Para quem pensa, decide e vive o agribusiness
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O agro brasileiro enfrenta o desafio de alimentar o mundo enquanto preserva o planeta
Depois de invadir as cidades, os veículos movidos a bateria chegam ao campo
CARREIRA
A DEMANDA POR PROFISSIONAIS
QUALIFICADOS PARA AS LAVOURAS NÃO PARA DE CRESCER
UM SÉCULO DE SOJA COMO O GRÃO REVOLUCIONOU A ECONOMIA BRASILEIRA NOS ÚLTIMOS 100 ANOS
TURISMO RURAL O RESGATE DAS TRADIÇÕES DO INTERIOR ATRAI CADA VEZ MAIS VISITANTES
CONECTIVIDADE
Por que a rede 4G se tornou imprescindível nas fazendas
O aumento da população mundial nos próximos anos – seremos quase 10 bilhões de pessoas até 2050 – coloca o agronegócio diante de um grande desafio: como produzir alimento suficiente para abastecer o planeta sem exaurir os recursos naturais disponíveis? A resposta passa necessariamente por um modelo sustentável de agricultura, que priorize a eficiência e o equilíbrio entre crescimento econômico e conservação.
A boa notícia é que estamos preparados para enfrentar a nova realidade. A partir do início dos anos 2000, o Brasil se consolidou como líder no crescimento da produtividade agrícola global. Segundo um estudo do Serviço de Pesquisa Econômica (ERS), órgão vinculado ao Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), essa liderança abrange um universo de 187 países. Entre 2000 e 2019, o crescimento médio anual da produtividade agrícola brasileira foi de 3,18%, superando amplamente a média global de 1,66% e deixando para trás países como Índia, China e Estados Unidos.
A reportagem de capa desta edição traz esses e outros dados que comprovam a vocação do agro nacional para liderar a produção sustentável de alimentos, combinando inovação tecnológica, práticas regenerativas e eficiência no uso de recursos. Ou seja: mais do que atender à demanda crescente por alimentos, o Brasil se posiciona como peça-chave no combate à degradação do planeta.
Boa leitura!
Amauri Segalla Diretor Editorial
plantproject.com.br
Diretor Editorial
Amauri Segalla amauri.segalla@datagro.com
Diretor
Luiz Felipe Nastari
Comercial
Carlos Nunes carlos.nunes@plantproject.com.br
Sérgio Siqueira sergio.siqueira@plantproject.com.br
João Carlos Fernandes joao.fernandes@plantproject.com.br
Tida Cunha tida.cunha@plantproject.com.br
Arte
Thaís Rodrigues (Direção de Arte) Andrea Vianna (in memorian – Projeto Gráfico)
Colaboradores
Texto: André Sollitto, Lucas Bresser, Mário Sérgio Venditti, Romualdo Venâncio e Ronaldo Luiz
Design: Bruno Tulini
Produção
Lau Borges
Revisão
Rosi Melo
Eventos
Luiz Felipe Nastari
Administração e Finanças
Cláudia Nastari
Sérgio Nunes publicidade@plantproject.com assinaturas@plantproject.com
Impressão e acabamento: Piffer Print
G GLOBAL pág. 7 A AGRIBUSINESS g pág. 15 F FRONTEIRA r pág. 73 W WORLD FAIR pág. 87 S STARTAGRO pág. 95 M MARKETS pág. 114 rA ARTE pág. 79 F FORUM o pág. 69
UNIVERSO AGRO LTDA. Calçada das Magnólias, 56 - Centro Comercial Alphaville – Barueri – SP CEP 06453-032 - Telefone: +55 11 4133 3944
a era das tarifas Como a vitória de Donald Trump afeta o agronegócio nos EUA e no mundo
GLOBAL
O lado cosmopolita do agro
ESTADOS UNIDOS
O que a vitória de Donald Trump significa para a agricultura americana e como afeta as transações globais de commodities
A vitória de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos vai provocar mudanças drásticas na estratégia de política internacional americana – e a alteração de rota terá impacto significativo no trabalho dos produtores rurais. O principal receio dos agricultores está relacionado a uma potencial nova guerra tarifária contra a China. Trump ameaçou impor uma tarifa geral de 60% sobre produtos chineses, o que seria uma escalada em comparação com o pico de 25% no primeiro mandato do republicano, entre 2017 e 2021. De acordo com um relatório do Departamento de Agricultura americano, a experiência pregressa foi malsucedi-
da. As tarifas reduziram as exportações agrícolas em 27 bilhões de dólares nos cerca de 18 meses seguintes ao início da primeira guerra comercial, em meados de 2018.
A China é o principal mercado de exportação dos Estados Unidos. Tarifas mais altas poderão afetar as oportuni-
dades de mercado para os agricultores, especialmente em um momento em que eles lutam para competir com commodities de preços mais baixos de outros países. Se a China retaliasse com suas próprias tarifas de 60% sobre produtos agrícolas dos Estados Unidos, o resultado seria uma perda de 25 milhões de toneladas de exportações de soja e 90% de exportações de milho, segundo dados de estudo encomendado pela National Corn Growers Association e pela American Soybean Association, organizações que representam, respectivamente, os produtores de milho e soja. Além disso, uma nova guerra tarifária imposta por
Trump tem potencial para estreitar ainda mais as relações comerciais entre a China e o Brasil. No primeiro mandato de Trump, os chineses foram forçados a comprar algumas commodities dos Estados Unidos devido à escassez de grãos e à disseminação da peste suína africana. Desde então, o país ampliou sua produção agrícola e se aliou a outros grandes produtores de commodities, como o Brasil. Em 2023, as exportações agrícolas brasileiras para a China atingiram o recorde de US$ 60,2 bilhões, representando 36% do comércio agrícola total do País.
Para balancear os impactos da guerra tarifária contra a China, Trump afirmou, na
campanha presidencial, que proporia acordos comerciais como o colocado em prática em 2019, revogando algumas tarifas em troca de a China comprar mais produtos agrícolas americanos. Segundo analistas, é possível também que ele recupere um programa de resgate agrícola que injetou bilhões de dólares na agricultura americana após a guerra comercial. Para isso, no entanto, será preciso convencer os republicanos a abrir os cofres do país, ao mesmo tempo que há uma pressão para economizar gastos públicos. De qualquer maneira, a possibilidade de uma nova rodada de tarifas já está tirando o sono de quem trabalha no campo americano.
MUNDO
Desde 2018, a consultoria McKinsey entrevista agricultores de diversos países para entender melhor a visão de cada um. Em 2024, a empresa consultou 4,4 mil agricultores da Europa (França, Alemanha e Holanda), Índia, América Latina (Argentina, Brasil e México) e América do Norte (Canadá e Estados Unidos) para entender o nível de adoção de novas tecnologias nas lavouras. Na média, 49% dos fazendeiros estão dispostos a testar produtos que aumentem a produtividade de suas lavouras. Na América do Norte, a porcentagem chega a 57%. Parte dessa vontade está ligada a um receio com a queda da produtividade causada pelas mudanças climáticas. Mas há barreiras, como o elevado custo de implantação de algumas tecnologias e certo ceticismo manifestado por produtores. Apenas 27% estariam dispostos a comprar produtos, tecnologias ou equipamentos inovadores. Mesmo a adoção de técnicas e práticas de sustentabilidade está condicionada a um aumento de produtividade. Programas de sequestro de carbono, por exemplo, têm adoção mínima. Nesse cenário, os produtores brasileiros estão entre os mais ligados em tecnologias agrícolas. Por aqui, 50% disseram que usam ou pretendem usar tecnologias de agricultura digital, porcentagem que fica atrás apenas dos Estados Unidos. Confira os principais resultados do estudo:
49%
dos agricultores usariam novos produtos para aumentar a produtividade
35%
testariam insumos de proteção da lavoura
64%
dos produtores brasileiros já adotam bioestimulantes e biofertilizantes em suas fazendas
27% comprariam produtos, equipamentos e tecnologias inovadoras
60%
dos produtores brasileiros usam ou pretendem testar ao menos uma nova tecnologia em suas propriedades
54%
dos produtores da América Latina adotariam técnicas sustentáveis se elas representassem um aumento de produtividade
53%
dos produtores brasileiros usam ou pretendem usar tecnologias de agricultura digital
foto:
Autoridades canadenses de saúde confirmaram que um adolescente da província de Colúmbia Britânica testou positivo para o vírus da gripe aviária A(H5). Ele recebeu tratamento em um hospital infantil e especialistas acreditam que a doença foi contraída diretamente de um pássaro da região. O ministro da saúde do Canadá, Mark Holland, afirmou que se trata de um “caso raro” e que os riscos permanecem baixos para a população. É inegável, contudo, que as autoridades sanitárias estão preocupadas. A gripe aviária H5 está disseminada em aves selvagens do mundo e têm provocado surtos em vacas leiteiras nos Estados Unidos, com vários casos humanos recentes entre trabalhadores dos segmentos de laticínios. No total, 450 fazendas em 15 estados americanos foram afetadas desde março, e 46 casos humanos foram registrados desde abril. No Canadá, 22 propriedades foram expostas ao H5. Além disso, o vírus pode ter sido o responsável pela morte de tigres e outros animais no Vietnã. Embora não existam casos de transmissão entre humanos, há o temor entre os cientistas de que uma nova pandemia de grandes proporções possa se instalar.
Cultivado quase exclusivamente na região das montanhas de Cederberg, no Cabo Ocidental da África do Sul, o arbusto conhecido como rooibos tem sido usado para o preparo de infusões há muitos anos. Mas agora passou a ser adotado no preparo do “espresso vermelho”, que funciona como substituto do café. A novidade é uma iniciativa do casal Pete e Monique Ethelston e do sócio Carl Pretorius. O trio descobriu que as plantas de rooibos podiam ser preparadas de forma semelhante a uma xícara de café, com espuminha e tudo, e misturada com leite para dar origem a uma bebida semelhante a um cappuccino, mas sem a cafeína e com poder antioxidante. A empresa, Red Espresso, conta atualmente com 60 funcionários. O portfólio é composto por 100 itens, vendidos em 12 países. Cerca de 40 toneladas são compradas anualmente direto de pequenos produtores familiares, responsáveis por cultivar rooibos de qualidade superior. Outras 160 toneladas anuais são provenientes de fazendas maiores da região. O sucesso da empresa foi motivado por uma busca dos consumidores por alimentos saudáveis, e o “supercafé” tem apelo nesse sentido. Agora, os empreendedores buscam expandir a atuação para novos países.
Fundada em 2012 na cidade de Munique, a startup alemã OceanLoop desenvolveu um sistema de criação de camarões que usa tecnologia para dar aos produtores o controle total sobre cada parâmetro da operação e, assim, aumentar a produtividade e o uso eficiente dos recursos naturais. O sistema da startup usa inteligência artificial para detectar dados da biomassa e níveis de estresse com o objetivo de garantir o bem-estar dos crustáceos. Por enquanto, a empresa opera duas unidades-piloto em Munique e em Kiel, com capacidade de 5 toneladas de camarões por ano. Agora, a empresa anunciou um aporte de 35 milhões de euros do Banco Europeu de Investimento (EIB), instituição que financia projetos que atendem aos objetivos de desenvolvimento da União Europeia. Com os recursos, a OceanLoop vai ampliar a capacidade de produção da unidade de Kiel para 60 toneladas anuais, além de construir uma outra nas Ilhas Canárias, na Espanha. O objetivo é garantir camarões de qualidade, rastreáveis e produzidos de acordo com a legislação de bem-estar animal estabelecida na Europa.
Uma das manifestações mais extraordinárias da engenhosidade dos astecas, as chinampas mexicanas consistem em ilhas criadas em áreas alagadas e pantanosas com o objetivo de cultivar alimentos. Por centenas de anos, a comida produzida nessas áreas alimentou a população. A crescente urbanização, porém, está colocando a tradicional técnica agrícola em risco. Os produtos cultivados nas chinampas perderam valor e muitas famílias estão abandonando a antiga prática para vender ou alugar suas terras para usos mais lucrativos, como
campos de futebol. A iniciativa é alarmante: enquanto a agricultura nas chinampas nãoexige defensivos agrícolas, os gramados requerem uma alta aplicação de produtos químicos. Para preservar essa técnica sustentável e ancestral, o grupo Chinampa Refuge desenvolveu estratégias modernas, como a criação de uma etiqueta de “indicação de procedência”, que certifica a origem e a qualidade dos alimentos. Preservar as chinampas não é apenas uma questão cultural, mas também ambiental, dada a sua vocação sustentável.
foto: Shutterstock
A Universidad Mayor Real y Pontificia de San Francisco Xavier de Chuquisaca, em Sucre, Bolívia, será a mais nova depositante do Banco Global de Sementes de Svalbard, no Ártico. Fundada em 1624, a instituição enviará amostras de milho e feijão, culturas essenciais para a segurança alimentar local. O projeto será financiado pelo Crop Trust, uma organização internacional dedicada à preservação da biodiversidade agrícola global, e pelo governo
A África tem se consolidado como um polo promissor para investimentos em agtechs, com destaque para fintechs e marketplaces agrícolas. Em 2023, os dois segmentos arrecadaram US$ 65 milhões, representando 41% de todos os aportes em tecnologia agrícola no continente, segundo o Africa
AgriFoodTech Investment Report 2024, estudo realizado pela plataforma AgFunder. O relatório aponta que plataformas digitais estão transformando o ecossistema agrícola africano ao conectar agricultores, consumidores e fornecedores e eliminar intermediários – o que reduz custos e aumenta a eficiência. Nos últimos dez anos, fintechs e marketplaces africanos do agro captaram US$ 554 milhões. O Quênia lidera o setor, com US$ 335 milhões recebidos. O avanço dessas soluções reforça o papel estratégico da tecnologia no desenvolvimento agrícola do continente.
norueguês. Segundo os cientistas envolvidos no projeto, a iniciativa visa preservar a diversidade genética dessas culturas, ameaçadas pela adoção de variedades comerciais. Comunidades indígenas, como quíchuas e guaranis, atuarão como guardiãs de sementes tradicionais, com o apoio da universidade. As sementes serão armazenadas em bancos locais e no Ártico, garantindo sua conservação no longo prazo.
Futuro em jogo
O agro enfrenta um desafio cada vez mais urgente: produzir mais sem exaurir o planeta
Empresas e líderes que fazem diferença
g
Empresas e líderes que fazem diferença
SUSTENTABILIDADE E INOVAÇÃO LIDERAM A TRANSFORMAÇÃO DO SETOR AGROPECUÁRIO, COM INICIATIVAS QUE AUMENTAM A PRODUTIVIDADE E REDUZEM IMPACTOS AMBIENTAIS
Por Lucas Bresser
Ag
Reportagem de Capa
população mundial ainda vai crescer muito antes de começar a decrescer. Estimativas da Organização das Nações Unidas (ONU) apontam que, em 2050, seremos quase 10 bilhões de pessoas no mundo (hoje, somos 8 bilhões). Depois disso, espera-se uma gradual redução até 2100, quando deveremos voltar ao patamar de aproximadamente 7 bilhões de habitantes. Até lá, será preciso alimentar, vestir e movimentar toda essa população sem exaurir os recursos do planeta. Em muitos aspectos, já estamos perdendo essa batalha. Em 2023, quase 750 milhões de pessoas enfrentaram fome no mundo, segundo as Nações Unidas. E o ritmo da mudança climática nunca foi tão intenso e visível, afetando inclusive a produção agrícola, especialmente naqueles países que dependem fortemente do ciclo de chuvas, como o Brasil.
A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) frequentemente alerta sobre esses desafios. Para Qu Dongyu, diretor-geral da FAO, os sistemas agroalimentares precisam ser transformados para enfrentar adversidades globais, como desigualdades estruturais, mudanças climáticas e degradação ambiental. “Se os sistemas atuais continuarem, o futuro será marcado por insegurança alimentar persistente e recursos degradados”, diz. Ele propõe “gatilhos de transformação”, incluindo governança melhorada, consumidores mais conscientes e tecnologias inovadoras para garantir sustentabilidade e resiliência.
Um estudo da FAO aponta que o estado dos recursos de solo, terra e água atingiu níveis críticos na última década. Segundo Qu Dongyu, é urgente proteger esses recursos fundamentais para a segurança alimentar global. Por exemplo, espera-se que a produção de alimentos tenha de aumentar em 50% até 2050, o que pode levar a um aumento de até 35% na retirada de água para a agricultura, criando riscos ambientais e sociais. A ONU também alerta que fatores como conflitos, extremos climáticos e choques econômicos vêm intensificando a insegurança alimentar. Para a entidade, em um contexto de escassez de recursos e desigualdades crescentes, é essencial repensar os
Estimativas feitas pela ONU apontam que, em 2050, seremos quase 10 milhões de pessoas no mundo. Atualmente, somos 8 bilhões
subsídios agrícolas para priorizar alimentos mais nutritivos e sustentáveis, reduzindo as barreiras comerciais para frutas, vegetais e leguminosas. A FAO defende que as transformações necessárias exigirão esforços coordenados entre governos, consumidores, setor privado e academia. Governança mais inclusiva, uso responsável dos recursos naturais e acesso igualitário às inovações tecnológicas são fundamentais para alimentar uma população crescente sem comprometer a sustentabilidade do planeta.
Não há fórmula mágica. Para alimentar e proteger o mundo, os grandes players do setor agropecuário têm de assumir a dianteira e implementar mudanças práticas, efetivas e – especialmente – em escala. A grandiosidade da cadeia de produtores e fornecedores envolvidos na transformação é um aspecto crucial. Felizmente, o Brasil tem bons exemplos nesse sentido. Além de contar com uma das legislações mais modernas do mundo para a preservação de áreas protegidas, o País também está na vanguarda em iniciativas do setor privado voltadas à proteção dos recursos naturais.
A Agropalma, maior produtora de óleo de palma sustentável das Américas, é uma das companhias que adotam práticas sustentáveis em escala no Brasil. A empresa preserva 64% de sua área total (107 mil hectares) como florestas nativas protegidas, ajudando a conservar a biodiversidade da Amazônia. Isso inclui iniciativas de monitoramento e proteção contra invasões e desmatamentos. A Agropalma também só planta em áreas previamente convertidas, evitando o desmatamento de novas áreas florestais. Todas as terras de cultivo foram adquiridas antes de 2004, respeitando critérios de sustentabilidade e legislação ambiental.
Além disso, a empresa trabalha em pesquisa para desenvolver variedades de palma mais produtivas e resistentes, permitindo maior aproveitamento por hectare e reduzindo a necessidade de expansão de áreas cultiváveis. Recentemente, o grupo anunciou que vai produzir 2 milhões de mudas clonais de palma por ano a
Reportagem de Capa
M arcelo Dalmagro, da Cargill:
"Empresas e consumidores estão engajados na pauta ambiental"
partir de 2026. A companhia investiu R$ 18 milhões no laboratório de mudas clonais em Belém (PA) –até 2026, esse montante chegará a R$ 25 milhões. “O ponto forte do nosso laboratório é que ele trabalha com genética customizada capaz de atender à característica desejada, como mudas com reduzida necessidade de fertilizantes, com tolerância à menor ou maior quantidade de água, ou com maior produtividade”, afirma André Borba, diretor Agrícola da Agropalma.
A Agropalma também possui um programa de gestão de emissões de gases de efeito estufa. Desde 2014, a empresa é carbono neutro, compensando todas as emissões relacionadas à produção de óleo de palma por meio de ações de conservação florestal e eficiência energética. A empresa ainda adota práticas rigorosas para otimizar o uso da água, como o reúso na irrigação e no processamento industrial, além de monitorar constantemente os recursos hídricos para evitar desperdícios. Além disso, a Agropalma mantém projetos de recuperação de áreas degradadas e monitora a
fauna e a flora em suas áreas preservadas, promovendo o equilíbrio ambiental. Por fim, o grupo reutiliza resíduos da produção de óleo de palma, como fibras e caroços, para gerar energia em suas próprias instalações industriais. Isso diminui a dependência de fontes externas e fósseis.
Na pecuária, uma das empresas brasileiras que se destacam é a JBS, maior produtora de proteínas do mundo. O grupo tem implementado diversas iniciativas voltadas à sustentabilidade e à produtividade sustentável. Uma delas é o monitoramento da cadeia de fornecimento, que tem a meta de garantir o desmatamento zero em toda a cadeia de suprimentos de gado no Brasil até 2025. Para isso, a empresa utiliza recursos tecnológicos como a Transparent Livestock Farming Platform (Plataforma de Transparência na Criação de Gado), que permite rastrear toda a cadeia, incluindo fornecedores indiretos, além da aplicação de blockchain e satélites para monitoramento.
A companhia vai além. “Na produção integrada de aves e suínos, a JBS apoia e estimula a modernização e adoção de tecnologias sustentáveis, como a produção de energia elétrica por meio do biogás e energia solar, além de práticas de bem-estar animal”, diz Liège Correia, diretora de Sustentabilidade da JBS. “Já na cadeia da pecuária bovina, a JBS possui o programa Escritórios Verdes, criado em 2021, que reúne 20 centros de atendimento a produtores, apoiando mais de 14 mil propriedades na regularização ambiental, e com 6 mil hectares destinados à restauração florestal.”
Segundo a JBS, é fundamental promover o comércio justo como pilar para combater a fome e a pobreza. Ao mesmo tempo, é preciso investir na redução de desperdícios de alimentos e na ampliação da produção sustentável, promovendo acesso de produtores rurais a novas tecnologias e à assistência técnica fundamentada em soluções baseadas na natureza – e escaláveis. “Essa abordagem integrada não apenas fortalece os sistemas alimentares globais como também contribui para mitigar os impactos das mudanças climáticas e proteger a biodiversidade, criando um ciclo virtuoso de prosperidade e resiliência”,
Um estudo da FAO revelou que o uso dos recursos de solo, terra e água atingiu níveis críticos na última década
diz Liège Correia. “A sustentabilidade da cadeia produtiva é imprescindível para a perenidade do agronegócio. A JBS busca produzir com menos recursos, além de estender esse conceito a toda sua cadeia de valor, principalmente em parceria com os produtores rurais.”
As iniciativas da JBS também incluem a promoção da agricultura regenerativa, incentivando a recuperação de áreas degradadas e melhoria da saúde do solo por meio da integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) e do manejo sustentável de pastagens para aumento da capacidade de sequestro de carbono. A empresa também instalou sistemas de reúso de água em
suas unidades produtivas e reduziu a dependência de combustíveis fósseis em suas operações. Para isso, montou plantas de geração de energia limpa, como solar e biogás, e promoveu o uso de resíduos orgânicos (biomassa) para movimentar os sistemas geradores.
A JBS ainda tem o objetivo de atingir 100% de resíduos reaproveitados até 2030, seja para produzir biogás e adubos, seja para transformar subprodutos do processamento animal em produtos como gelatina e colágeno. Resíduos animais das operações da empresa nos Estados Unidos, no Canadá e na Austrália também estão sendo convertidos em combustível para aviões.
O BRASIL SE DESTACA COMO UM DOS PROTAGONISTAS DA PRODUÇÃO GLOBAL DE COMIDA
1. China É o maior produtor de alimentos, responsável por um quarto de toda a comida cultivada globalmente.
2. Estados Unidos É o maior exportador agrícola do mundo, com destaque para milho, soja, trigo e carne bovina.
3. Brasil É o maior produtor e exportador de soja. Também é o maior produtor mundial de açúcar e café, e o maior exportador de milho e carne bovina.
4. Índia É um dos maiores produtores de trigo e leite do mundo.
5. Rússia É um dos maiores produtores de grãos, com destaque para trigo, cevada e milho.
Fonte: Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura
Nos últimos dois anos, 1,2 milhão de toneladas de sebo bovino e banha de porco foram destinadas à produção de Combustível Sustentável para Aviação (SAF, sigla em inglês para Sustainable Aviation Fuel) e outros combustíveis renováveis.
A utilização do sebo bovino para a produção de biocombustível é chamada de cowpower. No Brasil, a Friboi começou a investigar a viabilidade de utilizar resíduos animais na produção de combustível para aviação. Paralelamente, a Biopower, outra empresa do grupo JBS, está avaliando a possibilidade de produzir combustível renovável para navios, como uma alternativa ao bunker oil, combustível fóssil amplamente utilizado em embarcações marítimas.
Muitas das iniciativas sustentáveis adotadas pelo setor têm como foco a melhoria da produtividade – que nada mais é do que produzir mais consumindo menos recursos. É ela que guia as decisões estratégicas no campo, especialmente entre as grandes corporações do agronegócio. Nesse aspecto, o Brasil se destaca como referên-
A redução do uso de combustíveis fósseis e a adoção de tecnologias sustentáveis na produção de energia serão fundamentais
cia mundial. Desde o início dos anos 2000, o País tem se consolidado como líder no crescimento da produtividade agrícola global. Segundo um estudo do Serviço de Pesquisa Econômica (ERS, na sigla em inglês), órgão vinculado ao Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), essa liderança abrange um universo de 187 países. Entre 2000 e 2019, o crescimento médio anual da produtividade agrícola brasileira foi de 3,18%, superando amplamente a média global de 1,66% e deixando para trás países como Índia, China e Estados Unidos.
Atualmente, o grande desafio para os produtores é continuar avançando na produtividade em um cenário marcado por mudanças climáticas intensas, oscilações econômicas e questões sociais. “Nas últimas quatro décadas, impulsionado pelo empreendedorismo do produtor rural brasileiro e por um conjunto de políticas públicas que abarcaram desde infraestrutura até o apoio à produção e comercialização, passando por pesquisa, desenvolvimento e inovação, o Brasil
conseguiu quintuplicar sua produção de grãos, utilizando apenas 60% a mais de área plantada”, afirma Eduardo da Silva Matos, pesquisador da Superintendência Estratégica da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). “Essas políticas tiveram como foco principal os ganhos de produtividade proporcionados pela inovação, pela produção em escala e pelo acesso aos mercados internacionais”, acrescenta Pedro Abel Vieira Júnior, também pesquisador da Embrapa. Como resultado, houve um aumento contínuo na produção, melhoria na qualidade dos alimentos, avanço nas exportações, exploração de fontes alternativas de energia, preservação ambiental e geração de conhecimento estratégico para o País.
Agora, o Brasil deve ampliar o desenvolvimento e a disseminação do conhecimento, da tecnologia e da inovação entre todos os protagonistas do setor. “Uma boa parte dos ganhos virá da difusão de conhecimentos e tecnologias que já são aplicadas hoje em dia, mas que ainda podem estar restritos a
um ou outro segmento”, diz Felipe Serigati, pesquisador da FGV Agro. “Existem aqueles que estão na liderança e existe o mercado mais geral. Se você tornar isso mais espalhado, o ganho será expressivo.” Serigati ressalta que, para que o campo absorva as inovações, é fundamental contar com um modelo financeiro sólido – seja por meio de crédito bancário, seja pelo autofinanciamento dos próprios agentes do setor – aliado a uma cadeia logística eficiente. O especialista também aponta que culturas como milho, café, trigo e hortifrúti estão entre as que mais podem se beneficiar com a disseminação do conhecimento. Além disso, ele enfatiza que esse progresso exige atenção especial à gestão do agronegócio. “A tecnologia, a inovação, a máquina, a semente melhorada, tudo é importante, mas por trás disso há muita evolução em termos de gestão do negócio”, afirma.
A camada de gestão também está no foco de uma das principais iniciativas da Raízen, companhia integrada de origem brasileira referência em bioenergia e açúcar. O Programa Elos, lançado dez anos atrás, busca transformar completamente a cadeia de produção de cana-de-açúcar por meio da melhoria contínua e de práticas que respeitem o meio ambiente, os direitos humanos e trabalhistas. A ação pioneira se tornou referência global e engaja mais de 2 mil produtores e 20 mil trabalhadores, cobrindo 435 mil hectares de terras a cada safra.
Presente em cerca de 200 municípios de quatro estados – São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul e Goiás –, o Elos tem 30 colaboradores dedicados integralmente. Apenas no último ano, esse time ajudou a implementar mais de 400 ações de melhoria, resultantes de cerca de 2,5 mil visitas técnicas. Todas as propriedades participantes do Elos foram visitadas pelo menos uma vez. No total, os produtores atendidos cultivaram 35 milhões de toneladas de cana-de-açúcar. Além disso, o programa já dedicou mais de 500 hectares de área de preservação para ações de reflorestamento, em parceria com a SOS Mata Atlântica.
ONDE A DESNUTRIÇÃO É MAIS GRAVE, AFETANDO PRINCIPALMENTE A VIDA DAS CRIANÇAS
1. Somália Conflitos e crises climáticas deixam 4,8 milhões precisando de suporte nutricional. País tem alta taxa de mortalidade infantil e desnutrição.
2. Iêmen Conflito desde 2014 causa escassez de alimentos e 49% das crianças sofrem de desnutrição.
3. Chade Conflitos e mudanças climáticas deixam 17% da população faminta. Tem alta taxa de mortalidade infantil.
4. Madagascar A agricultura dependente da chuva é ameaçada por secas e ciclones e 40% das crianças sofrem de desnutrição.
5. República Democrática do
Congo Violência e crise econômica deixam 25% da população em insegurança alimentar. A inflação alta afeta os preços dos alimentos.
6. Haiti Crise humanitária e violência aumentam a insegurança alimentar: 50% da população está desnutrida.
7. Níger 80% da força de trabalho depende da agricultura, 47% das crianças sofrem de desnutrição e 12% não chegam aos 5 anos.
8. Libéria Após guerra civil e surtos de Ebola, 47% da população enfrenta insegurança alimentar. A agricultura é afetada pelas mudanças climáticas.
Crise humanitária deslocou 25% da população e deixou um terço faminta.
10. Coreia do Norte Insegurança alimentar crônica e desnutrição infantil são comuns, afetando mais de 53% da população. Fonte: Global Hunger Index – Concern Worldwide/Welthungerhilfe
“Os resultados e impactos do programa são notáveis, com melhorias significativas no campo tanto em relações trabalhistas, como segurança ocupacional e conformidade com as leis, quanto em relação ao meio ambiente, como capacitações para operação de máquinas e implementos agrícolas e treinamentos voltados à agricultura regenerativa”, diz Ricardo Berni, diretor de Agronegócios da Raízen. “O principal aspecto é a transformação de nossos fornecedores em defensores das boas práticas de negócios, sustentabilidade ambiental e gestão responsável.” Segundo a Raízen, 44% dos mais de 2 mil fornecedores engajados na iniciativa são produtores de pequeno porte (até 50 hectares), o que reforça o caráter inclusivo do programa.
A Raízen também é pioneira na produção de etanol de segunda geração (E2G) em escala
comercial, aproveitando resíduos da cana-de-açúcar (como palha e bagaço). Esse biocombustível reduz significativamente a pegada de carbono e aumenta a eficiência do uso de matéria-prima. A empresa já opera duas plantas de E2G no Brasil, incluindo a maior do mundo, localizada em Guariba (SP). A Raízen ainda transforma subprodutos da produção de açúcar e etanol, como bagaço de cana, em energia elétrica renovável. Além disso, utiliza resíduos industriais como fertilizantes no campo e implementa programas de reutilização da água, reduzindo o desperdício e otimizando recursos naturais.
Os programas das grandes corporações do agro têm em comum o alcance estendido dentro das cadeias de produção. Num ecossistema essencialmente integrado, isso é positivo por não limitar os benefícios apenas às empresas e ativos
O Brasil, como um dos líderes na exportação de alimentos, é um país-chave para a ampliação das melhores práticas produtivas
diretamente ligados ao negócio principal. No caso da Cargill – que trabalha tanto como compradora e processadora quanto como fornecedora de produtos alimentícios e agrícolas para diversos tipos de negócios e indústrias –, não é diferente. O grupo lançou recentemente o Programa ReSolu, que visa transformar áreas degradadas em produtivas e melhorar a saúde do solo. A iniciativa inclui apoio técnico para recuperação de terras para agricultura, uso de insumos que promovem a regeneração do solo, ferramentas financeiras para viabilizar a transição para práticas sustentáveis e monitoramento do impacto ambiental, como a redução de emissões de gases de efeito estufa. Uma das metas da empresa é recuperar 100 mil hectares de áreas degradadas nos próximos anos. “Não é uma empreitada simples, mas a boa notícia é que cada vez mais produtores rurais, empresas e consumidores estão engajados nessa causa, buscando soluções inovadoras e práticas para garantir um futuro mais sustentável”, diz Marcelo Dalmagro, diretor de Tecnologia e Marketing Estratégico da Cargill. Para o executivo, o mercado de proteína animal, em especial, é parte indissociável da solução. Por isso, a Cargill recentemente anunciou uma parceria com a Embrapa para evoluir nos estudos realizados em câmaras respiratórias climatizadas, que representam um grande avanço na precisão da mensuração de emissões de gases de efeito estufa na pecuária de corte.
Outra iniciativa, ao lado da Coopavel, possibilitou a redução de 23% das emissões de amônia na criação de suínos em uma das unidades de produção de leitões da cooperativa, em Cascavel (PR). Nesses estudos, foi utilizada uma dieta para os animais com o aditivo eubiótico Aromex, cuja composição fitoterápica consegue reduzir a amônia em suínos em diferentes fases de crescimento, além de melhorar a eficiência do aproveitamento dos alimentos. As reduções obtidas com o uso da tecnologia equivalem a 119 toneladas de CO2, o que corresponde à queima de 50 mil litros de gasolina.
Para Dalmagro, os maiores ganhos ainda virão
Liège Correia, diretora de Sustentabilidade, JBS : "Buscamos produzir com menos recursos"
da convergência de tecnologias, práticas e conhecimentos para otimizar a produção, reduzir o impacto ambiental e garantir a segurança alimentar. “Podemos esperar avanços significativos em produtividade sustentável a partir da combinação de diversas práticas, como pecuária de precisão, economia circular, energias renováveis e gestão da água”, diz. Segundo o diretor da Cargill, com o crescimento da população e, por consequência, a necessidade de maior produção de alimentos, a fronteira mais promissora continua sendo o aumento da produtividade. “O Brasil, ocupando uma posição estratégica no cenário de produção de alimentos, é um país-chave para a implementação e ampliação de melhores práticas. Por isso, é essencial trazer o produtor para fazer parte desse processo de mudança e de adoção de diferentes ferramentas.”
SEM POLUIR O MEIO AMBIENTE, TRATORES MOVIDOS
A BATERIA PODEM REDUZIR CUSTOS OPERACIONAIS
E AUMENTAR A PRODUTIVIDADE NAS PLANTAÇÕES
Por Mário Sérgio Venditti
Quem visita uma propriedade rural é capaz de encontrar automóveis e caminhões elétricos nas suas atividades do dia a dia. Não vai demorar muito, porém, para que essa cena incorpore outro veículo movido a bateria: os tratores. A eletrificação, que vem revolucionando a mobilidade nas cidades, também está chegando ao campo, e os profissionais do setor já percebem que esse tipo de tecnologia traz mais eficiência, precisão e reduz os valores das planilhas de custos.
Grandes fabricantes de equipamentos agrícolas estão desenvolvendo tratores com motorização elétrica para, em breve, colocá-los na lida das lavouras. Mas há uma empresa brasileira que não quis esperar o movimento das multinacionais, agiu em silêncio e, neste ano, iniciou as vendas de seus primeiros tratores elétricos. Localizada em Joinville (SC), a Yak oferece a Linha AG, composta pelas versões 2572,
Tratores da New Holland ( ao lado ) e da Case IH , marcas que pertencem ao conglomerado CNH I ndustrial: aposta nos modelos elétricos
1272 com cabine e 1272 sem cabine, todas destinadas para aplicações agrícolas. “Os tratores custam, em média, R$ 300 mil e são ideais para trabalhar na agricultura familiar, nas plantações de café e frutas cítricas, por exemplo”, afirma João Ozório, fundador e CEO da Yak. “Cada etapa foi muito bem estudada. Quando a Yak nasceu, tínhamos o pensamento de atuar no agronegócio com tratores 100% elétricos. Com a evolução dessa tecnologia, nos sentimos preparados para dar esse passo importante.”
O passo foi além e o portfólio da Yak diversificou-se em tratores elétricos para aplicações industriais e aeroportuárias. O executivo conta que a opção da empresa foi instalar nos tratores a bateria de lítio-ferro-fosfato (LFP), semelhante à utilizada nos automóveis de passeio da fabricante chinesa BYD, que entrega mais capacidade energética. “Importamos as células e fabricamos os packs das
baterias de 25 kWh e 72 kWh, que permitem uma autonomia de 5 a 10 horas”, diz. Ozório calcula que a economia financeira gerada na manutenção dos tratores elétricos da Yak chega a 70% em comparação com uma máquina similar abastecida com diesel.
A Yak aposta no aumento da demanda, que exigirá a ampliação de suas instalações. Segundo Ozório, a fábrica de 600 metros quadrados que acomoda 150 funcionários passará para mil metros quadrados em 2026. Os planos incluem a construção de uma unidade na cidade de Serrana, na região de Ribeirão Preto (SP), onde o agronegócio é muito rico. Enquanto isso não acontece, a Yak vai se estruturando. Com capacidade para
produzir 250 tratores por ano, ela pretende montar uma rede de pós-vendas abrangente para dar assistência aos clientes em qualquer parte do País. “Por enquanto, três grupos de representantes já cobrem os estados de São Paulo, Santa Catarina, Bahia e Pernambuco”, afirma o executivo. “Em dois anos, nossa meta é ter 50 lojas.”
A primeira empresa a lançar tratores elétricos para o agronegócio brasileiro já está semeando o terreno para o futuro, com o projeto do 80E, versão com potência mais elevada prestes a sair do forno. Além disso, vem desenvolvendo a plataforma Yak Cloud, que vai conectar os veículos dos fazendeiros, e o sistema de telemetria para monitorar todos os
tratores em operação nas propriedades. No entanto, Ozório tem consciência de que há muito para avançar. “Embora seja uma realidade, o trator elétrico não é o único caminho para a descarbonização no campo”, diz. “Afinal, ele ainda não consegue suprir 100% das necessidades das lavouras, o que abre espaço para o surgimento de modelos híbridos.”
Alguns potenciais concorrentes acompanham de longe a atuação da Yak, mas sem demonstrar pressa para lançar suas máquinas e fazer frente à empresa de Santa Catarina. Em 2022, a NewHolland, empresa do conglomerado CNH Industrial, apresentou o protótipo T4 Electric Power, trator totalmente elétrico e com dispositivos autônomos. “Fizemos uma exposi-
João Ozório ( à dir. ), fundador da Yak: "Quando a empresa nasceu, queríamos atuar no agronegócio com tratores 100% elétricos"
ção para sentir a reação do setor e conhecer a viabilidade de um produto como esse no mercado. O resultado foi altamente positivo”, afirma Flávio Mazetto, diretor de Produto e Portfólio da CNH para a América Latina. “Os profissionais do agronegócio, de acordo com suas políticas de ESG (ambiental, social e governança), buscam a sustentabilidade com a diminuição da pegada de carbono, além do aumento de produção na área disponível e da redução de custos.”
O T4 Electric Power tem tração 4x4, vem equipado com motores de 75 cv a 120 cv de potência e bateria de íon de lítio de 110 kWh. O conjunto leva o veículo a 40 km/h de velocidade máxima. “A autonomia dependerá da
aplicação do usuário e das condições do solo onde será colocado”, afirma Mazetto. “Mas a bateria tem alcance suficiente para um dia todo de jornada, com a recarga sendo feita à noite.” Segundo a fabricante, o T4 é uma solução bastante adequada para operações de menor potência, como atividades agrícolas mistas, gado, pomares, borrifação de defensivos e agricultura regenerativa.
Outra vantagem da eletrificação dos tratores agrícolas é o silêncio durante a operação. O nível de ruído do T4 é 90% inferior quando comparado a um modelo a combustão e a vibração praticamente não existe, aumentando o conforto do condutor e eliminando o risco de assustar o gado em áreas cercadas. Mazetto
explica que o desenvolvimento do T4 levou cinco anos, período abreviado por uma decisão estratégica da CNH Industrial: a aquisição, em 2021, de parte da Monarch Tractor, empresa americana de tecnologia agrícola, que deu mais rapidez aos estudos do protótipo.
As tecnologias previstas para equipar o T4 também chamam atenção. Ele possui sensores, câmeras e unidades de controle para que os agricultores ativem a máquina remotamente, por meio de aplicativo do smartphone. Outro recurso é o Smart Roof, teto inteligente que integra sensores e câmeras 360 graus, utilizando técnicas de visão computacional para reconhecimento de objetos em tempo real, a fim de evitar colisões. Na hora da manutenção,
foto: Shutterstock
o proprietário pagará menos, porque a quantidade de peças é menor do que a de um trator a diesel. “Uma máquina convencional passa por revisão depois de, aproximadamente, 300 horas trabalhadas. Isso não acontece com o elétrico. Na ponta do lápis, o custo operacional cai 90%”, diz Mazetto.
O desenvolvimento de tratores elétricos se estende à Case IH, outra marca da CNH Industrial, que concebeu o Farmall 75C Electric. Ele entrega desempenho semelhante ao modelo diesel, com tempo médio de operação de quatro horas, possibilidade de recarga rápida e, a exemplo do T4, custos de manutenção reduzidos. De acordo com a fabricante, o 75C Electric é muito versátil em operações como o cuidado
Motor movido a etanol: tecnologias limpas terão papel cada vez mais fundamental no agro e na preservação do planeta
com os vinhedos e outras plantações, e o gerenciamento de um pequeno rebanho.
Funções automatizadas inteligentes e modos de assistência ao operador fazem a diferença no Farmall 75C Electric. Uma das ferramentas mais úteis chama-se “Follow Me” (siga-me, em inglês), recurso em que o trator acompanha o operador quando ele está fora da cabine. Esse sistema de automação, capaz de aumentar a eficiência operacional, é prático em situações rotineiras da fazenda, como passar por porteiras ou alimentar o gado.
Os tratores elétricos estão na rota de uma energia mais limpa do agronegócio, mas, na visão da CNH Industrial, não será o único “combustível” alternativo das fazendas moder-
nas. A companhia também investe forte em motores movidos a biometano, que, segundo Mazetto, exibe ganhos importantes. “O método de reciclagem reaproveita os resíduos das fazendas para produzir o biogás, que, passado por um processo de filtragem, converte-se em biometano, responsável pela redução de 80% das emissões de dióxido de carbono (CO2) e 30% dos custos operacionais”, acrescenta o executivo. De olho nesse mercado, a CNH criou o T6.180 Methane Power, primeiro trator do mundo movido a biometano. Se o homem do campo quiser produzir o gás dentro de sua propriedade, terá de montar uma infraestrutura mínima e desembolsar cerca de R$ 2 milhões na aquisição do biodigestor, equipamento que
realiza a decomposição e a filtragem da matéria orgânica. Caso contrário, ele pode comprar o combustível em uma das mil fábricas de biogás espalhadas pelo País.
Com 150 cv de potência, o T6.180 Methane Power comporta 420 litros de gás, suficientes para uma operação de oito horas. Outra solução é o motor a etanol, projeto 100% brasileiro e projetado em parceria com a FPT Industrial. Chamado de Cursor 13, o propulsor-conceito está em fase de desenvolvimento e será testado em colhedoras de cana-de-açúcar. Mazetto não descarta também o lançamento de tratores movidos a hidrogênio verde no futuro. “Por se tratar de uma tecnologia cara, a previsão é de que eles estejam comercialmente
disponíveis daqui a 15 anos”, diz.
Tratores da New Holland ( no alto, à esq. ) e da Yak: a eletrificação, que avança nas cidades, também está chegando ao campo
Elétrico, biometano ou etanol, seja qual for a tecnologia de energia limpa escolhida pelo agricultor, Mazetto defende o fortalecimento de um programa de incentivos vindo do governo federal direcionado a quem está empenhado em reduzir as emissões. Uma possibilidade é a abertura de linhas de crédito atrativas para a compra dos tratores ecológicos e equipamentos como painéis fotovoltaicos, que jogam a energia captada pelo sol para os eletropostos usados na recarga das baterias das máquinas. “A sustentabilidade está no radar dos produtores”, diz Mazetto. “No entanto, eles precisam de contrapartida, ou seja, de estímulo para tornar suas propriedades ainda mais amigáveis ao meio ambiente.”
CULTURA COMPLETA UM SÉCULO DE BRASIL COM
LUGAR PRIVILEGIADO ENTRE OS ITENS AGRÍCOLAS E
UM IMPACTO GIGANTESCO NO DESENVOLVIMENTO DA AGROECONOMIA NACIONAL
Por Romualdo Venâncio
A grandeza da cadeia produtiva da soja é demonstrada pelos valores bilionários que movimenta e pelos empregos que gera
Aestimativa da produção nacional de soja para a safra 2024/25 já passa de 166,1 milhões de toneladas, indicando um aumento de 12,5% sobre o resultado do período anterior, quando o Brasil colheu 147,7 milhões de toneladas do grão. Na mesma base comparativa, a área plantada cresceu 2,6% – passou de 46,1 milhões de hectares para 47,3 milhões de hectares, o que evidencia o ganho em produtividade. Esse cenário de progressão se dá mesmo com todos os desafios climáticos enfrentados pelas lavouras nas últimas safras, com estiagem de um lado e excesso de chuva de outro. Divulgados pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), os números são apenas alguns dos indicadores da grandeza que a soja brasileira representa, dentro e fora do País.
Quaisquer estatísticas sobre o complexo da soja no Brasil são expressivas. Um balanço recente feito pela Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) estima que o setor deverá encerrar o ano de 2024 com esmagamento de 54,5 milhões de toneladas, e esse volume aumentará 4,6% em 2025, quando chegará a 57 milhões de toneladas. Em relação às exportações do grão, a perspectiva da entidade é de que chegue a 98,3 milhões de toneladas em 2024 e, no ano que vem, a 104,1 milhões de toneladas, com avanço de 6%.
A grandeza da cadeia produtiva da oleaginosa ainda é demonstrada por diversos outros segmentos que a acompanham – insumos agrícolas, máquinas e implementos, tecnologias, serviços – e por índices macroeconômicos, como a geração de milhares de empregos. No entanto, a soja não se tornou o principal produto agrícola do Brasil da noite para o dia, de um ano para o outro e nem de uma década para outra. A história da estruturação do complexo da soja no País vem sendo escrita há pelo menos 100 anos.
O ano de 1924 marca o início do plantio da soja em larga escala. A trajetória secular, contudo, começou dez anos antes, em novembro de
1914, pelo município de Santa Rosa, ao norte do Rio Grande do Sul – daí o título de “Berço Nacional da Soja” –, com a introdução da cultura já com o viés de se tornar um produto comercial. Isso porque o plantio da oleaginosa de forma experimental já havia ocorrido na Bahia, no final do século 19. De acordo com o livro A Saga da Soja – de 1050 a.C. a 2050 d.C., escrito pelos pesquisadores da Embrapa, Decio Luiz Gazzoni e Amélio Dall’Agnol, “o primeiro registro do cultivo de soja no Brasil é atribuído a Gustavo D’Utra, em 1882, mas este professor da Faculdade de Agronomia de Cruz das Almas fracassou em sua tentativa de produção comercial”.
Também não dá para afirmar se o que houve naquele período, em novembro de 1914, foi uma revolução agrícola trazida pela soja. Na verdade, o que se tinha, naquele momento, era um punhado de sementes trazidas ao Brasil por um pastor luterano americano em uma garrafa selada com cera. Era Albert Ernst Heinrich Lehenbauer, nascido no estado do Missouri, no centro-oeste dos Estados Unidos, que trouxe as sementes para Santa Rosa. “Ele reuniu alguns produtores e distribuiu as sementes, mas com o compromisso de que fossem multiplicadas e compartilhadas com outros agricultores”, diz Mauro Eduardo Servat, coordenador da Unidade de Cooperativismo Regional de Santa Rosa da Emater.
Servat é também o vice-presidente da Fenasoja, a Feira Nacional da Soja, realizada entre 29 de novembro e 8 de dezembro, no Parque de Exposições de Santa Rosa, e que teve como tema principal a celebração dos 100 anos da soja. Na próxima edição do evento, que ocorrerá em 2026, Servat é quem estará à frente da organização, como presidente. “É uma responsabilidade maior ainda dar sequência a esse trabalho”, afirma. O ano de 1914 é marcado ainda pelo início da Primeira Guerra Mundial, que impactou fortemente a produção agrícola, inicialmente na Europa, onde as fazendas perderam a mão de
obra para os exércitos, o que acabou impulsionando a mecanização. Logo, os efeitos do conflito se espalharam pelo mundo. O Brasil, que declarou neutralidade em relação à guerra, manteve o envio de produtos agrícolas aos países que participavam do combate. No sentido contrário, vinham os europeus, sozinhos ou com suas famílias, que abandonaram seu continente, fugindo daquele cenário de terror, e acabaram formando por aqui as colônias de alemães, italianos, poloneses e de outras nacionalidades.
Longe da guerra, os estrangeiros também encontraram desafios no Brasil. Na região onde a soja começou a ser cultivada, a infraestrutura era bem precária. “Aqui não tinha nada, não tinha eletricidade, era difícil. Muitas pessoas até precisaram de ajuda para tratar da saúde psicológica”, afirma Servat. “O que vemos hoje em dia na produção agrícola vem de um momento em que o associativismo já foi muito forte. E vimos isso se repetir com a dificuldade das últimas enchentes. Mantivemo-nos unidos e saímos fortalecidos.”
De acordo com o livro A S aga da Soja, houve importantes experimentos com o cultivo do grão entre os anos 1920 e 1930, mas foi na década
seguinte que a oleaginosa passou a ganhar relevância econômica de fato. “O primeiro registro estatístico nacional ocorreu em 1941, no Anuário Agrícola do Rio Grande do Sul, com área cultivada de 640 hectares, produção de 450 toneladas e rendimento de 700 kg/ha”, diz a publicação. Naquele ano, houve a instalação, em Santa Rosa, da primeira indústria processadora de soja do País. Em 1949, foi a primeira vez que o Brasil apareceu nas estatísticas internacionais como produtor do grão, com um volume de 25 mil toneladas.
Nos anos 1950, a soja brasileira, ainda plantada exclusivamente no Rio Grande do Sul, pegou carona no início do programa oficial de incentivo à triticultura nacional, para formar a rotação de culturas, que já se mostrava uma prática vantajosa tanto do ponto de vista agronômico quanto econômico. Essa combinação ajudava ainda a atenuar os riscos do agricultor, pois a soja oferecia uma alternativa de colheita sob condições climáticas diferentes das que envolviam o trigo. A dobradinha com o cereal impulsionou o cultivo da soja na Região Sul.
Uma das fases mais relevantes no desenvolvimento da soja no Brasil começou em 1966, no município gaúcho de Ibirubá. Tratava-se do Plano
Estadual de Melhoramento da Fertilidade do Solo, também chamado de “Operação Tatu”. A iniciativa, que reunia diversas instituições de pesquisa, como a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e a Emater, tinha como objetivo incrementar a produtividade da agricultura no estado, sobretudo por meio da análise e da recuperação da fertilidade dos solos.
Os resultados não saíram como o esperado em Ibirubá. Por isso, a operação passou a ser desenvolvida em Santa Rosa, onde realmente começou a fazer a diferença. “Apesar de jovem, o solo já estava desgastado, faltava calcário”, diz Servat. O coordenador da Emater destaca a importância da pesquisa na evolução da agricultura. “As análises de solo nos mostraram qual era a necessidade de correção e em quais níveis”, diz. O manejo de recuperação impactou diretamente na produtividade das lavouras, o que virou um argumento irrefutável para quem ainda desconfiava daquela ação. “O solo voltou a ter produtividade e a técnica se espalhou pelo País.”
A preparação da base permitiu passos mais firmes na evolução da soja. “O grande boom da cultura se deu na década de 1970”, diz o chefe-geral da Embrapa Soja, Alexandre Nepomuceno. A
Houve experimentos com o cultivo do grão nos anos 1920, mas foi na década seguinte que a soja ganhou relevância econômica
explicação para isso é o melhoramento genético da planta no Brasil, o que deu origem a cultivares devidamente adaptadas às condições locais. “As variedades que chegaram ao Brasil eram muito sensíveis ao fotoperíodo e precisavam da redução da luminosidade para florescer”, afirma Nepomuceno. “O problema é que não conseguiam crescer tanto, e por causa disso produziam menos.”
A disparada do melhoramento genético da soja nos anos 1970 correspondeu a um determinado contexto socioeconômico. Naquela década, conforme descrito no livro A saga da soja, o mercado mundial da oleaginosa foi fortemente impulsionado pela demanda de farelos proteicos e por uma concomitante redução da oferta, em especial da farinha de peixe, a principal fonte que abastecia o mercado de rações animais à época. Os sinais de novas oportunidades estimularam a migração do cultivo da soja para o centro do País. Diante das dificuldades de ampliar suas áreas, devido ao alto custo de terras, agricultores gaúchos venderam suas propriedades e pegaram a estrada rumo ao Paraná e ao Centro-Oeste. O Brasil era o único país a cultivar soja, em escala comercial, em regiões tropicais. Sem dispor de variedades adaptadas para baixas latitudes e que
apresentassem melhores resultados nas novas terras – apesar de baratas, elas tinham baixa fertilidade –, os agricultores recorreram às instituições de pesquisa, em grande parte públicas. “Durante algumas décadas, a Embrapa, como empresa pública, dominava o mercado de sementes. Quando as empresas privadas perceberam as oportunidades, passaram a investir também”, afirma Nepomuceno.
Outro destaque no desenvolvimento genético da soja é a transgenia. Segundo a CropLife Brasil, associação que representa empresas especializadas em pesquisa e desenvolvimento de soluções para a produção agrícola sustentável, a primeira soja transgênica foi desenvolvida nos Estados Unidos, em 1994, e começou a ser cultivada no Brasil em dezembro de 1998. Foi quando a Embrapa Soja recebeu sementes de uma linhagem derivada da cultivar BR-16, geneticamente modificada com o gene de tolerância ao glifosato. De acordo com a entidade, a soja transgênica, também chamada de OGM (organismo geneticamente modificado), teve grande impacto na rotina das lavouras e nos resultados da atividade, por oferecer variedades mais
resistentes a problemas como pragas e deficiência hídrica e assegurar maior produtividade. A soja transgênica apresentou resultados mais positivos até no armazenamento, por sofrer menos com a contaminação por aflatoxinas (toxina causada por fungos).
Outro salto da soja no campo do melhoramento pode vir da edição genética, com tecnologias como o CRISPR (Clustered Regularly Interspaced Short Palindromic Repeats), que permite promover mudanças na cadeia do DNA de diferentes organismos, a exemplo das plantas, tornando-as mais aptas a enfrentar desafios como sensibilidade ao calor e ao estresse hídrico. “A evolução no período da entrada da soja no Cerrado poderia ser menos demorada com a utilização do CRISPR, uma tecnologia que deveria receber mais atenção”, diz Nepomuceno.
Nos anos 2000, a soja mais do que se consolidou no Brasil Central, e foi ganhando mais espaço também nas novas fronteiras agrícolas do País, a exemplo da região do Matopiba. A cadeia produtiva da oleaginosa ganhou tração com a expansão do setor de infraestrutura, em especial
fotos: Shutterstock
A soja tem papel estratétigo na transição energética e se consolidou como a porta de entrada para as refinarias brasileiras
na área de logística – o crescimento de um segmento favoreceu o outro, e vice-versa. O trajeto nas últimas décadas trouxe a soja brasileira a outro momento de oportunidades. “A soja tem um papel estratégico na transição energética”, afirma Nepomuceno, referindo-se à participação massiva do grão no segmento do biodiesel. “É a porta de entrada para as refinarias brasileiras e para outros óleos vegetais.”
A opinião do chefe-geral da Embrapa Soja é compartilhada pelo presidente da Abiove, André Nassar. Segundo o executivo, o biodiesel estimulou a industrialização da soja. Atualmente, a soja responde por 75% da produção nacional de biodiesel. “E essa proporção tende a crescer”, afirma Nassar. Pela análise do executivo, a soja é a matéria-prima que mais apresenta condições de avançar nessa participação. A aprovação da Lei do Combustível do Futuro, que pode elevar para até 25% a adição de biodiesel na mistura com o diesel, reforça ainda mais essa perspectiva. “Se chegar a essa proporção, teremos de dobrar a capacidade de processar soja.” Pelo visto, os próximos 100 anos do grão também serão marcados pela fartura.
CRISE DE MÃO DE OBRA AMEAÇA A EFICIÊNCIA E A COMPETITIVIDADE DO AGRONEGÓCIO BRASILEIRO, QUE CADA VEZ
MAIS DEMANDA POR PROFISSIONAIS COM CONHECIMENTOS DE TECNOLOGIA, GESTÃO, ADMINISTRAÇÃO FINANCEIRA E PESQUISA
Por Lucas Bresser
Uma ameaça relativamente silenciosa, porém muito real, coloca em risco a produtividade e a competitividade do agronegócio brasileiro. A falta de mão de obra qualificada, tal qual uma praga que se espalha em ritmo constante, cada vez mais tira o sono dos produtores e gestores. A situação preocupa não só pela escassez de trabalhadores, mas também pela dificuldade em manter um fluxo contínuo de formação e sucessão para garantir o futuro do setor, que em 2023 contribuiu com cerca de R$ 720 bilhões para o Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil.
Os números do problema são confirmados por diversas fontes. Segundo a Agência Alemã de Cooperação Internacional, a Universidade do Rio Grande do Sul (UFRGS) e o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), o agronegócio brasileiro precisa de 178,8 mil profissionais qualificados para atuar com tecnologia, mas dispõe de apenas 32,5 mil. No Mato Grosso, um
dos estados mais importantes para o agro nacional, 70% dos produtores relatam enfrentar alta dificuldade na contratação de novos funcionários, enquanto apenas 9% dizem ter baixa dificuldade. A demanda mais urgente é por operadores de máquinas (37%), de acordo com dados do Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea), em parceria com o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar-MT).
Diante desse cenário, 29% dos produtores mato-grossenses declararam buscar mão de obra fixa em outros estados. A mesma pesquisa evidencia que o maior desafio enfrentado pelo agro do Mato Grosso em relação à mão de obra é a necessidade de qualificação técnica, citada por 58% dos entrevistados. “A crescente urbanização tem levado muitas pessoas a migrar das áreas rurais para as cidades, resultando em uma escassez de trabalhadores disponíveis no campo”, diz o consultor em agronegócios Carlos Cogo. “O
Cerca de 40% dos agricultores brasileiros são digitalizados e o País tem penetração de 80% no modelo de plantio direto sustentável
Alberto Santos, da faculdade CNA: o setor oferece boas posições dentro e fora das porteiras das fazendas
Brasil já conta com 86% da população vivendo no meio urbano e apenas 14% no meio rural. Muitos trabalhadores rurais têm baixa escolaridade e falta de qualificações técnicas, o que limita a eficiência e a produtividade.”
O especialista também explica que a demanda por mão de obra pode variar significativamente ao longo do ano, com picos durante a safra, tornando difícil manter uma força de trabalho estável e qualificada. Além disso, ainda faltam programas de capacitação e treinamento, o que limita o desenvolvimento de habilidades necessárias para o setor. “Essas dificuldades exigem uma abordagem multifacetada para serem superadas, incluindo políticas públicas, investimentos em educação e treinamento”, afirma Cogo.
Além do movimento de mão de obra para as cidades, outros fatores que ajudam a explicar a dificuldade em atrair profissionais são a falta de incentivos e condições de trabalho, principalmen-
te em locais remotos e com estruturas deficientes; a falta de formação e capacitação técnica; o perfil etário e geracional de algumas das propriedades rurais, especialmente as familiares, com a concentração de poder em gerações mais velhas limitando o espaço para que jovens inovem; e a visão estereotipada do agronegócio, associando-o a atividades manuais e de baixa tecnologia, o que desestimula carreiras no setor. Além disso, o sistema educacional brasileiro ainda não oferece uma formação integrada e atualizada que aborde as necessidades do agro em transformação digital e sustentabilidade.
Um levantamento do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Esalq/USP, em parceria com a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), mostra que, desde 2012 (início da série histórica), o perfil de mão de obra do agro por escolaridade sofreu uma transformação radical. Em pouco mais de
dez anos, o número de trabalhadores de nível superior cresceu quase 80%. No mesmo período, houve decréscimo entre aqueles que têm apenas o ensino fundamental ou que não têm instrução. Ainda assim, o agro tem imensas dificuldades em atrair e manter os jovens no campo. Dados do IBGE revelam uma queda significativa na participação de jovens de 18 a 29 anos no setor, com exceção feita justamente às funções técnicas.
Em 2012, 2,8 milhões de jovens trabalhavam no agronegócio, número que caiu para 2,4 milhões em 2023, uma redução de 13%. Enquanto isso, a participação de outras faixas etárias aumentou 12,7%, passando de 8,8 milhões para 9,9 milhões no mesmo período. “Essa demanda por mão de obra mais qualificada acontece tanto dentro quanto fora da porteira”, diz Nicole
Rennó, pesquisadora de macroeconomia do Cepea e professora da Esalq/USP.
Segundo a especialista, embora a agropecuária venha perdendo espaço como empregadora para os segmentos de indústria e serviços rurais, o que naturalmente resulta em maior demanda por qualificação, há também um movimento expressivo de elevação do nível médio de escolaridade do lado de dentro da porteira. “Nós acreditamos que essa é uma transformação que veio para ficar e se intensificar”, afirma Rennó. “Não sabemos ainda com que velocidade, mas o setor tem produzido cada vez mais, gerado cada vez mais empregos fora da porteira e visto a agropecuária se modernizar.” A pesquisadora da USP ressalta, no entanto, que a transformação não acontece no mesmo ritmo em todas as áreas. “Esse agro mais moderno e mais intensivo no uso
É preciso capacitar e aprimorar os profissionais que já estão no campo e criar cursos sobre novas tecnologias
de capital ainda está chegando a algumas regiões e culturas, e isso deve continuar estimulando a demanda por trabalho mais qualificado”, afirma.
Outro efeito da dificuldade do agro em atrair mão de obra qualificada são os problemas sucessórios. Dados da Fundação Dom Cabral mostram que mais de 80% dos empreendimentos rurais são comandados pelos fundadores ou pela segunda geração, com apenas 16% na terceira geração e 1% na quarta. Um levantamento de 2020 feito pela UFRGS também mostrou que 61% dos proprietários não estão prontos para a sucessão. E não é que o setor no Brasil careça de oportunidades para aqueles que buscam a vanguarda do mercado. Pelo contrário. Em alguns aspectos, o agronegócio nacional está mais avançado do que o americano e o europeu em digitalização e sustentabilidade. Segundo
pesquisa da consultoria McKinsey, cerca de 40% dos agricultores brasileiros são digitalizados, e o País tem penetração de 80% no modelo de plantio direto sustentável, enquanto nos Estados Unidos a taxa é de apenas 50%.
Para os especialistas consultados por PLANT PROJECT, a carência é generalizada, mas é especialmente acentuada em áreas que exigem conhecimento tecnológico – como operação de máquinas, captura e análise de dados, gestão e administração. “No agronegócio, o mercado é muito competitivo e incerto, e novos desafios surgem constantemente”, afirma Maria Flávia Tavares, economista, doutora em agronegócio, consultora e professora no MBA em Gestão de Agronegócio da Fundação Getulio Vargas (FGV). “Somente as empresas que estiverem preparadas e forem eficientes se manterão no mercado.”
Segundo Paulo de Tarso Ziccardi, diretor de Agronegócios da consultoria Accenture, o maior desafio está na capacidade de trazer dados e informações de diversas fontes, integrá-las, interpretá-las e usá-las de forma simples e eficaz. “Isso requer conhecimento dos processos, sistemas, tecnologias e uso de dados. Esses pontos não são triviais e poucos conseguem transformar isso em realidade, ou seja, em informações úteis e em ações para o dia a dia”, afirma Ziccardi. “A habilidade de colocar diversas competências para trabalhar em conjunto é fundamental para alcançarmos resultados inovadores por meio do uso das informações.”
As possíveis soluções para esse quadro preocupante são multifacetadas e envolvem iniciativa privada e setor público. Em primeiro
lugar, é preciso aprimorar e capacitar aqueles profissionais que já estão no campo. O investimento em programas de formação técnica voltados para a digitalização do agronegócio é essencial. O Senar qualifica 1 milhão de pessoas anualmente e já possui iniciativas para capacitar profissionais no uso de drones e máquinas agrícolas. Também é fundamental que o ensino rural incorpore cursos sobre novas tecnologias, agricultura de precisão e sustentabilidade. Além disso, é preciso melhorar os incentivos e a remuneração para diminuir a evasão de jovens do setor, com a aplicação de bonificações e benefícios relacionados a moradia e transporte. No Mato Grosso, 47% dos produtores entrevistados pelo Imea já implementam bônus para reter trabalhadores,
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Campanhas de conscientização e programas de intercâmbio com universidades podem atrair jovens que possuem perfil técnico
mas ainda há espaço para melhorias. A sucessão familiar no agronegócio também é um ponto crítico. Programas que incentivem a entrada de jovens na administração das propriedades, oferecendo formação em gestão e tecnologia, podem tornar o setor mais atrativo para sucessores. Benefícios fiscais e linhas de crédito voltadas à modernização de propriedades também podem contribuir para uma sucessão mais estruturada. E ainda é preciso valorizar o uso de tecnologia e dados no campo. Com o aumento da digitalização no setor, profissionais que dominem essas áreas têm se tornado cada vez mais essenciais. Contudo, o uso pleno dessas tecnologias requer formação técnica específica, o que reforça a necessidade de escolas e cursos.
Por fim, é fundamental reverter a percepção do agronegócio como uma carreira desatualizada. Campanhas de conscientização, aliadas a programas de intercâmbio e parcerias com universidades, podem ajudar a atrair jovens com perfil técnico e tecnológico. O agronegócio brasileiro já é referência global em sustentabilidade e eficiência, e essa mensagem precisa chegar aos profissionais qualificados e ao público jovem. “Em geral, os jovens, sobretudo os de vivência urbana, não enxergam o agro como um setor que oferece oportunidades de trabalho atrativas”, diz Alberto Santos, coordenador de ensino da Faculdade CNA. “O setor enfrenta o desafio de comunicar as diversas oportunidades e tendências do agronegócio brasileiro, que oferece boas posições de trabalho tanto em propriedades rurais quanto em grandes multinacionais de insumos e processamento.”
Segundo Santos, no âmbito da CNA e do Senar, a qualificação e a formação de mão de obra são prioridades. A Faculdade CNA tem se dedicado nos últimos anos a formar jovens profissionais que buscam suas primeiras oportunidades no setor, além de requalificar profissionais experientes que necessitam de
atualização diante das transformações em curso. Além disso, com os cursos técnicos do Senar voltados ao agronegócio, agropecuária, fruticultura, zootecnia e florestas, a entidade tem desenvolvido novas competências estratégicas para o avanço do setor. “Iniciativas como essas ajudam a superar os gargalos relacionados à qualificação contínua dos profissionais”, afirma o coordenador de ensino da Faculdade CNA. “Aliás, essa deve ser uma prioridade: somente o investimento em educação continuada para jovens e adultos, desde cursos livres até pós-graduações, pode atender à demanda por profissionais sempre bem qualificados.”
E há também o papel do governo e do Ministério da Educação, tanto no aprimoramento da educação fundamental e técnica quanto nas diretrizes e parcerias para o ensino superior. “É preciso investir em cursos técnicos voltados para as atividades do agronegócio, chamados cursos
profissionalizantes, e certamente em cursos de ensino superior”, diz Pedro Estevão Bastos de Oliveira, vice-presidente da Associação Brasileira de Agronegócio (Abag) e diretor da Máquinas Agrícolas Jacto. “Outra grande reclamação é a desatualização das grades curriculares. A tecnologia anda de Fórmula 1 e o ensino, de Fusca.”
Para Alberto Santos, uma ação mais coordenada e atenta às demandas e projeções apresentadas pelos diversos setores produtivos traria grandes contribuições. “Muitas vezes, a atuação desarticulada das instituições de ensino gera dificuldades para o agronegócio absorver os novos profissionais formados anualmente”, diz. “Há uma falta de experiência prática e intensidade nas atividades de ensino e extensão no agro. Sabemos que isso muitas vezes está relacionado à falta de iniciativa dos estudantes, mas o setor público pode agir para aprimorar esse perfil entre futuros profissionais.”
O Ministério da Educação deveria investir em cursos técnicos e de ensino superior voltados para pessoas que desejam trabalhar no campo
AS ÁREAS MAIS CARENTES DE MÃO DE OBRA QUALIFICADA NO AGRO
A adoção cada vez maior de tecnologias como a agricultura de precisão, drones e big data requer profissionais com habilidades específicas para operar e manter equipamentos e softwares sofisticados.
A gestão sustentável de recursos como água e solo precisa de especialistas que possam implementar práticas de conservação e uso eficiente.
Pesquisa e Desenvolvimento
O setor de P&D é crucial para o desenvolvimento de novas culturas e técnicas agrícolas, mas enfrenta dificuldades em atrair pesquisadores qualificados.
foto: Divulgação
Nicole Rennó, pesquisadora da E salq /USP : "A demanda por qualificação veio para ficar"
e Finanças A gestão administrativa e financeira das propriedades agrícolas também requer profissionais com conhecimentos específicos para lidar com as complexidades do setor.
A implementação de programas de saúde e segurança no ambiente de trabalho rural é essencial, mas muitas vezes carece de profissionais qualificados para gerenciá-los.
Fonte: Carlos Cogo, consultor em agronegócio
POR QUE O PROCESSO DE ARMAZENAMENTO DE CARBONO PODERÁ RESULTAR EM GANHOS
FINANCEIROS E AMBIENTAIS PARA O SETOR SUCROENERGÉTICO
Por Ronaldo Luiz
O mercado brasileiro de captura e armazenamento de carbono poderá movimentar até R$ 20 bilhões anuais
Uma tecnologia amplamente utilizada no segmento petrolífero pode aprimorar ainda mais a sustentabilidade do etanol, viabilizando a produção inédita do biocombustível com pegada negativa de carbono. Trata-se do processo de captura e armazenamento do carbono, conhecido mundialmente como CCS (sigla em inglês para Carbon Capture and Storage), que tem como inspiração técnica a injeção de CO2 nos campos petrolíferos. “A tecnologia de CCS é a mais eficiente para a estocagem rápida de grandes volumes de carbono e está na rota de descarbonização proposta pela ONU”, diz Colombo Tassinari, geólogo e professor da Universidade de São Paulo. “O setor de etanol está muito bem posicionado nessa agenda.”
O Brasil tem potencial de captura de carbono em torno de 200 milhões de toneladas de CO2 equivalente por ano, considerando o nível atual de atividade econômica do País. Nesse sentido, o mercado brasileiro de captura e armazenamento de carbono no solo tem perspectiva de movimentar entre R$ 14 e R$ 20 bilhões anuais, com participação significativa do setor de etanol, conforme estimativas da CCS Brasil, entidade especializada no tema. Já o mercado mundial de CCS deverá movimentar US$ 3,5 bilhões em 2024, com previsão de atingir US$ 14,5 bilhões em 2032. Com 40% de participação de mercado, os Estados Unidos lideram os projetos de captura e armazenamento de carbono, removendo da atmosfera anualmente 22,5 milhões de toneladas de CO2 equivalente, como mostram cálculos da consultoria de origem norueguesa Rystad Energy.
Um dos empreendimentos é desenvolvido pela trading ADM no estado de Illinois desde 2011. Segundo os executivos Andrew Duguid e Manoj Valluri, da consultoria Advanced Resources International, outro empreendimento de peso na indústria americana de etanol é o da Red Trail Energy no estado da Dakota do Norte. Existem hoje em dia mais de 50 novos projetos de CCS em análise para obtenção de licenças na Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos, o que demonstra o potencial desse mercado.
O etanol de cana-de-açúcar produzido no Brasil já reduz em até 90% as emissões de gases que contribuem para as mudanças climáticas. A captura e o armazenamento do CO2 gerado durante o processo de produção do biocombustível faz com que essa pegada de carbono seja ainda menor, chegando a ser negativa. “As mais de 360 usinas que produzem etanol no Brasil, em particular no estado de São Paulo, têm a oportunidade de fazer do País o líder global nesse mercado, abrindo as portas para o acesso aos créditos de carbono e criando mais uma fonte de receita para as usinas”, diz o geólogo Everton Oliveira, presidente da Hidroplan, empresa que atua no segmento. “A lei do Combustível do Futuro chegou para estabelecer o marco regulatório de CCS no País, determinando as diretrizes gerais para a atividade”, afirma Isabela Morbach, diretora da CCS Brasil. “A legislação vai destravar projetos já engatilhados, que avançam agora para a fase de real implantação.”
O gestor de ativos Carlos de Mathias Martins Júnior, especializado em créditos de carbono e energias alternativas, destaca que a atividade de CCS no setor de etanol pode resultar em ganhos financeiros para as usinas tanto por meio da geração e comercialização de créditos de carbono – seja no âmbito do RenovaBio ou no mercado voluntário – como também pela certificação do biocombustível como “zero emissor” ou “emissor negativo”. Isso permite que o etanol seja monetizado com ágio em mercados internacionais que valorizam esse atributo. “Investidores, fundos de investimento soberanos de países, assim como empresas prestadoras de serviço na atividade de CCS, estão de olho neste mercado”, diz Martins.
O valor de mercado dos créditos de carbono lastreados em CO2 armazenado no solo é maior do que créditos provenientes, por exemplo, do replantio de árvores. A explicação vem de um dos principais especialistas brasileiros em captura, transporte e armazenamento de CO2 no subsolo, o geólogo Milas Evangelista de Sousa, ex-Petrobras.
O especialista esclarece que o crédito de carbono oriundo da atividade de CCS na produção
Colombo Tassinari, professor da USP : "A tecnologia de CCS é eficiente para a estocagem de carbono"
de bioenergia, como é o caso das usinas de etanol, tem maior valor financeiro por dois motivos. Primeiro, porque é considerado um crédito de remoção de CO2 da atmosfera e não de redução de emissões. Segundo, porque é capturado, transportado e armazenado de forma segura e permanente, por tempo indeterminado, com baixo risco de seu retorno à atmosfera. “Por isso, ao confiar mais na entrega ambiental do crédito de carbono de CCS, que ficará estocado eternamente em reservatórios geológicos, o mercado majora seu preço”, diz Sousa.
A consultora americana em energia Sallie Greenberg, com mais de 25 anos de experiência em gestão de carbono, reforça: “O CCS no etanol impede a entrada na atmosfera de carbono que, de outra forma, seria emitido”, diz. “O CO2 gerado na produção de etanol é ainda o mais indicado para armazenamento porque se trata do mais puro, com elevada concentração de carbono com um pouco de água. Isso o torna facilmente capturável e desidratado quando a água é removida.” A explicação é que a biomassa utilizada para a fabricação de biocombustíveis é proveniente de plantas, ou seja, durante seu
crescimento já há a captura de carbono, mas este é novamente lançado na atmosfera quando convertido em energia. Se esse CO2 for capturado e transportado para um local de estoque permanente, como o subsolo, isso resultará em uma remoção negativa de CO2, ou seja, será capturada uma quantidade maior do que foi emitida.
O processo de captura, transporte e armazenamento de CO2 no subsolo está previsto na lei da Política Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio) e pode significar oportunidade para a geração de um maior volume de Créditos de Descarbonização (CBios) e, consequentemente, de renda para as usinas de etanol. “O RenovaBio originalmente prevê um bônus de até 20% na nota de eficiência energética para as unidades produtoras de etanol que emitirem CBios lastreados no armazenamento de carbono no solo, permitindo assim a possibilidade da emissão de mais títulos por parte das usinas”, diz Evangelista de Sousa.
Para uma das pioneiras na produção de etanol de milho no Brasil, a tecnologia de captura e armazenamento de carbono é uma oportunidade de atingir o objetivo de se tornar a maior produtora mundial de biocombustível carbono negativo. É o que destaca o vice-presidente executivo de Sustentabilidade e Novos Negócios da FS Bioenergia, Daniel Costa Lopes. Em uma de suas plantas, localizada no município de Lucas do Rio Verde (MT), a FS está implantando um projeto pioneiro de CCS, que até o momento recebeu cerca de R$ 460 milhões em investimentos, com estimativa de conclusão em junho de 2026. O projeto consiste na captura do CO2 emitido durante a fermentação do milho, etapa final da produção do etanol, e posterior estocagem no subsolo.
Lopes destaca que o retorno do investimento virá da venda de créditos de carbono – tanto no mercado voluntário quanto no âmbito do RenovaBio, além de prêmios pagos em mercados internacionais pelo etanol de pegada negativa de carbono. “Há um grande potencial para esse tipo de biocombustível na fabricação de combustível sustentável de aviação, o chamado SAF, e no setor marítimo também”, conclui o executivo.
RELATOR NA CÂMARA DOS DEPUTADOS DO COMBUSTÍVEL DO FUTURO, O DEPUTADO FEDERAL ARNALDO JARDIM ( CIDADANIASP) , DESTACA AS OPORTUNIDADES QUE A NOVA LEGISLAÇÃO TRAZ PARA AS USINAS DE ETANOL A PARTIR DA ATIVIDADE DE CAPTURA E ARMAZENAMENTO DE CARBONO, QUE RECEBEU CAPÍTULO ESPECÍFICO NA RECÉM-SANCIONADA LEI. NA ENTREVISTA A SEGUIR, ELE DÁ MAIS DETALHES SOBRE A NOVA FRONTEIRA DE NEGÓCIOS QUE O CCS TRAZ PARA AS USINAS DE ETANOL.
A ATIVIDADE DE CCS ESTÁ PREVISTA NO PROGRAMA COMBUSTÍVEL DO FUTURO. COMO O SENHOR ENXERGA AS OPORTUNIDADES DA TECNOLOGIA PARA O SETOR SUCROENERGÉTICO?
O setor sucroenergético brasileiro, em particular o etanol, tem o “DNA” de ser sustentável. Produz biocombustível limpo e renovável e, no elo da lavoura, é ancorado em boas práticas, com mecanização das tarefas, aproveitamento de resíduos e sobras que são transformadas em fertilizantes, além de funcionar como matéria-prima para geração de energia elétrica, e assim por diante. A nova lei vai dar o impulso definitivo do tema no Brasil, destravando projetos já engatilhados.
O CCS TEM POTENCIAL
PARA ELEVAR AINDA MAIS
A SUSTENTABILIDADE DO ETANOL BRASILEIRO?
Uma importante técnica que pode realizar a neutralização de carbono é o uso da biomassa combinada com o CCS, chamada de Bio-CCS (bioenergy with carbon dioxide capture and storage). A biomassa utilizada para biocombustíveis é proveniente de plantas, ou seja, durante seu crescimento já há a captura de carbono, mas este é novamente lançado na atmosfera quando convertido em energia, mesmo que em quantidades menores que os combustíveis fósseis. Se esse CO2 for capturado e transportado para um local de estoque permanente, como o subsolo, isso irá resultar em uma remoção negativa de CO2, ou seja,
será capturada uma quantidade maior do que foi emitido.
A NOVIDADE PODERÁ ATRAIR NOVOS INVESTIMENTOS INTERNACIONAIS PARA O SETOR SUCROENERGÉTICO?
Certamente. O Brasil é o país mais bem posicionado quando falamos de descarbonização e transição energética. Nosso potencial é gigantesco, porque combina oportunidades concretas de produção de energia limpa e renovável em diversas rotas, o que vai ao encontro da agenda global. Não é por acaso que a produção de etanol no Brasil é a mais sustentável do mundo, e com o CCS essa sustentabilidade pode se tornar ainda mais significativa.
NOVAS SOLUÇÕES TECNOLÓGICAS PARA A REDUÇÃO DAS EMISSÕES DE POLUENTES PELO
TRANSPORTE MARÍTIMO PODERÃO ABRIR
OPORTUNIDADES PARA O AGRONEGÓCIO
Por Amauri Segalla
Nos últimos anos, empresas, governos e instituições ambientalistas têm se esforçado para desenvolver soluções capazes de reduzir as emissões globais de dióxido de carbono. Até pouco tempo atrás, o transporte marítimo permanecia alheio aos debates, como se o tema não envolvesse o setor. A situação, contudo, começa a mudar. O transporte marítimo é responsável por 3% das emissões globais de CO₂, o que o coloca como fundamental no esforço global pela descarbonização. Segundo dados apurados pela Organização Marítima Internacional (IMO, na sigla em inglês), o segmento emite, todos os anos, aproximadamente 1 bilhão de toneladas de gases causadores do efeito estufa, e as previsões indicam que, sem medidas corretivas, elas deverão dobrar até 2050 como resultado do aumento do comércio global estimado para o período.
Diante desse cenário, a IMO estabeleceu a meta desafiadora de zerar as emissões das frotas marítimas até 2050. Para isso, aposta em soluções tecnológicas e políticas regulatórias que possam viabilizar a transição sustentável. Inúmeros projetos em andamento mostram que os objetivos da entidade, embora ousados, são realizáveis. Uma dessas iniciativas é a amônia verde. Projetada como um dos combustíveis mais promissores, ela é produzida a partir de energia renovável e não emite CO₂ durante o processo de combustão. Empresas como a dinamarquesa Maersk e a norueguesa Yara International possuem programas voltados para o desenvolvimento da amônia verde como combustível marítimo, e não descartaram
O transporte marítimo é responsável por 3% das emissões globais de dióxido de carbono. mudar esse quadro é urgente
adotá-la em ampla escala a partir de 2030. Há inúmeros projetos em andamento. A European Maritime Safety Agency (EMSA), agência europeia de segurança marítima, financia testes que buscam comprovar a eficácia do hidrogênio como combustível marítimo para uso comercial. Outra alternativa que tem atraído investimentos é o metanol verde. A francesa CMA CGM, uma das maiores empresas de transporte marítimo do mundo, anunciou recentemente que navios movidos a metanol deverão entrar em operação nos próximos anos. No curto prazo, uma solução viável é o uso de biocombustíveis, dada a sua compatibilidade com os motores existentes.
Além de combustíveis alternativos, inovações na propulsão têm ganhado espaço. Uma parceria entre a empresa francesa Louis Dreyfus Armateurs, a finlandesa Norsepower e a gigante da indústria aeroespacial Airbus poderá revolucionar o mercado de velas mecânicas, colaborar para reduzir a poluição na atmosfera e diminuir em 50% as emissões de CO₂ na frota transatlântica até 2030. A solução prevê a instalação de sistemas de velas rotativas em navios comerciais, o que reduzirá de forma significativa o consumo de combustível.
Navios elétricos são outra tendência, embora ainda estejam limitados a embarcações menores, devido à capacidade atual das baterias. Um exemplo notável é o navio dinamarquês Ellen, ferry elétrico que tem autonomia para viajar pouco mais de 100 quilômetros. O desenvolvimento tecnológico de novas baterias deverá abrir um oceano de possibilidades para o setor
A montadora chinesa BYD construiu um navio que utiliza, além do combustível convencional, o gás natural liquefeito
marítimo, assim como ocorreu na indústria automotiva. Enquanto a revolução não vem, uma solução mais rápida é a combinação de motores elétricos com combustíveis de baixo carbono, o que poderia ser adotado como uma alternativa para a transição no curto prazo.
Alguns projetos, contudo, já deixaram os estaleiros para singrar os mares do mundo. A montadora chinesa BYD construiu um navio que utiliza, além do combustível convencional, o gás natural liquefeito. Em maio de 2024, o Explorer 1 deixou o Porto de Lianyungang, no norte da China, para atracar no Porto de Suape, em Pernambuco. A empresa fez grande estardalhaço com a operação, por suas características sustentáveis. Além do navio movido a combustível verde, o Explorer 1 trouxe 5 mil veículos elétricos fabricados pela marca. As frotas marítimas, de fato, estão em vias de passar por grandes transformações. A alemã Hapag-Lloyd e a canadense Seaspan decidiram reformar suas embarcações para adotar o sistema de biocombustível, enquanto a gigante dinamarquesa Maersk já tem três navios de contêineres movidos a metanol.
A transição para combustíveis alternativos exigirá também infraestrutura adequada nos portos. A boa notícia é que muitas iniciativas começam a ser destravadas para apoiar essa transformação. O porto de Roterdã, na Holanda, lidera o desenvolvimento de hubs de abastecimento para hidrogênio e amônia. Outros portos, como o de Singapura, estão investindo em infraestrutura para fornecer GNL e combustíveis alternativos.
Embora o setor esteja mais mobilizado em
O agronegócio será peça-chave do movimento de descarbonização do transporte marítimo, assim como já fez na indústria automotiva
prol da descarbonização, alguns desafios permanecem. Os altos custos de transição, a incerteza regulatória e a falta de infraestrutura uniforme no mundo são barreiras significativas que colocam em xeque as metas estabelecidas pelas organizações internacionais. O custo financeiro é o maior obstáculo: especialistas estimam que o setor marítimo precisará de investimentos entre US$ 1,7 trilhão e US$ 2 trilhões até 2050 para alcançar os objetivos de descarbonização.
O agronegócio será peça-chave desse movimento. O setor proverá os biocombustíveis e outras soluções alternativas baseadas em produtos agrícolas – assim como já faz com o etanol que move veículos pelo Brasil e o SAF, o combustível sustentável de aviação, que está prestes a se tornar realidade. Outro aspecto a se destacar é o fato de que a crescente demanda por produtos sustentáveis tem incentivado consumidores e mercados internacionais a priorizar empresas que adotem práticas ambientais
responsáveis. Ao apoiar a descarbonização da frota, o agronegócio poderá desfrutar de vantagens competitivas, especialmente em mercados mais sensíveis a questões climáticas, como a União Europeia, que já tem estabelecido metas rigorosas de redução de emissões.
Eliminar as emissões de poluentes da frota marítima mundial é uma tarefa colossal, mas essencial para limitar o aquecimento do planeta. Segundo o observatório Copernicus, 2024 será o ano mais quente da história – um recorde que já havia sido quebrado no ano passado. Nesse cenário trágico, combustíveis alternativos, novas tecnologias de propulsão e políticas regulatórias são fundamentais para que os navios deem a sua cota de colaboração. De fato, os projetos em andamento mostram que a transformação é possível, mas o sucesso dependerá de cooperação global, inovação contínua e investimentos trilionários para que o transporte marítimo se torne protagonista de um futuro neutro em carbono.
"novas tecnologias, projetos sustentáveis e gestão profissional impulsionam a produção de alimentos, fibras e energia no brasil"
Ideias e debates com credibilidade
JÁ SÃO REALIDADE E PROJETAM UM FUTURO BRILHANTE PARA O AGRO BRASILEIRO
POR PAULO HERRMANN E MARCO RIPOLI*
Em 2025, o agronegócio brasileiro caminhará aceleradamente em direção a uma matriz energética ainda mais limpa. Para manter-se competitivo e alinhado com as exigências dos mercados internacionais, o Brasil tem investido na produção de biocombustíveis, energia solar e biomassa, aproveitando subprodutos da própria produção agropecuária. Por exemplo, o reaproveitamento de dejetos suínos e resíduos da cana-de-açúcar para gerar energia limpa não só reduz as emissões, mas também transforma esses resíduos em valor dentro do conceito da economia circular.
Nos últimos sete anos, quando começou a produção de etanol de milho no Brasil, 22 usinas já foram construídas, somando uma produção anual de mais de 6 bilhões de litros. Essas usinas, que consomem 12,5% da produção total de milho do País, refletem a capacidade empreendedora do agro brasileiro. Entre as 22 unidades, 10 operam no modelo flex, utilizando tanto milho quanto cana-de-açúcar para a produção de etanol – numa configuração única no mundo.
Com o programa Combustível do Futuro, o mix de etanol na gasolina, que está em 27,5%, deverá ser elevado para 30% até 2030. Além disso, já existem 15 novos projetos aprovados para usinas de etanol de milho, trigo e sorgo, que, somadas às usinas de cana (436 unidades), consolidam o País como o maior produtor de bio -
combustíveis do mundo.
O setor de biodiesel também tem relevância no Brasil, com 51 usinas em operação e uma produção de aproximadamente 7 bilhões de litros por ano. Essas unidades já absorvem cerca de 20% da produção nacional de matérias-primas, entre outras, a soja. Atualmente, a mistura de biodiesel no diesel está em 14% (B14) e deverá aumentar gradativamente até 20% (B20) em 2030, segundo o programa Combustível do Futuro.
No segmento de energia solar e eólica, o Brasil também é referência, especialmente em regiões como o Centro-Oeste e o Nordeste, que apresentam alta incidência solar. A produção equivale atualmente à geração de energia de mais de cinco usinas Itaipu. Além disso, o combustível de aviação sustentável (SAF) tem se destacado como uma das alternativas mais promissoras para reduzir a pegada de carbono do setor aéreo. Produzido a partir de fontes renováveis, como óleos vegetais, resíduos orgânicos e até mesmo resíduos sólidos urbanos, o SAF permite uma redução significativa nas emissões de gases de efeito estufa, podendo diminuir em até 80% as emissões de CO₂ em comparação com o querosene de aviação tradicional.
De acordo com Arturo Barreira, CEO da Airbus para a América Latina, o Brasil pode se tornar líder mundial na produção de SAF, alcançando a marca de 50 bilhões de toneladas nos próxi-
*Paulo Herrmann é CEO da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (FIERGS) e da PH Advisory Group. *Marco Ripoli é diretor da PH Advisory Group
O Brasil se tornou referência no segmento de energia eólica, especialmente na região Nordeste
mos anos. Isso coloca o País como a futura “Arábia Saudita do SAF”.
Finalmente, o hidrogênio verde, produzido principalmente a partir de etanol, poderá ser uma solução viável e exclusiva brasileira à descarbonização do setor automotivo.
CONECTIVIDADE NO CAMPO
A transformação digital no campo é essencial para a sua competitividade, principalmente possibilitando o uso pleno da tecnologia já disponível. Atualmente, estima-se que existam mais de 200 empresas fornecedoras de drones e sensores, além de 400 plataformas de gestão de dados no Brasil atuando na maximização da eficiência na aplicação de insumos, na redução de desperdícios e no uso racional de recursos como água e fertilizantes.
A agricultura de precisão reduz significativamente o impacto ambiental, um diferencial que atende exigências de sustentabilidade de mercados internacionais. Tecnologias para monitoramento de solo, clima e doenças de forma preditiva permitem que o Brasil entregue produtos agrícolas com maior qualidade e rastreabilidade, agregando valor para a exportação. Também é notável a chegada da Starlink e sua rede de mais de 3,4 mil satélites de baixa órbita, que trouxeram avanços revolucionários ao destravar a conectividade mesmo nas mais remotas áreas rurais do Brasil.
Diferentemente de muitos setores da economia no Brasil e no agro mundial, que enfrentam dificuldades em
Estima-se que existam no país 200 empresas de drones, além de 400 plataformas de gestão de dados
atrair jovens talentos e sofrem com o envelhecimento da força de trabalho, o agronegócio vem revertendo essa tendência, onde a idade média dos trabalhadores do setor é de 46 anos – a mais baixa entre as grandes potências agrícolas. Em comparação, a média de idade no setor agrícola dos Estados Unidos é de 58 anos e, na União Europeia, de 62 anos.
O rejuvenescimento do agro brasileiro decorre da atração que a tecnologia exerce sobre o jovem. Ele, por sua vez, traz consigo centenas de startups com soluções digitais que tornarão o setor mais competitivo no futuro.
INCLUSÃO FEMININA: OUTRA REALIDADE BRASILEIRA
A relevância do papel das mulheres em qualquer atividade é inquestionável.
Exemplo disso é a realização do Congresso Nacional de Mulheres no Agro (CNMA), que, nas suas últimas edições, atraiu mais de 3 mil congressistas vindas de todos os estados brasileiros.
Grupos de afinidades nas redes sociais são frequentemente encontrados entre cooperativas, organizações de classe e principalmente de forma informal, unidos apenas pelo desejo de troca de experiências, engajamento, maior protagonismo e defesa dos interesses do agro.
Como exposto acima, a estruturação consistente do agro brasileiro com investimentos em tecnologia, sustentabilidade e gestão profissional consolidará o setor nos próximos anos como o mais importante do mundo para a produção de alimentos, fibras e energia.
A carne é "verde"
Como o Mato Grosso se tornou uma das referências do País na produção sustentável de bovinos
As regiões produtoras do mundo
As regiões produtoras do mundo
DONO DO MAIOR REBANHO BOVINO DO PAÍS, O MATO GROSSO
LIDERA A AGENDA DE DEBATES SOBRE O EQUILÍBRIO ENTRE A PRODUÇÃO E A PRESERVAÇÃO AMBIENTAL
Por Romualdo Venâncio
Anotícia sobre o adiamento de um ano para a entrada em vigor da European Union Deforestation-Free Regulation (EUDR), a lei antidesmatamento da União Europeia, deu uma acalmada nos ânimos dos representantes da cadeia produtiva de carne bovina do Brasil. A nova legislação europeia deveria começar a valer no final de 2024, mas, após grande pressão externa, a data foi alterada para 30 de dezembro de 2025, no caso de grandes empresas, e 2026, se forem micro e pequenas companhias. O anúncio da EUDR provocou uma série de questionamentos no Brasil, sobretudo de quem representa a produção pecuária. Se por um lado os europeus pretendem impor exigências mais severas para permitir apenas a importação de produtos oriundos de áreas livres de desmatamento, do lado de cá do Oceano Atlântico tal cobrança é contestada sob a argumentação de que o Código Florestal brasileiro já é um dos mais rigorosos do planeta e que a pecuária está comprometida com o desmatamento ilegal zero, mantendo o que for permitido por lei.
Uma das indagações em relação à EUDR diz respeito ao fato de ignorar as legislações ambientais e a dinâmica da vegetação de cada país, o que coloca em desvantagem nações que ainda têm grande parte de sua vegetação nativa preservada, conforme análise do Núcleo de Agronegócio Global do Insper. Por causa dessa abordagem, também não há diferenciação sobre o que é desmatamento legal e ilegal, criando barreiras que podem não refletir a realidade das práticas sustentáveis adotadas localmente. De uma forma ou de outra, o desconforto inicial causado pelo anúncio da iniciativa dos europeus promoveu uma ampliação dos debates sobre sustentabilidade, rastreabilidade, transparência e as derivações desses tópicos na cadeia produtiva de carne bovina. Sem a pressão do prazo apertado, representantes dos segmentos ligados à pecuária de corte têm melhores condições de promover conversas que levem a decisões e soluções mais abrangentes, precisas e efetivas. Em um setor baseado na coletividade, não se chega a tal avanço sem diálogo.
A Mesa Brasileira da Pecuária Sustentável (MBPS), organização que reúne 60 organizações de todos os elos da cadeia de produção de carne bovina com o objetivo comum de promover a sustentabilidade na pecuária, realizou uma série de debates sobre “oportunidades e soluções para o produtor atender a EUDR”. Sendo o Brasil o maior exportador global de carne bovina, é fundamental que enderece os problemas que ainda persistem na cadeia para que atenda às novas regulações dos mercados.
Entre as iniciativas que vêm fazendo a diferença nessa questão, a MBPS destaca o Programa Boi na Linha, criado pelo Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora), associação civil sem fins lucrativos que auxilia o Ministério Público Federal na implementação do Termo de Ajustamento de Conduta da Carne. Também conhecido como TAC da Carne, o termo foi firmado com diversos frigoríficos que operam na Amazônia Legal, e é um dos principais instrumentos de controle do desmatamento na cadeia da pecuária bovina no Brasil.
Não há como falar em pecuária sustentável sem citar o Mato Grosso. Primeiro, porque seu território é composto por três biomas – Amazônia (o mais abrangente), Cerrado e Pantanal –, o que é essencial para a composição da biodiversidade local. Ou seja, o tema preservação está presente em toda discussão sobre a produção de carne bovina. O segundo ponto é que o estado tem liderado a agenda de debates sobre o equilíbrio entre a produção de carne bovina e a preservação ambiental.
E não poderia ser diferente, levando-se em conta a posição mato-grossense no ranking nacional da pecuária. Segundo dados da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec), o estado tem o maior rebanho bovino do País, com 34 milhões de cabeças (17% do total). Além disso, está à frente nos abates, com 7,1 milhões de cabeças por ano, e responde por 20% da exportação brasileira de carne bovina.
Prova de como a pecuária mato-grossense está em sintonia com as discussões globais sobre sustentabilidade socioambiental e econômica é a
Três biomas – Amazônia, Cerrado e Pantanal – fazem parte do território do Mato Grosso, o que reforça a biodiversidade da região
promoção do debate entre todos os segmentos ligados à produção de carne bovina. Foi o que se viu durante a segunda edição do encontro “Diálogos Boi na Linha”, realizado recentemente na capital, Cuiabá. O foco do evento se dividiu entre transparência, legalidade e inclusão, com o intuito de colocar sobre a mesa de conversa os desafios e as oportunidades na bovinocultura mato-grossense.
Um dos pontos mais relevantes do evento foi a constatação de que, embora sejam muitas as exigências quanto à produção sustentável, a ideia principal de quem está envolvido com o setor é favorecer o todo. O coordenador do Grupo de Trabalho Amazônia Legal, Rafael da Silva Rocha, deixou clara essa intenção ao detalhar o trabalho realizado pelo órgão em relação à cadeia. “O objetivo não é punir frigoríficos ou fazendas, nem é arrecadar com multas”, diz. “Buscamos, cada vez mais, melhorar e regularizar a cadeia produtiva da pecuária.”
Muito se falou durante o encontro a respeito da relação entre as ações de orientação e as punitivas, e da importância de, durante os processos de avaliação da condição ambiental das fazendas, serem consideradas as diferentes condições de cada propriedade. “Há uma infinidade de situações de baixa complexidade que podem ser fáceis de resolver, trazendo de volta para as negociações um produtor que foi excluído em um processo legitimado pelo mercado”, diz Lisandro Inakake, gerente em Cadeias Agropecuárias do Imaflora.
Na opinião do executivo do Imaflora, é importante formalizar instrumentos para reintegrar esse produtor à cadeia. Uma das medidas seria a diferenciação do desmatamento entre situações insolúveis, de alta complexidade de resolução, e as de baixa complexidade. A partir dessa análise, seria possível também estabelecer uma condição mais justa para cada pecuarista. Assim, quem se enquadra nas situações de baixa
Lisandro Inakake, do Imaflora: evento realizado em Cuiabá consolida o papel do programa boi na linha para a agenda sustentável
complexidade pode ter a condição de resolver o que for necessário, sem ser punido como alguém que está em uma situação mais complicada. Essa classificação poderia até influenciar a cessão de créditos para investimentos. As instituições financeiras também têm restrições baseadas nas condições ambientais das fazendas – devem, inclusive, cumprir um normativo estabelecido pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban), que entrou em vigor em março de 2023.
Um dos grandes desafios no processo de transparência da cadeia produtiva de carne bovina é o monitoramento dos fornecedores indiretos. “É aí que se concentra parte importante do desmatamento”, afirma Cintia Cavalcanti, analista sênior de Cadeias Agropecuárias da organização Amigos da Terra (AdT). “O TAC evoluiu, enxergamos um progresso dos frigoríficos desde o início, mas há essa questão dos indiretos que ainda não foi endereçada.”
Cintia vai além na lista de desafios. “Temos
um problema maior, que é a falta de transparência dos dados da Guia de Trânsito Animal (GTA)”, diz. “Isso dificulta até mesmo para o MPF realizar a auditoria dos indiretos. Como vai ser possível exigir que os frigoríficos monitorem os fornecedores indiretos se o Ministério da Agricultura e Pecuária não tem dados sobre os indiretos?” De acordo com a executiva da AdT, seria necessário que as agências estaduais de defesa sanitária começassem o oferecer uma base mínima de dados para a realização do monitoramento. Por tudo o que se debateu durante o evento “Diálogos Boi na Linha”, ficou claro que a integração das informações ao longo de toda a cadeia é primordial para solucionar grande parte dos desafios. Esse foi um dos pontos apresentados pela secretária adjunta de Gestão Ambiental da Secretaria de Estado do Meio Ambiente de Mato Grosso (Sema), Luciane Bertinatto. De acordo com a executiva, está em desenvolvimento um sistema digital do Cadastro Ambiental Rural (CAR) por
O estado tem o maior rebanho bovino do Brasil e responde por cerca de 20% das exportações da pecuária brasileira
município, para facilitar a validação do registro.
Esse processo tende a garantir mais precisão na coleta de informações e na representação da realidade dentro das fazendas. “Às vezes, uma movimentação do cascalheiro pode disparar um alerta, a partir de uma varredura automática, e aí já entra no polígono da questão ambiental”, afirmou Luciane. Há dois pontos relevantes nessa história. Um deles é a importância de o produtor solicitar uma autorização quando for fazer a retirada ou a movimentação do cascalheiro. O outro é a necessidade de se entender melhor o campo. “Precisamos ter o cuidado de conhecer o que acontece nas fazendas e não ficar só com as decisões tomadas sob o ar-condicionado.”
De maneira geral, a troca de informações e a oportunidade de os integrantes dos mais diversos elos da cadeia produtiva de carne bovina realizarem uma conversa direta foram a grande recompensa do encontro. “Não apenas discutimos os problemas, como trouxemos várias soluções”,
afirmou Cintia Cavalcanti, da AdT. A opinião da executiva foi compartilhada por Lisandro Inakake, do Imaflora: “O evento consolida o papel do Programa Boi na Linha em apoiar tanto a inclusão quanto o desenvolvimento sustentável, engajando todos os participantes em uma agenda positiva para o futuro da pecuária no País.”
Iniciativas como essas, que visam à produção de carne bovina de qualidade e com sustentabilidade, levaram o Mato Grosso a ser um dos destaques da China International Import Expo (CIIE), realizada em novembro, em Xangai. O presidente do Instituto Mato-Grossense da Carne (Imac), Caio Penido, que integrava a comitiva do Brasil na feira, fez questão de gravar com seu celular e publicar em seu perfil no Instagram a fila de visitantes, que chegou a dar volta no estande exclusivo do estado, para degustar o MT Steak, um corte bovino vencedor de uma competição promovida pelo Imac no ano passado e que virou uma marca mato-grossense.
O sabor do campo O turismo rural ganha adeptos ao oferecer a reconexão com a natureza
Um campo para o melhor da cultura
Produtos da queijaria Pardinho, projeto Do Rabo ao Focinho (homem se servindo) e Rancho Churrascada: valorização do campo
Cresce o interesse do público pelo turismo rural, modalidade que propõe a reconexão com a natureza e o contato mais profundo com a produção de alimentos
Por André Sollitto
Com o nome emprestado da cidade do interior de São Paulo, a cerca de 200 quilômetros da capital paulista, a queijaria Pardinho é uma das referências do movimento autoral que vem ampliando o reconhecimento da produção de queijos no estado. A empresa tem produtos em alguns dos principais restaurantes da capital paulista, incluindo casas reconhecidas por premiações internacionais, como o Guia Michelin. Há alguns meses, começou a organizar o evento Deguste Pardinho, em que recebe visitantes e clientes na propriedade em que são feitos os queijos. O encontro, realizado sempre nos finais de semana, deu tão certo que foi crescendo. A quarta edição, a mais recente, se transformou em um verdadeiro festival gastronômico.
A Festa do Porco, como foi chamada, contou com a participação do chef Jefferson Rueda, da Casa do Porco, eleito o 27º melhor restaurante do mundo pela premiação The World’s 50 Best Restaurants. Além de algumas entradas populares, como o torresmo servido com goiabada, Rueda levou para o evento a sua criação mais famosa: o porco San Zé, assado lentamente em grandes fornos montados na grama. A pele ganha crocância, enquanto a carne fica macia e suculenta. É um prato encontrado na Casa do Porco. Prová-lo no campo, em uma festa com queijos artesanais da Pardinho, vinhos produzidos na região e até um doce de leite preparado em um tacho de cobre, faz diferença. Não à toa, os ingressos esgotaram e a festa ocorreu com lotação máxima.
O exemplo da Festa do Porco ilustra um fenômeno que ganha força no Brasil, mas especialmente no interior de São Paulo: o turismo rural. “Percebemos de forma muito clara o aumento da demanda por esse tipo de experiência, especialmente depois da pandemia”, afirma Bento Mineiro, fundador da Pardinho Artesanal. “Antes, nossa região não era tão conhecida
pelo público de fora. Agora, temos visitantes todo final de semana. As pessoas passaram a buscar o contato com a natureza e, ao mesmo tempo, tentar entender melhor a origem dos alimentos.” Jefferson Rueda, seu parceiro de longa data, concorda. “Um evento como a Festa do Porco é uma oportunidade de compreender como toda a cadeia está ligada, como cada produtor dialoga com os outros e como todos esses parceiros podem trabalhar juntos.”
As queijarias representam uma face notória do fenômeno. Desde que os produtores artesanais do estado começaram a chamar a atenção para suas criações, muitas vezes inspiradas em queijos europeus, o turismo veio de forma natural. A Atalaia, em Amparo, foi pioneira. Paulo Rezende e a esposa, Rosana, recebem os visitantes, acompanham as degustações de queijos e mostram cada etapa do processo, da criação das vacas e cabras até o restauro da antiga propriedade. O Capril do Bosque, em Joanópolis, administrado por Heloísa Collins desde 2010, conta com bistrô
com menu degustação que inclui os queijos produzidos exclusivamente com leite de cabra.
O turismo rural, obviamente, não é composto apenas de queijarias artesanais. Há muito interesse nas tais experiências no campo. Em Itu, o Parque Maeda, um enorme complexo com estufas, tanques de pesca artesanal e pomares de morango, jabuticaba e lichia, recebe visitantes para a colheita das frutas. A cidade de Jundiaí também tem investido nesse mercado. De acordo com um levantamento realizado pela Unidade de Gestão de Agronegócio, Abastecimento e Turismo da Prefeitura Municipal, o turismo rural na cidade cresceu 166% entre 2013 e 2023. O número de estabelecimentos que adotam a modalidade saltou de 30 para 80 no mesmo período.
Há aqueles curiosos que buscam algo ainda mais imersivo e estão dispostos a gastar mais do que apenas algumas horas curtindo a natureza. Para quem quer levar a vivência do campo a sério, alguns programas oferecem um mergulho na cultura do interior. A Fazenda
O turismo rural ganha espaço no Brasil e no mundo ao proporcionar aos turistas uma imersão na cultura do interior
Experiências como gastronomia típica, artesanato e vivências no campo atraem os que buscam fugir das grandes cidades
Fundão, em Silveiras, no interior do estado, é a sede da Curiango Charcutaria Artesanal, projeto de Rafael Cardoso, conhecido como Rafa Bocaina. A partir da criação de porcos caipiras, ele passou a desenvolver um trabalho de divulgação de saberes tradicionais e da cultura regional. “Ao longo de cinco anos, fui montando um programa de três dias, de sexta a domingo, que oferece um estudo sobre o porco caipira”, afirma Cardoso. “A imersão passa por aspectos técnicos do manejo dos porcos e de charcutaria, mas inclui aulas sobre território, cultura caipira e até filosofia. É algo bastante profundo.” Cada iniciativa costuma acontecer com ingressos esgotados e inclui tanto curiosos quanto profissionais da gastronomia, como a chef Bel Coelho, o historiador Carlos Alberto Dória e os sócios da
Companhia dos Fermentados, Fernando Goldenstein Carvalhaes e Leonardo Andrade. A partir dos encontros nos finais de semana, Rafa Bocaina se juntou à pesquisadora Carla Spironello para elaborar uma proposta ainda mais ambiciosa: levar estudiosos, chefs e outros interessados para Portugal com o objetivo de estudar a cultura do porco que tanto ajudou a moldar a relação dos brasileiros com o animal. Assim surgiu a Comitiva Do Rabo ao Focinho, cujo nome é uma referência à variedade de preparos que são possíveis. A primeira edição aconteceu no ano passado, e a próxima está marcada para o início de 2025. Spironello, que mora em Portugal, diz que também há por lá um movimento de turismo rural, mas muito mais associado ao vinho. “Vai-se ao território rural para degustar vinhos,
Viajantes querem desbravar destinos que promovam práticas ecológicas e consumo consciente
mas nem tanto para provar comidas”, diz ela. Mas isso está ligado ao fato de que nunca houve uma desconexão total entre o campo e a cidade. “Saindo do centro de Lisboa, em 15 minutos você está na roça. É algo muito mais próximo. E o rural sempre esteve presente à mesa dos portugueses”, afirma a pesquisadora.
Com o aumento da demanda e do interesse por tudo que diz respeito ao campo, é natural, que, além de projetos turísticos pontuais, muitas vezes artesanais, também surjam iniciativas de maior envergadura. É o caso da Churrascada. O festival gastronômico especializado em carne surgiu em 2015 e circulou por várias regiões do Brasil antes de se tornar um restaurante, a Fazenda Churrascada. Instalado em um casarão do século 19 no bairro do Morumbi, em São Paulo, atrai mais de 40 mil pessoas por mês. Em 2024, um novo empreendimento foi inaugurado: o Rancho Churrascada. Localizado na cidade de Espírito Santo do Pinhal, quase na divisa com Minas Gerais, é
um complexo com cabanas, lago, vinhedo, plantação de café e arenas de cavalos. O restaurante do complexo, também especializado em carnes, é frequentado não apenas pelos hóspedes, mas por visitantes dispostos a percorrer longas distâncias apenas para almoçar ou jantar no ambiente repleto de elementos inspirados tanto na cultura sertaneja quanto no country americano.
A iniciativa, gerenciada pelo grupo UmaUma, um dos maiores no setor de entretenimento, busca oferecer um pacote de experiências rurais em um formato mais luxuoso, capaz de atrair também os poderosos do agronegócio. Em outubro, os responsáveis pelo Rancho anunciaram planos para construir um empreendimento “western” anexo à propriedade. A ideia é que o espaço, no meio das montanhas da Serra da Mantiqueira, seja palco de um festival sertanejo de grande porte. E, assim, o fluxo de visitantes deverá crescer ainda mais.
De pedaço em pedaço: O italiano Dario Cecchini prova que é preciso valorizar as partes menos nobres dos animais
A
grande feira mundial do estilo e do consumo
As regiões produtoras do mundo
Em visita ao Brasil, o italiano Dario Cecchini, o açougueiro mais famoso do mundo, mostra por que é importante valorizar partes consideradas menos nobres dos animais
OPor André Sollitto
s alto-falantes do restaurante começam a tocar Thunderstruck, clássico da banda australiana de rock AC/DC, quando o italiano Dario Cecchini sobe em uma das mesas. Ele está pronto para fazer o seu show. Cecchini usa calças vermelhas largas e um colete com as cores da bandeira italiana sobre uma camisa estampada com o diagrama dos cortes de carne de um boi. Sobre o conjunto, um avental da Antica Macelleria Cecchini, açougue localizado em Panzano, na região de Chianti, na Toscana, e que há oito gerações é comandado por sua família. Além do cabelo penteado para trás, Dario usa às vezes um bigode enrolado nas pontas, e o visual completo o torna instantaneamente reconhecível. Todos se aproximam à medida que ele desce da mesa, pega suas facas e começa a cortar, com precisão, pedaços da Bisteca alla Fiorentina, pela qual é famoso. O corte tradicional da região da Toscana é feito com o lombo do animal, com um osso em forma de “T” separando o contrafilé do filé-mignon. A enorme peça, que pode chegar a um quilo e meio, é grelhada por cerca de seis minutos de cada lado, sem tempero, e servida em um ponto único – sempre malpassada. Ele trabalha com rapidez e em poucos cortes a carne está pronta para ser servida. Dario Cecchini esteve recentemente no Brasil para participar de uma maratona de eventos em comemoração aos 20 anos da rede de restaurantes especializados em carne Pobre Juan. Por causa de seu estilo divertido e alegre e seu visual inusitado, o açougueiro, ou “macellaio”, como se diz em italiano, tornou-se um fenômeno no Instagram. Com mais de 220 mil seguidores, é
Cecchini Panini Truck, equipado com uma grelha para o preparo de lanches: fast-food com ares sofisticados
cultuado pelos amantes da carne e costuma se apresentar, sempre de forma espalhafatosa, em eventos focados em churrasco ao redor do mundo. Já esteve no Brasil em mais de uma ocasião, nos Estados Unidos e em outros destinos importantes. Mas, por trás da celebridade das redes sociais, está um dos mais dedicados defensores da boa carne, do cuidado com o manejo dos animais, do aproveitamento total de cada parte do porco ou boi abatidos e das tradições gastronômicas.
O trabalho como açougueiro, no entanto, não era sua primeira opção de vida. Embora a Antica Macelleria Cecchini, inaugurada em 1780, fosse de responsabilidade de sua família, Dario foi estudar medicina veterinária. Ele queria, como diz, cuidar dos animais ainda vivos. Quando o pai ficou doente, porém, foi obrigado a abandonar a
universidade e assumir o negócio. No início, teve dificuldades. Não conhecia o ofício e tinha prejuízos. Antes de morrer, o pai havia dito que, se tivesse dificuldades, deveria recorrer ao açougueiro experiente que escolhia as carnes para a Antica Macelleria Cecchini e era considerado um dos grandes mestres da região. Além da técnica, aprendeu lições importantes sobre o que significa ser um açougueiro. “Antes, eu sentia uma dor enorme quando cortava a carne de um animal”, disse ele no episódio dedicado a sua história no premiado seriado Chef’s Table, da Netflix. “Mas conheci os produtores da região e entendi que, enquanto os animais estavam vivos, recebiam tudo do bom e do melhor. Quando morriam pelas nossas mãos, era nosso dever respeitar o que aqueles nos proporcionavam.”
O manejo dos animais tornou-se um dos
Dario Cecchini: com 220 mil seguidores no Instagram, ele é cultuado pelos amantes da carne em diversos países
Sushi de Chianti, restaurante Solociccia e fazenda Fontodi: negócios voltados para a carne estão na família há oito gerações
principais objetivos de Cecchini. As carnes suína e bovina que vende em seu açougue não são de nenhuma raça específica, mas criadas por produtores parceiros na região da Catalunha, na Espanha, por “gente que conheço há mais de 20 anos”, como diz. Às vezes, os animais são da raça Chianina, provenientes da família Manetti, responsáveis pela fazenda Fontodi, na região de Panzano. Depois de abatidos, ainda passam por um processo de maturação durante 30 dias.
Apesar da dedicação, Cecchini encontrou outra barreira. Seus clientes só queriam cortes nobres. Ele tinha dificuldade em vender outros, menos populares. Foi assim que decidiu também se aventurar na cozinha. “Não acho justo matar um animal só pela bisteca ou pelo filé”, disse. “Entendi que o único jeito de não ter desperdício era colocando a comida no prato das
pessoas para que elas entendessem.” Assim, abriu o primeiro restaurante, Solociccia, que significa “apenas carne”. Não dá para pedir bisteca. O menu é elaborado com partes consideradas menos nobres, preparadas de acordo com antigas receitas familiares. Quem se aventura pode achar que a oferta de embutidos e pratos com rabo, focinho e tendões é assustadora, mas o sabor supera o receio. Críticos começaram a frequentar o espaço e logo a pequena casa, instalada em frente ao açougue, começou a atrair filas de clientes locais.
A fama internacional veio em 2001. Na época, autoridades sanitárias da Europa decidiram proibir a venda de carne com osso como forma de evitar a disseminação da doença da vaca louca. Cecchini, então, organizou um “leilão” das últimas peças de bisteca. Afinal, era um verdadeiro sacrilégio servir
Bistecca alla Fiorentina: servida em pedaços, com o interior rosado e macio, e acompanhada de feijões e batatas
o corte sem o osso. Portanto, a decisão do governo representava o fim de uma das principais tradições gastronômicas locais. O teatro atraiu a atenção de veículos de comunicação, e a notícia correu o mundo. O açougueiro transformado em chef passou a ser conhecido e disputado e, desde então, tem viajado pelo mundo para levar tanto seus conhecimentos sobre a carne e a importância do bem-estar animal quanto suas receitas.
Tanto é assim que hoje em dia Cecchini administra três restaurantes diferentes, todos na cidade de Panzano. Além de Solociccia, tem um pequeno food truck, o Cecchini Panini Truck, equipado com uma grelha para o preparo de lanches. E a Officina Della Bistecca, dedicada principalmente à Bistecca alla Fiorentina. Já teve outros, como o Mario Doc, um tipo de fast-food que oferecia principalmente hambúrgueres. Na visita ao Brasil, Cecchini trouxe exatamen-
te o menu que serve na Officina. Na mesa, pão toscano, vegetais e o Profumo del Chianti, um sal misturado com ervas aromáticas. De entrada, serviu seu Sushi de Chianti, um tartar de carne bovina temperado apenas com sal, pimenta, um pouco de limão e algumas ervas, e Porchetta, assado de porco que mescla a crocância da pele com a maciez da carne. A grande Bistecca alla Fiorentina é servida em pedaços, com o interior rosado e macio, acompanhada de feijões e batatas. Há ainda outra opção, a Bistecca Panzanese, um corte de contrafilé servido sem osso, igualmente macio. Servidas para os convivas, aquelas porções de carne, saborosas e suculentas mesmo sem sal, representam uma jornada de vida. E justificam tanto esforço. Cecchini gosta de usar o trocadilho “carne diem”, inspirado na expressão em latim “Carpe Diem. Ou seja, aproveite o momento – e a boa carne.
Fazendas conectadas
Parcerias levam
internet para o campo, integrando tecnologia e desenvolvimento rural
As inovações para o futuro da produção
STARTAGRO
As inovações para o futuro da produção
Operadoras de telefonia celular ampliam os investimentos em soluções que levam conectividade para as fazendas
Por Mário Sérgio Venditti
Os nomes TIM, Claro e Vivo são associados principalmente à operação de telefonia celular no Brasil. As atividades das três empresas, porém, vão muito além de oferecer serviços de comunicação entre as pessoas. Elas atuam em várias frentes e uma delas é o agronegócio, com projetos para desenvolver a conexão no campo. Uma vez instalada na zona rural, a internet proporciona técnicas mais eficientes de agricultura de precisão e emprega modelos sustentáveis e lucrativos de trabalho, além de promover a aproximação entre o campo e os centros urbanos. Tantas possibilidades motivaram a TIM a investir fortemente no agronegócio a partir de 2018. “De certa forma, o agro já era smart nas máquinas e em alguns processos digitais, mas ainda carecia de uma conectividade com resultados efetivos”, afirma Alexandre Dal Forno, diretor de Desenvolvimento e Mercado
IoT (Internet das Coisas) e 5G da TIM. “Criamos, então, o 4G TIM, levando uma rede de frequência de 700 mega-hertz (MHz) às fazendas, suficiente para cobrir grandes áreas.”
Uma das experiências mais bem-sucedidas começou em 2021, envolvendo a empresa de equipamentos agrícolas Case IH e a TIM no projeto chamado Fazenda Conectada, na cidade de Água Boa (MT). Um ecossistema completo em agricultura digital – que conectou e viabilizou o diálogo entre funcionários e máquinas – foi montado na propriedade de 3 mil hectares de plantação de soja, coletando dados e informações em tempo real. O saldo positivo surpreendeu. Segundo Dal Forno, a produtividade da safra 2022/23 aumentou 13% no estado, os custos operacionais caíram 25% e a pegada de carbono diminuiu 10%. “O objetivo da iniciativa é mostrar como a
Conectividade no campo: tecnologia
4 G aumenta a produtividade das fazendas
brasileiras e ajuda a reduzir custos
conectividade rural eleva a fertilidade no campo, mesmo em uma região que já apresenta alto rendimento a cada safra”, diz. Atualmente, a rede móvel da TIM abrange 18,2 milhões de hectares, o equivalente a mais de metade do território da Itália. A conexão no campo beneficia também as comunidades das porteiras para fora. Afinal, a rede móvel não atende apenas máquinas e sensores, mas os moradores do entorno das fazendas. Os 18,2 milhões de hectares cobertos pela TIM impactam, por tabela, 231 mil pequenas e médias propriedades e 1,7 milhão de pessoas, vizinhas das grandes plantações. “A tecnologia promove a comunicação e a conexão das comunidades, em um verdadeiro trabalho social de inclusão digital”, afirma Dal Forno. Essa abrangência se dá porque o sinal das operadoras contratadas pelos produtores acaba se espalhando por uma área bem maior na zona rural. Dal Forno destaca que muitas plantações de cana-de-açúcar estão próximas das usinas. Para atender todas, é preciso contemplar uma área maior. Ele lembra o caso de uma fazenda de 160 mil hectares no Vale do Ivinhema (Mato Grosso do Sul), onde o sinal da TIM alcança 1 milhão de hectares. Às margens das propriedades, as rodovias do sistema Ecovias do Araguaia, que cortam Tocantins e servem prioritariamente para escoar os produtos do agronegócio, também tiram proveito da conectividade do campo. O executivo relata que o alcance da banda larga depende muito do relevo do local. No Mato Grosso do Sul, uma torre abrange de 35 mil a 40 mil hectares, ao passo que, no Paraná, esse raio é de 10 mil hectares. Isso porque regiões com morros, florestas densas e vastas extensões de terras interferem na propagação dos sinais, atrapalhando um pouco a imple -
mentação da internet 4G e cabos de fibra óptica. Além da necessidade de investimentos, a expansão da conectividade passa pela mudança de mentalidade do produtor. O segmento sucroenergético foi o primeiro a enxergar os ganhos da internet no campo. Hoje em dia, está havendo maior amadurecimento do setor de grãos, que apresentava resistência diante da transformação digital. “Felizmente, as novas gerações já pensam com a cabeça do mundo digital”, diz Dal Forno.
O retorno dos investimentos pode ser medido em três cenários. No melhor deles, uma única safra já é suficiente para pagar o que foi
gasto pelo produtor. No cenário intermediário, o investimento é devolvido em uma safra e meia. No pior caso, o payback ocorre depois de duas safras. O diretor da TIM não fala em valores do investimento para o produtor que contrata a rede móvel em sua propriedade, mas dá uma pista. “A moeda do agricultor é a saca de soja”, diz. “Em média, um quarto de uma saca paga o investimento em cada hectare coberto pelo 4G.”
Para o executivo, as projeções de crescimento da conectividade no agro são enormes, visto que o Brasil tem 80 milhões de hectares de área cultivada. De um ano para cá, a Tim reúne-se com cooperativas rurais para favorecer especial-
mente os pequenos produtores, sem condições de investir individualmente. Um dos temas da pauta é a possibilidade de rateio entre os fazendeiros menores para a instalação de uma torre. “Todos devem ter acesso à tecnologia da agricultura 4.0”, afirma. “Fazer uma reunião debaixo de uma árvore, sem a necessidade de se enfiar em uma sala não tem preço.”
A operadora Claro igualmente atua no campo ao levar conectividade móvel para o agronegócio ao lado da startup Sol, criada especialmente para alavancar a conexão entre os produtores rurais, com a meta de instalar 450 torres e cobrir 9 milhões de hectares até o fim
O 4 G da TIM leva uma rede de frequência de 700 mega-hertz (MHz) às fazendas, o que é suficiente para cobrir grandes áreas
do ano. A maior parte da cobertura está concentrada nos estados do Mato Grosso, Tocantins, Goiás, São Paulo e Rio Grande do Sul. O modelo de negócios é bem dividido. Cabe à Sol prospectar áreas do agronegócio de pequenos e médios produtores com viabilidade econômica, enquanto a Claro se responsabiliza pela instalação das antenas.
Por considerar o agronegócio um dos pilares da economia brasileira, a Claro desenvolveu soluções específicas para atender as necessidades do setor. Valendo-se de soluções de IoT, a empresa proporciona a conexão de máquinas e equipamentos, com o controle e a
automação de processos de forma remota e em tempo real. Assim, os produtores conseguem monitorar as condições do solo e das plantações e as mudanças climáticas.
Na corrida das operadoras, a Vivo não quer ficar atrás na tarefa de conectar o campo. A empresa oferece o Agro Cobertura, conexão personalizada para as propriedades rurais, com o serviço de banda larga para o uso do smartphone, acesso à internet e a comunicação entre as máquinas, com direito a telemetria e rastreamento. A Internet das Coisas também está presente no pacote de soluções da Vivo para ajudar o agronegócio. Ela é capaz de avaliar o desempenho da frota de veículos pesados, a fim de melhorar a produtividade, reduzir gastos com energia por meio de medições de dados conectados na rede, gerenciar as equipes e auxiliar na administração de dados sobre a identificação e pesagem do gado de corte. No caso da pecuária leiteira, a IoT pode monitorar os parâmetros de temperatura e a alimentação das vacas.
As operadoras contam com um aliado decisivo para expandir a rede móvel no campo. Fundada em 2018 por iniciativa de várias empresas ligadas ao agronegócio – como TIM, CNH e Agco –, a ConectarAgro tem o objetivo de fomentar o acesso à internet 4G nas zonas rurais do País, com soluções tecnológicas e gestões junto a entidades governamentais. A presidente da ConectarAgro, Paola Campiello, revela que, em abril passado, a organização estreou o Indicador da Conectividade Rural, com metodologia criada em parceria com a Universidade Federal de Viçosa (MG). “A ferramenta faz o mapeamento da conectividade em todas as regiões do Brasil, para acompanhar os pontos que mais precisam de investimentos”, afirma.
Inclusão digital: o sinal das operadoras contratadas pelos produtores se espalha por áreas bem maiores na zona rural
Com atualizações previstas a cada seis meses (em abril e outubro), o indicador apontava, na primeira medição, 19% de cobertura no campo, número que saltou para 23,8% em outubro passado. “Apesar do aumento, o resultado ainda é muito baixo”, afirma Campiello. Para comparar, a cobertura é de 70% nos Estados Unidos. “Se localidades da região Centro-Oeste – onde o agronegócio é mais desenvolvido – nem sequer possuem energia elétrica, imagine então internet”, lamenta.
O crescimento só não é superior pela falta de condições financeiras de pequenos e médios produtores. A oferta de conectividade é cara e complexa em áreas rurais de difícil acesso e baixa densidade demográfica, inviabilizando a instalação de torres de transmissão, cabos e equipamentos. “Daí a importância de políticas públicas, e os nossos encontros com o Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust) caminham nessa direção”, diz a executiva.
Algumas ações estão saindo do papel. No ano passado, o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), em colaboração com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), lançou o Projeto Rural + Conectado, iniciativa para expandir a conectividade no campo no Norte e Nordeste do Brasil. O projeto visa atender povoados e lugarejos desassistidos de internet, com mais de 2,3 mil pontos de acesso na primeira fase. “Programas do governo federal permitem que a agricultura familiar consiga usufruir de tecnologias de ponta, como máquinas autônomas controladas remotamente, inteligência artificial e drones para mapeamento das plantações”, conclui Paola Campiello.
24ª Conferência DATAGRO celebra 100 anos do etanol no Brasil. Evento reuniu público superior a 1,3 mil pessoas e contou com a participação de 80 palestrantes nacionais e internacionais
P or r onaldo l uiz
Com a presença do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, e do ministro da Defesa, José Mucio, a abertura da 24ª Conferência Internacional DATAGRO sobre Açúcar e Etanol, realizada nos dias 21 e 22 de outubro, na capital paulista, deu o arranque às celebrações de 100 anos do biocombustível no Brasil. A solenidade inicial do evento teve como destaque homenagens a pessoas, empresas, entidades, autoridades e instituições que, de alguma forma, contribuíram para o desenvolvimento do etanol no País. O marco de 100 anos tem como registro a primeira experiência no Brasil com o uso do biocombustível.
O feito coube ao engenheiro químico Salvador Pereira de Lyra, na Usina Serra Grande, no estado de Alagoas. Essa iniciativa pioneira culminou com a implantação do Proálcool nos anos 1970. Tido como o “Pai do Proálcool”, Lamartine Navarro Filho também foi homenageado. Conduzida pelo presidente da DATAGRO, Plinio Nastari, a cerimônia também rendeu homenagens aos empresários Maurílio Biagi Filho, Henrique de Amorim e Otávio Lages Siqueira Filho, à companhia Copersucar e às entidades Unica, Bioenergia Brasil, CNI, CTC e Anfavea.
Entre os representantes do poder público, foram homenageados: o Ministério da Agricultura; Arthur Lira, presidente da Câmara dos Deputados; José Mucio, ministro da Defesa; deputado Arnaldo Jardim, vice-presidente da FPA; deputado Zé Vitor, presidente da Frente Parlamentar do Etanol; e o senador Fernando Dueire.
Em sua fala, Nastari ratificou a importância do etanol para o desenvolvimento socioeconômico e energético do Brasil, além das óbvias contribuições ambientais de sua adoção. “O etanol é nosso grande ativo de descarbonização”, disse.
Lira pontuou que o etanol não pode ficar atrás de nenhuma outra fonte de energia que o País produz. “Com o etanol, o Brasil está à frente do mundo na jornada da transição energética”, afirmou o presidente da Câmara,
acrescentando que “a segurança jurídica é o item que mais importa para quem produz e que o Código Florestal Brasileiro é a legislação ambiental mais rígida do mundo”. O presidente da Câmara mencionou, ainda, a aprovação da Lei do Combustível do Futuro, cujo objetivo é expandir o uso do etanol, do biodiesel e de outras fontes de energia limpas e renováveis na matriz energética nacional.
Mucio enfatizou que, no Brasil, o etanol sempre evoluiu na dificuldade, a solavancos, se tornando a melhor matéria-prima que temos para a descarbonização: “Teremos agora etanol nos aviões, nos navios e assim por diante”. Por fim, Jardim ressaltou que, graças ao etanol, o Brasil será protagonista global da economia verde.
Por sua vez, o presidente da União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia (Unica), Evandro Gussi, frisou que o Brasil é exemplo global no setor devido a um “arcabouço institucional” de políticas públicas construído de maneira democrática e inteligente ao longo de décadas.
Também participaram da abertura da 24ª Conferência DATAGRO: Edson Fernandes, secretário executivo da pasta da Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, que representou o governador Tarcísio de Freitas; Guilherme Campos Júnior, secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura e Pecuária; Mauro Mattoso, chefe do Departamento de Biocombustíveis do BNDES; Renato Pontes Cunha, presidente do Sindaçúcar-PE; Pedro Robério de Melo Nogueira, vice-presidente do Coagro-CNI; Paulo Leal, presidente da Feplana; André Rocha, presidente do Sifaeg; entre outras autoridades e dirigentes do setor sucroenergético.
A seguir, confira mais destaques da 24ª Conferência DATAGRO:
EM HIDROGÊNIO VERDE
Os investimentos na cadeia produtiva do hidrogênio verde têm potencial para gerar impacto positivo de R$ 7 trilhões no PIB até
2050, destacou a CEO da Associação Brasileira da Indústria do Hidrogênio Verde (ABIHV), Fernanda Delgado.
Segundo Delgado, o desenvolvimento de uma indústria de hidrogênio verde no País, que já conta com marco regulatório estabelecido, viabilizará a fabricação de um amplo portfólio de produtos energéticos de baixo carbono: “O próprio hidrogênio verde, o combustível sustentável de aviação (SAF, na sigla em inglês), metanol verde, soluções para o segmento químico, e assim por diante”. De acordo com a dirigente, será, no entanto, o segmento de fertilizantes o primeiro a ganhar tração a partir do hidrogênio verde.
No painel, que contou com a moderação do sócio da DATAGRO Financial, Ingo Kalder, o vice-presidente de novos negócios da Atvos, Caio Dafico, tratou das oportunidades e
também dos desafios do mercado de SAF. Segundo ele, o Brasil, devido às diversas rotas em que o País apresenta vantagens competitivas, pode se tornar o maior fabricante de combustível sustentável de aviação a partir do hidrogênio verde. “Temos o caminho da energia eólica, solar, do etanol, de novas oleaginosas, entre outros.”
De acordo com Dafico, além de se tornar uma plataforma exportadora de hidrogênio verde para diferentes fins, o Brasil poderá se beneficiar também da venda de créditos de carbono que podem surgir com lastro na tecnologia. Nesta lógica, o assessor de Inovação para Novos Negócios da Usina São Martinho, Marcelo Eskenazi, lembrou ainda que os novos produtos que serão gerados a partir do hidrogênio verde poderão ser usados para descarbonização de diversos segmentos da economia.
Traders do mercado do açúcar projetaram uma conjuntura construtiva de preços para o adoçante, com uma oferta inferior à demanda e estimativa de quebra de safra neste ciclo 2024/25 no Brasil. Na avaliação do executivo-chefe da Sucden do Brasil, Luiz Silvestre Coelho, até outubro do próximo ano, o mundo será dependente da produção brasileira, o que sugere a perspectiva de que podem ocorrer movimentos de preços interessantes para o produtor.
De acordo com o head de Açúcar no Brasil da Czarnikow, Pedro Mizutani, o momento é também de baixos estoques de açúcar, o que fortalece a tendência altista para as cotações. De acordo com o head de Açúcar para as Américas da ED&F Man Sugar, Rodrigo
Ostanello, o recuo de produção na safra brasileira decorre das intempéries climáticas e também dos incêndios que castigaram os canaviais, em particular do Centro-Sul. “Esses efeitos ainda não foram medidos em sua totalidade, o que nos leva a acreditar em um déficit entre consumo e produção ao final da temporada, com impactos subsequentes.”
Números da DATAGRO apresentados no evento indicam que a safra 2024/25 de cana no Centro-Sul deverá encerrar com queda de 9,4%, atingindo uma moagem de 593,01 milhões de toneladas. A produção de etanol deverá recuar 1,2% para 33,18 bilhões de litros, e a de açúcar cair 8,8%, para 38,70 milhões de toneladas.
A biomassa, em particular a da cana-de-açúcar, como a palhada e o bagaço, tem
potencial para ampliar sua participação como fonte de energia elétrica, contribuindo ainda mais para a segurança do sistema interligado do País, destacou o diretor da Koblitz Energia, Luiz Otávio Koblitz.
Em painel que contou com a moderação do presidente da Associação da Indústria de Cogeração de Energia (Cogen), Newton Duarte, o presidente da DATAGRO, Plinio Nastari, ressaltou que a bioeletricidade já está madura e que leilões de energia específicos para a modalidade seriam muito bem-vindos. “Já está na hora”, disse Duarte. Segundo Koblitz, em 2023, 89,2% da matriz energética brasileira foi composta por fontes não emissoras de gases de efeito estufa, contemplando hidrelétricas, solar, eólica e biomassa.
De acordo com Duarte, a cogeração vem sendo extremamente importante para ajudar o
Operador Nacional do Sistema (ONS) a enfrentar os desafios do setor elétrico, especialmente neste momento, com pouca água nos reservatórios das hidrelétricas, principalmente no subsistema Sudeste-Centro-Oeste. A cogeração, disse ele, traz resiliência e provê o sistema de forma distribuída, com potência e com capacidade para enfrentar as oscilações de tensão diante do crescimento da geração de fontes intermitentes na matriz elétrica brasileira no fim da tarde, especialmente as solar fotovoltaicas.
O setor sucroenergético brasileiro tem boas oportunidades para capturar novos negócios, tanto em cooperação tecnológica
para o plantio e colheita da cana quanto em mercados para o etanol junto a nações da América Central e vizinhos da América do Sul, destacaram representantes, entre autoridades e dirigentes setoriais, de alguns destes países e também do Brasil.
Segundo Flavio Castellari, da Apla, países da América Central têm importância histórica na produção de açúcar, mas são mercados a serem desbravados do ponto de vista dos biocombustíveis, em particular para o etanol: “Há oportunidades para mistura de biocombustíveis nos combustíveis fósseis, bem como para a exportação de nosso etanol”.
De acordo com Aida Lorenzo, gerente-geral da Renewable Fuels Association, da Guatemala, seu país natal, bem como Honduras, Costa Rica e Panamá, estudam a implantação da adição de etanol na gasolina. “A não
adoção de biocombustíveis vem trazendo insegurança energética”, afirmou. Para Humberto Jasso Torres, presidente da CNIAA do México, a nova presidente do país, Claudia Sheinbaum, é uma entusiasta da sustentabilidade e quer dar impulso à indústria do etanol no país. Já a embaixadora da República Dominicana no Brasil, Patricia Villegas, enfatizou que seu país, assim como alguns outros da América Central, tem acordos de livre-comércio com Europa e Estados Unidos e podem funcionar como plataforma para reexportação de etanol do Brasil.
Na sequência, Nicolás Casasfranco Jiménez, ex-cônsul Comercial da Colômbia no Brasil, afirmou que há potencial de intercâmbio entre o setor sucroenergético brasileiro e o segmento colombiano de cana, sobretudo em tecnologias voltadas ao incremento de produtividade dos
canaviais, com destaque para irrigação, biotecnologia e agricultura de precisão.
Nesta temática, a Índia, segundo maior produtor mundial de cana – atrás apenas do Brasil –, vem aumentando a fabricação de etanol a partir de políticas públicas de estímulo à descarbonização. De acordo com Ganesh Bongane, gerente-geral adjunto da Baramati Agro, e Anup Kumar, diretor-geral da Sucden India Hariana, a produção local do bicombustível saltou de 3,7 bilhões de litros em 2018/19 para uma projeção de 16,4 bilhões de litros na atual temporada 2024/25.
A safra global 2024/25 de açúcar deve registrar déficit (consumo superior à produção) de 3,58 milhões de toneladas, estimou o diretor
executivo da Organização Internacional do Açúcar (ISO, na sigla em inglês), José Orive.
A produção mundial deve ficar em torno de 179,3 milhões de toneladas, e o consumo tem potencial para alcançar 182,8 milhões. Segundo Orive, o volume produzido deve crescer na Tailândia, União Europeia e no Egito, e recuar no Brasil – cerca de 4 milhões de toneladas –, na Índia e Rússia. “O Brasil responde por 25% da produção global e 50% das exportações.”
No painel, o presidente da DATAGRO, Plinio Nastari, recebeu homenagem da ISO pela sua trajetória no setor sucroenergético.
O açúcar brasileiro é exportado para mais de 120 países e o etanol nacional chega a mais de 70 destinos no exterior, acentuou o secretá-
rio adjunto da Secretaria de Comércio e Relações Internacionais do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), Julio Ramos. “Rotineiramente, recebemos pedidos de informações no Ministério sobre o açúcar brasileiro. A demanda pelo nosso adoçante está aquecida”, disse.
Segundo o CEO da Santa Eliza, Josmar Verillo, há preocupação quanto ao volume de cana e qualidade da biomassa desta safra 2024/25 e também em relação à próxima, devido à estiagem que vem castigando os canaviais – além do impacto dos incêndios que atingiram as lavouras. “A moagem do ciclo futuro, 2025/26, deve atrasar, portanto não vai começar em março”, afirmou Verillo.
O diretor comercial da Usina Alta Mogiana, Luiz Gustavo Junqueira, projeta inicialmente uma produção de cana menor na temporada
2025/26, com tendência para um mix mais açucareiro. Além disso, o CEO da BP Bioenergy, Geovane Consul, enalteceu o potencial do Brasil no etanol e na bioenergia, a partir de bases agrícolas, em particular a cana: “A cana será matéria-prima vital para fabricação de novos produtos verdes, e o Brasil será líder na transição energética e descarbonização dos sistemas produtivos”.
O Centro de Tecnologia Canavieira (CTC) quer dobrar a produtividade dos canaviais brasileiros até 2040, a fim de atender à demanda crescente por etanol. Foi o que destacou Silvia Yokoyama, diretora de Assuntos Regulatórios e Governamentais do CTC: “Tecnologias modernas como melhoramento genético de
precisão e biotecnologia, já aplicadas em culturas como soja, milho e algodão, vêm sendo introduzidas na cana pelo CTC e terão impacto direto no aumento da produtividade e, consequentemente, na mitigação da emissão de gases de efeito estufa”.
Segundo a diretora do CTC, essas tecnologias, conjugadas ao projeto “sementes”, trarão facilidade ao processo de plantio e contribuirão para o aumento da descarbonização. “A nova tecnologia de plantio possibilitará o melhor uso da terra, a redução do uso de diesel, menor exposição do solo e uso otimizado de fertilizantes”, afirmou.
PREPARADO PARA CICLOS DE BAIXA
O setor sucroenergético está menos alavancado, com mais musculatura financeira
própria e assim mais preparado para atravessar futuros ciclos de baixa, que são inerentes à atividade, analisou o superintendente de Crédito para o Agronegócio do Itaú BBA, Guilherme Bellotti de Melo.
Um estudo do banco indica que as usinas têm avançado em políticas de gestão de risco e ampliado a capacidade de produção, aproveitando o momento de alta nos preços. Nos últimos dois anos, houve um aumento expressivo no acesso ao mercado de capitais e na busca por linhas mais estruturadas e de longo prazo, o que contribuiu para o aumento do prazo médio de dívidas. A melhoria na governança e na rentabilidade tem possibilitado maior disponibilidade de linhas de crédito de longo prazo, impulsionando a liquidez do setor.
“As usinas estão mais capitalizadas na
comparação com o cenário de alguns anos atrás”, afirmou o executivo da UBS Matheus Enfeldt. Segundo o analista da XP Leonardo Alencar, o setor deve aproveitar a conjuntura de margens positivas para enfrentar períodos mais desafiadores, o que é da natureza do mercado agro, em particular de commodities, como o do açúcar.
A coexistência de diversas rotas tecnológicas de motorização (biocombustíveis, híbridos e elétricos) é o caminho mais provável para o avanço da mobilidade sustentável no Brasil, afirmaram especialistas do mercado automotivo. “A descarbonização passa por esta combinação”, disse o diretor de Sustentabili-
dade e de Parcerias Estratégicas e Institucionais da Anfavea, Henry Joseph Junior, acrescentando que o papel dos biocombustíveis se mantém relevante.
“O caminho é o da complementariedade”, afirmou o vice-presidente da fabricante de carros BYD, Alexandre Baldy. De acordo com o vice-presidente de assuntos regulatórios da montadora Stellantis, João Irineu Medeiros, o desafio da descarbonização precisa considerar todo o ciclo, do poço à roda, e primar pelo equilíbrio de modalidades de motorização, levando em conta questões ambientais, mas também socioeconômicas. Também presente no painel, o executivo da Associação Brasileira de Veículos Elétricos (ABVE), Carlos Roma, destacou que a tecnologia dos biocombustíveis é parceira do segmento na jornada da transição energética.
Com produção anual de mais de 30 milhões de veículos e vendas domésticas superando 23 milhões de unidades, dos quais mais de 45% eletrificados fabricados majoritariamente por 240 marcas locais, a China se consolida como um dos maiores mercados do mundo.
Essa performance era impensável 5 anos atrás, quando a maior parte dos veículos fabricados e vendidos na China eram de marcas estrangeiras como Volkswagen e Hyundai.
As vendas domésticas de eletrificados na China concentram-se no segmento de VEBs (veículos elétricos a bateria), e seus modelos passam a ser cada vez mais reconhecidos mundo afora pela qualidade e modernidade de suas motorizações e sistemas integrados multimídia.
A sua competitividade e o apetite do consumidor no mercado local são impulsionados por
financiamentos diretos acessíveis e baratos.
A ascensão em volume e preço trouxe reações, principalmente nos EUA e Europa, que elevaram as tarifas de importação de veículos chineses, também acompanhadas em menor intensidade até pelo Brasil. Mas, por aqui, não há nada que tenha representado um freio aos investimentos para a instalação de plantas, na maior parte de montagem de power-trains importados, e à sua crescente penetração de mercado.
Do ponto de vista ambiental, entretanto, considerando o conceito amplo de avaliação do ciclo de vida (ACV), a adoção de veículos elétricos a bateria pela China ainda não tem sido capaz de trazer resultados imediatos, visto que a matriz elétrica local ainda é majoritariamente baseada em energia fóssil. Mas os elevados investimentos em energia
solar fotovoltaica (SPH) e eólica tendem a reduzir a carga fóssil, embora de forma parcial. Por serem fontes intermitentes, dependem de geração complementar térmica que permanece de origem fóssil, ou, na melhor das hipóteses, de base nuclear.
O que chama a atenção no fenômeno chinês é a sua rápida capacidade de adaptação.
Enquanto montadoras norte-americanas e europeias têm demorado a apresentar motorizações que respondam ao crescente desinteresse dos consumidores por opções elétricas a bateria por conta das previstas dificuldades de uma rápida disseminação de infraestrutura eficiente de recarga, montadoras chinesas têm se mostrado rápidas a oferecer opções de eletrificados nas versões híbridas convencionais e plug-ins. A oferta deste tipo de motorização por fabricantes chineses
já começa a se tornar disponível nos mercados da Europa e EUA. Na Europa, esses veículos gozam inclusive de alíquotas de importação menos restritivas do que as aplicadas aos VEBs. No Brasil, de forma coerente com as limitações de infraestrutura de recarga, as duas principais marcas chinesas com presença no País, BYD e GWM, á se posicionaram a favor do desenvolvimento de opções híbridas convencionais e plug-in.
Com escala, competitividade e rápida capacidade de adaptação, tudo indica que automóveis chineses tendem a continuar aumentando a sua participação de mercado. As dificuldades de investimento e limitações físicas ao estabelecimento de infraestrutura de recarga de baterias indicam que, para vários mercados consolidados e em desenvolvimento, as opções híbridas devem ganhar espaço.
A instalação de fábricas chinesas no Brasil e a possível adoção de motorizações híbridas pode representar uma estratégia para o desenvolvimento de outros mercados de exportação. Na opção híbrida, ganham relevância os combustíveis líquidos limpos e sustentáveis
como etanol, biodiesel e biometano. Montadoras instaladas no Brasil há décadas têm anunciado o caminho das opções híbridas, introduzidas em 2019 de forma pioneira pela Toyota e adotadas em anos recentes pela Chery, Hyundai e, mais recentemente, pela Stellantis. E, em breve, por VW e GM. Biocombustíveis ganham relevância por estarem disponíveis, serem distribuídos através de uma infraestrutura já instalada, terem preço competitivo, e serem reconhecidos por sua capacidade de promover descarbonização de forma eficiente, sem a necessidade de um complemento fóssil.
Países que têm a possibilidade de produzir biocombustíveis em escala e de forma competitiva têm o desafio de criar incentivos e condições para que os consumidores adotem a combinação de motorização híbrida flex com o uso do biocombustível, superando obstáculos como a falta de informação e o temor sobre um equivocado impacto na durabilidade dos motores e sistemas embarcados.
De qualquer forma, fica configurada uma nova realidade de mercado, segundo a qual o setor automotivo ingressa em uma nova fase, com a entrada marcante de montadoras chinesas
no cenário internacional, adotando estratégias de penetração rápidas e adaptadas às condições locais.
O temor de que o etanol poderia ter seus dias contados com a crescente eletrificação fica cada vez mais distante da realidade –pela vantagem de sua baixa intensidade de carbono e por dispor de infraestrutura consolidada de distribuição.
A reforma do etanol para a produção de hidrogênio guarda um novo futuro promissor para o etanol e outros biocombustíveis por seu elevado teor de hidrogênio.
Os biocombustíveis produzidos a partir de práticas sustentáveis, com certificação individual de baixa intensidade de carbono por produtor, podem ser considerados elementos básicos para a sua transformação em produtos mais sofisticados como SAF e plásticos verdes, e para a substituição de combustível de navegação.
A DATAGRO estima que, até 2050, o mercado potencial para o etanol poderá representar um volume equivalente a 9,4 vezes a produção mundial atual, de 115 bilhões de litros.