![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/494e1639a9d7bf9c3fb852b2aff30cf8.jpeg)
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/494e1639a9d7bf9c3fb852b2aff30cf8.jpeg)
COP PARA QUEM?
Lideranças da Amazônia, dentre elas Alessandra Munduruku, cobram poder de decisão na COP30, em Belém (PA), e alertam para medidas do governador Helder Barbalho, temendo que soluções para a crise climática dependam de interesses políticos e econômicos
www.revistacenarium.com.br | Janeiro de 2025
Expediente
Diretora-Geral
Paula Litaiff – MTb 793/AM paulalitaiff@revistacenarium.com.br www.paulalitaiff.com
Coordenadora de Redação
Adrisa de Góes
Gestor de Marketing
Orson Oliveira
Gestores de Conteúdo – On-line
Adrisa de Góes (1º turno)
John Britto (2º turno)
Gestora de Produção Multimídia
Bianca Diniz
Gestora de Conteúdo Digital/Impresso
Márcia Guimarães
Projeto Gráfico e Diagramação | Revista Digital/ Impresso
Hugo Moura
Fotos da capa
Helder Barbalho - Fabio Rodrigues Pozzebom | Agência
Brasil
Alessandra Munduruku - Fabyo Cruz | Cenarium
Núcleo de Reportagem – On-line/Digital/TV/Impresso
Adrisa de Góes
Ana Cláudia Leocádio
Ana Pastana
Fabyo Cruz
Ian Vitor Freitas
Jadson Lima
Marcela Leiros
Thaís Matos
Cinegrafista/Editor de Fotografia/Editor de Imagem Luiz André
Arthur Hayden
Designers Gráficos
Weslley Santos (1º turno)
Luís Paulo Dutra (2º turno)
Social Media
Gustô Alves (1º turno)
Maria Eduarda Furtado (2° turno)
Revisores Textuais
Gustavo Gilona
Jesua Maia (Versão impressa/digital)
Conselho Editorial
Inory Kanamari – Povos Indígenas
Iraildes Caldas – Questões de Gênero
Lucas Ferrante – Ciências Biológicas
Luciana Santos – Povos Quilombolas
Consultor Jurídico
Denise Coêlho – OAB/AM 10.520
Tiago Lazarini – OAB/AM 9.946
Telefone da Redação (92) 3307-4394
Tiragem
5 mil exemplares
Circulação
Manaus (AM), Belém (PA), Roraima (RR), Rondônia (RO), Brasília (DF) e São Paulo (SP)
REVISTA CENARIUM O MELHOR CONTEÚDO EM MULTIPLATAFORMA
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/c30f0b447f7f7051b0c37b43f7bbd60d.jpeg)
Revista Cenarium On-line | Revista Cenarium Digital/Impressa Agência Cenarium | Canal Cenarium
ASSINE
A REVISTA CENARIUM, de responsabilidade da AGÊNCIA CENARIUM, está disponível na versão digital, disponibilizada gratuitamente em www.revistacenarium.com.br, e na versão impressa, remetida fisicamente por meio de uma assinatura mensal no valor de R$ 24,99, com frete grátis disponível apenas para Manaus (AM).
ACESSE A REVISTA CENARIUM NAS REDES SOCIAIS
nosso conteúdo on-line!
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/d756522e341b44c7fd02971dea16f98e.jpeg)
Editorial
Narrativas em crise
O Pará vive uma contradição de narrativas que evidencia a exclusão da participação dos povos tradicionais em um dos maiores eventos ambientais que o Estado irá sediar em novembro deste ano, a Conferência das Partes, COP30, realizada por países signatários da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, gerando uma verdadeira crise de imagem e de identidade do Brasil para o mundo.
A COP é o momento em que os países discutem medidas para reduzir a emissão de gases de efeito estufa e buscam soluções para dilemas ambientais. As decisões da conferência deveriam envolver a participação, em tese, de quem está na linha de frente da proteção dos ecossistemas. O Governo do Pará, por meio de Helder Barbalho, vendeu ao mundo a ideia de que sua política seria exemplo nessa área. A realidade é outra.
Nas últimas semanas, a ocupação da sede da Secretaria de Educação (Seduc-PA), em Belém (PA), por lideranças de 22 etnias para protestar contra a Lei Estadual 10.820/2024, que compromete o ensino de indígenas e quilombolas, é uma demonstração de que o Governo do Pará não consegue respeitar seus povos tradicionais em questões primárias. O impasse é, atualmente, objeto de análise no Supremo Tribunal Federal (STF), provocado pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib).
Seis meses antes do início da crise na educação do Pará, lideranças indígenas, extrativistas e quilombolas passaram a denunciar a exclusão das populações que vivem nas florestas nos pré-debates da conferência internacional do clima e o privilégio da participação de grandes empresas, até mineradoras, e de políticos partidários na definição das diretrizes do evento. Essa constatação remete-nos a um questionamento: "a COP30 vai atender a quais interesses?”
É preciso estar atento a quem vai definir as diretrizes e resoluções do maior evento ambiental do mundo e quem vai lucrar, de fato, com ele, garantindo aos povos tradicionais o espaço devido nas negociações e poder de participação nas decisões. Com este alerta, o especial da CENARIUM desta edição chama o leitor a refletir sobre os interesses ocultos de quem quer negociar o futuro do clima, pois, como disse Ailton Krenak (2022), “o amanhã não está à venda”, ou pelo menos não deveria estar.
O que queremos da COP da Amazônia
A 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30) é crucial para o Brasil, para a Amazônia e para o planeta. Marcada para novembro deste ano, em Belém (PA), a COP30, chamada de “COP das Florestas”, carrega o simbolismo de ser realizada em meio à Floresta Amazônica, que impacta o clima global, e representa enormes responsabilidades e desafios. Do encontro de líderes mundiais depende o futuro da humanidade no planeta. Não há tempo para errar. Mas o que querem da COP30 os povos tradicionais, que estão na linha de frente da preservação da Amazônia? É o que buscamos abordar na reportagem de capa.
Diante do questionamento da CENARIUM, lideranças indígenas, quilombolas, ribeirinhas e extrativistas de Estados da Amazônia Legal trazem respostas que podem ser resumidas em uma palavra: respeito. Para esses líderes, as decisões tomadas na COP30 precisam ter como base os conhecimentos de quem vive na Amazônia e luta para preservá-la.
Segundo dados do MapBiomas, as Terras Indígenas (TIs) são oásis de preservação, tendo perdido apenas 1% de sua vegetação nativa entre 1985 e 2023. Nas áreas privadas, a devastação no mesmo período foi de 28%. O MapBiomas também identificou que os desmatamentos em Comunidades Remanescentes de Quilombos (CRQs) representaram somente 0,05% da área total desmatada em 2022, outro exemplo de preservação.
Sobre o impacto da Amazônia no clima do planeta, um estudo publicado na revista científica Nature, em dezembro de 2024, revela que a “respiração” da floresta tropical influencia a geração de partículas atmosféricas que viajam grandes distâncias, contribuem para a formação de nuvens e impactam a quantidade de chuva em diferentes regiões. Além disso, essas partículas influenciam o calor que a Terra recebe e reflete de volta para o espaço, impactando o clima global.
Ora, se a Amazônia é crucial para o clima do planeta e quem mais a preserva são os povos tradicionais que a habitam e detêm conhecimentos milenares sobre a floresta, nada mais justo do que respeitar esses povos, assegurando-lhes que suas vozes sejam ouvidas e que tenham poder de decisão na COP30.
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b4f0dc37ca79222d82c629cc8b5ff6a2.jpeg)
Paula Litaiff Diretora-Geral
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/55244ed981dc2b747078976c4364e254.jpeg)
Márcia Guimarães Gestora de Conteúdo
Leitor&Leitora
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/41c46e9130137bd8b45de0e681be10e6.jpeg)
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/d834f1dd002585260f95f8f6f0117f46.jpeg)
�� Conexão com a Amazônia
Mesmo vivendo longe da Amazônia, sendo manauara e residindo em São Paulo, mantenho viva minha conexão com minha terra natal. A REVISTA CENARIUM é uma ótima opção para acompanhar as notícias, seja pelas redes sociais ou pelas edições mensais. Um conteúdo autoral e aprofundado, que valorizo por me aproximar da realidade amazônica.
Sasha Barbosa São Paulo - SP
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/11236230ea871c7ed89e23f4855be40e.jpeg)
�� Responsabilidade de todos
É muito importante abordar o assunto da ecoansiedade (capa de dezembro de 2024). Estamos preparados para o que virá? Não! O meio ambiente (onde nós, humanos, vivemos), também afeta a nossa saúde mental. Não importa se você mora em uma metrópole ou é ribeirinho. Sua vida vai mudar de uma forma ou de outra, porque somos parte de um todo e todos temos responsabilidade nas mudanças climáticas. Quanto mais consumimos, mais destruímos.
Naradja Varela Manaus – AM
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/ce69e59c417f768bc3ea9eb4843d6e4f.jpeg)
�� Urgência de agir
A ecoansiedade (capa de dezembro de 2024) é um reflexo do amor pelo planeta e da urgência de agir. Que ela nos inspire a buscar soluções e a cuidar do nosso futuro com mais responsabilidade e esperança. Parabéns CENARIUM, por trazer esse tema. Rebeca Andrade Manaus - AM
�� Fonte confiável
A REVISTA CENARIUM tem sido para mim uma fonte confiável de acesso a informações sobre a realidade da nossa região amazônica. Gostei muito da reportagem de capa da edição de outubro sobre os riscos que os grandes empreendimentos trazem para indígenas isolados. É sempre uma questão delicada o dilema entre as populações tradicionais e as promessas de desenvolvimento econômico.
Jorge Luís Figueira Manaus – AM
Crédito: Acervo Pessoal
Sumário
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/53308a5d6607ad0737ae65bc3b000ef1.jpeg)
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/c084e53a991592f50d5cd1bd3be13d15.jpeg)
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/71db72b2463b811325b41b3f2bf7387d.jpeg)
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/49857db15b8618646ebec9fb97282510.jpeg)
Crédito: Composição De Paulo
Dutra Cenarium
“Somos
os principais freios das mudanças climáticas”
Ronaldo Amanayé, líder indígena do Pará.
“A Amazônia é nossa. Quem deve decidir somos nós!”
Alessandra Munduruku, liderança indígena.
“Precisamos ocupar ruas e mesas de negociação”
Ângela Mendes, ativista socioambiental e filha de Chico Mendes.
“Quem financia a COP também destrói”
Antonia Cariongo, liderança do quilombo Cariongo, no Maranhão.
“A COP Paralela será fundamental, se continuarmos silenciados”
Vanuza Cardoso, liderança quilombola.
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b9b31336a5a87435e473cc16ac2fbf52.jpeg)
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/f9d2fba47cfe282a79cfe05177c49cba.jpeg)
“Queremos uma COP feita por nós”
Povos da floresta buscam protagonismo na COP30, em novembro em Belém;
No coração da Amazônia, indígenas, ribeirinhos e quilombolas temem decisões
tomadas apenas por grandes empresas e países ricos
Fabyo Cruz – Da Cenarium
BELÉM (PA) - “O agronegócio, as mineradoras e as indústrias de combustíveis fósseis dominam os debates nas COPs. Minha preocupação é que essa lógica se repita em Belém, deixando os povos da floresta, mais uma vez, à margem das decisões que impactam diretamente seus territórios”. O alerta é de Ângela Mendes, ativista socioambiental do Estado do Acre e filha de Chico Mendes, sobre a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30), marcada para novembro deste ano, em Belém, capital do Pará. Embora políticos brasileiros tenham apelidado o evento de “COP das Florestas” ou “COP das COPs”, em referência ao simbolismo da realização do evento na Amazônia, lideranças indígenas, quilombolas e ribeirinhas manifestam preocupação: se as decisões continuarem apenas com os donos dos grandes interesses econômicos,
a COP30 será vazia, ficará só no discurso, avaliam. “Queremos voz e poder real de decisão”, afirma Alessandra Munduruku, liderança indígena do Pará.
A COP, ou Conferência das Partes, é o principal fórum de decisão da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC), reunindo, anualmente, delegados de países signatários para debater e implementar ações voltadas à redução das emissões de gases de efeito estufa. Este ano, pela primeira vez, o Brasil sediará a conferência, trazendo atenção internacional para o país que abriga a maior parte da floresta amazônica, e criando um palco de grande importância para que os povos amazônicos se posicionem nas decisões político-ambientais e sociais. A COP não é só sobre a Amazônia, mas a região é um dos pontos focais de discussão. A maior floresta tropical do mundo tem
impacto direto na regulação do clima do planeta e os povos que tradicionalmente a habitam estão entre os principais agentes de sua preservação.
“Não queremos ser coadjuvantes em um evento que impacta nossas vidas e nossos territórios”, afirma Alessandra Munduruku, liderança indígena que atua no Pará, refletindo posicionamento semelhante ao de outros líderes consultados pela REVISTA CENARIUM. Para eles, atuar nas decisões implica não apenas em ter suas reivindicações ouvidas, mas também em incorporar suas propostas às decisões globais sobre mudanças climáticas. Para os representantes dos povos tradicionais ouvidos pela reportagem, o objetivo principal é que a conferência em Belém resulte na construção de uma transição energética para a eliminação do uso dos combustíveis fósseis, que seja justa e inclusiva, respeitando os direitos
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b9b31336a5a87435e473cc16ac2fbf52.jpeg)
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/01f21ad05106845df24abe4816593d91.jpeg)
COP
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b9b31336a5a87435e473cc16ac2fbf52.jpeg)
“Queremos um planeta com futuro, com solidariedade”
Ângela Mendes, ativista socioambiental e filha de Chico Mendes, do Acre.
dos povos originários e comunidades tradicionais. O objetivo é reduzir a emissão de gases de efeito estufa, como o dióxido de carbono (CO2).
Em 2023, durante a COP28, realizada em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos — um dos principais produtores de petróleo do mundo — foram firmados acordos visando à diminuição do consumo de combustíveis fósseis. Contudo, o texto não mencionou a eliminação completa, ou mesmo uma redução progressiva desses combustíveis (petróleo, carvão e gás), conforme desejavam alguns países e uma parte significativa da sociedade civil que participou do evento.
DE BAKU A BELÉM
No ano passado, as discussões sobre a mitigação das mudanças climáticas na COP29, realizada em Baku, no Azerbaijão, não avançaram como o esperado. O acordo final não fez referências à transição energética, contrariando as expectativas geradas após a COP28 de 2023, que sinalizou a redução da exploração de combustíveis fósseis. A recusa de países cuja economia depende da exploração desses combustíveis foi decisiva para bloquear qualquer referência ao setor, resultando em um retrocesso nas negociações. Isso frustrou a esperança de um compromisso mais robusto para a redução das emissões de gases de efeito estufa.
Em relação ao financiamento climático, a conferência acordou que as nações ricas
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/3a298438a4bfe3c766d2415100598dfa.jpeg)
destinarão US$ 300 bilhões anuais para apoiar os países em desenvolvimento no combate e adaptação à crise climática. Esse valor, embora superior aos US$ 250 bilhões propostos inicialmente, ficou aquém das expectativas dos países em desenvolvimento, que exigiam, pelo menos, US$ 1,3 trilhão por ano. Ambientalistas argumentaram que o montante acordado mal cobre a inflação da meta de financiamento estabelecida em 2015, deixando em aberto questões importantes para a COP30, em Belém, cidade que também está sendo confrontada com suas próprias contradições ambientais, sociais e estruturais, para se tornar palco dos debates mundiais, com questões como descarte inadequado de lixo e falta de infraestrutura necessária para o evento. Para tentar estar pronta para novembro, a capital do Pará se tornou um canteiro de obras, com diversas grandes construções em andamento, como o Parque da Cidade, que será um dos palcos principais do evento e o Porto de Futuro II, espaço que abrigará atividades econô-
micas e culturais voltadas ao turismo, lazer, gastronomia, bioeconomia, dentre outros
O QUE PENSAM OS POVOS DA FLORESTA?
“Percebi claramente que quem decide não somos nós, povos da floresta. Quem toma as decisões são as grandes empresas, as multinacionais e os países com interesses econômicos específicos”, afirmou Alessandra Munduruku, ativista indígena no Pará e líder do povo Munduruku, que participou, pela segunda vez, de uma conferência climática internacional, a mais recente em Baku, no Azerbaijão. Alessandra criticou a falta de representatividade dos povos originários e relatou as severas restrições enfrentadas pelos participantes para organizar manifestações. “Qualquer protesto precisava ser comunicado com 24 horas de antecedência, detalhando o tema e o conteúdo das faixas. Sentíamos que não havia liberdade, nem democracia”.
Letícia Moraes, vice-presidente do Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS)
Crédito: Reprodução Instagram
No Azerbaijão, ela se deparou com um ambiente de controle rigoroso, onde os protestos eram permitidos apenas em locais previamente delimitados. “O país é muito limpo e organizado, mas essa limpeza é superficial. Não há frutas, rios ou pássaros. Tudo está contaminado, e a cultura local parece extinta”, observou. Alessandra teme que práticas autoritárias similares surjam no Brasil durante a COP30, destacando a urgência de preservar a soberania e os territórios amazônicos. “A Amazônia é nossa. Quem deve decidir somos nós!”, enfatizou.
Diante da possibilidade de exclusão de suas demandas, populações tradicionais estão se mobilizando para organizar eventos paralelos, como a “COP do Povo”, que tem Alessandra entre os organizadores. “Será um encontro para quem nunca é convidado para os debates oficiais, mas que sofre diretamente os impactos das decisões tomadas na COP. Vamos às bases, ouvir as pessoas antes de novembro”, explicou
ÂNGELA MENDES: ‘É HORA DE PROPOR MUDANÇAS ESTRUTURAIS’
Para Ângela Mendes, ativista socioambiental e filha de Chico Mendes, ícone da luta pela preservação da floresta, a COP30 representa mais do que um evento climático: é um palco estratégico para resistência e proposição de alternativas. “É um momento crucial para mostrar a realidade da Amazônia ao mundo e fortalecer os movimentos sociais”, afirmou.
Ela acredita que o sucesso da COP30 dependerá da capacidade de articular alianças globais e propor estratégias concretas para enfrentar as crises ambientais e sociais. “O mundo já conhece os problemas da Amazônia. Agora, precisamos focar em como construir saídas coletivas e sustentáveis. É hora de propor mudanças estruturais, fortalecer processos democráticos e garantir que os povos historicamente
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b9b31336a5a87435e473cc16ac2fbf52.jpeg)
excluídos tenham voz e poder de decisão”, conclui a ativista.
Para Ângela, a força dos movimentos sociais será essencial para transformar a COP30 em um espaço de protagonismo popular. Ela menciona que coalizões como a “COP do Povo” já estão se articulando para promover ações paralelas que ampliem a voz dos povos da floresta e das comunidades afetadas pela crise climática. “Queremos um planeta com futuro, com solidariedade. Precisamos ocupar as ruas e as mesas de negociação, exigindo justiça climática e social. Só com resistência e ação coletiva podemos enfrentar os desafios impostos pelos grandes interesses econômicos”, enfatiza a ativista.
Embora sediar a COP no coração da maior floresta tropical do mundo tenha um peso simbólico significativo, Ângela Mendes critica a contradição entre o discurso oficial e as práticas adotadas pelo Governo do Pará. “É um paradoxo o Estado sediar
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/74ca63a6105f383b9cb096e638847af8.jpeg)
Obra do Parque da Cidade, que será um dos principais locais da COP30, em Belém
Lideranças indígenas ocupam sede da Seduc-PA desde o dia 14 de janeiro, sem acordo com o governador Helder Barbalho sobre a revogação da Lei n.º 10.820/2024
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/6341282c9f9135c00b163c29234b410f.jpeg)
Crise na educação, exclusão e falta de diálogo
No Pará, o impasse em torno da revogação da Lei n.º 10.820/2024, que alterou o Sistema de Organização Modular de Ensino (Some), criado na década de 1980 para levar educação a comunidades remotas, como ribeirinhas, quilombolas e indígenas, evidencia o tratamento excludente dispensado pelo governador do Estado, Helder Barbalho, a indígenas e outros povos tradicionais e deixa clara a falta de diálogo, apontam manifestantes contrários às alterações. A nova lei gerou revolta por suprimir do sistema a garantia de aulas presenciais e com qualidade, dentre outras medidas. Em protesto, indígenas ocupam, desde o dia 14 de janeiro, uma área da sede da Secretaria de Estado de Educação (Seduc-PA), localizada no distrito de Icoaraci, em
Belém, unindo-se ao descontentamento de professores, que vêm se manifestando desde novembro de 2024 e entraram em greve no dia 23 de janeiro deste ano.
Após pressão dos manifestantes e da opinião pública, no dia 27 de janeiro, a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, chegou à Seduc para conversar com os manifestantes e, no dia 28 de janeiro, Barbalho aceitou se reunir com representantes do movimento indígena em um encontro na sede do governo, que terminou sem acordo devido à negativa do governador em revogar a lei. Os manifestantes também exigem a exoneração do atual titular da pasta da Educação no Estado, Rossieli Soares. O Estado tem tentado a desocupação do prédio da Seduc por
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b9b31336a5a87435e473cc16ac2fbf52.jpeg)
meios judiciais, alegando que o protesto prejudica o funcionamento da secretaria. Sem acordo, parte da comitiva indígena saiu da reunião prometendo que a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP30), marcada para novembro deste ano na capital paraense, pode não acontecer. Além disso, passaram a cobrar a presença do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva. A reunião foi realizada a portas fechadas. A comitiva de 40 indígenas, recebida pela Força Tática da Polícia Militar do Estado, reuniu-se com Barbalho e outras autoridades, como a ministra Sonia Guajajara. Enquanto a reunião acontecia dentro do Palácio do Governo, o indígena Cristian Arapiun, comunicador do Conselho
Crédito: Composição De Weslley Santos Cenarium
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/2cca07137da533caabf6e7a6ec637a31.jpeg)
Indígena Tapajós e Arapiuns (Cita), que esteve presente em alguns momentos da reunião, repassou informações para outros indígenas que aguardavam do lado de fora do local.
“Começou perguntando ‘por que você não quer revogar a lei?’. Ele [Helder Barbalho] não passou nem perto de responder. A gente apresentou o que estava acontecendo com a gente na Seduc, todos aqueles casos de polícia, e ele falou que ‘não viu nenhum vídeo que mostrasse alguma ação policial dentro da Seduc’. As falas dele demonstram que ele nem quer falar sobre a revogação da lei. O negócio dele é educação indígena. Ele está com aquele discurso... Ele é um homem frio, calculista, mas também é gente, ele perdeu a postura dele por um momento. Deixamos bem claro para ele: se não tiver revogação [da lei], não vai ter COP. Vai ter aeroporto parado, não vai ter ferrovia funcionando, a gente vai parar o Brasil”, disse Cristian. Ainda segundo o jovem indígena, os celulares foram confiscados, e algumas pessoas chegaram a ser barradas de ingressar na sala de reunião.
INDÍGENAS E GOVERNO DO PARÁ DIVERGEM
Antes da reunião na sede do governo, Helder Barbalho afirmou, no dia 24 de janeiro, que se reuniu com a comissão de indígenas das etno-regiões para discutir e dialogar sobre questões da educação dos
povos originários do Estado. No mesmo dia, a liderança indígena do Médio Tapajós, Alessandra Munduruku, e o cacique Dadá Borari negaram a declaração do governador e afirmaram que ainda não haviam sido ouvidos. Segundo eles, o grupo que se reuniu com o político não integra as lideranças que estão à frente da ocupação.
“Foram quase quatro horas de reunião ouvindo os povos indígenas e atendendo a todas as reivindicações que foram demandadas, garantindo que o sistema modular seja com aulas presenciais, não tem dúvida disso. Garantindo o salário no teto para todos os profissionais que atuam na educação indígena. Garantindo a legislação indígena para a educação do Estado do Pará”, declarou Barbalho.
A CENARIUM solicitou informações do Governo do Pará sobre as reuniões dos dias 24 e 28 de janeiro. Até o fechamento desta edição, o governo respondeu somente à solicitação de informações sobre a reunião do dia 24, enviando por e-mail o link de um release de sua assessoria de comunicação intitulado “Governador e vice participam de reunião que formula Política Estadual de Educação Escolar Indígena”, publicado na Agência Pará, justamente o encontro que é contestado pelos manifestantes da ocupação da Seduc.
SOBRE A LEI
Sancionada no final do ano passado, a Lei n.º 10.820/2024 extingue o Sistema
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b9b31336a5a87435e473cc16ac2fbf52.jpeg)
Modular de Ensino Indígena (Somei), integrante do Sistema Modular de Ensino (Some). A CENARIUM foi o primeiro veículo de comunicação a noticiar, após receber uma denúncia anônima, em novembro do ano passado, que o Some vinha sendo gradualmente substituído por uma “central de mídia”, que transmite aulas via satélite.
Um dos pontos mais polêmicos da lei é a transferência da gestão do Some para a Seduc, submetendo-o a condições de trabalho definidas por portarias. Entre as alterações mais contestadas está a criação de níveis de complexidade que definem os valores das gratificações recebidas pelos professores.
“Antes, os educadores do Some recebiam um valor fixo de R$ 8 mil como gratificação, mas, agora, os valores variam conforme a classificação da localidade: nível 1 recebe R$ 1 mil; nível 2, R$ 3 mil; nível 3, R$ 5 mil; e nível 4, R$ 7 mil. É anunciado como se todos os professores fossem receber R$ 7 mil”, disse um educador entrevistado pela reportagem, que não quis se identificar.
A precarização também afeta diretamente a educação indígena. Em Santarém, no oeste do Pará, por exemplo, apenas dois dos 46 professores que atuam no Somei são concursados. Os demais, contratados de forma temporária, enfrentam ainda mais dificuldades com a redução das gratificações.
Crédito: Marx Vasconcelos Cenarium
A ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, e o governador do Pará, Helder Barbalho
COP DA AMAZÔNIA
MEIO AMBIENTE & SUSTENTABILIDADE
um evento de tal magnitude enquanto reforça políticas que agravam a violência contra as populações tradicionais e fragilizam setores fundamentais por meio de reformas administrativas prejudiciais”, argumenta.
A situação no Pará reflete problemas mais amplos enfrentados em toda a Amazônia. No Acre, Estado natal de Ângela, obras recentes na Reserva Extrativista Chico Mendes, como estradas e pontes, têm acelerado o desmatamento e facilitado a exploração predatória. “Essas intervenções são feitas sem transparência, com licenciamentos duvidosos, e acabam ampliando o escoamento de gado e madeira. É um modelo de gestão que destrói o que deveria ser preservado”, denuncia.
ANTONIA CARIONGO: ‘QUEM FINANCIA A COP TAMBÉM DESTRÓI’
Antonia Cariongo, liderança do quilombo Cariongo, no Maranhão, também reforçou as críticas. Desde a COP16, em 2019, ela acompanha os compromissos internacionais do Brasil, mas lamenta a falta de ações concretas. “A única iniciativa que chegou até nós foi o projeto ‘Floresta Mais’, ainda em fase inicial. Enquanto isso, enfrentamos fazendeiros que tentam destruir nosso território. Resistimos na
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b9b31336a5a87435e473cc16ac2fbf52.jpeg)
“Chega de irmos às COPs apenas para protestar. Precisamos levar propostas claras e articuladas para soluções climáticas”
Neidinha Suruí, liderança cofundadora da Fundação Kanindé, em Rondônia.
linha de frente, impedindo máquinas de derrubar a mata”, relatou.
Ela vê a ocupação de espaços políticos como essencial para a luta quilombola. “Sem representatividade no poder, não avançamos. A demarcação e titulação dos territórios é urgente para proteger florestas, nascentes e rios”, afirmou. No entanto, se mostra cética quanto à inclusão de suas pautas na COP30. “Quem financia a COP também destrói. Não sabemos se teremos espaço para nossas reivindicações. Por isso, iniciativas como a ‘COP do Povo’ são fundamentais”, destacou. Entre suas demandas estão políticas punitivas contra o agronegócio e maior controle sobre as licenças de desmatamento.
Antonia também mencionou os impactos da crise climática em sua comunidade. “No último Natal, rezei por chuva. O igarapé está seco, e as chuvas que antes vinham em dezembro só chegaram em janeiro. Nós, das comunidades tradicionais, sentimos isso na pele”.
Sem recursos para levar sua comunidade a Belém durante a COP30, Antonia tenta articular apoio. “Quero que meu povo
esteja lá, lutando ao lado de outros territórios”, afirmou. Determinada, concluiu: “Mesmo que lá dentro estejam os grandes, nós faremos barulho na ‘COP do Povo’, mostrando que resistimos. Somos os verdadeiros guardiões da natureza”.
LETÍCIA MORAES: ‘CONSIDERAMOS PROTESTOS ESTRATÉGICOS’
Letícia Moraes, vice-presidente do Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS) e natural de Curralinho, Pará, reforçou a importância de garantir a participação dos povos da floresta nas discussões climáticas. “Já participei de espaços como a COP, o que foi estratégico para entender como funcionam essas conferências. O evento que ocorrerá em Belém é a formalidade, mas as negociações acontecem muito antes, e, nesses processos preparatórios, não somos incluídos”, afirmou.
Em seu site, o CNS, criado com a liderança de Chico Mendes em 1985, informa que tem como missão “mobilizar, organizar e representar as comunidades e organizações extrativistas da Amazônia brasileira e
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/2cca21e6a070683bddf023201ebcdf7f.jpeg)
Neidinha Suruí, liderança cofundadora da Fundação Kanindé, em Rondônia
Crédito: Acervo Pessoal
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/23196d3c33d3ad14bc5b6a91683b79f3.jpeg)
do Brasil para articular, propor, reivindicar e acompanhar a execução de políticas públicas que garantam a sustentabilidade econômica, ambiental e cultural de nossas gerações presentes e futuras”.
À CENARIUM, Letícia citou a exclusão das comunidades tradicionais em decisões cruciais, como na Conferência de Bonn, em 2024, quando o conceito de povos e comunidades tradicionais foi debatido sem sua participação. “Essa exclusão preocupa, pois nossos territórios e modos de vida são fundamentais para o equilíbrio climático”.
Para a COP30, Letícia destacou ações que buscam engajar as comunidades. “Estamos promovendo encontros como as ‘COPs da Floresta’. Um deles será em Santarém, conduzido pelos jovens Guardiões do Bem Viver. Além disso, organizamos a Marcha dos Povos da Floresta, reunindo 1 mil lideranças extrativistas com porongas acesas e óleo de andiroba, simbolizando nossa defesa contra os combustíveis fósseis”, revelou.
Entre os desafios enfrentados, Letícia mencionou barreiras como a exigência de passaporte para acessar o espaço oficial e a necessidade de intérpretes. “Muitos extrativistas não têm condições de cumprir essas exigências, o que inviabiliza nossa participação”.
Apesar disso, a mobilização segue forte. “Estamos unindo forças com organizações como a Federação dos Povos Indígenas do Pará, a Fepipa, e a Malungu, que é a Coordenação das Associações das Comunidades Remanescentes de Quilombos do Pará. Se nossa presença for negada, consideramos protestos estratégicos, como até mesmo bloqueios no aeroporto de Belém”.
Letícia vê a COP30 como uma oportunidade histórica para destacar a importância dos territórios extrativistas e promover uma visão inclusiva da Amazônia. “Em 2025, o CNS completa 40 anos, e queremos reforçar o legado extrativista, mostrando que os povos da floresta são centrais para as decisões climáticas globais”.
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b9b31336a5a87435e473cc16ac2fbf52.jpeg)
“Queremos uma
COP
com a nossa cara, com as nossas vozes, feita por nós”
Vanuza Cardoso, liderança quilombola do Pará.
RONALDO
AMANAYÉ: ‘SOMOS OS PRINCIPAIS FREIOS DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS’
Ronaldo Amanayé, coordenador da Federação dos Povos Indígenas do Pará (Fepipa) e uma das principais lideranças do povo Amanayé, ressaltou que a questão da terra está no centro das demandas dos povos indígenas e deve ser colocada em pauta durante as discussões da COP30. Ele, que enfrenta constantes ameaças por
Obra Porto Futuro 2, em Belém, um dos investimentos da cidade com vistas à COP30
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/f215e42057bb87e1b1c651694445e01a.jpeg)
Crédito: Reprodução Instagram
“Quem toma as decisões são as grandes empresas, as multinacionais e os países com interesses econômicos específicos”
Alessandra Munduruku, ativista indígena no Pará e líder do povo Munduruku.
sua atuação em defesa da Reserva Indígena Amanayé, localizada em Goianésia do Pará, afirmou:
“A demarcação, homologação e proteção das terras indígenas são essenciais. Hoje, nossas terras são invadidas por garimpeiros, madeireiros e pescadores ilegais. Precisamos também de políticas públicas que cheguem às nossas comunidades, como saneamento, educação de qualidade e apoio ao empreendedorismo local. Sem isso, fica impossível garantir a sustentabilidade dos nossos territórios”.
Dona Lourdes: ‘precisamos defender de forma coletiva os nossos biomas’
A mineira Maria de Lourdes de Souza Nascimento, a Dona Lourdes, coordenadora-geral da Rede Cerrado, destacou a importância de a sociedade civil ocupar espaços estratégicos durante a COP30, em Belém, para cobrar dos países desenvolvidos maior responsabilidade sobre os impactos ambientais que afetam o Brasil. Ela criticou duramente a dinâmica de reuniões internacionais anteriores, onde percebeu um foco exclusivo em interesses financeiros, deixando de lado a preservação ambiental e a justiça climática.
“A gente não pode deixar que apenas o Brasil seja responsabilizado pelo ‘pulmão’ do mundo, enquanto os outros países continuam consumindo nossas riquezas e despejando suas mazelas aqui. Eles enviam agrotóxicos proibidos em seus territórios e, depois, se beneficiam dos alimentos que produzimos, sem considerar os danos causados ao nosso solo, água e povo”, afirmou.
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b9b31336a5a87435e473cc16ac2fbf52.jpeg)
Dona Lourdes relatou que a Rede Cerrado tem trabalhado desde a Eco-92 para proteger os biomas brasileiros, mas alerta para a necessidade de uma abordagem unificada que inclua todos os biomas e seus povos. “O Cerrado puxa a fila, mas precisamos defender de forma coletiva os nossos biomas e as populações que garantem sua preservação. Sem os povos tradicionais no campo, os biomas não estarão de pé”.
Além disso, a coordenadora-geral enfatizou a importância de criar espaços de participação efetiva para as organizações da sociedade civil dentro e fora da COP30. “Estamos nos organizando pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável e outras redes. Precisamos dar nosso recado, não só em eventos paralelos, mas dentro dos espaços de decisão, e, caso isso não aconteça, protestos serão inevitáveis”.
Dona Lourdes também compartilhou sua decepção com a COP28, em Dubai, onde observou que líderes mundiais e grandes empresas estavam mais preocupados com interesses financeiros do que com soluções ambientais. “Foi muito triste. Esperávamos discussões sobre formas de reduzir os impactos climáticos e preservar o planeta, mas o que vimos foi uma disputa por ganhos econômicos, sem considerar a causa comum”.
A Rede Cerrado, com atuação em quatro núcleos regionais, defende que os debates climáticos considerem os povos e as populações tradicionais como protagonistas. “Não podemos proteger os biomas expulsando quem sempre cuidou deles. Precisamos integrar as demandas ambientais às sociais, garantindo a permanência dessas comunidades com qualidade de vida”, concluiu.
Vanuza Cardoso:
Vanuza Cardoso, liderança espiritual do Território Quilombola do Abacatal, em Ananindeua, Pará, enxerga a COP30 como uma oportunidade essencial para que as comunidades tradicionais ocupem o espaço que lhes é de direito nas discussões climáticas. Para ela, a conferência deve ser construída com a participação direta dessas populações, respeitando suas histórias e demandas.
“Queremos uma COP com a nossa cara, com as nossas vozes, feita por nós. Não apenas para que falem sobre nós, mas para que nós falemos. Essa é uma luta pela sobrevivência e pela dignidade dos povos da floresta”, afirma Vanuza, que também é antropóloga e militante dos direitos humanos.
Entre as prioridades das comunidades quilombolas, Vanuza destaca a titulação de seus territórios como bandeira central. “A titulação é a garantia para as futuras gerações, para a nossa per-
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b9b31336a5a87435e473cc16ac2fbf52.jpeg)
‘queremos uma COP com a nossa cara’
manência e qualidade de vida. Sem território, não temos políticas públicas e nem asseguramos o direito à nossa própria existência”, explica.
A líder quilombola também critica o formato excludente de eventos climáticos anteriores e alerta que a COP30 não pode repetir esse padrão. Segundo ela, é fundamental criar mecanismos que permitam às populações tradicionais apresentar suas demandas diretamente, sem intermediários.
Vanuza lembra os desafios enfrentados por sua comunidade, como o impacto de projetos de infraestrutura no Território Quilombola do Abacatal, incluindo a construção de uma ecoavenida. “O Estado cumpriu os ritos, fez estudos e apresentou compensações, mas isso não é suficiente. É preciso que as mitigações sejam efetivas e respeitem os 314 anos de história do nosso território”, ressalta.
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/fd137db6556da027f40696d07d946bc9.jpeg)
Além de participar das articulações para a Cúpula dos Povos — evento paralelo à COP30 que visa garantir espaço às comunidades tradicionais —, Vanuza reforça a importância de espaços alternativos, caso as lideranças continuem excluídas da conferência oficial. “A COP Paralela será fundamental se continuarmos silenciados. Precisamos de um espaço para denunciar como as decisões tomadas em salas fechadas impactam diretamente nossas vidas e territórios”.
Por fim, Vanuza destaca que o diálogo direto com o governo e empresas é indispensável, mas deve ser orientado pelo respeito aos povos tradicionais e seus territórios. “Não estamos dissociados do território. Assim como cuidamos de nossos corpos, cuidamos da terra. O que é inegociável para nós, são nossos territórios e as futuras gerações”.
“É fundamental reforçar as organizações regionais e criar mecanismos para que elas sejam representadas de forma ativa”
Sila Mesquita, coordenadora nacional da Rede de Trabalho Amazônico (Rede GTA).
Ronaldo destacou a importância da COP30 como espaço para expor ao mundo as contribuições das terras indígenas para o equilíbrio climático global: “Nós, povos indígenas, somos os principais freios das mudanças climáticas. Vivemos as consequências diretas, como queimadas, estiagens e secas históricas. Precisamos mostrar a calamidade em que nos encontramos e exigir providências. Além disso, é fundamental garantir financiamento direto para nossas atividades. Precisamos de recursos
Sila Mesquita, coordenadora nacional da Rede de Trabalho Amazônico (Rede GTA)
para combater incêndios, fiscalizar nossas terras e proteger nossa biodiversidade”.
O líder também alertou sobre os desafios da participação indígena na COP. Segundo ele, as regras internacionais impostas pela ONU, que regem o evento, dificultam manifestações sociais e limitam a visibilidade das reais demandas amazônicas. “Muitas empresas, como a Vale, usam o espaço para autopromoção, ocultando os danos que causam. A COP precisa mostrar a verdadeira realidade da Amazônia, não apenas o que as empresas querem que o mundo veja”.
Ronaldo defende que os povos da floresta tenham acesso direto a recursos, como os do Fundo Amazônia, para garantir a preservação ambiental e a manutenção de suas atividades sustentáveis. “Se a ONU quer, de fato, lutar pelos direitos humanos e pela Amazônia, precisa ouvir quem vive aqui e depende dela. Precisamos de espaço para falar das nossas realidades e necessidades, garantindo que nossas florestas permaneçam vivas”.
NEIDINHA SURUÍ: ‘PRECISAMOS LEVAR PROPOSTAS CLARAS’
Neidinha Suruí, ativista socioambiental e cofundadora da organização Kanindé, em Rondônia, é uma das principais vozes na luta pela proteção da Amazônia e dos direitos indígenas. Ela tem uma visão clara sobre a importância da COP30, enfati-
Crédito: Acervo Pessoal
zando a necessidade de um protagonismo mais assertivo dos povos indígenas nas discussões sobre a crise climática. Nascida em Plácido de Castro, no Acre, em 1959, e criada em Rondônia, Neidinha é mãe de Txai Suruí, jovem ativista indígena também filha da liderança do povo Paiter Suruí, Almir Suruí, que ganhou projeção ao discursar na abertura da COP26.
Neidinha acredita que a COP30 não pode ser mais um espaço apenas para protestos, mas sim para a apresentação de propostas concretas e viáveis para a preservação dos biomas. “Chega de irmos às COPs apenas para protestar. Precisamos levar propostas claras e articuladas para soluções climáticas”, afirmou. Neidinha, junto com jovens indígenas, está organizando uma mobilização para levar demandas específicas, como a realidade dramática da seca em Rondônia, onde aldeias inteiras ficaram sem água, necessitando de helicópteros para o abastecimento.
A luta contra o marco temporal também foi mencionada por Neidinha como assunto para ser levado à COP e a ativista alertou para os impactos globais dessa
legislação. “Se não conseguirmos derrubar o marco temporal, os problemas ambientais se agravarão em escala global. Não é apenas uma questão indígena, mas de todos os povos tradicionais e, principalmente, do equilíbrio dos recursos hídricos”, disse. Ela também destacou a importância de uma abordagem mais ampla e colaborativa com o agronegócio. “O agronegócio deveria ser nosso aliado nessa luta, pois sem água e floresta não há agricultura”.
Para Neidinha, a COP30 é uma oportunidade única de unir os povos da Amazônia e outros biomas como Cerrado, Caatinga e Pantanal, visando avançar em soluções integradas para o meio ambiente. Ela alerta para os impactos irreversíveis da devastação ambiental, que não são apenas ecológicos, mas também econômicos e sociais. “Precisamos parar de pensar apenas no agora. A devastação ambiental terá consequências econômicas e sociais irreversíveis. É hora de avançarmos em uma economia que caminhe junto com a preservação ambiental”, afirmou.
Em sua visão, a sustentabilidade econômica está diretamente ligada à preser-
“Se é para proteger a Amazônia, tem que proteger quem mora nela. [...] Quem nunca pisou aqui, não pode falar por nós”
Maria dos Santos, ribeirinha do Xingu e integrante do Conselho Ribeirinho do Reservatório da Hidrelétrica Belo Monte.
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b042a0a5c8452affbf809c6c34e7ab3b.jpeg)
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b9b31336a5a87435e473cc16ac2fbf52.jpeg)
Maria dos Santos, ribeirinha do Xingu e integrante do Conselho Ribeirinho do Reservatório da Hidrelétrica Belo Monte
Crédito: Divulgação
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/312c7db1616ea1c40b22ee740521a0f5.jpeg)
Júnior Hekurari Yanomami: ‘ações na Amazônia devem evitar interesses políticos’
Arealização da 30ª Conferência das Partes (COP30) em Belém, marcada para 2025, coloca a Amazônia no centro das discussões climáticas globais. Contudo, para Júnior Hekurari Yanomami, um dos líderes do povo Yanomami e presidente da Urihi – Associação Yanomami, em Roraima, é imprescindível que as decisões tomadas durante o evento sejam conduzidas com foco em soluções práticas e voltadas para a proteção do bioma amazônico. Segundo ele, políticas voltadas à Amazônia devem evitar interesses políticos ou disputas que desviem o foco das urgências climáticas e ambientais.
Hekurari destacou a importância de envolver os povos indígenas nos debates e decisões. Para ele, as comunidades que vivem na floresta têm um papel fundamental na sua proteção. “É fundamental ouvir os povos indígenas, pois são eles que têm uma relação direta com a floresta e carregam o conhecimento necessário para sua proteção”, afirmou. Ele também enfatizou que a participação indígena deve ser genuína, sem transformar a causa em bandeira de interesses políticos externos às comunidades.
“Na minha opinião, como alguém que vive na Amazônia e conhece de perto a floresta, é essencial que qualquer política ou ação relacionada à região não prejudique seu ecossistema, nem seja contaminada por interesses políticos ou politicagem. As decisões precisam ser tomadas com foco em questões específicas, como a emergência climática e os problemas enfrentados pela Amazônia atualmente”, afirmou.
Apesar da relevância do protagonismo indígena, Júnior questiona a falta de clareza sobre a participação dos povos da floresta no evento. Ele diz que o povo Yanomami ainda não tem clareza sobre quem está organizando ou convidando os povos indígenas para participar da COP30 em Belém, o que dificulta a participação deles na conferência: “Observando lideranças de outros países e iniciativas passadas, acredito que precisamos de uma abordagem diferente, que realmente dê espaço às vozes da floresta. No entanto, quanto à nossa participação na COP, ainda não temos clareza sobre quem está organizando ou convidando os povos indígenas para participar, o que dificulta nosso envolvimento”.
Ao refletir sobre as edições passadas da Conferência do Clima, o líder Yanomami demonstrou frustração com a ausência de avanços significativos em temas críticos, como a transição energética e a redução do uso de combustíveis fósseis. “É necessário retomar essas discussões e trazer à tona a importância de implementar ações concretas que beneficiem tanto o clima global quanto as comunidades locais”, defendeu. Para ele, as comunidades indígenas ainda não foram impactadas por mudanças efetivas que promovam a preservação da Amazônia.
Júnior reforçou a importância global da Amazônia, descrevendo-a como essencial para a regulação climática do planeta. A floresta, segundo ele, enfrenta ameaças como queimadas, desmatamento e tecnologias mal aplicadas que comprometem sua integridade. “Sem chuva, não há
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b9b31336a5a87435e473cc16ac2fbf52.jpeg)
Amazônia; sem Amazônia, não há equilíbrio climático. Proteger a floresta e os povos indígenas é essencial para a sobrevivência de todos nós”, alertou.
O líder finalizou seu argumento dizendo que a preservação da floresta deve ser um compromisso de toda a sociedade e não apenas das comunidades que nela vivem. Ele defende uma política de conscientização que valorize a Amazônia e os povos indígenas como pilares de um futuro sustentável.
“É fundamental ouvir os povos indígenas, pois são eles que têm uma relação direta com a floresta e carregam o conhecimento necessário para sua proteção”
Júnior Hekurari Yanomami, um dos líderes do povo Yanomami e presidente da Urihi – Associação Yanomami.
Júnior Hekurari Yanomami, um dos líderes do povo Yanomami e presidente da Urihi – Associação Yanomami.
COP
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b9b31336a5a87435e473cc16ac2fbf52.jpeg)
“Sem
os povos tradicionais no campo, os biomas não estarão de pé”
Maria de Lourdes de Souza Nascimento, a Dona Lourdes, coordenadora-geral da Rede Cerrado.
vação do meio ambiente. Para concluir seu raciocínio, Neidinha usou as abelhas como exemplo. “As abelhas são essenciais para a polinização e, consequentemente, para a agricultura. Esse é um exemplo claro de como economia e meio ambiente são interdependentes”.
SILA MESQUITA:
‘É FUNDAMENTAL REFORÇAR AS ORGANIZAÇÕES REGIONAIS’
A amazonense Sila Mesquita, coordenadora nacional da Rede de Trabalho Amazônico (Rede GTA), destacou a importância da ampliação da participação comunitária por meio do fortalecimento das organizações regionais. Segundo Sila, além de consolidar pautas históricas, como a demarcação de territórios indígenas e a eliminação dos combustíveis fósseis, a Rede GTA busca integrar lideranças comunitárias no planejamento e nas discussões da Cúpula dos Povos, evento paralelo à COP30, porque muitas delas desejam levar suas perspectivas locais para o debate global. “Por isso, é fundamental reforçar as organizações regionais e criar mecanismos para que elas sejam representadas de forma ativa”, afirmou.
Sila explicou que a participação na Cúpula dos Povos está vinculada à adesão de organizações jurídicas, como redes ou associações locais, como a Rede GTA, de quem as lideranças podem solicitar adesão, caso concordem com valores e objetivos contidos em sua Carta de Princípios. A Rede GTA tem 32 anos de atuação e mais de 310 organizações afiliadas.
Ela também enfatizou que a inclusão de novas vozes é essencial para fortalecer o diálogo com o governo brasileiro e com as instituições internacionais. “A Cúpula dos Povos não está na agenda oficial da ONU, mas é um espaço estratégico para a sociedade civil influenciar decisões e propor alternativas concretas. Mobilizar 15 mil pessoas para Belém durante a COP30 é uma meta ambiciosa, mas absolutamente necessária para garantir que demandas regionais e locais sejam ouvidas”, concluiu.
ROBERTO BRITO: ‘A AMAZÔNIA É VIDA PARA O PLANETA’
Para Roberto Brito Mendonça, liderança ribeirinha da Comunidade do Tumbira, localizada na Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Rio Negro, no Amazonas, a COP30 representa uma oportunidade única de “narrar nossa história com nossa voz” diretamente para líderes globais e grandes empresas responsáveis por boa parte das emissões de carbono no mundo. “Nós temos essa oportunidade de reivindicar com a nossa própria voz o que queremos, não apenas para agora, mas para nossos filhos e netos. A Amazônia precisa de apoio real para quem vive nela, porque o futuro do planeta passa por aqui”.
Roberto acredita que a preservação da floresta passa, necessariamente, pela garantia de melhores condições de vida para as populações locais. “Se a gente não tiver suporte, uma boa qualidade de vida, acesso às coisas básicas, principalmente sociais, a Amazônia fica dividida, principalmente em questões como desmatamento, queimadas e poluição dos rios”, apontou.
O ribeirinho, que foi madeireiro até 2011, quando decidiu mudar de rumo, hoje trabalha com turismo de base comunitária, e critica projetos para a Amazônia que “fazem escala em governos e ONGs, mas não chegam ao povo que realmente vai fazer a diferença”. “Enquanto isso, as pessoas continuam derrubando árvores ou poluindo rios porque precisam sobreviver”. “Graças a Deus, tive a oportunidade de parar com o manejo madeireiro e, hoje, trabalho com turismo. A Amazônia, para mim, é vida. E assim como é vida para nós, é para todo o planeta”, concluiu.
MARIA DOS SANTOS: ‘AQUI, A ESCUTA SEMPRE NOS FOI NEGADA’
Maria dos Santos, ribeirinha do Xingu e integrante do Conselho Ribeirinho do Reservatório da Hidrelétrica Belo Monte, tem uma visão crítica sobre a COP30, especialmente em relação à falta de representatividade das populações diretamente impactadas por megaprojetos na Amazônia. Para Maria, a conferência deve ser uma oportunidade para garantir que as vozes dos povos tradicionais, como os ribeirinhos, sejam ouvidas e consideradas.
Ela aponta que, ao longo dos anos, os ribeirinhos foram raramente convidados a falar sobre as mudanças que afetam suas vidas, especialmente quando se trata dos impactos negativos de grandes empreendimentos como a Hidrelétrica Belo Monte, em Altamira, no Pará. “Quando a gente vê nossa fala chegando em pessoas que nunca viveram o que vivemos, que pegam nossas lágrimas e dores para se promover, isso indigna. Porque aqui, a escuta sempre nos foi negada”, afirma Maria.
A conselheira também denuncia o descumprimento de promessas feitas durante a construção da usina, como indenizações e reassentamentos adequados. “Os trabalhadores do Xingu, até hoje, não foram indenizados, e as nossas águas não são mais as mesmas. A empresa tirou o que tínhamos e destruiu nossa dignidade”, lamenta.
Maria dos Santos destaca que, para proteger a Amazônia, é essencial que os debates climáticos incluam as perspectivas e as experiências de quem vive e depende da floresta. “Se é para proteger a Amazônia, tem que proteger quem mora nela. A floresta é a morada dos deuses, não apenas dos seres humanos. Quem nunca pisou aqui não pode falar por nós”.
Para ela, a COP30 deve ser um momento crucial para dar visibilidade às reivindicações locais, uma chance de mudar a narrativa de exclusão. Ela critica a falta de espaços para que as lideranças das populações tradicionais apresentem suas demandas em encontros internacionais: “Será que na COP do Pará as populações tradicionais vão conseguir entrar e apresentar suas demandas? Porque em outras COPs isso não aconteceu”.
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/93eee4d177cfc83242df5d5042c95ec5.jpeg)
Presidente da COP30 promete ouvir sociedade civil da Amazônia
Ana Cláudia Leocádio – Da Cenarium
BRASÍLIA (DF) – O presidente da 30ª
Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30), embaixador André Aranha Corrêa do Lago, assegurou que os atores locais da sociedade civil da Amazônia serão ouvidos na fase preparatória do evento, que será realizado em Belém (PA), em novembro deste ano.
Desde que foi anunciada, a COP30 tem recebido críticas porque excluiria das discussões os atores principais da região, como indígenas, ribeirinhos, quilombolas e as instituições acadêmicas e científicas.
O diplomata lembrou como a Conferência do Clima de 1992, realizada no Rio de Janeiro, conhecida como Rio-92, teve um impacto muito grande sobre a maneira como o brasileiro percebeu a mudança do clima, o meio ambiente e a biodiversidade.
“Há uma expectativa também muito grande porque o Brasil tem uma tradição e esse governo tem uma tradição de abraçar a sociedade civil, de ouvir a sociedade civil. Então, durante esse período preparatório, nós vamos ter muito diálogo com a sociedade civil, porque é essencial que eles estejam envolvidos no processo. Porque depois, como na Rio-92, são as populações que têm que acreditar nessa agenda e que têm que contribuir para que essa agenda dê certo”, afirmou o presidente da COP no Brasil.
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b9b31336a5a87435e473cc16ac2fbf52.jpeg)
O presidente destacou ainda que a COP tem uma dimensão nacional relevante para a realização do evento. “Tem uma dimensão nacional extremamente importante, e pela decisão do presidente Lula de fazer a COP na Amazônia em Belém, é essencial que sejam ouvidas as pessoas que são justamente aquelas que convivem com esse bioma, que é um mistério para a maioria do mundo. Aliás, é um mistério para muitos brasileiros. Então, a participação deles é absolutamente essencial”, afirmou Lago.
Com a posse do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e a saída do país do Acordo de Paris, que é essencial para que os países se comprometam com medidas que mitiguem os efeitos da mudança climática no planeta, Lago considera que a ausência americana terá “impacto significativo na preparação da COP30”, e ainda avalia como eles lidarão com a saída de um país tão importante nesse processo.
O embaixador disse acreditar que a maioria dos países que participam da COP, onde todas as decisões são por consenso, já defenderam seus interesses também dentro desse processo e, agora, vão trabalhar para um objetivo comum: conseguir controlar as consequências da mudança do clima.
“Então, eu acho que os países podem ter motivos diferentes de participar da COP, mas eu acredito que todos os países que estão no Acordo de Paris, entendem que há algo de extremamente importante para eles em se manter nesse processo”, disse.
Sobre a agenda a ser definida para o encontro em Belém, o presidente da COP30 explicou que está em elaboração, mas que há certos mandatos já pré-determinados pelos países que vêm negociando as 29 COPs anteriores. Um deles é o financiamento climático, debatido em Baku, no Azerbaijão, e que o Brasil deverá dar prosseguimento nas discussões, no sentido de “fortalecer os recursos financeiros que vão estar disponíveis para o combate às mudanças do clima”. Falta fechar um valor que atenda às necessidades atuais dos países.
“Mas também há várias outras (agendas), a questão da adaptação, que no Brasil este ano se tornou um tema muito compreendido e muito traumático, principalmente pelo que aconteceu em Porto Alegre (RS). Tem vários desses temas que já estão predeterminados como temas que vão ser negociados durante a COP”, informou o embaixador.
Outro tema destacado é a chamada “agenda de ação” na COP, que consiste num processo paralelo no qual os atores que não podem negociar, porque somente as delegações oficiais dos países o fazem, vão poder também desenvolver certos temas dentro dessa agenda de ação que vai determinar quais são as prioridades. Isso incluiria Estados, cidades, empresas e sociedade civil. “Tudo isso está em elaboração, mas mais proximamente vamos poder conversar sobre isso”, concluiu Lago.
O Embaixador André Aranha Corrêa do Lago presidirá a COP30
Crédito: José Cruz Agência Brasil
COP DA AMAZÔNIA
MEIO AMBIENTE & SUSTENTABILIDADE
Crédito: Marx Vasconcelos | Cenarium
Oportunidades e desafios
Vista do Mercado Ver-o-Peso, um dos principais pontos turísticos de Belém, que recebeu investimentos para reformas e que deve atrair visitantes durante a COP30
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/4d42dadcde01670a78fd4fc9b495df55.jpeg)
Especialistas avaliam que COP30, em Belém, pode trazer impactos sociais, econômicos e políticos positivos, mas será preciso vencer obstáculos para mudar paradigmas na governança ambiental
Fabyo Cruz – Da Cenarium
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b9b31336a5a87435e473cc16ac2fbf52.jpeg)
BELÉM (PA) - Pela primeira vez, a Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, maior evento climático do mundo, ocorrerá na Amazônia, colocando a cidade-sede, Belém, e a região amazônica no centro das discussões globais sobre preservação ambiental e desenvolvimento sustentável. Os impactos prometem ir além da visibilidade internacional, com potenciais reflexos econômicos, sociais e políticos de grande envergadura.
Nesta reportagem, o economista Nélio Bordalo Filho, o cientista político Breno Guimarães e o cientista social João Noronha discutem os possíveis desdobramentos da COP30. Eles analisam como o evento
poderá estimular investimentos na infraestrutura urbana, impulsionar o turismo e fortalecer a governança ambiental na Amazônia. Além disso, avaliam os desafios para implementar políticas públicas que atendam tanto às demandas globais quanto às necessidades das populações locais.
GOVERNANÇA E PROTAGONISMO AMBIENTAL
Para o cientista político Breno Guimarães, presidente do Instituto Brasileiro de Direito Partidário (Ibradip) e membro do efetivo da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), a COP30 representa uma chance única para que
“O Brasil deve se apresentar na COP30 estimulando práticas ambientalmente sustentáveis para assumir algum papel de protagonismo nas discussões ambientais em nível global”
Breno Guimarães, cientista político.
Belém e a Amazônia assumam protagonismo global. “Belém como anfitriã e palco da COP30 poderá ter um protagonismo e influenciar políticas públicas regionais, caso os governos estadual e municipal promovam investimentos na educação ambiental, visando à conscientização da população para práticas ambientalmente sustentáveis, como a utilização de energias renováveis, reciclagem de resíduos, bem como por meio da revisão de suas legislações e a implementação de novas iniciativas capazes de gerar impacto positivo na preservação do meio ambiente e no desenvolvimento sustentável das cidades”, destaca.
Além disso, a conferência pode impulsionar a visibilidade da Amazônia como ecossistema crucial para a regulação do clima global. “A Amazônia pode aparecer na pauta global como importante ecossistema de regulação do clima do planeta e de preservação da biodiversidade, sendo acompanhado de investimentos internacionais para o fortalecimento de projetos locais e o incentivo a novas iniciativas sustentáveis, seja por meio de projetos de reflorestamento, de energias renováveis e turismo ecológico, bem como pelo empoderamento de comunidades locais com atuação na preservação da Amazônia.
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/30901250b0738cebdfd7a05ea07c511d.jpeg)
Por conseguinte, o Brasil deve se apresentar na COP30 estimulando práticas ambientalmente sustentáveis para assumir algum papel de protagonismo nas discussões ambientais em nível global”, explica Guimarães.
No entanto, ele alerta que os compromissos efetivos podem ser limitados. A ausência de líderes globais influentes, como o presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, pode enfraquecer decisões voltadas à preservação da Amazônia, pondera Guimarães.
“A COP30, enquanto reunião de líderes dos países partes, trata-se de um encontro diplomático voltado a debater temas relacionados às mudanças climáticas, principalmente na redução da emissão de gases poluentes ao meio ambiente, e pode acabar por não apresentar compromissos efetivos dos países partes, assim como o presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, provavelmente não comparecerá à reunião da COP30, e sendo os EUA um dos principais atores mundiais no debate das mudanças climáticas, em função do seu volume de investimentos e aquisições de produtos globais, pode-se acabar tendo uma COP em que não serão enfrentados
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b9b31336a5a87435e473cc16ac2fbf52.jpeg)
compromissos voltados para os problemas ambientais da região amazônica”.
IMPACTOS ECONÔMICOS E LEGADO TURÍSTICO
Segundo o economista Nélio Bordalo Filho, conselheiro do Conselho Regional de Economia dos Estados do Pará e Amapá (Corecon PA/AP), a COP30 trará benefícios econômicos diretos e indiretos para a região. Ele afirma que o evento movimentará setores como turismo, comércio, gastronomia e serviços, atraindo visitantes de todo o mundo. “A visibilidade gerada consolidará Belém como porta de entrada para o turismo amazônico”, analisa.
Bordalo aponta que o turismo ecológico e cultural deve crescer, beneficiando não só Belém, mas cidades próximas como Salinópolis e Castanhal, na região nordeste do Pará. “A preparação para o evento impulsionará empregos temporários e investimentos em infraestrutura, deixando um legado econômico e social positivo”, afirma Bordalo Filho.
Para o economista, a COP30 funcionará como um catalisador para posicionar a Amazônia no centro de discussões globais sobre desenvolvimento sustentável. Governos e empresas internacionais, sensi-
Crédito: Arquivo Pessoal
COP
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/a020b9468bf9afbc6537a06215d3d73d.jpeg)
bilizados pela importância da preservação, poderão canalizar recursos para projetos de energia limpa, como a solar e a eólica, e para iniciativas de reflorestamento e manejo sustentável de recursos florestais.
Além disso, ele ressalta o potencial da bioeconomia. “A bioeconomia amazônica, com seu potencial de geração de valor por meio de produtos como açaí, óleos essenciais, fármacos e cosméticos naturais, terá a oportunidade de atrair investidores que buscam negócios alinhados aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). O evento também pode abrir caminhos para parcerias público-privadas e impulsionar o acesso a fundos climáticos internacionais, como o Fundo Verde para o Clima (GCF)”, explica.
REFLEXOS SOCIAIS E JUSTIÇA CLIMÁTICA
O cientista social João Noronha, professor de Sociologia em uma escola estadual do Mato Grosso, alerta que os impactos sociais dependerão da forma como os recursos serão distribuídos. “Embora o evento possa gerar melhorias na infraestrutura e amplificar a visibilidade cultural da Amazônia, é essencial que essas mudanças beneficiem as comunidades locais, e não apenas os visitantes”, argumenta.
“Sem a inclusão das vozes locais, as discussões podem reforçar desigualdades históricas, em vez de combatê-las”
João Noronha, cientista social.
Noronha também vê a COP30 como uma plataforma para transformar narrativas sobre a Amazônia e seus povos. Ele afirma que a inclusão de vozes indígenas e tradicionais nos debates é crucial para quebrar preconceitos e reafirmar o papel dessas populações na preservação do bioma. “Isso pode contribuir para a construção de novos paradigmas de desenvolvimento sustentável e justiça climática”, conclui.
Para o cientista social, a conferência tem o potencial de transformar a maneira como a Amazônia e seus povos são vistos globalmente “O evento pode desmistificar narrativas preconceituosas e colonialistas, mostrando a importância das populações tradicionais na preservação do bioma”.
Ele ressalta que o envolvimento dessas comunidades nos debates é essencial. “Sem a inclusão das vozes locais, as discussões podem reforçar desigualdades históricas, em vez de combatê-las. A COP30 pode redefinir o desenvolvimento sustentável como uma questão ética, envolvendo justiça climática e redistributiva”, destaca Noronha.
Além disso, ele acredita que a visibilidade internacional gerada pelo evento pode fortalecer movimentos sociais e lideranças amazônicas. “Esse protagonismo pode gerar maior autonomia e poder de negociação
para as comunidades locais, reposicionando a Amazônia como peça central nas políticas nacionais”, conclui.
OBSTÁCULOS E POSSIBILIDADES
Apesar do otimismo, os especialistas concordam que a implementação de compromissos firmados na COP30 enfrentará obstáculos. Entre eles estão a limitação orçamentária dos governos locais, a falta de infraestrutura e a necessidade de maior coordenação entre os diferentes níveis de governo. No entanto, com investimentos internacionais e o engajamento da sociedade civil, Belém poderá transformar o evento em um marco para o desenvolvimento sustentável na Amazônia e no Brasil.
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/f5441cbbc22feb62bb4c7e1d8bc1a350.jpeg)
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b9b31336a5a87435e473cc16ac2fbf52.jpeg)
Crédito: Marx Vasconcelos | Cenarium
Crédito: Arquivo Pessoal
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/40af977dae0bf8b3cf09fa307885ee78.jpeg)
“A bioeconomia amazônica, com seu potencial de geração de valor por meio de produtos como açaí, óleos essenciais, fármacos e cosméticos naturais, terá a oportunidade de atrair investidores que buscam negócios alinhados com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS)”
Nélio Bordalo Filho, economista, conselheiro do Conselho Regional de Economia dos Estados do Pará e Amapá (Corecon PA/AP).
Obras da chamada nova doca, em Belém. As obras em andamento para criar locais que receberão visitantes durante a COP30 geram empregos temporários
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/dd3319317d7278172cd7bbeadb1c8ffe.jpeg)
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b9b31336a5a87435e473cc16ac2fbf52.jpeg)
Governadores: discurso x prática
Ao mesmo tempo em que traz visibilidade e possíveis investimentos, a COP na Amazônia põe governadores da região sob pressão para mostrar resultados de preservação ambiental em realidades controversas. Governo Lula também é pressionado
Fabyo Cruz – Da Cenarium
BELÉM (PA) - Com a aproximação da COP30, a ser realizada em Belém, os olhos do mundo estão voltados para a região amazônica. Apesar de discursos que promovem a sustentabilidade e a inclusão, decisões recentes dos governadores da Amazônia Legal têm colocado em risco tanto a biodiversidade, quanto os direitos dos povos indígenas e comunidades tradicionais. Os principais retrocessos incluem a concessão de licenças para mineração e agronegócio, desmatamentos ilegais e a falta de consulta prévia a comunidades afetadas por grandes empreendimentos. Essas ações comprometem a legitimidade da região como referência na agenda climática global, alertam especialistas.
No Pará, Estado governado por Helder Barbalho (MDB), que é anfitrião da COP30, iniciativas como a duplicação da Rua da Marinha, embargada por falta de estudos de impacto ambiental, e as negociações controversas de créditos de carbono sem a consulta de lideranças indígenas expõem contradições entre discurso e prática. A mineração e a expansão do agronegócio reforçam a percepção de que interesses econômicos têm prevalecido sobre a preservação ambiental.
Já no Amazonas, governado por Wilson Lima (União Brasil), o desmatamento e as queimadas atingem índices alarmantes, enquanto avançam projetos de exploração
de petróleo e gás. Em abril do ano passado, o governador assinou os termos da Concessão de Direito Real de Uso (CDRU) de quatro áreas em Urucu, Coari, permitindo à Petrobrás continuar a exploração de gás natural e petróleo em terras estaduais. No mesmo período, entidades do movimento indígena protestaram em Manaus contra a licença estadual para a exploração de potássio na Amazônia, alegando a violação do direito de consulta prévia garantido pela Convenção n.º 169 da OIT. O impasse é semelhante ao da exploração de gás e petróleo na região dos municípios amazonenses de Silves e Itapiranga, onde indígenas também questionam o empreendimento e denunciam violação de seus direitos. Paralelamente, a seca histórica de 2024 intensificou os impactos climáticos, agravando a vulnerabilidade das populações ribeirinhas.
No Mato Grosso, gerido pelo governador Mauro Mendes (União Brasil), a flexibilização de leis ambientais e a falta de fiscalização têm facilitado o desmatamento e a expansão desenfreada do agronegócio, gerando críticas de ambientalistas. Rondônia e Acre também enfrentam pressões crescentes. O primeiro, sob a liderança de Marcos Rocha (União Brasil), busca reduzir áreas protegidas para expandir o agronegócio, enquanto o segundo, governado por Gladson Cameli (Progressistas), lida
Em Belém, iniciativas como a duplicação da Rua da Marinha, embargada por falta de estudos de impacto ambiental, são exemplos de como nem sempre o discurso ambiental condiz com a realidade prática nos Estados da Amazônia
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/c9a8275410d1ffd9f8e5fc0799930c7c.jpeg)
com queimadas crescentes e impactos na icônica Reserva Extrativista Chico Mendes. Outros Estados da região apresentam desafios semelhantes. O Amapá, de Clécio Luís (Solidariedade), enfrenta resistência de ambientalistas, devido ao apoio à exploração de petróleo. Em Roraima, a ineficiência no combate ao garimpo ilegal e declarações discriminatórias contra indígenas geram críticas ao governador Antonio Denarium. No Maranhão, de Carlos Brandão (PSB), e no Tocantins, de Wanderlei Barbosa (Republicanos), problemas como desmatamento,
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b9b31336a5a87435e473cc16ac2fbf52.jpeg)
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/755191313df8e46b8900632148e518af.jpeg)
queimadas no Cerrado e o uso excessivo de defensivos agrícolas também intensificam os problemas ambientais.
PROTAGONISMO EM RISCO
A 30ª edição da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas é vista como uma oportunidade para reposicionar a Amazônia Legal no centro da agenda climática global. Contudo, especialistas alertam que, sem a reversão de políticas prejudiciais, os governadores locais correm o risco de enfraquecer sua legitimidade.
Carlos Eduardo Siqueira, professor doutor em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília (UnB), explica que, desde 2008, os líderes da região têm buscado protagonismo na agenda ambiental por meio de iniciativas como o Fórum de Governadores da Amazônia, que permite a atuação em nível internacional através da paradiplomacia. No entanto, a ausência de poder decisório em acordos internacionais, como o Acordo de Paris, limitam suas influências diretas.
“Governadores amazônicos, desde 2008, têm se organizado e procurado serem prota-
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b9b31336a5a87435e473cc16ac2fbf52.jpeg)
gonistas na agenda amazônica, mesmo com baixo poder de negociação, justamente pela agenda ambiental, principal tema da região, que está atrelada às Nações Unidas. No entanto, criaram o Fórum de Governadores da Amazônia e outros arranjos políticos que os credenciam a fazer uma paradiplomacia, a diplomacia de regiões e cidades. Dessa forma, eles podem constranger o governo central brasileiro quanto à transparência, além de mobilizar a população a não aceitar políticas predatórias como o mercado de carbono, onde grandes empresas pagam para desmatar”, destaca Siqueira.
Crédito: Marx Vasconcelos | Cenarium
COP DA AMAZÔNIA
MEIO AMBIENTE & SUSTENTABILIDADE
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/9b028f38cd7e95a22bb155a874ac14f8.jpeg)
Para ele, enquanto decisões ambientais continuam sendo tomadas de cima para baixo, povos indígenas e comunidades tradicionais intensificam suas estratégias de resistência. Segundo Siqueira, essas populações têm organizado reivindicações por políticas públicas que respeitem suas condições e direitos, mas enfrentam dificuldades devido ao baixo poder de constrangimento político em um cenário desfavorável.
“Muitas políticas são postas pelos tomadores de decisões, os políticos investidos em cargos no Estado, de cima para baixo. Assim, o que comunidades indígenas e tradicionais podem fazer é fortalecer sua organização, estar em lugares estratégicos reivindicando políticas públicas condizen-
tes com suas condições, o que já fazem, mas que dependem da conjuntura política do País e da região. Pelo status quo estes grupos, da forma como se organizam, têm baixo poder de constrangimento, ou seja, de mudar esse status”, analisa o especialista.
GOVERNO LULA À PROVA
Faltando pouco menos de um ano para a realização da COP30, o governo Lula também enfrenta uma crescente pressão interna e internacional para avançar na agenda ambiental. A promessa de atingir o desmatamento zero até 2030, uma das principais bandeiras da campanha presidencial, tem se mostrado um desafio monumental diante dos números recentes de queimadas e destruição da floresta amazônica.
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b9b31336a5a87435e473cc16ac2fbf52.jpeg)
O Brasil vai para a conferência global em um momento crítico: com cinco anos restantes para cumprir a meta, porém, até agora, sem ações que tenham se mostrado suficientes. Dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) mostram que o desmatamento na Amazônia segue em níveis preocupantes, colocando em dúvida a viabilidade do compromisso assumido pelo governo. O Brasil registrou 278.299 focos de incêndios florestais em 2024. O número representa um aumento de 46,5% em relação ao ano anterior, quando foram contabilizadas 189.901 ocorrências. Na divisão por biomas, a maior parte dos incêndios ocorreu na Amazônia, com 140.346 focos de incêndios. Em seguida, estão Cerrado (81.468), Mata Atlântica (21.328), Caatinga (20.235) e Pampa (424).
Reunião do 27º Fórum de Governadores da Amazônia Legal, realizada em abril de 2024, em Rio Branco, no Acre
Crédito: Marcos Vicentti | Governo do Acre
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/e282853f507cdd54b9575d5030d34b08.jpeg)
“Muitas políticas são postas pelos tomadores de decisões, os políticos investidos em cargos no Estado, de cima para baixo. Assim, o que comunidades indígenas e tradicionais podem fazer é fortalecer sua organização”
Carlos Eduardo Siqueira, professor doutor em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília (UnB).
O presidente Lula reconheceu a importância histórica da COP30 durante a última reunião do G20, realizada em novembro do ano passado no Rio de Janeiro. “Não podemos adiar para Belém a tarefa de Baku. A COP30 será nossa última chance de evitar uma ruptura irreversível no sistema climático”, destacou o presidente, enquanto convidava os líderes globais para o evento no Brasil. Lula também enfatizou a necessidade de uma governança climática mais robusta: “Precisamos de uma governança climática mais forte. Não faz sentido negociar novos compromissos se
não temos um mecanismo eficaz para acelerar a implementação do Acordo de Paris”.
A expectativa é alta para que o Brasil assuma um papel de liderança no debate climático global, mas essa responsabilidade também é uma faca de dois gumes. O êxito na realização de ações concretas pode consolidar o País como uma referência ambiental; por outro lado, falhas podem trazer repercussões negativas tanto para a imagem internacional do Brasil quanto para o governo.
Além das cobranças externas, o governo enfrenta a pressão de setores sociais e ambientais dentro do País. Ativistas e pesquisadores pedem maior agilidade em ações de proteção ambiental, enquanto comunidades tradicionais que vivem na Amazônia denunciam o avanço do garimpo ilegal e a exploração de terras indígenas. Apesar de algumas medidas iniciais, como o aumento da fiscalização e a reativação do Fundo Amazônia, os números alarmantes de desmatamento indicam que muito ainda precisa ser feito.
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/7aa3cd79af0dc98363d720cbb8ff6881.jpeg)
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b9b31336a5a87435e473cc16ac2fbf52.jpeg)
Crédito: Arquivo Pessoal
MEIO AMBIENTE & SUSTENTABILIDADE
Superar a falta de estrutura
Obras em Belém avançam em meio a críticas e expectativas
Fabyo Cruz – Da Cenarium
Reforma no antigo prédio da Receita Federal, onde funcionará um dos novos hotéis para suprir a carência de leitos da rede hoteleira de Belém
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/88827acda39ff70b4b5cc6d2b6be6a98.jpeg)
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b9b31336a5a87435e473cc16ac2fbf52.jpeg)
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b9b31336a5a87435e473cc16ac2fbf52.jpeg)
BELÉM (PA) - Belém, capital do Pará, se transformou em um verdadeiro canteiro de obras, com tapumes, intervenções no trânsito e placas anunciando a cidade como a “Capital da COP30”. A realização da 30ª edição da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP), programada para ocorrer entre os dias 10 e 21 de novembro deste ano, coloca o município diante de desafios estruturais, logísticos, ambientais e sociais. Segundo a Secretaria Extraordinária para a COP30, vinculada à Casa Civil da Presidência da República, estão em andamento mais de 30 obras estruturantes em Belém, realizadas por meio de uma parceria entre o governo federal, a prefeitura e o governo do Estado. Contudo, à medida que os preparativos avançam, surgem preocupações de diversos setores quanto ao impacto e à execução das intervenções. O governo federal destinou quase R$ 4,7 bilhões para os preparativos da Conferência sobre Mudanças Climáticas.
Durante a conferência, o governo brasileiro espera receber em Belém mais de 40 mil pessoas, incluindo chefes de Estado, diplomatas, empresários, investidores, ativistas e delegações dos 193 países-membros da Organização das Nações Unidas (ONU). Diante dessa alta demanda, o setor hoteleiro enfrenta grandes desafios, especialmente pela insuficiência de leitos para acomodar os visitantes. Segundo a Associação Brasileira da Indústria de Hotéis do Pará (Abih-PA), a rede hoteleira da capital está em pleno processo de adaptação, com todos os hotéis passando por reformas para atender às exigências da COP30.
Atualmente, Belém conta com 18 mil leitos de hotel, porém a expectativa é que o número chegue a 22 mil até a conferência, graças à inauguração de novos hotéis e ampliações. Com o uso de camas de casal contadas como dois leitos, espera-se que o total alcance entre 45 mil e 50 mil. Três novos hotéis de alto padrão, voltados para os públicos A e B, estão em construção, sendo financiados por grupos internacionais. Um deles será erguido na área do Porto Futuro II, outro ocupará um antigo prédio da Receita Federal e o terceiro estará localizado em Castanhal, município localizado a 75 quilômetros de Belém
Outra estratégia para ampliar a oferta de leitos durante a COP30, planejada pelos governos federal e do Pará, envolve o uso de navios transatlânticos, que ficariam ancorados no porto de Outeiro, a cerca de 35 quilômetros do centro de Belém. Considerado um “ponto estratégico” para a atracagem dessas embarcações, o porto de Outeiro deve adicionar cerca de 4.500 quartos temporários à capacidade de hospedagem durante o evento. Além disso, há o porto de Belém, que, mesmo apto a receber apenas navios e embarcações de menor porte, devido ao seu calado atual, ajudará a contribuir ainda mais para ampliar as opções de hospedagem na cidade durante a conferência.
“Temos que mudar o padrão de urbanização e macrodrenagem dos projetos, incorporando áreas de vegetação nativa e soluções que absorvam naturalmente as águas de chuva”
Juliano Pamplona Ximenes Ponte, arquiteto e urbanista, professor da Universidade Federal do Pará (UFPA).
OBRAS EM CURSO
Considerado pelo Governo do Pará como a maior obra de intervenção urbana em execução no Estado, o Parque da Cidade será um dos principais espaços da programação da COP30. Segundo o governo estadual, as obras estão dentro do cronograma estipulado, com mais de 73% da etapa prevista para o evento já concluída. Ao todo, serão mais de 500 mil metros quadrados de obras construídas, complementados por uma área paisagística de 50 hectares. O projeto final do parque contempla o museu da aviação, um centro de economia criativa, boulevard gastronômico, ciclotrilha e ecotrilha, áreas verdes preservadas, lago
artificial e instalações esportivas voltadas para a promoção da qualidade de vida, lazer, cultura, arte e bem-estar.
Segundo o planejamento preliminar, o Hangar Centro de Convenções da Amazônia será designado como a zona azul da COP, onde líderes internacionais e as principais decisões estarão concentrados. A menos de dois quilômetros, o Parque da Cidade será a zona verde, destinada à participação popular nas demais atividades programadas. Os dois locais estão interligados e estão situados no bairro Souza, a aproximadamente 20 minutos de carro do Aeroporto Internacional de Belém, que também passa por reforma.
Entre as principais obras também está o Porto Futuro II. No local, cinco galpões cedidos pela Companhia Docas do Pará (CDP) ao governo do Estado estão sendo revitalizados e transformados em um complexo de lazer e gastronomia, incluindo um inovador polo de bioeconomia. O espaço, que será um novo ponto turístico de Belém, também promoverá a valorização da cultura popular, do patrimônio imaterial, da história amazônica, das experiências gastronômicas e da biodiversidade do Pará, proporcionando aos visitantes uma experiência única. Atualmente, mais de 50% das obras já foram concluídas, segundo informações divulgadas pelo Governo do Pará.
Outra intervenção bastante divulgada pelo Governo do Pará é a ampliação da Rua da Marinha, que faz parte de um complexo viário planejado para criar um corredor urbano. Segundo a gestão estadual, o projeto busca reduzir congestionamentos na Região Metropolitana de Belém (RMB), melhorar a segurança viária e diminuir o tempo de deslocamento entre a capital e os municípios vizinhos.
A Avenida Visconde de Souza Franco, no Centro de Belém, está sendo transformada na “Nova Doca”, que promete se tornar mais um cartão-postal da cidade. Com 51% dos serviços já executados, a reconstrução inclui a instalação de uma passarela metálica com mirante, quiosques de lanche, jardins de chuva, áreas para piqueniques, espaço para eventos, espaço pet, urbanização viária, playground, academia ao ar livre e uma fonte interativa. Os trabalhos abrangem a fundação, lançamento e
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/8dbede3fc1a78f060b173fc501e996c5.jpeg)
concretagem de peças metálicas, além da cravação de estacas para sustentação da estrutura do canal.
A construção do Parque Linear da Doca, uma parceria entre o Governo do Pará e o governo federal, com apoio da Itaipu Binacional, envolve a revitalização de 1,2 quilômetro de canal. O projeto inclui serviços de drenagem, paisagismo, urbanização, construção de passarelas e a substituição de comportas para controle da maré, visando prevenir inundações. Além disso, mais de 2,4 quilômetros da Avenida Visconde de Souza Franco serão pavimentados, com a implantação de um sistema de drenagem profunda e superficial para águas pluviais, redes de esgoto sanitário, tubulação de água potável, ciclovia e um sistema de energia limpa.
ENTRE PROGRESSO E SEGREGAÇÃO
Para o arquiteto e urbanista Juliano Pamplona Ximenes Ponte, professor da Universidade Federal do Pará (UFPA), não
existe uma fórmula única para o planejamento urbano de cidades que receberão megaeventos internacionais, como Jogos Olímpicos ou COPs, mas existe um padrão recorrente. Este modelo, impulsionado por uma ideologia neoliberal, prioriza a criação de “corredores urbanos” controlados e restritos, com o objetivo de oferecer uma imagem “embelezada” da cidade para os visitantes. No entanto, as melhorias feitas para esses eventos, geralmente, não se refletem em benefícios diretos para a população local.
O professor aponta que, ao invés de promover um desenvolvimento urbano inclusivo, essas intervenções acabam criando um cenário de segregação social, onde as melhorias se concentram em áreas de alto valor simbólico e comercial, enquanto os bairros periféricos são negligenciados.
Em relação ao planejamento urbano na região amazônica, Ponte critica a falta de rigor nos projetos de grandes obras, como as realizadas pelo Governo do Estado do Pará. Ele chama a atenção para
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b9b31336a5a87435e473cc16ac2fbf52.jpeg)
o impacto ambiental das obras viárias, como a criação de corredores rodoviários, que têm resultado em destruição de vegetação nativa, morte da fauna local e aumento da poluição. Por outro lado, ele elogia as intervenções da Prefeitura de Belém, que priorizam necessidades mais urgentes da população, como melhorias no Mercado de São Brás, Ver-O-Peso e no sistema de transporte público BRT, que também fazem parte dos preparativos para a COP30.
Ponte sugere que, ao invés de continuar com o modelo atual de obras que privilegiam grandes projetos de infraestrutura com impactos ambientais significativos, seria possível adotar uma abordagem mais sustentável, baseada em soluções de infraestrutura verde e no planejamento de espaços públicos que respeitem a natureza local. “Temos que mudar o padrão de urbanização e macrodrenagem dos projetos, incorporando áreas de vegetação nativa e soluções que absorvam naturalmente as águas de chuva”, propõe.
Vista aérea da região onde fica o Theatro da Paz, um dos principais pontos turísticos de Belém
Crédito: Marx
Um dos maiores desafios dos megaeventos, segundo o professor, é garantir que as obras deixem um legado positivo para a população local. Em Belém, ele critica a falta de continuidade de projetos de grande importância, como a dragagem da Baía do Guajará, que poderia beneficiar a zona portuária da cidade. No entanto, ele vê com otimismo algumas das iniciativas promovidas pela gestão do ex-prefeito Edmilson Rodrigues, que, ao contrário de projetos destinados apenas a “enfeitar a cidade” para o evento, estão mais alinhadas com as necessidades diárias da população.
Ponte ressalta que, ao planejar grandes intervenções urbanas, é crucial que se considere as demandas sociais e a participação da comunidade. Segundo ele, o processo de consulta pública realizado pelo governo municipal é um exemplo positivo de como as obras podem ser mais responsáveis e beneficiar diretamente as pessoas.
Embora as obras urbanas sempre causem algum grau de transtorno à população,
Ponte acredita que um planejamento eficaz pode mitigar esses impactos. Ele critica a execução apressada das obras, como o caso dos canais da Doca e da Tamandaré, que falharam no planejamento hidráulico, resultando em alagamentos e contaminação. Um diagnóstico rigoroso e um gerenciamento eficiente são fundamentais para reduzir os transtornos durante a execução de grandes obras.
Para Juliano, é possível realizar grandes obras urbanas sem prejudicar o meio ambiente ou excluir a população. A chave está em um planejamento que considere tanto as necessidades locais quanto as exigências ambientais. “A Região Metropolitana de Belém tem quase 60% de seus domicílios em favelas, áreas precárias. É fundamental garantir moradia digna, escolas, unidades de saúde e espaços públicos adequados para todos”, conclui Ponte, enfatizando a importância de uma urbanização mais justa e sustentável para o futuro das cidades amazônicas.
30
Segundo a Secretaria Extraordinária para a COP30, vinculada à Casa Civil da Presidência da República, estão em andamento mais de 30 obras estruturantes em Belém.
40 mil
Durante a conferência, o governo brasileiro espera receber em Belém mais de 40 mil pessoas, incluindo chefes de Estado, diplomatas, empresários, investidores, ativistas e delegações dos 193 paísesmembros da Organização das Nações Unidas (ONU).
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/9ccea15aab5f8e06979b38a6c3239afb.jpeg)
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b9b31336a5a87435e473cc16ac2fbf52.jpeg)
Vila da Barca, em Belém. A Região Metropolitana de Belém tem quase 60% de seus domicílios em favelas, áreas precárias
Tecnologia a serviço da preservação
Projeto Curupira: avanços no monitoramento ambiental e inovações tecnológicas
Thaís Matos – Da Cenarium
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/4df1f2c2fd65e47a2fe24aeb13030be5.jpeg)
Crédito: Luiz André Nascimento | Cenarium
MANAUS (AM) - Liderado pelo Laboratório de Sistemas Embarcados (LSE/HUB) da Universidade do Estado do Amazonas (UEA), o projeto Curupira vem avançando desde a sua criação em 2023, focando no aprimoramento tecnológico voltado à preservação ambiental. Desenvolvido com o objetivo de implementar um sistema inteligente de monitoramento para áreas de floresta fechada, rios e zonas urbanas, o projeto busca uma abordagem inovadora na detecção de ameaças e ataques ao ecossistema de dentro das florestas para fora, e não de fora para dentro, como ocorre, por exemplo, no monitoramento por satélite.
Entre os progressos, destaca-se a incorporação de novas funcionalidades, parâmetros e ferramentas de monitoramento, além de ajustes no sistema de comunicação e mais autonomia energética do dispositivo. O professor doutor Raimundo Cláudio, coordenador do LSE/HUB, destacou esses avanços em entrevista à CENARIUM, reforçando o compromisso com a proteção ambiental e a evolução tecnológica.
“Na primeira versão, lançada em 2023, nossa autonomia era de apenas um ano. Desde então, evoluímos significativamente e, agora, alcançamos uma autonomia de cinco anos. Embora ainda não utilizemos a colheita de energia, essa transição de autonomia representa um avanço importante no processo. Além disso, outros progressos foram feitos ao longo desse período. Atualmente, estamos trabalhando para incluir, nesta nova versão, a capacidade de identificar focos de queimadas por meio de imagens. Também estamos trabalhando em uma aplicação do sistema, para a identificação da fauna, abrangendo aves, animais terrestres e outros. Essa funcionalidade permitirá a criação de módulos especializados nessa tarefa”, explicou o professor.
EVOLUÇÃO TECNOLÓGICA
Outra evolução significativa a ser destacada é que, em 2023, foi desenvolvido o primeiro protótipo do hardware do sistema. Desde então, foram implantadas versões mais robustas, que incorporam funcionalidades adicionais e utilizam plataformas de microcontroladores mais poderosos. Esse novo hardware oferece mais recursos
e, aliado às melhorias na parte de software, foi adaptado para atender às diferentes aplicações.
Entre as funcionalidades incorporadas, além da detecção sonora, estão outros sensores, maior capacidade de processamento e estratégias otimizadas para alcançar a autonomia de cinco anos. Esse resultado foi possível graças ao refinamento contínuo do projeto de hardware, que é fundamental para viabilizar essa durabilidade e eficiência energética.
IDENTIFICAR FOCOS DE QUEIMADAS
Sobre a identificação de focos de queimada na Amazônia, o professor destacou que estão sendo incorporados ao sistema sensores de fumaça e qualidade do ar, que possibilitam medir temperatura, umidade, partículas suspensas e gases como oxigênio e CO₂. Esses recursos são especialmente úteis em contextos de seca extrema, quando aumenta a demanda por monitoramento de áreas desmatadas e focos de incêndio. “O Curupira surge como uma ferramenta adicional para proteger o meio ambiente, fornecendo informações em tempo real”.
O professor explicou que o monitoramento por satélite, atualmente o método mais utilizado, apresenta algumas limitações, dentre elas o preço, informações geralmente repassadas após os eventos e a exigência de muitos recursos para atingir alta resolução ou frequência de varredura, especialmente em regiões como a Amazônia. Para um monitoramento detalhado e eficaz, seria necessário um número elevado de satélites de baixa órbita, o que torna o processo ainda mais caro.
As vantagens do Curupira operando na detecção desse problema é que ele opera com uma abordagem diferenciada e mais econômica, utilizando comunicação por rádio, sendo capaz de detectar eventos preliminares, como o som de motosserras ou um aumento na concentração de fumaça. Ao identificar esses sinais em tempo real, o sistema emite alertas automáticos, permitindo ações imediatas.
“Além disso, o Curupira pode ser integrado a serviços de satélite, solicitando imagens específicas da área de interesse no momento do alerta, ou ativar drones para
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/7939763d6710579c01c59684fe38d33b.jpeg)
“Estamos
trabalhando para incluir, nesta nova versão, a capacidade de identificar focos de queimadas por meio de imagens. Também estamos trabalhando em uma aplicação do sistema, para a identificação da fauna”
Raimundo Cláudio, professor doutor, coordenador do Laboratório de Sistemas Embarcados (LSE/ HUB) da Universidade do Estado do Amazonas (UEA).
Crédito: Luiz André Nascimento | Cenarium
sobrevoos e registros visuais detalhados. Essa combinação de tecnologias oferece uma solução mais ágil e eficaz para prevenir desmatamentos e queimadas, trazendo um impacto significativo na proteção do ecossistema”, completou.
Raimundo Cláudio esclareceu que a implementação do sistema que monitora os focos de incêndio está na fase de Deploy, a quarta etapa do projeto antes de chegar ao consumidor. Contudo, existem outras frentes de trabalho que devem chegar antes que esse sistema ao público.
PROJETOS PARA O FUTURO
O professor explicou que alguns projetos já devem estar prontos ainda este ano, alguns em parceria com outros órgãos do
Estado. O Curupira deve ser instalado na Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) do Uatumã, no município de São Sebastião do Uatumã, onde vai atuar no monitoramento de parte da reserva, que tem atuação de movelaria local.
“Dentro de algumas semanas, no máximo um mês, iniciaremos as primeiras visitas de campo, onde os módulos serão instalados. Essas visitas vão marcar o início dos estudos preliminares no local. Enquanto isso, já estamos trabalhando na preparação das unidades, que estão sendo configuradas para a implantação”, explicou.
Raimundo explicou também que o projeto segue um modelo de desenvolvimento em versões. A versão inicial, será implantada para a fase de testes. Com
base nos dados e resultados preliminares obtidos, serão disponibilizadas as versões subsequentes, ajustando e aprimorando o sistema conforme necessário. “Ainda não realizamos visitas ao local devido à severidade da última seca, que impossibilitou o acesso à área. No entanto, com a situação mais favorável, daremos início às atividades diretamente na comunidade”.
A implantação efetiva do sistema está prevista para ocorrer na fase final do projeto, com conclusão estimada até o final de 2025.
Outro projeto para este ano, ainda, é o monitoramento da fauna na Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Rio Amapá, no município de Manicoré. Esse projeto acontece a pedido da Fundação
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/6777d07588f7301a5e6909bd7fddaed1.jpeg)
Dispositivo do sistema Curupira durante um teste
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/497a5b5b96437ae509d3406d483b5bb5.jpeg)
Amazônia Sustentável (FAS) e já foi iniciado com a equipe da fundação, mas as visitas em campo devem acontecer no mês de fevereiro. O projeto tem previsão para ser concluído até maio.
“Estamos na etapa que envolve a definição e identificação das espécies e animais que serão monitorados, além da coleta dos padrões sonoros característicos desses animais. Esses padrões serão catalogados para, em seguida, realizarmos a integração do modelo de identificação ao sistema Curupira”, disse.
Atualmente, não há áreas monitoradas, pois o projeto ainda não alcançou a fase de implantação definitiva, alguns desenvolvimentos e ajustes estão sendo programados. Mas as primeiras áreas monitoradas serão a região de Manicoré e em São Sebastião do Rio Uatumã.
“Além disso, em parceria com o CMA [Comando Militar da Amazônia], serão instaladas algumas unidades na área de treinamento do Cigs [Centro de Instrução de Guerra na Selva]. Essas unidades, no entanto, terão foco em testes e ajustes do sistema. Até o final deste ano, esperamos ter, pelo menos, duas áreas monitoradas de forma clara e funcional, marcando o início da operação efetiva do projeto”, explicou Raimundo Cláudio.
Raimundo também comentou que algumas empresas e parceiros têm procurado o programa para o desenvolvimento de projetos, e já existe um diálogo com diversas pessoas e organizações para viabilizar o financiamento necessário para expandir os testes de campo e realizar Deploy em novas áreas, explorando outras finalidades do sistema. E também para que esses projetos sirvam como crédito de carbono.
“É PRECISO VIVENCIAR”
O coordenador do Laboratório de Sistemas Embarcados (LSE/HUB) da Universidade do Estado do Amazonas (UEA), professor doutor Raimundo Cláudio, afirma que monitorar a Amazônia não é uma tarefa fácil, considerando todas as especificidades que a floresta apresenta.
“Reconheço a competência de grandes instituições no Brasil, como a USP [Universidade de São Paulo] e outras, mas ressalto que, além da capacidade técnica, é fundamental conhecer a realidade da nossa região. Não basta apenas visitá-la uma vez; é preciso vivenciar a região para compreender seus desafios e peculiaridades. Somente assim é possível desenvolver soluções realmente eficazes”, ressaltou o coordenador.
Crédito: Reprodução | UEA
Dispositivo do sistema Curupira sendo instalado para testes
Crédito: Composição De Élio Lima | Cenarium
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/576d5f4ff679f9b9b37b49a4e60e22d9.jpeg)
Prefeitos à direita
Maioria dos chefes do Executivo de capitais da Amazônia Legal são alinhados a perfil conservador
Jadson Lima – Da Cenarium
MANAUS (AM) – Cinco dos nove prefeitos de capitais da Amazônia Legal que tomaram posse em 1º de janeiro de 2025 foram reconduzidos aos cargos nas últimas eleições municipais, ocorridas em outubro de 2024. A CENARIUM fez um levantamento sobre o perfil dos mandatários das cidades, onde vivem mais de 7 milhões de habitantes, e sete deles são ligados à direita e dois ao chamando ‘Centrão’, como ficou conhecido o grupo de partidos que não tem uma orientação ideológica bem definida, mas se une para garantir seus interesses.
Dos prefeitos que foram reeleitos, três fizeram alianças com siglas consideradas de direita, um concorreu pelo Partido Liberal (PL) e o quinto teve na composição da chapa legendas de centro. Já entre os prefeitos que concorreram fora do cargo, três buscaram siglas de direita para compor as candidaturas, e um deles não fez alianças e concorreu por um partido de centro.
A CENARIUM consultou especialistas para analisar o que levou a região a votar mais em políticos inclinados para a direita. O advogado e cientista político Helso Ribeiro atribuiu o crescimento de candidaturas de direita ao crescimento da extrema-direita no País. Já o cientista político Davidson Cavalcante pontuou que a eleição de figuras desse campo ideológico pode impactar em ações ambientais. Para o levantamento sobre o perfil dos nove prefeitos de capitais dos Estados da Amazônia Legal, a CENARIUM considerou os dados divulgados pela Consultoria Nexus em outubro de 2024. Conforme a consultoria, são partidos de esquerda o PCdoB, PDT, PSB, PT, PV e Rede. Entre as siglas consideradas de centro estão o Agir, Avante, MDB, Mobiliza, PMB, Podemos, PP, PSD e Solidariedade. As legendas alinhadas com a direita são: PL, Democracia Cristã, Novo, PR, PRTB, PSDB, Republicanos e União Brasil.
Um dos prefeitos reeleitos concorrendo por uma sigla de direita é o de Rio Branco (AC), Tião Bocalom (PL). Além do PL, a coligação vitoriosa nas urnas teve o apoio dos partidos União Brasil, Progressistas, Podemos e a Federação PSDB-Cidadania. Em entrevista concedida à CNN Brasil após a reeleição, o prefeito da capital do Acre fez uma série de elogios ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), uma das principais figuras da direita no País.
“A minha identificação com Jair Bolsonaro foi logo de cara, porque ele teve uma postura como presidente da República muito parecida com aquilo que eu sempre sonhei, sempre tive […] A outra questão é a questão de defender a bandeira do patriotismo. Eu não abro mão disso”, afirmou o prefeito da capital acriana.
David Almeida (Avante), prefeito reeleito de Manaus, também foi um dos que se aliaram a siglas de direita para concorrer a um novo mandato, apesar de ter no palan-
Os prefeitos eleitos e reeleitos das capitais da Amazônia Legal
que os senadores Eduardo Braga (MDB) e Omar Aziz (PSD), mais alinhados ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Durante a campanha eleitoral, o político manteve o discurso religioso e conservador.
“Quando Deus olha para um homem e quando um homem vê em outro homem, um pastor, Deus enxerga nele um rei. Quando os homens viam em mim um cabo eleitoral [em 1996], Deus já tinha me visto prefeito”, disse Almeida durante a convenção que oficializou o nome dele à reeleição.
Além de Almeida, os prefeitos reeleitos em Boa Vista (RR) e Macapá (AP), Arthur Henrique e Dr. Furlan, respectivamente, ambos do MDB, também tiveram siglas de direita compondo as candidaturas. Na capital de Boa Vista, o candidato a vice-prefeito, tenente-coronel Marcelo Zeitoune, foi indicado pelo PL. Já a candidatura de Dr. Furlan teve na composição da chapa o partido PRD.
O único prefeito reeleito que não fez composição com siglas de direita foi Eduardo Braide (Podemos). O prefeito de São
Tião Bocalom, prefeito de Rio Branco, durante encontro com Jair Bolsonaro
Luís, capital do Maranhão, contou com o apoio do Republicanos e do MDB, além do seu partido, o PSD. Todas as siglas são consideradas de centro pelo levantamento da Nexus.
ALIANÇAS DOS ELEITOS
Três dos quatro prefeitos que concorreram ao cargo pela primeira vez também se aliaram ou concorreram por siglas de direita nas eleições municipais de 2024. Em Cuiabá, capital de Mato Grosso, o candidato bolsonarista Abilio Brunini (PL) foi eleito com o apoio direto da família Bolsonaro e figuras expoentes da direita brasileira, como o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG). Após a eleição, ele pregou união.
“Cuiabá é uma só. Os problemas de Cuiabá atingem todos nós. O buraco da cidade não escolhe lado, ele atinge a esquerda e a direita. O sofrimento que a gente tem nas UPAs (Unidades de Pronto-Atendimento) não tem lado ideológico. Faltam remédios e faltam serviços tanto para o pessoal da direita quanto para o
“Eu observo que
houve um crescimento da extrema-direita no Brasil e, com isso, a palavra direita acabou gerando uma espécie de uso inflacionário. Então, todo mundo agora é de direita para ficar bem na foto”
Helso Ribeiro, advogado e cientista político.
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b0acd06c8cebf3bc8ce9decab32342b6.jpeg)
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/6d69fd7565a10f266120fe8dc716c06f.jpeg)
“Aproximidade com figuras como o ex-presidente Jair Bolsonaro sugere que pautas conservadoras, como segurança pública, defesa de valores tradicionais e menor intervenção estatal na economia, podem ganhar destaque nas agendas desses gestores”
Davidson Cavalcante, cientista político e sociólogo.
pessoal da esquerda. Vamos ter que juntar forças com todos, o apoio dos eleitores do lado de lá e do lado de cá”, disse em discurso.
Pertencente ao clã Barbalho em Belém, Igor Normando (MDB), foi outro político que contou com o apoio de legendas como o União Brasil, PRD, além do Cidadania, que faz federação com o PSDB. Apesar da aliança com siglas de direita, Normando não teve o apoio do clã Bolsonaro e teve que enfrentar o candidato do grupo político do ex-presidente, que fez campanha para o deputado federal Éder Mauro (PL).
Caso semelhante ocorreu em Palmas, capital do Tocantins. O então candidato Eduardo Siqueira (Podemos) reuniu no seu entorno partidos considerados de direita, mas enfrentou uma candidata do partido de Jair Bolsonaro, o PL. Apesar do apoio, o candidato, que já havia governado a cidade entre 1993 e 1997, venceu a disputa no segundo turno.
Já na capital de Rondônia, Porto Velho, Leo Moraes (Podemos) não reuniu outras siglas em torno da sua candidatura e concorreu pelo Podemos, uma legenda considerada de centro, segundo a consultoria
Nexus. A adversária dele, candidata Mariana Carvalho (União Brasil), teve o apoio de 12 siglas.
CRESCIMENTO DA EXTREMA-DIREITA
Para o advogado e cientista político Helso Ribeiro, o impulsionamento de candidaturas de direita na Amazônia Legal está ligado ao crescimento da extrema-direita no País. O especialista explicou que as ações desenvolvidas no âmbito municipal são de governo, não ideológicas. Mas, para ele, os políticos precisaram adequar o posicionamento para garantir votos de eleitores que passaram a se identificar com figuras desse campo ideológico, como o ex-presidente Jair Bolsonaro.
“Construir uma creche, tapar um buraco, botar árvores nas ruas, tratar do pavimento público, das calçadas. Isso não é esquerda, nem direita. Isso é ação de governo. Agora, eu observo que houve um crescimento da extrema-direita no Brasil e, com isso, a palavra direita acabou gerando uma espécie de uso inflacionário. Então, todo mundo agora é de direita para ficar bem na foto”, disse.
O cientista político destacou que o perfil ideológico dos mandatários não influencia na tomada de decisões, caso tenham uma visão social. “Se a pessoa tiver no Executivo com uma visão social, ela vai realizar atos que vão tocar as pessoas carentes. Ela não precisa ser de esquerda ou de direita para isso. Uma creche não é ser de direita ou esquerda, tapar um buraco na rua não é ser de direita ou esquerda”, frisou.
O especialista também afirmou que o conservadorismo atualmente é fruto da propaganda de uma onda que nem sempre corresponde aos fatos e ao comportamento de quem a propaga. “Agora, o fato desse discurso conservador existir, não significa que quem é de esquerda não seja conservador, nem que quem é de direita seja sempre conservador”, disse.
REELEIÇÃO DE PREFEITOS
Para Helso, a reeleição da maioria dos prefeitos das capitais da Amazônia Legal pode estar condicionada às ações desenvolvidas pelos mandatários no primeiro mandato. O especialista frisou que as entregas realizadas nos dois últimos anos do primeiro governo favorecem quem está no
Abilio Brunini, prefeito de Cuiabá, com o deputado federal Nikolas Ferreira Crédito: Divulgação
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/d10cd8992245426437d126fea4c2f0b4.jpeg)
poder, ao contrário de um candidato que não tem a administração.
“Quem está com o poder nas mãos, no Executivo, tem obras para mostrar, porque está com a máquina administrativa. E isso acabou facilitando, de certa forma, a reeleição. Aí o eleitor quer ver o final da obra concluída e aplaude a ação que foi feita, normalmente, entregue no final do governo nos dois últimos anos para ficar marcado na mente da população”, concluiu.
CONSERVADORISMO
O cientista político e sociólogo Davidson Cavalcante afirma que a inclinação conservadora entre prefeitos das capitais dos Estados da Amazônia Legal reflete o contexto social e cultural com as demandas do eleitorado local. Conforme o especialista, a religiosidade, a busca por estabilidade e a rejeição ao “sistema” são fatores que explicam a eleição dessas figuras.
“A influência de grupos evangélicos e católicos fortalece candidatos que defendem pautas morais e tradicionais, como a valorização da família e a oposição a agendas progressistas. [Por outro lado], em um cenário de crises econômica e social, o discurso conservador, frequentemente associado à ordem e à segurança, atrai eleitores que buscam respostas imediatas.
[E, por fim], a narrativa contra a corrupção e privilégios políticos é bem recebida, mesmo quando não há comprovação de que os candidatos conservadores consigam concretizar essas promessas”, disse.
Cavalcante também menciona que a proximidade dos mandatários com o discurso de direita aponta que pautas conservadoras podem ganhar destaque nas agendas dos gestores. “A proximidade com figuras como o ex-presidente Jair Bolsonaro sugere que pautas conservadoras, como segurança pública, defesa de valores tradicionais e menor intervenção estatal na economia, podem ganhar destaque nas agendas desses gestores”, frisou.
IMPACTOS AMBIENTAIS
Cavalcante também pontua que prefeitos que adotam discursos favoráveis à flexibilização de regulamentações ambientais podem tanto atrair setores como o agronegócio e a mineração quanto se tornarem alvos de críticas de movimentos ambientalistas. Para ele, o atual cenário político pode ser marcado por tensões entre interesses econômicos e demandas ambientais.
“A Região Norte, em particular, tem uma forte relação com questões ambientais. Prefeitos alinhados com discursos de flexibilização de regulamentações ambientais podem enfrentar críticas de movimentos sociais e ambientais, mas também podem atrair setores, como o agronegócio e a mineração”, concluiu.
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/98589ff3ffbeff9b2aaccc5e3ec73972.jpeg)
O prefeito de Manaus, David Almeida, já declarou ser apoiador de Jair Bolsonaro
O prefeito de Belém, Igor Normando, ao lado do governador do Pará, Helder Barbalho
Crédito: Divulgação
Crédito: Divulgação
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/d4e4202e4c56e1dfbd91df0c56ba77ba.jpeg)
Ato pela democracia
‘Ainda estamos aqui’: Lula discursa em evento de dois anos do 8/1, relembrando a tentativa de golpe de Estado e os ataques aos Três Poderes
Da Cenarium*
BRASÍLIA (DF) – “Hoje é dia de dizermos em alto e bom som: ainda estamos aqui. Estamos aqui para dizer que estamos vivos e que a democracia está viva, ao contrário do que planejavam os golpistas de 8 de janeiro de 2023”. Com essas palavras, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva iniciou seu discurso em ato no Palácio do Planalto, no dia 8 de janeiro deste ano, para marcar os dois anos da tentativa frustrada de golpe de Estado em 2023.
A frase inicial faz uma referência ao filme “Ainda estou aqui”, dirigido por Walter Salles e estrelado por Fernanda Torres –ganhadora do Globo de Ouro – sobre a trajetória de Eunice Paiva durante a ditadura militar, após ter o marido, Rubens Paiva, preso e assassinado pelo regime. A cerimônia no Planalto contou com a presença de ministros, parlamentares, governadores e representantes dos Três Poderes, além dos comandantes das Forças Armadas, a quem
o presidente fez questão de agradecer pela participação.
“Estamos aqui para lembrar que, se estamos aqui, é porque a democracia venceu. Caso contrário, muitos de nós talvez estivéssemos presos, exilados ou mortos, como aconteceu no passado, e não permitiremos que aconteça outra vez”, prosseguiu Lula.
Em uma cerimônia anterior, o presidente recebeu de volta 21 obras de arte e peças do acervo cultural do Palácio do
Presidente discursou em ato contra o golpismo no Palácio do Planalto
Crédito: Lula Marques | Agência Brasil
Planalto, que haviam sido vandalizadas pelos invasores no dia 8 de janeiro de 2023, dentre elas, um relógio suíço do século XVIII que pertenceu a Dom João VI e a icônica pintura As Mulatas, de Di Cavalcanti.
Após a cerimônia no Salão Nobre do Planalto, Lula e as autoridades desceram a rampa do palácio para um ato na Praça dos Três Poderes batizado de Abraço da Democracia, com a presença de populares e movimentos sociais.
OBRA EM CONSTRUÇÃO
Ainda em seu discurso em defesa da democracia, Lula falou que esse regime é uma obra em construção, e precisa ser uma realidade para todas as pessoas, além do discurso.
“Democracia para poucos não é democracia plena. Por isso, a democracia será sempre uma obra em construção. A democracia será plena quando todas e todos os brasileiros, sem exceção, tiverem acesso à alimentação de qualidade, saúde, educação, segurança, cultura e lazer”, observou.
Lula seguiu destacando a necessidade de construir um país mais justo, especialmente para as minorias sociais oprimidas do País.
“A democracia será plena quando todos e todas sejam, de fato, iguais perante à lei, e a pele negra não seja mais alvo da truculência dos agentes do Estado. Quando os povos indígenas tiverem direito às suas terras, suas culturas e suas crenças. Quando as mulheres conquistarem igualdade de direitos, e o direito de estar onde quiserem estar, sem serem julgadas, agredidas ou assassinadas”, afirmou.
INVESTIGAÇÃO E PUNIÇÃO
Sobre a tentativa de golpe de Estado e as investigações que apontam uma trama para assassiná-lo, assassinar o vice-presidente Geraldo Alckmin e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, o presidente Lula voltou a cobrar punição e pregar direito de defesa.
“Os responsáveis pelo 8 de janeiro estão sendo investigados e punidos. Ninguém foi ou será preso injustamente. Todos pagarão pelos crimes que cometeram, inclusive os que planejaram os assassinatos do presidente, do vice-presidente da República e do presidente do Tribunal Superior Eleitoral”, disse.
(*) Com informações da Agência Brasil.
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/90355ac43583245cc01a24d8e76f4dbc.jpeg)
“Estamos aqui para lembrar que, se estamos aqui, é porque a democracia venceu.
Caso contrário, muitos de nós talvez estivéssemos presos, exilados ou mortos, como aconteceu no passado, e não permitiremos que aconteça outra vez”
Luiz Inácio Lula da Silva, presidente do Brasil.
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/655bed0487c7befffb2d0b3b3190ff02.jpeg)
Ato marca os dois anos da tentativa frustrada de golpe de Estado em 2023
Cerimônia contou com a presença de ministros, parlamentares, governadores e representantes dos Três Poderes
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/151d842944fedaa650d1f22664950c07.jpeg)
2025: desafios para gestores
A pauta ambiental e climática é imprescindível na agenda das gestões municipais
Vinicius Raduan – Especial para a Cenarium**
PORTO VELHO (RO) – Ao assumirem seus mandatos, os prefeitos e prefeitas dos Estados da Amazônia Legal enfrentam desafios ambientais e sociais cada vez mais críticos e complexos. Estes são intensificados por crises ecológicas, conflitos socioambientais e pela mudança climática.
A região, que abrange nove Estados (Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins), foi marcada por uma série de emergências ambientais em 2024, como queimadas, desmatamento apressado, secas históricas e inundações extremas.
Essas situações vêm afetando diretamente a qualidade de vida das comunidades e comprometendo atividades
econômicas vitais para a região, como a agricultura e o ecoturismo.
No entanto, apesar das legislações existentes para a proteção ambiental e combate às mudanças climáticas, a ausência de regulamentação eficaz de políticas de governança climática e de biodiversidade nos âmbitos municipais e estaduais limita a capacidade de ação dos gestores locais.
ATRASO
A Amazônia Legal, por sua vastidão e complexidade ambiental, exige um compromisso rigoroso com a regulamentação de políticas de governança climática e de serviços ambientais. Em Estados como Rondônia, Pará e Mato Grosso, a falta de regulamentação para o controle do desmatamento e incentivo a créditos de
carbono tem impactado severamente a capacidade de desenvolver políticas que possam captar recursos para mitigar os efeitos das mudanças climáticas.
A regulamentação de tais políticas poderia gerar receitas substanciais para os municípios, viabilizando iniciativas de combate a incêndios florestais, financiamento de brigadistas, instalação de poços artesianos, monitoramento ambiental e outras ações necessárias para fortalecer a resiliência climática. No entanto, sem essa regulamentação, a Amazônia Legal sofre com a perda de oportunidades econômicas e o agravamento de crises socioambientais.
NEGACIONISMO
O negacionismo climático, ainda presente em diversas esferas políticas e sociais
A região da Amazônia em tons de amarelo e vermelho
Crédito: Composição Paulo Dutra | Cenarium
na Amazônia Legal, representa uma barreira significativa para a implementação de políticas ambientais eficazes. Esta postura contribui para a aceleração de práticas devastadoras, como a exploração predatória de madeira, mineração ilegal e ocupação de áreas de proteção ambiental, que resultam em danos ambientais de grande magnitude.
A destruição de ecossistemas, como florestas primárias e territórios indígenas, tem exacerbado os eventos climáticos extremos, como secas prolongadas e enchentes devastadoras, que ameaçam tanto as comunidades locais quanto a biodiversidade.
Ademais, a exploração predatório-destrutiva compromete a capacidade da floresta amazônica de agir como um regulador do clima, agravando os efeitos das mudanças climáticas.
A consequência direta é uma perda acentuada de produtividade agrícola, especialmente para as culturas tradicionais que dependem de um regime climático equilibrado.
A insegurança alimentar torna-se uma realidade em várias regiões, já que a variabilidade climática afeta a produção local e eleva os preços dos alimentos, impactando especialmente as populações mais vulneráveis e na segurança alimentar de muitos grupos.
GOVERNANÇA
As auditorias realizadas por órgãos como o Tribunal de Contas da União (TCU) e os Tribunais de Contas Estaduais nos Estados da Amazônia Legal têm revelado falhas graves nos sistemas de monitoramento e prevenção de práticas insustentáveis.
Os levantamentos expõem as consequências da falta de regulamentação de políticas ambientais, mas também a fragilidade na governança local para enfrentar crises ambientais recorrentes.
As queimadas, por exemplo, têm colocado Estados como Mato Grosso, Pará e Rondônia em estado de calamidade, com a poluição do ar atingindo níveis perigosos e levando ao aumento de problemas respiratórios e outros problemas de saúde pública.
Para que essas auditorias se traduzam em ações concretas, é fundamental que os prefeitos da Amazônia Legal trabalhem de maneira coordenada com os Tribunais de
“A criação
de conselhos ambientais, planos de manejo florestal e programas de educação ambiental para as comunidades são passos essenciais para que os municípios fortaleçam a governança local e previnam crises futuras”
Vinicius Valentin Raduan Miguel, coordenador do Grupo de Pesquisa e Intervenção em Direitos Humanos – Mapinguari, professor da Universidade Federal de Rondônia.
Contas e especialistas, e adotem medidas robustas de gestão ambiental.
A criação de conselhos ambientais, planos de manejo florestal e programas de educação ambiental para as comunidades são passos essenciais para que os municípios fortaleçam a governança local e previnam crises futuras.
CRISE HÍDRICA
A Amazônia Legal, embora possua uma das maiores reservas hídricas do mundo, enfrenta graves desafios relacionados ao abastecimento de água e saneamento básico.
A crise hídrica, que tem se agravado em regiões como o Acre, o Amazonas e Rondônia, expôs as limitações das políticas de gestão de água, especialmente em comunidades ribeirinhas e áreas rurais isoladas.
A falta de acesso à água potável e a ausência de tratamento de esgoto são problemas que ameaçam a saúde pública, intensificam as desigualdades sociais e comprometem a saúde coletiva de forma transgeracional.
A implementação do Marco Regulatório do Saneamento Básico (Lei n.º 14.026/2020), que determina universalizar o acesso a esses serviços até 2033, deve ser uma prioridade para os prefeitos dos Estados da Amazônia Legal.
Contudo, para alcançar essa meta, é imprescindível que os gestores municipais invistam em infraestrutura básica de saneamento e em sistemas de tratamento de água.
O desenvolvimento de políticas sustentáveis para a proteção dos recursos hídricos
e a conscientização da população sobre o uso responsável da água são igualmente essenciais para enfrentar o desafio da crise hídrica.
SUSTENTABILIDADE
O crescimento desordenado das áreas urbanas e a expansão das fronteiras agrícolas na Amazônia Legal sobre áreas protegidas aumentam a pressão sobre os recursos naturais e agravam problemas como a erosão do solo e a perda de biodiversidade.
A adoção de políticas baseadas nos princípios de Governança Ambiental é essencial para promover um desenvolvimento sustentável na região.
A integração dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU nas agendas municipais pode ser um guia e protocolo para os gestores e gestoras locais, especialmente em áreas de grande vulnerabilidade socioambiental.
O compromisso com a sustentabilidade não admite mais adiamentos. Adiar o debate e a adoção de boas práticas só implicará em mais danos socioambientais, redução de ativos futuros, comprometendo ainda mais o equilíbrio da Amazônia.
(*) Vinicius Valentin Raduan Miguel é graduado em Direito e em Ciências Sociais. É mestre pela Universidade de Glasgow (Escócia), doutor pela UFRGS. Atualmente, coordena o Grupo de Pesquisa e Intervenção em Direitos Humanos – Mapinguari e atua como professor da Universidade Federal de Rondônia.
(*) Este conteúdo é de responsabilidade do autor.
Brasil indígena
Amazônia Legal concentra 19 das 20 cidades com mais localidades indígenas, aponta Censo do IBGE
Ana Cláudia Leocádio – Da Cenarium
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/7c7981270206a80163c4fec01ff957c6.jpeg)
BRASÍLIA (DF) – Dos 20 municípios com o maior número de localidades indígenas no Brasil, 19 estão localizados na Amazônia Legal, sendo seis no Amazonas, quatro em Roraima e no Maranhão, três no Pará, um em Mato Grosso e um em Tocantins. É o que mostra o resultado do “Censo Demográfico 2022: Indígenas – Principais características das pessoas e dos domicílios”, divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O IBGE considera localidade indígena “todo lugar no território nacional onde exista um aglomerado permanente de habitantes indígenas”. Em 2022, o Censo identificou 8.568 localidades indígenas no País, a maioria concentrada na Região Norte com 5.158 (60,20%) localidades, seguida do Nordeste, com 1.764 (20,59%), Centro-
-Oeste, com 1.102 localidades (12,86%), Sul, com 308 (3,59%) registros e o Sudeste com 236 (2,75%).
O Estado do Amazonas concentra o maior número de localidades, com 2.571 aglomerados, que correspondem a 30% dos registrados em todo o País. O município de São Gabriel da Cachoeira, no Alto Rio Negro, lidera a quantidade de localidades, com 505 identificadas. Em seguida, vem Autazes (109), Barcelos (101), Santa Isabel (97), Lábrea (89) e Atalaia do Norte (87).
O município de Alto Alegre, no Estado de Roraima, é o segundo entre os 20 com o maior número de localidades indígenas, com 168 registros. Em terceiro está Jacareacanga, no Pará (167), em quarto Amarante do Maranhão (148) e, em quinto, Campinápolis (143), em Mato Grosso.
O Estado de Mato Grosso ocupa o segundo lugar em número de localidades, com 924, ou seja, 10,78% de todo o País. O Pará vem em terceiro, com 869 (10,14%), seguido do Maranhão, com 750 (8,75%).
Quando consideradas as localidades fora de Terras Indígenas, o Amazonas também lidera, com 1.078 identificadas (41,93%). Pernambuco vem em segundo, com 237 (56,97%), seguida do Pará, com 187 (21,52%), Ceará, com 159 (79,50%), e Bahia, com 138 (68,32%).
MAIS INDÍGENAS EM SITUAÇÃO URBANA
O Censo também mostrou um crescimento de 88,96% da população indígena no País, que saiu de 896.917 pessoas, em 2010, para 1.694.836 indivíduos, em 2022. Desse total, 1.227.642 se identificaram por cor ou
Indígenas sobre o mapa da Amazônia Legal
Crédito: Composição de Paulo Dutra CENARIUM | Fernando Frazão | Agência Brasil
raça indígena, enquanto 467.194 se autodeclararam como tal. Dos 5.570 municípios brasileiros, 4.833 têm população indígena.
Um dado que chamou a atenção no levantamento foi o aumento da proporção de população indígena vivendo em situação urbana, que alcançou 53,97%, totalizando 914.746 pessoas, em 2022. No Censo 2010, esse contingente urbano era de 36,2% (324.834 moradores) contra 63,78% (572.083 pessoas) em situação rural, segundo explicações dos técnicos do IBGE, durante apresentação dos resultados em transmissão on-line.
Conforme os técnicos, entre um Censo e outro, além da melhoria das ferramentas de coleta de dados do IBGE, ocorreu ainda uma ampliação da população indígena, tanto urbana quanto rural, como também aumentou o número de autodeclarações das pessoas como indígenas.
“Destaca-se o Estado do Amazonas, onde 59 (95,16%) dos 62 municípios, que abrigam quase um terço da população indígena do País tiveram perda percentual de população rural”, informa o IBGE. Em Roraima, 11 dos 15 municípios também apresentaram redução dessa população, enquanto no Acre houve queda em 15 dos 22 municípios do Estado.
No total, 13 Unidades da Federação registraram a maioria da população indígena que mora nas áreas urbanas. O Estado de Goiás registrou os maiores percentuais, com 95,52%, seguido do Rio de Janeiro (94,59%) e do Distrito Federal (91,84%).
Já os Estados com as maiores proporções de pessoas indígenas residindo em áreas rurais foram Mato Grosso (82,66%), Maranhão (79,54%) e Tocantins (79,05%).
O IBGE também identificou os indígenas residindo dentro e fora de terras demarcadas. Das 8,5 mil localidades indígenas contabilizadas, “6.130 (71,55%) estavam situadas em terras indígenas declaradas, homologadas, regularizadas ou encaminhadas como reservas indígenas na data de referência do Censo, enquanto 2.438 (28,45%) localidades encontravam-se fora dessas áreas”.
Os maiores contingentes de indígenas residindo fora de terras declaradas, homologadas, regularizadas ou encaminhadas como reservas indígenas, foram registrados nas regiões Sul, Sudeste e Nordeste.
A Região Sul registrou o maior percentual, 47,4%, onde 146 das 308 localidades existentes na região se enquadravam nessa situação. Para os técnicos do instituto, isso reflete a defasagem nos processos de regularização desses territórios. Conforme o Censo 2022, no Estado do Rio Grande do Sul, esse índice chegou a 58,93% da população indígena fora de suas terras.
Essa migração também ocorre nos Estados da Região Norte, mesmo que em menor escala, segundo o IBGE, principalmente nos municípios na Calha do Rio Amazonas e no entorno das rodovias Cuiabá-Belém e Belém-Brasília, que registraram principais pontos de concentração de indígenas em áreas urbanas.
“O Censo 2022 mostra que, mesmo residindo em áreas urbanas e fora de seus territórios oficialmente reconhecidos, a população indígena tem menor acesso aos serviços de saneamento básico que o conjunto da população do País”
Marta Antunes, coordenadora do Censo de Povos e Comunidades Tradicionais do IBGE.
O Censo 2002 traz ainda o recuo da taxa de analfabetismo da população indígena de 23,40% para 15,05%. Nas áreas rurais, essa taxa caiu de 32,16% para 20,80%, enquanto para os indígenas em áreas urbanas, essa taxa recuou de 12,29% para 10,86%.
Entre os indígenas que residem em terras regularizadas, a redução da taxa de analfabetismo foi de 11,4%, a maior identificada pelo IBGE, caindo de 32,3% para 20,8%, de 2010 para 2022. No mesmo período, a taxa de analfabetismo da média da população do País recuou de 9,62% para 7%.
O IBGE também identificou que, em 2022, 97,28% da população urbana do País morava em domicílios conectados à rede geral de abastecimento de água ou a poço, fonte, nascente ou mina canalizada até dentro do domicílio. Entre os indígenas residentes em áreas urbanas, esse percentual chegou a 89,92%. Isso significa que 13,33% da população indígena em área urbana vivia uma realidade de precariedade no acesso à água, enquanto a média da população urbana do País era de 2,72%.
A situação piora quanto ao esgotamento sanitário, uma vez que apenas
59,24% da população indígena residindo em áreas urbanas e fora das terras indígenas tinham acesso a esse tipo de saneamento básico em 2022. No território nacional, o percentual é de 83% da população residente em domicílios conectados à rede geral ou pluvial de esgoto, ou com fossa séptica, ou fossa filtro, consideradas condições adequadas. Quanto à precariedade da destinação do lixo, a proporção de indígenas é de 5,83%, ou seja, quatro vezes superior à da população urbana do País, de 1,43%.
Na avaliação da coordenadora do Censo de Povos e Comunidades Tradicionais do IBGE, Marta Antunes, “os povos tradicionais residindo em territórios remotos, com predominância em áreas rurais não poderiam apresentar os mesmos percentuais de acesso ao saneamento básico que a média da população do País”.
“No entanto, o Censo 2022 mostra que, mesmo residindo em áreas urbanas e fora de seus territórios oficialmente reconhecidos, a população indígena tem menor acesso aos serviços de saneamento básico que o conjunto da população do País”, explicou.
Educação e saneamento
2.571
O Amazonas concentra o maior número de localidades, com 2.571 aglomerados, que correspondem a 30% dos registrados em todo o País. O município de São Gabriel da Cachoeira, no Alto Rio Negro, lidera a quantidade de localidades, com 505 identificadas.
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/d3f376b5f8155ecdc5142ce6a3bfdee2.jpeg)
CENSO RETRATA POPULAÇÃO
8.568
Total de localidades indígenas no País
5.158 localidades 2.571 aglomerados
Maior concentração Região Norte - 60,20%
Maior concentração por Estado Amazonas - 30%
4.833
Municípios com população indígena (de um total de 5.570 municípios brasileiros)
914.746
Indígenas vivendo em situação urbana 53,97% do total
1.694.836
Total de indígenas no Brasil aumento de 88,96% em relação a 2010, quando a população indígena era de 896.917 indivíduos.
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/8378a05b12bc64d72d9b3f2e65e3ca9f.jpeg)
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/7f1bd615e87155c91123db3a7a2f6f8e.jpeg)
Crédito: Reprodução IBGE
Crédito: Reprodução IBGE
88,96%
O Censo mostrou um crescimento de 88,96% da população indígena no País, que saiu de 896.917 pessoas, em 2010, para 1.694.836 indivíduos, em 2022.
Outros achados do Censo 2022 sobre a população indígena
Em 2022, o Brasil tinha cerca de 72,5 milhões de domicílios particulares permanentes, com 2,79 moradores por domicílio. A média de moradores em terras indígenas era de 4,59 pessoas. Nos domicílios particulares permanentes dentro de terras indígenas e em situação rural, essa média é um pouco maior: 4,63 pessoas.
A idade mediana da população indígena urbana fora de terras indígenas é de 32 anos. Já a população indígena rural dentro de terras indígenas tem idade mediana de 18 anos.
A população masculina supera a feminina em vários recortes, chegando a 106,65 homens para cada 100 mulheres em áreas rurais fora de terras indígenas. Em áreas urbanas fora de terras indígenas, a razão de sexo dos indígenas (89,37 homens para cada 100 mulheres) é menor que a da população urbana do País (91,97 homens para cada 100 mulheres).
As crianças indígenas com até 5 anos que residem fora das terras indígenas em situação rural apresentam a segunda maior proporção de existência de registros de nascimento de cartório ou Registro Administrativo de Nascimento de Indígena (Rani) com 96,74%, sendo o registro de nascimento em cartório responsável por 93,33% dos registros de nascimento com 91,97% dos registros de nascimento desse subgrupo indígena.
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/453328aa01ba2b04722c5f64fba84436.jpeg)
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/453328aa01ba2b04722c5f64fba84436.jpeg)
Crédito: Reprodução Águas de Manaus
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/f74d95aa14041ea36821d311e7e1d5df.jpeg)
Sede de dignidade
Acesso à água tratada garante direitos a comunidades indígenas de Manaus
Maria Eduarda Furtado e Jadson Lima – Da Cenarium
MANAUS (AM) – Em defesa de direitos básicos e na busca por melhorias de infraestrutura, povos indígenas, como os que vivem no Parque das Tribos — o maior bairro indígena do Brasil em processo de homologação —, localizado no bairro Tarumã-Açu, Zona Oeste de Manaus, lutaram por anos para ter acesso à água tratada. A comunidade é uma das oito localizadas em diferentes zonas da capital amazonense que agora possuem o serviço de abastecimento, beneficiando cerca de 11 mil pessoas.
Eliza Sateré, uma das lideranças do Parque das Tribos, afirma que o abastecimento de água tratada era um problema diário e, para conseguir realizar atividades de rotina,
os moradores dependiam de auxílio fora da comunidade. “A gente dependia da água dos outros. Lembro que a gente ia para uma outra comunidade ao lado para pegar água, carregar em baldes, em garrafões dentro do carro, ou então a gente tinha que descer ali na área de reserva. Descíamos as ribanceiras para a gente usar a água das nascentes”, destaca.
Além do Parque das Tribos, onde vivem cerca de 1.000 famílias de 35 etnias, outras comunidades onde se concentram indígenas em situação urbana de Manaus também recebem água encanada por meio da Águas de Manaus, a concessionária do serviço de água na cidade. A CENARIUM apurou que se tratam das comunidades Parque
das Nações Indígenas e Waikiru e Sateré, localizadas nos bairros Tarumã e Redenção, nas zonas Oeste e Centro-Oeste.
Na Zona Norte da capital amazonense, cerca de 5,1 mil indígenas moradores das comunidades Nova Vida e Sol Nascente, localizadas nos bairros Nova Cidade e Cidade de Deus, respectivamente, também recebem água direto da torneira. A comunidade Nova Vida concentra maior número de beneficiados com o acesso à água. São pouco mais de 4,8 mil pessoas.
Outros 800 beneficiados também contam com água encanada na Zona Leste da cidade. As comunidades beneficiadas, segundo a concessionária, são a Iapoam e a Aldeia São João de Tupaberaba Sununga,
Mulher e criança indígena em comunidade de Manaus
localizadas nos bairros Coliseu e Jorge Teixeira, respectivamente. Os dados são da Águas de Manaus enviados à CENARIUM por meio de nota.
O serviço para as comunidades reforça que a garantia de água tratada reflete não apenas a necessidade de serviços essenciais para atender a todos os cidadãos, mas também o reconhecimento da dignidade e da saúde desses lugares. Eliza conta que o abastecimento anterior à chegada de água potável foi marcado por água consumida de cacimbas, que não possuíam nenhum tipo de tratamento.
De acordo com ela, também era cobrada uma taxa para as casas receberem água. Ela afirma também que a reunião de lideranças e do cacique para reivindicar água tratada impulsionou as obras para a encanação e distribuição. Ao todo, o processo durou cerca de quatro anos.
Indígenas da Comunidade
Parque das Nações, em Manaus
Programas e projetos
Nos últimos anos, uma série de projetos e programas foram lançados ou sugeridos nos parlamentos municipal, estadual e federal. Em Manaus, iniciativas vêm sendo adotadas para garantir o abastecimento de água para outras comunidades.
Em 2023, o programa Tarifa Zero, da Águas de Manaus, concedeu a tarifa de R$ 10 nas contas de água e de esgoto para mulheres em exercício de chefe de família; mulheres vítimas de violência doméstica; pessoas com 60 anos ou mais; e para famílias com crianças de até 12 anos incompletos; Benefício de Prestação Continuada (BPC) como principal fonte de renda familiar e famílias residentes em áreas de moradias precárias.
Além dessa iniciativa, o Programa Nacional de Acesso à Água Potável em Terras Indígenas (Pnati) foi lançado em 2022 para disponibilizar o acesso à água tratada em comunidades indígenas. O projeto prevê melhoria no controle da qualidade e abastecimento e busca atender 95% da população indígena ao longo de 20 anos.
Também tramita no Senado Federal uma proposta que estabelece diretrizes para o saneamento básico em áreas rurais, comunidades tradicionais e povos indígenas. Em 2023, a Comissão de Direitos Humanos (CDH) aprovou o substitutivo do projeto, um texto alternativo de autoria do senador Weverton (PDT-MA).
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/ab592f178cb39c6dcc7c1e52d09092b4.jpeg)
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/778ba0e827aa34216c30bfe201b772cd.jpeg)
11,7 mil
Aproximadamente 11,7 mil indígenas moradores de comunidades urbanas em Manaus contam com serviço de água encanada, segundo a concessionária Águas de Manaus.
“Nós tínhamos que pagar uma taxa, por exemplo, de R$ 30, R$ 50, por mês, para que colocassem água em nossas caixas, nos nossos baldes, e isso passou por uns três, quatro anos, até que chegasse água encanada. Foi quando as lideranças se reuniram e reivindicaram para conseguirmos água para as nossas casas”, relata Eliza.
Dados do Instituto Trata Brasil apontam que Manaus subiu no ranking de saneamento básico do Brasil. Nos últimos cinco anos, a capital amazonense registrou avanços. Em 2018, a cidade ocupava a 96ª posição. Cinco anos depois, em 2023, saltou 13 posições e alcançou o 83º lugar no ranking.
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/e1e27908ee670eb7fac2b59baa1693c6.jpeg)
Eliza Sateré é liderança indígena em Manaus
Mapa mostra comunidades beneficiadas pela Águas de Manaus
Crédito: Reprodução Arquivo Pessoal
Ainda com os avanços, dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram, em um levantamento divulgado em 2022, que quase metade da população indígena enfrentava a ausência de sistema de abastecimento de água regular. Os dados do período também apontaram que 61,1% de indígenas que moravam em domicílios particulares conviviam com, pelo menos, uma situação de precariedade ou ausência de saneamento relacionado à distribuição de água.
COMUNIDADES ASSISTIDAS
O acesso à água tratada para as comunidades indígenas foi feito a partir de pesquisas de identificação dessas comunidades urbanas na capital amazonense. A afirmação é do gerente de Responsabilidade Social e porta-voz da Águas de Manaus, Semy Ferraz.
À CENARIUM, ele explicou sobre a identificação dos problemas referentes à distribuição de água de comunidades indígenas e que, ao realizar um levantamento, levou à identificação dessas localidades em diferentes zonas da cidade que sofriam de problemas no abastecimento.
“Foi também o momento em que essas pessoas passaram a ter, pela primeira vez, um comprovante de residência. Por serem comunidades vulneráveis, todas as famílias também foram cadastradas em uma das Tarifas Sociais da empresa”, afirma Ferraz.
O gerente afirma, ainda, que as intervenções nas comunidades respeitam a cultura desses locais. “Mesmo que não seja reconhecida pela Funai, a gente tem toda uma política de relacionamento”, destaca.
Ferraz sugere que a política da empresa anterior pode ter prejudicado a regularização do acesso à água tratada. “Eles não tinham o acesso à água formalizado, regularizado. Era um processo de clandestinidade”, disse. De acordo com ele, atualmente “onde tem gente morando há muito tempo e o poder público não removeu, nós vamos regularizar a água”, salienta.
Atualmente, a Águas de Manaus mantém contato direto com os representantes das comunidades assistidas, por meio do programa Afluentes. De acordo com nota, “a partir daí desenvolve atividades sociais para atender essa população”. A concessionária destacou os serviços levados aos moradores, mencionando exposição sobre saneamento.
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/c11bc068f2ecd2318992ae700676145c.jpeg)
Parque das Tribos
O Parque das Tribos é o maior bairro indígena do Brasil em homologação e está localizado no bairro Tarumã, na Zona Oeste de Manaus. Foi a partir da união de João Diniz, da etnia Baré, e Raimunda da Cruz Ribeiro, da etnia Kokama, que a comunidade começou a ser formada, gradativamente, a partir de 1980. O casal veio do Médio Rio Solimões, nas proximidades do município de Tefé, em busca de cuidados médicos, trabalho e educação. Logo depois, vieram outros indígenas. No entanto, foi apenas no dia 14 de abril de 2014, sob a liderança do então cacique-geral Messias Kokama e com o apoio da cacica Lutana Kokama, filha do casal, que a comunidade Parque das Tribos foi fundada. Segundo os geógrafos Luiz de Freitas e Ivani de Faria, no artigo “Parque das Tribos: territorialização, conflitos e a construção de um território indígena urbano na área do Tarumã na cidade de Manaus – AM”, a ocupação do espaço ocorreu gradativamente e o mês de abril de 2014 marca o desenvolvimento de ações como a construção de moradias e a apropriação do solo urbano.
Eles explicam ainda que a ocupação começou a partir da comunidade Cristo Rei e, como não foi possível abrigar outras
famílias no espaço, as lideranças indígenas solicitaram informações sobre o terreno onde hoje é o Parque das Tribos. Os dados enviados pela Secretaria de Estado de Política Fundiária (SPF), Instituto de Terras do Amazonas (Iteam) e outros órgãos revelou que a terra era devoluta, ou seja, terras públicas sem destinação pelo Poder Público e que, em nenhum momento, integraram o patrimônio de um particular. Sendo assim, fundaram a comunidade no dia 14 de abril de 2014.
Em dez anos de existência, a comunidade Parque das Tribos enfrentou pedidos de reintegração de posse que, no final, tiveram desfecho favorável aos indígenas. Com o falecimento de Messias, devido a complicações da Covid-19, coube a Lutana guiar os indígenas em sua reivindicação territorial. Atualmente, a comunidade abriga mais de 1 mil famílias, de 35 etnias sob a liderança da cacica.
A reportagem entrou em contato com a Coordenação dos Povos Indígenas de Manaus e Entornos (Copime) para entender sobre os processos de reivindicação para acesso ao tratamento e à disponibilização de água nas comunidades indígenas. Não houve retorno até a publicação desta reportagem.
Moradores de comunidade indígena de Manaus recebem água tratada
Crédito: Reprodução Águas De Manaus
Roraima
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/bb63ee5a5d4dda0865e91da948a91257.jpeg)
Ameaça silenciosa
Queda em notificações de ISTs em Roraima preocupa autoridades
Ian Vitor Freitas – Da Cenarium
BOA VISTA (RR) – O Estado de Roraima teve uma redução nos casos de Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs) no ano de 2024, em comparação com o ano anterior. As informações são do Núcleo de Controle das IST/Aids da Secretaria de Saúde de Roraima (Sesau). Os dados acendem um alerta para a saúde pública, pois a suspeita é que pessoas com infecções não procuraram postos de saúde para o diagnóstico.
Os boletins epidemiológicos de HIV e Aids divulgados em 2023, por exemplo, mostram que houve uma redução de, aproximadamente, 50 casos notificados. No ano anterior, foram 554 casos de pacientes com HIV ou Aids, enquanto, em 2024, o número foi de 500 casos, segundo a Sesau.
A secretaria informou que, desde janeiro de 2024, foram contabilizados 334 casos confirmados de HIV e 166 casos de Aids (a doença manifestada). Entre as mulheres
teve uma redução em casos de Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs) no ano de 2024, em comparação com o ano anterior
“Comparando o ano de 2024 com o ano de 2023, nós tivemos uma redução significativa no número de casos, o que nos preocupa bastante. Uma das hipóteses é que as pessoas não estão procurando as Unidades Básicas de Saúde para fazer o tratamento e o diagnóstico de forma correta”
Jacqueline Voltolin, gerente do Núcleo de Controle das IST/Aids de Roraima.
Crédito: Acervo Pessoal
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/b20bdbdcbdf8fd36baf719479dc90f8f.jpeg)
gestantes, foram registrados 100 novos casos de HIV. Já entre o público infantil (crianças), houve seis casos de Aids. Nesse último caso, a transmissão ocorre geralmente de forma vertical, de mãe para filho.
Segundo a gerente do Núcleo de Controle das IST/Aids, Jacqueline Voltolini, Roraima teve uma redução significativa no número de casos de ISTs notificados, o que é preocupante.
“Comparando o ano de 2024 com o ano de 2023, nós tivemos uma redução significativa no número de casos, o que nos preocupa bastante. Uma das hipóteses é que as pessoas não estão procurando as Unidades Básicas de Saúde para fazer o tratamento e o diagnóstico de forma correta. As ISTs podem causar algumas complicações de forma gradativa, podendo levar a câncer no pênis, no colo do útero e até impossibilitar uma gravidez”, disse.
Para Jacqueline, outra razão para essa redução é que as ISTs podem ter um tratamento vendido em farmácias, sem necessidade de receita médica. Além disso, as pessoas diagnosticadas geralmente têm vergonha de procurar ajuda, o que piora a situação.
“Existe o medo e o preconceito que elas têm a respeito das ISTs, então elas não buscam ajuda. Em alguns casos, os sintomas não aparecem imediatamente e, quando surgem, podem desaparecer entre 7 e 15 dias, voltando de forma mais severa posteriormente. Se você sentir qualquer sintoma, como corrimento, coceira, ferida, lesão ou verruga, busque o serviço de saúde para um tratamento correto da sua infecção”, destacou.
CUIDADOS E PREVENÇÕES
Os meios de prevenção estão disponíveis em todos os postos de saúde dos 15 municípios de Roraima, a exemplo de preservativos masculinos e femininos, além da terapia
preventiva Profilaxia Pré-Exposição (PrEP). Segundo a Sesau, o autocuidado é fundamental para o controle da doença, assim como fazer o teste rápido, que é essencial para garantir a qualidade de vida.
“Com o passar dos anos, nós avançamos muito na prevenção, diagnóstico e tratamento das ISTs. O principal ainda é o uso do preservativo feminino e masculino. Independentemente da relação sexual e de com quem nos relacionamos, o preservativo ainda é o método mais seguro para prevenção. Além disso, nós temos vacinas, como as de HPV e hepatite, e o diagnóstico, que também funciona como uma prevenção”, ressaltou.
Em Roraima, as ISTs estão presentes em diferentes grupos, não havendo distinção quanto a sexo, raça ou escolaridade. No entanto, as infecções ocorrem de forma mais frequente na população mais jovem, entre os 15 e os 29 anos.
Gerente do Núcleo de Controle das IST/Aids, Jacqueline Voltolini
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/6fdf31ee9f08f506f7a52a7735a665c9.jpeg)
Crime brutal
Governo federal envia Força Nacional ao Amazonas após
assassinato de indígena
Adrisa de Góes – Da Cenarium
MANAUS (AM) – O governo federal enviou agentes da Força Nacional de Segurança Pública (FNSP) ao município de Barcelos (a 399 quilômetros de Manaus), no Amazonas, após uma indígena da etnia Baré, identificada como Rosimar Santos de Oliveira, de 48 anos, ser estuprada e assassinada. O corpo dela foi encontrado no dia 3 de janeiro. Em nota enviada à CENARIUM, o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) informou que a mobilização ocorreu por “necessidade de pacificação e preservação da ordem pública diante da situação de tensão envolvendo as etnias Yanomami e Baré”. O acionamento ocorreu no dia 4 de janeiro.
“O efetivo da FNSP chegou à região no mesmo dia para reforçar a segurança e
garantir a proteção das comunidades e do patrimônio público. Por questões estratégicas e visando preservar a integridade dos agentes e da população, o número de efetivos mobilizados não será divulgado”, diz trecho da nota, enviada à reportagem no dia 6 de janeiro. Os agentes prestam apoio à Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e às forças de segurança locais, a pedido da Casa de Governo de Roraima.
“Desde então, a Força Nacional tem atuado em cooperação com a Funai, as lideranças indígenas, a Polícia Civil, a Polícia Militar, a Guarda Municipal e o Exército Brasileiro. Reuniões de articulação foram realizadas para alinhar esforços na investigação do crime e promover o diálogo e a estabilização da situação local, que
atualmente é considerada controlada”, explica a nota do MJSP.
À CENARIUM, a Polícia Civil do Amazonas (PC-AM) informou que um inquérito policial foi instaurado para “apurar os crimes de estupro e homicídio contra uma indígena”. Segundo a PC-AM, pessoas já foram ouvidas e diligências estão em andamento para localizar os suspeitos de praticar os crimes. O caso segue sob sigilo.
ENTENDA O CASO
Uma mulher indígena da etnia Baré, identificada como Rosimar Santos de Oliveira, de 48 anos, foi estuprada e assassinada no dia 3 de janeiro, no município de Barcelos. De acordo com informações repassadas à CENARIUM por familiares da
Agentes da Força Nacional de Segurança Pública
Crédito: Fábio Rodrigues Pozzebom | Agência Brasil
vítima, os suspeitos de cometer os crimes gravaram o ato criminoso e o conteúdo circula em conversas de aplicativos de mensagens.
Integrante da Associação Indígena de Barcelos (Abisa), Rosimar foi encontrada morta em um terreno localizado na Rua Vereador José Basílio, nas proximidades do Hospital-Geral de Barcelos, na região
central do município. O corpo da vítima apresentava sinais de estupro e violência, conforme os familiares dela.
Com a repercussão do caso, familiares de Rosimar convocaram uma manifestação para pedir justiça pelo assassinato da indígena. O protesto, realizado no dia 5 de janeiro, reuniu várias pessoas, com início na sede da Associação de Indígenas de
“O efetivo da FNSP chegou à região no mesmo dia para reforçar a segurança e garantir a proteção das comunidades e do patrimônio público”
Barcelos (Asiba). Os manifestantes seguravam cartazes com frases como “Queremos Justiça em favor de Rosimar”.
Após percorrer as ruas da cidade, o ato contou com parada na frente do edifício do Fórum de Justiça Antônio de Lucena Bittencourt. A manifestação foi encerrada na sede da 75ª Delegacia Interativa de Polícia (DIP) do município.
Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), em nota. A indígena da etnia Baré, Rosimar Santos de Oliveira, foi violentada e assassinada em Barcelos. O corpo dela foi encontrado no dia 3 de janeiro
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/932f7d94015830022c36ed11ce08baf4.jpeg)
Polícia investiga e realiza prisões
Thais Matos – Da Cenarium
MANAUS (AM) – Até o fechamento desta edição, os indígenas Klesio Aprueteri Yanomami, de 26 anos, e um adolescente de 17 anos, ambos da etnia Yanomami, eram procurados pela Polícia Civil do Amazonas (PCAM) pelo estupro coletivo e feminicídio de Rosimar Santos de Oliveira. Os detalhes da investigação foram apresentados em coletiva de imprensa, na sede da Delegacia-Geral, em Manaus.
O delegado-geral adjunto da PC-AM, Guilherme Torres, fez um apelo à população para não compartilhar as imagens do crime que estavam circulando em grupos de aplicativo de mensagens. “Pedimos que as pessoas não divulguem esse vídeo, considerando que a vítima tem familiares. Então, não compartilhem”, destacou o delegado.
Guilherme Torres também revelou que um dos suspeitos já havia cometido outro crime de estupro em outro Estado, agravando a gravidade da situação.
Durante coletiva, o delegado Paulo Mavignier, diretor do Departamento de Polícia do Interior (DPI), reforçou a importância dos canais de denúncia para que a população contribua com as investigações e ajude a reduzir casos semelhantes.
“Contamos com o Disque 100 para denúncias de abuso sexual contra crianças, o 190, canal direto com a Polícia Militar, e o 181. Além disso, há uma ampla rede de proteção que inclui escolas, hospitais e conselhos tutelares, onde as denúncias podem ser registradas. Todos esses órgãos estão unidos para proteger nossas crianças e mulheres, para transformar a realidade do nosso Estado”, destacou.
PRISÕES
No dia 7 de janeiro, Sirrico Aprueteri Yanomami, de 19 anos, foi preso por envolvimento direto no crime. Sandoval Aprueteri Yanomami, cuja idade não foi divulgada, também foi detido por auxiliar na fuga dos autores. As prisões ocorreram na Comunidade do Cumaru, na região do Médio Rio Negro, zona rural de Barcelos, segundo o delegado titular da 75ª Delegacia Interativa de Polícia (DIP) de Barcelos, John Castilho.
Após o ato, os criminosos tentaram se esconder. Dois deles conseguiram fugir, enquanto Sirrico foi preso. Segundo o delegado, Sandoval Aprueteri Yanomami deu apoio a Sirrico para tentar levá-lo de
volta à comunidade onde morava, mas a polícia conseguiu capturá-lo antes.
Todos os envolvidos vão responder por estupro coletivo e feminicídio. Sandoval deve responder por favorecimento pessoal. Eles passarão por audiência de custódia e permanecerão à disposição da Justiça.
DETALHES DO CRIME
O delegado informou que três autores foram identificados, mas destacou que outras pessoas, embora não tenham participado diretamente do estupro, foram testemunhas do crime.
“Durante as investigações, conseguimos esclarecer os fatos e identificar quem participou diretamente dos crimes, quem foi testemunha e quem tentou ajudar a vítima. Alguns indígenas tentaram socorrer a mulher, mas, infelizmente, não conseguiram, devido à extrema violência usada pelos autores”, explicou o delegado.
Ainda de acordo com Castilho, os criminosos conheceram a vítima durante as festividades de Ano Novo realizadas na região. “Quando ela retornava para casa, foi abordada. Ela tentou resistir à tentativa de estupro, mas foi esfaqueada, e os autores praticaram o crime”, relatou.
Crédito: Reprodução Arquivo pessoal Composição de Paulo Dutra | CENARIUM
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/acefb2a1d5e6af1a29f77a1728acc32f.jpeg)
Indígenas sob ataque
Novo atentado contra os Avá-Guarani deixa quatro feridos
Thais Matos – Da Cenarium
MANAUS (AM) – A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) denunciou, na noite de 4 de janeiro, por meio das redes sociais, mais um ataque ao povo indígena Avá-Guarani da Terra Indígena (TI) Tekoha Guasu Guavirá, localizada entre Guaíra e Terra Roxa, no oeste do Paraná. De acordo com a entidade, o ataque deixou quatro pessoas feridas, de 7, 14, 25 e 28 anos. Elas foram levadas para o Hospital Bom Jesus de Toledo.
“Estamos cercados, neste momento. Está havendo tiros por todos os lados”, relataram lideranças indígenas em mensagem enviada à Apib e divulgada nas redes sociais, naquele dia.
A denúncia relata que o povo Avá-Guarani tem sido alvo de ações violentas por parte de pessoas não indígenas insatisfeitas com a retomada dos territórios tradicionais pelos indígenas. Os ataques persistem, mesmo com a presença da Força Nacional na região e vêm ocorrendo desde o dia 29 de dezembro de 2024.
APELO
A Apib fez um apelo ao Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) e ao Judiciário para intervirem e cessarem os ataques contra os indígenas da região. Segundo o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), desde o início da onda de violência, um
indígena foi baleado no braço, no dia 31 de dezembro, e outra indígena sofreu queimaduras no pescoço, no dia 30. Além disso, barracos e plantações foram incendiados e deixaram famílias desabrigadas e sem acesso a alimentos ou água potável.
O primeiro ataque, registrado no dia 29 de dezembro, ocorreu inesperadamente, quando pessoas atearam fogo na vegetação e nas plantações, incendiaram barracos, realizaram disparos de armas de fogo e lançaram bombas contra a comunidade. Em um manifesto intitulado “S.O.S Aldeia Yvy Okaju Corre Risco de Extermínio”, divulgado em 23 de novembro do ano passado, os Avá-Guarani já alertavam
Indígenas sangram após serem baleados
Crédito: Reprodução Apib
sobre as ameaças constantes. “Recebemos um recado de que, no dia 25 de dezembro de 2024, os brancos estão se organizando para realizar um novo ataque contra nossa comunidade”, destacou o documento, à época.
Diante do agravamento da tensão, o MJSP autorizou, ainda em dezembro, o emprego permanente da Força Nacional de Segurança Pública na região. No entanto, instituições indigenistas consideram a atuação dos militares ineficaz.
CONFLITO HISTÓRICO
O conflito no local tem raízes históricas e remonta à época da construção da Hidrelétrica Itaipu Binacional, que expulsou os Avá-Guarani de suas terras para viabilizar a obra. Atualmente, a comunidade luta para retomar suas terras ancestrais, enfrentando resistência e violência constantes.
Da Cenarium*
Reforço na segurança
baleados durante um ataque armado às comunidades.
A Justiça Federal determinou aos governos federal e do Paraná que reforcem, imediatamente, a proteção policial às comunidades indígenas das cidades de Guaíra e Terra Roxa, no oeste paranaense, próximo à fronteira do Brasil com o Paraguai.
A ampliação dos efetivos da Polícia Federal, da Força Nacional e da Polícia Militar foi ordenada pelo juiz federal Pedro Pimenta Bossi, da 3ª Vara Federal de Umuarama (PR), no dia 5 de janeiro.
A decisão foi motivada por um pedido do Ministério Público Federal (MPF) e da Defensoria Pública da União (DPU). E foi publicada dois dias após quatro moradores da Terra Indígena (TI) Tekoha Guasu Guavirá, localizada entre as duas cidades paranaenses, serem
Entre as vítimas baleadas durante o ataque deflagrado por homens ainda não identificados, está uma criança, atingida por um tiro em uma das pernas. Um indígena teve o maxilar perfurado por um projétil. Outro, foi alvejado nas costas, e uma quarta vítima também foi ferida na perna.
A Polícia Federal (PF) instaurou um inquérito para tentar identificar os autores dos disparos que feriram os quatro indígenas. Em nota, a superintendência estadual da PF informou à Agência Brasil que “diversas diligências” estão em andamento, motivo pelo qual os “elementos [probatórios] já colhidos seguem sob sigilo, a fim de não prejudicar as investigações”.
*Com informações da Agência Brasil.
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/412de8fd5d5c89fbeadd4dd1c69632c4.jpeg)
Indígenas Avá-Guarani
Crédito: Reprodução | Lizely Borges
As avós
Roger Adan Chambi Mayta
N–ão temos que caminhar de qualquer modo, filho, você tem que dizer “olá” e pedir permissão à montanha. Bom dia, vovó, vou passar pelo teu território, cuida de mim, você tem que dizer assim.
Eu tinha cinco anos e, junto com a minha mãe, caminhávamos em direção aos campos de batata localizados quase no topo da montanha. O frio das nove da manhã queimava mais as minhas bochechas vermelhas, que começaram a rachar. Será que existe uma avó dentro da terra? Eu me perguntei enquanto cumprimentava a montanha em voz alta, seguindo as instruções da minha mãe.
– Se você não cumprimentar, se não pedir permissão, pode pisar onde caiu um raio e ficar doente. Você também pode cair e seu ajayu pode fugir. É por isso que é muito importante dizer olá.
Mas, mamãe, como eu sei onde a vovó está dentro da montanha para cumprimentá-la? Tenho medo de pisar nela e machucá-la.
A ingenuidade dos meus primeiros anos citadinos me fazia entender a montanha e a avó como coisas separadas. Uma avó, para mim, tinha o rosto, as mãos, as tranças, a saia e a manta da dona Francisca Mamani, mãe da minha mãe, minha avó, que sempre me mimava com fartura de comida; e uma montanha era um concentrado de pedras e terra com belas paisagens, animais e acesso muito difícil ao topo.
– Não, filho, vovó é a montanha toda. Neste momento, estamos caminhando sobre ela, por isso estamos levando folhas de coca e álcool para que ela possa pijchar
e beber. Ela cuida de nós e garante que nunca nos falte comida.
Já estávamos na metade do caminho. Dessa vez, as bordas dos meus lábios estavam começando a abrir fendas, mas fiquei tranquilo ao saber que o sol estava se aproximando de nós. À medida que apressávamos o passo, tentei incorporar os novos ensinamentos da minha mãe com os mais antigos.
– Então, mamãe, a montanha tem fome e sede como nós? E ela também chora, como a batata? Você se lembra de que uma vez me disse para não machucar a batata na colheita porque ela chora?
– Claro, filho, a batata, a oca, a quinoa, como tantos outros produtos do campo, são filhos da avó. Por isso sentem, por isso nos alimentam bem, por isso temos que cuidar deles e agradecer sua produção. A montanha vive, às vezes tem sede e às vezes tem fome. Às vezes pode estar triste, e outras vezes pode estar feliz.
Na minha tenra idade, cada palavra, cada detalhe que minha mãe me contava era grafado na minha cabeça em cenas quase surrealistas. Imaginava uma grande montanha com muita fome; imaginava que os buracos feitos pelas chinchilas eram os olhos da vovó, que o grande poço de água era sua boca e que a extensa vegetação era seu cabelo. Uma montanha que vive, que sente, que nos protege.
– Tudo isso são os frutos da vovó, filho. Você se lembra daquele rio que fica perto de casa, onde colocamos as batatas para fazer tunta? Essa água é o carinho da avó.
Aos poucos, fui entendendo a vitalidade que existia ao meu redor. A importância do respeito e do cuidado com os frutos
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/993f2e6ac11245a0864f41902ef1cc2a.jpeg)
da vovó. Confesso que senti um pouco de medo ao descobrir como me relacionar com a montanha, com os produtos agrícolas, com o rio. Tinha medo de ser desrespeitoso, de despertar o aborrecimento da montanha.
– Mamãe, o que acontece se a gente esquecer de cumprimentar, de dar de beber e de comer para a vovó? Ela nos castiga?
– Se a esquecermos, teremos secas. Os animaizinhos podem morrer ou ficar doentes. O esquecimento é o pior castigo que podemos dar às nossas avós.
– Nossas avós? Existem muitas?
– Cada montanha é uma avó, filho!
– Mas como elas surgiram?
Para cada pergunta havia sempre uma resposta. Minha mãe sabia o que dizia porque foi assim que aprendeu com a mãe dela, e a mãe com a avó, e assim de geração em geração. Com a voz agitada pela subida, minha mãe, dona Hilda Mayta Mamani, me contou, a quase seiscentos passos da roça de batata, a origem das avós:
– Houve um tempo muito distante em que os primeiros homens e mulheres viviam no escuro. Não conheciam a luz, eram seres muito diferentes de nós. Os seres que habitavam esses solos eram misturas de diferentes espécies. Havia seres com corpo de homem e rosto de puma ou condor, ou com asas e olhos de serpente. Tinha gente com pernas de lhama e braços de planta. Eram seres que podiam voar e que podiam submergir ao solo; alguns eram gigantes e outros muito pequenos. Eram os ch’ullpas, os primeiros povos da terra.
Em certo momento, surgiu o rumor de que novos seres vivos chegariam àquele mundo com um brilho que nunca haviam
Crédito: Arquivo Pessoal
visto em suas vidas. Corria o boato de que esses novos seres chegariam do Oeste. Por isso, todos construíram as suas casas com as portas voltadas para o Leste, com o objetivo de se proteger. No entanto, a luz brilhante veio do Leste do território e, junto com a luz, apareceu um casal de humanos como nós somos agora. Os ch’ullpas viram pela primeira vez seus próprios corpos, tiveram medo ao ver a claridade e se esconderam: alguns nos céus, outros em rios e lagos, outros dentro da terra, e muitos ficaram paralisados e petrificados, transformando-se em montanhas.
– Esta montanha onde estamos caminhando agora, filho, e as demais que você vê aí, eram sete irmãs daquela época. Dizem que tinham olhos de vicunha e tranças muito grossas, ficavam juntas e não se separavam por mais que o sol as assustasse no começo. Já transformadas em montanhas, aprenderam a conviver com o sol e os novos homens, criaram um vínculo de respeito e cuidado. Portanto, essas montanhas são as protetoras e donas desse território desde a época dos ch’ullpas. Já viram muitas vidas passarem por aqui, são antigas e eternas. Por isso, as chamamos de avós. É por isso que lhes confiamos o alimento e o cuidado.
Quando ela terminou o relato, finalmente chegamos aos campos de batata. O sol aquecia nossos rostos. Tentei imaginar como teriam se sentido aqueles primeiros seres vivos ao verem a luz e se reconhecerem como eram. Escrevendo estas linhas, considero que os raios daquele sol me fizeram descobrir a mim também. Descobri-me como parte de um mundo onde cabiam outros mundos que precisávamos respeitar e agradecer. A partir daquele momento, senti que a minha vida ficou melhor ao tomar consciência de que, além da proteção da minha mãe, eu tinha o cuidado e a proteção das minhas avós das montanhas.
(*) Advogado Aymara da Bolívia. Doutorando no Programa de Pós-Graduação em Direito Agrário da Universidade Federal de Goiás (UFG). Mestre em Estudos Latino-Americanos pela Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila). Atua como pesquisador e consultor jurídico, abordando questões relacionadas à crítica jurídica, justiça indígena, estados plurinacionais, direito agroambiental, movimentos políticos indígenas e mídia. Faz parte do Coletivo de Estudos Latino-Americanos de Barcelona (Celab).
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/9d97c701e4c5162cd2d0855e1f7b8aa1.jpeg)
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/152c1a62f498d8fe78c9e43abe367577.jpeg)
Desinformação: Meta x Brasil
Decisão da empresa dona das redes sociais Facebook, Instagram e WhatsApp de encerrar a política de verificação de fatos repercute mal no Governo Lula
Ana Cláudia Leocádio – Da Cenarium
BRASÍLIA (DF) – O fim da política de verificação de fatos anunciado pela Meta, dona do Facebook, Instagram e WhatsApp, repercutiu negativamente na Esplanada dos Ministérios, em Brasília (DF), com a manifestação contrária de ministros do Governo Lula. A decisão também suscitou discussões sobre o des-
tino do Projeto de Lei das Fake News, que tramita no Congresso desde 2020, e sobre a importância do julgamento da constitucionalidade ou não do Artigo 19 da Lei do Marco Civil da Internet pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
O dono da Meta, Mark Zuckerberg, anunciou, no dia 7 de janeiro, o fim do Programa de Verificação de Fatos (Third-Party Fact Checking – 3PFC, na sigla em inglês).
O sistema, criado em 2016, contava com o apoio de agências de checagem independentes, certificadas pela Aliança Internacional de Checagem de Fatos (International Fact-Checking Network, IFCN, em inglês).
No Brasil, o programa começou a operar em 2018, com auxílio de agências como a Lupa, uma das mais conceituadas do País no trabalho de verificação de fatos. Agora,
a Meta deve adotar o mesmo modelo do X (antigo Twitter), baseado em contribuições colaborativas conhecidas como “Notas da Comunidade”.
Em comunicado divulgado no dia 7, o vice-presidente de Assuntos Globais da Meta, Joel Kaplan, afirmou que o encerramento do 3PFC começará pelos Estados Unidos, sem previsão de extensão para outros países por enquanto.
“Enquanto fazemos a transição, vamos parar de reduzir a distribuição de conteúdo verificado e, em vez de exibir advertências em tela cheia que exigem cliques para acessar a postagem, vamos usar um rótulo menos intrusivo, indicando que há informações adicionais sobre o post para quem desejar vê-las”, declarou Kaplan.
O presidente Lula e o CEO da Meta, Mark Zuckerberg
Crédito: Composição De Paulo Dutra | Cenarium
“O que nós queremos, na verdade, é que cada país tenha sua soberania
resguardada. Não pode um cidadão, não
podem dois cidadãos, não podem três cidadãos acharem que podem ferir a soberania de uma nação”
Luiz Inácio Lula da Silva, presidente do Brasil.
MANIFESTAÇÕES
O advogado-geral da União, Jorge Messias, foi o primeiro a se manifestar contra as medidas da Meta, em entrevista ao jornal O Globo. Ele defendeu a criação de um novo marco jurídico para a regulação das redes sociais no Brasil.
“A Meta decidiu focar na expansão de seu modelo de negócios. Infelizmente, como os algoritmos da empresa são secretos, essa escolha tende a intensificar a desordem informacional em um ecossistema digital que já enfrenta desafios significativos relacionados à disseminação de fake news e discursos de ódio”, declarou Messias.
No dia 9 de janeiro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que realizará uma reunião para discutir as novas regras anunciadas pela Meta. “O que nós queremos, na verdade, é que cada país tenha sua soberania resguardada. Não pode um cidadão, não podem dois cidadãos, não podem três cidadãos acharem que podem ferir a soberania de uma nação”, afirmou Lula no Palácio do Planalto, durante visita à galeria de ex-presidentes, localizada no térreo do prédio e reinaugurada recentemente.
“Eu acho extremamente grave as pessoas quererem que a comunicação digital não tenha a mesma responsabilidade de quem comete um crime na imprensa escrita. É como se alguém pudesse ser punido por algo na vida real, mas não fosse responsa-
Crédito: Reprodução Redes Sociais
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/7062c8ca9e70c2933381b465bc1f7741.jpeg)
Projetos que tramitam no Congresso
Desde 2020, segundo informações da Câmara dos Deputados, havia 50 projetos de lei tramitando com propostas de combate às fake news. Somente naquele ano, 21 proposituras foram apresentadas.
O mais significativo é o Projeto de Lei n.º 2.630/2020, de autoria do senador Alessandro Vieira (MDB-SE), que cria a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet, conhecida como “PL das Fake News”. O texto propõe a criação de regras para combater a desinformação na internet, responsabilizar plataformas e garantir a fiscalização e aplicação de sanções.
Apresentado e aprovado pelo Senado em 2020, o projeto está parado na Câmara dos Deputados desde julho daquele ano. Em 5 de maio de 2023, foi enviado para análise das comissões de Comunicação, Finanças e Tributação e Constituição e Justiça. Contudo, em abril de 2024, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PPAL), declarou que o relatório do deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) não seria votado em plenário, anunciando a criação de um grupo de trabalho para analisar o projeto. Até o fechamento desta edição, não houve avanços.
Lira alegou que o texto de Silva propunha censura e violação da liberdade de
expressão, o que gerou divergências entre os parlamentares, impedindo sua votação.
Em declaração ao portal Congresso em Foco, o senador Alessandro Vieira avaliou que as declarações de Zuckerberg não devem interferir no avanço do PL das Fake News no Brasil. Segundo ele, as ações da Meta buscam priorizar interesses comerciais.
“A Meta nunca teve preocupação real com a qualidade da informação que circula nas redes; seu foco sempre foi maximizar lucros. Zuckerberg só está preocupado com o lucro das suas empresas, não com liberdade de expressão ou saúde mental”, afirmou Vieira.
A deputada Erika Kokay (PT-DF) também apresentou o Projeto de Lei n.º 2051/2024, que criminaliza a produção, divulgação ou compartilhamento de notícias falsas sobre temas de interesse público relevante, como saúde, educação, meio ambiente, segurança pública e economia nacional.
A proposta prevê pena de detenção, de seis meses a três anos, além de multa, para quem produzir, divulgar ou compartilhar notícias falsas que alterem, distorçam ou corrompam gravemente a verdade sobre assuntos de interesse público relevante.
Tela de celular mostra aplicativos de rede social
“A
Meta decidiu focar na expansão de seu modelo de negócios. Infelizmente, como os algoritmos da empresa são secretos, essa escolha tende a intensificar a desordem informacional em um ecossistema digital que já enfrenta desafios significativos relacionados à disseminação de fake news e discursos de ódio”
Jorge Messias, advogado-geral da União.
bilizado por fazer o mesmo no ambiente digital”, acrescentou Lula.
O secretário de Políticas Digitais do governo federal, João Brant, afirmou em suas redes sociais que o anúncio de Zuckerberg “antecipa o início do governo Trump e explicita a aliança da Meta com o governo dos Estados Unidos para enfrentar União Europeia, Brasil e outros países que buscam proteger direitos no ambiente on-line” que,
O advogado-geral da União, Jorge Messias
na opinião do CEO da Meta, “promovem censura”.
“Em suma, Facebook e Instagram vão se tornar plataformas que vão dar total peso à liberdade de expressão individual e deixar de proteger outros direitos individuais e coletivos. A repriorização do ‘discurso cívico’ significa um convite para o ativismo da extrema-direita”, avaliou Brant.
Já o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou à Globonews que o Brasil já enfrentou graves consequências decorrentes da disseminação de notícias falsas, desde 2018, culminando nos ataques de 8 de janeiro de 2023.
“A economia estará bem, mas nós precisamos cuidar da nossa democracia, nós temos que cuidar das nossas instituições, nós temos que cuidar da integridade das pessoas e das informações que são divulgadas, para evitar pânico e o avanço de ideologias extremistas que ameaçam nos-
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/bfee1759882775a1d11158624341adfb.jpeg)
Crédito: Renato Menezes AsocmAGU
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/0450e17c14902e2efd8b3c2f08ab68a3.jpeg)
“A economia estará bem, mas nós precisamos cuidar da nossa democracia, nós temos que cuidar das nossas instituições, nós temos que cuidar da integridade das pessoas e das informações que são divulgadas”
Fernando Haddad, ministro da Fazenda.
sas liberdades individuais e a paz social”, concluiu Haddad.
DEPUTADA FALA EM ATAQUE À SOBERANIA
A deputada federal Erika Hilton (PSol-SP) usou seu perfil na rede X, na manhã do dia 8 de janeiro, para criticar a decisão da Meta. A parlamentar afirmou que “a atualização da política de moderação da organização é um ataque direto à soberania dos países, que têm se colocado contra as arbitrariedades cometidas pelas redes sociais, que cada vez mais se tornam territórios livres para a extrema-direita e para a violação de direitos e das democracias”.
“Como disse a pesquisadora Marie Santini, do NetLab, não são os países da América Latina que têm ‘cortes secretas’,
como afirmou Mark Zuckerberg. São as redes sociais que possuem tribunais secretos, devido à falta de transparência sobre suas equipes de moderadores, as regras e os critérios de moderação e não moderação”, declarou Hilton.
Na avaliação da deputada, “a guinada pró-trumpismo de Zuckerberg só reforça a necessidade, aqui no Brasil, de um processo já realizado em diversos países do mundo: a regulamentação das redes sociais”.
A ex-candidata à Prefeitura de Belo Horizonte, Duda Salabert, anunciou, também no dia 8, que ingressará com uma ação judicial contra a Meta para impedir que as novas medidas sejam implementadas no Brasil.
“Enviei também um ofício ao ministro Alexandre de Moraes para que possamos
debater o tema. A despatologização das identidades LGBT+ foi uma conquista, fruto de lutas históricas, e não aceitaremos retrocessos! Nenhuma empresa estrangeira está acima da ciência, de nossa história, de nossa luta e das leis e soberania nacionais!”, afirmou Salabert na rede X. Ela se refere ao fato de que a nova política poderá permitir que postagens associem pessoas LGBT+ a “doentes mentais”.
STF deve prosseguir julgamento em 2025
O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) deve retomar, neste ano, o julgamento do Tema 987 de repercussão geral, que discute a constitucionalidade do art. 19 da Lei n.º 12.965/2014, que institui o Marco Civil da Internet. O artigo estabelece a necessidade de ordem judicial prévia para a exclusão de conteúdos, responsabilizando civilmente provedores de internet por danos decorrentes de atos ilícitos praticados por terceiros. A ação foi movida pelo Facebook e envolve a criação de um perfil falso na rede social.
Três dos 11 ministros já votaram no julgamento, que envolve dois Recursos Extraordinários (RE). O relator do RE n.º 1037396, ministro Dias Toffoli, considerou o artigo 19 inconstitucional, alegando que confere imunidade às plataformas. Ele propôs que a responsabilização se baseie no artigo 21, que prevê a remoção de conteúdo mediante notificação simples.
O ministro Luiz Fux, relator do RE n.º 1.057.258, também declarou o dispositivo inconstitucional, afirmando que ele concede imunidade civil às plataformas, que só podem ser responsabilizadas se descumprirem decisão judicial.
O presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, divergiu parcialmente, sugerindo modelos de responsabilização que não impliquem em responsabilidade objetiva das plataformas. Ele também considerou o artigo 19 parcialmente inconstitucional.
O ministro André Mendonça pediu vista em dezembro de 2024, suspendendo o julgamento. A matéria deve ser retomada após o recesso do Judiciário, a partir do mês de fevereiro.
A deputada federal Erika Hilton (PSol-SP)
Crédito: Reprodução
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/ad754f70bbb186eddd77b1a25e6e9626.jpeg)
Celebração à literatura amazônica
Valer Teatro, um novo espaço multicultural em Manaus
Marcela Leiros – Da Cenarium
MANAUS (AM) – De frente para o maior cartão-postal de Manaus (AM), o Teatro Amazonas. Essa é a referência para chegar ao Valer Teatro, novo ambiente multicultural da cidade que abriu as portas ao público no dia 8 de dezembro de 2024, na Rua José Clemente, n.º 608, bairro Centro, Zona Sul de Manaus.
A ideia do espaço surgiu menor, com a intenção de ser o novo endereço da Editora Valer e, agora, tem livraria, café, restaurante,
O Valer Teatro foi inaugurado no dia 8 de dezembro de 2024
Crédito: Divulgação
espaço para eventos e até portal de notícias (https://portaldolargo.com.br/). Tudo isso no principal ponto turístico da cidade, como explicou à CENARIUM o diretor da Valer, Isaac Maciel.
“Essa ideia foi crescendo. Da editora veio também a necessidade de a gente voltar com a livraria. Depois da livraria, o café, e do café virou também espaço para o restaurante, para a galeria, para uma parte de eventos, e o portal de notícias para sintetizar as nossas pautas, porque só de obras publicadas sobre a Amazônia temos mais de 2 mil”, explicou.
Segundo Maciel, a reabertura de uma livraria da Editora Valer, após sete anos fechada, marca a retomada de um mercado que estava enfraquecido, o de livrarias de ruas. Ele explicou que, por quase 20 anos, as “mega stores” de livrarias — lojas muito grandes especializadas na venda de livros — tomaram o mercado e sufocaram os estabelecimentos menores, que voltaram a ganhar força a partir da conexão com os leitores.
“Acredito que outras livrarias surgirão nessa corrente nova do momento, que é o livreiro próximo do leitor”
Isaac Maciel, diretor da Valer.
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/a352407f1c1042778b2087a47f654be7.jpeg)
“Acredito que outras livrarias surgirão nessa corrente nova do momento, que é o livreiro próximo do leitor. Isso estabelece uma diferença, eu, como livreiro, e também nossos vendedores, que conhecem o consumidor, que conhecem o professor, aquela pessoa que frequenta [as livrarias de rua]”, acrescentou.
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/8f1206212bbb2cf87edd9cbbc6d7bf70.jpeg)
Crédito: Divulgação
LITERATURA DA AMAZÔNIA
Outro propósito do projeto é oferecer ao público a possibilidade de conhecer mais a Amazônia e seus autores, como detalhou a coordenadora editorial da Valer, Neiza Teixeira. A editora tem mais de 2 mil títulos sobre a região publicados.
“Uma das nossas principais linhas, com esse nosso compromisso com o povo do Amazonas, é publicar as Amazônias. Antes era publicar a Amazônia, mas nós temos muitas Amazônias em uma Amazônia. E hoje, pode ter certeza, nós somos a maior editora do Norte do Brasil”, destacou.
HISTÓRIA
A Editora Valer foi fundada em 1991, em Manaus, período em que a Universidade do Amazonas encontrava-se em plena atividade. Contudo, estudantes e professores sentiam falta de livros para aprimorar seus conhecimentos e de atividades culturais que auxiliassem no seu desenvolvimento intelectual. Essa necessidade motivou o jornalista Isaac Maciel a empreender no ramo editorial.
Com mais de 2 mil títulos publicados, o catálogo da Valer apresenta obras como “Poranduba Amazonense”, de João Barbosa Rodrigues, “Os estatutos do homem”, de Thiago de Mello, “Frauta de barro”, de Luiz Bacellar, “Barro verde”, de Elson Farias, “Intramuros”, de Astrid Cabral, dentre outras. Para o público infantojuvenil, a editora oferece obras que têm o cenário amazônico como pano de fundo, com o objetivo de fomentar o sentimento de pertencimento e o fortalecimento da identidade amazônica.
Livraria Valer funciona dentro do Café Teatro
Crédito: Luiz
André Nascimento | Cenarium
Crédito: Reprodução Redes Sociais
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/9943fe36eee133b42ba119b9f0b5e92d.jpeg)
Ano de Xangô e Iansã
Orixás vão reger 2025; veja o que dizem previsões
Adrisa De Góes – Da Cenarium
MANAUS (AM) – O ano de 2025 será marcado pela influência de dois importantes orixás das tradições afro-brasileiras, conhecidos como “casal do dendê”: Xangô, associado à justiça e ao equilíbrio, e Iansã, orixá dos ventos e tempestades. Considerada uma força natural poderosa, a regência das divindades promete um ano de intensas transformações e decisões importantes, tanto no âmbito pessoal quanto no coletivo. É o que dizem previsões de babalorixás (também chamados de “pais de santo”) consultados pela CENARIUM.
A regência é apontada por meio da numerologia, na somatória dos números do ano, e também pelo jogo de mérìndilogún (jogo de búzios), um oráculo divinatório utilizado há séculos como ferramenta para
prever o futuro e proteger os praticantes e filhos de orixás. A prática sagrada oferece orientações sobre os melhores caminhos a seguir e, segundo religiosos, ajuda a evitar situações adversas, além de fortalecer conexões espirituais.
À reportagem, o babalorixá brasiliense Ronald de Oxóssi afirma que, além da influência do casal do dendê, haverá a atuação de Odu Ossá, uma divindade que representa conquistas e gira em inúmeras dimensões da vida, sejam negativas ou positivas. Com intensidade, ele eleva as pessoas para conquistarem algo que realmente almejam.
“Ossá é um odu do oráculo de Ifá, que, no mérìndilogún, é representado por nove conchas abertas e sete fechadas. Pessoas regidas por este Odu são explosivas, inten-
sas; elas colocam fogo na casa para depois correr para apagar”, ressalta o pai de santo.
Ainda de acordo com Pai Ronald, Odu Ossá é regido por Iansã, Iemanjá, Obá e também por Obaluaê. Ele define esse Odu como “muito quente”. “Vai ser um ano para se resolver muita coisa na vida de quem precisa. Casos amorosos vão ser resolvidos, muita coisa vai ser resolvida. Ou acaba, ou continua, não vai ter meio-termo. Vai ser um ano muito direto”, destaca o babalorixá.
MUDANÇAS E FINANÇAS
À reportagem, o presidente da Associação de Umbanda Pai João e Baiano Severino, na cidade de Ponte de Lima, em Portugal, Thiago de Oxumare, afirma que a regência será marcada por justiça
Imagem representativa dos orixás Xangô e Iansã
e mudanças, principalmente no âmbito político. Ele alerta, ainda, para a intensificação de guerras.
“Será um ano em que precisaremos ficar atentos, principalmente espiritualmente. Cuidar da espiritualidade, precisamos buscar fé, não importa qual religião”, destaca o pai de santo.
Apesar dos alertas, o líder religioso afirma que o ano também será de positividade nas questões financeiras e de união familiar. Ele destaca que, para isso, é preciso desapegar-se de mágoas e rancores passados.
Sobre Xangô
Xangô, um dos orixás mais emblemáticos das tradições afro-brasileiras, é conhecido por sua força viril, personalidade agressiva e senso de justiça. Representando o fogo e os raios dos céus, ele atua principalmente em questões de justiça cármica — um conceito que avalia as ações humanas ao longo de todas as vidas, e não apenas na existência atual.
Suas características marcantes incluem misericórdia, lealdade e um espírito guerreiro, além de um arquétipo de conquistador justo. Com coragem, vigor e dinamismo, Xangô reflete a intensidade do elemento que o rege, sendo símbolo da determinação e da busca pelo equilíbrio em meio às adversidades.
Sobre Iansã
Iansã, também conhecida como Yansã ou Oyá, é a poderosa orixá dos fenômenos climáticos, associada à força dos ventos e ao poder da natureza. Sua presença é sentida nos momentos em que o céu se transforma em chuva e tempestade, refletindo sua energia vigorosa e incontrolável.
Símbolo da garra, independência e força feminina, Iansã representa o arquétipo da mulher guerreira. Ela é destemida, pronta para enfrentar desafios e mudar seu curso quando necessário. Para aqueles que recorrem à sua proteção, Iansã oferece coragem e determinação, qualidades essenciais para vencer batalhas diárias e alcançar objetivos com perseverança e confiança.
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/5c09a17a1c3889b489fb263631a13e07.jpeg)
“Vai ser um ano para se resolver muita coisa na vida de quem precisa. Casos amorosos vão ser resolvidos, muita coisa vai ser resolvida. Ou acaba, ou continua, não vai ter meio-termo. Vai ser um ano muito direto”.
Ronald de Oxóssi, babalorixá brasiliense.
Jogo
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/ed6d61c494cc0b2326def74f22ee377b.jpeg)
“Será um ano em que precisaremos ficar atentos, principalmente espiritualmente. Cuidar da espiritualidade, precisamos buscar a fé, não importa qual religião”.
Thiago de Oxumare, pai de santo.
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/410f2cbbf55d6f920a52ea397daa274b.jpeg)
de búzios
Crédito: Ricardo Oliveira Arquivo Cenarium
Crédito: Reprodução Arquivo Pessoal
2025: um ano para recalcular prioridades e viver com propósito
Tiago Paiva
Estamos vivendo um ano raro, um momento que não se repete com frequência. 2025 não é apenas mais um número no calendário – ele é um ano-quadrado-perfeito, ou seja, o resultado de um número multiplicado por ele mesmo: 45 x 45 = 2025. Assim como a matemática conecta e equilibra os números, este ano nos convida a equilibrar nossas vidas e a aproveitar cada momento.
E que tal transformar essa analogia num propósito para 2025? Assim como um quadrado perfeito é único, cada dia desse ano pode ser a chance de recalcular prioridades e alinhar nossas escolhas com o que realmente importa.
CUIDE DA SUA SAÚDE: O SEU PRIMEIRO
PRESENTE
Nosso corpo é o templo onde moramos, e este ano é o momento de valorizar mais esse presente. Alimentação saudável, exercícios regulares e momentos de descanso são essenciais. Não deixe para depois o cuidado com a saúde física e mental – afinal, só podemos dar o nosso melhor aos outros se estivermos bem conosco.
FORTALEÇA OS LAÇOS COM OS AMIGOS
2025 pode ser o ano de reencontros. Ligue para aquele amigo que você não vê há anos. Planeje momentos juntos. Os laços de amizade são como a base de um quadrado: sólidos e sustentadores. Não perca a oportunidade de mostrar aos seus amigos o quanto eles são importantes.
AME SUA
ESPOSA/MARIDO, AME SEUS FILHOS
O amor é a força que nos conecta e nos dá sentido. Neste ano especial, dedique tempo à sua família. Um olhar, um abraço, um “eu te amo” sincero – tudo isso transforma dias comuns em dias extraordinários. Ame
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/39a4d9f8f573f736a27d46ecce4a7c4f.jpeg)
sua esposa/marido como no primeiro dia. Abrace seus filhos como se o amanhã não fosse garantido.
VALORIZE SEUS PAIS ENQUANTO PODE
Se seus pais ainda estão por perto, você tem um tesouro. Reserve um tempo para escutá-los, para retribuir o amor que um dia eles lhe deram. São eles que carregam as histórias que moldaram quem você é hoje.
DÊ O SEU MELHOR NO TRABALHO
O trabalho é uma forma de contribuir para o mundo. Que 2025 seja o ano de mais dedicação, mais aprendizado e mais impacto. Faça com que cada tarefa seja feita com amor e excelência. Isso não só constrói sua carreira, mas também reflete o cuidado com sua missão na vida.
O MAIS IMPORTANTE: TEMPO PARA DEUS
Por mais que tudo na vida seja importante, nada pode ocupar o lugar de Deus. Este ano é o momento perfeito para colocar em prática o maior mandamento: “Amar a Deus sobre todas as coisas”. Reserve momentos diários para oração, meditação e reflexão. Ao fazer isso, você estará fortalecendo a sua base espiritual, algo essencial para enfrentar qualquer desafio.
Assim como 2025 é único e especial, nossa vida também é. Que possamos usar este ano para sermos melhores em todas as áreas – cuidando de nós mesmos, dos outros e, acima de tudo, da nossa relação com Deus. Feliz 2025, o ano perfeito para amar, cuidar, viver e servir!
(*) Tiago Paiva é publicitário, ex-gerente de Projetos Estratégicos no Ministério da Educação e membro do Conselho da RNP. Liderou o planejamento de projetos complexos como Ronda no Bairro e Modernização do Transporte Público em Manaus.
Crédito: Acervo Pessoal
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/4ee20f74c8a80f7799eb15453ef7f7c5.jpeg)
![](https://assets.isu.pub/document-structure/250201045105-f73c28929d8a0b67304c8f24de5dd983/v1/07513652cf7d5d02c80637559d4091f5.jpeg)