é que vários tentam, porém poucos a tornam concreta. Nota-se que a capacidade, o poder e a relevância destes Estados dentro do sistema internacional tendem a interferir na concepção e realização da Grande

5


Estratégia. Bem, no cenário atual pode-se observar que um país que atingiu a envergadura, o tamanho e a força econômica e política capaz de influenciar e, simultaneamente, ter que se preocupar com a dinâmica global é a República Popular da China, doravante China (ou RPC). Sua posição regional e sua ascendência no cenário internacional tornam a China um dos mais importantes players do cenário global. As ações chinesas tendem a influenciar seu entorno regional, seus parceiros econômicos e políticos e o processo de tomada de decisão das potências globais, hegemônicas ou não. No caso chinês, tomando-a como um grande Estado, a Grande Estratégia busca melhorar sua posição relativa no sistema internacional e aumentar capacidade de atingir seus objetivos estratégicos e maximizar sua influência na agenda internacional. Esta formulação estratégica é inevitavelmente de longo prazo e, portanto, perfeitamente inserida nos pressupostos culturais chineses de longo prazo, paciência e gradualidade. Ainda, para a China contemporânea, fatores estruturais influenciam diretamente a sua construção estratégica. O tamanho populacional, sua dimensão territorial, suas fronteiras são de extrema relevância para a análise de como a China se posiciona estrategicamente. Para uma nação da envergadura da China, rotas marítimas e terrestres são fundamentais. Tornam-se vetores de primeira importância considerando a rota de crescimento chinesa nos âmbitos político e econômico. Por este motivo, a manutenção do crescimento econômico e do desenvolvimento doméstico são tão caros a administração central chinesa, principalmente a manutenção do Partido Comunista Chinês no poder. Dentro deste escopo a ser considerado, valem os exemplos das regiões de Chongqing e Xinjiang. A primeira encontra-se no meio oeste do território chinês. Consiste em uma região de baixo desenvolvimento e com uma concentração de população de etnias distintas. Não por acaso foi a região escolhida para ser o hub de passagem e distribuição da parte terrestre da Nova Rota da Seda. Ao mesmo tempo, Xinjiang, que já foi palco de disputas territoriais, no limítrofe da fronteira recebe atenção semelhante por parte do planejamento central chinês (informação do Institute of Geographic Sciences and Natural Resources Research - IGSNRR, Chinese Academic Science - CAS). Ambos os casos são exemplos imediatos do planejamento derivado da adoção de uma Grande Estratégia. E tal classificação é possível pois a Nova Rota da Seda é um projeto estatal de ligação logística entre a China e a Eurásia e Europa. Lançando mão de uma sólida estratégia de investimento a China prepara sua projeção além fronteiriço e, simultaneamente, busca resolver problemas de ordem doméstica.

6


O projeto logístico (ver figura) de ligação do território chinês passando pela Ásia Central chegando até a Europa – a Nova Rota da Seda – pressupõem uma passagem de mercadorias, dutos, ferrovias, estradas, redes de internet e cabos de fibra ótica aproveitando o denominado de “period of strategic opportunity” conforme consta nos documentos oficiais. Para tanto, um volume significativo de investimento é necessário. Investimento que na atual conjuntura poucos países teriam condição de realizar, a China é um destes poucos. Figura 1 - O projeto da Nova Rota da Seda.

Fonte: IGSNRR, 2016. Uma outra característica importante deste movimento chinês é que os tomadores de decisão o classificam como contra hegemônico. E por contra hegemônico não se compreende como uma posição extrema e contrária. Mas uma postura que incorpore as premissas (ou as bases culturais e filosóficas) da constituição da própria República Popular. A concepção de contra hegemonia aqui está mais relacionada a uma posição contrária à unipolaridade do que contrário a quem aufere os ganhos da unipolaridade. Ou seja, a China não se apresenta contrária ao EUA, mas sim a sua primazia na tomada de decisão e na determinação de uma agenda internacional. E consequentemente aos ganhos derivados da liderança. Observa-se nos documentos oficiais chineses que a China colocase como “proativa” diante do atual cenário mundial. Repare que o termo usado é distinto do comumente usado “assertivo”. O uso da narrativa aqui também pode ser contabilizado

7


como um instrumento estratégico. A troca do termo reflete uma postura não agressiva, mas sim harmônica como preferem os chineses. O interessante é notar que a China usa o pensamento estratégico em todas as suas ações. A sua postura denominada de contra hegemônica considera a existência dos EUA. Ao mesmo tempo a China mantém a busca contínua de seus objetivos. Ou seja, as metas são atualizadas constantemente mediante observação do cenário. As metas são estabelecidas a despeito das ações norte americanas e considerando as ações norte americanas. E exatamente neste difícil exercício de conciliação é que se observa a adoção de uma Grande Estratégia por parte da China. E tal comportamento é um excelente exemplo de contemporaneidade e, sobretudo, vigor da Geopolítica como área de estudo e essência da estratégia. Seus limites e suas possibilidades são igualmente considerados em seu planejamento estratégico no grande xadrez global. A expansão chinesa para os continentes africano e latino americano são exemplos a ser considerados. Estes dois territórios constituem oferta e demanda, fornecedores de insumos e mercado para os produtos chineses. É uma expansão “pacífica” que é construída por meio de acordos de cooperação. Ou seja, negociação e barganha estão inseridos no processo. E nesta toada a expansão chinesa vai mostrando um caminho distinto daquele notado e registrado por Chang na sua obra Chutando a Escada. A construção do desenvolvimento chinês é fruto de uma proposta contra hegemônica cujo discurso sustentador encontra eco no multilateralismo e na multipolaridade. Também instrumentos fortes para a consecução de seus objetivos. Todo o acima exposto indica que considerando os pressupostos da Geopolítica, montando uma Grande Estratégia, a China vai gradualmente galgando seu espaço de expressão no cenário global.

Geopolitics, Great Strategy and the Chinese position in the international game

8


Alexandre Cesar Cunha Leite2

There are those who say that Geopolitics is fashionable nowadays, just as there are also those who say that Geopolitics has gained importance again towards today’s global transformations and the new international dynamics. Chinese expansion (in broad perspective) and territorial disputes (especially regarding the islands of the South China Sea), the movements of NATO expanding to the East, the new North American foreign policy drawn (although not completely clear) in the Donald Trump administration, the numerous conflicts in the Middle East and the African continent, migratory movements around the globe and the Russian policy of resumption in Vladimir Putin's rule are some examples used to highlight the resurgence of Geopolitical studies. Contrarily to those who follow the cycle of thought, I dare say that Geopolitics has always been present, it is not an advent related to “the now” and at any moment lost its relevance or taken into account by those who wish to understand more in detail what happens in international politics. Mackinder, Spykman, Mahan, Haushofer and Brzezinski, among others, have never been forgotten or considered to be "old-fashioned". These Strategy thinkers are seminal and, above all, essential for a broad understanding of the global dynamics and its complexity. I take here the concept of Geopolitics as the combination of several factors, notably geographic, historical, political and economic factors, having an effect in the condition of one or several States, or region within the great chessboard that constitutes the global politics. Some authors tend to consider Geopolitics as an area of study in which the it can be observed the influence of geographical factors (territory, population, natural resources, infrastructure and economic capacities) on State policy and its participation in the International System. This second concept is very useful and didactic, but when it comes to relations between States, global dynamics tends to function in a system of action and reaction. When one imagines this system as a strategy game, such as chess, one should additionally presuppose rationality not exclusively in the movement of pieces, but

2

9

Professor and researcher of the Post-Graduation Program in International Relations of the State University of Paraíba (PPGRI / UEPB) and of the Graduate Program in Public Management and International Cooperation of the Federal University of Paraíba (PGPCI / UFPB). Coordinator of the Asia-Pacific Research and Study Group (GEPAP / UEPB / CNPq). E-mail: alexccleite@gmail.com. Orcid: http:// orcid.org/0000-0002-0209-2717. Lattes: http://lattes.cnpq.br/7812468603653799.


also in strategic pre-movement thinking. This indicates that there is a need to reason the movements and the dynamics even before the decision making. When a State or a ruler uses strategic thinking derived from Geopolitics, it is understood that the domestic and foreign objectives of that nation are being taken into consideration. How to maintain the sovereignty of their territories and the best way to do so. Once established the objective(s) is left to definition of which are the most recommended practices considering the existing scenario. In addition, a conjecture exercise is made to consider the possible movements of the representative actors in order to achieve the planned objectives. Having said that, it should be considered that in view of the great scenario defined by Geopolitics it is important to design an action strategy. The literature indicates that nations with greater capacity tend to establish what has been termed as Great Strategy. Barry Posen, Hal Brands, Flint and Hillary Leverett, among other scholars of the Geopolitical relationship, objectives and foreign policy classify the Great Strategy as an intellectual construction that structures foreign policy actions over time in order to achieve the planned/defined objectives. In practice, the Great Strategy is the construction of Foreign Policy design (in the broad sense) considering how best to achieve its goals, whether domestic or international. For this purpose, Diplomacy is used here as the capacity of the State to persuade as many other States to cooperate in order to increase its capacity and, consequently, to achieve its objectives. It also makes use of existing economic power as a mobilizing instrument and a guarantee of bargaining power. Thus, the Grand Strategy must, above all, have the protection of its territory and political integrity as its main objective. Before what was here exposed, a question that arises is whether all States have a time-based planning system as a form of Great Strategy. What is observed in the literature and by consulting state official documents is that several try but few make it concrete. It is noted that the capacity, power and relevance of these States within the International System tend to interfere with the design and implementation of the Great Strategy. In the current scenario one can observe that a country that has reached the scale, size and economic and political strength, and is capable of influencing and simultaneously having to worry about the global dynamics, is the Popular Republic of China, henceforth China (or PRC). Its regional position and ascendancy on the international scene make

10


China one of the most important players in the global scenario. Chinese actions tend to influence their regional environment, their economic and political partners and the decision-making process of global powers, being hegemonic or not. In the Chinese case, taking it as a large state, the Great Strategy seeks to improve its relative position in the International System and to increase its capacity to achieve its strategic objectives and maximize its influence on the international agenda. This strategic formulation is inevitably long-termed and therefore perfectly embedded in the Chinese long-term cultural assumptions, patience and gradualness. Still, for contemporary China, structural factors directly influence its strategic construction. The size of the population, its territorial dimension, and its borders are extremely relevant to the analysis of how China strategically positions itself. For a nation with the wingspan of China, sea and land routes are the key. They become vectors of first importance considering the Chinese route of growth in the political and economic spheres. For this reason, the maintenance of economic growth and domestic development are so important for the central Chinese administration, mainly the maintenance of the Chinese Communist Party in power. Within this scope to be considered, the examples of the regions of Chongqing and Xinjiang are worthy. The first is in the middle west of China. It consists of a region of low development with a big concentration of population from different ethnic groups. Not by chance was this region chosen to be the hub of passage and distribution of the land part of the New Silk Road. At the same time, Xinjiang, which has already been scene of many territorial disputes on the border frontier receives similar attention from central Chinese planning (information from the Institute of Geographic Sciences and Natural Resources Research - IGSNRR, Chinese Academic Science - CAS). Both cases are immediate examples of planning derived from the adoption of Great Strategy. And such classification is possible because the New Silk Road is a state-owned logistics project between China, Eurasia and Europe. Using a solid investment strategy, China prepares its projection across borders and simultaneously seeks to solve domestic problems. The logistics project (see figure) linking Chinese territory through Central Asia to Europe - the New Silk Road - presupposes a passage of goods, ducts, railways, roads, internet networks and fiber optic cables taking advantage of the so-called "period of strategic opportunity" as it appears in the official documents. For this, a significant

11


amount of investment is required. Investment in the current conjuncture is what few countries would be able to carry out, and China is one of these few. Figure 1 – The project of the New Silk Road

Source: IGSNRR, 2016. Another important feature of this Chinese movement is that decision makers classify it as counter-hegemonic. And by counter-hegemonic it is not understood as an extreme and/or contrary position. But a posture that incorporates the premises (or the cultural and philosophical bases) of the constitution of the Popular Republic itself. The conception of counter-hegemony here is more related to a position contrary to unipolarity than to those who benefit from the gains of unipolarity. In other words, China is not opposed to the US, but its primacy in decision-making and in the determination of an international agenda. And consequently the gains derived from leadership. Official documents state that China is "proactive" in the current global scenario. Notice that the term used is distinct from the commonly used "assertive." The use of narrative here can also be accounted as a strategic tool. The exchange of the term reflects a non-aggressive posture, but rather harmonious just as the Chinese prefer. Interestingly, China uses strategic thinking in all its actions. His so-called antihegemonic posture considers the existence of the United States. At the same time China maintains the continuous pursuit of its goals. That is, goals are constantly updated by

12


observing the scenario. The goals are established in spite of the North American actions and considering the North American actions. It is precisely in this difficult conciliation exercise that the adoption of Great Strategy by China is observed. And such behavior is an excellent example of contemporaneity and, above all, the vigour of Geopolitics as an area of study and essence of Strategy. Its limits and possibilities are also considered in its strategic planning in the great global chess. The Chinese expansion to the African and Latin American continents are examples to be considered. These two territories constitute supply and demand, suppliers of inputs and market for Chinese products. It is a "peaceful" expansion that is built through cooperation agreements. That is, negotiation and bargaining are embedded in the process. And at this rate the Chinese expansion is showing a path distinct from the one noticed and recorded by Chang in his work “Kicking the ladder”. The construction of Chinese development is the result of a counter-hegemonic proposal whose sustaining discourse is echoed in multilateralism and multipolarity, also strong instruments for the achievement of its goals. All that was mentioned above indicates that by considering the assumptions of Geopolitics, by setting up Great Strategy, China is gradually expanding its space of expression on the global stage.

Geopolítica e democracia: percepções acerca das ações russas em seu entorno regional

13


Larlecianne Piccolli3

Para a análise aqui desenvolvida propõe-se ir além a um debate conceito acerca dos termos centrais propostos à abordagem: geopolítica e democracia. Ambos os termos, ao longo dos tempos, foram debatidos à exaustão e ainda apresentam divergências em suas concepções. Destarte, não se espera nesta breve análise adentrar e aprofundar tal debate conceitual, outrossim, busca-se uma mínima aplicabilidade à realidade posta do sistema internacional contemporâneo, especificamente no que tange a atuação da Federação Russa neste. Isto posto, a fim de avançar empiricamente ao tema exposto, pretende-se abordar a relação entre os interesses geopolíticos de Moscou e a condução democrática nos países de seu entorno. Para tanto, delimita-se temporalmente a análise a partir dos anos 2000, com a ressalva de uma breve retomada da década de 1990 para melhor compreensão dos fatos. A fim de estruturar o desenvolvimento e execução da tarefa proposta, utilizar-se-á a concepção de “círculos concêntricos” desenvolvida pela acadêmica Maria Raquel Freire (2011) e sua vinculação aos vetores estruturantes da política externa do Kremlin. Para tanto, em primeiro lugar, trabalhar-se-á o entendimento ao conceito proposto por Freire, para então adentramos em princípios basilares da condução de política externa e de segurança russa (PES), vislumbrando seus interesses geopolíticos e geoestratégicos na região considerada seu “exterior próximo” para, por fim, analisar situações postas ao longo da década de 90 e dos anos 2000 que aufiram a relação existente entre condução democrática e interesses geopolíticos. Maria Raquel Freire (2011) afirma em seu estudo que a ação de Moscou no sistema internacional segue um modelo de círculos concêntricos, estabelecidos a partir do influxo daqueles que se constituem enquanto vetores estruturantes da política externa e de segurança russa. Neste sentido, o primeiro círculo remete à área da Comunidade de Estados Independentes (CEI), também referida como “exterior próximo”, qual seja a área em seu entorno imediato, aquela que toca diretamente suas fronteiras ou a de seus espaço vital (antigas repúblicas soviéticas). Freire ainda segmenta este primeiro círculo em três sub regiões: CEI Ocidental (Rússia, Bielorrússia, Ucrânia e Moldávia), Cáucaso do Sul 3

Doutoranda e Mestre em Estudos Estratégicos Internacionais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul Bacharel em Relações Internacionais pela Faculdade América Latina. Contato: larle@hotmail.com

14


(Armênia, Azerbaijão, Geórgia) e Ásia Central (Cazaquistão, Quirguistão, Tadjiquistão, Turcomenistão e Uzbequistão)4. A região é considerada zona de interesse estratégico à Moscou, é assumida enquanto região prioritária da política externa e, no presente estudo, postula-se como objeto de análise empírica da correlação proposta entre geopolítica e democracia. O segundo círculo faz referência ao direcionamento da política externa ao Ocidente, nomeadamente às relações com a instituições ocidentais União Europeia (UE) e Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), bem como ao relacionamento estendido aos Estados Unidos. Ademais de geograficamente afastado do primeiro círculo, politicamente busca exercer deveras influência na região como visto ao longo de década de 90 nos movimentos conhecidos como Revoluções Coloridas. Ainda, é sublinhado pela política externa russa o ímpeto expansionista das instituições, em especial da OTAN, gerindo constantes focos de tensão no curso do relacionamento das partes. O terceiro círculo ao qual se refere Freire vincula a dimensão oriental da PES da Rússia, englobando atores como China, Índia e Japão, bem como a Organização Cooperação de Xangai (OCX). Um quarto círculo, não bem delimitado, adentra no relacionamento da Rússia com o Oriente Médio, aqui proeminente ao debate visto a presença de Moscou no conflito sírio, incitada por interesses geopolíticos: garantir linhas marítimas de comunicação e acesso a mares de águas quentes. Dito isto, importa retomarmos brevemente aspectos do período anterior à delimitação temporal (anos 2000) para compreendermos como as mudanças auferidas pelo governo Putin geriram uma latente alteração no posicionamento da política externa e de segurança nas e com as regiões acima supracitadas. Com o colapso soviético, a Rússia herda da URSS aliados estratégicos em sua área de influência, seu assento no Conselho de Segurança da ONU, suas representações diplomáticas no exterior e seu aparato militar e nuclear, mas em contraponto, também herdou uma economia deteriorada, instituições políticas desgastadas e a perda de importantes fatores geopolíticos que moldavam sua influência no sistema internacional. A economia apresentava índices de crescimento negativos e uma organização interna ainda relutante para com as novas medidas econômicas propostas, índices de inflação altíssimos e uma balança comercial mantida a níveis positivos exclusivamente pela venda de commodities. Nas questões políticas, a constante manipulação das instituições por 4

A divisão proposta pela autora não considera os páises Bálticos (Estônia, Letônia e Lituania), cabe aqui mencionar que tem-se ciência que a influência da política externa russa estende-se à região.

15


líderes políticos e sua vinculação aos processos de privatização, acarretaram a falência de um processo de transição democrático e o retorno de meios autoritários de governança – ver-se-á que, com o advento do governo Putin, tais meios autoritários de governança emoldurarão a guinada da política externa do país e sua atuação a partir dos círculos concêntricos designados. Deparava-se com um processo de reestruturação lento e gradual, profundamente marcado por um expressivo crescimento econômico e autoritarismo político. Em suma, a queda da URSS trouxe quatro implicações centrais para a Rússia: o fim de uma ideologia unificada sustentada nos princípios marxista-leninistas; findo o domínio ideológico, perde-se também a identidade a ele agregada, caracterizada por uma hierarquização e centralização da autoridade governamental do Partido Comunista; instaura-se um processo de transformação para um modelo de governo democrático, o qual a sociedade russa desconhecia; e por último, desencadeia-se um processo de formatação de novas fronteiras e redefinição das suas relações com seus vizinhos instáveis, além de uma redefinição do papel da Rússia no sistema internacional. Desta forma, “[...] [o] novo projeto político [externo] russo dependia não só do que o país herdou da URSS em termos materiais, mas também do ‘software’ [capacidade] político que seria aplicado para transformar a Rússia” (Godzimirski, 2008 apud Freire, 2009, p. 79), implicando em medidas de política externa resultantes de uma equação de fatores domésticos e externos, na qual a conjugação de recursos internos e vontade política com ameaças e oportunidades externas, conduziram a opções de políticas externas impregnadas com o objetivo maior de maximização do interesse nacional. Ainda de acordo com Freire (2009), esta fórmula complexa é assim composta por variáveis distintas a diferentes níveis [...] que cruzam uma multiplicidade de setores (política, segurança, economia), [...] visa explicar a multiplicidade de aspectos subjacentes à política externa, para além dos modelos tradicionais baseados na escolha racional, políticas burocráticas, ou papel da liderança na definição da agenda e formulação de políticas, [...] permitindo uma análise alargada de dinâmicas e tendências (Freire, 2009, p. 76).

Numa conjuntura de mudanças, se fazia necessária uma política externa que desse conta da nova realidade que se instaurava, capaz de guiar a inserção da nova Rússia em uma configuração internacional não mais bipolar. Era preciso estabelecer uma nova identidade para a política externa do país, agora ajustada à situação de decadência de

16


superpotência, e a fim de “sedimentar uma posição estável do país na política internacional” (Zhebit, 1993, 260). Isto abriu um significativo espaço para a multilateralidade das relações exteriores, bem como enfatizou o relacionamento com os países de seu entorno. A política externa passa a ser um instrumento de política doméstica norteada para as necessidades do país buscando parcerias de cooperação e, além disso, há uma “vinculação entre as reformas domésticas e a evolução da situação mundial, [onde se argumenta] que a consolidação da democracia é fulcral para a futura ordem internacional” (Zhebit,1993, p. 261). O processo transitório político e econômico que remodelou as estruturas institucionais da Rússia durante a década de 1990, foi profundamente marcado por crises políticas e econômicas, escândalos de corrupção e por novos poderes influentes na política, que deram ao sistema moldes pouco democráticos e autoritários. A reação da população era de apatia e descontentamento para com o governo, a piora das condições socioeconômicas, a falta de resultados significativos das políticas empreendidas pelo governo Yeltsin e a deterioração da imagem do país no cenário internacional – alavancada pelos escândalos de corrupção envolvendo o Presidente e muitos de seus assessores diretos, influenciavam diretamente no desejo da população por uma “mão-forte” capaz de restabelecer a ordem no país. Tão logo assume o governo Putin estabelece quatro metas principais, a saber: i) reversão do declínio econômico; ii) promoção da Rússia enquanto ator importante na arena internacional; iii) transformação do quadro político que poderia levar ao desmantelamento do país (pacto federativo), e paralelo a este último, iv) restabelecimento da validade das leis estatais (Colin, 2007). Assim, toda e qualquer reforma, desde a área administrativa, social, militar e econômica do Estado, estavam designadas a restabelecer a ordem interna e a governabilidade do país, tendo como base o rígido controle político de todas as áreas. Putin se valeu de um modelo “autoritário vertical” como forma de garantir a governabilidade do país. Num cenário em que, se por um lado as rígidas medidas políticas estabelecidas colocaram a prova os rumos do processo democrático e das liberdades civis, por outro alavancaram uma retomada da autoconfiança nacional e da credibilidade no país.

Neste

sentido,

compreende-se

necessária

a

assimilação

do

conceito

gosudarstvennost enquanto fundamental para o entendimento deste processo. Tal concepção está vinculada a ideia de

17


o estado russo estar organicamente ligado à sociedade russa, não sendo nem seu oposto, nem seu inimigo [,] ao contrário da concepção liberal de que o estado é potencialmente um inimigo das liberdades individuais na sociedade, o estado moscovita [russo] se desenvolveu sob uma concepção intelectual bastante generalizada de que um estado forte é necessário para o pleno desenvolvimento da sociedade russa (Segrillo, 2008, p. 9).

Destarte, entende-se porque a condução de medidas tomadas como antidemocráticas pela comunidade internacional, não são vistas desta maneira pela sociedade russa. De acordo com Mielniczuk e Piccolli (2015), “aos russos a ideia de uma ligação orgânica entre Estado e sociedade, principalmente em se tratando de um estado centralizado, é vista como meio natural para o desenvolvimento e crescimento do país”, sendo a centralidade e a autoridade estatal aceitas pelo cidadão comum. Tal essência é também perceptível na condução da política externa do país. Historicamente dividida entre corrente pró-ocidentais e eslavófilas5, Putin foi capaz de articular uma política externa perspicaz a qual uniu elementos e ponderou a relatividade de ambas as correntes por meio da ênfase em aspectos específicos da situação geopolítica da Rússia. Diante disto, o Estado segue exercendo papel fundamental: é o elo de ligação entre o mundo Europeu Ocidental e o mundo Asiático, e o pilar de sustentação contra as ameaças representadas por esses dois extremos. Esta guinagem da política externa prevê enquanto pilares a i) preservação de sua integridade territorial, manutenção da segurança e soberania do país, enfatizando a inserção do país de forma prestigiosa na comunidade internacional; ii) revisão do status quo unipolar vigente no sistema internacional, a fim de garantir a influência russa sobre os processos gerais mundiais e assim, criar condições externas propícias ao seu desenvolvimento; e iii) formação de um cinturão de boa-vizinhança ao longo das fronteiras, no intuito de assegurar a primazia e exclusividade russa em sua área de influência – em especial o espaço pós-soviético. Desta forma, depreende-se que a atuação frente aos espaços estabelecidos pelos círculos concêntricos de Freire é fundamentada por tal espírito de “autoridade

5

18

O debate entre eslavófilos e ocidentalistas é formado no desenrolar do processo histórico de formação da Rússia, mas ganha fôlego após as modernizações de caráter ocidentalista feitas por Pedro, o Grande. Ao passo que os ocidentalistas acreditam na idéia de que a Rússia deva se modernizar seguindo os caminhos do Ocidente, os eslavófilos pregam que a Rússia, por suas características únicas, deva se desenvolver por seus próprios meios e caminhos, não imitando o Ocidente. Yeltsin mostrou-se bastante ocidentalista em suas políticas, já Putin possui uma posição mais central no pêndulo eslavismo/ocidentalismo, exercendo um papel moderados no debate (Segrillo, 2008).


vertical”, refletido em uma política externa multivetorial que, ao fim e ao cabo, preconiza a manutenção dos interesses geopolíticos do país para garantir a condução de um sistema internacional com características multipolares assegurando seu status de influência neste. Ou seja, ultrapassa a barreira doméstica e passa a ser refletida na condução do relacionamento e na influência que exercer no “exterior próximo” em prol de ganhos em seus objetivos e interesses. Quando se trata de garantir seus interesses, Moscou não poupa esforços, e age de maneira assertiva e pragmática. Desta forma a geopolítica russa em seu entorno adquire contornos econômicos, estratégicos e de proteção territorial, e a garantia destes perpassa manutenção de influência nestes países vizinhos. Em termos econômicos importa garantir prospecção de campos e logística de escoamento da produção de hidrocarbonetos, a fim de garantir bons resultados econômicos. As questões estratégicas dizem respeito a manutenção das linhas marítimas de comunicação e o acesso aos mares de águas quentes. A proteção territorial importa por questões de segurança estatal de ampla vinculação às questões de segurança nuclear. Passamos então às tratativas de vinculação empírica da política externa e de segurança russa às regiões especificadas nos círculos concêntricos. No primeiro círculo é perceptível o jogo de alta complexidade da política externa russa: a região é assumida como área estratégica aos interesses e área preferencial de intervenção, o que gera mínimo grau de flexibilidade na negociação do envolvimento de terceiros na região. Exemplos disto são as intricadas relações no Cáucaso, a intensificação do relacionamento com a Ásia Central, e claro, as questões envolvendo a expansão da OTAN para o Leste Europeu (nomeadamente, Ucrânia) e Cáucaso (nomeadamente, Geórgia). A região, que antes servira como cordão sanitário ao Ocidente e um cinturão de proteção ao governo soviético, hoje é foco de atuação da política externa russa de modo a formar um cinturão de boa-vizinhança, prezando por um bom entendimento multi e bilateral entre os países a fim de, como dito, eliminar focos de tensão e prevenir que possíveis conflitos se desenvolvam ao longo das fronteiras, garantindo segurança e integridade ao território russo. O segundo círculo abrange a dimensão de relacionamento com o Ocidente. As ações nesse dispostas, por vezes indiretas, causam reflexo direto no primeiro círculo. Veja-se a questão da expansão da OTAN, por exemplo, ademais de possuir status de

19


parceira da OTAN desde 2002, Moscou repudia veementemente seu ciclo expansionista6. A preocupaçaõ russa é factual: vê a OTAN como uma ameaça à sua segurança. Isto porque, de acordo com o Artigo 5° do Tratado do Atlântico do Norte, os Estados signatários do tratado acordam que um ataque em armas contra um ou mais membros da OTAN deverá ser considerado como um ataque a todos os membros. Além disto, é prevista mútua assistência entre seus membros, incluindo a possibilidade de uso das forças armadas com a finalidade de restaurar e manter a segurança em sua regiaõ de abrangência. Estas duas questões remetem um peso ainda maior ao projeto de expansaõ do bloco, principalmente no momento em que, com dito, sua próxima fase faz alusaõ à adesaõ de Ucrânia e Geórgia ao bloco, aproximando-se significativamente da fronteira russa. Alexei Arbatov (2003) bem resume o temor russo: é preciso evitar a formaçaõ de pequenos protetorados norte-americanos ao longo das fronteiras, naõ sendo apenas umaquestaõ de respeito a princiṕ ios e sim, uma questaõ de segurança própria, senaõ , de sobrevivência. O Kremlin tampouco aceita a ingerência ocidental na região. Sob a bandeira da luta contra o terror global, influenciou nas chamadas Revoluções Coloridas: Revolução das Rosas (Geórgia – 2003), Revolução Laranja (Ucrânia – 2004) e Revolução das Tulipas (Quirguistão – 2005). No entanto, na busca pela destituição de governos prórussos ditos “autoritários” pelo ocidente, prezando respeito à democracia e liberdade de direitos nestes países Washington incentivou tais revoluções buscando, outrossim, estabelecer governos próximos a seus interesses (Piccolli, 2012). Movimento semelhante ocorreu no recente imbróglio ucraniano. Dividida entre projetos econômicos que a aproximavam ou afastavam de europeus e/ou russos, a opção pelo acordo com os europeus representava não somente um passo ao livro comércio com a União Europeia mas também a adesão progressiva a Defence Policy and European Defence Agency. Ao fim e ao cabo coloca indiretamente a Ucrânia na estrutura militar da OTAN. Esta adesão representava uma expressiva aproximação da organização ao território russo

Em uma primeira onda de expansaõ (1997) incorporou os Estados da República Tcheca, Hungria e Polônia (se tornam membros oficialmente em 12 de março de 1999). Em 2002 sao ̃ convidados a participar da organização Bulgária, Estônia, Letônia, Lituânia, Romênia, Eslováquia e Eslovênia, aderindo oficialmente ao pacto em 29 de março de 2004. Em sua última onda expansionista, é protocolada a entrada de Albânia e Croácia (1° de abril de 2009) na organização. O avanço em direção ao “exterior próximo”, angariando novos parceiros (Ucrânia e Geórgia) e criando bases militares em ex-repúblicas soviéticas (Cazaquistão e Uzbequitão, por exemplo), alerta ainda mais o Kremlin. 6

20


(especificamente cerca de 1.600km de São Petersburgo e apenas 480km de Moscou), rompendo com todo o equilíbrio geopolítico da Eurásia (Bandeira, 2016). No compasso da expansão da OTAN, outra questão litigiosa entre as partes é o projeto norte-americano de instalação de um escudo antimísseis na Europa Oriental (NMD – National Missile Defense7). O projeto, retratado pelos Estados Unidos como uma proteção do Ocidente a ataques da Coreia do Norte e do Irã, vai de encontro às premissas de segurança da Rússia, sendo argumentado por Moscou que o “plano [é] uma ameaça à sua própria força nuclear de dissuasão e implicações ao seu status como grande poder” (Luque, 2010, p. 56). Ao passo que as ameaças nucleares iranianas se estabilizam com o avanço dos acordos nucleares com Teerã, e frente ao sabido curto alcance dos mísseis norte-coreanos, infere-se que o projeto é sim voltado à minar a capacidade de segundo ataque russo, garantindo primazia nuclear aos norte-americanos. Por fim, importa atentar a dois eventos em que o uso efetivo da força traduz o ímpeto de Moscou em garantir seus interesses geopolíticos, a Guerra da Geórgia e a intervenção na Síria. A Guerra da Geórgia serviu à objetivos econômicos, operacionais e políticos-estratégicos dos russos. Em termos econômicos, apontou aos países europeus que os rumos de seu fornecimento de energia8 estão em jogo em face a expansão da OTAN para Leste, bem como expôs a fragilidade da infraestrutura alternativa ao fornecimento fundamentada na Geórgia. As questões operacionais dizem respeito à capacidade de combate e ação dos russos em áreas geopoliticamente estratégicas ao país.

7

21

De acordo com a Public Law 106-38 (1999), a National Missile Defense (NMD) consiste na política dos Estados Unidos para implantar, tão logo a tecnologia permita, um efetivo sistema de Defesa Nacional Antimísseis capaz de defender o território dos Estados Unidos contra ataques de mísseis balísticos limitados (quer acidental, não autorizado, ou deliberado). Tal projeto tem seu financiamento sujeito à autorização anual das dotações e da apropriação de fundos para a Defesa de Mísseis Nacional (PUBLIC LAW 106-38, 1999). Dentre os projetos que integram o NMD está o Sistema de Mísseis Balísticos (Ballistic Missile Defense System – BMDS), cujo principal sítio de atuação é a Europa e o Japão. Apesar disto, os principais elementos destes sistemas são operados pelo Comando Estratégico dos Estados Unidos (USSTRATCOM), Comando Norte (USNORTHCOM), Comando do Pacífico (PACOM), Comando Europeu (USEUCOMA) e Forças dos Estados Unidos no Japão (USFJ). A despeito da denominação dos sistemas alocados em território europeu e japonês, denotam apenas o custeio e a propriedade dos interceptadores por estes parceiros, haja visto que a operação é quase integralmente dependente dos Estados Unidos. Importa ressaltar ainda que Washington possui programas de cooperação em defesa missilística com uma série de aliados, incluindo Reino Unido, Japão, Austrália, Israel, Dinamarca, Alemanha, Holanda, República Tcheca, Polônia, Itália e outros, fazendo valer destas parcerias enquanto espaço de atuação. A tecnologia de defesa de mísseis desenvolvida, testada e implementada pelos Estados Unidos é designada a conter mísseis balísticos de todos alcances (curto, médio, intermediário e longo). A coordenação geral do projeto fica a cargo da Agência de Defesa de Mísseis (Missile Defense Agency – MDA) (Cepik; Martins, 2014; Piccolli, 2012). 8 Lembra-se que a Rússia é a principal fornecedora de energia aos europeus e que estes tem buscado mercados alternativos para reduzir esta dependência.


No conflito em questão foram capazes de destruir boa parte da infraestrutura logística georgiana, movendo prontamente tropas por terra e mar. Em termos políticos-estratégicos é um claro sinal ao Ocidente que não será tolerado o cerco gerados por suas instituições, da mesma forma que aponta para contenção de quaisquer desafios regionais que lhe sejam impostos (Piccolli, 2016). Na questão síria (e aqui abrangendo um quarto círculo concêntrico sob as premissas de Maria Raquel Freire) também são perceptíveis interesses que perfazem uma interessante moldura geopolítica. Em primeiro lugar, uma perspectiva político-militar assinala à comunidade internacional a capacidade de Moscou em seu entorno regional: seja por um viés cooperativo, priorizando os mecanismos de negociação; seja por um viés coercitivo, projetando e utilizando capacidades militares em seu entorno regional – agora em um escopo que vai além ao “exterior próximo”. Como anteriormente mencionado, o ponto de vista estratégico cumpre assegurar as linhas marítimas de comunicação com o Mar Mediterrâneo e com o posto avançado em Tartus, garantido acesso aos mares de águas quentes. Aqui faz-se um adendo para atentar à importância da Crimeia neste processo, visto servir de casa para a principal base naval russa, Sevastopol, recebendo a Frota do Mar Negro e sendo ponto de acesso crucial aos estreitos que levam ao Mediterrâneo Leste / Índico. Em termos econômicos, é perceptível o interesse de Moscou em manter-se participativa no estabelecimento de projetos que vinculem a dependência europeia de hidrocarbonetos seus e de aliados. Ao fim, fica explícito o papel que os interesses geopolíticos da Rússia exercem em termos de ações de política externa e segurança nos países em seu entorno. Ainda, é perceptível que frente ao avanço constante das instituições ocidentais, ou seja do Ocidente em si – também em busca de seus interesses geopolíticos, há um influxo reativo de Moscou na região com vistas a garantir sua área de influência e a proteção de seus interesses, nem que para isso seja necessário alocar suas premissas de “autoridade vertical” além fronteiras.

Bibliografia

22


ARBATOV, Alexei. The Transformation of Russia’s Military Doctrine in the Aftermath of Kosovo and Chechnya. In: GORODETSKY, Gabriel. Russia Between East and West: Russian Foreign Policy on the Threshold of the Twenty-First Century. London: Frank Cass Publishers, 2003. BANDEIRA, Luiz Alberto Moniz. A desordem mundial: o espectro total da dominação. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2016. BERTONHA, João Fábio. Rússia – Ascensão e Queda de um Império: Uma História Geopolítica e Militar da Rússia, dos Czares ao Século XXI. Curitiba: Juruá, 2010. CEPIK, Marco; MARTINS, Jose Miguel Quedi. Defesa Nacional Antimíssil dos EUA: a lógica da preempção e suas implicações internacionais. In: SCHMIDT, Carlos Arturi (org.). Políticas de Defesa, Inteligência e Seguranca. Porto Alegre: UFRGS/CEGOV, 2014, pp. 14-47. COLIN, Roberto. Rússia: o ressurgimento da grande potência. Florianópolis: Letras Brasileiras, 2007. COLIN, Roberto. Rússia: o ressurgimento da grande potência. Florianópolis: Letras Brasileiras, 2007. FREIRE, Maria Raquel. A Política Externa em Transição: o caso da Federação Russa. Relações Internacionais, Lisboa, nº 23, Setembro 2009, pp.75 – 89. FREIRE, Maria Raquel. A Rússia de Putin: Vectores Estruturantes de Política Externa. Coimbra: Cosmopolis, 2011. LUQUE, Alessandra Aparecida. O Eixo Putin-Bush (2001/2008) e a Dinâmica da Cooperação e do Confronto no Relacionamento Bilateral Rússia e EUA. Marília: UNESP, 2010. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Relações Internacionais) Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista – UNESP, 2010. MIELNICZUK, Fabiano, PICCOLLI, Larlecianne. Política e sociedade na Rússia atual. Em Debate. Belo Horizonte, v.7, n.4, p.50-54, set. 2015. PICCOLLI, Larlecianne; MACHADO, Lauren; MONTEIRO, Valeska Ferrazza. A Guerra Híbrida e o Papel da Rússia no Conflito Sírio. Revista Brasileira de Estudos de Defesa. Porto Alegre, vol. 3, n. 1, 2016. PICCOLLI, Larlecianne. “5 Dias de Guerra”: para além do cliché hollywoodiano: uma análise dos impactos no jogo político internacional. In: JÚNIOR, Edson José Neves; ZANELLA, Cristine Koehler (Org.). As Relações Internacionais e o Cinema – Volume 2: Estados e Conflitos Internacionais. Belo Horizonte: Fino Traço, 2016.

23


PICCOLLI, Larlecianne. Europa enquanto condicionante da política externa e de segurança da Rússia: o papel da defesa antimissile. Dissertação (Mestrado em Estudos Estratégicos Internacionais) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Faculdade de Ciências Econômicas, Programa de Pós-Graduação em Estudos Estratégicos Internacionais, Porto Alegre, 2012. POMERANZ, Lenina. Eleições na Rússia: O Fenômeno Putin. Sociedades em Transformação, nº4,

ano

VI,

2000,

pp.

2-6.

Disponível

em

<http://ftp.unb.br/pub/UNB/ipr/rel/sociedades/2000/140revista.pdf>. RUSSIA. The Foreign Policy Concept of the Russian Federation. Moscow, Feb. 2013. Disponível em: < http://www.mid.ru/brp_4.nsf/0/76389FEC168189ED44257B2E0039B16D>. RUSSIA. The Military Doctrine of the Russian Federation. Moscow, Feb. 2010. Disponível em: <http://www.sras.org/military_doctrine_russian_federation_2010>. SEGRILLO, Angelo . A nova Rússia: Balanços e Desafios. In: II Conferência Nacional de Política Externa e Política Internacional – II CNPEPI (Rio de Janeiro, 2007): O Brasil no Mundo que vem aí. Brasília: Funag, 2008. SEGRILLO, Angelo. Rússia: Economia e Sociedade. In: II Conferência Nacional de Política Externa e Política Internacional – Seminário Rússia. Brasília: Funag, 2008. ZHEBIT, Alexandre A. Reflexões sobre a Nova Concepção de Política Externa da Rússia. Contexto Internacional, Rio de Janeiro, vol. 15, nº2, jul/dez 1993, pp. 259-277.

Geopolitics and democracy: perceptions about Russian actions in their regional environment

24


Larlecianne Piccolli9

For the analysis developed here, it is proposed to go beyond a concepts’ debate about the central terms proposed for the approach: geopolitics and democracy. Both terms, throughout time, have been debated to exhaustion and there are still divergences in their conceptions. Thus, it is not expected in this brief analysis to penetrate and deepen such conceptual debate and also seek a minimum applicability to the reality created by the contemporary International System, specifically in what concerns the Russian Federation's performance in this. This, in order to proceed empirically to the subject mentioned above, intends to address the relationship between the geopolitical interests of Moscow and the democratic conduction in the neighbour countries. Therefore, the analysis is temporarily delimited from the 2000s, with the exception of a brief resumption of the 1990s to better understand the facts. In order to structure the development and execution of the proposed task, the concept of "concentric circles" developed by the academic Maria Raquel Freire (2011) and its linkage with the structuring vectors of Kremlin foreign policy will be used. In order to do so, we firstly work on the understanding of the concept proposed by Freire, and then we enter into the basic principles of the conduct of Russian Foreign and Security Policies (PES), looking at its geopolitical and geostrategic interests in the region considered its "close exterior". And finally, to analyze situations that occurred during the 1990s and the 2000s that draw the relationship between democratic leadership and geopolitical interests. Maria Raquel Freire (2011) states in her study that Moscow's action in the International System follows a model of concentric circles, established from the influx of those who constitute structuring vectors of Russian Foreign and Security policy. In this sense, the first circle refers to the area of the Commonwealth of Independent States (CIS), also referred to as the "close exterior", which is the area in its immediate surroundings which directly touches its borders or its vital space (former Soviet republics). Freire also divides this first circle in three sub-regions: Western CIS (Russia, Belarus, Ukraine and Moldova), South Caucasus (Armenia, Azerbaijan, Georgia) and Central Asia 9

PhD and MSc in International Strategic Studies by the Federal University of Rio Grande do Sul, Bachelor in International Relations by Latin America Faculty. Contact: larle@hotmail.com.

25


(Kazakhstan, Kyrgyzstan, Tajikistan, Turkmenistan and Uzbekistan)10. The region is considered a strategic area of interest to Moscow, it is assumed as a priority region of foreign policy and, in the present study, postulated as the object of empirical analysis of the proposed correlation between geopolitics and democracy. The second circle refers to the orientation of foreign policy to the West, namely relations with the Western European Union (EU) and North Atlantic Treaty Organization (NATO) institutions as well as the extended relationship to the United States. Although geographically away from the first circle, politically seeks to exercise a real influence in the region as seen throughout the decade of 90 in the movements known as Coloured Revolutions. Yet, Russian foreign policy underlines the expansionist impetus of institutions, especially NATO, managing constant points of tension in the course of the parties' relationship. The third circle to which Freire refers links the Eastern dimension of PES to Russia, encompassing actors such as China, India and Japan, as well as the Shanghai Cooperation Organization (OCX). A fourth circle, not well delimited, enters Russia's relationship with the Middle East, which is prominent here in the debate taking into consideration Moscow's presence in the Syrian conflict, incited by geopolitical interests: to guarantee maritime lines of communication and access to warm-water seas. Having said this, it is important to briefly review aspects of the prior period to the 2000s in order to understand how the changes made by the Putin Administration have led to a latent change in the positioning of foreign and security policy in the regions mentioned above. With the Soviet collapse, Russia inherits from the USSR strategic allies in its area of influence, its seat in the UN Security Council, its diplomatic representations abroad and its military and nuclear apparatus, but in counterpoint also inherits a deteriorating economy and political institutions, and the loss of important geopolitical factors that shaped its influence on the International System. The economy had negative growth rates and an internal organization still reluctant to the proposed new economic measures, very high inflation rates and a trade balance maintained at positive levels exclusively by the sale of commodities. In political matters, the constant manipulation of institutions by political leaders and their entailment of privatization processes has led to

10

The division proposed by the author does not consider the Baltic countries (Estonia, Latvia and Lithuania), however it should be mentioned that it is well known the extension of the influence of Russian foreign policy to this region.

26


the failure of a process of democratic transition and the return of authoritarian means of governance - it will be seen that with the advent of the Putin’s government such authoritarian means of governance will frame the turn of the country's foreign policy and its performance from the designated concentric circles. There was a slow and gradual restructuring process, deeply marked by significant economic growth and political authoritarianism. In sum, the fall of the USSR brought four central implications for Russia: the end of a unified ideology based on Marxist-Leninist principles; once the ideological domain is over, the identity attached to it is also lost, characterized by a hierarchy and centralization of the governmental authority of the Communist Party; a process of transformation is established for a model of democratic government, which the Russian society did not know; and finally, the process of creating new frontiers and redefining its relations with its unstable neighbours, and a redefinition of Russia's role in the International System. In this way, "[‌] [the] new Russian [external] political project depended not only on what the country inherited from the USSR in material terms but also on the political 'software' that would be applied to transform Russia "(Godzimirski, 2008 apud Freire, 2009, p.79), implying foreign policy measures resulting from an equation of domestic and external factors in which the combination of internal resources and political will with external threats and opportunities led to options of external policies impregnated with the greater objective of maximizing the national interest. Still according to Freire (2009), this complex formula is thus composed by distinct variables at different levels [...] that cross a multiplicity of sectors (politics, security, economy), [...] to explain the multiplicity of aspects underlying foreign policy, beyond traditional models based on rational choice, bureaucratic policies, or the role of leadership in the definition of the agenda and formulation of policies, [...] allowing a broad analysis of dynamics and trends (Freire, 2009, p.76).

In a conjuncture of changes, it was necessary a foreign policy that would take into account the new reality that was established, being able to guide the insertion of the new Russia in a non-bipolar international configuration. It was necessary to establish a new identity for the country's foreign policy now adjusted to the situation of superpower decadence, and to "establish a stable position of the country in international politics" (Zhebit 1993, 260). This has opened up significant space for the multilateralism of foreign

27


relations, as well as emphasized the relationship between the countries of its surroundings. Foreign policy becomes an instrument of domestic policy headed to the country's needs for cooperation partnerships. In addition, there is a "link between domestic reforms and the evolution of the world situation, [where it is argued] that the consolidation of Democracy is central to the future International Order "(Zhebit 1993: 261). The transitional political and economic process that reshaped Russia's institutional structures during the 1990s was deeply marked by political and economic crises, corruption scandals, and new influential political powers that have given the system undemocratic and authoritarian moulds. The population’s reaction was apathy and discontent with the government, the worsening of socio-economic conditions, the lack of significant results of the policies undertaken by the Yeltsin government and the deterioration of the country's image on the international stage - leveraged by corruption scandals involving the President and many of its direct advisors, directly influenced the population's desire for a "strongman" capable of restoring order in the country. As soon as he assumes the leadership, Putin establishes four main goals, namely: i) reversion of the economic decline; ii) promotion of Russia as a major actor in the international arena; iii) transformation of the political framework that could lead to the dismantling of the country (federal pact) and parallel to it, iv) restoration of the validity of state laws (Colin, 2007). Thus, any reform from the administrative, social, military and economic area of the State was designed to re-establish the internal order and the governability of the country, based on the rigid political control of all areas. Putin used a "vertical authoritarian" model as a way of ensuring the governance of the country. In a scenario where, on the one hand, the rigid political measures established have paved the way for democratic processes and civil liberties and , on the other hand, they have boosted a resumption of national self-confidence and credibility in the country. In this sense, it is necessary to assimilate the gosudarstvennost concept as fundamental for understanding this process. This conception is linked to the idea that the Russian state is organically connected to Russian society, being neither its opposite nor its enemy [,] contrary to the liberal conception that the state is potentially an enemy of individual liberties in society, the Moscovite [Russian] was generated by a very general intellectual conception that a strong state is necessary for the full development of Russian society (Segrillo, 2008, p.9).

28


From this, it is understood that the conduct of measures taken as undemocratic by the international community is not seen in this way by Russian society. According to Mielniczuk and Piccolli (2015), "to the Russians the idea of an organic link between State and society, especially in the case of a centralized state, is seen as a natural mean for the development and growth of the country", being the centrality and authority of the State accepted by the common citizen. Such essence is also perceptible in the conduct of the country's foreign policy. Historically divided between pro-Western and Slavophilic currents11, Putin was able to articulate an astute foreign policy which united elements and pondered the relativity of both currents by emphasizing specific aspects of Russia's geopolitical situation. In view of this, the State continues to play a fundamental role: it is the link between the Western European world and the Asian world, and the pillar of support against the threats posed by these two extremes. This strand of foreign policy provides as pillars i) preservation of its territorial integrity, maintenance of the security and sovereignty of the country, emphasizing the insertion of the last one in a prestigious way in the International Community; (ii) review of the unipolar status quo in the International System in order to ensure Russian influence on global general processes and thus create favourable external conditions for its development; And (iii) the formation of a good-neighbour belt along borders in order to ensure Russian primacy and exclusivity in its area of influence – especially in the postSoviet space. In this way, it can be understood that the action in front of the spaces established by the concentric circles of Freire is based on such a spirit of "vertical authority", reflected in a multivectorial foreign policy that, in the end, advocates the maintenance of the geopolitical interests of the country in order to ensure the conduct of an international system with multipolar characteristics and therefore ensuring its influence status in this. In other words, it goes beyond the domestic barrier and is reflected

11

29

The debate between Slavophiles and Westerners is formed in the unfolding of the historical process of formation of Russia, but it becomes more noticeable after the modernizations of western characters made by Peter the Great. While Westerners believe in the idea that Russia must modernize along the paths of the West, Slavophiles preach that Russia, by its unique characteristics, should develop by its own means and paths, not by imitating the West. Yeltsin has proved to be quite Western in his policies, since Putin has a more central position in the Slavism / Westernism pendulum, playing a moderate role in the debate (Segrillo, 2008).


in the conduct of the relationship and in the influence that it exerts in the "near abroad" in favour of the gains in its objectives and interests. When it comes to guarantee their interests, Moscow spares no effort and acts assertively and pragmatically. In this way, Russian geopolitics in its surroundings acquires economic, strategic and territorial protection contours, and the guarantee of these in the maintenance of influence in these neighbouring countries. In economic terms, it is important to ensure exploration of fields and logistics for the production of hydrocarbons in order to ensure good economic results. The strategic issues concern the maintenance of maritime lines of communication and access to the warm seas. Territorial protection matters because of state security issues that are broadly linked to nuclear safety matters. We then turn to the empirical linkages of Russian foreign and security policy to the specified regions in the concentric circles. In the first circle, the highly complex game of Russian foreign policy is perceived: the region is assumed as a strategic area for the interests and preferential area of intervention, which creates a minimum degree of flexibility in the negotiation of third party involvement in the region. Examples of this are the intricate relations in the Caucasus, the intensification of relations with Central Asia and, of course, the issues surrounding the expansion of NATO to Eastern Europe (namely Ukraine) and the Caucasus (notably Georgia). This region, which had once served as a sanitary cordon to the West and a belt of protection to the Soviet government, is today the focus of Russian foreign policy in order to form a good-neighbourly belt with a good multi-bilateral understanding between the countries and so to eliminate tensions and prevent potential conflicts from occurring along borders, ensuring security and integrity to the Russian territory. The second circle covers the dimension of relationship with the West. The arranged actions in this, sometimes indirect, cause direct reflection in the first circle. Looking at the issue of NATO expansion, for example, and in addition having NATO with partner status since 2002. As expected, Moscow vehemently repudiates its expansionist cycle12. Russia's concern is factual: it sees NATO as a threat to its security. 12

30

In the first wave of expansion (1997) it incorporated the States of the Czech Republic, Hungary and Poland (became official members on March 12, 1999). In 2002, Bulgaria, Estonia, Latvia, Lithuania, Romania, Slovakia and Slovenia were invited to formally join the pact, becoming official members in March 29, 2004. In its last expansionist wave, Albania and Croatia (1st Of April 2009) are inserted in the organization. The advance towards the "close exterior", raising new partners (Ukraine and Georgia) and


This is because, according to Article 5 of the North Atlantic Treaty, the signatory States of the treaty agree that an attack on arms against one or more NATO members should be considered as an attack on all members. In addition, mutual assistance is envisaged among its members including the possibility of using the armed forces for the purpose of restoring and maintaining security in its area of coverage. These two issues are of greater importance to the expansion project of the bloc, especially at the moment when its next phase alludes to the adhesion of Ukraine and Georgia to the bloc, getting significantly closer and closer to the Russian border. Alexei Arbatov (2003) sums up Russian fears quite well: it is necessary to avoid the formation of small American protectorates along the borders, not just a matter of respect for principles but a matter of security, if not survival. Also, the Kremlin does not accept Western interference in the region. Under the banner of the global fight against terror it influenced the so - called Coloured Revolutions: Revolution of the Roses (Georgia - 2003), Orange Revolution (Ukraine 2004) and Tulip Revolution (Kyrgyzstan - 2005). However, in pursuit of the removal of pro-Russian governments from the West, where respect for democracy and freedom of rights are praised, Washington encouraged such revolutions and sought to establish governments close to their interests (Piccolli, 2012). A similar movement occurred in the recent Ukrainian conflict. Divided between economic projects that either brought it closer or away from Europeans and/or Russians, the option for the agreement with Europe represented not only a step to the “book of trade� with the European Union but also the progressive accession to Defense Policy and European Defense Agency. In the end, it indirectly places Ukraine in the military structure of NATO. This adhesion represented an expressive approach of the organization to the Russian territory (specifically about 1,600km from St. Petersburg and only 480km from Moscow), breaking with the entire geopolitical balance of Eurasia (Bandeira, 2016). In the midst of NATO's expansion, another controversial issue between the parties is the insertion of the North American Missile Defense (NMD - National Missile Defense13) project in Eastern Europe. This project, portrayed by the United States as a

31

creating military bases in former Soviet republics (Kazakhstan and Uzbekistan, for example), keeps the Kremlin staying alert. 13 According to the Public Law 106-38 (1999), the National Missile Defense (NMD) is the policy of the United States to implement, as soon as their technology allows, an effective system of National Anti-Missile Defence capable of defending the territory of the United States against limited ballistic missile attacks


protection of the West from attacks by North Korea and Iran, goes against Russia's security assumptions, being argued by Moscow that the "plan [is] a threat to its own nuclear force of deterrence and implications for their status as great power"(Luque, 2010, 56). As Iran's nuclear threats stabilize with the advance of nuclear deals with Tehran and the well-known short range of North Korean missiles, it is inferred that the project is aimed at undermining the capability of a second Russian attack, ensuring American primacy. Finally, two events in which the effective use of force translates Moscow's will to secure its geopolitical interests, the Georgian War and the intervention in Syria are worthy of attention. The Georgian War served the Russian economic, operational, and political-strategic objectives. In economic terms, it pointed out to European countries that the direction of their energy14 supply is at stake in the face of NATO's expansion to the East as well as exposed the fragility of alternative supply infrastructure based in Georgia. Operational issues concern the Russian capability of combat and action in geopolitically strategic areas of the country. In the conflict previously mentioned, they were able to destroy much of the Georgian logistic infrastructures, promptly moving troops by land and sea. In political-strategic terms, it is a clear signal to the West that the siege generated by its institutions will not be tolerated, just as it aims facing any regional challenges imposed on it (Piccolli, 2016). In the Syrian conflict (and here encompassing a fourth concentric circle under the premises of Maria Raquel Freire) interests that make an interesting geopolitical framework are also perceptible. First, a political-military perspective that signals to the

32

(whether accidental, unauthorized, or deliberate). This project has its finance subjected to the annual authorization of appropriation of funds for the National Missile Defense (PUBLIC LAW 106-38, 1999). Among the projects that integrate the NMD is the Ballistic Missile Defense System (BMDS), whose main site is Europe and Japan. Despite this, the main elements of these systems are operated by the United States Strategic Command (USSTRATCOM), Northern Command (USNORTHCOM), Pacific Command (PACOM), European Command (USEUCOMA) and United States Forces in Japan (USFJ). Despite the names of the systems allocated in European and Japanese territory, they only denote the costing and ownership of the interceptors by these partners, as the operation is almost entirely dependent on the United States. It is also worth noting that Washington has programs of missile defence cooperation with a number of allies, including the United Kingdom, Japan, Australia, Israel, Denmark, Germany, the Netherlands, the Czech Republic, Poland, Italy and others, making use of these partnerships as a space for performance. The missile defence technology developed, tested and implemented by the United States is designed to contain ballistic missiles of all sizes (short, medium, intermediate and long). The overall coordination of the project is handled by the Missile Defence Agency (MDA) (Cepik, Martins, 2014, Piccolli, 2012). 14 It should be recalled that Russia is the main energy supplier to Europeans and that Europeans have been searching for alternative markets to reduce this dependence.


international community the capacity of Moscow in its regional environment: either by a cooperative via, prioritizing negotiation mechanisms; either by a coercive via, by designing and utilizing military capabilities in its regional environment - now in a scope that goes beyond the "close exterior". As previously mentioned, the strategic point of view is to ensure the maritime lines of communication with the Mediterranean Sea and the outpost in Tartus, ensuring access to the warm seas. Here relies an addendum to pay attention to the importance of the Crimea in this process as it serves as base to the main Russian naval base, Sevastopol, receiving the Black Sea Fleet and being a crucial access point to the straits that lead to the East/Indian Mediterranean. In economic terms, Moscow's interest in being participatory in the establishment of projects linking European dependence on its hydrocarbons and allies is noticeable. Finally, the role of Russia's geopolitical interests in terms of foreign policy and security actions in the surrounding countries made itself very explicit. Yet, it is notable that in the face of the constant advance of Western institutions, i.e. the West itself - also in pursuit of its geopolitical interests, there is a reactive influx of Moscow into the region in order to secure its area of influence and the protection of its interests, even if it is necessary to allocate its premises of "vertical authority" across borders.

Bibliography ARBATOV, Alexei. The Transformation of Russia’s Military Doctrine in the Aftermath of Kosovo and Chechnya. In: GORODETSKY, Gabriel. Russia Between East and West: Russian

33


Foreign Policy on the Threshold of the Twenty-First Century. London: Frank Cass Publishers, 2003. BANDEIRA, Luiz Alberto Moniz. A desordem mundial: o espectro total da dominação. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2016. BERTONHA, João Fábio. Rússia – Ascensão e Queda de um Império: Uma História Geopolítica e Militar da Rússia, dos Czares ao Século XXI. Curitiba: Juruá, 2010. CEPIK, Marco; MARTINS, Jose Miguel Quedi. Defesa Nacional Antimíssil dos EUA: a lógica da preempção e suas implicações internacionais. In: SCHMIDT, Carlos Arturi (org.). Políticas de Defesa, Inteligência e Seguranca. Porto Alegre: UFRGS/CEGOV, 2014, pp. 14-47. COLIN, Roberto. Rússia: o ressurgimento da grande potência. Florianópolis: Letras Brasileiras, 2007. COLIN, Roberto. Rússia: o ressurgimento da grande potência. Florianópolis: Letras Brasileiras, 2007. FREIRE, Maria Raquel. A Política Externa em Transição: o caso da Federação Russa. Relações Internacionais, Lisboa, nº 23, Setembro 2009, pp.75 – 89. FREIRE, Maria Raquel. A Rússia de Putin: Vectores Estruturantes de Política Externa. Coimbra: Cosmopolis, 2011. LUQUE, Alessandra Aparecida. O Eixo Putin-Bush (2001/2008) e a Dinâmica da Cooperação e do Confronto no Relacionamento Bilateral Rússia e EUA. Marília: UNESP, 2010. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Relações Internacionais) Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista – UNESP, 2010. MIELNICZUK, Fabiano, PICCOLLI, Larlecianne. Política e sociedade na Rússia atual. Em Debate. Belo Horizonte, v.7, n.4, p.50-54, set. 2015. PICCOLLI, Larlecianne; MACHADO, Lauren; MONTEIRO, Valeska Ferrazza. A Guerra Híbrida e o Papel da Rússia no Conflito Sírio. Revista Brasileira de Estudos de Defesa. Porto Alegre, vol. 3, n. 1, 2016. PICCOLLI, Larlecianne. “5 Dias de Guerra”: para além do cliché hollywoodiano: uma análise dos impactos no jogo político internacional. In: JÚNIOR, Edson José Neves; ZANELLA, Cristine Koehler (Org.). As Relações Internacionais e o Cinema – Volume 2: Estados e Conflitos Internacionais. Belo Horizonte: Fino Traço, 2016. PICCOLLI, Larlecianne. Europa enquanto condicionante da política externa e de segurança da Rússia: o papel da defesa antimissile. Dissertação (Mestrado em Estudos Estratégicos

34


Internacionais) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Faculdade de Ciências Econômicas, Programa de Pós-Graduação em Estudos Estratégicos Internacionais, Porto Alegre, 2012. POMERANZ, Lenina. Eleições na Rússia: O Fenômeno Putin. Sociedades em Transformação, nº4,

ano

VI,

2000,

pp.

2-6.

Disponível

em

<http://ftp.unb.br/pub/UNB/ipr/rel/sociedades/2000/140revista.pdf>. RUSSIA. The Foreign Policy Concept of the Russian Federation. Moscow, Feb. 2013. Disponível em: < http://www.mid.ru/brp_4.nsf/0/76389FEC168189ED44257B2E0039B16D>. RUSSIA. The Military Doctrine of the Russian Federation. Moscow, Feb. 2010. Disponível em: <http://www.sras.org/military_doctrine_russian_federation_2010>. SEGRILLO, Angelo . A nova Rússia: Balanços e Desafios. In: II Conferência Nacional de Política Externa e Política Internacional – II CNPEPI (Rio de Janeiro, 2007): O Brasil no Mundo que vem aí. Brasília: Funag, 2008. SEGRILLO, Angelo. Rússia: Economia e Sociedade. In: II Conferência Nacional de Política Externa e Política Internacional – Seminário Rússia. Brasília: Funag, 2008. ZHEBIT, Alexandre A. Reflexões sobre a Nova Concepção de Política Externa da Rússia. Contexto Internacional, Rio de Janeiro, vol. 15, nº2, jul/dez 1993, pp. 259-277.

35


36


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.