Revista Cenarium 06/2020

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Junho de 2020 Ano03-N05

O fantasma da Covid-19 na Amazônia RISCO DE ‘SEGUNDA ONDA’ É REAL /16 a 19

/35 a 37

/44 a 46

GOVERNO Populações tradicionais cobram Bolsonaro por descaso.

MORTALIDADE AM concentra 58% das mortes de indígenas por Covid-19 no País.

ECONOMIA Produção industrial no Amazonas cai 50%.



Editorial EXPEDIENTE Diretora Geral Paula Litaiff Editora Executiva | Versão Impressa Márcia Guimarães Editores Executivos | Versão On Line Luana Dávilla Luís Henrique Oliveira Reportagem Alyne Araújo Bruno Pacheco Carolina Givoni Gabriel Ricardo Luana Dávilla Luís Henrique Oliveira Mencius Melo Paula Litaiff Stefanie Simoes Thiago Fernando Fotografia Arlesson Sicsú Euzivaldo Queiroz Sandro Pereira Projeto Gráfico/Diagramação Natália da Silva Nakashima TV Web – Técnica Mateus Guerra Lourenço Rebouças Luiz Ricardo Araújo Redes Sociais Agência Porto Gisele Coutinho Bruno Pacheco Gerente Comercial Elcimara Oliveira (92) 99450-7462 Assessoria Jurídica Christhian Naranjo de Oliveira (OAB 4188/AM) www.revistacenarium.com.br

VIDA PÓS-PANDEMIA: UMA INCÓGNITA Três anos. É o tempo previsto por analistas internacionais para o mundo voltar aos níveis de produção que tinha antes da pandemia do novo Coronavírus, o vírus causador da Covid-19, que matou quase meio milhão de pessoas no planeta nos últimos sete meses, e sua continuidade no ar ainda é uma incógnita. Para obter informações regionalizadas sobre o risco de uma ‘segunda onda’ do vírus e seu impacto na economia da Amazônia, a REVISTA CENARIUM descobriu que a dúvida atinge, também, a comunidade científica. Embora os esforços precisem estar voltados à proteção da vida, é preciso avaliar os desafios que o novo cenário econômico traz no próximo semestre. Se o mundo espera três anos para retomar a produção, especialistas contabilizam cinco anos para o Brasil. O Amazonas pode amargar período maior, com a queda de 50% da produção do Polo Industrial de Manaus (PIM), seu maior propulsor econômico. O cenário pede reinvenção, mas com proteção à vida e ao meio ambiente, e são esses os alertas e caminhos que a edição de maio traz ao leitor. Paula Litaiff

Diretora Geral

UMA AMAZÔNIA, MUITAS FERIDAS ABERTAS A pandemia de Covid-19 lançou holofotes sobre muitas fragilidades da Amazônia. Feridas que há muito não se fecham e que estavam escondidas sob um véu ilusório de normalidade, estão sendo expostas pelas urgências provocadas pela gravidade da doença. Ironicamente, o microscópico vírus revelou a enorme precariedade do sistema de saúde na região, escancarou o grande isolamento em que vivem os povos tradicionais e atraiu atenção para o tamanho do efeito de políticas do governo federal que, segundo ambientalistas e pesquisadores, fragilizam o meio ambiente e os indígenas. É esse quadro de vulnerabilidades que o leitor poderá acompanhar ao longo das reflexões e notícias desta edição. Através dos reflexos do mortal e ainda muito desconhecido vírus sobre o dia a dia das pessoas que vivem na região, da ausência do Estado em muitos rincões desse mais profundo Brasil e da luta dos indígenas pela resistência diante do que chamam de genocídio, a Cenarium monta uma parte do quebra-cabeças do complexo mundo da Amazônia. Boa leitura. Márcia Guimarães

Editora Executiva | Versão Impressa


Índice

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05 AMAZÔNIA Números do desmatamento ‘explodem’ na pandemia.

34 ECONOMIA ‘Segunda onda’ da pandemia pode derrubar PIB do Brasil.

07 MEIO AMBIENTE Governo do AM prevê queda no desmatamento até 2022.

35 INDÍGENAS Amazonas lidera ranking de mortes por Covid-19.

09 ‘PL DA GRILAGEM’ Proposta foca terras federais, as mais devastadas.

38 INTERIOR Municípios se adaptam para enfrentar pandemia.

12 CONSELHO DA AMAZÔNIA Composição sem representantes da região é criticada.

40 PRESERVAÇÃO Primeira-dama de Manaus pede reflexão sobre meio ambiente.

15 ARTIGO David Almeida. 16 PODER PÚBLICO Populações tradicionais cobram Bolsonaro por assistência. 20 ELEIÇÕES Para TRE-AM, ‘fake news’ e compra de votos são desafio. 22 OPINIÃO Desrespeito à memória de Arthur Virgílio Filho. 24 CENTRAL DA POLÍTICA Liliane Maia fala sobre desafios da mulher na política. 27 ARTIGO Everaldo Farias. 28 COVID-19 Manaus e a ameaça da ‘segunda onda’ da pandemia.

42 SAÚDE Socorristas do Samu relatam medo do Coronavírus. 44 INDÚSTRIA Produção no Amazonas cai 50% com pandemia. 47 ARTIGO Marcelo Amil. 48 VIOLÊNCIA Aumentam registros de agressão a mulheres em Manaus.

48 53 ARTIGO Rodrigo Guedes. 54 APELO Greta Thunberg pede ajuda mundial para Manaus. 56 AMEAÇA Mundo levará cinco anos para controlar Coronavírus. 58 CULTURA Eventos se adaptam aos tempos de distanciamento social. 60 ENTRETENIMENTO Empresários buscam estratégias e projetam expectativa. 62 FESTIVAL DE PARINTINS Espetáculo dos Bois Bumbás segue indefinido. 64 HOTÉIS Empresários temem permanecer fechados após pandemia. 66 TURISMO Setor já amarga perdas no valor de R$ 62 bilhões.

50 CONFLITOS Assassinatos de indígenas cresceram em 2019.

68 TRANSPORTE AÉREO Preços de passagens devem cair após quarentena.

52 SEGURANÇA PF alerta para aumento de crimes cibernéticos na pandemia.

70 ARTIGO Paula Litaiff.


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Amazônia: números apontam ‘explosão’ de desmatamento Mencius Melo. Da Cenarium.

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alco das grandes discussões mundiais sobre meio ambiente e qualidade de vida, a Amazônia registrou uma ‘explosão’ nos números do desmatamento, em meio à pandemia. Em março de 2020, o desmatamento na Amazônia cresceu 279%, em comparação com o mesmo mês do ano passado, segundo o Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD) do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon). Os dados ainda apontam que 254 km² de floresta foram derrubados em abril. Esse é o número mais alto registrado nos últimos dois anos. A REVISTA CENARIUM procurou especialistas para saber o que mudou no sistema de preservação do maior bioma brasileiro, durante o surto que estagnou atividades ambientais. ‘DESMATADOR NÃO FAZ HOME-OFFICE…’ O superintendente de Inovação & Desenvolvimento Institucional da Fundação Amazonas Sustentável (FAS), Victor Salviati, afirma: “Grileiro e desmatador não faz home-office. Dados do Imazon demonstram que o desmatamento aumentou 171% em relação a abril de 2019, desses 18% foram aqui no Amazonas, majoritariamente no sul do Estado, apontou. Salviati avalia que as ações do poder público precisam ser mais objetivas. “É preciso investimento estruturante nos órgãos de controle estadual e federal adicionalmente à agenda de comando-controle, é preciso também uma agenda positiva com projetos de geração de renda e empoderamento”, indicou. Salviati também vê necessidade de investir em bioeconomia e fortalecer processos participativos locais de gestão territorial. DESMATAMENTO RECORDE! O pesquisador do Programa de Pós Graduação em Ecologia (PPG -ECO) e doutorando do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), Lucas Ferrante, afirma que há registros de um aumento explosivo do desmatamento na Amazônia. “O Instituto

Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) mostra mais que o dobro do desmatamento do ano passado, registrando um recorde nos últimos 10 anos!”, observou. “O governo federal tem usado a pandemia como uma ‘cortina de fumaça’ para aumentar a destruição da Amazônia”, apontou Lucas, para quem a degradação da floresta tem sido propiciada por políticas públicas e falas do presidente Jair Bolsonaro e do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, a quem o pesquisador chama de ‘anti-ministro’.

Ministro Ricardo Salles é chamado pelos ambientalistas de “anti-ministro”. Foto: José Cruz/Agência Brasil


6 / MEIO AMBIENTE & SUSTENTABILIDADE Agregado dos alertas de desmatamento do Inpe entre janeiro a abril somam 1.202 km² na Amazônia Legal. Foto: Ibama/Fotos Públicas

“São ações diretas de estímulo ao desmatamento relacionadas à fala do presidente da República, somadas à política de sucateamento ambiental propiciadas pelo próprio Ministério do Meio Ambiente, onde você tem a militarização de órgãos como IBAMA e ICMBio, e a flexibilização do Código Florestal”, apontou Ferrante.

as terras indígenas. “De janeiro a abril de 2020, as populações indígenas testemunharam um aumento 64 % no desmatamento dentro de seus territórios, em relação ao mesmo período de 2019”.

GREENPEACE: ‘CRIME AMBIENTAL ORGANIZADO…’ O porta-voz da ‘Campanha de Amazônia’ do Greenpeace Brasil, Danicley Aguiar, afirma que o crime organizado, que há décadas está por trás da destruição da

Amazônia, não cumpre medidas de isolamento social. “Desde o início dessa pandemia, o Greenpeace Brasil vem alertando para o fato de que grileiros, madeireiros e garimpeiros não fazem home office, que se o governo continuar se omitindo ou prevaricando diante do crime ambiental organizado, em 2020, bateremos todos os recordes de desmatamento da última década”, alertou. Danicley ressaltou que, até maio, o INPE já havia emitido alertas de desmatamento para 405 km² de floresta, mais que o dobro do mesmo período em 2019. O ambientalista alerta também para a pressão sobre

279%

171%

64%

Em março de 2020, o desmatamento na Amazônia cresceu 279%, em comparação com o mesmo mês de 2019.

Dados do Imazon demonstram que o desmatamento aumentou 171% em relação a abril de 2019.

IBAMA E ICMBIO EM SILÊNCIO… Até a conclusão desta reportagem, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) e o Intituto Chico Mendes da Conservação da Biodiversidade (ICMBio) não se pronunciaram. Em seus sites institucionais não há dados novos sobre o desmatamento na Amazônia.

De janeiro a abril de 2020, os povos indígenas sofreram aumento de 64% no desmatamento em suas terras.


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Governador do AM projeta queda de 15% no desmatamento até 2022 Bruno Pacheco. Cenarium.

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ANAUS - O governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), estima que o Estado reduza os índices de desmatamento em 15% até o final de 2022. A meta de redução nos índices de destruição da floresta faz parte de um plano preservação, com estratégias de combate ao desmatamento e incêndios no Amazonas, anunciado no Dia Mundial do Meio Ambiente, 5 de junho. O Plano de Prevenção e Controle do

Desmatamento e Queimadas do Amazonas (PPCDQ-AM) vai orientar a atuação dos órgãos ambientais entre os anos de 2020 até 2022. De acordo com o governador, a expectativa é que o Amazonas reduza os índices de desmatamento ao final de 2022 em 15% (1.207 km²), em relação ao ano de 2019, cujo índice de área desmatada foi de 1.421 km², segundo levantamento do governo. O plano, orçado em R$ 88 milhões de recursos oriundos do

Fundo Amazônia e repatriados da Petrobrás, no contexto da operação “Lava Jato”, também visa fortalecer a governança ambiental no Estado, reduzir o desmatamento ilegal e incentivar o uso sustentável dos recursos naturais. “O plano tem três eixos importantíssimos. Um deles é o ordenamento territorial. Infelizmente, no estado do Amazonas, nós ainda temos uma grande quantidade de terras que a gente não sabe a quem pertence, há indefinições. Outro eixo é a questão do co-

O governador Wilson Lima afirma que o plano de preservação tem como eixos o ordenamento territorial, o comando e controle e a bioeconomia. Foto: Arthur Castro/Secom


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mando e controle, para ampliar a nossa tecnologia de acompanhamento de desmatamento e focos de queimadas. O último eixo é a questão da bioeconomia, levando em consideração o desenvolvimento sustentável, as atividades de manejo, conciliando o desenvolvimento econômico com a preservação da floresta”, explicou Wilson Lima, em uma coletiva de imprensa, na sede do governo. As ações são direcionadas aos municípios do Sul do Estado, área em que há maior índice de desmatamento ilegal e número de focos de calor, de acordo com monitoramento de 2019. A região também é responsável por mais de 95% do desmatamento registrado em 2020, sendo que 81% ocorreu em áreas federais. Wilson Lima também destacou estratégias de desenvolvimento sustentável visando as populações que moram na floresta e lamentou que o Estado só tenha a atenção do mundo quando o assunto é relacionado a esse tema. “O Estado do Amazonas ganha uma atenção muito grande e infelizmente, as pessoas só voltam a atenção para cá, quando há desmatamento, há queimadas. E muitas vezes, de forma muito injusta. Não é correto com o povo do Amazonas colocar uma manchete em um veículo de circulação internacional dizendo que a floresta está pegando fogo, e muita gente acaba falando sobre coisas que não entendem e que não sabem”, pontuou o governador. PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO O secretário de Meio Ambiente, Eduardo Taveira, destacou que desde 2015 o Amazonas não tinha um planejamento estratégico para

o combate ao desmatamento e a queimada, o que, segundo ele, levou ao aumento nas ocorrências. “O plano é estratégico para que o Estado possa definir suas estratégias e diretrizes, suas ações, e os orçamentos para que a gente possa reduzir esses índices que vêm crescendo ano a ano, que cresceu, em especial, nesses quatro primeiros meses do ano”, disse. Conforme Taveira, o plano ordena as atividades, alinha as secretarias de Estado em uma ação que não é só ambiental, mas também

é voltada para o desenvolvimento sustentável do Amazonas. “É o compromisso do Estado de encontrar caminhos para equilibrar crescimento econômico, desenvolvimento rural e, ao mesmo tempo, conservação ambiental e geração de renda, inclusive por meio de economia da floresta”, afirmou. O lançamento contou, ainda, com a presença da deputada estadual Joana Darc, presidente da Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa do Amazonas, e do deputado estadual Saulo Vianna.

DEVASTAÇÃO Números do desmatamento e queimadas


MEIO AMBIENTE & SUSTENTABILIDADE / 9 Projeto de Lei prevê a regularização fundiária de ocupações em áreas da União. Foto: Euzivaldo Queiroz

‘PL da Grilagem’ mira terras federais, que concentram mais de 70% da devastação no Amazonas Foco do Projeto de Lei (PL) 2.633/2020, chamado de ‘PL da Grilagem”, as terras de propriedade da União representam mais de 70% da área desmatada no Amazonas, maior estado da Amazônia Legal, de acordo com um levantamento da Secretaria de Estado do Meio Ambiente (Sema)

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riundo da Medida Provisória 910 de 10 de dezembro de 2019, que prevê a regularização fundiária de terras federais invadidas até 2014, o Pro-

jeto de Lei 2.633/20 virou motivo de polêmica, após 23 artistas nacionais gravarem um vídeo para as redes sociais, pressionando o relator da proposta, o deputado

amazonense Marcelo Ramos (PL/ AM), a não colocar o PL em pauta durante o período da pandemia do Coronavírus.


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No novo formato de projeto, foi aumentado o período de abrangência da regularização fundiária que, agora, vai até 2008. As terras federais, no Amazonas, foram comprovadamente as mais devastadas nos últimos 15 anos em relação às estaduais, e o registro da incidência vem se mantendo. De acordo com a Secretaria de Estado do Meio Ambiente (Sema), este ano, foi registrado um aumento de 57% no índice de desmatamento ilegal de terras. Desse percentual, 50% da devastação ocorreu em glebas federais e 27% em assentamentos. O levantamento compara o primeiro trimestre deste ano ao de 2019. Apresentada pelo deputado Zé Silva (SD-MG), a proposta dispõe sobre a regularização fundiária das ocupações incidentes em terras situadas em áreas de domínio da União ou do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), por meio da alienação e da concessão de direito real de uso de imóveis desde 2008.

O deputado Marcelo Ramos justificou a proposta, explicando que o PL cria um processo simplificado de regularização para aqueles que demonstrarem “posse mansa, pacífica e produtiva”. Segundo ele, serão beneficiados os pequenos produtores rurais que ocupam a terra, sem qualquer conflito, há 12 anos. “Sendo assim, não há o que se falar em novas invasões e nem em grilagem”, finalizou. Embora o projeto de lei atinja todo o país, na prática, a proposta é direcionada à Amazônia por pelo menos três motivos, de acordo com especialistas: primeiro porque a União detém mais terras nesta região; segundo, porque as terras do Sul e Sudeste do país já estão destinadas quase totalmente e, por fim, porque a preocupação maior, em termos de desmatamento, é na Região Norte. ARTISTAS CRIAM CAMPANHA CONTRA PROJETO No vídeo onde aparecem artistas como Caetano Veloso, Frejat, Alessandra Negrini e Cássia Kis, o depu-

tado Marcelo Ramos é confrontado a repensar a urgência da tramitação do PL 2.633, no período da pandemia do novo Coronavírus. A gravação inicia com Caetano Veloso explicando a origem do projeto de lei. “Em plena pandemia, a MP (Medida Provisória) 910 virou PL 2.633, o PL da Grilagem”, diz. Em seguida, a atriz Alessandra Negrini lembra que o Amazonas está entre os estados brasileiros que mais registraram casos da doença causada pelo novo vírus. “Deputado Marcelo Ramos, o seu estado do Amazonas é o mais afetado pela Covid-19”. A atriz Cássia Kis conclui o vídeo dizendo que espera mais reflexão de Marcelo Ramos. “Que Deus ilumine seu coração e sua mente e faça uma reflexão mais coerente com o seu Estado e com o Brasil”, afirmou. Em resposta aos artistas, Marcelo Ramos gravou outro vídeo, aparentemente nervoso, afirmando que os cantores e atores desconhecem a Amazônia. E mostrou-se irritado com o uso de imagens de

Artistas nacionais, como Caetano Veloso, gravaram vídeo para pressionar Marcelo Ramos a tirar o PL da Grilagem da pauta do Congresso. Foto Marcelos Ramos: Maryanna Oliveira/Câmara dos Deputados. Foto Caetano Veloso: Tania Victoria/Ministério da Cultura de Cidade do México/Fotos Públicas


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covas coletivas de vítimas da Covid-19, gravadas em Manaus. Ao justificar que suas prioridades na Câmara incluíam a Covid-19 com repasse de emendas, Ramos reclamou que os artistas falavam de localidades distantes do Amazonas. “(...) Vocês estão nos seus apartamentos confortáveis no Rio ou em São Paulo, para falar de uma Amazônia que vocês só conhecem pela internet, pela TV ou em visitas a passeio”, disse Ramos ao rebater os artistas. PROPOSTA IGNORA USO COLETIVO DE TERRAS Há nove anos acompanhando processos sobre regularização fundiária no Amazonas, hoje, procurador-chefe de Meio Ambiente da Procuradoria Geral do Estado (PGE), Daniel Viegas critica o teor do Projeto de Lei 2.633/20 e diz que a proposta não observa a maior especificidade da Amazônia para regularização fundiária: a

O Projeto de Lei 2.633 tenta burlar o que chamamos de flexibilização de direito ambiental e territorial. Ele não visa em momento algum favorecer os pequenos agricultores”. - Dione Torquato, secretário-geral do Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS).

presença das áreas de uso coletivas por diversas comunidades. “Essas comunidades coexistem junto com a floresta em cadeias produtivas da castanha, do açaí, do pirarucu entre outras. O PL (2.633) se destina a regularizar unidades individuais sendo cego para os povos e comunidades tradicionais que fazem uso consorciado entre áreas coletivas”, explicou o procurador. Ele informou ainda que essas terras individuais não podem ser divididas em “quadradinhos modulares” como funciona em outros lugares do Brasil. De acordo com Viegas, o modelo não é compatível com a maior parte da região amazônica e vai ser útil para viabilizar a formação de latifúndios. “O PL trata como se nas terras federais só houvesse ocupações individuais. E as centenas de comunidades que exploram coletivamente suas áreas?”, questionou o procurador do Amazonas. COMUNIDADES CONTRÁRIAS Secretário-geral do Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS), Dione Torquato indicou que os movimentos da sociedade civil à agricultura familiar e desenvolvimento sustentável são contrários ao Projeto de Lei 2.633/20. O CNS representa pelo menos 71 mil famílias extrativistas distribuídas em mais de 60 milhões de hectares de floresta. A extensão equivale a mais de 10% da Amazônia Legal, onde estão concentrados nove estados brasileiros. Para Dione, a reforma agrária não se resume à regularização fundiária. “O Projeto de Lei 2.633 tenta burlar o que chamamos de flexibilização de direito ambiental e territorial. Ela não visa em momento algum favorecer os pequenos agricultores”.

50% Do total do desmatamento no Amazonas, 50% da devastação ocorreu em glebas federais e 27% em assentamentos, segundo a Sema.


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Conselho da Amazônia: só conhece quem vive, apontam pesquisadores e líderes indígenas Avaliação é de que nova composição do Conselho da Amazônia, enfraquece a região Stephane Simões. Da Cenarium.

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ANAUS – A falta de membros da Fundação Nacional do Índio (Funai), estudiosos da área ambiental e de representantes da sociedade civil e dos povos indígenas no Conselho Nacional da Amazônia pode causar prejuízos para a região e torná-la ainda mais vulnerável. É o que apontam pesquisadores e lideranças indígenas

Vice-presidente Hamilton Mourão é o presidente do Conselho da Amazônia. Foto: José Cruz/Agência Brasil

ouvidas pela Revista Cenarium. A partir de um novo decreto presidencial, publicado em meados de abril, o Conselho passou a funcionar na vice-presidência da República apenas com militares e policiais federais, Para o professor da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Rogério Fonseca, “só conhece a Amazônia quem vive”. Entres os membros nomeados estão 15 coronéis, sendo 12

do Exército e três da Aeronáutica, além de dois majores-brigadeiros e um brigadeiro. Outros quatro delegados da Polícia Federal também compõem a lista. Eles foram indicados pelo Ministério da Justiça e da Segurança Pública. O Conselho é presidido pelo vice-presidente da República, general Hamilton Mourão. O documento com os nomes que agora compõem o Conselho foi publicado no Diário Oficial da União no dia 17 de abril.


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“O Conselho da Amazônia, ao contrário do que muitos pensam, não pode ser político. Para nós, seria um passivo muito grande não ter membros da comunidade científica e de algumas organizações não-governamentais representadas no Conselho”, disse Fonseca, mestre em Ciências Florestais e Ambientais. Um dos pontos destacados pelo professor é a falta de pessoas que já possuem experiência e vivência na região amazônica, onde órgãos e pesquisadores estão inseridos e já contribuem há anos. “Região Amazônica a gente só consegue aprender vivendo como amazônida, não como aquele indivíduo que chega aqui e fica dentro de uma vila militar. Eles não têm mais experiência que um professor universitário que sempre está

em terras indígenas, unidades de conservação e conhece a Amazônia como a palma das mãos. Eu mesmo me senti ofendido com a composição do Conselho”, disse. Para ele, o mais indicado seria que o Conselho fosse composto por órgãos que envolvem pesquisas, educação, saúde e segurança pública estaduais, com pelo menos um representante de cada área. Em relação a esta nova composição, Fonseca acredita que uma das grandes perdas é a falta de representantes da Funai entre os membros do Conselho. “Eu vejo isso com muito maus olhos. Para mim, é o grande gargalo. Isso pode ser um elemento propiciador para aumentar as diferenças e deixar mais distantes as instituições, com essa formatação só com militares”, afirmou.

Uma das competências do Conselho da Amazônia é propor políticas de prevenção da Amazônia. Foto: Ricardo Oliveira/Sema


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Para o engenheiro ambiental e mestre em saneamento, Jose Antonio Bezerra, a não participação de órgãos competentes e profissionais que conhecem e atuam diretamente na proteção do ambiente é preocupante. “Tudo o que foi conquistado até hoje poderá sofrer danos insuperáveis, já que não temos representação popular nas decisões. Mesmo havendo oportunidade de autoridades, especialistas e representantes nacionais e internacionais participarem da reunião a convite do chefe do Executivo, isso não tem garantia de representação popular de interesse coletivo”, comentou. O especialista acrescentou, ainda, que é bem provável que a região sofra prejuízos ambientais, do ponto de vista da preservação, visto que o Ministério do Meio Ambiente perdeu a autonomia no Conselho. “O Ministério do Meio Ambiente fica sem função, e quem sabe será mais um órgão extinto no futuro. Não precisamos criar outras instituições independentes, precisamos de ações e condições que fortaleçam os que já existem para atuarem no desenvolvimento sustentável do Brasil”, concluiu. INDÍGENAS Para o presidente da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (FOIRN) e conselheiro da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), Marivelton Baré, com a atual composição, não se pode chamar o Conselho da Amazônia de Conselho, mas apenas de “reduto formado pelo pessoal de patentes”. “É inadmissível um conselho desse ter uma composição sem a participação da sociedade civil e sobretudo dos povos indígenas da

Amazônia, diante da sua própria representatividade e organização. A gente não diria que é um conselho, mas apenas um reduto formado pelo pessoal de patentes, o que não vai condizer com a realidade, porque o formato deles de pensar e a ideologia é muito diferente daquilo que se trata a especificidade da Amazônia”, afirmou. Marivelton Baré afirma também que a atual composição do Conselho da Amazônia deixa a região ainda mais vulnerável a projetos como o da Perimetral Norte e os que envolvem o interesse multinacional da regularização da exploração mineral nos territórios indígenas, porque se trata de um formato de poder pensar e planejar com uma equipe só e praticamente de uma única instituição. “O que a gente vê é um governo muito capitalista, que não leva em consideração nenhum dos protocolos de consulta dos povos resistentes. E a gente, enquanto população indígena, sabe da grande briga constante para tentar defender os direitos e garantir que nossos protocolos sejam respeitados e acolhidos, a partir daquilo que determinam os povos e comunidades dentro de cada um dos territórios. E isso, a gente vê que praticamente o governo não respeita”, concluiu. MUDANÇAS NO CONSELHO O Conselho Nacional da Amazônia, que era do Ministério do Meio Ambiente desde 1995, foi realocado para a vice-presidência, quando o presidente Jair Bolsonaro assinou um decreto, no dia 11 de fevereiro deste ano. Com isso, o vice-presidente da República, general Hamilton Mourão, foi nomeado para presidir o Conselho. No dia 25 de março deste ano, Mourão participou da primeira

Região Amazônica a gente só consegue aprender vivendo como amazônida”. - Rogério Fonseca, professor da Ufam.

Marivelto Baré, presidente da Foirn, rejeita atual Conselho da Amazônia. Foto: Acervo pessoal

reunião, já como presidente do Conselho. Em uma rede social, ele defendeu a união dos estados com o governo federal e o compromisso de garantir a proteção da Amazônia. Desde a transferência do Conselho, Mourão visitou oito governadores de estados que formam a Amazônia Legal. O conselho é formado por representantes de 14 ministérios e tem 13 competências descritas em decreto. Uma delas é “propor políticas e iniciativas relacionadas à preservação, à proteção e ao desenvolvimento sustentável da Amazônia Legal, de forma a contribuir para o fortalecimento das políticas de Estado e assegurar a ação transversal e coordenada da União, dos estados, dos municípios, da sociedade civil e do setor privado”.


ARTIGO / 15

Foto: Divulgação

O racismo é estrutural David Almeida

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a resistência às tropas portuguesas, contra a escravidão, o líder quilombola Zumbi dos Palmares foi morto no Brasil, em 1695. Nos Estados Unidos da América (EUA), em 1968, o pastor Martin Luther King Jr foi assassinado após liderar a defesa pelos direitos civis. Por anos vítima do preconceito, o líder do movimento Alma Negra do Amazonas, Nestor Nascimento, partiu em 2003, por problemas de saúde, aos 56 anos, após lutar pela causa negra. Três histórias de luta, entre outras tantas de crianças, mulheres e homens negros, que voltaram à pauta do planeta, após o triste episódio do ex-segurança George Floyd, morto por um policial nos EUA. O caso deu luz a outras duas tristes histórias brasileiras: a do menino João Pedro, no Rio de Janeiro, e de Miguel Otávio Santana da Silva, em Pernambuco. Todos eles vítimas do racismo estrutural; um mal construído ao longo da história e reforçado na mente humana como um método de classificação, muitas das vezes até mesmo disfarçado de humor. Aos olhos do mundo, denunciada com a ajuda das novas tec-

nologias, a crueldade das imagens da morte por sufocamento de George Floyd, no dia 25 de maio de 2020, juntou comunidades negras e brancas que tomaram às ruas nos EUA – mesmo em meio aos riscos da pandemia do novo coronavírus (Covid-19) -, para cobrarem justiça às autoridades estadunidenses. As manifestações cresceram de tal forma que chegaram a outros países, inclusive ao Brasil, que também passou a gritar “Vidas negras importam”, em memória de João Pedro, vítima de uma trágica ação policial, no Rio, e do Miguel, que pela falta de cuidado ou desprezo por parte da patroa da sua mãe, acabou caindo do nono andar do prédio, onde ela trabalhava no Recife. Mais do que atitudes individuais de discriminação na sociedade, o racismo que muitas vezes achamos que já foi vencido no Brasil, com a Lei Áurea, em 1888, segue ainda forte mais de 130 anos depois da abolição. Mais do que desprezo, ofensas e violência de uma patologia social, nós precisamos entender que o racismo no Brasil segue muito vivo na dinâmica do cotidiano da sociedade e ele não

está apenas em relação às comunidades negras. É um problema da estrutura política do país que está longe de ser vencido, principalmente se o Brasil seguir com um sistema tributário que cobra menos proporcionalmente dos mais ricos e castiga os mais pobres que, em razão da sua história, tem o povo negro como maioria, os indígenas em situação de vulnerabilidade e o Norte e Nordeste, às margens do país. Enquanto o sistema brasileiro seguir jogando o peso da sua carga tributária sobre o consumo e o salário, os mais pobres ficarão sempre a mercê das tensões sociais, com menos acesso a educação e oportunidades. Sem o debate amplo e iniciativas de Estado que garantam uma política social e econômica mais igualitária para brancos, negros e índios, o Brasil se manterá umbilicalmente ligado aos seus tempos de mero território colonial. David Almeida é deputado estadual da 15ª a 17ª legislatura, governador do Amazonas em 2017 e presidente estadual do partido Avante no Amazonas.


16 / PODER & INSTITUIÇÕES

Entidades alertam o Poder Público Federal sobre carência de equipamentos de proteção e sugerem ações de prevenção e assistência no combate à Covid-19. Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil

Isoladas do Poder Público, populações tradicionais da Amazônia cobram Bolsonaro

Caroline Givone e Redação. Da Cenarium.

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ANAUS – Um manifesto assinado por 123 entidades e instituições chamou atenção para as preocupações das populações tradicionais da Amazônia sobre o contágio do novo Coronavírus e a forma como o governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) vem tratando essas comunidades. No documento, as entidades alertaram o governo federal sobre a carência de equipamentos de proteção e insumos médicos e sugerem ações de prevenção e assistência no combate à doença. O grupo é composto, por organizações sociais, entidades representantes dos povos indígenas, extrativistas, quilombolas e ribeirinhas e da zona rural. O manifesto foi divulgado pelo Fórum Nacional Permanente em Defesa da Amazônia (FNPDA) em abril. Um dos pedidos do manifesto é voltado a uma comunicação especifica para a região ribeirinha, visto que algumas áreas não possuem sinal de telefone e internet. “As populações tradicionais já são historicamente marginalizadas de algumas ações do poder público. Uma dessas divisões se dá pela questão


étnico racial, mas também pelo distanciamento geográfico dos centros urbanos. Muitos moradores sem saber a maneira correta para solicitar os R$ 600 do auxílio emergencial, têm se deslocado até os bancos. Pondo a própria vida e do povoado em risco, em possíveis aglomerações”, comenta Dione Torquato, representante do Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS). A carta aberta é assinada por instituições como Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), Greenpeace, Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) e Instituto Socioambiental (ISA), Comitê Chico Mendes entre outros. O encaminhamento de medicações, máscaras e kits de teste rápido e materiais de higiene; bem como a assistência alimentar, às famílias carentes também é requisitado no manifesto, com propósito de evitar a vulnerabilidade epidemiológica e deslocamento das populações tradicionais. O acesso imediato ao saneamento básico para as áreas sem cobertura de esgotamento sanitário também é lembrado por Torquato. “Com a pandemia instaurada na capital e nos municípios do interior, nosso receio é de que o poder público esqueça das áreas rurais e afastadas. Por essa razão, o FNPDA solicita o deslocamento de equipes de saúde às localidades, a fim de evitar a saída dessas populações para cidades já atingidas pelo vírus”, explica Torquato. UNIDADES DE CONSERVAÇÃO O fortalecimento do subsistema de saúde indígena, por meio da

Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs) e das Casas de Saúde Indígena (CASAIs), foi ressaltado. “Muitas Unidades de Conservação (UC), possuem sobreposição de território com áreas indígenas. Portanto, se faz necessário recondicionar esses atendimentos, para evitar o contágio entre os povos isolados e os que têm acesso livre à cidade. Lembrando que esses locais (Casas de Saúde) possam se tornar lugares aglomerados pela alta demanda. Dentro das UCs, por exemplo, existem com 26.431 famílias em 1.030 comunidades”, defende Torquato. As 42 UCs, estão sob responsabilidade federal e municipal, sendo oito de proteção integral e 34 de uso sustentável, totalizando 18.907.378,34 hectares de floresta legalmente protegidos. O manifesto ainda sugere a criação de um comitê virtual, coordenado pela Casa Civil da Presidência da República, com participação Interministerial e das organizações que assinaram o

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As populações tradicionais já são historicamente marginalizadas”. - Dione Torquato, representante do Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS).

Dione Torquato defende a inclusão dos povos extrativistas nas ações de prevenção contra a pandemia de Covid-19. Foto: Maysa Leão


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Distanciamento geográfico em relação a centros urbanos preocupa comunidade ribeirinhas. Foto: Marcelo Camargo/ Agência Brasil/Fotos Públicas

manifesto, para gerir as políticas e programas públicos de prevenção e assistência, durante a pandemia. POLÍTICA GENOCIDA As entidades que representam os povos indígenas também vêm demonstrando muita preocupação com medidas tomadas pelo governo Bolsonaro durante a pandemia. Uma delas Instrução Normativa nº 9, da Fundação Nacional do índio (Funai), publicada no dia 22 de abril de 2020, que permite legalizar o crime de grilagem dentro de áreas indígenas. “Garantir segurança jurídica aos povos indígenas é crucial. Este governo declaradamente é anti-indígena e tem tomado medidas genocidas e que destroem a natureza”, declarou a Apib, em comunicado sobre a medida. No documento final do Acampamento Terra Livre de 2020, encerrado no dia 30 de abril, a Apib voltou a afirmar que o atu-

al governo federal tem planos genocidas para os povos indígenas. “Denunciamos perante a opinião pública nacional e internacional, que nós povos indígenas do Brasil, mais de 305 povos, falantes de 274 línguas diferentes, estamos na mira e somos vitimados por um projeto genocida do atual governo de Jair Messias Bolsonaro, que já desde o início de seu mandato nos escolheu como um de seus alvos prioritários, ao dizer que não iria demarcar mais nenhum centímetro de terra indígena, e que as demarcações realizadas até então teriam sido forjadas, e que portanto, seriam revistas”, diz trecho do documento. DIVERGÊNCIAS E SUBNOTIFICAÇÃO Outra preocupação, segundo a Apib, é com a subnotificação do número de casos de Covid-19 e de óbitos de indígenas causados

pela doença. Há uma grande divergência no número de mortes e de casos confirmados que ocorre por conta da subnotificação. A Sesai que contabiliza apenas registros de índios aldeados, enquanto que as entidades que representam povos indígenas levam em conta todos os casos. No final de abril, a Apib registrou um aumento de cerca de 800% em 15 dias no número de mortes de indígenas contaminados por Covid-19, chegando à marca de 10 óbitos até o dia 22 daquele mês, enquanto os dados oficiais da Sesai apontavam quatro mortes. No dia 11 de maio, segundo a Apib, 77 indígenas já haviam morrido pela doença e 308 estavam contaminados, com 34 povos indígenas atingidos. A maioria do casos está na Amazônia e o Amazonas concentra o maior número de indígenas doentes. Apesar disso, os dados oficiais da Sesai davam con-


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ta de 258 casos confirmados e 12 óbitos, até o dia 12 de maio. Para a Apib, que representa 35 etnias do Brasil, é lamentável que os indígenas que vivem nas cidades fora dos territórios tradicionais, não tenham assistência dos recursos disponibilizados pelo governo federal, por meio da Fundação Nacional do Índio (Funai) Orlando Melgueiro, vice coordenador da Coordenação das Organizações e Povos Indígenas do Amazonas (Coimpam), afirma que algumas populações indígenas do Amazonas, que residem nas cidades, não são reconhecidas pelas políticas públicas específicas, por serem “desaldeados”. “Os preconceitos e discriminações reinam quando a Funai e

organizações indígenas não os reconhecem como cidadãos indígenas, não importando suas idades, deixando-os de fora do auxílio e assistências à essas populações. Quando este indígena busca atendimento pelo SUS, agrava ainda mais o quadro: enfrenta aglomerações e precisa disputar espaço no atendimento médico com o público geral, passivo a contrair outras doenças. Como se não bastasse, o paciente indígena portador da Covid-19, se depara com hospitais em colapso”, desabafou. A situação levou líderes indígenas do Brasil a pedirem à Organização Mundial da Saúde (OMS), no dia 4 de maio, a criação de um fundo de emergência para ajudar a proteger suas comunidades da ameaça da pandemia de corona-

vírus. Em carta ao diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, eles pediram ajuda para obter equipamentos de proteção pessoal, indisponíveis para os profissionais de saúde que trabalham em reservas e aldeias. Muitos dos 850 mil indígenas do país moram em áreas remotas da Amazônia, com acesso limitado ao atendimento de saúde, e grupos indígenas dizem que o governo não incluiu suas comunidades nos planos nacionais de combate ao vírus. “É uma verdadeira emergência”, disse à Reuters a deputada Joenia Wapichana (Rede-RR), líder do apelo à OMS e a primeira mulher indígena eleita para o Congresso brasileiro. “Os indígenas estão vulneráveis e não têm proteção”, afirmou.

O MANIFESTO Confira trecho do documento Proposições para prevenção e assistência às populações da Amazônia frente ao Coronavírus

“Diante dos acontecimentos referentes ao gravíssimo cenário de pandemia de COVID-19 provocada pelo novo Coronavírus, o Fórum Nacional Permanente em Defesa da Amazônia (FNPDA), composto, entre outras Organizações Sociais, pelas entidades representantes dos Povos Indígenas, Povos Extrativistas e Povos Quilombolas, em ALIANÇA PELA VIDA, torna pública nota expressando as preocupações e proposições destas populações em virtude da potencialidade de contágio e transmissão, combinada com sua grande carência de equipamentos e insumos médicos para dar os atendimentos necessários para garantir a saúde e o bem estar aos povos que, historicamente, demonstram ser mais vulneráveis e com menos capacidade material em fazer uma autoproteção. Por isso, viemos alertar o Poder Público Federal das necessidades de medidas emergenciais para a prevenção e assistência no combate deste vírus nos territórios dos povos da Amazônia.”


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‘Fake news e compra de votos são grandes desafios’, diz novo presidente do TRE-AM, Aristóteles Thury Em entrevista à Revista Cenarium online, o desembargador falou sobre as perspectivas para as próximas eleições municipais Luís H. Oliveira. Da Cenarium.

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ANAUS – O presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Amazonas (TRE-AM), desembargador Aristóteles Thury, afirmou que as ‘fake news’ e a compra de votos são grandes desafios para a Justiça Eleitoral. As declarações sobre a disseminação de notícias falsas e a troca de favores e vantagens por

votos foram feitas em entrevista à Revista Cenarium online no dia 21 de maio, em que o magistrado falou sobre as perspectivas para as próximas eleições municipais, previstas para outubro deste ano. “Somente quando os cidadãos tiverem consciência do poder transformador do voto não aceitarão condutas que interfiram em sua manifestação de vontade e

que comprometam o regime democrático”, afirmou o magistrado, durante a entrevista. Para Thury, é necessário comprometimento de todos os atores envolvidos na realização das eleições. O desembargador afirma que a Justiça Eleitoral brasileira tem buscado um aprimoramento constante para apresentar uma resposta eficiente ao desafio do

Desembargador Aristóteles Thury tem como primeiro desafio à frente do TER-AM a condução das próximas eleições municipais. Foto: Divulgacão


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combate à desinformação, a fim de que seja impedida ou minimizada sua esfera de influência no exercício da democracia. “O combate à desinformação na propaganda eleitoral representa um grande desafio para os regimes democráticos contemporâneos. Promover o transcurso do processo eleitoral de forma regular, hígida e conferindo legitimidade aos eleitos é extremamente desafiador, especialmente diante do volume e da velocidade com que as ‘fake news’ são disseminadas”, declarou. ESTRATÉGIAS Como medidas adotadas pela Justiça Eleitoral frente às ‘fake news’, Thury citou a Resolução nº 23.610, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), de dezembro de 2019, que determina aos candidatos a obrigação de confirmar a fidedignidade das informações veiculadas na propaganda eleitoral. O desembargador lembrou ainda que o TSE também lançou a página ‘Fato ou Boato’, com o objetivo de rebater as informações falsas sobre a Justiça Eleitoral e as Eleições. Thury ressaltou também

O desembargador Domingos Chalub foi eleito presidente com 20 votos. Foto: Divulgação/TJAM

que o TRE-AM instituiu na última eleição o Comitê de Prevenção e Combate à criação e propagação de notícias falsas, que deverá ser aprimorado. Durante a entrevista, o desembargador afirmou ainda que a conduta de ‘comprar votos’, embora reprovável pela legislação eleitoral, sendo considerada crime, ainda é bastante presente e corriqueira nas eleições. Segundo ele, esse fato reflete a necessidade de adoção de medidas por parte do TRE-AM, por meio de fiscalização e reprimenda mais eficiente, quando configurada a tentativa ou efetiva compra de votos. O magistrado também afirmou que o tribunal também atua na educação eleitoral. “A legislação eleitoral tem como objetivo primordial garantir um processo eleitoral normal e legítimo, tudo com o fito de assegurar que a escolha das urnas reflita a vontade soberana do eleitorado”, disse o desembargador. Thury falou ainda sobre outros temas, como a previsão de custo para as eleições deste ano, que serão divulgados por ato do presidente do TSE até o dia 20 de julho

deste ano, o perfil do eleitorado do Amazonas e a participação dos jovens nas eleições. A íntegra da entrevista está disponível no endereço www.revistacenarium. com.br, na editoria Poder. POSSE O desembargador Aristóteles Lima Thury tomou posse como presidente do TRE-AM no dia 7 de maio, ao lado do desembargador Jorge Manoel Lopes Lins como vice-presidente, para o biênio 2020- 2022. A cerimônia foi presidida pelo desembargador João de Jesus Abdala Simões e ocorreu virtualmente, com diversas autoridades do Estado discursando via videoconferência.

O combate à desinformação na propaganda eleitoral representa um grande desafio”. - Aristóteles Thury, presidente do TRE-AM.

ELEIÇÃO POR VIDEOCONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Pela primeira vez na história, o Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM) elegeu um presidente em uma sessão plenária realizada por meio de videoconferência transmitida via internet. Em cumprimento às recomendações de isolamento social por conta da pandemia de Covid-19, o TJAM realizou uma eleição online, no dia 14 de abril, em que o desembargador Domingos Chalub, foi eleito como presidente da Corte, para o biênio 2020-2022. A eleição foi também realizada pela primeira vez com voto aberto. As desembargadoras Carla Reis e Nélia Caminha foram aclamadas vice-presidente e a corregedora-geral de Justiça, respectivamente.


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EDITORIAL – A sordidez de Jair Bolsonaro com Arthur Virgílio, Manaus e sua história

Arthur Virgílio Filho, pai de Arthur Neto: falta de respeito à memória e ao legado do senador que combateu a Ditadura Militar causou indignação. Foto Arthur Filho: Crédito: Senado. Foto: Arthur Neto Marcio James/Semcom

Paula Litaiff. Da Cenarium.

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repulsa às declarações do Presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido), contra o prefeito de Manaus (AM), Arthur Virgílio Neto (PSDB), e o pai dele, o senador Arthur Virgílio Filho, morto há 32 anos, não pode ser um ato isolado de correligionários políticos, deve ser um dever civil de indignação com o que há de mais vil e sórdido. Peça central no inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF) que investiga interferência de Bolsonaro na Polícia Federal (PF), áudios vazados de uma reunião do

presidente com ministros, tendo como pauta a pandemia do Coronavírus, no dia 22 de abril deste ano, mostram Bolsonaro ofendendo o prefeito e o pai dele. “Aquele ‘v...’ do prefeito de Manaus, que está abrindo cova coletiva para enterrar gente e aumentar o índice da Covid. Vocês sabem filho de quem ele é, né?”, disse o presidente na reunião, rindo após fazer a pergunta retórica. Além de ratificar sua predileção por sistemas torturadores, as declarações do presidente da República indicam seu total desconhecimento com as recomen-

dações da Organização Mundial de Saúde (OMS) para os enterros das vítimas da Covid-19, infecção causada pelo Coronavírus. Apesar de doloroso para familiares, a OMS orienta a abertura de covas coletivas para reduzir a transmissão da doença. HONRA ATINGIDA A falha de Bolsonaro não é só na técnica e no caráter. Ao ofender o representante político de um município, o presidente fere a honra de seus moradores e mancha a história de uma cidade que lhe deu mais de 65% dos votos, mas,


sabemos, nunca foi prioridade do presidente e, agora, sofre com o abandono. Somente dois meses depois do início da pandemia, o governo federal acenou com um “auxílio” de profissionais para ajudar no atendimento dos hospitais. O ato do prefeito de Manaus em buscar ajuda internacional, diante da imobilidade e incapacidade administrativa do presidente em meio à crise na Saúde causada pela pandemia foi o que motivou a ira de Bolsonaro na reunião com o seu staff em abril. Ademais, a imperícia é a “marca” na vida pública de Bolsonaro, que durante 27 anos no Câmara Federal, conseguiu aprovar dois projetos de lei e uma emenda. Um legado indecoroso, se comparado aos registros deixados por Arthur Neto e a pai dele, em 30 anos de vida pública. Contudo, a sordidez de Bolsonaro vai além da incapacidade política e administrativa. Como é de seu estilo, sua degeneração moral tem o costume de alcançar a família daqueles que ele escolhe para desafeto.

Aquele ‘v...’ do prefeito de Manaus, que está abrindo cova coletiva para enterrar gente e aumentar o índice da Covid. Vocês sabem filho de quem ele é, né?”. - Jair Bolsonaro, presidente da República.

A vítima este mês foi Arthur Virgílio Filho (1921-1987), pai de Arthur Neto, senador cassado na Ditadura Militar do Brasil por lutar pelo direito de manter no poder somente aqueles que tivessem passado pelo voto popular. Entre outras conquistas sociais, Virgílio foi, também, o parlamentar que apresentou o projeto de lei para fundar a Universidade Federal do Amazonas (Ufam), antes Universidade Livre de Manáos – primeira instituição de Ensino Superior do País. DIGNIDADE E LEGADO “Depois de muito recuar, chegou a hora de este Congresso se impor. Chegou a hora de este Congresso ser digno da representação que ele encarna, de dizer a esta nação que, se ele cedeu, que, se ele recuou, não cederá nem recuará mais. Que nos fechem hoje, mas com o povo que nos assiste ao nosso lado; e não nos fechem amanhã, ingloriamente, com o aplauso do povo brasileiro, como aconteceu em 1937”. A declaração de Arthur Virgílio, em 1965, ocorria no dia seguinte à decretação do Ato Institucional nº 2 (AI-2), quando a ditadura se afastou ainda mais da democracia ao extinguir os partidos políticos e permitir apenas duas legendas (Arena e MDB, governo e oposição). Também acabava naquele momento a eleição direta para presidente, e o discurso que se tornou célebre resume bem a atuação política de Arthur Virgílio. O discurso de apologia à tortura e ofensivo ao pai do prefeito de Manaus e ao próprio Arthur Neto não pode ser mais um a cair na banalidade, como ocorreu em 29 de julho de 2019, com a declaração de Bolsonaro contra o pai do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz,

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Que nos fechem hoje, mas com o povo que nos assiste ao nosso lado; e não nos fechem amanhã, ingloriamente, com o aplauso do povo brasileiro, como aconteceu em 1937”. - Arthur Virgílio Filho, senador, em 1965, após ato da ditadura militar que extinguiu partidos. Fernando Augusto Santa Cruz de Oliveira, desaparecido, após ser preso por militares na Ditadura. REPRESENTANTE INGLÓRIO A fala desmedida do presidente não pode se tornar mais uma, no arquivo de aberrações ecoadas pelo Palácio do Planalto, como o ataque à alta comissária de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU), a ex-presidente do Chile, Michelle Bachelet, em 4 de setembro de 2019. Bolsonaro exaltou a Ditadura de Augusto Pinochet, sistema que matou o pai de Michelle, Alberto Bachelet, um dos principais combatentes pela democracia no país. Em menos de um ano, o presidente brasileiro ofendeu publicamente pelo menos três pessoas que penhoram a vida para defender a soberania popular. Mas Bolsonaro não sabe o que é lutar pela Democracia. Sabe, sim, usufruir-se dela e dos incautos, que se deixam usar por ele.


24 / CENTRAL DA POLÍTICA Para Liliane, o meio político ainda é um universo masculino, cheio de vícios e práticas machista. Foto: Divulgação

‘Me tornei vítima daquilo que combatia, superei e quero ajudar a libertar mulheres pela política’, diz a jornalista Liliane Araújo pré-candidata nas eleições 2020 Carolina Givoni. Da Cenarium.

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ANAUS – O desejo de promover dignidade e igualdade social às comunidades periféricas da capital amazonense, tantas vezes cenário de reportagens ao longo dos seus 12 anos de carreira, consolidam uma das razões que motivaram a jornalista Liliane Araújo ao ingresso na carreira política.

Em entrevista à REVISTA CENARIUM, a comunicadora destaca detalhes da candidatura que desbancou ‘velhos caciques’ nas eleições suplementares de 2017 e os planos para a incerta disputa por uma das cadeiras da Câmara Municipal de Manaus (CMM) neste ano. A conversa traz ainda assuntos polêmicos como o machismo e feminismo e a polarização entre

eleitores de direita ou esquerda, que, segundo ela, desejam um “legislador preparado, que não só conheça superficialmente as problemáticas da sua cidade, mas que possua capacidade de gestão e controle dos gastos públicos”. Acompanhe a entrevista na íntegra:


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REVISTA CENARIUM – O destaque da sua trajetória surgiu nas eleições suplementares, em que você conquistou 64 mil votos. Qual foi o desafio de enfrentar e deixar para trás nomes tradicionais e lidar com a questão da desigualdade de gênero no meio político? LILIANE ARAÚJO – O meio político ainda é muito machista e recebi como um grande desafio ter que enfrentar os ‘caciques’, que há mais de 30 anos se revezam no poder. Não foi fácil, eu tive que ter muita coragem para encarar o jogo sujo, os ataques covardes contra a minha honra, minha imagem e dignidade. Me apresentei como uma alternativa ao eleitorado, que correspondeu bem. No entanto, observei movimentos dos bastidores das campanhas,

Liliane pretende levar para a Câmara uma mentalidade mais centrada na competência técnica. Foto: Divulgação

que tinham objetivo de me tirar do pleito, diante do meu crescimento nas pesquisas. Para uma mulher concorrer ao alto cargo do executivo estadual ou municipal é algo muito difícil, mas não impossível. Somos maioria da população, do eleitorado e possuímos o maior nível de escolaridade. No entanto, ainda ocupamos poucos cargos políticos, e para que ouçam nossas vozes, precisamos ainda mais fazer parte da política e mudar essa realidade. É muito importante que os partidos compreendam de vez, que uma política sem mulheres, não é, e não será uma política democrática de fato. RC – O que motiva você a permanecer na política, mesmo diante de tantos desafios, principalmente para as mulheres que detém um

baixo percentual de participação nas casas legislativas? LA – Sabia que não seria fácil enfrentar um universo tão masculino, cheio de vícios e práticas, mas eu, enquanto cidadã, entendo que a minha cidade, o Amazonas e o Brasil só vão avançar e desenvolver caso pessoas comuns, assim como eu, tenham o desejo de mudança e assumam a responsabilidade de participar da política. Acima de tudo, é uma questão de justiça democrática garantir a inserção das minorias, bem como as mulheres, em condição de igualdade no sistema político. É importante que nós mulheres estejamos presentes nos espaços de poder, em vez de marginalizadas e ‘subrepresentadas’, para que de fato as nossas demandas sejam atendidas.


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RC – Sobre políticas públicas voltadas para mulheres, especialmente às vítimas de violência, tanto física, quanto psicológica, você tem alguma identificação ou segure pautar esse tema em um mandato futuro? LA – A defesa de causas sociais e a luta por uma sociedade igualitária, sempre foram bandeiras políticas na minha trajetória. Mas combater a violência doméstica virou uma pauta constante na minha vida. Sempre fiz reportagens mostrando os casos de violência, com destaque à violência contra a mulher no Amazonas, e acabei me tornando vítima do que eu tanto combatia. O apoio da minha família foi fundamental para que eu superasse a humilhação, a vergonha e o medo do agressor e lutasse por justiça. Desde então, passei a atuar na causa em redes de apoio que atuam no enfrentamento à esta violência. É preciso ampliar as políticas públicas em defesa dos direitos da mulher e fortalecer as redes de apoio às vítimas na capital, principalmente agora, em tempos de pandemia, onde as mulheres são duplamente ameaçadas: por um vírus potencialmente letal e por pessoas violentas de seu próprio convívio doméstico. RC – Quais dificuldades você projeta que enfrentará em sua trajetória como pré-candidata neste ano? LA – Esse ano será inédito em todos os aspectos, já que estamos enfrentando uma pandemia, que reflete diretamente na rotina de todas as pessoas. Consequentemente, isso será refletido no âmbito político, além das mudanças na legislação eleitoral, que não permite mais a coligação para candidaturas proporcionais. Vai ser um desafio maior, tudo ainda é muito

incerto. Acompanhamos diariamente as medidas adotadas pelos governantes para conter o vírus, que são modificadas frequentemente. Acredito que sairá na frente, quem já vem se preparando, organizando e buscando qualificação para disputar e conquistar uma vaga nesse pleito. Além disso tudo, será preciso assumir uma posição ideológica, diante do cenário político, cada vez mais po-

Para uma mulher concorrer ao alto cargo do executivo estadual ou municipal é algo muito difícil, mas não impossível. Somos maioria da população, do eleitorado e possuímos o maior nível de escolaridade”. larizado entre esquerda e direita, trabalhar com muita criatividade os conteúdos das redes sociais e o planejamento. Além do mais, o povo já está cansado das velhas promessas que nunca saem do papel. Esse novo eleitor quer legislador preparado, que não só conheça superficialmente as problemáticas da sua cidade, mas que possua capacidade de gestão e controle dos gastos públicos.

RC – Hoje você está no PSL, como a sigla se prepara para as eleições municipais? Quantas mulheres serão lançadas como pré-candidatas? LA – O Partido Social Liberal no Amazonas vem demonstrando um exemplo de incentivo à participação feminina na política, quando abre espaço para que mulheres façam parte dos diretórios da sigla. Isso já nos dá condições democráticas de manifestar as nossas ideias e necessidades em relação às políticas públicas voltadas para o universo feminino. Para esse pleito, temos bons quadros e opções para disputar proporcional e majoritário. Nossa nominata vem completa em termos de representatividade feminina. Ainda estamos avaliando a candidatura ao Executivo municipal e por que não uma mulher? RC – Como você espera pautar sua atuação na Câmara Municipal, caso seja eleita? LA – Quero levar para a Câmara Municipal de Manaus uma nova mentalidade, onde a competência técnica e a capacidade inovadora sejam mais fortes que os vícios da política tradicional. Pretendo atuar rigorosamente na fiscalização da destinação dos recursos públicos da minha cidade, aprovar projetos de lei que realmente contribuam para a melhoria de vida da população e ser um exemplo feminino na vida pública incentivando outras mulheres a também atuarem na política. Deixar o legado que o político é um funcionário do povo e que deve agir com transparência, honestidade e verdade adquirindo a confiança do eleitor para se manter na vida pública contribuindo para o desenvolvimento do meu município.


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Sejamos todos sentinelas da Amazônia Everaldo Farias

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Semana do Meio Ambiente é uma oportunidade para reflexão sobre o rumo que estamos dando para o nosso meio ambiente. Para nós, povos da Amazônia, as questões ambientais são mais próximas. Fazem parte do nosso cotidiano. Cuidar do meio ambiente é um dever de todos nós, por isso, é importante estarmos atentos a tudo que diz respeito às políticas públicas voltadas para as nossas riquezas naturais, principalmente agora, com o atual ministro à frente do Ministério do Meio Ambiente. Para quem não se atentou, o atual ministro do meio ambiente, Ricardo Salles, na reunião ministerial que veio a público recentemente, proferiu palavras que preocupam o futuro da Amazônia. Na prática, o que o ministro propôs é a flexibilização da legislação ambiental, que proíbe entre outras coisas, o desmatamento, o uso indevido dos recursos hídricos, estabelece normas para a manutenção de Área de Preservação Permanente (APP) e Reserva Legal (RL). Em sua fala, o ministro Ricardo Salles sugeriu que presidente da república aproveite esse período

de pandemia do coronavírus para “ir mudando todo o regramento e simplificando normas, de Iphan, de Ministério da Agricultura, Ministério do Meio Ambiente, ministério disso, ministério daquilo”. Quem assiste a esta fala do ministro e entende a importância da nossa legislação ambiental para a preservação das nossas riquezas naturais, da importância da proteção às terras indígenas, fica perplexo com tamanha displicência de um ministro que deveria estar preocupado em assegurar a proteção e o desenvolvimento das terras amazônicas de maneira sustentável e respeitosa. Em março deste ano o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) divulgou um alerta informando que no Amazonas, por exemplo, foram desmatados 73km² de florestas. Esse dado é preocupante e mostra mais uma vez que nossas políticas públicas, voltadas para o meio ambiente, precisam proteger nossas terras, rios, florestas, povos. É preciso atentar para as ações do governo federal como a Medida Provisória (910/2019) que dá mais benefícios para invasores de terras pú-

Foto: Divulgação

blicas – a grilagem. Não podemos deixar “a boiada passar”, como propõe o ministro Ricardo Salles. Precisamos ficar em alerta como sentinela, que sob qualquer suspeita de ataque, aciona o grupo para proteger o seu espaço. Everaldo Farias é ativista ambiental e ex-vereador de Manaus.


28 / ECONOMIA & SOCIEDADE

COVID-19:

Manaus sob ameaça da ‘segunda onda’ da pandemia ‘Imunidade por rebanho’ é descartada por pesquisadores, que divergem sobre fim da pandemia em Manaus Foto: Sandro Pereira


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Manaus enfrentou semanas seguidas de caos funerário pelo grande número de mortes por Covid-19. Foto: Sandro Pereira

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ANAUS - Passado o momento inicial da pandemia de Covid-19 em Manaus, com números aterrorizantes de mortes e colapso nos sistemas de saúde e funerário, a capital do Amazonas, uma das mais atingidas pela tragédia no Brasil, vive agora sob o temor de uma segunda onda, com novo pico de contágio e óbitos. Estudos técnicos que investigam na capital amazonense o comportamento do novo Coronavírus, causador da Covid-19, divergem sobre o fim do surto da doença, enquanto a cidade entra na segunda etapa das medidas de relaxamento do isolamento social. De certo entre os pesquisadores, só o entendimento de que está descartada a teoria “de imunidade por rebanho”, em que a maior parte da população foi ex-

posta ao vírus e adquire resistência, e que é preciso cautela na reabertura das atividades. Após duas semanas da divulgação do relatório elaborado por especialistas ligados ao Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), sobre um novo pico da Covid-19, a REVISTA CENARIUM comparou a previsão com dados do boletim epidemiológico divulgado pela Fundação de Vigilância em Saúde do Amazonas (FVS) no dia 14 de junho. Do início da pandemia até o dia 27 de maio, quando foi divulgado o relatório, Manaus tinha registrado 14.800 casos. No intervalo de 18 dias, até 15 de junho, foram confirmados mais 8.301 novos casos na cidade, somando 23 mil manauaras infectados, cerca de 27% a menos do

previsto no estudo para este período. Quando foi publicada, a nota técnica estimava que dentro de quatro semanas, que compreendem o período entre os meses de maio e junho, cerca de 85 mil pessoas poderiam ser infectadas apenas em Manaus.

61% O número de internações por Covid-19 caiu 61% em Manaus em 18 dias.


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A comparação ainda aponta um aumento das mortes em 79%, apesar da redução de 61% nas internações pela doença. O líder da pesquisa e doutorando em biologia pelo Inpa, Lucas Ferrante, justifica que esse declínio do número de internações é resultante do isolamento social, que apesar de não ter sido mais rigoroso, suavizou a curva projetada anteriormente. Ele também critica o método cientifico utilizado pela Universidade Federal do Amazonas (Ufam), que por meio do projeto Atlas de Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), afirmou que Manaus seria a primeira capital do País a vencer a crise sanitária. NOVA PREVISÃO “Nas próximas duas semanas, vamos observar um aumento do número de casos confirmados e mortes. No entanto, é importante ressaltar que pesquisas como as da ODS Ufam, são ‘super desconcentradas’, e não detém qualidade científica para serem divulgadas à população. Não é plausível afirmar que o vírus está se tornando mais fraco, sem verificar as variações genéticas dele. O crescimento exponencial de novos casos

vai acontecer em Manaus, assim como em outras capitais que aderiram à reabertura do comércio. A preocupação aqui se dará pelo colapso dos leitos na capital em conjunto com interior”, alerta. O estudo do Inpa também contemplou pesquisadores da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Escola de Tecnologia da Universidade do Estado do Amazonas (EST-UEA); bem como o Instituto alemão Freiburg – Max Planck em Imunobiologia, que anteriormente ressaltou que dados apresentados pelo Governo do Estado não sustentavam a reabertura de atividades não essenciais. TESE LOGÍSTICA Segundo o coordenador do boletim elaborado pelo Atlas ODS Amazonas, Henrique Pereira, por conta da evolução do vírus, não há possibilidades de uma segunda onda de contaminação de Covid-19 a curto prazo, fato que faria da capital amazonense a primeira cidade do país a superar a crise. “Todos os vírus estão competindo para se reproduzir, os menos viru-

lentos ganham vantagem porque se transmite em maior frequência e, depois de certo tempo, interagindo com a população hospedeira, se tornam maioria”, defendeu. Para chegar a essa conclusão, a pesquisa formada pelos pesquisadores Henrique Pereira, Danilo Egle e Bruno Lorenzi, usou o modelo logístico, e não epidemiológico, para prever taxas de crescimento de casos e de óbitos. A projeção estima que 97% das mortes por Covid-19 deveria ocorrer até o dia 17 deste mês. Pereira ressaltou que a hipótese, não deve ser confundida com a imunização de rebanho, onde quase toda a população já teria tido contato com o vírus. Na avaliação do Atlas, se o modelo adotado estiver corretamente ajustado para a curva de cada um dos municípios examinados, as projeções feitas até o marco de 97% dos óbitos previstos indicam que Boa Vista, Macapá, Rio Branco e Porto Velho serão as últimas capitais localizadas na bacia amazônica a controlarem a pandemia. Essa hipótese, segundo os pesquisadores estaria relacionada com a data do início da transmissão comunitária nessas capitais.

Covid-19 Manaus - Análise de 18 dias (27 de maio à 14 de junho) Casos confirmados

27/mai

14/jun

Evolução

Óbitos

27/mai

14/jun

Evolução

Manaus

14.800

23.101

64%

Manaus

1.272

1.614

79%

Interior

18.708

33.405

56%

Interior

619

878

71%

Total AM

33.508

56.506

59%

Total AM

1.891

2.492

76%

Letalidade

27/mai

14/jun

Comparação

Internações

27/mai

14/jun

Redução

Manaus

9%

7%

-2%

UTI

315

167

53%

Interior

3%

3%

0%

Leitos Clínicos

687

449

65%

Média AM

6%

5%

5%

Total AM

1.002

616

61%

Tabela construída a partir de consulta ao painel epidemiológico da FVS.


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Relaxamento das medidas de distanciamento social preocupa pesquisadores que projetam risco de novo pico da pandemia em Manaus. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

“A aceleração da transmissão começou primeiro em Manaus; 4 dias após, em Belém e Rio Branco, depois em Macapá após 6 dias e, finalmente, em Porto Velho, em 8 dias após o início em Manaus. Porém, essas pequenas diferenças em dias não seriam suficientes para explicar o fato de em Porto Velho a curva de óbitos ainda não ter atingido sequer o ponto de inflexão, previsto para 18 de junho”, informa o boletim.

14.800 casos confirmados no mesmo período de maio e saltou para 23.101 no mesmo período, resultando em 64% de aumento.

COMPARATIVOS

Apesar do aumento expressivo, o número geral de internações apresentou queda de 61% dentro dos 18 dias, pois em 27 de maio, 1.002 pacientes estavam internados nas Unidades de Terapia Intensiva (UTI) e leitos clínicos, e até 14 de junho, o número despencou para 616. Mais especificamente, as internações na UTI caíram 53% e em leitos clínicos, 65%.

Em menos de 20 dias, o Amazonas apresentou um crescimento de 59% no número de casos de Covid-19, saltando de 33.508 até 27 de maio, para 56.506 em 14 de junho. Manaus concentrou

Os óbitos saltaram de 1.891 para 2.492, um crescimento de 76%, mesmo com a letalidade da doença se mantendo em 5%. Em Manaus, o índice de letalidade caiu 2% apesar do crescimento das mortes.

Conforme divulgado em 27 de maio, os cientistas do Inpa atribuíram essas reduções à fatores cruciais como as determinações de isolamento social, que reduziram o contato entre pessoas, o fechamento de comércios, escolas e universidades, além da adesão das atividades em forma de home-office ou o uso de máscaras por quem não poderia ficar em casa. RECOMENDAÇÕES Lucas Ferrante explica que essas reduções, mesmo em meio ao crescimento de casos, estão ligadas às melhorias aplicadas nos hospitais da capital, com devido aumento no número de leitos, chegada de profissionais de saúde e à melhora na organização do fluxo do atendimento.


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O especialista ainda alerta que Manaus pode enfrentar mais de um pico da pandemia, por conta do relaxamento social. “Sem dúvida nenhuma, entre os meses de julho e agosto, a cidade deve enfrentar um pico devastador do vírus. Estamos alertando todos os tomadores de decisão, assim como o governador e o prefeito para retomar o isolamento social rigoroso”, dispara. Para o pesquisador Henrique Pereira, manter o isolamento social não é garantia de que o vírus não possa circular. Ele defende que medidas de higiene e distanciamento social podem contribuir para a redução do número de casos. “Temos que nos arriscar. Cada um está colocando seu pescoço como cientista nesse debate. Nossa teoria é da ecologia de doenças, observamos a relação entre virulência e transmissão. O que significa que não fica razoável supor que possa acontecer uma nova onda em sequência desta, que parece estar se encaminhando para o fim”, ressalta. Ainda assim, o pesquisador também defende o adiamento da reabertura das atividades econômicas, por conta da velocidade de transmis-

são do atual estado da doença, que poderá ganhar novas “roupagens”. Sobre a evolução dos vírus, o biólogo do Inpa rebate a tese do colega pesquisador da Ufam, dizendo que é impossível acontecer a co-evolução do vírus na atualidade. Ele diz, que essa evolução ocorreria por seleção natural, mas não em pouco tempo. “Nós ainda nem tivemos tempo para analisar o DNA das crianças nascidas durante a pandemia para afirmar que elas possuem a resistência ao vírus. Essa evolução da humanidade acontece por várias gerações e não simplesmente poucos meses”, rebate. O especialista declara que noticiar a tese da evolução sem comprovação cientifica é irresponsável por parte dos pesquisadores da Ufam, e que cientistas devem ter responsabilidade ao defender hipóteses e sempre apresentar provas. “Vir a público e dizer que o vírus está menos letal, sem qualquer tipo de comprovação é uma grande irresponsabilidade. Dizer à população que a pandemia está passando, causa um impacto muito grande, pois as pessoas têm uma confiança na ciência. Não se pode dar informações desconcentrada”, finalizou Ferrante.

Henrique Pereira aposta em fim da pandemia em Manaus. Foto: Reprodução/Youtube.

EXPECTATIVA ECONÔMICA

Banco Mundial: Brasil terá recuperação mais lenta que outros países Eduardo Cucolo, São Paulo, SP (Folhapress).

A

economia brasileira deve encolher 8% em 2020, um dos piores resultados globais, de acordo com estimativas do Banco Mundial. Em janeiro, a instituição projetava crescimento de 2% para o Brasil. Além de ter uma retração superior à média mundial de 5,2%, o país terá uma recuperação mais lenta. A projeção de crescimento para 2021 é de 2,2%, pouco mais da metade do crescimento mundial de 4,2% esperado para 2021. “A economia global sofrerá contração de 5,2% neste ano. Isso representaria a recessão mais profunda desde a Segunda Guerra Mundial, com a maior proporção de economias desde 1870 a experimentar declínio do produto per capita [90% dos países, ante 85% na Grande Depressão dos anos 1930]”, afirma o Banco Mundial em sua publicação “Global Economic Prospects”. As economias avançadas devem encolher 7%. As emergentes e em desenvolvimento, 2,5%, em sua primeira contração como grupo em pelo menos 60 anos. “A expectativa de declínio para a renda per capita


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A economia global deve sofrer uma contração de 5,2% em 2020, o que representaria a recessão mais profunda desde a Segunda Guerra Mundial. Foto: Rafael Matsunaga/(Arquivo) – Wikipédia/Fotos Públicas

é de 3,6%, o que levará milhões de pessoas à situação de pobreza extrema neste ano”, afirma a instituição. As estimativas consideram que a pandemia se atenue o suficiente para permitir a suspensão das medidas de distanciamento social até meados deste ano nas economias avançadas e um pouco mais tarde nas economias emergentes e em desenvolvimento. Em um cenário mais negativo, a contração do PIB mundial poderia chegar a até 8% neste ano, seguida de uma recuperação de apenas 1% em 2021. Entre os países desenvolvidos, a economia dos EUA deve contrair 6,1% neste ano, e a da Zona do Euro deverá encolher 9,1%, com recuperação de 4% e 4,5%, respectivamente, em 2021. A China deve crescer 1% neste ano e 6,9% em 2021. Entre as 14 recessões dos últimos 150 anos, a atual seria clas-

sificada como a 4ª mais profunda (seguida pelos períodos de 1914, 1930-32 e 1945-46). Espera-se uma queda de 6,2% para o PIB (Produto Interno Bruto) per capita, a maior desde a Segunda Guerra Mundial. CENÁRIO BRASILEIRO Segundo a instituição, a contração no Brasil está ligada às medidas de contenção da propagação do vírus, investimentos em queda e redução nos preços de commodities. A recuperação em 2021 pressupõe uma reversão desses fatores, além da retomada das discussões sobre as reformas tributária e do ambiente de negócios. De acordo com o banco, as economias emergentes e em desenvolvimento com espaço fiscal disponível e condições de financiamento economicamente acessíveis deveriam considerar estí-

mulos adicionais se persistirem os efeitos da pandemia. Segundo a instituição, a crise afeta mais os países em que a pandemia foi mais grave e onde há forte dependência do comércio global, do turismo, da exportação de produtos primários e do financiamento externo. É o caso do Brasil. Em relação aos países emergentes, o Banco Mundial diz que as interrupções no sistema escolar e no acesso à atenção de saúde primária provavelmente terão impactos duradouros no desenvolvimento do capital humano. “Trata-se de uma perspectiva profundamente desanimadora, com a probabilidade de a crise causar cicatrizes duradouras e impor grandes desafios globais”, disse a vice-presidente de Crescimento Equitativo, Finanças e Instituições do Grupo Banco Mundial, Ceyla Pazarbasioglu.


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PIB do Brasil pode sofrer déficit de 9,1% em virtude de nova ‘onda’ de Covid-19 Da Cenarium.

B

RASÍLIA – A economia brasileira deve apresentar queda de 7,4% neste ano, segundo previsão da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Essa retração pode ser ainda maior, se houver uma segunda onda de contaminação pelo novo Coronavírus (Covid-19), chegando a 9,1% de queda do Produto Interno Bruto (PIB), que é a soma de todos os bens e serviços produzidos no país. Segundo relatório publicado no dia 10 de junho, pela OCDE, a economia brasileira estava finalmente se recuperando de uma longa recessão quando veio o surto da Covid-19. E agora, a previsão é que a economia sofra uma recessão ainda mais profunda, diz a organização. Para a OCDE, a recuperação da economia será lenta e parcial e alguns empregos e empresas serão perdidos. “O desemprego vai bater recorde histórico antes de recuar gradualmente”, avalia. Para 2021, a previsão é de crescimento de 2,4% do PIB, no cenário com duplo surto de Covid-19. No

Para a OCDE, a recuperação da economia será lenta e parcial e alguns empregos e empresas serão perdidos. Foto: Comunicação Volkswagen do Brasil/Fotos Públicas

cenário com apenas uma onda de contaminação, a previsão de expansão para o próximo ano é 4,2%. MUNDO A previsão da OCDE para a queda da economia mundial é de 6% neste ano, em caso de controle do surto da Covid-19, com crescimento de 5,2%, em 2021. Se houver uma segunda onda de contaminação, a projeção de queda é 7,6%, em 2020, e expansão de 2,8% em 2021.

6% A OCDE prevê queda de 6% neste ano, em caso de controle da Covid-19.


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Com 58%, Amazonas lidera índice de mortalidade indígena por Covid-19 no Brasil

Carolina Givoni e Luís Henrique Oliveira. Da Cenarium.

M

ANAUS – O Estado do Amazonas concentra a maior quantidade de óbitos indígenas por Covid-19, com 132 mortes confirmadas em 15 etnias diferentes, representando 58% da mortalidade pela doença no Brasil. Em todo País, a pandemia já vitimou 228 nativos de 76 etnias. Segundo o último boletim epidemiológico da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), divulgado em 9 de junho, o número de infectados chegou a 2.908, com 386 casos suspeitos e 228 óbitos em 43 povos indígenas. Os povos originários da Amazônia são os mais afetados pelo vírus, que apenas no Amazonas causou a morte de 55 Kokama, 16 Tikuna, 7 Baniwá, 7 Baré, 6 Tukano, 4 Apurinã, 3 Mura, 2 Koripapo, 1 Matsés, 1 Tariano, 1 Sateré Mawé, 1 Omagua-Kambeba, 1 Dessana, 1 Mundukuru e 1 Karapanã, totalizando 132 mortes com 25 indígenas sem identificação da etnia. O Pará segue na segunda colocação com 51 óbitos, com Roraima fechando a lista dos três Estados com 29 mortes causadas pelo novo Coronavírus.

Em todo País, a pandemia já vitimou 228 nativos de 76 etnias. Foto: Euzivaldo Queiroz

Os dados da organização divergem da contagem feita pela Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), que leva em consideração apenas indígenas aldeados para registro, o que é contestado por lideranças. “Ao negar esse atendimento a quem se declara indígena mas não reside nas aldeias, a Sesai evidencia o racismo estrutural, disse o advogado e indígena Sateré Mawé, Tito Menezes.


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DADOS A Sesai apresentou no dia 10 de junho, 2.392 casos de Covid-19 confirmados, 435 suspeitos, 85 óbitos e 1.088 casos de cura clínica. Essas informações são obtidas junto a cada um dos 34 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (Dsei), validadas pelo Departamento de Atenção à Saúde Indígena (DASI) e, assim, disponibilizadas à sociedade. Por Dsei, segundo a Sesai, as regiões amazônicas são as que possuem mais casos confirmados de Covid-19. A região do Alto Solimões, no Amazonas, concentra o maior número, com 448 casos confirmados. Guamá Tocantins (PA), vem em seguida, com 182, Alto Rio Negro com 157, Maranhão com 131 e Amapá e norte do Pará com 117 casos. AÇÕES DA SESAI O governo federal diz que tem garantido assistência aos mais de 750 mil indígenas brasileiros aldeados durante a pandemia da Covid-19. O Ministério da Saúde, por meio Sesai, reforçou o atendimento desde o começo do ano, antes mesmo do decreto de pandemia feito pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Dessa forma, foram realizadas ações de informação, prevenção e combate ao coronavírus, orientando comunidades indígenas, gestores e colaboradores em todo o Brasil. O País conta com mais de 5,8 mil aldeais de 305 etnias espalhadas pelo território nacional. “Mesmo antes da decretação de pandemia, nós da Sesai já estávamos atuando por reconhecer a fragilidade, a história e o perfil epidemiológico dos povos indígenas. Nós temos unido grandes esforços

junto aos estados e municípios para atuar de forma coordenada, ampliando as ações de saúde no país, com o único objetivo de salvar vidas neste momento”, reforçou o secretário Especial de Saúde Indígena do Ministério da Saúde, Robson Santos da Silva. KOKAMA PERDEU 11 FAMILIARES As 11 mortes na família do líder tradicional do povo indígena Kokama, Edney da Cunha Samyas, 38 anos, são uma mostra do poder de destruição do novo Coronavírus nos povos tradicionais da Amazônia. “Meu pai era um guerreiro. Era um homem muito bom que tinha roça. Ainda trabalhou na construção civil e gostava de praticar artes marciais. Levou com ele muito conhecimento”, disse Edney com a voz trêmula, ao contar em um vídeo enviado à REVISTA CENARIUM sobre a perda de 11 familiares para a Covid-19. Morando em Tabatinga (AM), a 1.111 quilômetros de Manaus, Edney falou ainda sobre o uso da medicina tradicional, que, segundo ele, “salva mais vidas que a medicina do homem branco”. “Meu pai gostava de reunir a família em casa para nos ensinar os hábitos da nossa etnia Kokama. Além disto, ele passou para nós os ensinamentos sobre a medicina tradicional como o chá da Ayahuasca. Já perdi 11 familiares para a Covid-19, entre eles o meu avô, meu pai, tios, tias, primos, entre outros. A medicina tradicional pode curar qualquer tipo de doença, mas achamos que a estrutura do homem branco seria melhor, mas não, nos enganamos. Fomos acreditar que a medicina do branco poderia curar a Covid-19 e perdemos quem mais amávamos”, disse Edney.

O chá a que Edney se refere é visto pelos indígenas como um purificador completo, limpando a mente e o corpo, uma vez que pelo seu potencial alucinogênico, como o DMT, a harmalina ou a harmina, atua sobre o sistema nervoso, causando estados de consciência sobrenatural, o que leva as pessoas a terem visões, além de diarreia e vômitos como efeitos colaterais. De acordo com Edney, seu pai, Guilherme Samias, de 64 anos, apresentou sintomas e foi logo encaminhado ao Hospital de Guarnição de Tabatinga (HGuT), gerido pelo Exército. Segundo a Secretaria de Estado de Saúde do Amazonas (Susam), no dia 5 maio, o estado de saúde de Guilherme Samias, era grave, porém mantinha quadro estável da parte respiratória e hemodinâmica. “Deveríamos ter cuidado dele em casa”, finaliza. Segundo Edney, que também é líder da Federação Indígena do Povo Kukami-Kukamiria do Brasil, Peru e Colômbia (TWRK), atualmente vivem 25 mil Kokamas no lado brasileiro, sendo 5.500 na área urbana de Tabatinga. Dados da Associação dos Povos Indígenas Brasileiros (APIB), re-

Já perdi 11 familiares para a Covid-19, entre eles o meu avô, meu pai, tios, tias, primos, entre outros”. - Edney da Cunha Samyas, líder Kokama.


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forçam a gravidade do depoimento de Edney. A Covid-19 possui uma taxa de letalidade de 14,3% entre os povos originários, que biologicamente são mais frágeis à infecções e vírus. Para termos de comparação, a letalidade do novo Coronavírus na população urbana brasileira é de 6,5%. AÇÕES GOVERNAMENTAIS Uma comitiva da Saúde visitou o HGuT em maio e contou com a presença da secretária da Susam, Simone Papaiz, e do titular da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), Robson Silva. A equipe visitou e acompanhou a entrega de 2 toneladas de respiradores e Equipamentos de Proteção Indivi-

dual (EPIs) realizadas pelo Ministério da Saúde (MS). No município de Tabatinga, foram entregues dez ventiladores pulmonares e 49 mil itens de EPIs. Na cidade, o atendimento referenciado dos doentes também está sendo feito no HGuT. “O governo estadual tem estado muito preocupado com o crescimento de casos de Covid-19 no interior, e em especial entre os indígenas. Por isso, desde o início organizamos nosso plano de contingência e isso permitiu que fôssemos um dos primeiros estados a receber auxílio federal”, explicou Papaiz, na época. Em Manaus, para reforçar o atendimento aos indígenas da comunidade Parque das Tribos, a

prefeitura instalou uma UBS Móvel nas proximidades para realizar testes para o novo Coronavírus e outras ações de saúde. AJUDA HUMANITÁRIA O presidente da Fundação Estadual do Índio (FEI), Edivaldo Munduruku, afirmou que a pasta tem atuado diretamente na ajuda humanitária aos povos originários. “Estamos fazendo intensivamente a distribuição de cestas básicas, álcool em gel e máscaras, assim como o trabalho de conscientização do controle sanitário de entrada e saída entro das aldeias. O trabalho tem sido feito em parceria com a Funai”, disse o presidente da FEI.

MORTALIDADE INDÍGENA

AMAZONAS CONCENTRA MAIOR NÚMERO DE MORTES Kokama: 55 Tikuna: 16 Baniwá: 7 Baré: 7 Tukano: 6 Apurinã: 4 Mura: 3 Koripapo: 2 Matsés: 1 Tariano: 1 Sateré Mawé: 1 Omagua-Kambeba: 1 Dessana: 1 Mundukuru: 1 Karapanã: 1 Indígenas sem identificação de etnia: 25 FONTE: COIAB. *Atualizado até 9 de junho.

132 mortes


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Agente orienta moradora de Eirunepé sobre cuidados na prevenção à Covid-19. Foto: Assessoria de Imprensa

Com sistema de saúde deficiente, interior do Amazonas se adapta para enfrentar Covid-19 Da Revista Cenarium.

A

pandemia de Covid-19 atingiu em cheio o Amazonas colocando o Estado entre os mais afetados pela doença no Brasil. Quase sem acessos por vias terrestres, os municípios do interior vivem um drama para tratar os pacientes da doença, situação agravada ainda mais pela falta de estrutura, reflexo do abandono histórico no sistema público de saúde. Com as deficiências já existentes e a demora na ajuda dos governos do Estado e Federal, as prefeituras tiveram de redobrar esforços e fazer investimentos para controlar a

proliferação do vírus e reduzir o número de casos graves, uma vez que sem Unidades de Tratamento Intensivo (UTIs), insumos e equipamentos, o número de mortes poderia superar o da capital. No Careiro Castanho (a 100 quilômetros de Manaus), que é atravessada pela BR-319, a prefeitura decretou o fechamento total, criando barreiras nas entradas da cidade. Também foi decretado o fechamento do comércio não essencial e as ruas são higienizadas diariamente. “Com o primeiro caso confirmado, estabelecemos dias para

cada comunidade ter transporte público liberado à sede do Careiro. Adquirimos 40 mil máscaras caseiras produzidas por 10 costureiras do município, além da distribuição de 10 mil frascos de álcool em gel. Tivemos de agir rápido”, afirmou o prefeito Nathan Macena. Segundo o gestor, entre os equipamentos adquiridos para o Hospital Regional da cidade estão ventiladores mecânicos não invasivos, duas ambulâncias, um aparelho de raio-x móvel, dois concentradores de oxigênio, 20 termômetros digitais infravermelhos, além de 15 oxímetros digitais entre outros.


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ALA EXCLUSIVA Eirunepé (a 1.160 quilômetros de Manaus) passou dos 75 casos até o fechamento desta reportagem. Por lá, o Hospital Regional Vinícius Conrado ganhou uma ala para atender exclusivamente pacientes com Covid-19. Foram criados 19 novos leitos, sendo cinco de UTIs. Além de cápsulas “Vanessa” - desenvolvidas no Amazonas para ajudar no tratamento da doença - o espaço é equipado com respiradores, três monitores cardíacos, dois monitores com desfibriladores e cinco ventiladores mecânicos. “Com o agravamento da contaminação no Amazonas e os riscos à saúde, determinei a reforma e adequação de uma ala do hospital. O local foi isolado para o tratamento de pessoas com Covid-19”, explicou o prefeito Raylan Barroso, que determinou a montagem de barreira sanitária fluvial na entrada do município, tendo ele próprio contraído a doença.

Insumos hospitalares passaram por desinfecção ao chegar em Envira. Foto: Assessoria de Imprensa

A cidade adotou o isolamento social antes do primeiro caso, registrado dia 30 de abril. Foi decretado o uso obrigatório de máscaras em locais públicos, bancos e de funcionamento essencial. Com carros pipa e equipamentos de esterilização, ruas foram higienizadas e o aeroporto foi fechado para voos comerciais, praticamente isolando Eirunepé, que só recebeu voos com insumos, cerca de 10 toneladas, para ajudar no combate à Covid-19. SEM CASOS Embora ainda não tenha registrado nenhum caso da doença até dia 22 de maio, o sistema de saúde da pequena Envira vem sendo equipado para tratar eventuais pacientes. Para estar preparado para casos graves da doença, o Hospital Regional recebeu sete cápsulas “Vanessa” e dois compressores, equipamentos fundamentais.

Por meio do decreto n°127/2020, a prefeitura de Envira decretou também o uso obrigatório de máscaras de proteção facial em locais públicos e vedou a prática das atividades físicas e de lazer, incluindo caminhadas em vias públicas, espaços públicos ou de uso comum da coletividade. Dos 62 municípios do Estado, apenas Envira e Ipixuna não registraram casos da Covid-19 até o fechamento desta reportagem. Medida comum no interior, uma barreira sanitária foi montada no aeroporto de Envira, onde agentes atuam na desinfecção de cargas vindas de Manaus. Ivon Rates, prefeito de Envira, pediu que a população fique em casa, cumpra o decreto que estabeleceu isolamento social e observa que o cerco está se fechando em relação à pandemia. “A situação é séria. O interior do Amazonas já tem mais casos confirmados que Manaus. Fiquem em casa”, alertou.

MUNICÍPIOS Dos 27.038 casos confirmados no Amazonas até o fechamento desta reportagem, 12.967 eram de Manaus (47,96%) e 14.071 do interior do Estado (52,04%). As notificações são realizadas pelas vigilâncias epidemiológicas dos municípios, por meio de sistema de informação de saúde, e informadas para a FVS-AM, que consolida os dados. Os casos notificados são confirmados ou descartados, futuramente, por exame laboratorial ou testes rápidos.


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Em discurso reflexivo, Elisabeth Valeiko, mulher de Arthur Virgílio, assume protagonismo socioambiental Paula Litaiff. Da Cenarium.

A

primeira-dama de Manaus, Elisabeth Valeiko do Carmo Ribeiro, usou do protagonismo social que já detém à frente do Fundo Social de Solidariedade (FSS), “Manaus Solidária”, e fez um alerta sobre os desafios ambientais enfrentados na capital amazonense, em um vídeo gravado para as redes sociais sobre a Semana Mundial do Meio Ambiente, comemorada neste mês. Em um tom menos amistoso e mais reflexivo, a primeira-dama diz que o momento não é de festejos. “É o momento de refletir, não é de festejar. Para a gente refletir, realmente, o que vale, quais são os valores hoje que nós temos para seguir nossas vidas. E uma delas, é justamente o meio ambiente, um lugar onde nós vivemos, onde nós habitamos, onde nós precisamos cuidar e ter essa reflexão: ‘o que nós estamos fazendo hoje pelo lugar onde a gente vive? O que nós estamos fazendo, hoje, pelo meio ambiente?’”, questionou. Presidente da Comissão de Paisagismo da Prefeitura de Manaus, Elisabeth Valeiko, que é arquiteta por formação, disse que precisou atuar diretamente na reversão de projetos arquitetônicos que iriam ser entregues, sem a contemplação de áreas verdes. “(…) os projetos que chegavam ao prefeito Arthur (Virgílio) eram lindos nas fotos, tinha árvores, verde. Mas na realidade, estava sendo contemplado apenas o projeto físico, o projeto

arquitetônico. Na hora da entrega, não tinha a parte de paisagismo, de passeio, de água, grama, não tinha nada disso”, observou. A formação acadêmica e a análise técnica das obras fizeram a arquiteta reavaliar as diretrizes dos projetos e contratos para que em toda obra municipal fosse contemplado o paisagismo ou a preservação da vegetação original das localidades. “Hoje, em todos os projetos da prefeitura (de Manaus), existe o projeto do paisagismo, que tem que estar integrado ao projeto arquitetônico”, apontou. QUEBRA DE PARADIGMAS O novo comportamento administrativo diante da valorização do meio ambiente gerou a humanização das obras implantadas em Manaus, nos últimos anos. “Não existe nenhuma obra linda e perfeita se não houver a humanização dele, se não houver o paisagismo verde, que eu tanto valorizo”, explicou Elisabeth Valeiko. A responsabilidade do cidadão em garantir a manutenção dos projetos de paisagismo, bem como a preservação do patrimônio público, também, foram abordados pela primeira-dama de Manaus. “Precisamos entender que é necessário cuidar do lugar onde nós vivemos. O que é cuidar: que a gente não jogue lixo nas ruas, não jogue lixo no igarapé, cuide da sua cidade como você cuida da sua casa, e esse ambiente aqui, em que nós estamos

vivendo, é nosso, dos nossos filhos, dos nossos netos”. Voltando-se à reflexão da data lembrada em junho, Valeiko destacou a importância da valorização das obras municipais pelo próprio cidadão, responsável pelo recurso empregado nos projetos públicos. “Vejam: é o Dia Mundial do Meio Ambiente, não é o Dia Municipal, nem nacional. É mundial, porque todos entendem a importância de um meio ambiente saudável, que não é só limpo ou estar bonito, é a gente valorizar e compreender o quanto nós precisamos disso (…)”, observou. NOVOS PARQUES Há mais de um ano, a Prefeitura de Manaus deu início às obras de três novos parques ambientais e de lazer que serão instalados nas

Não existe nenhuma obra linda e perfeita se não houver a humanização dele, se não houver o paisagismo verde, que eu tanto valorizo”. - Elizabeth Valeiko, primeira-dama de Manaus.


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A primeira-dama Elizabeth Valeiko diz que momento é de reflexão sobre os desafios ambientais de Manaus. Foto: ltemar Alcantara/Semcom

áreas verdes dos conjuntos Hileia 2, no bairro Redenção; loteamento Monte Sinai, no Monte Sinai; e dos Sargentos e Subsargentos, no bairro Flores, de acordo com a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semma). Os espaços serão mantidos por empresas privadas e associações de moradores, segundo a Secretaria de Parcerias e Projetos Estratégicos. Os espaços terão pista de caminhada, iluminação de LED, academias ao ar livre e parquinho infantil, além de jardinagem e arborização. Com essas três áreas verdes, somadas às dos conjuntos Colina do Aleixo, Novo Aleixo, e Jardim Primavera, no Parque 10 de No-

vembro, sobe para 11 o número de áreas verdes contempladas por projetos de requalificação ambiental. CONSELHO DA AMAZÔNIA No mesmo dia em que a primeira-dama de Manaus chamou a atenção para a reflexão socioambiental, o prefeito Arthur Neto enviou nota à imprensa para informar de seu pedido oficial ao Presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido), para participar como membro do Conselho da Amazônia Legal. O pedido foi recebido pela presidência e encaminhado ao Ministério do Meio Ambiente para análise. “Pedi para participar,

como ouvinte e debatedor, para expor a realidade amazônica sob a ótica de quem sabe de suas dificuldades. Quero ser o ponto contraditório em um Conselho que é composto por 14 ministros comandados pelo presidente e que não vão debater suas opiniões”, relatou Virgílio. O Conselho conta com a participação de ministérios e não tem representantes de órgãos e entidades com atuação direta na proteção do meio ambiente, das populações tradicionais que compreendem os povos indígenas, os quilombolas, pescadores e ribeirinhos, o que, para o prefeito de Manaus, acaba fragilizando o debate.


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‘Todos os dias, sofro com o fantasma de levar o vírus para minha casa’, diz enfermeira de Manaus

A socorrista Antônia Costa teme todos os dias levar o vírus para dentro de sua casa. Foto: Arlesson Sicsú

Paula Litaiff. Da Cenarium.

H

á 14 anos trabalhando no Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) de Manaus, no Amazonas, a técnica de enfermagem Antônia Costa enfrenta um dos maiores desafios de sua vida: conviver com o risco diário de contaminar familiares com o novo Coronavírus, vírus causador da Covid-19, com cura ainda desconhecida. A reportagem acompanhou a rotina de Antônia Costa e de outros socorristas da capital amazonense, no

atendimento a pacientes suspeitos de Covid-19. A cada dez chamadas por dia ao Samu de Manaus, pelo menos seis são para atender pacientes com suspeita de Covid-19. O novo vírus – que causa pneumonia e não responde a tratamento com antibióticos – registrou crescimento acelerado de contágio em Manaus. Até o fechamento desta reportagem, no dia 16 de junho, 2.550 pessoas morreram com Covid-19 no Amazonas e o total de casos confirmados chegou a 58.018. Ao todo, 46.894 pessoas já passaram pelo período de qua-

rentena (14 dias) e se recuperaram da doença. Há ainda 8.574 casos confirmados nos últimos 14 dias, pessoas que se encontram internadas ou em isolamento domiciliar. No Samu de Manaus, pelo menos 30% dos profissionais foram afastados do cargo por contaminação da doença, em março, segundo dados do Serviço Móvel de Urgência. Mas o problema não reside só dentro das bases socorristas. É que a maioria dos profissionais precisa dar plantões nos hospitais para completar a renda, lamenta Antônia.


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AMIGOS EM RISCO “Toda semana, vejo um colega sendo afastado por testar positivo para a doença e a maioria não contraiu aqui, foi nos hospitais onde fazem plantão. Tive um amigo que foi entubado há dois dias, fiquei desesperada por ele, e preocupada por mim. Pensei: meu Deus, poderia ser eu”, disse. A médica Simone Damasceno afirmou que o procedimento de descontaminação de roupas e equipamentos é complexo, metódico, mas necessário. “Adotamos o procedimento de manter pessoas específicas para a lavagem das ambulâncias a cada atendimento de suspeita de Covid-19. Também, trocamos todos os equipamentos a cada atendimento de chamada”, explicou. Apesar das precauções adotadas no trabalho, a médica disse que precisou se afastar do filho

de quatro anos, com medo de um risco de contaminação. “Eu pedi que ele ficasse na casa de familiares, faz cerca de dez dias que não o vejo, não o abraço. A gente sofre com essa distância, mas nunca pensei em abandonar minha profissão”, disse Antônia no início de abril, quando a Revista Cenarium acompanhou sua rotina. PERTO DO VÍRUS No atendimento a uma idosa de 60 anos, na zona Oeste de Manaus, os socorristas precisaram descer até palafitas para retirar a senhora de maca do local. DESESPERO AO VOLANTE No retorno para a base do Samu, Júlio Rodrigues recebeu uma nova chamada. Um homem sofreu um acidente de trânsito, após passar mal por suspeita de Covid-19 e perder a direção do carro. “Isso

nunca tinha acontecido por aqui”, disse o motorista. No local, o homem, com aparência de 30 anos, aparentava palidez e cansaço. Falou que esteve com pessoas contaminadas, passou mal, com febre e falta de ar, e estava a caminho do hospital, quando colidiu o carro em um ônibus. Depois dos primeiros socorros, ele foi levado ao hospital. Para os socorristas, o medo não pode ser maior que a missão que abraçaram. A cada atendimento de chamada e chegada a um hospital, o retorno de volta para casa fica sempre a dúvida. “Será que passei para alguém (o Coronavírus)? Será que sou um hospedeiro. Eu chego em casa e passo direto para o banho. Nunca mais abracei minha mulher e nem meus dois filhos. Vivo isolado, mas não penso em abandonar o trabalho. É a minha missão”, disse Rodrigues.

Maioria dos acionamentos recebidos pelo Samu são para pacientes com suspeita de Covid-19. Foto: Arlesson Sicsú


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Saldo da pandemia: produção industrial do AM amarga retração de quase 50%, diz IBGE Carolina Givoni. Da Cenarium.

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ANAUS – Com queda na produção beirando a casa dos 50%, fixada em 46,5%, a indústria amazonense encabeça a lista de piores índices de recuo na atividade produtiva, durante os meses de março e abril deste ano, segundo um levantamento realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Para o Instituto, este é pior resultado do Estado desde o início dos comparativos, em 2002. Nesta pesquisa, somente em abril, mesmo com o ajuste sazonal, 13

Produção da indústria do Amazonas apresentou pior resultado desde o início dos comparativos, em 2002. Foto: Euzivaldo Queiroz

dos 15 locais consultados demostraram taxas negativas. O economista Wallace Meireles explica que o balanço é preocupante, mas nada que não estivesse previsto da situação de pandemia da Covid-19. “Os americanos têm taxas de decréscimo, que estão previstas algo em torno de 4%, somente nos primeiros três meses desse ano. A China caiu 9% no primeiro trimestre, e o Brasil não vai ficar fora disso, com todos os setores econômicos afetados”, disse. Meireles afirmou que há uma fragilidade do sistema econômi-

co relacionada, porque ninguém consegue produzir como antes. E questão do emprego acaba sendo crítica. “É preciso ter em mente um plano. Precisamos de um governo mais ágil, menos burocrático. É uma questão de humanidade para ajudar as pessoas que estão em uma situação difícil”, explica. Para o supervisor de disseminação de informações do IBGE no Amazonas, Adjalma Nogueira Jaques, a razão da paralisação do Polo Industrial de Manaus (PIM), o isolamento social causado pela pandemia do Covid-19, é o principal motivo para esse quadro.


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“Com as plantas industriais obrigadas a paralisar suas linhas de produção, por conta da pandemia, acabou causando uma estagnação brusca na fabricação dos produtos. Com isso, o desempenho desabou à níveis históricos, causando sérios prejuízos momentâneos e futuros para a indústria do Estado. Para a próxima divulgação, as expectativas não são das melhores, uma vez que o isolamento permaneceu durante todo o mês de maio”, declara. Os índices de maiores acentuações de queda estão no Amazonas, Ceará, e Região Nordeste toda, bem como o Paraná, Bahia,

São Paulo e Rio Grande do Sul. Assim como os anteriores, o Rio de Janeiro, Espírito Santo, Minas Gerais, Santa Catarina, Pernambuco e Mato Grosso completaram o conjunto de locais com índices negativos. O resultado reflete o isolamento social por conta da pandemia da COVID-19, que afetou a produção industrial por todo o país. RECUPERAÇÃO Meireles defende que políticas podem amenizar o quadro, a curto e médio prazo, para o especialista, a situação não voltará ao normal de uma hora para outra. “A indicação

é que podemos conviver com essa doença por alguns anos. É preciso nos reinventarmos nessa situação como o caso do home office, que continua a produção. Preservar a vida é importantíssimo. Vamos passar por isso e reerguer a economia, a inflação é consequência de uma economia que está decrescendo rapidamente”. O especialista ainda fala do desejo que tem do governo preservar a demanda agregada brasileira, trabalhando a questão do micro, médias e grandes empresas. “Esperamos que o governo tenha essa sensatez, não só o governo federal, mas os Estados e Município”, pondera.


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A Moto Honda da Amazônia foi uma das empresas do PIM que retomou gradualmente as atividades produtivas. O retorno dos colaboradores às atividades na unidade, segue um cronograma de retomada da operação, encerrado antecipadamente ao período de suspensão temporária do contrato de trabalho. A empresa ainda afirma que colaboradores cujas atividades permitirem atuação à distância, ainda permanecerão em regime de home office. Nos novos protocolos de saúde e segurança foram estabelecidas avaliações de saúde com medição de temperatura no acesso à fábrica; horários diferenciados e intercalados para evitar aglomerações; reorganização de espaços, limitação do número de pessoas e adoção de critérios de distanciamento mínimo em locais como ônibus fretados, linhas de produção, refeitórios e salas de reunião; novos critérios de higienização, limpeza e sanitização bem como a adoção de máscaras.

O Polo Industrial de Manaus sofreu forte queda na produção por conta da pandemia de Covid-19. Foto: Euzivaldo Queiroz

COMPARATIVOS O índice de média móvel trimestral da indústria caiu 8,8% no trimestre encerrado em abril de 2020 frente a março, intensificando o recuo de 2,4% do mês anterior e mantendo a trajetória predominantemente descendente iniciada em outubro de 2019. A redução desse mês foi a mais intensa desde o início da série histórica. Todos os 15 locais pesquisados apontaram taxas negativas nesse indicador. Os recuos mais acentuados foram de Amazonas (-18,6%), Ceará (-17,1%), Rio Grande do Sul (-12,2%), Região Nordeste (-11,7%), Paraná (-10,2%), Santa Catarina (-10,2%), Bahia (-9,8%) e São Paulo (-9,5%).

mais intenso desde o início da série histórica: Amazonas (-53,9%), Ceará (-53,0%), Rio Grande do Sul (-35,8%), Região Nordeste (-33,1%), São Paulo (-31,7%), Santa Catarina (-30,8%), Paraná (-30,6%), Pernambuco (-29,1%) e Bahia (-26,5%). Espírito Santo (-23,9%), Minas Gerais (-20,4%), Mato Grosso (-11,6%) e Rio de Janeiro (-5,4%) completaram o conjunto de locais com índices negativos nesse mês. Por outro lado, Pará (37,6%) e Goiás (0,4%) apresentaram variações positivas.

Na comparação com igual mês do ano anterior, a indústria caiu 27,2% em abril de 2020, com 13 dos 15 locais pesquisados apontando resultados negativos. Assim como no índice nacional, nove dos quinze locais pesquisados atingiram seu resultado negativo

Com as plantas industriais obrigadas a paralisar suas linhas de produção, por conta da pandemia, acabou causando uma estagnação brusca na fabricação dos produtos”. - Wallace Meirelles, economista.


ARTIGO / 47

Esquerdas, liberais, mas DEMOCRATAS Marcelo Amil

O

Brasil vive um momento onde não pode haver tergiversação. Há apenas dois caminhos apontados e todos precisamos fazer uma escolha. Aqueles que não escolherem por ação, estarão fazendo sua escolha por omissão. Há dois caminhos possíveis, o da democracia, e o do autoritarismo. Até hoje sentimos na pele as marcas do que foi a ditadura militar no Brasil. Uma ditadura mantida com o derramamento de sangue, com a supressão de liberdades, e com feridas que até hoje não cicatrizaram completamente. E digo que não cicatrizaram porque uma mãe que não pôde sequer enterrar seu filho é uma ferida em todos nós que não vai cicatrizar nunca. Nesse caso, já que não há cura, que haja alento e memória, pois memória é o único alento. Manter viva a memória do que foi a ditadura militar é o alento de que ela não mais acontecerá. Churchil disse que a democracia é o pior regime que existe, depois de todos os outros. Chruchil, o homem que ordenou a constrangedora campanha de Galípoli em 1915, e ainda assim, graças à democracia,

tornou-se um memorável primeiro ministro da Inglaterra. Aqueles que optarem por não se envolver, escudados em malabarismos retóricos que tentam justificar não se apresentar ao lado A ou B, estão fazendo sua escolha por omissão. Já no campo dos que lutam pela democracia, devemos baixar as nossas individuais armas menores e erguer juntos a maior. Nossos bodoques são importantes, mas essa guerra exige um canhão que nenhum de nós pode operar sozinho e que só pode ser operado por todos nós juntos. Militantes de esquerda, militantes de centro, trabalhistas, socialistas, comunistas, social democratas, a luta desse momento está além do programa dos nossos partidos. A luta desse momento é pela democracia. Ou nos ombreamos e juntos combatemos a cadela no cio ou veremos o estado democrático, que nos é tão caro, mais uma vez esvair-se por entre nossos dedos. Aos que estarão do outro lado, do lado do autoritarismo, saibam que vocês serão derrotados como

Foto: Divulgação

sempre. Vocês serão derrotados pois a própria luta de vocês é uma derrota. Quem precisa se impor pela força é ignóbil que não consegue defender sua ideia. Você serão derrotados pois viemos da natureza onde valia a lei do mais forte. Superamos a lei de talião. Chegamos à civilização, e o futuro não é outro senão o de uma sociedade livre e civilizada. A única masmorra que vocês poderão operar será a que existe dentro de suas cabeças onde vive o monstro da arbitrariedade. Vivam com esse monstro preso em suas cabeças, pois nós, defensores da democracia, viveremos com a liberdade do pensamento. Marcelo Amil é advogado, Defensor Geral da Justiça Desportiva no Amazonas.


48 / POLÍCIA & CRIMES AMBIENTAIS

Confinadas com o

agressor

Violência doméstica contra mulheres aumenta 33% em Manaus nos quatro primeiros meses do ano

O maior tempo de permanência com os agressores no isolamento social é apontado como uma das causas do aumento do casos de violência. Foto: Clóvis Miranda/DPE-AM

Márcia Guimarães. Da Cenarium.

A

umentou em 33% o número de casos de violência doméstica contra mulheres em Manaus nos quatro primeiros meses deste ano. De acordo com dados da Secretaria de Estado de Segurança Pública (SSP), de janeiro a abril de 2019, foram registrados na capital 5.035 casos. No mesmo período de 2020, os registros somaram 6.716 ocorrências. São 1.681 casos a mais, o que dá ideia de um cenário que pode ser ainda mais preocupante, levando-se em conta que há um número desconhecido de mulheres que não denuncia a violência. Ainda de acordo com dados da SSP, as ocorrências mais recorrentes nos quatro primeiros meses de 2020 são injúria (31,7%), ameaça (28,5%) e lesão corporal (13,1%), respectivamente. Os dados até abril são os últimos divulgados pela SSP até o momento. A secretaria informou que os números de maio ainda não foram consolidados. As informações são do Sistema Integrado de Segurança Pública (Sisp). Vale destacar que estes são registros, não número de vítimas. Isto quer dizer que mais de uma pessoa pode ter sido vítima em um único registro, ou que uma mesma vítima tenha sofrido mais de um tipo de crime. Desde o início da pandemia, em março, autoridades ligadas à rede de proteção às mulheres têm alertado para o aumento da violência doméstica durante o isolamento social. A recomendação para ficar em casa protege do novo Coronavírus, mas deixa mulheres vítimas de violência mais vulneráveis por conta da maior permanência na convivência com os agressores.


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Comparação do número de casos registrados em Manaus de janeiro a abril.

5.035 6.716

2019

2020

Fonte: Secretaria de Estado de Segurança Pública (SSP).

Em Manaus, o caso mais recente de grande repercussão foi o assassinato da Miss Manicoré Kimberly Karen Mota de Oliveira, 22, encontrada morta a facadas no apartamento do ex-namorado, o analista judiciário Rafael Fernandes, 31. A polícia suspeita que o fato de ela ter terminado o relacionamento de três meses tenha sido o motivo do crime. Em 2019 inteiro, de janeiro a dezembro, a violência doméstica tendo mulheres como vítimas em Manaus somou 18 mil ocorrências, segundo dados da SSP. MEDIDAS PROTETIVAS Preocupados com o aumento do número de casos, órgãos que atuam no combate e prevenção à violência contra as mulheres têm buscado alternativas para não desamparar as vítimas durante a pandemia. Em Manaus, as medidas protetivas para mulheres que sofreram algum tipo de violência podem ser solicitadas ou prorrogadas por meio de requerimento feito por telefone. Tanto a Defensoria Pública do Estado do Amazonas (DPE-AM), quanto o Tribunal de Justiça do Amazonas (TJ-AM) disponibilizaram serviços de atendimento à distância durante o período de pandemia de Covid-19, em cumprimento das medidas de distanciamento social necessárias. Durante o período de pandemia, as Medidas Protetivas de Urgência (MPU) podem ser solicitadas de uma forma mais simples, sem que as mulheres precisem se dirigir a uma delegacia. Mas é preciso estar atenta, porque a solicitação de prorrogação deve ser feita com um mês de antecedência em relação à data de vencimento da medida.

MEDIDAS PROTETIVAS PARA ONDE LIGAR: TRIBUNAL DE JUSTIÇA Para requerimentos de prorrogação da medida protetiva. 1º Juizado Especializado no Combate à Violência Doméstica e Familiar Contra Mulher: (92) 99972-8953 / 99198-7620 e (92) 98449-7084 2º Juizado Especializado: (92) 3303-5011 / 3303-5004 / 98438-5528 3º Juizado Especializado: (92) 3303-5012 / 3303-5009 / 98200-6669 DEFENSORIA PÚBLICA Para pedidos de prorrogação, pedidos iniciais ou informação de descumprimento de Medida Protetiva de Urgência. Núcleo de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres (Nudem): (92) 98417- 3249/98427-1138 RONDA MARIA DA PENHA Para pedir ajuda em caso de descumprimento de medida protetiva. (92) 98842-2258 HORÁRIOS E DOCUMENTOS: Os serviços telefônicos do TJ-AM e da Defensoria para prorrogação de medidas protetivas ou pedido inicial funcionam das 8h às 14h, de segunda à sexta-feira. Para fazer o requerimento, é necessário a identificação da vítima, um relato dos fatos, e, se houver, algum documento comprobatório como fotos, áudios e vídeos. Fontes: TJAM e DPE-AM

“As mulheres estão deixando de pedir medida protetiva por acreditar que tem que ir à delegacia, quando na verdade podem fazer um pedido simples por telefone, na Defensoria ou nos próprios juizados”, afirma a defensora pública Pollyana Vieira, coordenadora do Núcleo de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres (Nudem).


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Número de mortes de líderes indígenas e conflitos rurais foi maior em 2019 do que em dez anos

Greenpeace Brasil. e acordo com o mais recente levantamento da Comissão Pastoral da Terra (CPT), Conflitos no Campo Brasil 2019, lançado em meados de abril deste ano, durante 2019, o número de conflitos rurais foi o maior dos últimos dez anos, chegando a 1933, sendo 60% destes na Amazônia. A região também concentrou a violência extremada, com 27 (84,4%) dos 32 assassinatos registrados. O relatório mostra um aumento de 14% no número de assassinatos, de 7% nas tentativas de assassinato e de 22% nas ameaças de morte. Segundo análise da organização, as pessoas assassinadas em 2019 eram, em grande parte, lideranças de movimentos dos trabalhadores rurais e indígenas, que lutavam pelo direito ao uso da terra e que realizavam denúncias de grilagem, de extração ilegal de madeira, de invasão de garimpeiros. Um dado alarmante foi o aumento no número de assassinatos de lideranças indígenas, o maior nos últimos dez anos, sendo sete lideranças indígenas mortas, nos es-

tados do Amapá (1), Amazonas (3) e Maranhão (3), onde o povo Guajajara segue sob intensa ameaça. A situação vivenciada pelo povo Guajajara é trágica e exemplar em relação ao contexto de vulnerabilidade a que muitas comunidades indígenas estão expostas em todo o Brasil – mesmo as que vivem em terras já demarcadas e, em tese, contam com a proteção do Estado. Apenas entre novembro e dezembro de 2019, quatro indígenas do povo Guajajara, na Amazônia maranhense, foram assassinados e, em março deste ano, outra liderança foi assassinada. “O principal foco dos ataques são os territórios tradicionais, seja para a exploração de madeira, minério, expansão agrícola de fazendas, agronegócio ou especulação imobiliária. Com isso a vida, de todo mundo que luta em defesa da terra e do meio ambiente está em risco”, reforçou Sônia Guajajara, coordenadora executiva da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), no relatório. “Os assassinatos de lideranças indígenas e camponesas se inserem no contexto de ataque gene-

14%

7%

22%

O relatório da Comissão Pastoral da Terra mostra um aumento de 14% no número de assassinatos.

Número de tentativas de assassinato aumentou 7% em 2019.

Relatório da Comissão Pastoral da Terra apontou aumento de 22% nas ameaças de morte.

D


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ralizado promovido pelo governo Bolsonaro contra os povos Indígenas, com o enfraquecimento dos órgãos de proteção e fiscalização indígena e ambiental, como a Funai e o Ibama”, avaliou Rômulo Batista, da campanha de Amazônia do Greenpeace. O relatório da CPT ressalta a gravidade da crise gerada pelos incêndios florestais do ano passado, “que se alastraram por todo o território e que fazendeiros, grileiros e madeireiros batizaram como ‘Dia do fogo’, fomentados pelo discurso bolsonarista. E, enquanto a floresta queima, no Planalto garante-se a institucionalização da grilagem de terras, através da edição da Medida Provisória 910/2019”. A MP 910 ou MP da grilagem, que pode ser votada no Congres-

so a qualquer momento, é um verdadeiro presente para os ladrões de terras públicas, que na esperança de terem suas invasões perdoadas avançam sobre a floresta, passando por cima de tudo e de todos, inclusive aqueles que estiverem lá para defendê-la. Outro projeto preocupante do governo é o PL 191/2020, que visa liberar as Terras Indígenas para exploração, colocando mais uma camada de tensão sobre esses povos, que já sofrem com a ilegalidade negligenciada e podem ver suas terras abertas para uso do mercado. “Infelizmente esse aumento na violência no campo é só mais uma prova de que este é o governo da destruição, que não respeita as florestas, os indígenas, as populações tradicionais e os camponeses, desdenhando de tudo o que é diferente dele e que representa a diversidade e singularidade do povo brasileiro”, completou Rômulo.

O principal foco dos ataques são os territórios tradicionais”. - Sônia Guajajara, coordenadora executiva da Apib.

Levantamento da Comissão Pastoral da Terra mostra que conflitos contra indígenas aumentaram em 2019. Foto: Aldarey Tamandaré/Pará/ Fotos Públicas


52 / POLÍCIA & CRIMES AMBIENTAIS

Polícia Federal alerta para ameaças cibernéticas Da Redação.

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RASÍLIA – Durante a crise sanitária provocada pelo Covid-19, a Polícia Federal detectou um aumento significativo de ameaças cibernéticas. Os criminosos utilizam campanhas falsas – compostas por meio de e-mails, links, mensagens por aplicativos, ligações telefônicas e outros canais – para obter dados bancários e informações pessoais para o cometimento de crimes cibernéticos.

LINKS Não clique em links enviados por e-mail, SMS ou aplicativos de mensagens em nome de instituições bancárias, não preencha dados de cartões de crédito em formulários e nem informe dados de cartões de crédito e senha em ligações telefônicas; Procure as informações junto ao seu banco nos canais oficiais.

A Polícia Federal orienta que, para garantir que os cidadãos tenham acesso às informações precisas e atualizadas sobre as ações federais em torno da crise sanitária provocada pela pandemia de Covid-19, procure os canais oficiais nos sites ou mídias sociais do Portal Governo do Brasil (gov.br), Ministério da Justiça e Segurança Pública, Ministério da Saúde, Ministério da Economia, Ministério da Cidadania e das instituições bancárias.

VOUCHER AUXÍLIO EMERGENCIAL

APLICATIVOS MALICIOSOS

Diversas mensagens disparadas por meio de aplicativos como Whatsapp, SMS, e-mails e até telefonemas têm solicitado informações para cadastro dos beneficiários do auxílio emergencial aprovado pelo Governo Federal. Não informe os seus dados nesse tipo de mensagem.

Foram identificados diversos aplicativos que solicitam informações ou se passam por órgãos do governo a fim de obter dados pessoais. Fique atento e baixe apenas os aplicativos indicados nos sites oficiais.

GOLPES USANDO O WHATSAPP Solicitações de empréstimos e transferências oriundas de contatos no Whatsapp podem ser golpes! Ligue para o seu contato e confirme a solicitação!

BOLETO FALSIFICADO Códigos de barras podem ser facilmente alterados. Fiquem atentos ao nome da empresa e valor do pagamento. Qualquer dúvida, entre em contato com o credor e emissor do boleto ou com a sua instituição bancária.


ARTIGO / 53

Foto: Divulgação

Cadê o Procon? Rodrigo Guedes

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ssumi o Procon Manaus em abril de 2018 e até então o órgão não existia, ou melhor, existia apenas no papel, como uma típica repartição pública, da forma que estamos acostumados a ver e não atuava em nada em favor da sociedade, perfazendo-se apenas um estamento burocrático, que passava longe de cumprir seu mister, qual seja, o equilíbrio das relações de consumo. A criação do Procon Manaus foi, sem sombra de dúvidas, uma das mais importantes políticas públicas de cidadania executadas no município, porém, a despeito da extrema utilidade pública nesses dois anos de hígido funcionamento, foi, recentemente, extinto sumariamente, justo no momento em que as pessoas mais precisam deste hábil e eficiente instrumento de justiça social, já que as novas relações sociais emergentes após a pandemia do coronavirus, fizeram explodir os conflitos, a ponto de recebermos mais de cinco mil denuncias em quinze dias de março. Em outras palavras, os consumidores ficaram a ver navios em seus direitos e garantias, que na esmagadora maioria das vezes

poderiam ser resguardados com celeridade pelo órgão. Antes de 2018 não se ouvia falar por aqui na sigla Procon ou muito menos em “Cadê o Procon?”, simplesmente pelo fato de que este não fazia parte do dia a dia da população. Após a forte e justa atuação que passamos a empreender, centenas de milhares de pessoas passaram a buscar o órgão. Foi um crescimento meteórico e estratosférico, chegando, a gerar o efeito contrário, ou seja, certa insatisfação por não conseguirmos mais dar conta sequer de 10% das demandas encaminhadas, dada a equipe extremamente diminuta. Frases como “Cade o Procon?”, “Vou procurar o Procon”, ou “vou no Procon”, entre outros, caíram na boca do povo. Decerto é que não valoriza a importância disso quem não precisa e não sofre as agruras de ver direitos ou bens essenciais esvaírem-se pelas mãos, indefesos. Vi, com meus próprios olhos, como diz o ditado, o drama das pessoas que nos procuravam. Muitas delas chorando ou desesperadas, em busca de uma solução. Os manauaras perderam um eficientíssimo instrumento de

dignidade humana já que defesa do consumidor é defesa de todos, pois todos o somos, e, acima de tudo, a defesa dos mais vulneráveis e hipossuficientes. Milhares de pessoas ficaram órfãs. O vale tudo pelo dinheiro voltou e o alto poder econômico foi preservado pelo sistema, mesmo que cometam irregularidades. Quem causa a quase totalidade das demandas consumeristas não é o seu Zé ou a Dona da Maria, da taberna, mas as grandes corporações econômicas . Depois de ter ouvido ou lido a pergunta centenas de milhares de vezes, agora eu que pergunto: Cadê o Procon? Rodrigo Guedes é graduado em Direito pela Universidade Federal do Amazonas, especialista em Administração Pública pela Ufam e foi Secretário do Procon Manaus e Ouvidor do Municipio de Manaus entre 2018-2020.


54 / MUNDO & CONFLITOS INTERNACIONAIS

“As consequências da morte dos povos da Amazônia e da destruição da Floresta Amazônica serão globais” - Greta Thunberg, ativista ambiental.

Foto: World Economic Forum/ Manuel Lopez/Fotos Públicas


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Vídeo de Greta Thunberg pede ajuda mundial para Manaus no combate à Covid-19 Luana Dávila. Da Cenarium.

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ativista sueca Greta Thunberg cumpriu a promessa ao Prefeito Arthur Neto (PSDB) e gravou um vídeo pedindo socorro à Amazônia pelas vítimas da pandemia no novo Coronavírus, que já matou mais de 14 mil brasileiros. Greta também pediu ajuda ao combate da doença. “Manaus é a capital do Estado do Amazonas no Brasil. É o coração do que você conhece como a Floresta Amazônica”, disse a jovem de 17 anos que se tornou famosa mundialmente pela luta e proteção do meio ambiente no planeta. A sueca e um grupo de ativistas pediram num vídeo ajuda para a capital amazonense: “Manaus é o epicentro da pandemia de Covid-19 na Floresta Amazônica”, diz o brasileiro João Duccini, 21. Em seguida, a também brasileira Valentina Ruas, 16, afirma: “E o seu sistema de saúde não vai colapsar”, “porque ele já colapsou”, concluiu Amália Garcez, 16. Treze ativistas de diferentes países, como Brasil, Irlanda do Norte, Nova Zelândia, Portugal e Suécia, participaram da gravação. Em português, todos, incluindo Greta, concluem com a mensagem: “salvem a Amazônia”. “As consequências da morte dos povos da Amazônia e da destruição da Floresta Amazônica serão globais”, diz Greta em um trecho do vídeo em que destaca o grave risco dos efeitos da pandemia sobre povos indígenas. O vídeo será distribuído para a imprensa nacional e internacio-

nal, para chefes de Estado e líderes mundiais. O vídeo também está disponível nas redes sociais da Prefeitura de Manaus. Em resposta à boa vontade de Greta, o Prefeito Arthur Neto comentou: “Hoje, tive resposta ao meu pedido de ajuda feito à sueca Greta Thunberg, grande ativista da causa ambiental. Manaus e o Amazonas enfrentam momentos difíceis durante essa pandemia da Covid-19. Por isso, o apoio e a influência global dela vêm em hora oportuna, porque a crise já coloca em risco a vida dos protetores da nossa floresta, os nossos indígenas”, destacou. “Eu agradeço, de coração, o retorno que recebi de Greta e adianto que formalizarei uma nova carta, para alinharmos estratégias e unirmos esforços no combate ao novo Coronavírus, não só pela nossa cidade, mas por toda a Amazônia”, disse o prefeito.

O pedido para que Greta gravasse o vídeo foi feito no dia 2 de maio, também por vídeo, e Greta resolveu ajudar. O vídeo será distribuído para a imprensa nacional e internacional, para chefes de Estado e líderes mundiais. A informação foi veiculada na Revista Veja. PERSONALIDADE MUNDIAL Greta Thunberg, que foi eleita a personalidade do ano de 2019 pela revista Time, comunicou sua decisão de atender ao apelo do prefeito de Manaus na noite do dia 12 de maio, por meio do representante para o Brasil e Portugal do ‘Fridays Future’, movimento dirigido pela ativista sueca. Em recentes críticas à política ambiental do atual governo brasileiro, para a Amazônia, Greta Thunberg foi hostilizada por radicais pró-governo e ganhou do presidente Jair Bolsonaro, a alcunha de ‘pirralha’.

Greta Thunberg reuniu um grupo de jovens ativistas para gravar o vídeo. Foto: UNclimatechange/ Fotos Públicas


56 / MUNDO & CONFLITOS INTERNACIONAIS

Serão necessários até cinco anos para controlar o coronavírus, segundo cientista-chefe da OMS Ana Estela Pinto. Folhapress.

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inda serão necessários quatro ou cinco anos até que o novo Coronavírus esteja sob controle, disse a cientista-chefe da Organização Mundial da Saúde (OMS), Soumya Swaminathan. Segundo ela, o tempo pelo qual o vírus continuará representando uma ameaça vai depender das mutações que ele possa sofrer, da eficácia de medidas de restrição do contágio implantadas pelos países e do desenvolvimento de uma vacina viável. Em uma conferência digital promovida pelo jornal britânico Financial Times, Soumya disse que “não há bola de cristal” para essa previsão, e que a pandemia pode até “potencialmente piorar”. As declarações foram dadas no dia 13 de maio. Além disso, o fracasso de governos e famílias em aplicar as vacinas já comprovadas para doenças já conhecidas mostra que é um erro apostar todas as fichas em uma descoberta científica no caso do coronavírus, disse em entrevista em Genebra o diretor-executivo da OMS, Michael Ryan. “Desculpem se pareço cínico, mas vejam quantas doenças poderíamos ter eliminado com vacinas perfeitamente eficazes, como a do sarampo, e não o fizemos. Podemos até descobrir, produzir e entregar, mas as pessoas precisam também tomar as vacinas”, disse Ryan.

Segundo ele, o mais provável é que o coronavírus fique endêmico e a humanidade precise conviver com ele, como ocorre com o HIV. “Com tratamentos corretos, pode se tornar um vírus que não provoca mais pânico. Mas no momento é um patógeno novo, chegando aos humanos pela primeira vez, e é impossível estimar por quanto tempo ele ficará entre nós”, disse.​ Mesmo sem uma vacina, os governos podem controlar a pandemia com medidas básicas de epidemiologia e saúde, afirmou Maria van Kerkhove, líder técnica da OMS: “Vários países já comprovaram que com as medidas corretas para impedir o contágio e tratar os doentes é possível dominar a Covid-19”. Para Peter Piot, diretor da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres que também participou do evento do Financial Times, eliminar o coronavírus vai exigir “muito mais” do que desenvolver uma vacina viável. VACINA A empresa de biotecnologia Moderna anunciou no dia 18 de maio, que testes preliminares de uma possível vacina para o novo Coronavírus tiveram resultados positivos. Oito pacientes receberam doses pequenas e médias da vacina e desenvolveram níveis de anticorpos semelhantes ou superiores aos encontrados em pacientes já recuperados da doença.

A pandemia pode até ‘potencialmente piorar’”. - Soumya Swaminathan cientista-chefe da OMS.


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Os resultados sugerem, por ora, que a vacina desencadeia um certo nível de imunidade. Porém o resultado envolve um número pequeno de pacientes. A empresa anunciou que deve realizar novos testes em julho que podem envolver 600 pessoas. “A fase provisória 1, embora em estágio inicial, demonstra que a vacinação com o mRNA-1273 produz

uma resposta imune da mesma magnitude que a provocada por infecção natural”, disse Tal Zaks, diretor médico da Moderna, em comunicado. A companhia afirmou que a vacina “tem potencial para prevenir a Covid-19”. O estudo clínico é realizado pelos Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos, onde o governo investiu US$ 500 milhões de dólares.

Cientistas da OMS acreditam que o mais provável é que o coronavírus fique endêmico e a humanidade precise conviver com ele. Foto: NIAID/Fotos Públicas


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Portal da Cultura disponibiliza vídeos de visitas guiadas a espaços culturais. Foto: Michael Dantas

Eventos culturais do Amazonas se adequam à quarentena

Mencius Melo. Da Cenarium.

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á com saudade de sair de casa, né meu filho?”, o meme do Draúzio Varela cai como uma luva para esses tempos de quarentena. Sem poder sair de casa – por enquanto por consciência, daqui a pouco talvez, por lockdown – o amazonense se vira para sair da rotina. Para ajudar, a Revista Cenarium apresenta uma série de alternativas culturais, para o leitor saborear cultura, na segurança do seu lar. Com a ajuda da tecnologia, é possível curtir shows, passeios virtuais a museus, bate papos culturais interativos, saraus de poesia, exposições fotográficas e as populares lives de artistas consagrados. O COMBO CULTURAL DA SEC Responsável por gerir as políticas públicas de cultura no Estado, a Secretaria de Estado da Cultura e

Economia Criativa (SEC) preparou um super pacote que inclui visitas guiadas e em 360º a espaços culturais; atividades como gincana do livro, documentários, cursos completos de teclado, violão, desenho e até espetáculos direto do palco do Teatro Amazonas. Um dos melhores roteiros, são as visitas virtuais guiadas, aos espaços administrados pela SEC. Sem sair de casa, é possível circular por equipamentos culturais como a Pinacoteca do Amazonas, Museu Tiradentes da Polícia Militar, Museu de Arqueologia, Museu da Imagem e Som do Amazonas, Museu de Numismática, Biblioteca Pública do Amazonas, Galeria do Largo e dos centros culturais Palácio Rio Negro e Povos da Amazônia, além do Teatro Amazonas e Centro Cultural Palácio da Justiça, que contam com vídeos em 360 graus. Durante as visitas, os guias que trabalham nestes


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espaços fazem um tour, comentando sobre a história, curiosidades e obras de cada patrimônio. AULAS E PERFORMANCES

Serviços disponibilizados incluem espetáculos de dança, aulas do Liceu Cláudio Santoro e acesso a documentários pelo Portal da Cultura. Foto: Reprodução/Sec

Além disso, ainda são oferecidas aulas meio do projeto “Praticarte”, com professores do Liceu de Artes e Ofícios Claudio Santoro. E também performances dos Corpos Artísticos da SEC, como Amazonas Filarmônica, Orquestra de Violões, Amazonas Band e Coral do Amazonas. Para fechar o “combo”, tem o #FicaNaRedeManinho, com videoclipes de artistas da terra, contemplados no edital. Todo o conteúdo disponibilizado faz parte do “Cultura Sem Sair de Casa” e pode ser acessado no portal: cultura.am.gov.br.

Foto: Reprodução/Sec

PREFEITURA ABRE O PARQUINHO Quem também está oferecendo agenda virtual é a Prefeitura Municipal de Manaus (PMM). A turma do Parque da Criança está realizando ação por meio de live no Instagram. Todas as terças-feiras, às 17h, shows e contações de histórias são realizadas no perfil @parquecidadedacrianca. MANAUSCULT CELEBRA ARTE MANAUARA Para não deixar ninguém na vontade, a Manauscult criou o #CulturaNaQuarentena. O projeto reúne videoclipes de artistas do Amazonas, entre eles nomes badalados como Lucilene Castro, Zona Tribal, Márcia Novo, República Popular e também dicas de literatura com o escritor Jan Santos e dicas de cultura pop, sobre o universo das Histórias em Quadrinhos (HQ) com o jornalista Emerson Medina. Para assistir, é só ir no site: vivamanaus. com/culturanaquarentena.

Foto: Reprodução/Sec


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Entretenimento do AM projeta expectativa para o segundo semestre Carol Givone. Da Cenarium.

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ANAUS – Empresários do setor de entretenimento do Amazonas, estão buscando estratégias para minimizar os impactos da pandemia de Covid-19 no segundo semestre. Para parte deles, a remarcação dos eventos perdidos poderá contribuir para a estabilização dos negócios e evitar maiores perdas, uma vez que os impactos da crise podem levar 580 mil profissionais ao desemprego em todo o Brasil. Para tentar minimizar os impactos, a Associação Brasileira de Promotores de Eventos (Abrape) e outras entidades do setor, estão solicitando ao público que adquiriu ingressos de festivais ou shows adiados, que não peçam o estorno do dinheiro. Ainda segundo Abrape, cerca 52% dos eventos no país foram cancelados, adiados ou estão em situação incerta. Para contornar a situação, outra solução foi encontrada: Validar os ingressos para um outro evento de responsabilidade da produtora.

Guto Oliveira, gestor da Fábrica de Eventos, conta que a empresa realizadora dos shows de Anitta, Wesley Safadão e Skank em Manaus, tem adotado essa medida para não onerar os lotes provenientes para a remarcação, previstas para o segundo semestre do ano. “O consumidor pode trocar o ingresso adquirido por um ‘voucher’. Dessa forma, esse ingresso pode valer para qualquer outro evento da Fábrica. A troca é válida para o mesmo tipo de ingressos, sejam VIPs para o mesmo tipo, bem como os de pista”. Carlos Junior, da empresa Mode On Eventos, explica que não realiza mais festivais, atuando somente em eventos corporativos. “Tudo está parado. Não estamos mantendo caixa, atividades e outras atribuições. Uma possível solução seria produzir eventos online, estamos estudando isso. Voltar a funcionar é uma questão de tempo, só não sabemos quando. Corrida, festas de confraternizações, treinamentos devem voltar a acontecer, talvez em tamanhos menores. Mas não existe a possibilidade de fazer isso agora”, concluiu.

52% De acordo com dados da Abrape, cerca 52% dos eventos no país foram cancelados.

92% Pesquisa da Abrape apontou que 92% das empresas associadas já relataram prejuízos.


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Alguns empresários ofertam a troca de ingressos de shows adiados ou cancelados por um voucher para ser utilizado em outros eventos da empresa. Foto: Arlesson Sicsu

Cerca de 60% do PIB do setor no País é composto por membros Abrape. O órgão, afirma que os impactos da crise, podem levar 580 mil profissionais ao desemprego em todo o Brasil. Doreni Caramori Junior, presidente da associação, está apreensivo. “É um cenário sem precedentes. Estimamos que 300 mil eventos deixarão de acontecer. Nosso setor está 100% fechado. Se considerarmos a população total de trabalhadores, algo em torno de 1,9 milhão de empregos, estamos falando em prováveis 580 mil demissões”. BARES Mais de um mês depois do início da pandemia, ainda vigoram as determinações municipais e estaduais, que suspenderam gran-

des concentrações de público no Amazonas, para evitar o contágio do novo Coronavírus. Fábio Cunha presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes do Amazonas (Abrasel-AM), afirma que estabelecimentos noturnos têm tentado implantar o delivery, como uma forma de compensar as perdas. “Por serem noturnos, alguns bares chegam a ter uma perda total no faturamento. Para tentar compensar, alguns estão fazendo entregas”, comentou. PREJUÍZOS William Lauschner, proprietário do bar “Porão do Alemão”, foi um dos primeiros empresários locais a declarar em uma rede social, dificuldades para manter o local em funcio-

namento interno. “Nunca brinquei de ser empresário e sempre cumpri com meus compromissos como tal. Sem perspectiva até junho, com o Decreto Nº 4.790, não vejo outra opção a não ser demitir todos os meus funcionários. Mas para pagar, tive que fazer empréstimo no banco, por que todos a que recorremos como representantes do entretenimento, falaram que não poderiam ajudar. E agora? Quem vai pagar essa conta?”, diz a postagem. A pesquisa da Abrape, ainda apontou que 92% das empresas associadas já relataram prejuízos que chegam a casa dos R$ 290 milhões. O prejuízo frustra as expectativas desse nicho para este ano, onde era estimando um aumento de quase 7% das receitas em shows e eventos em comparação com 2019.


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Espetáculo em suspense Festival Folclórico de Parintins segue indefinido na agenda cultural do Amazonas Mencius Melo. Da Cenarium.

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m dos maiores eventos culturais do País, o Festival Folclórico de Parintins, segue na berlinda. Secretaria de Cultura, Governo do Estado, Prefeitura de Parintins e Amazonastur se mantêm cautelosos sobre a realização da festa, mas os presidentes dos bois Garantido e Caprichoso afirmaram à Revista Cenarium que o evento acontecerá depois de agosto, com orçamento reduzido, e já vislumbram data.

Vamos ter festival. No momento, estamos prudentes em relação à saúde de todos, mas, já vislumbramos uma data”. - Fabio Cardoso, presidente do Garantido.

“Vai ter festival sim!”, declarou enfático o presidente azul, Jender Lobato. “Claro que o momento agora é de cuidar das pessoas, mas, o festival é a vida de Parintins e dos municípios ao redor, é por acreditar nisso, que estamos mantendo a chama acesa dos nossos torcedores, mantendo iniciativas como as lives”, exemplificou. Questionado sobre uma possível data, Jender arriscou: “Acredito que depois de agosto, será possível”, previu. VERMELHO ACREDITA Pelo lado rubro, a fé também é a mesma. “Vamos ter festi-

val”, declarou Fabio Cardoso – presidente do Garantido. “No momento, estamos prudentes em relação à saúde de todos, mas, já vislumbramos uma data”, adiantou sem dizer qual. “A questão é que independente da data, temos que ter o tempo de construção do espetáculo, que na minha opinião é de no mínimo dois meses”, avaliou. Fábio Cardoso ainda chamou atenção para outro detalhe: “O orçamento será menor e aí teremos aquela conjuntura de 2016 (ano em que o ex-governador José Melo, retirou o Estado do evento, causando um enorme prejuízo aos bois)”, relembrou. O dirigente do Garantido não descartou nenhuma possibilidade, inclusive de diminuição das noites ou do número de alegorias – grandes estruturas que pesam nos custos de arena. “Vamos discutir todas as possibilidades”, declarou. PATROCINADORES APOSTAM A Gerente de Relacionamentos da Maná Produções, empresa responsável pela captação de patrocinadores para o


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Festival de Parintins, Márcia Nogueira, acredita na realização do evento. “Não se trata de querer ou não realizar, se trata da necessidade que Parintins tem em relação ao evento”, comenta. Ainda segundo a gerente da empresa que está baseada em São Paulo, o otimismo pauta as marcas que patrocinam a festa. “Todos os patrocinadores do festival estão desenvolvendo suas campanhas publicitárias, acreditando na realização do festival, ainda esse ano”, informou. INGRESSOS VENDIDOS Empresa responsável pela venda dos ingressos do festival, a Amazon Best, divulgou nota no dia 26 de maio, comunicando o adiamento do evento. O Diretor- presidente da empresa, Valdo Garcia, disse à REVISTA CENARIUM que a Amazon Best não tem poder de remarcar o festival, mas tem que dar satisfação aos clientes. “Como operadora comercial do evento, temos que dar uma satisfação ao trade, e foi isso que fizemos”, declarou. Valdo disse que dos 16 mil ingressos vendidos, somente 2% foram devolvidos. Ele afirmou que até o final do

mês de junho, a nova data será anunciada. De acordo com a empresa, os ingressos vendidos já estarão válidos para a nova data do evento. Se o comprador não puder participar, terá as opções de solicitar o crédito do valor do ingresso, para utilização em outros eventos da Amazon Best ou de pedir o reembolso integral, conforme condições estabelecidas pela MP 948/2020, a chamada MP do reembolso. PALAVRA OFICIAL O secretário Apolo Muniz, da Secretaria de Estado da Cultura e Economia Criativa (Sec), disse à REVISTA CENARIUM que está em diálogo com os Bumbás. “Estamos em constante diálogo com os presidentes dos dois bois, porque entendemos a importância do festival para Parintins e o Amazonas mas, no momento, o foco do Estado é a luta contra a pandemia”, comentou. Na mesma linha, o prefeito de Parintins, Frank Bi Garcia (DEM), foi lacônico. “Não estamos pensando em festival no momento, só vamos pensar nisso, quando essa pandemia passar”, afirmou.

Vai ter festival sim! Claro que o momento é de cuidar das pessoas, mas, o festival é a vida de Parintins”. - Jender Lobato, presidente do Caprichoso.


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Hotéis do AM poderão continuar fechados após a pandemia, dizem sindicatos

Setor de hotelaria do Amazonas está paralisado por conta da pandemia, afirma Sindhotéis. Foto: Euzivaldo Queiroz

Nícolas Marreco. Cenarium.

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ANAUS – Na reinvenção da economia ante ao isolamento social, empresas e negócios fazem como podem. O setor do turismo, no entanto, enfrenta a pior recessão do século com a pandemia do novo Coronavírus. Os 127 hotéis, principalmente, instalados no Amazonas estão totalmente inertes, segundo o Sindicato de Hotéis, Bares e Similares (Sindhotéis).

Para o presidente do sindicato, Paulo Tadros, nenhuma medida concreta para tentar “ressuscitar o turismo” foi tomada, sendo uma total catástrofe. Nesse cenário, não há qualquer reação para os donos de estabelecimentos no setor que chega a arrecadar anualmente cerca de R$ 540 milhões, conforme o governo do Estado do Amazonas. “Ninguém está enfrentando nada. Pé, mão, boca, tudo está amarrado. O que aconteceu foi

que todo mundo fechou, não tem reação. Quem dá a vida à hotelaria são os hóspedes, e quem traz os hóspedes são as companhias aéreas. O hóspede viaja para trabalhar ou lazer e turismo, o que não está acontecendo. É uma catástrofe; corre o risco de não ter hotéis quando a economia voltar”, frisou. Num possível cenário de retomada da categoria, Tadros afirmou que esse tipo de atividade é diferente e que “não volta em 2, 4, 8,


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porte do poder público que atenda às demandas dos empresários. Com a redução do faturamento, fechar as contas no fim do mês sem débitos é o desafio que muitos enfrentam com dificuldade. Uma solução que atenderia à classe é a isenção de impostos durante o decreto de Estado de calamidade pela pandemia. “Os hotéis têm custos fixos monstruosos e as providências municipais e estaduais não estão vindo. Como o cara vai pagar o tributo postergado se ele não está faturando? E quem aguenta pagar IPTU, Alvará sem atividade por um ano?”, questionou. A referência é sobre os tributos e taxas com datas de pagamento adiadas, anunciadas pelo Executivo. Nesse sentido, o executivo afirma que uma “bola de neve” pode ocorrer com os donos de hotéis emprestando para quitarem os impostos. “Como vai pagar o empréstimo quando vencer? Porque aí vai dar a propriedade como garantia e vai perde-la, não vai ter como quitar. O empresário da hotelaria tem que ter várias outras empresas e um capital de espera muito grande para aguentar todo esse negócio. O turismo depende especificamente de tudo o que não temos mais”, criticou, citando mão de obra e eventos em geral, por exemplo. 10 meses”. O fator variável vai ser, em grande parte, definido pelas malhas aéreas pelas demandas das pessoas em viajar. “Os caras [turistas] vão ficar com a ideia muito fixa na cabeça de pegar a doença; principalmente para nós, que estamos na mídia como um dos lugares que mais tem problemas”, enfatizou. MEDIDAS VAZIAS Tadros também reafirmou a negatividade do cenário com a falta de su-

BARES E RESTAURANTES Ainda segundo Tadros, aproximadamente 2.800 restaurantes estavam funcionando no Amazonas até os decretos de isolamento. A dinâmica do próprio negócio em si, entretanto, permite uma agilidade que abre janelas de oportunidade em crises. O delivery, por exemplo, é citado pelo presidente sindical da classe como um caminho ao qual muitos aderiram para driblar a recessão.

“Eles ainda têm esse pouquinho de formas de lidar com a crise. A estrutura não é pesada; ele fecha a torneira do gás, apaga a luz e não é cobrado. Acorda com os funcionários de reduzir a jornada e depois retoma normalmente. Estão com a capacidade baixa, mas tem uma facilidade de retorno mais ágil”, finalizou. AGÊNCIAS DE TURISMO O Sindicato das Empresas de Turismo do Amazonas (Sindetur), também vinculado à Federação do Comércio no Amazonas (Fecomércio) assim como o Sindhotéis, também avalia a liberação de R$ 5 bilhões para créditos às empresas como inócua. O anúncio foi resposta do Ministério do Turismo frente à crise no setor, juntamente com a Medida Provisória que altera a natureza jurídica da Empresa Brasileira de Turismo (Embratur). A ideia é transformá-la em serviço social autônomo, sob regime jurídico de direito privado, sem fins lucrativos, de interesse coletivo e de utilidade pública. Assim, irá desvincular-se do orçamento da União e terá como receita financeira as contribuições sociais apuradas pela Previdência Social para o Sistema S. O montante será de 15,75% do adicional de Contribuição de Intervenção do Domínio Econômico (Cide), além de poder receber outras fontes de receita. Enquanto o texto-base foi aprovado no final de abril, na Câmara dos Deputados, o presidente do Sindetur, Mario Tadros, indicou que para o turismo receptivo e hotelaria funcionarem é preciso a suspensão de todo tipo de imposto ou taxa. “Os custos de um hotel parado têm praticamente nenhuma diferença com ele funcionando, e isso num faturamento zero? Não faz sentido algum, concluiu.


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Turismo brasileiro já perdeu R$ 62 bilhões desde início da pandemia, diz CNC Agência Estado.

O

setor de turismo brasileiro já perdeu R$ 62,56 bilhões desde o início da pandemia do novo coronavírus, calculou a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). O levantamento considera um período de quase dois meses: desde 15 de março, poucos dias após a Organização Mundial de Saúde (OMS) decretar oficialmente estado de pandemia, até o último dia 10 de maio. Os serviços turísticos foram um dos segmentos da economia mais impactados pela Covid-19, em decorrência das medidas para impedir a disseminação do vírus, como o isolamento social e o fechamento das fronteiras em diferentes países, fazendo despencar o fluxo de passageiros de transporte aéreo em todo o mundo, assim como também no Brasil. O estudo considera no cálculo a forte correlação entre o fluxo de passageiros em voos e a geração de receitas no turismo. Informações coletadas pela CNC sobre os 16 maiores aeroportos do Brasil, que detêm mais de

80% do fluxo de passageiros, mostram que as taxas de cancelamento de voos nacionais e internacionais saltaram de uma média diária 4% nos primeiros dias de março para 93% até o final de março. Como resultado, as atividades turísticas perderam R$ 13,4 bilhões apenas na segunda quinzena de março, quando houve o agravamento da pandemia no Brasil. Segundo a CNC, a paralisia quase completa do setor nas semanas seguintes ainda agravou o prejuízo, que totalizou R$ 36,94 bilhões no mês de abril e levou a mais uma perda R$ 12,24 bilhões nos dez primeiros dias de maio. O ESTUDO O economista Fabio Bentes, responsável pelo estudo da CNC, acredita não ser possível ainda precisar quando o segmento iniciará uma recuperação. “Ainda é muito cedo. Acho pouco provável que o setor de turismo consiga iniciar essa recuperação ainda neste ano. Trata-se da prestação de serviços considerados não essenciais, que testarão os protocolos de combate à Covid-19 nos próximos meses”, avaliou Bentes.


VIAGEM & TURISMO / 67

MP DO REEMBOLSO

Praias de Salvador lindas e desertas por causa da pandemia do Coronavírus. Foto: PMS/Fotos Públicas

O presidente Jair Bolsonaro editou a Medida Provisória nº 948 no dia 8 de maio, definindo que, na hipótese de cancelamento de serviços, as plataformas digitais de venda de ingressos, o prestador do serviço ou a empresa responsável não serão obrigados a reembolsar, em reais, os valores pagos pelo consumidor, desde que assegurem algum acordo a ser formalizado com o consumidor.


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Em 60% da rotas de viagens aéreas há pelo menos três concorrentes. Foto: Rafael Neddermeyer/Fotos Públicas

Preço da passagem aérea vai cair após quarentena, diz associação internacional Folhapress / Ana Estela de Sousa Pinto.

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ÉLGICA – Os preços das passagens aéreas devem cair cerca de 40% quando acabarem as quarentenas, segundo Brian Pearce, economista-chefe da Associação Internacional das Companhias Aéreas (Iata). A redução já está acontecendo no mercado doméstico da China, diz ele, e reflete uma tentativa das empresas de estimular a demanda. No país asiático, o número de reservas, que caiu 88% durante o

lockdown, agora está em cerca de 45% do que era antes das quarentenas. Já as tarifas estão 40% abaixo da média. A queda do preço vai acontecer principalmente nas rotas em que há competição entre empresas (80% dos trajetos, sendo que em 60% deles há pelo menos três concorrentes, segundo a associação). O preço do combustível de aviação, hoje cerca de um terço do que era antes da pandemia, vai ajudar nessa estratégia, mas as companhias devem ver sua situação financeira

agravada, porque os custos de operação vão subir, segundo Pearce. Além de mais gastos com medidas de proteção e desinfecção, a maior pressão sobre os custos viria do chamado “cancelamento de assentos”: a obrigatoriedade de deixar uma poltrona vazia entre os passageiros. Segundo o economista-chefe, para empatar receitas e custos é preciso voar com pelo menos 75% dos assentos ocupados, e a exigência de cancelar acentos permitiria no máximo uma taxa de 67%.


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A queda do preço das passagens aéreas deve acontecer principalmente nas rotas em que há competição entre empresas. Foto: Tânia Rego/Agência Brasil/ Fotos Públicas

De acordo com dados de 122 companhias de vários países em 2019, só 4 chegavam ao ponto de equilíbrio com menos de 60% da ocupação. Pearce afirmou que o preço das tarifas teria que subir entre 43% e 54% apenas para compensar os custos, se as empresas precisarem reduzir o número de passageiros por avião. Como a tendência será de queda das tarifas, o prejuízo ficará ainda maior. Além de prejudicial para as finanças das empresas, o cancelamento de assentos não é a melhor forma de evitar contágio, afirmou David Powel, conselheiro médico da Iata. O consultor citou acompanhamento de 1.100 pessoas feito depois que passageiros mostraram sintomas após viagens em quatro diferentes voos. Segundo Powell, nenhum dos outros ocupantes dos quatro aviões havia sido contaminado pelo novo Coronavírus. A Iata defende que, em vez de cancelar assentos, outras medidas sejam adotadas pelo setor para evitar contágios. Segundo Powel, medidas como o uso obrigatório de máscaras, o faseamento de refeições (para que

passageiros vizinhos não retirem a máscara ao mesmo tempo), a redução da circulação e do contato nas cabines (por exemplo, proibindo filas para usar o banheiro), a facilitação para a higiene das mãos e a desinfecção cuidadosa do avião são mais recomendadas que cancelar acentos. A proposta que a Iata pretende discutir com autoridades nacionais e internacionais de saúde também inclui o controle de temperatura antes do embarque, a redução do contato no check-in e despacho de bagagens e a proteção reforçada para as tripulações. Powell afirmou também que o fluxo de ar dentro do avião é dez vezes maior que em outros locais públicos, como cinemas e teatros, e que nos aviões modernos o ar passa por filtros potentes. “O risco de transmissão não é pelo ar da cabine, mas por gotas de saliva de alguém infectado”, disse o consultor. No entanto, segundo ele, o fato de as pessoas estarem sentadas lado a lado, e não cara a cara, a barreira física dos encostos dos assentos e as outras medidas de prevenção sugeridas já reduzem significativamente o risco de contaminação.

O risco de transmissão não é pelo ar da cabine, mas por gotas de saliva de alguém infectado”. - David Powel, conselheiro médico da Iata.


70 / VIAGEM & TURISMO

Covid-19 no AM: cultura do ‘quanto pior, melhor’ é para oportunistas Paula Littaif

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ANAUS – Uma entrevista concedida pela diretora-presidente da Fundação Vigilância em Saúde (FVS-AM), Rosemary Pinto, no final de abril, sobre o aumento do número de mortes no Amazonas por Covid-19, infecção causada pelo novo Coronavírus, fez surgir uma avalanche de oportunistas em busca holofotes para se autopromover em ano eleitoral ou enriquecer em meio ao caos. Eles não querem soluções, espalham o terror. São políticos com ou sem mandato, aprendizes de políticos, empresários em busca de contratos milionários no governo do Estado e/ou na Prefeitura de Manaus e os pré-candidatos que, na falta da campanha pré-eleitoral normal, usam como massa de manobra famílias fragilizadas que perderam entes queridos. Manaus passou por seguidas semanas com dezenas de sepultamentos ao dia e com muitas mortes em casa porque as pessoas não conseguiram chegar aos hospitais, que operavam acima da capacidade máxima. Mas de quem é a culpa? Da população que não fiscalizou ações do Poder Público e dos parla-

mentares nas últimas décadas? Dos ex-governadores que se revezaram no poder e não se preocuparam em fortalecer o sistema de Saúde? Ou de quem não entendeu que a pandemia é maior que qualquer melhor gestão pública do mundo? Possivelmente, as três opções. NA ITÁLIA E NOS EUA Os representantes do governo do Amazonas e da Prefeitura de Manaus queriam buscar apoio financeiro internacional do G-20, grupo de 20 países mais ricos e influentes do mundo, entre eles a Itália e os Estados Unidos que enfrentaram colapso nos hospitais. De acordo com a BBC Brasil, os 5,2 mil leitos de terapia intensiva existentes na Itália foram rapidamente superados, muitos deles já estavam ocupados por pacientes com problemas respiratórios (que aumentam nos meses de inverno). Em Nova York, nos Estados Unidos, o estado se tornou o epicentro da pandemia no país. O governo chegou a estudar confiscar hospitais particulares para ter acesso a mais estrutura de atendimento.

Foto: Divulgação

SÃO PAULO, A MAIS RICA Com o maior Produto Interno Bruto (PIB) municipal do Brasil e sendo a décima capital mais rica do mundo, São Paulo, vive a pandemia com seus hospitais à beira de um colapso, situação noticiada diariamente nos jornais em cadeia nacional. Pacientes relatam a dificuldade de conseguir atendimento. No estado de São Paulo, a taxa média de ocupação dos leitos de UTI é de 60%. Na região metropolitana, o índice sobe para 80%. Na capital está em 73%. Mas em quatro hospitais públicos, a capacidade máxima nas UTIs chegou ao limite máximo. Somente os neófitos acreditam em “Salvadores da Pátria”. O que se precisa é de equilíbrio em meio à tragédia para gerenciar os próprios recursos e buscar ajuda de quem realmente é altruísta e não usa a desgraça alheia para se locupletar. Paula Litaiff é jornalista com especialização em Gestão de Políticas Sociais.

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