Para quem pensa, decide e vive o agribusiness
O CORINGA VERDE DA ENERGIA Com versatilidade e enorme potencial ainda inexplorado, o setor sucroenergético é a reserva sustentável para manter o Brasil ligado IMÓVEIS RURAIS
Por que o preço de terras sobe sem parar – e o que o ESG tem a ver com isso
FRONTEIRA A FAZENDA QUE MUDOU UMA REGIÃO E TEM SABOR DE GUARANÁ INOVAÇÃO
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E d ito ri a l
O que define o termo Agronegócio? Criado para resumir em uma única pa-
QUEM FALA PELO AGRO?
lavra o enorme contingente de atividades reunidas em torno da produção agroindustrial no Brasil, ele acabou se tornando uma simplificação equivocada de um universo complexo e, ao contrário do que muitos pensam, bastante diverso. Esse processo de simplificação trouxe alguns benefícios para
Para quem pensa, decide e vive o agribusiness
o entendimento do setor. Por outro lado, criou uma imagem única, que não O CORINGA VERDE DA ENERGIA Com versatilidade e enorme potencial ainda inexplorado, o setor sucroenergético é a reserva sustentável para manter o Brasil ligado IMÓVEIS RURAIS
Por que o preço de terras sobe sem parar – e o que o ESG tem a ver com isso
reflete seus diferentes matizes. Para muitos, o agro é isso, o agro é aquilo... Mas de que agro estamos falando? E quem está falando pelo agro? O pequeno agricultor de subsistência é tão agro quanto o CEO da megacorpo-
FRONTEIRA A FAZENDA QUE MUDOU UMA REGIÃO E TEM SABOR DE GUARANÁ INOVAÇÃO
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VINHOS AO MAR
O que uma vinícola uruguaia produz no fundo do Atlântico
ração agrícola com ação na bolsa de valores. O exportador de commodities e o produtor que adota sistemas agroflorestais dependem igualmente do solo, do clima, da água. São muito diferentes, no porte e na prática. Mas ambos são
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agro e merecem ter voz. O agro não tem um único dono nem é representado
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por uma bancada – que muitas vezes está mais conectada a outros interesses do que aos que realmente importam a quem produz. O agro é múltiplo. O agro deve ser democrático. E, portanto, deve ser ouvido e avaliado. Negócios rurais são, em primeiro lugar, negócios – como os de varejo, os financeiros, os de serviços. Como tal, são geridos por pessoas e não por uma entidade superior que define um pensamento único. Assim como no comércio, nos bancos e em outros segmentos, nos estabelecimentos agropecuários há bons e maus dirigentes, gente apegada ao passado, outros de olho no futuro. É possível concordar com um e discordar do outro. É incorreto pensar que são todos uma coisa só. A PLANT se alinha a quem produz com responsabilidade com a atual e as próximas gerações, com aqueles que entendem que não há (e não haverá) agronegócio sem preservação, sem uso racional de insumos, sem compromissos com ações em favor do clima. Aqueles que ouvem as demandas das cidades e se preocupam em dialogar com elas. Aqueles que, felizmente, são cada vez mais numerosos e falam cada vez mais alto.
Luiz Fernando Sá Diretor Editorial
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D i r eto r E ditoria l Luiz Fernando Sá luiz.sa@plantproject.com.br D i r eto r Comerc ia l Renato Leite Marketing e Publicidade Multiplataforma renato.leite @plantproject.com.br D i r eto r Luiz Felipe Nastari Art e Andrea Vianna Projeto Gráfico e Direção de Arte E d i to r Romualdo Venâncio romualdo.venancio@plantproject.com.br Co l a bora dor es: Texto: André Sollitto, Daiany Andrade, Irineu Guarnier Filho, Lívia Andrade, Ronaldo Luiz Fotos: Eduardo Scaravaglione Design: Bruno Tulini P ro d ução Daniele Faria Rev i são Rosi Melo Ev e n tos Simone Cernauski Ad m i nist ração e Fina n ç as Cláudia Nastari Sérgio Nunes
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Pomar de oliveiras na Cisjordânia:
GLOBAL
O lado cosmopolita do agro
foto: Shutterstock
Como a produção de azeitonas virou um símbolo da resiliência palestina
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O lado cosmopolita do agro
PA L E S T I N A
OS POMARES DA RESILIÊNCIA A produção de azeitonas resiste a tudo nas áridas colinas da Cisjordânia Outubro é mês de colheita nas colinas áridas e ensolaradas da Palestina. Milhares de agricultores da região se juntam, em uma espécie de ritual, para percorrer longas fileiras plantadas com oliveiras. Juntos, eles as sacodem, fazendo cair os frutos de seus galhos sobre cestos ou pedaços de pano. As olivas que permanecem coladas à árvore são, então, colhidas à mão, com a ajuda de longas hastes. São cenas que se repetem por muitas gerações, mas que estão cada vez mais ameaçadas de não se repetirem no próximo ano. Para muitos agricultores palestinos, manter 8
ou até mesmo acessar seus pomares tem se tornado uma jornada complexa, dificultada pela conflituosa relação com Israel. Na disputa pelas terras da Cisjordânia, tropas israelenses impedem o livre trânsito de palestinos pela região e limitam o uso da água pelos produtores, impedindoos de irrigar suas culturas. Resilientes, as oliveiras tornaramse um símbolo da resistência palestina. Em muitos pomares, que antes produziam também pêssesgos e damascos, apenas elas restaram. Hoje, 12 milhões de árvores voltadas para o cultivo de azeitonas ocupam quase
metade da área agricultável da Cisjordânia. A cultura e a produção de óleo de oliva representam um quarto da renda na região. E são a única certeza que os agricultores ainda têm, já que nunca sabem ao certo se terão permissão para cultivar outras plantas e, principalmente, se haverá água disponível para irrigá-las. A situação de agravou nas últimas duas décadas, com o recrudescimento das ações do exército israelense na região após o levante palestino do ano 2000, conhecido como a Segunda Intifada. Desde então, Israel vem derrubando milhares de árvores em territórios palestinos, sob o pretexto de que precisa de mais espaço para suas instalações militares. A reação dos agricultores foi replantá-las, com a ajuda de organizações não-governamentais como o Grupo Árabe para a Proteção da Natureza (AP Nature, na sigla em inglês). A entidade estima ter conseguido replantar cerca de 2,5 milhões de oliveiras. O problema mais sério, porém, é mesmo o acesso à água. “Não somos autorizados a cavar poços ou procurar água em nossas cidades, pois trata-se de um recurso natural sob controle israelense”, afirmou o produtor Abbas Milhem à revista americana Modern Farmer. Esse controle ocorre desde 1967, quando uma ordem militar de Israel definiu que qualquer instalação associada ao uso da água precisa ser expressamente
autorizada. Mesmo para o uso doméstico, o insumo precisa ser adquirido dos israelenses. Mesmo os poucos Produtores que conseguem obter autorização e possuem recursos para fazer a irrigação de suas lavouras não estão livres de outros obstáculos. Desde 2002 Israel tem construído uma série de barreiras físicas para impedir o livre trânsito de palestinos na região. Não é raro que eles sejam parados em postos de controle e impedidos de seguir viagem, mesmo que o destino sejam suas próprias plantações. Para que possam prosseguir, precisam obter salvo-condutos específicos, que muitas vezes se resumem apenas a seus familiares diretos. Dessa forma, o manejo das plantações a as tradicionais colheitas coletivas costumam ser afetados. Não é raro, segundo Milhem, que o trabalho no campo seja feito sob a vista de soldados israelenses fortemente armados. Diretor executivo da União dos Agricultores Palestinos, Milhem ainda assim se mantém otimista. Ele acredita que a pressão internacional em favor dos produtores locais pode ajudar a reduzir as restrições sobre seu trabalho, permitindo que a produção se desenvolva. “Os palestinos de vêem nas oliveiras”, afirma Rami Barhoush, vice-presidente da AP Nature. “São gentis e humildes por fora, mas muito difíceis de quebrar por dentro.”
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G E S TA D O S U N I D O S
UMA NOVA HISTÓRIA PARA A BATATA Um dos alimentos mais populares em todo o mundo, as batatas passaram a ser consumidas em outros continentes após os espanhóis as terem descoberto como base da dieta de populações dos Andes, da América do Sul. Mas uma variedade pouco conhecida, cultivada por indígenas do estado americano de Utah, pode trazer um novo aspecto a essa história. Chamada atualmente de Batata
Quatro Cantos (Four Corners Potato, em inglês), essa pequena parente do tubérculo tradicional, já teria sido plantado há mais de 11 mil anos naquela região. E ressurge agora como uma alternativa para cultivo em condições de clima árido e quente. Pesquisadores da Universidade de Utah e ativistas
indígenas promoveram estudos sobre a espécie – cujo nome científico é Solanun jamesii – e garantem que ela pode ser produzida em condições de meteorológicas adversas, com a vantagem de oferecer o triplo de proteínas e o dobro de cálcio se comparada a uma batata orgânica convencional.
I N G L AT E R R A
CARRO MOVIDO A QUEIJO E VINHO Herdeiro do trono britânico, o príncipe Charles é frequentemente questionado sobre o que faz para combater a crise climática. Sem poder de decisão sobre políticas ambientais no seu país, ele costuma responder com evasivas. A mais recente delas virou piada na Inglaterra. Indagado pela TV estatal BBC sobre a sua pegada pessoal de carbono, Charles afirmou que, além de ter instalado painéis solares em sua residência real, a Clarence House, seu carro particular – um Aston Martin que dirige há 50 anos – utiliza como combustível “excedente de vinho branco inglês e soro do processo de fabricação 10
de queijo”. A explicação para a resposta: o motor do carro foi convertido para funcionar com biocombustível E85, uma combinação que usa 85% de bioetanol e 15% de gasolina. A produção do bioetanol é feita com biomassa e o vinho e o soro entram na mistura. Os súditos britânicos reagiram, nas redes sociais, com um misto de crítica e humor. Houve quem lembrasse que a família real costuma se locomover com jatos e helicópteros privados, mesmo para distâncias curtas. Outro inglês levou na brincadeira: “Eu também devo ser um Aston Martin. Há anos utilizo o mesmo combustível”
G ÍNDIA
YOGA NA FAZENDA O poder da mente é capaz de produzir colheitas mais fartas e de melhor qualidade? Um número crescente de pequenos agricultores indianos garante que sim. Eles praticam em suas propriedades as técnicas de “yoga farming”, que combina meditação e produção orgânica na rotina das fazendas e afirmam que o resultado é surpreendente. Desenvolvido pelo movimento espiritual Brahma Kumaris no início do século, o conceito ganhou adeptos no estado de Maharashtra, no Oeste da Índia, e hoje já tem seguidores em vários países ocidentais. Há poucos estudos sobre os reais impactos do método na produção agrícola, mas os existentes o relacionam a uma maior diversidade orgânica nos solos e uma melhor germinação das sementes. Já entre os produtores, o “yoga farming” teria resultado em redução nos níveis de tensão, raiva e frustração.
E S TA D O S U N I D O S
Vacina para todos A febre suína Africana provocou pânico nos criadores de porcos ao redor do mundo. Uma epidemia matou dezenas de milhões de animais na China e no Sudeste Asiático, chegou a ser registrada em localidades do Haiti e da República Dominicana e acendeu o alerta em países como o Brasil e os Estados Unidos, que possuem grandes rebanhos e são exportadores de carne suína. O prejuízo provocado pode ter superado os US$ 100 bilhões. Não por acaso, um anúncio do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), no final de setembro passado, foi festejado em todo o mundo. Em um estudo publicado no jornal
“Transboundary and Emerging Diseases”, o USDA confirmou que pesquisadores do Serviço de Pesquisa Agrícola obtiveram sucesso no desenvolvimento de uma vacina contra o vírus causador da doença. Nos testes realizados com animais, a efetividade do imunizante, produzindo a partir da retirada de
material genético do próprio vírus, chegou a 100% depois de quatro semanas da aplicação. O USDA tem cinco outras vacinas patenteadas contra a febre suína africana, mas esta foi a primeira a demonstrar-se viável, inclusive para a produção em larga escala, o que deve ocorrer já nos próximos meses.
G E S TA D O S U N I D O S
As marcas da agricultura regenerativa Recuperar a vida do solo, evitar revolver a terra, fazer rotação de culturas, sequestrar carbono, usar mais insumos biológicos, plantar culturas de cobertura, fazer o manejo correto dos recursos hídricos. O conceito de agricultura regenerativa propõe a adoção cada vez mais intensa dessa e de boas práticas agrícolas na busca de uma agropecuária mais sustentável. E, a partir delas, ajudar a recuperar os ecossistemas e tornar os sistemas produtivos mais resilientes. Na última década, os programas de agricultura regenerativa ganharam os holofotes, inicialmente em iniciativas piloto e de pequena escala. Mais recentemente, entraram na agenda de grandes grupos e passaram a contar com orçamentos polpudos para ganhar musculatura e passar a englobar números crescentes de agricultores. Apenas este ano, corporações ligadas diretamente ao agronegócio – e até mesmo algumas sem um laço visível – anunciaram investimentos pesados para levar o conceito para a prática em suas cadeias de fornecimento. Boa parte dos anúncios aconteceu dias antes da realização da conferência da ONU que discutiu as cadeias alimentares, realizada no final de setembro. Confira:
O conglomerado suíço da área de alimentos vai aplicar US$ 1,29 bilhão para incentivar sua rede global com mais de 500 mil produtores e 150 mil empresas fornecedoras a acelerar a sua transição para a agricultura regenerativa. O programa lista práticas voltadas para biodiversidade, conservação do solo, recuperação de nascentes e cursos d’água, além da integração da produção pecuária.
Dona de marcas como Yoplait e Haagen Daas, a companhia americana anunciou o compromisso de levar práticas regenerativas para mais de 400 mil hectares até 2030, apenas na cadeia de laticínios. Com isso, espera reduzir suas emissões de GEE em 30%. A meta é ser net zero até 2050.
A fabricante holandesa de cervejas iniciou uma série de experimentos para desenvolver métodos de produção sustentável para sua demanda de cevada. Os primeiros pilotos acontecem no Reino Unido, em parceria com empresas como a Muntons Malt e a Future Foods Solutions. 12
A companhia de bebidas e alimentos definiu ambiciosas metas globais para o que chama de “Agricultura Positiva”. O objetivo anunciado é atingir 100% de suas matérias-primas produzidas de forma sustentável até 2030 e ampliar para 2,83 milhões de hectares sua área de cultivo de safras e matérias-primas com práticas de agricultura regenerativa. Com isso, estima a redução de pelo menos 3 milhões de toneladas de emissões de GEE (gases do efeito estufa).
A gigante do varejo eletrônico ingressou na Leaf Coalition, uma iniciativa públicoprivada para mobilizar pelo menos US$ 1 bilhão para proteger as florestas tropicais do mundo. Uma de suas ações é uma parcria com a ong The Nature Conservancy para o lançamento de uma aceleradora de projetos para agroflorestas e restauração de áreas nativas. O primeiro projeto pretende apoiar 3 mil pequenos produtores do Pará, ajudando-os a restaurar pastagens degradadas para florestas nativas através de técnicas de agricultura regenerativa e sistemas agroflorestais.
A trading americana lançou a plataforma RegenConnect, que se propõe a conectar produtores a marketplaces que os remuneram pela geração de créditos de carbono. O objetivo é de reunir mais de 4 milhões de hectares ao programa até 2030, inicialmente apenas na América do Norte.
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QUÊNIA
O RESGATE DAS GIRAFAS A população de girafas caiu 30% no continente africano nos últimos 40 anos. Segundo dados do Giraffe Conservation Fund, há apenas 117 mil delas vivas, mas ameaçadas pela degradação ambiental, pela caça e até mesmo pela instalação de linhas de transmissão de energia com alturas tão baixas que podem ser alcançadas pelos animais. Por isso, iniciativas de preservação da espécie têm se multiplicado no continente e gerado cenas inusitadas como as registradas recentemente no lago Baringo, no norte do Quênia. Em função da elevação do nível das águas, nove girafas da espécie Nubian ficaram ilhadas em uma pequena área, correndo risco de morrerem de fome. Para salvá-las, integrantes da 16
entidade local Ruko Community Conservancy montaram uma inusitada operação de resgate. Construíram duas balsas especialmente desenhadas para fazer o transporte dos animais até um local seguro. Sem poder sedá-las para a jornada, cobriram seus olhos e as acalmaram oferecendo mangas para que se alimentassem ao longo do percurso. A operação, bem sucedida, foi financiada com recursos de entidades de vários países, como a americana USAID, que mantém um programa de suporte às comunidades da região, apoiando-as na produção de alimentos e no desenvolvimento do turismo rural e incentivando-as a manter áreas de reserva para a proteção das girafas.
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Usina de etanol no interior Paulista: O volume de cana processado para açúcar e etanol no Brasil equivale a uma produção de petróleo de 2,13 milhões de barris de petróleo por dia
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Empresas e líderes que fazem diferença
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Empresas e líderes que fazem diferença
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Sem aumentar um hectare de canavial, o setor sucroenergético tem um potencial de geração de energia sete vezes maior do que o utilizado em 2020
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Uma montanha de energia STEN
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Brasil vive a pior crise hídrica dos últimos 91 anos. Muitos reservatórios de hidrelétricas – que são as responsáveis por 64,9% da geração nacional de energia elétrica – estão em níveis críticos, com um volume de água inferior a 10% da capacidade. Tal situação levou o governo a decidir pela contratação emergencial de termoelétricas, uma energia mais cara, que já deixou a conta de luz, em média, 7% mais alta este ano. E o cenário não é nada animador para 2022. Segundo cálculos preliminares da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), as tarifas podem subir até 16,68% no próximo ano. Avaliações recentes feitas pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) e Empresa de Pesquisa Energética (EPE) vão nessa mesma direção. Elas indicam que os reservatórios de água das hidrelétricas começarão o próximo ano em níveis piores que no início de 2021 – uma consequência do fenômeno La Niña, aliada às mudanças climáticas, agravadas pelo desmatamento, queimadas e utilização de combustíveis fósseis. A crise energética joga um balde de água fria em um ano em que a economia brasileira tenta se
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A cana-de-açúcar é uma máquina biológica muito eficiente para conversão de energia solar em biomassa, que por sua vez pode se transformar não só em alimento, mas em energia na forma de etanol, bioeletricidade, biogás e em vários outros produtos” Plinio Nastari, presidente da consultoria Datagro
recuperar dos prejuízos causados pela pandemia da Covid-19. A população sente os efeitos no bolso: aumento da conta de luz e inflação dos alimentos. Mas nem tudo são más notícias. Há um oásis no deserto, que vem do agro brasileiro. O setor tem uma capacidade gigantesca de geração de energia a partir do sol, dos ventos, dos resíduos orgânicos, dos subprodutos da produção de açúcar e etanol, dos dejetos da pecuária e da criação de suínos etc. Para se ter uma ideia, só o setor sucroenergético tem um potencial quase sete vezes maior do que é utilizado. “No ano passado, nós geramos 22,6 mil gigawatts-hora (GWh), mas com a biomassa que temos, sem aumentar um só pé de cana-de-açúcar, poderíamos ter gerado 148 mil GWh”, diz Zilmar José de Souza, gerente de bioeletricidade da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica). “Mas para isso precisamos de uma política de longo prazo, de diretrizes mais críveis e de previsibilidade de contração”, acrescenta. Com um melhor planejamento, as usinas brasileiras poderão fornecer energia limpa e “poupar água”, uma vez que o pico do processamento de cana-de-açúcar (de abril a novembro) coincide com o período de estiagem, caracterizado pela pouca chuva, o que afeta os reservatórios das hidrelétricas. “A sazonalidade do setor sucroenergético cobre o período de déficit hidráulico. É uma energia firme, de base renovável, com um custo de geração de R$ 400 por
MWh, uma alternativa muito melhor do que as térmicas movidas a gás natural ou óleo diesel, que têm um custo que oscila entre R$ 1.000 e R$ 1.800 por MWh”, diz Plinio Nastari, presidente da consultoria Datagro.
SEM PERDAS DE TRANSMISSÃO E as vantagens vão além. “Esta geração ocorre perto do centro de carga, perto das cidades. Então, com um menor investimento em linhas de transmissão e com menos perdas. Lembrando que, no Brasil, as perdas de transmissão de energia são estimadas em 14% devido à distância entre as linhas”, explica Nastari. Mas tudo esbarra na falta de um plano de curto, médio e longo prazo. “Em 2010, a gente chegou a acrescentar 1.750 MWh de energia nova [proveniente de parques de cogeração novos] à matriz elétrica. Mas no ano passado caiu para 304 MWh. Essa gangorra desestrutura não só o setor sucroenergético, mas a cadeia produtiva em volta, que é 100% nacional, exporta tecnologias na produção de caldeiras, de usinas e que se vê diante deste cenário de falta de previsibilidade, de continuidade”, explica Souza. A ausência de um planejamento estratégico pode ter consequências perversas para o País. De acordo com Caio Megale e Rodolfo Silva, economistas da XP, há um sério risco de racionamento de energia em 2022, que – se acontecer – poderá zerar o crescimento do Produto PLANT PROJECT Nº27
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15.721 GWh
foram gerados pelo setor sucroenergético de janeiro até 15 de agosto deste ano. Este montante evitou a emissão de 4,3 milhões de toneladas de CO2 na atmosfera, marca que somente seria atingida se plantássemos 30 milhões de árvores nativas ao longo de 15 anos Fonte: Zilmar José de Souza, gerente de bioeletricidade da Unica
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Interno Bruto (PIB) brasileiro. Se, no entanto, o Brasil fizer a lição de casa, resolver as questões regulatórias e der segurança para os fazendeiros e usineiros investirem, o agro nacional – com seu potencial de geração de energia limpa e neutra em emissões de gases do efeito estufa (GEE) – tem tudo para atrair aportes das grandes gestoras globais de ativos, que já sinalizaram que não mais investirão em empresas que não tenham um plano robusto de transição para uma economia de baixo carbono. Neste contexto, o Brasil tem a seu favor o RenovaBio, uma política nacional de biocombustíveis, instituída pela Lei nº 13.576, de 2017. Ao promover a expansão dos combustíveis verdes na matriz energética, o programa ajuda o País no cumprimento das metas de redução dos gases de efeito estufa (GEE) assumidas no Acordo de Paris e dá aos produtores de biocombustíveis certificados o direito de solicitar a emissão de créditos de descarbonização, os famosos CBios. “O RenovaBio estimula o aproveitamento integral e mais eficiente da energia contida na cana e, portanto, premia através da possibilidade da emissão de mais crédito de descarbonização aquelas empresas que aproveitam melhor o bagaço, a palha e o biogás”, diz o presidente da Datagro. “Além da receita obtida com a venda da bioeletricidade, ao expandir a capacidade de produção, o produtor recebe o benefício de vender mais CBios e ter uma renda ainda maior”, acrescenta. A riqueza energética de um canavial ainda é pouco conhecida. “A cana-de-açúcar é uma máquina biológica muito eficiente para conversão de energia solar em biomassa, que por sua vez pode se transformar não só em alimento, mas em energia na forma de etanol, bioeletricidade, biogás e em vários outros produtos”, diz Nastari. Uma tonelada de cana-de-açúcar, por exemplo, corresponde a 1,2 barril de petróleo. Traduzindo em miúdos, o volume de cana que é produzido e processado para açúcar e etanol no Brasil equivale a uma produção de 2,13 milhões de barris de petróleo por dia. Não muito atrás dos 2,9 milhões de barris de petróleo que o País produz diariamente.
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foto: foto: Shutterstock Wenderson Araujo/CNA
PRÉ-SAL CAIPIRIA O apelido carinhoso foi dado pelos moradores do interior paulista ao potencial de geração de energia do setor sucroenergético. E eles têm razão. É possível produzir energia a partir do bagaço da cana-de-açúcar, da palha, da vinhaça (subproduto da produção de etanol) e da torta de filtro (resíduo da produção de açúcar). Para se ter uma ideia, de janeiro até 15 de agosto deste ano, só o segmento de biomassa (em que o bagaço de cana-de-açúcar representa 80% do total) gerou 15.721 Gigawatthora (GWh), segundo dados da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE). “Este número significou poupar 11% de energia armazenada em forma de água nos reservatórios das hidrelétricas do Centro-Oeste e Sudeste do País”, diz Zilmar de Souza, da Unica. “Imagina se o Brasil tivesse contratado 30% a mais [de energia] de biomassa a cada ano? Talvez o País não estivesse passando pelo apuro atual”, conjectura. Segundo a Unica, até 2020, o setor sucroenergético no Brasil tinha 366 usinas,
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sendo todas unidades autossuficientes em energia. “Dessas, 220 venderam o excedente [de bioeletricidade] para rede, 146 não venderam”, diz Souza. “No total, foram gerados 22,6 mil GWh no ano passado, isso corresponde a um aproveitamento de apenas 15% do nosso potencial de geração”, acrescenta.
DESAFIO SUCROENERGÉTICO O segmento tem tudo para exportar mais energia para o Sistema Interligado Nacional (SIN) e aumentar sua eficiência energética, aproveitando a biomassa, a palha e a vinhaça. “Mas falta um plano estruturado para o aproveitamento desse potencial, falta uma política direcionada a viabilizar a energia do setor e, às vezes, há entraves para conexão da usina ao SIN, dificuldades com autorizações de interligações”, diz Plinio Nastari. Outro empecilho é o modelo dos últimos leilões para contratação de energia de longo prazo, que foram focados em “energia nova”, proveniente de novos parques de cogeração, o que demanda um aporte considerável. “O investimento é da ordem de, aproximadamente, R$ 6 milhões por megawatt de potência instalada”, diz Nastari. Tal situação, inclusive, é uma das dificuldades do setor, uma vez que muitos grupos sucroenergéticos têm um potencial de geração de energia maior, mas não têm incentivo para aumentar a cogeração nos parques já instalados, porque os leilões privilegiam novos parques. “A imprevisibilidade quanto à receita e a falta de estímulo para usar 100% da capacidade são gargalos do setor”, diz Gustavo Segantini, diretor comercial da Tereos Açúcar e Energia Brasil. 26
Há dez anos, a subsidiária brasileira do grupo francês Tereos vem investindo no aumento da capacidade de cogeração de energia. “Somos autossuficientes, consumimos cerca de 500 mil megawatts por ano e, no ano passado, exportamos 1,150 milhão de megawatts de energia para o sistema”, diz Gustavo Segantini, diretor comercial da Tereos. “Este volume de cogeração é suficiente para abastecer o consumo residenc0ial de uma cidade de 2,3 milhões de habitantes durante um ano”, acrescenta. No entanto, a produção de energia a partir da queima do bagaço é inferior à capacidade instalada do parque de cogeração da Tereos. “Nossa biomassa não é suficiente para utilizar 100% do nosso potencial, teríamos que ter uma quantidade maior ou contratar terceiros”, diz Segantini. Nesse sentido, Souza frisa a necessidade de uma previsibilidade mínima. “Se no ano passado, antes de começar a safra, tivessem sinalizado ao setor sucroenergético, poderíamos ter nos planejado e contratado biomassa de terceiros, como casca de arroz, cavaco de madeira”, explica. “A safra de cana-de-açúcar começa em abril e vai até novembro, mas, se houver planejamento, conseguimos antecipar a geração de energia para fevereiro e estender até janeiro”, acrescenta. Se por um lado, a falta de biomassa é um empecilho para a Tereos usar sua capacidade máxima de produção de energia; por outro lado, a disponibilidade de vinhaça é uma oportunidade. A cada um litro de etanol produzido são gerados em torno de 10 a 13 litros de vinhaça, subproduto que demandava um alto investimento para ser transformado em biofertilizante. “A gente
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A imprevisibilidade quanto à receita e a falta de estímulo para usar 100% da capacidade são gargalos do setor” Gustavo Segantini, diretor comercial da Tereos
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entendeu que tinha uma maneira melhor de utilizar a vinhaça, um jeito mais eficiente gerando energia elétrica ou combustível através do biogás”, diz Segantini. Isso levou a empresa a investir, um valor não revelado, num projeto-piloto na unidade de Cruz Alta, em Olímpia (SP). Lá, toda a vinhaça – que soma 900 milhões de litros por ano – vai para uma lagoa. Na sequência, passa por um biodigestor anaeróbio, que transforma a matéria orgânica da vinhaça em biogás. E depois o biogás passa por um processo de dessulfuração e se transforma em biometano. Parte do biometano é comprimida e vira combustível para a frota movida a gás e parte é direcionada para um tubo gerador e produz energia elétrica. “Este ano, vamos conseguir gerar de 10 a 20 MWh de energia, fora a geração de biometano comprimido para a nossa frota”, diz o diretor comercial da Tereos. “Já estamos fazendo testes e a ideia é substituir os caminhões movidos a diesel. Queremos reduzir ainda mais nossa pegada de carbono e substituir o combustível fóssil [da frota de caminhões] por combustível limpo”, acrescenta. Para o futuro, o plano da Tereos é expandir o projeto da vinhaça para todo o grupo, que – somando todas as unidades – tem a seu dispor 8,7 bilhões de litros de vinhaça por ano.
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A CANA É VERDE E TECH Para produzir a energia cada vez mais limpa, o manejo dos canaviais precisa ser cada vez mais sustentável – e a FMC tem um papel importante nesse processo
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lgumas culturas agrícolas são fundamentais por gerar fortes impactos econômicos. Outras destacam-se pela vocação ambiental. Há um terceiro grupo, ainda mais raro, que combina os dois fatores – a capacidade para impulsionar o PIB e, ao mesmo tempo, disseminar valores sustentáveis. Nesta última classe está a cana-de-açúcar, um dos mais tradicionais e relevantes produtos nascidos do campo brasileiro. Os números comprovam a força e as qualidades da cana-de-açúcar. Segundo estimativas da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica), o setor sucroenergético responde por 2% do PIB brasileiro e emprega mais de 2 milhões de pessoas, direta ou indiretamente – é o equivalente a toda a população de Paris, na França. Além dos benefícios econô-
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micos, a cana se caracteriza por ser uma aliada de primeira hora do meio ambiente. O etanol de cana-de-açúcar, por exemplo, é o biocombustível com a menor pegada de carbono do mundo. Entre outros atributos, ele reduz em 90% a emissão de gases poluentes em comparação com a gasolina. Para se ter ideia do que isso significa: desde o lançamento dos veículos flex, em março de 2003, e até março de 2021, o uso do etanol evitou a emissão de 552 milhões de toneladas de CO2 na atmosfera brasileira. Não é só. Atualmente, boa parte da energia elétrica que abastece a cidade de São Paulo vem de usinas de cana-de-açúcar. Em um contexto de crise hídrica, a hábil planta pode funcionar, portanto, como um antídoto contra apagões. A bioeletricida-
de, lembre-se também, não exige a queima de carvão ou petróleo, o que só reforça as inúmeras vantagens da cana. Mas, para contribuir cada vez mais para a geração de energia limpa para o planeta, o setor precisa garantir uma produção cada vez mais sustentável nos canaviais. E então, todos os elos da cadeia precisam estar alinhados no mesmo propósito. “Quando se fala em sustentabilidade do agronegócio, é impossível não pensar em cana-de-açúcar”, diz Christian Menegatti, gerente de Cultura da FMC. A empresa tem fortes conexões com os dois temas. Ela não apenas comanda o mercado brasileiro de defensivos para a cana-de-açúcar como também é uma agente importante na propagação da sustentabilidade no campo. No
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ano passado, a empresa lançou a campanha “Onde Tem Cana, Tem Energia”, que busca justamente realçar os valores intrínsecos da planta, seja para a economia, seja no aspecto ambiental. Não é apenas conversa da boca para fora. Atualmente, a FMC destina 97% dos investimentos de P&D à criação de produtos sustentáveis. Até 2025, o índice chegará a 100%. Graças aos robustos aportes na área, a empresa desenvolveu diversas tecnologias que, aplicadas no campo, representam notáveis avanços para o agronegócio brasileiro. Um deles é o Quartzo®, nematicida 100% biológico. “Ele é feito à base de bacilos e entrega resultados muitos superiores aos químicos, e de maneira sustentável”, aponta Menegatti. O Quartzo® traz, de fato, inú-
meras vantagens. Seu mecanismo é desencadeado pela ação sinérgica entre duas bactérias – em conjunto, elas criam um biofilme protetor ao redor da raiz, o que otimiza a absorção de água e nutrientes. Como resultado, pode entregar aumentos médios de produtividade em torno de 15%. Ele também possui outra característica vital: seu uso contínuo eleva de maneira expressiva a população das bactérias no solo. “Ao longo do tempo, os bacilos vão promovendo naturalmente o controle de pragas, e o resultado desse processo é um tremendo ganho sustentável”, diz o executivo da FMC. Além disso, o Quartzo® apresenta propriedades únicas em relação a outros biológicos, como o fato de não exigir refrigeração ou outras condições especiais de
armazenamento. Por todas essas razões, recentemente foi eleito o melhor produto biológico do mercado brasileiro pelo “Fórum e Prêmios de Ciência Agrícola do Agronegócio – Agrow Awards”. A sustentabilidade é uma das marcas registradas de outro produto de alto valor tecnológico da FMC: o Altacor®, que integra o portfólio de químicos da empresa e destina-se principalmente para o controle da broca da cana-de-açúcar, praga cuja incidência aumentou nos últimos anos nos canaviais brasileiros. Apesar de ser um produto de alta performance e elevado poder inseticida, o Altacor® possui uma característica singular – a seletividade. “Ele só vai controlar aquela praga que agride a cana”, afirma Menegatti. “Ou seja, os outros insetos que estão em volta da lavouPLANT PROJECT Nº27
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Faria (à esq.), diretor comercial, e Menegatti, gerente de cultura: cana é sinônimo de sustentabilidade no agronegócio
ra ficam protegidos.” O executivo reforça que, por se tratar de um produto com ação específica, ele não provoca danos a nenhuma espécie de animais, sejam aves, peixes ou mamíferos. Essa característica também permite a integração total entre produtos químicos e biológicos. O Altacor®, por exemplo, é inofensivo para a Cotesia, inseto amplamente utilizado no controle biológico de pragas, especialmente nas lavouras de cana-de-açúcar. O especialista lembra que atualmente 80% do controle da broca se dá por meio de seus inimigos naturais, como joaninhas, tesourinhas e formigas. O problema é que os 20% restantes podem provocar grandes estragos. É aí que o Altacor® entra, justamente para cobrir esse percentual. Por ser um produto de alta rentabilidade, ele exige menos aplicações. Sendo assim, gasta-se menos combustível para abastecer as aeronaves de pulverização ou as máquinas de solo, num ciclo que, no final das contas, traz benefícios para a parte mais interessada na história: o agricultor. O especialista reforça o aspecto sistêmico do Altacor®. “Assim que o produto é aplicado, ele naturalmente passa a ser absor30
vido pela planta”, explica. “Quando chove, a cana libera novos brotos e o Altacor® acaba chegando até eles. Com isso, a broca não tem chance alguma, e todos os brotos crescem protegidos.” As inovações da FMC não se restringem a produtos. Na área de serviços, a empresa colocou no mercado o “SmartCalda”. Trata-se de um equipamento que automatiza o preparo da chamada “calda de aplicação” na lavoura. Nos processos convencionais, os técnicos manuseiam os produtos químicos, o que os expõe a riscos. Com a tecnologia da FMC, toda a rotina é feita de maneira automática, sem que haja contato humano com os produtos. Proporcionando maior segurança para o aplicador e para o meio ambiente, uma vez que todos os cálculos e dosagens são feitos por um programa computadorizado, além de contribuir para a redução enorme do número de embalagens plásticas. O inédito sistema, já está presente em 30 grandes usinas do País. A busca pela inovação permeia todas as operações da FMC. Para disseminar essa cultura e estimular o surgimento de produtos e serviços, a empresa conta com três centros de pesquisa – em Paulínia, no interior de São Paulo,
Stine, nos Estados Unidos, e Hørsholm, na Dinamarca –, além de 22 estações para testar produtos e formulações. Ao unir inovação e sustentabilidade, e fazer isso em prol do desenvolvimento do mercado de cana, a FMC não está apenas gerando bons negócios, mas, acima de tudo, ajudando a construir um País melhor. “A FMC tem história na cultura da cana-de-açúcar. Somos líderes neste mercado porque sempre prezamos por entregar inovação e sustentabilidade para toda a cadeia, pensando em um manejo eficiente que contribua com a produtividade do campo. Nesses anos de parceria com o setor, fomos pioneiros em tecnologias biológicas para os canaviais, levamos serviços inovadores como o SmartCalda, além de sermos grandes apoiadores da cultura, criando campanhas que valorizam a cana-de-açúcar, como o ‘Onde ‘Onde tem Cana, tem Energia’”, afirma o Diretor Comercial da FMC, Marco Faria. “Estar ao lado do produtor é a nossa cultura, vivenciando seus maiores desafios e proporcionando experiências, histórias e resultados para a cana-de-açúcar. Afinal, esta é uma das culturas com potencial enorme para o nosso País”.
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SAFRA CHEIA DE IPOs Oferta inicial pública de ações de empresas do agronegócio movimenta bolsa de valores este ano Por Ronaldo Luiz
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fotos: Divulgação
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valor, por si só, impressiona: mais de R$ 10,5 bilhões. É dinheiro novo, injetado por investidores, no caixa de apenas sete empresas, resultado de uma colheita financeira sem precedentes para o agronegócio. AgroGalaxy, Boa Safra, BrasilAgro, Jalles Machado, Raízen, 3Tentos e Vittia foram as responsáveis por fazer de 2021, que ainda nem terminou, a maior temporada das companhias do agro na B3, a bolsa de valores de São Paulo. Ao lançar ações para negociação pública, elas demonstraram que os negócios rurais, antes pouco atraentes para uma massa de investidores, tornaram-se visíveis e cobiçados no mercado de capitais. Os bilhões arrecadados com ofertas iniciais públicas de ações (IPOs, na sigla em
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inglês comumente usada por quem é da área) devem irrigar o campo com futuros lances das empresas em aquisições, contratações, desenvolvimento e pesquisa de produtos, compras de equipamentos, gerando um efeito positivo em vários elos da cadeia produtiva do agro. A safra 2021 de IPOs rurais tem um outro aspecto relevante. A Raízen, gigante do setor bioenergético, levantou mais de R$ 6,9 bilhões com a operação, a maior do gênero no ano, entre todos os setores. Mas tão importante quanto é o fato de passarem a ser listadas na B3 empresas de porte médio do segmento, sobretudo da área de insumos agrícolas – entre fabricantes e revendas digitais –, passando a se juntar a grandes grupos do ramo sucroenergético
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e da área de proteína animal, os maiores representantes do agro na bolsa até o momento. A maioria das operações se concentrou na primeira metade do ano em uma conjuntura que ainda era marcada pela queda de juros, o que acabava sendo um impulso para a abertura de capital. De lá para cá, o quadro mudou, com a turbulência política e o risco fiscal deteriorando o ambiente econômico, o que dificulta movimentos em direção à bolsa. Contudo, segundo especialistas, é a força econômica do agronegócio, puxada pela demanda estrutural crescente por alimentos, energia limpa e fibras, e a consequente necessidade de novos e mais recursos para viabilizar o aumento de produção, o principal e real motivo para a boa safra de IPOs de empresas do setor. O câmbio favorável, ou seja, o dólar apreciado frente ao real, também ajuda, já que o agronegócio é um segmento de natureza dolarizada, e, com exportações aquecidas, companhias do setor vêm registrando excelente desempenho neste ano. Os números estão aí para comprovar, com os mais importantes indicadores relacionados ao agro, mostrando a robustez da atividade. O Valor Bruto da Produção Agropecuária (VBP) de 2021, conforme o Ministério da Agricultura, Pecuária e
Abastecimento (Mapa), deve uma vez mais superar a cifra de um trilhão de reais, mais especificamente R$ 1,106 trilhão, avanço de 9,7% em relação ao valor de R$ 1,008 trilhão registrado no ano passado. Ademais, as exportações do setor alcançaram US$ 83,6 bilhões no intervalo de janeiro a agosto, incremento de 20,7% em relação a igual período de 2020. No primeiro semestre de 2021, o PIB do agronegócio nacional acumulou alta de 9,81%, segundo cálculos realizados pelo Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada), da Esalq/USP, em parceria com a CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil). Considerando-se a performance do agro e da economia brasileira até o momento, a participação do segmento no PIB total deve se manter em torno de 30% no ano. Entretanto, esse peso econômico não se reflete, ainda, na B3. Até o final do ano passado, por exemplo, o valor de mercado das empresas do agronegócio – incluindo as gigantes de proteína animal – representava apenas 4% do total do valor das companhias listadas na bolsa. As sete novas integrantes do mercado adicionaram cerca de R$ 80 bilhões a essa conta, que ainda está longe de representar adequadamente o setor. “O setor estava sub-representado. Havia uma defasagem, que não condizia com o dinamismo da atividade”,
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3Tentos, Raízen, AgroGalaxy e Vittia tocam o sino na B3: capital novo para investimentos
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concorda Leonardo Resende, gerente de Relacionamento com Empresas da B3.
LISTA DE ESPERA Para muitos especialistas, essa defasagem tem um nome: oportunidade para novos lançamentos. Não por acaso, há vários nomes de empresas do setor na lista de espera pelo momento certo de fazer o IPO. Estão na antessala de lançamento Oleoplan, Centro de Tecnologia Canavieira (CTC) e Companhia Mineira de Açúcar e Álcool. “O potencial de entrada de novas companhias do agronegócio na bolsa é alto. O segmento está muito aquecido, sobretudo pelas exportações, o que alavanca os ‘agro-IPOs’”, avalia Joelson Sampaio, professor de economia da Fundação Getulio Vargas (FGV). Para Regis Chinchila, analista da Terra Investimentos, o “Programa Bovespa Mais”, idealizado pela B3 com o intuito de contribuir para o desenvolvimento do mercado brasileiro de ações, ao possibilitar o acesso gradual de pequenas e médias empresas à bolsa, vem sendo um impulso para as recentes ofertas. Segundo Chinchila, as empresas do agronegócio vêm apostando em IPOs para captação de recursos e expansão de seus negócios, além do reforço no capital de giro. “A alta das commodities agrícolas, obviamente, traz impactos positivos para o setor, 36
e consequentemente contribui para a valorização dos papéis das empresas do agro”, diz. Nos grandes bancos de investimento, comprar e vender agro é, cada dia mais, uma atividade lucrativa. Um dos mais ligados nessa tendência é a XP, que participou de seis ofertas iniciais de ações de companhias do agro – em três delas liderou a operação. Sócio responsável pelo setor de agronegócio no investment banking da empresa, Pedro Freitas pontua que a exposição dos investidores às oportunidades que as ações das empresas do agro oferecem ainda é baixa, o que, por outro lado, mostra que há muito o que crescer nesta questão de atratividade. “Falta um esforço de catequização, que eduque o investidor acerca das especificidades do setor. Esta realidade faz com que algumas ações de empresas do segmento ainda sejam adquiridas por quantias mais baratas”, ponderam Maurício Nozawa e Osias Brito, diretores da BR Finance. Investidores internacionais estão atentos a esse detalhe. Denis Morante, sócio-diretor da Fortezza Partners, chama a atenção para o interesse cada vez maior deles por ações de companhias do agronegócio. Em geral, diz o executivo, para que um IPO vingue, a operação de abertura de capital depende de capital do exterior. E eles apareceram no caso dos agro-
IPOs. Dados da B3 apontam que o percentual de investidores estrangeiros na bolsa hoje gira em torno de 30 a 35%.
JORNADA RUMO À BOLSA Abrir o capital não é tarefa corriqueira, principalmente para empresas que cresceram em um setor pouco acostumado a se mostrar ao mercado. “Primeiro, só abrir o capital já é um desafio muito grande. Se para uma empresa de um setor mais conhecido já não é algo tão trivial, imagine então para uma companhia do agro. O mercado não é muito educado em relação às particularidades do segmento”, afirma Alexandre Del Nero Frizzo, diretor financeiro e de relação com investidores do Grupo Vittia, especializado em fertilizantes, defensivos biológicos e inoculantes, cuja estreia nos pregões aconteceu no início de setembro. A operação arrecadou R$ 382 milhões e só foi efetivada depois de uma longa jornada, que incluiu dois adiamentos em função da conjuntura econômica desfavorável. Frizzo relata que, nesse período de amadurecimento até a tomada
foto: Divulgação
O IPO da Boa Safra: processo exige disciplina e transparência
de decisão para a oferta de ações, uma das maiores tarefas, de fato, é a de decodificar a dinâmica do agronegócio para os investidores privados. Na lição de casa que precisa ser feita para que a empresa se sinta confortável e elegível para fazer o IPO, o fator-chave é ter um plano sólido de negócios, que apresente de modo claro as perspectivas de crescimento da companhia. “A partir deste ponto, a empresa passa também a trabalhar o amadurecimento em relação às demais exigências do mercado relacionadas, por exemplo, a melhores práticas de sustentabilidade, gestão de recursos humanos, estrutura de capital etc.” Nesse sentido, as sete empresas listadas em 2021 representam, em suas áreas, a face mais moderna da gestão do agro, tendo incorporado no seu cotidiano conceitos de governança e transparência valorizados pelos investidores. Para Mauricio Puliti, diretor financeiro do AgroGalaxy – marketplace destinado à venda de insumos agrícolas e comercialização de grãos que abriu o capital em julho
passado, levantando R$ 350 milhões –, o maior fator de risco de ser uma empresa listada na bolsa é o acesso às informações pela concorrência. Ele lembra, porém, que o caminho de crescimento exigido hoje para o sucesso no agronegócio passa pela alavancagem de recursos via mercado privado. José Humberto Teodoro, presidente da Terra Santa Propriedades Agrícolas – empresa resultante da incorporação da Terra Santa Agro pela SLC Agrícola, ambas de capital aberto, em julho, para atuar no ramo imobiliário rural –, adiciona outro aspecto fundamental no processo de profissionalização, com foco no mercado acionário, das companhias do agronegócio: além de desenvolver de forma integrada medidas de compliance social e de governança, precisa ter uma clara política de responsabilidade com o meio ambiente, questão intrínseca vinculada à sobrevivência dos negócios rurais.
DINHEIRO MAIS BARATO O caminho rumo ao mercado de capitais tem obstáculos e PLANT PROJECT Nº27
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Os IPOs Agro de 2021 Empresa
Setor
Valor Arrecadado*
AgroGalaxy Insumos e Serviços Boa Safra Sementes BrasilAgro Imóveis rurais Jalles Machado Sucroenergético Raízen Sucroenergético 3Tentos Agroindustrial Vittia Bioinsumos
350 460 500 741,5 6900 1300 382
*Em milhões de reais
exige a mudança de cultura em grande parte das empresas. Os benefícios, para quem os supera e consegue mostrar aos investidores a qualidade de sua gestão, são inegáveis, sobretudo em um país em que o crédito tradicional é escasso e caro. Para Antônio da Luz, vice-presidente da Comissão Nacional de Política Agrícola da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) e economista-chefe da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul), o movimento de abertura de capital de empresas do agronegócio está atrelado ao avanço de uma nova agenda do crédito rural como um todo. 38
Há um direcionamento claro do governo de que as políticas públicas de financiamento serão cada vez mais voltadas para os pequenos produtores, e que demais agentes do setor terão que ir ao mercado privado para levantar recursos. “Além disso, o sistema bancário oficial de crédito não consegue mais acompanhar a demanda do segmento agropecuário por capital. Então, se faz necessário a busca por outras fontes”, frisa o especialista. “O agro precisa andar de mãos dadas com o mercado de capitais, porque o setor é uma excelente oportunidade para o mercado e vice-versa.”
Reimaginar a agricultura é inovar em cada ação, dentro e fora do campo.
Uma safra produtiva e rentável depende de diversos fatores, dentre eles inovação, união e atitude. Por isso, a Ourofino se mantém ao lado do produtor, buscando reimaginar seu negócio e contribuir para o seu desenvolvimento.
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QUANTO VALE A SUA TERRA? Valorizado, mercado de terras agrícolas passa por transformações e incorpora a agenda ESG como critério para tomada de decisão de compra Por Luiz Fernando Sá e Ronaldo Luiz Fotos de Wenderson Araújo/Trilux/Sistema CNA/Senar
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ai diversificar os investimentos? Olhe para o campo. A valorização das terras agrícolas, impulsionada, sobretudo pelos bons resultados do agronegócio brasileiro, vem tornando o investimento em imóveis rurais bastante interessante e atrativo. Taxas de juros consideradas ainda baixas – levando-se em conta nosso histórico não muito distante de dois dígitos – e a cotação do dólar estabilizada em um piso de patamar elevado, o que consequentemente impacta de modo positivo nos preços dos produtos agropecuários, são outras duas variáveis que funcionam como indutor de um viés de alta para os ativos do mercado imobiliário rural. Na última década, segundo levantamento da IHS Markit, a valorização de terras em áreas consolidadas do agronegócio nacional foi, em média, superior a 10% ao ano. Com commodities em alta nos mercados globais, novas fronteiras para a produção de grãos, como os estados do Matopiba (sigla que reúne as inicias de Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), chegaram a dar retornos ainda maiores, próximos de 20% ao ano (veja tabelas ao longo da reportagem). E com potencial para se manter nesse patamar para os próximos anos, já que a demanda por maior produção de alimentos aumentará o interesse por terras produtivas, com oferta cada vez mais restrita. Se a conjuntura internacional é favorável, a grande movimentação do mercado financeiro nacional indica um cenário ainda mais positivo. Mudanças na legislação, como a sanção da lei que
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regulamentou a criação dos Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (Fiagro), instituindo regras próprias e estímulos tributários para a negociação de ativos do setor agropecuário no mercado de capitais. Com mecanismos semelhantes aos dos fundos imobiliários, a nova modalidade desburocratiza e democratiza o investimento em produtos financeiros ligados ao agro, permitindo que pequenos aplicadores urbanos também participem da atividade rural, sem precisar comprar fazendas ou mesmo entender de produção agropecuária. Os efeitos da nova legislação, sancionada em março passado, já começam a ser sentidos. De lá para cá, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), responsável pela fiscalização do mercado de capitais, já recebeu dezenas de pedidos de registro de operações de Fiagro. Os primeiros a serem autorizados começaram a captar recursos em setembro passado. Então, foi possível perceber que a transformação não para na chegada ao pequeno investidor urbano. Com o mercado valorizando cada vez mais ativos verdes, boa parte dos novos fundos imobiliários do agro incorpora metas de sustentabilidade na aquisição dos imóveis. RESISTENTE A PANDEMIA Enquanto a economia mundial desacelerava em função da pandemia de Covid-19, o mercado imobiliário rural mostrou-se tão resiliente quanto a atividade agropecuária. O levantamento da IHS Markit, por exemplo, aponta que as terras em
Terras
Quanto vale sua terra?
preço de terra região
JÁ EM OPERAÇÃO EM BRL/HA
MENTO EM O BRASIL TEM ÇÃO HISTÓRICA.
consolidadas nas e sudeste xas de valorização olta de 10% a 11%, fronteirasEvolução do preço norte e centro dos imóveis rurais axas de 13% por região (em reais/ hectare)
Fonte: FNP - IHS Markit
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2010
2020
CAGR
1,462
4,804
13%
2010
2020
CAGR
2,074
5,365
10%
2010
2020
CAGR
3,586
12,127
13%
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2020
CAGR
7,981
19,574
10%
2010
2020
CAGR
9,864
27,587
11%
Fronteiras da valorização MARANHÃO
21%
BAHIA
20% A região do MAPITOBA composta pelos estados do Maranhão, Piauí, Tocantins e Bahia destacam-se na valorização de terras no país.
VALORIZAÇÃO DO PREÇO DE TERRAS No entendimento da gestora, as principais valorizações no preço Regiões produtoras de terracom em maior 2020 foram em variação regiões expoentes na produção do preço das terras de grãos, refletindo o efeito do (valorização dos início do ciclo de valorização das preços por hectare commodities.
em 2020)
MATO GROSSO
17%
RIO GRANDE DO SUL
15%
Fonte: IHS Markit
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locais de interesse para o agronegócio registraram uma valorização média de 6% no intervalo entre novembro de 2019 e de 2020. Já no período de 12 meses até abril deste ano, a alta nos preços médios das terras agrícolas foi quase o triplo, de praticamente 18%. Leydiane Brito, analista de mercado na IHS Markit, destaca que os números podem ser ainda maiores se, na avaliação das áreas, forem observados critérios relacionados aos diferentes tipos de ocupação e de localização dos imóveis rurais. “Por exemplo, terras destinadas ao cultivo de grãos, cuja média foi de R$ 31.103 por hectare no bimestre março/ abril deste ano, apresentaram alta de 29,2% em relação aos últimos 12 44
meses. Outro caso são as terras de pastagens, que subiram de uma média de R$ 8.340 por hectare no bimestre maio/junho de 2020 para uma média de R$ 9.304 por hectare no bimestre março/abril deste ano, avanço de 11,6%.” A executiva detalha que a valorização das terras agrícolas está vinculada a uma combinação de fatores, que tem beneficiado o agronegócio como um todo, com destaque para o incremento da demanda externa, o câmbio favorável às exportações, o aumento das cotações internacionais das principais commodities e a, segundo ela, “trajetória histórica de queda nos juros”. De acordo com Leydiane, esta conjuntura vem
contribuindo para alavancar resultados bastante satisfatórios para a produção agropecuária brasileira. “Mesmo setores que vinham de momentos mais difíceis, como a pecuária, puderam crescer e manter a alta de seus produtos. Isso tudo vem dando sustentação aos preços das terras. O mercado, então, passou a operar de maneira mais regular, com valores mais elevados”, frisa a executiva. “Pode-se dizer que o cenário favorável ao agronegócio brasileiro mantém margens de rentabilidade bastante satisfatórias aos principais agentes da cadeia produtiva, o que contribui de maneira decisiva para manutenção de um mercado de ativos rurais aquecido.”
Terras
O perfil de compradores de terras agrícolas, neste momento, é bem diversificado, segundo a analista. Engloba desde o produtor mais capitalizado, passando por grandes grupos de gestão de ativos rurais – que adquirem áreas, com o intuito de criar valor na transformação destas propriedades – até fundos imobiliários relacionados ao setor. “A procura crescente por áreas para fins de compensação ambiental também vem movimentando o mercado.” Matheus Siqueira, da gestora TG Core, diz que fundos imobiliários com foco em áreas agrícolas estão mesmo entrando no radar dos investidores. “Os fundos que administramos contam com investimentos
pulverizados por todo o País e muitos deles vêm pegando carona no desenvolvimento do agronegócio incentivados pela expectativa de retorno esperada”, afirma. “Nosso foco contempla, por exemplo, novas fronteiras agrícolas, como o Matopiba, bem como regiões mais consolidadas, entre as quais os estados do Centro-Oeste, além do Triângulo Mineiro e interior de São Paulo.” COMPLIANCE SOCIOAMBIENTAL Primeiro Fiagro imobiliário com oferta pública registrada pela CVM, o fundo Santa Fé Terra Mater chegou ao mercado no final de setembro passado com a meta de levantar até R$ 500 milhões para
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investimentos em imóveis rurais para arrendá-los ao próprio produtor ou a terceiros. Os rendimentos do fundo virão da valorização com a eventual venda das fazendas, assim como do resultado obtido com a produção. Um dos pontos indicados no prospecto, porém, é inovador: a obtenção de ganhos com o pagamento por serviços ambientais (PSA) nas propriedades. Para atingir essa meta, a gestora Santa Fé informou que todos os imóveis adquiridos pelo fundo passarão por diagnósticos socioambientais, realizados pela empresa especializada Produzindo Certo, que se encarregará de identificar eventuais passivos e elaborar PLANT PROJECT Nº27
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Ag Terras
O negócio do ano Uma negociação com valores expressivos confirmou, no início de outubro, o momento particularmente aquecido do mercado imobiliário rural no Brasil. A BrasilAgro, empresa com foco em investimentos que visam ganhos com a valorização de propriedades agropecuárias, anunciou no dia 8 a venda de uma fazenda com 3,7 mil hectares (sendo 2,6 mil hectares produtivos) por incríveis R$ 589 milhões. A fazenda Alto Taquari, destinada à produção de grãos no Mato Grosso, estava no portifólio de bens da companhia desde 2007, quando foi adquirida por R$ 30 milhões. Isso significa uma valorização de quase 20 vezes em menos de uma década e meia. A quantia obtida na venda surpreendeu até mesmo os executivos
da BrasilAgro. A transação foi fechada com um ganho de 65% sobre a avaliação da própria empresa, divulgada no último balanço, em agosto, segundo informou a companhia em fato relevante. Nesse período, é claro, a BrasilAgro investiu em melhorias na propriedade, mas a avaliação é que a evolução dos preços das commodities agrícolas tenha ajudado a impulsionar os valores negociados. Mesmo em relação ao valor da cotação da soja, entretanto, houve ganhos. Segundo informou o próprio CEO da BrasilAgro, André Guillaumon, quando comprou a fazenda a empresa pagou o equivalente a 320 sacas de soja por hectare. Agora, o valor de venda corresponde a 1.100 sacas por hectare.
planos de adequação e melhoria nessa área. “Estar em conformidade com este conceito é sinônimo de credibilidade, o que favorece a concretização de negócios”, pontua Leydiane, da IHS Markit. A realidade é que a cobrança pela agenda ESG (Ambiental, Social, Governança), só cresce, e sobre o agro não é diferente. A sociedade e os investidores buscam um modelo de desenvolvimento sustentável que considere as práticas relacionadas à proteção ambiental, responsabilidade social e maior transparência. São questões que ganham peso na análise do investidor e para as transações no comércio global. De acordo com relatório da Bain & Company, as agências de classificação de crédito consideram cada vez mais as questões de sustentabilidade 46
em suas avaliações e um número crescente de instituições financeiras está integrando o impacto social e ambiental nas decisões de risco-retorno. Hoje, cerca de 190 bancos e mais de 3 mil gestores de ativos já adotam os princípios bancários e de investimento sustentáveis das Nações Unidas. O estudo cita, por exemplo, o HSBC, atualmente o segundo maior financiador de combustíveis fósseis da Europa, que recentemente ampliou sua posição ESG ao se comprometer a reduzir as emissões financiadas de seu portfólio para zero líquido até 2050 ou antes. O objetivo do banco é fornecer entre US$ 750 bilhões e US$ 1 trilhão em finanças sustentáveis até 2030. A pesquisa da Bain & Company destaca, ainda, que os empréstimos vinculados a ESG são o segmento de crescimento
mais rápido do mercado de crédito corporativo. Dos € 102 bilhões emitidos na Europa durante 2019, € 35 bilhões consistiram em empréstimos verdes e € 67 bilhões em outros financiamentos vinculados à sustentabilidade. Os empréstimos ESG geralmente incluem incentivos para que o captador do recurso alcance metas de desempenho de sustentabilidade predeterminadas. “Com a pandemia, o ESG ganhou ainda mais força. A relação das empresas com o meio ambiente, seus funcionários, fornecedores e clientes, as métricas e estratégias adotadas, a transparência na divulgação dos impactos e a preocupação com o greenwashing passaram a ser temas amplamente discutidos”, explica Sheila Conrado, sócia no Rio de Janeiro da consultoria empresarial e contábil internacional Baker Tilly. “Para o mercado financeiro, trata-se de uma ferramenta que estabelece critérios para que as empresas possam ter acesso a financiamentos com condições diferenciadas, como, por exemplo, juros mais baixos.” Em recente comunicado, a FAIRR Initiative, associação global que reúne grandes fundos, que administram cerca de US$ 38 trilhões, acentuou que identificar, por exemplo, a “pegada ambiental” da agricultura é um mecanismo que pode dar impulso na confiança dos
investidores para mobilizar capital na direção de sistemas e alimentos mais sustentáveis. O fundo de pensão da Canada Post Corporation e a Legal & General Investment Management, do Reino Unido, são alguns dos membros da FAIRR. O AGRO NA AGENDA ESG Para Bruno Lucchi, diretor técnico da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), o agronegócio brasileiro tem um potencial enorme para aproveitar as oportunidades de monetização e captação de recursos, que serão proporcionadas pela temática ESG. Segundo ele, ativos como o Código Florestal – uma das legislações ambientais mais rígidas –, boas práticas focadas em sistemas de produção de baixo carbono, entre as quais destacam-se o plantio direto
e a integração lavoura-pecuáriafloresta e mais de 60% de mata nativa protegida são trunfos que só o Brasil tem. “Um dos desafios é gerarmos comprovações de todos estes feitos, seja por meio, por exemplo, de créditos de carbono, títulos verdes ou outros dispositivos.” Fábio Zenaro, diretor de Produtos de Balcão e Novos Negócios da B3, ressalta que a agenda ESG está, sim, muito presente no agronegócio brasileiro, e não apenas por uma questão de remuneração, busca de investimentos, mas pelo propósito dos agentes da cadeia produtiva de desenvolvimento de uma produção cada vez mais sustentável. “Exemplo disso são os Certificados de Créditos de Descarbonização, os CBios, peça-chave do RenovaBio, a Política Nacional de Biocombustíveis.”
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Permanece impasse acerca da elegibilidade do capital estrangeiro para compra de terras Projeto de Lei em tramitação no Congresso Nacional pode pacificar a questão. Imbróglio represa bilhões em investimentos no agronegócio brasileiro Se por um lado, existem avanços como a captação de recursos para o agronegócio por meio de títulos verdes, outros imbróglios permanecem, como a questão relativa à aquisição e posse de imóvel rural por pessoas físicas ou jurídicas estrangeiras. Renato Buranello, sócio do VBSO Advogados, um dos principais especialistas no assunto, diz que, atualmente, a questão ainda é regulada pela Lei nº 5.709, de 1971, que, ao gerar diversas controvérsias, levou a Advocacia-Geral da União (AGU) a emitir três pareceres, sendo o último de 2010, válido até hoje, que dá respaldo às restrições da norma original. “É uma legislação de quando ainda éramos importadores de alimentos, que desconsidera a jornada de modernização da agricultura nos últimos 40 anos, descasada com a realidade atual, e que precisa ser reformada”, observa. Segundo o advogado, excetuando-se alguns negócios pontuais, que caminharam nos limites da lei de 1971, os investimentos internacionais para 48
esta categoria estão represados pela burocracia e insegurança geradas pelo regime jurídico vigente, que é pouco claro. De acordo com Buranello, as discussões relacionadas, por exemplo, à soberania do País acabam por contaminar o debate em torno do tema. “Não importa o carimbo de onde vem o dinheiro, a nacionalidade do recurso, porque, na prática, a empresa que receber o investimento estrangeiro estará sujeita às regras brasileiras, terá que seguir a Constituição Federal. Você não leva o ativo terra para fora do País”, ressalta reforçando que “o Projeto de Lei nº 2.963, do senador Irajá (PSD-TO), que tramita no Congresso Nacional, é um caminho, já que o texto olha para a frente”. PL PODE PACIFICAR A QUESTÃO O Projeto de Lei nº 2.963/19 facilita a compra, a posse e o arrendamento de propriedades rurais no Brasil por pessoas físicas ou empresas estrangeiras. Em análise na Câmara dos Deputados, a proposta dispensa a necessidade de autorização ou licença para aquisição e posse por estrangeiros, quando se tratar de imóveis rurais com áreas não superiores a 15 módulos fiscais (no Brasil, o valor do módulo
Terras
fiscal é fixado pelo Incra e varia de 5 a 110 hectares, dependendo do município). A soma das áreas rurais pertencentes e arrendadas a pessoas de outros países não poderá, no entanto, ultrapassar 25% da superfície dos municípios onde se situarem. No caso de sociedades formadas por cidadãos e empresas de mesma nacionalidade, esse percentual será mais rigoroso: 10%. O texto, que já foi aprovado no Senado, atribui competência ao Congresso Nacional para autorizar, mediante decreto legislativo, a aquisição de imóvel por estrangeiros, além dos limites fixados em lei, quando se tratar da implantação de projetos julgados prioritários, em face dos planos de desenvolvimento do País, mediante manifestação prévia do Poder Executivo. Os imóveis rurais adquiridos por sociedade estrangeira no Brasil também deverão obedecer aos princípios da função social da propriedade previstos na Constituição, como o aproveitamento racional e a utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e a preservação do meio ambiente. Autor do projeto, o senador Irajá diz que, na última década, o Brasil perdeu pelo menos R$ 550 bilhões em investimentos no setor agropecuário por causa de “controvérsias jurídicas” sobre a abertura ao capital estrangeiro. Pela proposta, os estrangeiros deverão obrigatoriamente lavrar escritura pública para aquisição do imóvel, e os cartórios de registro de imóveis terão de manter registro especial, em livro auxiliar, das aquisições de imóveis rurais pelas pessoas físicas e jurídicas estrangeiras. A identificação do adquirente do imóvel será acompanhada, no caso de pessoa jurídica, de informações relativas à estrutura empresarial no Brasil e no exterior, declaradas sob pena de falsidade ideológica, conforme previsto no Código Penal. De acordo com a proposta, estarão sujeitas à aprovação do Conselho de Defesa Nacional (CDN) a aquisição de imóveis rurais ou de qualquer
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modalidade de posse quando as pessoas jurídicas forem organizações não governamentais, fundos soberanos, fundações e outras pessoas jurídicas com sede no exterior. Também terão de passar pelo conselho pessoas jurídicas brasileiras constituídas ou controladas direta ou indiretamente por pessoas, físicas ou jurídicas, estrangeiras, quando o imóvel rural se situar no Bioma Amazônia e sujeitar-se à reserva legal igual ou superior a 80%. As aquisições por estrangeiros de imóveis situados em área indispensável à segurança nacional também deverão obter o consentimento prévio do Conselho de Defesa Nacional. Ficam vedados a estrangeiros: qualquer modalidade de posse por tempo indeterminado, arrendamento ou subarrendamento parcial ou total por tempo indeterminado e habilitação à concessão de florestas públicas destinadas à produção sustentável. Essa concessão, no entanto, é permitida para pessoa jurídica brasileira constituída ou controlada direta ou indiretamente por pessoa física ou jurídica estrangeira. Essas proibições não se aplicam quando a aquisição de imóvel rural se destinar à execução ou exploração de concessão, permissão ou autorização de serviço público, inclusive das atividades de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica ou de concessão ou autorização de bem público da União. O texto modifica a Lei nº 4.131/62, que disciplina a aplicação do capital estrangeiro e as remessas de valores para o exterior. Conforme o projeto, os recursos financeiros ou monetários introduzidos no Brasil por pessoas físicas e jurídicas estrangeiras, ou quando objeto de reinvestimento para a aplicação em atividades econômicas que envolvam a aquisição e o arrendamento de áreas rurais em território nacional, estarão sujeitos à legislação que regula a aquisição de imóveis rurais por pessoas estrangeiras. PLANT PROJECT Nº27
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MUITO ALÉM DA REIMAGINAÇÃO Com parceiras internacionais, registro de patentes e centros de excelência, Ourofino Agrociência reinventa o mercado de defensivos agrícolas
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sul-coreano W. Chan Kim tornou-se nos últimos anos um dos pesquisadores do universo corporativo mais celebrados do mundo. Autor do clássico “A Estratégia do Oceano Azul”, o professor do Insead, conceituada escola de negócio da França, diz que as empresas bemsucedidas são aquelas capazes de se reinventar permanentemente. “É preciso inovar o tempo todo”, ressalta o pesquisador. No agronegócio brasileiro, poucas companhias estão tão sintonizadas com essa premissa quanto a fabricante de origem brasileira de defensivos agrícolas Ourofino Agrociência. Não à toa, também são raras aquelas que cresceram em ritmo tão intenso na última década. Fundada em 2010, a Ourofino vive em 2021 um dos anos mais marcantes de sua história – o que é resultado sobretudo de seu
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permanente processo de evolução. A empresa, que sempre fabricou genéricos, estreou no mercado de patentes ao lançar, em junho, o produto Goemon, inseticida que age sobre lagartas que atacam principalmente as lavouras de soja e milho. “Com essa inovação, demos um passo imenso em direção ao futuro”, diz Marcelo Abdo, que assumiu o comando da Ourofino também em junho, após 5 anos no cargo de vice-presidente. Abdo não está exagerando. De fato, colocar no mercado uma molécula patenteada representa uma grande transformação, na medida em que, além de expressar a capacidade da empresa para inovar, a destaca imediatamente como referência tecnológica de seu setor. Nesse aspecto, a Ourofino foi inteligente ao detectar, em 2019, uma tremenda oportunidade de negócio. Naquele ano, associou-se às japonesas
Mitsui, e à ISK, especializada em pesquisa e desenvolvimento de novas moléculas de agroquímicos, que compraram respectivamente 20% e 5% da companhia brasileira. A transação encurtou caminhos e deu novo impulso para as ambições da Ourofino. “A molécula que patenteamos foi desenvolvida pela ISK”, afirma Leonardo Araújo, diretor de marketing P&D e PDI da empresa. “Isso por si só revela como a parceira acabou sendo proveitosa para nós. Em apenas dois anos de atuação em conjunto com ISK, chegamos ao registro de uma patente.” De fato, não poderia haver maneira mais veloz para alcançar esse objetivo. E não vai parar por aí. A Ourofino tem no pipeline diversas outras moléculas, próprias e da ISK, e certamente algumas delas serão registradas
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como patentes no futuro próximo. Em certos casos, serão tropicalizadas para que suas formulações se adequem melhor às características brasileiras, numa sinergia inédita no mercado nacional. A associação com a Mitsui é igualmente produtiva. O presidente Marcelo Abdo lembra que a Ourofino usa a estrutura do escritório da empresa japonesa na Índia para prospectar oportunidades em áreas como logística e transportes, além de desbravar novos fornecedores de matérias-primas. “É uma troca permanente de conhecimento”, reforça o executivo. Embora a Ourofino tenha entrado para o mercado de patentes em agosto, a inovação está no DNA da empresa. Desde 2012, funciona em Guatapará, no interior de São Paulo, a sua Estação Experimental, um centro avançado de pesquisas que realiza, por exemplo, testes de formulações em túneis de vento e simuladores de chuvas. Atualmente, são quatro estações experimentais em operação – além de Guatapará, nas cidades de Cambé e Bandeirantes, ambas no Paraná, e Rio Verde, em Goiás. A empresa também se mantém conectada com o ambiente acadêmico, associando-se a instituições como a Universidade Estadual de Maringá, Unesp/Botucatu e Universidade de Rio Verde, entre outras. As startups estão igualmente em seu radar. Um dos programas em andamento é o chamado Segnus, que consiste no monitoramento e aplicação de defensivos por via aérea. Para isso, a Ourofino conta com o
apoio da Perfect Flight, agtech especializada no monitoramento de aplicação aérea. Outra iniciativa é o Programa Focus360, executado em parceria com a plataforma de gestão agronômica Agritask para o mapeamento de plantas daninhas. Todos os anos, a Ourofino investe parte significativa do seu orçamento em Pesquisa e Desenvolvimento. No último, 2,5% de suas receitas foram destinados aos estudos, o que resulta numa série de inovações no mercado. A empresa possui uma linha de produtos que ganhou o sugestivo nome de “reimaginados”, que está em sintonia com o posicionamento criado em 2017 para ressaltar a expertise da empresa no desenvolvimento de produtos adaptados à realidade agrícola tropical: “Reimaginando a Agricultura Brasileira”. Marcelo Abdo explica. “Nos produtos reimaginados, o ativo é genérico, mas a formulação é inovadora”, diz o executivo. “Nós inclusive submetemos esses produtos ao registro de patentes.” Atualmente, lembra ele, há 8 produtos reimaginados no portfólio da empresa.
O registro de produtos é outro aspecto que mostra os diferenciais da Ourofino. Nesse campo, a empresa é mais veloz do que qualquer outra no país. Atualmente, ela consegue registrar suas formulações, em média, em 37 meses. No mercado, são 49 meses. Como se dá o milagre? “Em primeiro lugar, possuímos uma equipe que tem muito conhecimento, o que faz com que as solicitações raramente voltem com algum apontamento”, diz o presidente. Todas essas iniciativas justificam as metas arrojadas definidas pela Ourofino. A empresa conta atualmente, entre portfólio principal e clones, com 68 produtos em seu portfólio. De 2021 até 2023, serão 106. A partir de 2023, o número chegará a 285. A mesma ousadia é observada no campo financeiro. O objetivo é alcançar R$ 3 bilhões de faturamento em 2026. Para efeito de comparação, a companhia fechará o ano com receitas de R$ 1,8 bilhão, mais do que o dobro de três anos atrás. Como se vê, o futuro está de portas abertas para a Ourofino.
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foto: Gabriel Faria
DAS OFICINAS PARA O MUNDO Interessado por mecânica desde a infância e criativo desde sempre, o empresário Odilo Pedro Marion também precisou de muita persistência para superar os “períodos de seca” e transformar o Grupo Agrimec em uma potência da agroindústria nacional Por Romualdo Venâncio
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lgumas pessoas podem optar tanto pelo sentido literal quanto pelo figurado para falar sobre si ao utilizarem a expressão “escrever história”. É o caso do empresário Odilo Pedro Marion, fundador e presidente do Grupo Agrimec, que tem sede em Santa Maria, região central do Rio Grande do Sul, e é um dos nomes fortes da indústria nacional de máquinas e implementos agrícolas. Em novembro deste ano, Marion celebra dez anos do lançamento de sua autobiografia Empreender: Ousadia ou Loucura?, obra na qual conta a trajetória para construir, manter e expandir seu negócio, composto por quatro empresas – Agrimec, Acespeças, Intecsol e Idema. Hoje, com 47 anos de existência, o grupo emprega cerca de 450 colaboradores, fabrica 126 modelos diferentes de implementos, produz mais de 1.240 máquinas por ano e exporta para 32 países. Para que o livro fosse o mais fiel possível à realidade, Marion incluiu referências
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desde sua infância, quando já eram notórias a criatividade e a persistência, características que o ajudaram a construir uma história de sucesso. Aos 79 anos de idade, Marion segue ativo na gestão dos negócios. “Estou sempre trabalhando. E divido meu tempo entre as duas principais empresas do grupo, a Agrimec e a Idema”, afirma o industrial, que diz estar escrevendo mais dois livros. “Não me entrego”, acrescenta. E não se trata apenas de “força de expressão”, pois o empresário teve de colocar sua resistência à prova ao enfrentar a Covid-19 durante cerca de 30 dias, após ter sido infectado pelo coronavírus. Ao superar a doença, além de celebrar a própria recuperação, Marion também comemorou o comprometimento de seus colaboradores. “Nos dias em que fiquei afastado, a produção foi um pouco acima do normal. As equipes sabiam o que precisavam fazer e fizeram”, diz o empresário, em nítido tom de satisfação. Marion fala com orgulho sobre
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O EMPRESÁRIO | Odilo Pedro Marion Nascimento: 29 de junho de 1942, em Segredo (RS), que na época fazia parte do município de Sobradinho Pais: Santo Marion e Blondina Mainardi Marion Família: Eloisa Marion (esposa) – Odimara e Gustavo (filhos) Formação: mecânico (na prática), técnico em Contabilidade (Escola Técnica do Comércio – Colégio Santa Maria), Administração de Empresas (UFSM), Administração da Produção (pós-graduação na UFRGS) Prazeres: ler, escrever e (agora) descansar bastante
O GRUPO | Grupo Agrimec Fundação: 1974 Localização: Distrito Industrial de Santa Maria (RS) Composição: Agrimec, Acespeças, Intecsol e Idema Colaboradores: 450 Segmentos: Arroz irrigado, cana-de-açúcar, soja e milho, pastagem, café e feijão, florestal e orgânicos Portfólio: 126 modelos diferentes de implementos Produção: 1.242 máquinas por ano Exportação: 32 países
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a transparência na relação com as pessoas que trabalham no Grupo Agrimec. “Todos os colaboradores passam por mim durante as entrevistas do processo de seleção, pois precisam me conhecer. E deixo sempre a mensagem de que estou colocando a pessoa na empresa, mas é ela mesma que vai garantir sua permanência”, afirma o empresário, que diz receber por dia até dez fichas de cadastro de pessoas procurando emprego. Tal busca acaba sendo natural, pela relevância do Grupo Agrimec para o município de Santa Maria e seu entorno. Marion lamenta que não existam mais escolas de metalurgia na região, pois certamente haveria mais mão de obra capacitada e mais oportunidades.
INFÂNCIA INSPIRADORA Odilo Marion é natural de Segredo, cidade gaúcha que na época ainda era um povoado pertencente ao município de Sobradinho. Como grande parte dos colonos que viviam ali, seus pais, Santo Marion e Blondina Mainardi Marion, trabalhavam na lavoura. Quando o empresário nasceu, o pai trocou a lida na roça por um emprego na agroindústria que um irmão estava iniciando. Dona Blonda, forma carinhosa como sua mãe era chamada, seguiu no cultivo agrícola, até para cuidar da alimentação da família. Já maiorzinho, mas ainda criança, Marion não podia ficar em PLANT PROJECT Nº27
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foto: Divulgação
casa enquanto os pais estavam fora, como acontecia com seus irmãos, Dalilo e Áuria, já mais velhos. Acabava acompanhando o pai na agroindústria, onde se distraía com o giro de polias e o ronco das máquinas, como conta em sua autobiografia. Outro fato curioso relatado por Marion em seu livro é que, ainda na infância, aprendeu atividades como artesanato, confecção de redes de pesca, bordado e costura. Esta última, inclusive, lançou um pouco mais de luz sobre seu precoce interesse por mecânica, pois lhe chamava mais a atenção toda a sincronia daquele sistema do que a costura em si: o pedal da máquina acionava uma haste, que movimentava uma grande polia e, por meio de uma correia de couro, girava o mecanismo
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que fazia a agulha subir e descer através dos tecidos. Na adolescência, veio a relação direta com esse universo de polias, engrenagens, peças de metal. “Com 13 anos, meu pai me disse que eu precisava de um ofício, e me colocou na oficina mecânica”, diz Marion. A combinação entre curiosidade e criatividade, naquele ambiente, fez com que se diferenciasse ainda mais entre os garotos de Segredo. Se já costumava construir os próprios brinquedos, com o material disponível ali poderia ir muito além. “Uma vez ganhei uma bicicleta e a modifiquei toda. Botei sineta, luz, campainha, mola no assento, mola no eixo dianteiro, tudo com peças que sobravam ali dos automóveis”, comenta. As adaptações fizeram
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brilhar os olhos dos colegas, que também queriam incrementar suas “magrelas” com aqueles opcionais. “Me tornei um empreendedor. Há coisas nas bicicletas de hoje que eu já fazia há mais de 60 anos.”
PROFISSIONAL MULTIFUNÇÃO Marion foi para Santa Maria na época de prestar o serviço militar, e após a baixa no quartel tratou de procurar novas oportunidades na carreira de mecânico. Sem sucesso nessa busca, pelo menos naquele momento, acabou trabalhando como taxista até que retornasse à função desejada. Sempre priorizando a continuidade dos estudos, cursou contabilidade na Escola Técnica do Comércio, no Colégio Santa Maria, e depois se formou em administração pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). O objetivo, na verdade, era engenharia mecânica, mas não foi possível por se tratar de uma opção de período integral. O curso de administração era algo muito recente, tanto que antes da UFSM só havia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Marion lembra que os colegas taxistas costumavam questioná-lo, um tanto quanto incrédulos, sobre do que se tratava realmente aquilo e onde iria arrumar emprego. “Eu costumava responder a eles que iria criar meu emprego, e não procurar por ele”, diz.
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Entre as características que o industrial mais tem satisfação de comentar sobre si mesmo estão sua dedicação e seu comprometimento, em relação a tudo o que faz. Mas em especial sobre os estudos e o trabalho, ainda mais se estiverem conectados. “Sempre me dei bem nos estudos, e por conta disso me convidaram para lecionar na UFSM”, lembra o empresário, que foi indicado pelos próprios professores com quem teve aula. Além de mecânico, taxista, técnico em contabilidade e administrador, passou também a ser um mestre. E esse novo emprego se tornou um importante pilar para a trajetória que estava por vir.
O DESAFIO DE SER EMPRESÁRIO Criada por quatro sócios (contando com Marion), em 1974, a Agrimec recebeu esse nome como referência à expressão “agricultura mecanizada”, mas logo ganhou uma definição com apelo comercial mais forte: Agro Industrial Mecânica Agrimec Ltda. O objetivo inicial era industrializar um equipamento que iria revolucionar o controle de plantas invasoras no cultivo de soja, a capinadeira rotativa. Em seu livro, Marion conta que a inovação teria sido inventada “por um santa-mariense”, inclusive já com pedido de patente junto ao Instituto Nacional de da Propriedade Industrial (INPIInpi). Mas o PLANT PROJECT Nº27
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desenvolvimento do implemento foi todo dele, a partir de um protótipo que não chegou a funcionar por uma hora durante a demonstração. “Não desanimei, pois o conceito da máquina era ótimo, e eu acreditei nele.” A partir das pesquisas e melhorias realizadas por Marion, o equipamento ganhou diversas funções e o nome de Rotacarp. Além de limpar o terreno e impedir a ação das plantas daninhas, a máquina era robusta e versátil, superando desafios como galhos, cipós, pedras, torrões, chuva, entre outros. Diferentemente de seus sócios, o industrial mantinha uma intensa dedicação ao novo negócio, tanto administrativa e operacional quanto financeira. A sociedade não resistiu por muito tempo à tal incompatibilidade, ampliada pela falta de sintonia na forma como enxergavam a empresa. “Eram especuladores e imediatistas. Ficou mais fácil para mim quando saíram”, 58
comenta o industrial. Como qualquer novo empreendimento, foi preciso injetar recursos de toda ordem naquele início para que avançasse. “Durante muito tempo, sustentei a empresa com o salário da universidade e das extensões”, diz Marion. À época, além da UFSM, o empresário lecionava na Sociedade Educacional Três de Maio (Setrem), no município homônimo, que ficava a mais de 250 quilômetros de Santa Maria. Já sem os sócios lá do início, com a Agrimec transformada em sociedade anônima, e ainda pagando royalties pela invenção da Rotacarp, Marion se viu ameaçado por conta de algo que foi fundamental para que chegasse até ali: a inovação agrícola. Em meados dos anos 1970, o surgimento dos herbicidas tornou obsoleta a capina mecânica nos campos de soja e trouxe um sério risco de falência. Era preciso se reinventar de
novo e rapidamente. Um passo marcante naquele momento foi a quebra da patente da Rotacarp, o que reduziu os custos de maneira significativa, ainda mais por se tratar de um equipamento que já não traria rendimentos. Marion apertou o passo para ampliar o campo de atuação: surgiram a roçadeira de três lâminas e o para-choque tanque. Também passou a se dedicar ao segmento do arroz, o que abriu novos e valiosos caminhos. “Fui buscar mercados que me dessem mais oportunidades”, afirma o industrial, que agregou mais uma atividade a seu currículo para melhor atender o setor. “Me tornei agricultor, plantei arroz, trigo e soja durante dez anos e conheci também o lado dos produtores.” Essa visão privilegiada sobre a necessidade dos clientes colocou a Agrimec em uma posição de destaque. Mais do que dispor de seu próprio campo de teste para as
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inovações, Marion pôde realizar avaliações técnicas diretamente nas lavouras para combinar eficiência, performance e conforto a seus clientes. “Visito muito os campos, acompanho os protótipos nos testes práticos. Além das inovações, também melhoramos os equipamentos tradicionais”, diz o empresário, que destaca a linha de produtos para plantio direto da cana como exemplo dessa diversificação com base nas demandas do setor, dos agricultores.
FUTURO PROMISSOR A Agrimec enfrentou dificuldades em diferentes períodos, como as duas décadas entre os anos 1980 e 1990, com inflação, hiperinflação e até mesmo com um pedido de falência em 1999. Segundo Marion, trabalharam pela sobrevivência. “Vendíamos uma máquina e o dinheiro que recebíamos já não valia mais no dia seguinte. Economizamos tudo o que podíamos, acabamos atrasando títulos e tributos, mas saímos vivos dessa. Eu saí mais maduro da crise, mais experiente, criei mais demanda, se uma máquina não vendesse eu buscava outra opção”, recorda. De acordo com alguns índices apresentados pelo empresário, eles seguem bem vivos. Do ano 2000 para cá, o grupo já cresceu 75 vezes. Entre agosto do ano passado e junho de 2021, o efetivo das quatro empresas praticamente
dobrou. O faturamento geral no primeiro semestre deste ano foi 30% maior do que o registrado durante o ano passado inteiro. A maturidade na gestão tem ajudado a manter os pés no chão e a se preparar melhor para novas oscilações entre períodos positivos e outros mais difíceis. “Em 2013 e 2014, tivemos um voo muito bom, mas não esbanjamos nada, pois meu prazer está em empregar pessoas. Agora, calculo que teremos mais um ano nesse ritmo crescente, mas depois podem vir ondas de baixa. Então precisamos nos fortalecer, nos capitalizar para estarmos preparados”, analisa Marion, que tem na família um suporte poderoso para seguir em frente. A esposa, Eloisa, que o acompanha em todos esses passos, e os filhos, Odimara e Gustavo, que também trabalham no grupo.
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Interior da fábrica da Agrimec: em duas décadas, grupo cresceu 75 vezes
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A BELEZA DA PRODUÇÃO As flores das culturas agrícolas fascinam duplamente, pois além de encantarem pelas formas e cores, tão bonitas quanto curiosas, têm papel fundamental na reprodução das plantas e performance de lavouras e pomares Por Romualdo Venâncio
Cafezal no interior de SP: florada indica saúde da lavoura e potencial de produtividade PLANT PROJECT Nº27
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or mais rotineira que seja a vida no campo, por mais que se repitam atividades de manejo e cuidados com lavouras e pomares, dificilmente alguém deixa de se encantar com a chegada do período das floradas. Com o início da primavera, esse fenômeno se expande e se intensifica, e as fazendas ganham um novo brilho, tanto pela beleza da variedade de formas, cores e perfumes das flores que tomam conta das plantações, quanto pelo que elas representam. Floração é sinônimo de reprodução, de produtividade, de novas expectativas para uma safra cheia, robusta e lucrativa. E também uma confirmação de que o cultivo está bem cuidado, de que o solo está fértil e as plantas estão sadias. Confira agora alguns exemplos desse colorido especial e até curioso da produção agrícola espalhada pelo Brasil e pelo mundo. SOJA Quem vê a lavoura de soja no ponto de colheita, com a aparência de seca, não faz ideia da beleza dessas flores, que apresentam diversos tons de cor entre o branco e o roxo e medem entre 3 e 8 mm.
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ALGODÃO A flor do algodoeiro apresenta apenas cinco pétalas e inicialmente é branca. Depois de fecundada ela começa a mudar de cor, passando para rosa ou arroxeada
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CITRUS Uma forte característica das flores de citrus é que de maneira geral são muito perfumadas. Isso porque apresentam glândulas de óleos essenciais, que inclusive são utilizados para fins terapêuticos.
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BATATA Esta pequena florzinha com formato de estrela e apenas cinco pétalas mede entre 3 e 4 cm de diâmetro e pode apresentar diferentes tonalidades de cor, indo de branca a rosa, vermelha, azul e roxa. COUVE-FLOR Neste caso, a flor já vem no nome da planta e ela mesma é o próprio alimento. Inclusive proporcionando diferentes tipos de preparo: grelhada, refogada, gratinada...
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CAFÉ É uma felicidade para o produtor quando o cafeeiro fica todo branquinho, coberto de flores, quase uma planta ornamental. Alegria maior só quando elas começam a cair para dar lugar às cerejas. CACAU A flor do cacaueiro surge no tronco da planta, pois é nele que ficam os frutos. Dá até a impressão de que alguém as colocou ali, como fazem com orquídeas em árvores espalhadas pelas cidades.
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MARACUJÁ É considerada uma das flores mais bonitas entre as plantas frutíferas. Também é chamada de “flor da paixão”, por conta de uma analogia que se faz com a Paixão de Cristo. 66
ALHO-PORÓ Esta é uma flor bastante curiosa. Além de ser utilizada na culinária, para dar sabor e aroma, também é usada como enfeite, por conta de sua beleza bastante particular.
MAÇÃ As flores da macieira podem ser brancas ou rosadas, geralmente têm cinco pétalas e são hermafroditas. Isso mesmo, elas têm órgãos reprodutores masculinos e femininos.
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ABÓBORA Esta florzinha amarela também serve como alimento. Rica em fibras, cálcio e vitamina C, ela faz parte do grupo das Plantas Alimentícias Não Convencionais (Panc).
ABACAXI Esta é uma imagem bastante incomum para quem não lida com o cultivo da fruta. Até porque o próprio abacaxi lembra uma espécie de flor quando está começando a aparecer.
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LAVANDA Você pode ou não gostar do aroma da lavanda, mas é difícil não se encantar com um campo coberto por estas flores roxinha. Por isso lavandários são considerados pontos turísticos. PLANT PROJECT Nº27
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“Nossa sociedade e o meio ambiente clamam por cuidado real. E nós, como iniciativa privada e sociedade civil, temos papel de agente transformador nesse cenário de incerteza”
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Ideias e debates com credibilidade
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BIOECONOMIA: CAMINHO A SER TRILHADO POR MAURICIO HARGER*
Há mais de um ano e meio, o coronavírus veio para embaralhar as cartas que estavam em muitas mangas. Desfez planos, alterou rotas, desalinhou trilhos. E acelerou pautas que já eram urgentes antes da pandemia. Uma delas é o enfrentamento da escassez de recursos naturais e da degradação do meio ambiente, sobretudo pelas atividades industriais. Nossa sociedade e o meio ambiente clamam por cuidado real. E nós, como iniciativa privada e sociedade civil, temos papel de agente transformador nesse cenário de incerteza. A jornada não será fácil, mas temos como escolher a rota que desejamos trilhar. A bioeconomia é um dos caminhos para essa transformação. O consumo de produtos que utilizam matérias-primas sustentáveis não é apenas uma tendência, mas uma necessidade de sobrevivência da natureza e da humanidade. Países como a Alemanha já proíbem a comercialização de materiais plásticos que não sejam reciclados. O reaproveitamento de 100% dos resíduos decorrentes da nossa operação industrial, que origina mais de 15 produtos – como matéria-prima para produção de cimento, serragem para painéis de madeira, corretivo de pH do solo e fertilizantes orgânicos – e gera emprego e renda a mais de 70 famílias, é um exemplo de iniciativa de economia circular que adotamos em nossa unidade industrial. Em um grande projeto de bioeconomia recém-anunciado para modernização operacional da nossa unidade industrial de Guaíba (RS), que a tornará uma das mais sustentáveis do setor no mundo, estamos trabalhando para que
a celulose não funcione apenas como matéria-prima para produtos já conhecidos ou mera fonte de receita. Os processos que serão implementados permitirão ganhos consideráveis para o meio ambiente e para a sociedade. A lignina, conhecida como licor negro, material excedente do processo de cozimento da celulose, é utilizada na geração de energia elétrica, fazendo com que sejamos autossuficientes em produção energética. O excedente desse processo é comercializado à rede pública de energia, de modo que geramos anualmente energia capaz de abastecer um município de 50 mil habitantes por um ano. A lignina, de forma geral, também começa a ser explorada no mercado para outros fins, podendo ser convertida em plástico durável para ser utilizado em aparelhos celulares, painel de automóveis e muitos outros equipamentos. Já a celulose como um todo tem inúmeros usos e ainda pode se desdobrar na nanocelulose e na celulose solúvel – esta para indústria têxtil –, com a possibilidade de aumentar de 40 itens utilizados no cotidiano de uma família que tem como base essa matéria-prima para mais de mil itens confeccionados a partir dela. Com as medidas de gestão e controle ambiental do BioCMPC, continuaremos sendo uma empresa zero resíduos, mas diminuiremos consideravelmente o volume de material gerado (composto químico originado na caldeira de recuperação) e eliminaremos 100% os resíduos de cinzas. Para a região de Guaíba, durante as obras está prevista a criação de cerca de 7,5 mil novos postos de trabalho e a meta de atuar com cerca PLANT PROJECT Nº27
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de 50% dos fornecedores com base na localidade, tornando esse o maior investimento em ESG em todo o Rio Grande do Sul. Muitos outros ganhos estão por vir, entre eles o desligamento da caldeira de força a carvão, com redução prevista de 60% em emissão atmosférica, e um espaço digital para acompanhamento da performance ambiental da empresa. Ter um compromisso com o coletivo e o meio onde se está inserido, com
propostas robustas para a redução de ocorrências de eventos que gerem incômodos à comunidade e com melhores estratégias de governança socioambiental, é fundamental para uma retomada que gere e impulsione mudanças. Tomar os ensinamentos atuais que a pandemia nos trouxe e direcioná-los à construção de uma economia mais do que sustentável, uma verdadeira bioeconomia, é crucial para alcançar um futuro mais promissor para todo o planeta.
*Diretor-geral da CMPC no Brasil. Formado em Engenharia Mecatrônica pela PUC de Minas Gerais, com MBA em Gestão Estratégica de Negócios pelo ITA-ESPM e especialização em Finanças Avançadas pelo New York Institute of Finance.
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Viveiro com mudas de plantas de guaraná na Fazenda Santa Helena: Cultivo sustentável em harmonia com a floresta
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As regiões produtoras do mundo
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As regiões produtoras do mundo
UMA FAZENDA DE GUARANÁ NO CORAÇÃO DA FLORESTA Com produção própria de mudas e trabalho dedicado ao melhoramento genético, Guaraná Antarctica completa 100 anos como modelo de produção sustentável do fruto nativo da Amazônia
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Por Daniany Andrade
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m século do refrigerante tipicamente brasileiro. De cor e sabor bem característicos, o Guaraná Antarctica chega a essa marca histórica com a vitalidade de quem sempre inovou. Muda o formato, o tamanho, o rótulo, o jingle… No entanto, algumas coisas não mudam. A tradição também é ingrediente essencial nessa trajetória. Há 100 anos é do fruto original da Amazônia que sai a bebida que se tornou símbolo do Brasil. Todo guaraná usado na fabricação sempre foi colhido e torrado artesanalmente na região. “Nossos produtos são de fontes naturais, e mais do que isso, são locais”, disse o vice-presidente de sustentabilidade e suprimentos da Ambev (dona da marca), Rodrigo Figueiredo. Foi com foco no
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desenvolvimento sustentável, local e também no melhoramento genético do guaranazeiro, que a empresa iniciou uma produção própria em 1971, na Fazenda Santa Helena, em Maués, no coração da floresta amazônica, há 267 km da capital, Manaus. Conhecido como a “Terra do Guaraná”, o município tem raízes indígenas. O nome, Maué ou Mawé, tem origem na língua tupi, e é como são chamados os povos da região, os Sateré-Mawé, conhecidos como os precursores do cultivo da planta do guaraná. Foi observando os índios Maués, em 1669, que o padre João Felipe Bettenford “descobriu” o guaraná. Ele viu que os índios amassavam o fruto em uma cuia e bebiam. Dessa forma tinham força e ficavam sem fome o dia inteiro. Além
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famílias produtoras de guaraná, que utilizam predominantemente mão de obra familiar e possuem, em média, 3 hectares de guaraná. A maioria possui baixa escolaridade e faz pouco uso das tecnologias existentes para a cultura”, conta a gerente agronômica da fazenda, Miriam Frota. “Nos últimos anos, com os trabalhos desenvolvidos, temos melhorado a organização dos produtores, a fim de fortalecer suas representatividades e lucro na comercialização da produção, com a venda direta. Além de buscar novos produtos e mercados a partir de certificações orgânicas e selo de Indicação Geográfica – IG”, destaca ela.
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disso, o guaraná também era usado de forma medicinal. O consumo diário do fruto é uma tradição até hoje. E muitos apontam esse hábito como responsável pela elevada longevidade dos habitantes do município. Há estudos que mostram que a cidade tem o dobro da média nacional de idosos com mais de 80 anos. Portanto, não foi por acaso que a região foi escolhida como base para a fazenda da Ambev, que é referência na produção de guaraná e é considerada o maior banco genético do fruto. Isso porque o foco da propriedade é o desenvolvimento agronômico e genético da planta. “Faz parte do nosso negócio entender a cadeia”, destaca Figueiredo. Na última década, os novos cultivos registraram aumento de 140% na produtividade do fruto sem aumentar a área de plantio, segundo dados da fazenda. A atividade principal é a produção de mudas para os 2 mil produtores locais – de Maués e de municípios do entorno – que cultivam o fruto. Por ano, cerca de 50 mil mudas, com maior potencial de produção e resistência a pragas, são distribuídas aos agricultores parceiros da empresa, os principais responsáveis pela matéria-prima usada na fabricação do Guaraná Antarctica. Apenas 10% da demanda é colhida na Santa Helena. “Em Maués, são mais de mil
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Porteira da fazenda e o beneficiamento dos frutos: cultivo gera impacto para mil famílias da região
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O DIA DO GUARANÁ Guardada pela exuberância da floresta amazônica, a fazenda tem 1.070 hectares de extensão. Cerca de 80% dessa área é de preservação e os outros 20% são destinados ao cultivo de mudas, desenvolvimento de novas variedades e à produção do guaraná. Números que
demonstram a preocupação com a sustentabilidade e a conservação da biodiversidade. “A melhor forma de evitar o desmatamento é promover o desenvolvimento local”, reforça Figueiredo. Por isso, além de fornecer mudas de qualidade aos produtores, a empresa também promove treinamento e capacitação sobre as melhores práticas de cultivo. Uma das principais ações organizadas pela marca é “O Dia do Guaraná”. Celebrada anualmente no município desde 1998, a data é marcada por comemorações e capacitação técnica. “Nesta ocasião, o Guaraná Antarctica convida os produtores agrícolas, técnicos e instituições voltadas ao setor rural de Maués para apresentar as técnicas desenvolvidas pela marca em nossa fazenda para aprimorar o cultivo do fruto”, conta Miriam. Por muito tempo o evento foi realizado no período próximo à safra. Depois passou a ocorrer no início do ano, entre janeiro e fevereiro. “Assim, podemos repassar orientações sobre manejo dos novos plantios aos produtores que estão recebendo as mudas, trocar experiências da última safra, comemorar os resultados e ainda propor ações aos desafios da cultura ao longo do ano”, explica a gerente da Santa Helena. Com a pandemia, o evento foi suspenso, mas as orientações pontuais aos produtores
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continuaram sendo feitas. “O Dia do Guaraná” vai voltar a ser comemorado em 2022. Outras ações de capacitação são realizadas com parceiros institucionais locais de assistência técnica, de pesquisa e de extensão rural, como o Instituto de Desenvolvimento Agropecuário e Florestal Sustentável do Estado do Amazonas (Idam), a Universidade Federal do Amazonas, e a Embrapa Amazônia Ocidental. “Desde 1985 nosso principal parceiro para melhoramento genético é a Embrapa, desenvolvendo pesquisas para
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Figueiredo, da Ambev: “Faz parte do nosso negócio entender a cadeia”
escolha dos melhores materiais genéticos a serem reproduzidos. Alguns experimentos são conduzidos dentro da Fazenda”, afirma Miriam. Como resultado das pesquisas realizadas na Fazenda Santa Helena, pode-se citar a origem da variedade BRS-Maués, considerada uma das melhores variedades da planta, de acordo com o Sistema de Produção da Embrapa. Com o objetivo de promover o desenvolvimento socioeconômico da região, a Ambev também atua em ações e parcerias em outras áreas. Em 2017, foi criada a Aliança Guaraná de Maués, uma rede de parceiros
com uma meta em comum: melhorar a qualidade de vida da população. Grupos de trabalho para desenvolver atividades relacionadas ao turismo, educação, produção sociocultural e sustentável surgiram como resultado. “Tudo para que a comunidade evolua e cresça, valorizando sempre sua cultura e biodiversidade”, destaca a gerente agronômica. Dessa forma, o guaraná se consolida como importante agente de transformação social, ambiental e econômica. Tripé que, como já sabemos, é essencial para o futuro da floresta amazônica. PLANT PROJECT Nº27
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SUA REDE DE
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Sede da Bodega Oceânica, no Uruguai: Vinhos feitos em terroir com maresia
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A grande feira mundial do estilo e do consumo
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A grande feira mundial do estilo e do consumo
Lote de garrafas armazenadas no fundo do mar, a 14 metros de profundidade: “Sabor delicado e sofisticado” 82
VINHOS AO MAR O interesse por inovações e a proximidade com o Oceano Atlântico levaram os fundadores da Bodega Oceánica José Ignacio a um mergulho em novas possibilidades Por Romualdo Venâncio | Fotos Divulgação
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m novembro de 2020, Natalia Welker e Marcelo Conserva deram um novo passo na evolução da Bodega Oceánica José Ignacio, uma vinícola boutique fundada pelos dois em Maldonado, no Uruguai. Na verdade, não foi exatamente um passo, foi um mergulho – no Oceano Atlântico, a menos de 20 quilômetros da propriedade. O casal já vinha conquistando espaço com rótulos refinados e decidiu agregar mais valor à produção e oferecer ao público uma nova experiência a partir de uma armazenagem não convencional. Um lote de 120 garrafas de seus vinhos rosé – uvas albariño e tannat – foi
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lançado ao mar, dentro de uma gaiola de aço inoxidável, a uma profundidade de 14 metros e a um quilômetro da costa. O período ainda é de pesquisa e experimentação, mas as provas vêm agradando até o momento. “Os resultados estão sendo excelentes”, comenta Natalia, que é a CEO da empresa. As primeiras retiradas de garrafas, com 45, 75 e 180 dias após a armazenagem, mostraram certa singularidade. “São muito mais delicados, mais sofisticados”, diz Natalia, acrescentando que o diferencial vai além do aspecto sensorial, de aroma e paladar com uma taça nas mãos. “As garrafas cobertas
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de corais são verdadeiras obras de arte.” A ideia é que cada garrafa conte a história por trás desse vinho e revele a essência da empresa como um todo, e que dessa forma possam agregar valor ao produto. O projeto de armazenagem dos vinhos no oceano, batizado de Ultramar, resulta de uma série de pesquisas da empresa. Segundo Natalia, foi formada uma equipe de trabalho específica para lidar com essa inovação, que levou alguns meses de estudo até definir qual seria o modelo ideal de gaiola e como as garrafas seriam armazenadas. Também foi preciso avaliar as questões legais para utilizar o fundo do mar como adega, tanto que o local onde ficam as garrafas é identificado e apenas mergulhadores profissionais têm acesso. “Foi necessário averiguar com as autoridades uruguaias se já havia algo assim no país. E não havia, o que tornou o Ultramar ainda mais desafiador, pois cada decisão, cada passo, exigia muita investigação”, conta Natalia. Esse levantamento amplo e detalhado também leva a empresária a acreditar que a José Ignacio seja a primeira vinícola da América do Sul a adotar uma cave submarina. “Sabemos que há outros exemplos pelo mundo, como na Espanha e nos Estados Unidos.”
EXTENSÃO DO TERROIR A propriedade de Natalia
e Marcelo tem 52 hectares, dos quais 23 são dedicados ao plantio de oliveiras e somente 8 destinam-se às uvas. A produção de azeites veio primeiro, dando origem à linha O’33. Mas a de vinhos já estava no projeto desde o início. “Só precisávamos de mais tempo para poder avançar com a implementação da Bodega Oceánica José Ignacio. Inicialmente, plantamos 3 hectares com vinhedos, e preparamos os outros 5 hectares para ampliação”, diz Natalia. O primeiro rótulo da vinícola a entrar no mercado foi o Pinot Noir Rosé, “um vinho fresco e mineral”, como descreve a produtora. “É um vinho muito elegante e equilibrado, que pode ser apreciado em diversas combinações.” A proximidade com o Oceano Atlântico já garante um terroir diferenciado, por conta do solo composto por areia, limo e argila, e consequentemente características únicas aos vinhos que saem dali. Além disso, a região tem clima quente e temperado, com temperatura média de 16,5 °C, oferecendo uma boa amplitude térmica durante o período de amadurecimento da uva. Com todos esses pontos favoráveis, por que o casal ainda precisaria investir em um armazenamento submarino? A resposta acabou sendo outra pergunta: E por que não? Natalia diz que estão sempre em busca de inovações para produzir, e quando souberam
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Natalia, Marcelo e momentos do projeto Ultramar: pesquisa e inovação em um setor tradicional
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de algumas descobertas submarinas começaram a pensar no assunto. Juntaram o fato de que deixar o vinho descansar após o engarrafamento é uma prática muito comum e a proximidade com o Atlântico. “Se estamos tão perto do oceano, por que não usá-lo como cave para experimentar vinhos do fundo do mar?”, questiona. Segundo ela, os vinhos armazenados no mar apresentaram um desenvolvimento mais rápido do que aqueles guardados em caves tradicionais. Embora não seja comum, o processo de envelhecimento de vinhos no fundo do mar já vem sendo utilizado – e rendendo notícias – por causa de algumas condições que favorecem o processo de maturação da bebida. No armazenamento submarino, dependendo da profundidade em que as garrafas são guardadas, a temperatura 86
é constante, com graduação benéfica ao vinho. Assim como a luminosidade ideal e a pressão marítima, outras características benéficas ao processo. Há quem afirme que dentro do mar já ocorra naturalmente a necessária movimentação das garrafas, o giro para manter a bebida em contato com a rolha.
EXPERIÊNCIA FAZ DIFERENÇA Toda a produção de vinhos da José Ignacio é realizada sob o olhar técnico de Hans Vinding Diers, especialista que já nasceu em uma região vinícola: Stellenbrosch, na África do Sul. “Ele está conosco desde que começamos, e é quem toma as decisões em relação aos vinhos. Sua maior contribuição é que consegue interpretar a essência da fruta e trazer à tona o melhor de cada uva”, comenta Natalia. Para se ter ideia da vivência de Hans Diers com o segmento, ainda na infância
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se mudou com a família para Bordeaux, cidade francesa conhecida como a “capital do vinho”, e cresceu em meio à vinícola de seu pai. O especialista passou ainda por Itália e Austrália e, em 2021, chegou à América do Sul, mais precisamente na Patagônia argentina, onde fundou a Noemía, uma vinícola biodinâmica. São dezenas de safras de experiência, atuando em quatro continentes, que garantiram ao enólogo uma visão única sobre a produção de vinhos. Essa larga experiência foi primordial para que os vinhos da José Ignacio conquistassem o público uruguaio a partir dos restaurantes e das lojas especializadas, as “vinotecas”. Também são comercializados pelo site da empresa e em supermercados específicos. Hoje, a produção anual da vinícola, que tem sede em Montevidéu, sob o nome de Casa O’, é de 90 mil garrafas de vinho, incluindo todas as variedades, tanto dos tintos (merlot, pinot noir e tannat) quanto dos brancos (albariño e chardonnay). E a ideia é seguir como uma vinícola boutique, que prioriza a qualidade ao volume. Da mesma forma com o azeite virgem, cuja produção chega a 40 mil litros. Em fevereiro deste ano, Natalia foi convidada para compartilhar a história de sua empresa, como case de sucesso de novas gerações, no evento Field Days NZ + UY, uma já tradicional
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parceria entre Nova Zelândia e Uruguai, promovido pela New Zealand Trade and Enterprise, a agência neozelandesa para o desenvolvimento de comércio internacional. A equação que reúne o espírito inovador do casal Natalia e Marcelo, a experiência de Hans Diers, os vinhos que surgem dessa parceria e todo o ambiente em torno dessa produção também abrem espaço para o enoturismo. A José Ignacio abre suas portas para receber o público em visitas à propriedade, passando tanto pelos vinhedos quanto pela vinícola. E é somente nessas oportunidades, quando o público desfruta do convidativo ambiente da vinícola, que se pode provar o Ultramar. Essa experiência acabou se tornando um privilégio dos uruguaios durante a pandemia da Covid-19, pois as restrições em relação a doenças impactaram a participação de estrangeiros na programação de visitas.
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O TEMPLO SAGRADO DOS “BRUTOS” Uma viagem pela evolução dos caminhões: é o que oferece o primeiro museu destinado a esses veículos pesados do Brasil Por Irineu Guarnier Filho, de Canela (RS) Fotos Eduardo Scaravaglione
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nipresente nas estradas brasileiras, mas também nas entregas de mercadorias nas grandes cidades, o caminhão é um dos mais antigos e persistentes símbolos do desenvolvimento nacional. Mais de 60% das mercadorias que circulam pelo Brasil – incluindo as safras agrícolas – são transportadas por cerca de 2 milhões de caminhões, que não raramente entregam suas cargas na porta do cliente. Coisa que nem trens nem aviões e muito menos navios conseguiriam fazer. Não por acaso, os caminhoneiros são a única
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categoria de trabalhadores capazes de, literalmente, parar o País. Com toda a importância que esse veículo tem, curiosamente não havia, até bem pouco tempo, nenhum museu brasileiro dedicado à preservação dessas máquinas. Colecionadores particulares existem, mas não são muitos – a restauração de um caminhão custa caro e o acervo exige muito espaço. Acessíveis ao público, por isso, são raras as coleções desse tipo. Desde outubro de 2020, no entanto, os “brutos” ganharam um verdadeiro templo para exibir
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seus “músculos” e imponência: o American Old Trucks. Localizado em um belo trecho da ERS-466, às margens do Bosque Sinosserra, em Canela, na Serra Gaúcha, a mais nova atração do Grupo Dreams (proprietário de outros museus automotivos, como o Hollywood Dream Cars, na vizinha cidade de Gramado) foi inaugurada em meio à pandemia e recebe grupos de aficionados e turistas com todos os cuidados sanitários que o momento exige. O American Old Trucks mantém em exibição permanente 53 caminhões e 11 picapes de diversas épocas, além de um ônibus double deck londrino, em um pavilhão coberto de 3.200 m2. O caminhão mais antigo é um Ford 1946, e o mais moderno, um Volvo 1994. Impecavelmente restaurados pelos proprietários nos últimos 30 anos, os veículos contam a história do transporte rodoviário de cargas no Brasil, nos Estados Unidos e na Europa. Alguns desses modelos, como o brasileiríssimo FNM, o Mercedes “Bicudinho” ou o Scania “Jacaré”, foram o ganha-pão de muitas famílias ou a base de grandes transportadoras atuais, como lembra o curador do museu e também chefe de equipe da Fórmula Truck, Tony Martinez. Algumas das marcas são bem conhecidas dos brasileiros, como Volvo, Ford, Mercedes e
Scania, mas há também modelos raros de fabricantes pouco conhecidos no Brasil, como os alemães Bussing 600 1954 e Magirus-Deutz S3500 bombeiro 1951, um Mack DM800 1971, que trabalhou na construção da Usina de Itaipu, ou o gigante norte-americano Kenworth 523 1950. “Muita gente que vem aqui fica emocionada, porque trabalhou com um caminhão ou porque o pai teve um”, conta Martinez, que se surpreendeu com o interesse de um público bastante heterogêneo pelos pesospesados de vários eixos: crianças, mulheres e mesmo profissionais liberais que jamais subiram a uma boleia se encantam com as máquinas coloridas e repletas de cromados. Para este público, há ainda uma loja de suvenires, uma cafeteria e uma divertida
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O lendário FNM e outras pérolas da estrada: restauração de um veículo pode chegar a R$ 300 mil
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W Memória Ford 1946: modelo mais antigo da coleção com 53 caminhões e 11 picapes
pista de truckmodelismo, com caminhões em escala 1/14 radiocontrolados. Os turistas também podem fazer selfies no mockup de uma moderna e espaçosa cabine de caminhão. E logo o museu poderá contar com uma oficina de preparação de caminhões de corrida da equipe Dream Racing. Diferentemente de automóveis antigos, que podem eventualmente ser encontrados com baixas quilometragens e bem cuidados, caminhões são máquinas que rodam bastante e geralmente viram ferro-velho ao final de uma longa vida de trabalho duro. “Caminhão é uma ferramenta que sofre muito”, diz Martinez. Garimpar essas preciosidades e devolverlhes o brilho e a originalidade
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de quando saíram da fábrica é um trabalho que exige tempo, conhecimento, paciência e um bom saldo bancário – uma restauração de cabo a rabo, como as feitas pelo American Old Trucks, pode custar até R$ 300 mil. Um dia inteiro pode ser pouco para um aficionado da história do transporte rodoviário de cargas conhecer tudo o que o museu de Canela exibe. Chama a atenção, por exemplo, a evolução das cabines: antes apertadas e desconfortáveis, atravancadas por enormes volantes, hoje são amplas e oferecem muito mais conforto e segurança aos motoristas – principalmente pela incorporação da tecnologia digital. “Um caminhão moderno
é mais sofisticado do que qualquer automóvel de luxo”, compara Martinez. Se, no passado, era preciso ter muita força muscular para dirigir um veículo de dezenas de toneladas, hoje, com direções hidráulicas, freios a ar e muita assistência eletrônica, qualquer pessoa – devidamente habilitada – pode conduzir um bruto de mais de 50 mil quilos pelas estradas do Brasil. Sim, caminhões autônomos já rodam por rodovias norteamericanas e europeias. Provavelmente esse seja o futuro do modal rodoviário. Mas, para quem ama essas máquinas, o reencontro com os reis das estradas de tempos passados é uma experiência insuperável.
Cena da HQ Estórias Gerais, de Flavio Colin: Mestre do gênero no Brasil usou os temas nacionais para criar uma obra que ganhou o mundo
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Um campo para o melhor da cultura
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O BRASIL NO TRAÇO DE UM MESTRE DAS HQS O relançamento de Estórias Gerais e de outras obras ilustradas por Flavio Colin dá fôlego ao reconhecimento tardio de um pioneiro dos quadrinhos que sempre defendeu os autores e temas nacionais, do folclore amazônico aos causos do sertão mineiro Por André Sollitto
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ono de um traço aparentemente simples, estilizado, mas capaz de transpor para as páginas dos quadrinhos uma enorme variedade de histórias, o carioca Flavio Colin (1930-2002) é um dos mestres da nona arte no Brasil. Ao longo de quase 50 anos deixou uma vasta produção, que passeia por gêneros como o romance histórico, a aventura e o terror. No topo de uma extensa lista de obras-primas está Estórias Gerais, uma coleção de contos ambientados no sertão mineiro da década de 1920. Fora de catálogo há alguns anos, ela está prestes a voltar às livrarias em uma republicação feita pela editora Conrad. O projeto foi idealizado pelo roteirista da HQ Wellington Srbek e oferece uma oportunidade para que o Brasil atual conheça o trabalho de Colin, que serve de referência para muitos quadrinistas contemporâneos. Srbeck, por exemplo, conta que havia acabado seu mestrado em história na UFMG e sentia vontade de escrever ficção. Uma obra sempre retornava a seus pensamentos: Grande Sertão: Veredas, de João Guimarães Rosa. “Na época, também li Morte e Vida Severina, de João Cabral de Melo Neto, e Auto da Compadecida, de Ariano Suassuna. Esses grandes clássicos de nossa literatura me fizeram imergir no Brasil interior, com sua narrativa de personagens e ambientes únicos”, diz Srbek. O roteirista rascunhou as ideias iniciais e mergulhou em uma pesquisa sobre o norte de Minas na década de 1920, lendo jornais da época. Fez o roteiro e convidou Colin para desenhar. A obra foi publicada pela primeira vez em 2001 e depois saiu
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em nova edição pela Conrad, em 2007. Teve ainda outra versão, pela editora Nemo, antes de retornar à Conrad para a reedição em homenagem aos 20 anos. O relançamento de Estórias Gerais faz parte de uma leva de títulos do mestre das HQs que retornam ao mercado. A editora Figura prepara uma edição de As Aventuras do Anjo, série da década de 1950 que deu início à carreira do artista. As HQs eram uma adaptação do seriado de TV, e a versão que sai agora é a reprodução de um dos gibis, O Lenhador Maldito, de 1959, sem os retoques gráficos, mostrando a arte de Colin em seu estado mais “bruto”. É voltada principalmente para pesquisadores e interessados em compreender o processo criativo do desenhista. Outro volume é Terror no Inferno Verde, da editora Pipoca & Nanquim, uma coletânea de histórias que vão do terror ao erótico, sempre com inspiração em contos e lendas brasileiras. Essa profusão de reedições marca um novo momento do reconhecimento tardio do trabalho do quadrinista. “Colin foi o maior desenhista da história dos quadrinhos brasileiros e um dos grandes gênios dos quadrinhos mundiais, que não foi devidamente reconhecido e valorizado em vida”, afirma Srbek. No início da carreira, quando desenhava adaptações de seriados populares, como Vigilante Rodoviário, Colin mostrava uma influência de artistas estrangeiros, como Chester Gould, autor de Dick Tracy, e Milton Caniff (de Terry e os Piratas). Logo encontrou seu próprio estilo e passou a lutar pela valorização das HQs brasileiras – não apenas aquelas produzidas por artistas nacionais, mas que abordassem temas regionais.
Chegou a se afastar da produção de quadrinhos na década de 1960, quando a ditadura no Brasil se tornou mais agressiva, e trabalhou na publicidade durante 12 anos. Mas voltou à nona arte. “Deixar a publicidade e retornar aos quadrinhos foi um desastre financeiro e moral, porque a família se voltou contra mim (com justa razão)”, escreve Colin em uma espécie de diário, datado de 1997 e publicado na edição de Caraíba, dez anos depois. Mas Colin tinha um objetivo em mente. Ele se debruçou sobre lendas, histórias folclóricas, guerras e outros movimentos históricos. “O que obras como Estórias
Gerais fazem é traduzir para linguagens artístico-literárias um Brasil interior, quase mítico, de um passado com personagens, ambientes e cultura absolutamente singulares”, afirma Srbek. É um trabalho de valorização da nossa cultura. “Nosso País é vasto, coberto de panoramas deslumbrantes, tipos humanos e costumes dos mais variados. E, milagrosamente, nesse Brasil continental, todos falamos a mesma língua. Quantas histórias, lendas, ‘causos’, dramas e comédias vividos e narrados por nosso povo! ”, escreveu Colin. Nem sempre foi fácil. “Endeusamos e copiamos tudo o que é estrangeiro, mormente norte-americano. Tudo, menos o patriotismo, o nacionalismo deles. Lá, é primeiro nós, depois, os outros. No Brasil é o contrário”, escreveu. O desenhista era um crítico da quantidade de material que vinha de fora e era publicado pelas editoras daqui, tirando oportunidades de artistas brasileiros. E sofreu financeiramente, aceitando trabalhos com remuneração inferior ao que merecia. Mas a batalha de Colin deu frutos. Muitos dos autores mais respeitados da cena atual de quadrinhos nacionais, que começaram a carreira na década de 1990, foram influenciados pela produção de Colin, principalmente do ponto de vista temático. Há também diversas editoras que passaram PLANT PROJECT Nº27
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Colin e duas de suas obras: "Considero as HQs uma missão"
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a olhar para o que é feito aqui. “Nunca houve uma produção nacional tão grande”, afirma Cassius Medauar, editor-chefe da Conrad. “Tem muita gente vivendo de quadrinhos. Houve uma enorme evolução mercadológica. Tem muita diversidade nas HQs nacionais: discussão de problemas raciais, temática LGBTQIA+, todo tipo de brasileiro fazendo quadrinhos. E o leitor percebeu que é mais interessante ler uma obra autoral do que um HomemAranha genérico”, diz Medauar. A variedade a que ele se refere é, de fato, muito grande. Há interpretações do cangaço, de Bando de Dois, de Danilo Beyruth, à versão cyberpunk Cangaço Overdrive, de Zé Wellington e Walter Geovani. Tungstênio, de Marcello Quintanilha, premiada no exterior, aborda crimes ambientais cometidos em Salvador e como eles afetam a vida de pessoas normais. Beco do Rosário, de Ana Luiza Koehler, aborda a modernização da cidade de Porto Alegre nos anos 1920. A Viola Encarnada:
Moda de Viola em Quadrinhos, de Yuri Garfunkel, usa o repertório caipira para falar do interior do País. Angola Janga, de Marcelo D’Salete, fala de Palmares, de como a rebelião se tornou uma nação com população comparável à de grandes cidades brasileiras da época. Jeremias – Alma, de Rafael Calça e Jefferson Costa, parte do clássico personagem de Mauricio de Sousa para falar de ancestralidade. E isso é só o começo. Quem quiser mergulhar ainda mais no trabalho de Colin consegue encontrar, sem tanto esforço, outros títulos. É o caso de Caraíba (ed. Desiderata), uma reunião de três histórias do personagem-título escritas e desenhadas pelo artista. Após um encontro com o Curupira, o caçador abandona a antiga ocupação e se torna um defensor da floresta e passa a combater o tráfico de animais, as queimadas e a caça predatória. Outra é Fawcett, escrita pelo roteirista André Diniz, sobre a fracassada expedição do arqueólogo britânico Percy Fawcett em busca de uma civilização perdida no Mato Grosso. Há ainda Fantasmagoriana, histórias de terror com sotaque brasileiro escritas por Srbek. “Considero as HQs uma ‘missão’”, escreveu Colin. “E como todo bom missionário, dedicado e tenaz, acredito que, um dia, através delas, o Brasil será mais brasileiro.”
Projeção dos futuros Laboratórios Criativos da Amazônia (LCA): Biofábricas levarão tecnologia sustentável para o coração da floresta
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REVOLUÇÃO AMAZÔNICA O Projeto Amazônia 4.0 é o ponto de partida para a implementação de uma bioeconomia baseada na floresta em pé e na agregação de valor aos produtos da floresta, promovendo o desenvolvimento socioeconômico da região Por Romualdo Venâncio | Fotos Divulgação/Marko Brajovic
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magine se produtores de cacau da Amazônia conseguissem, ao invés de apenas fornecer castanhas como commodity, oferecer algo diferenciado, comprovadamente sustentável, com qualidade elevada e padronizada, com rastreabilidade e cumprindo todas as exigências em relação à utilização de água nesse processo. Haveria grandes chances de o mercado responder com uma remuneração mais alta. Por consequência, esse valor agregado tornaria a atividade mais rentável e competitiva, estimulando a evolução dos agricultores e a manutenção da floresta e de seus serviços ambientais. Este cenário pode deixar de ser hipotético a partir do projeto Amazônia 4.0, iniciativa que tem o objetivo de promover a bioeconomia a partir de biofábricas para o beneficiamento de produtos agrícolas como cacau e cupuaçu, inicialmente. A meta principal desse projeto é desenvolver um novo modelo de economia na Amazônia que mantenha a floresta em pé, para garantir os serviços ambientais prestados pelas
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árvores. Segundo Antonio Donato Nobre, cientista do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPEInpe), uma árvore grande, frondosa, com uma copa de 20 metros de diâmetro, chega a colocar mais de 1 mil litros de água na atmosfera em um dia. “Ela vai buscar água no lençol freático, a 50 ou 60 metros de profundidade. E suas folhas são estruturas fantásticas de evaporação”, explica. Esse processo, que contribui para a formação do fenômeno de “rios voadores”, acaba influenciando o volume de chuvas em regiões distantes dali, como o CentroOeste e o Sudeste, inclusive em áreas de grande produção agropecuária. O projeto é baseado na implementação de unidades de pesquisa chamadas de Laboratórios Criativos da Amazônia (LCAs). São estruturas modulares, com cerca de 50 metros quadrados, que podem ser montadas, desmontadas e transportadas – de barco, caminhão e avião – para serem instaladas em quaisquer outros lugares da região. Desenhadas pelo arquiteto
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e designer Marko Brajovic, esses laboratórios terão toda a estrutura necessária para serem utilizados como biofábricas, para o desenvolvimento dos produtos com valor agregado, e como ponto de capacitação dos agricultores. A ideia é que sejam criadas condições para que o público atendido siga depois por conta própria. “Não temos a pretensão de fabricar produtos, queremos oferecer os equipamentos e o conhecimento para que eles sejam independentes”, diz Ismael Nobre, que é biólogo, doutor em Dimensões Humanas em Recursos Naturais e colíder do Amazônia 4.0. Como o próprio nome do projeto sugere, a iniciativa segue o conceito da indústria 4.0, combinando diversas e modernas tecnologias, como computação em nuvem, automação industrial, inteligência artificial, impressão 3D, blockchain, entre outras. Pegando o cacau como exemplo, no processo bean-to-bar, ou seja, da semente à barra de chocolate, será possível ajustar até a curva de torra das amêndoas para extrair o melhor de cada matéria-prima e, assim, atender demandas específicas de acordo com padrões internacionais. O ponto de torra tem forte impacto no sabor final do chocolate e, de maneira geral, esse controle é feito em fornos manuais. No LCA é tudo automatizado, e esse monitoramento é feito realizado
por sensores de temperatura que alimentam o software responsável por manter o calor no nível correto. Um diferencial importante é que isso tudo pode ser feito em qualquer escala de produção, o que favorece a inclusão dos pequenos produtores. “Nesse conceito 4.0, as máquinas podem ser feitas por outras máquinas, adequadas ao tamanho de cada propriedade e à capacidade de cada família”, afirma Ismael. Uma vez que a padronização está garantida, pode-se alcançar boas negociações mesmo que sejam diversas unidades produtivas com volumes menores, pois a comercialização acontece feita de forma coletiva, como uma cooperativa.
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Estruturas modulares desenvolvidas pelo arquiteto Marko Brajovic para os LCAs e o biólogo Ismael Nobre (abaixo): conhecimento ao alcance da população da Amazônia
AGROCIÊNCIA PARA FLORESTA O projeto Amazônia 4.0 é resultado de estudos científicos que vêm sendo desenvolvidos
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Visão do interior de um dos módulos e da captação de energia solar
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há anos, com profissionais de diversas áreas, sob a liderança do climatologista Carlos Nobre. “Ele foi o primeiro cientista a instalar torres para avaliaranalisar o sequestro de carbono e avaliar essa melhoria do clima”, comenta Ismael, deixando transparecer o orgulho pelo trabalho de seu irmão. Ele acrescenta ainda que as ciências climáticas mostraram que as áreas protegidas por lei não eram suficientes para manter a floresta, tanto a biodiversidade quando quanto os serviços ambientais. “Em 30 anos de muitos estudos, não havia realmente um projeto que trouxesse desenvolvimento natural, com retorno financeiro para fazer frente a outras atividades.” Essa é a grande virada que se espera do Amazônia 4.0, desenvolver uma bioeconomia rentável o suficiente para priorizar a preservação do
bioma, embalada em uma narrativa que destaque referências únicas daquela região. “É um terroir muito abundante”, diz Ismael. Ele explica que, enquanto commodity, a amêndoa do cacau é comercializada entre R$ 10 e R$ 12 o quilo, mas quando beneficiada pode virar um chocolate de R$ 200 o quilo. “E o nível de perdas no caminho é baixíssimo, quase que 80% do peso da amêndoa é chocolate”, acrescenta. Considerando que o Pará lidera a produção brasileira de cacau, o horizonte fica ainda mais amplo. A safra paraense deste ano pode passar de 144 mil toneladas (53,6% do volume nacional), segundo dados do IBGE, divulgados pela Agência Pará. O projeto conta com investimento de R$ 5 milhões, recursos vindos pelo Laboratório de Inovação
do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID Lab). E tem apoio do Instituto Arapyaú, do Instituto Humanize, do Instituto Clima e Sociedade (ICSiCS) e do Good Food Foundation(GEF). A previsão é de que ainda este semestre fique pronto o protótipo do Laboratório Criativo da Amazônia para Cacau e Cupuaçu. O desenvolvimento acontece no Parque Tecnológico da Universidade do Vale do Paraíba (Univap), em São José dos Campos (SP). Para Ismael, é muito positivo estar dentro de um polo tecnológico como esse, até porque o projeto é multidisciplinar. “O LCA exige um alto grau de tecnologia, e aqui a gente ‘tropeça’ em cientistas que já estão lidando com algo que precisamos”, afirma o biólogo. A elaboração dos equipamentos é resultado de um trabalho coletivo que envolveu especialistas de diversos segmentos, como engenheiros da cadeia produtiva do chocolate,
engenheiro de alimento para área das castanhas (o projeto vai abranger também a castanhado-brasil), e engenheira química para a área de cosméticos. “Nosso trabalho hoje é desenvolver prova de conceito.”
PRÓXIMOS PASSOS Nesse momento, estão sendo concluídas as últimas elaborações técnicas e tecnológicas do projeto, como a parte de software. Assim que o projeto estiver completo, começa de fato a implementação na Amazônia e a capacitação das pessoas. “Em janeiro ([2022]) devemos fazer uma homologação dessa tecnologia toda em alguma comunidade e, depois, vamos visitar outras quatro, que serão acompanhadas por dois meses”, diz Ismael. Essa etapa será desenvolvida por meio da parceria com o Instituto Conexões Sustentáveis (Conexsus). Trata-se de uma organização sem fins lucrativos, que trabalha para ativar o PLANT PROJECT Nº27
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Montagem do primeiro módulo: projeto começa a sair do papel
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ecossistema de negócios comunitários rurais e florestais, e dessa forma aumentar a renda dos pequenos produtores e fortalecer a conservação dos ecossistemas naturais. A participação de instituições como Sebrae e Senai pode contribuir para ampliar a capacitação e o desenvolvimento de negócios. É fundamental que se consolide a autossuficiência das comunidades participantes, que os produtores absorvam a lógica de agregação de valor dentro das regras do capitalismo. Serão realizadas expedições para as regiões produtivas com o intuito de ouvir as lideranças das comunidades, identificar e entender o que realmente necessitam, realizar um mapeamento bem direto. Já estão em desenvolvimento ampliações do projeto, envolvendo outros produtos. Ismael conta que o design do laboratório para trabalhar com a castanha-dobrasil está quase pronto. Assim como uma opção voltada à
produção de uma linha gourmet de azeites com patauá, buriti e tucumã. “Há tendência de diversos óleos, mas como matéria-prima, em grandes volumes. Estamos buscando o produto final”, afirma o colíder do Amazônia 4.0. Futuramente podem ser incluídos experimentos agregando outros ingredientes, como supernutrientes, valorizando ainda mais os produtos. A coordenação buscará outras parcerias estratégicas com instituições locais, sobretudo as que já estejam envolvidas com ações que tenham o mesmo conceito. “A ideia é que tudo isso seja absorvido por grandes atores que possam fazer muito mais. E a equipe que está hoje no centro do desenvolvimento pode avançar mais para as biofábricas e para questões ligadas à certificação a todos esses processos ligados a à Amazônia”, afirma Ismael. “Futuramente podemos até nos tornar um hub de inovação.”
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A REGRA (AINDA NÃO) É CLARA Falta pouco para sabermos se o governo brasileiro vai ou não definir uma normativa para o setor de proteínas produzidas à base de vegetais e, em caso positivo, qual será essa regulamentação Por Romualdo Venâncio
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m janeiro de 2022, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) deve iniciar os trabalhos de análise de impacto regulatório em relação aos alimentos plant-based, aqueles produzidos apenas com matéria-prima de origem vegetal e análogos à proteína animal. Esta será a primeira etapa obrigatória para a produção normativa sobre o tema, mas o processo começou antes, a partir de uma tomada pública de subsídios. “Essa tomada é opcional, mas decidimos realizá-la por se tratar de um assunto muito novo e complexo”, afirma Glauco Bertoldo, diretor do Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Vegetal (Dipov) do Mapa. Durante 90 dias, a sociedade – pessoas físicas e jurídicas – pôde manifestar livremente sua opinião a respeito do assunto por meio de um formulário que estava disponível no site do Mapa. Os dados da pesquisa ainda estavam sendo tabulados quando Bertoldo conversou com a redação da PLANT PROJECT, no entanto o diretor do Dipov se diz bastante satisfeito com o que já havia sido possível extrair até aquele momento. “Essa manifestação foi muito rica, as pessoas veem a necessidade de que o
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segmento seja regulamentado, que exista uma regra clara para a nomenclatura desses produtos visando à boa informação para o consumidor”, comenta. Este é um dos motivos pelos quais o Mapa abriu esse diálogo com a sociedade, garantir que a população tenha condições de saber exatamente o que é um alimento plantbased, quais são suas características, como é produzido, entre outras informações, para que decida de forma consciente e segura se quer ou não consumir esse produto. Até por isso o Mapa conta com a participação da Anvisa nesse processo. Para a análise de impacto regulatório, todo o setor envolvido e interessado nesse diálogo é convidado a discutir qual é o impacto de haver ou não uma regulamentação para o segmento plantbased. “A grande decisão que sai daí é se vamos ou não regular o assunto, se vamos ou não normatizar”, afirma Bertoldo. Após esse passo, vêm a consulta pública, em que o primeiro texto propositivo é apresentado para que a sociedade se manifeste – a favor ou contra –, e por fim a audiência pública, que é a etapa imediatamente anterior à publicação da norma. “É quando debatemos e alinhamos pontos ainda indefinidos”, diz o
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Produtos de proteína alternativa da marca europeia Vivera: JBS investiu 341 milhões de euros para se posicionar no novo mercado
diretor do Dipov, acrescentando que em seguida a normativa será entregue à ministra Tereza Cristina. Ou, dependendo de quando o documento ficar pronto, a quem estiver em seu lugar à frente do Mapa, caso ela deixe o cargo para disputar uma vaga na Câmara Federal ou no Senado nas eleições do ano que vem. O prazo para a saída do atual posto, a chamada desincompatibilização, é de no mínimo seis meses antes da disputa eleitoral. QUESTÃO DE MERCADO Outras razões também motivaram essa tomada pública de subsídios pelo Mapa. Uma delas é o rápido avanço do setor de alimentos plant-based no Brasil nos últimos anos. Prova desse crescimento é aposta de alguns dos principais players do setor de proteína animal no segmento. Mais do que ganhar espaço no portifólio de empresas como JBS, BRF e Marfrig, as chamadas proteínas alternativas vêm se tornando estratégicas para essas companhias, tanto no mercado nacional quanto no global. No ano passado, por exemplo, Marfrig e ADM anunciaram a criação da
PlantPlus Foods, uma joint venture para produção e comercialização de produtos de base vegetal nas Américas do Sul e do Norte. Este ano a JBS investiu 341 milhões de euros na compra da Vivera, terceira maior empresa europeia neste setor. “Estima-se um avanço exponencial desse movimento nos próximos anos. Se fecharmos os olhos e não quisermos discuti-lo, vamos ficar atrasados em relação ao que o mundo vai fazer daqui para a frente”, avalia Bertoldo. “É importante ordenarmos esse movimento por aqui de maneira correta enquanto está em uma curva crescente.” Antes da tomada pública de subsídios, o Mapa promoveu um amplo debate sobre as proteínas alternativas. O workshop “Percepções sobre o segmento plant-based products no Brasil”, realizado em dezembro do ano passado, com o apoio da Embrapa, reuniu agentes de diversas áreas direta ou indiretamente ligadas ao tema. Algo que ficou claro durante essa live que passou de quatro horas de duração é o consenso sobre o crescimento do setor de alimentos plant-based, e de que esse movimento resulta de uma mudança de hábitos do
consumidor. O estudo “O consumidor brasileiro e o mercado plant-based”, feito pelo Good Food Institute (GFI) em maio do ano passado, em parceria com o Ibope, mostra como essa tendência já está presente no País. Das 2 mil pessoas que participaram da pesquisa, 39% afirmaram substituir alternativas animais por vegetais pelo menos três vezes por semana. E quase metade (49%) disse ter reduzido o consumo de carne nos 12 meses que antecederam a pesquisa. Muito dessa mudança deve-se ao surgimento de um novo grupo de consumidores: os flexitarianos. Trata-se de um público que está diminuindo a porção de produtos de origem animal em suas dietas, mas sem eliminá-los por completo. Para Alexandre Cabral, assessor de Políticas Públicas do GFI, a principal razão dessa mudança de hábito é a preocupação com a própria saúde. “Se você perguntar por que estão comendo menos carne, vão dizer que foram ao médico e receberam a orientação para isso, ou que irão ao médico e já esperam que ele diga isso”, diz Cabral. “Os flexitarianos estão PLANT PROJECT Nº27
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Cabral, do GFI: o consumidor não se engana, faz escolhas
mais preocupados com sua própria saúde, seu bem-estar, do que com o planeta ou o bem-estar animal.”
O NOME CORRETO Diante da expansão do setor de alimentos plant-based, surge uma preocupação em relação à nomenclatura dos produtos, vinda principalmente das entidades que representam as cadeias produtivas de proteína animal. De maneira geral, reconhece-se a crescente relevância desse novo setor e a importância de que seja regulado, mas há um pleito comum para que não se utilize termos específicos de produtos de origem animal, como “carne” e “leite”, para definir alimentos gerados a partir de matéria-prima vegetal. O principal argumento de tal solicitação é que isso pode confundir os consumidores, induzindo-os a comprar e ingerir um produto que não condiz com sua denominação. “Não temos problemas com os produtos plant-based, mas se é um alimento vegetal, chame-o da maneira correta. Se não tem 112
carne, não chame de carne; se não tem leite, não chame de leite”, diz Ricardo Santin, presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA). Em resposta à tomada pública de subsídios do Mapa, a Associação Brasileira de Criadores de Zebu (ABCZ) fez uma declaração, assinada por seu presidente, Rivaldo Machado Borges Júnior, em que considera apropriação indevida o uso dessas denominações para proteínas alternativas. “Temos percepção clara de que o uso impróprio dessas palavras traduzse em propaganda enganosa perante os consumidores”, diz a nota da entidade. A diretoria do Sindicato da Indústria de Laticínios e Produtos Derivados do Estado do Rio Grande do Sul (Sindilat/ RS) entregou sua solicitação diretamente a Tereza Cristina. Durante encontro com lideranças do agronegócio gaúcho em setembro, no município de Vacaria, a ministra recebeu um ofício do Sindilat, assinado pelo presidente da entidade, Guilherme Portella,
pedindo atenção ao assunto. “As indústrias por nós representadas não aceitam que o termo leite seja utilizado por bebidas de origem vegetal nem que se use denominação como queijo vegano, manteiga vegetal, requeijão vegano para produtos derivados de quaisquer outras matérias-primas que não sejam leite”, diz o documento, que ainda afirma haver prejuízo financeiro e social à imagem e ao setor lácteo. O diretor técnico regulatório da Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes e de Bebidas Não Alcoólicas (Abir), Igor Castro, participou do workshop realizado pelo Mapa e afirmou que a entidade é contra a utilização do nome leite para a categoria de bebidas plant-based. Entretanto, para a Abir, há uma exceção: o leite de coco. “Porque na verdade não é uma bebida que sai do coco – a única bebida que sai do coco é a água –, ele é feito da pasta da parte branca do coco. E já é um nome consagrado na população brasileira”, explicou Castro. O diretor do Dipov conta que,
após a realização daquele workshop, passaram a participar de diversos eventos, receberam convites de entidades tanto da cadeia de proteína animal quanto do setor de proteínas alternativas para explicarem suas intenções e, principalmente, ouvir o posicionamento desses setores. “Algumas poucas vezes ouvimos, dos dois lados, manifestações extremadas, seja para proibição, seja para liberação do uso desses termos. Mas o que buscamos é o caminho do meio”, afirma Bertoldo. Segundo ele, a prioridade é buscar o que é melhor para o País, para o consumidor brasileiro, de forma que esteja bem informado e bem abastecido com alimentos seguros. “Depois, pensamos também no que é melhor para nossa agropecuária. O Brasil é protagonista na produção de alimentos no mundo, então precisamos de uma legislação que seja compatível com essa capacidade. Claro, visando ao desenvolvimento do nosso país, gerando empregos e mais investimentos”, diz. Embora tenha consciência do desafio que é agradar a todos, Bertoldo considera a tarefa extremamente necessária, até para colocar o Brasil no rumo de se tornar protagonista também no setor de proteínas alternativas. POR OUTRO ÂNGULO Alexandre Cabral, do GFI, conta que, entre as investigações feitas pela instituição sobre o
segmento plant-based, buscaram na Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), órgão vinculado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, se algum consumidor havia registrado no Procon reclamação de que ao procurar leite integral de vaca tivesse se confundido e comprado uma bebida de origem vegetal, que custa três vezes mais. “O Procon não tem registro sobre isso”, afirma. “Solicitamos às empresas com quem nos reunimos em um grupo de trabalho que consultassem seus SACs para saber se havia alguma reclamação desse tipo, e também não há. Esse debate é de posicionamento, menos científico do que político.” Para o executivo do GFI, o consumidor não se engana entre proteína animal e alimentos plant-based, “ele faz escolhas”. Mas defende que exista um regulamento de rotulagem, de maneira que os padrões estabelecidos eliminem qualquer possibilidade de confusão no momento da compra. Cabral inclusive destaca o trabalho que vem sendo realizado pelo Mapa sobre a necessidade ou não da regulação deste segmento. “O governo brasileiro tem sido técnico, imparcial e correto em conduzir uma análise de impacto regulatório isenta numa situação em que a macropolítica não é favorável a isso”, comenta. O GFI é uma das instituições parceiras do Mapa nesse processo. Por mais questões que ainda
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precisam ser respondidas sobre o setor de proteínas alternativas, não há dúvidas de que o mercado consumidor é decisivo na definição dos caminhos a seguir, independentemente dos motivos. De alguns anos para cá, vem se intensificando o interesse por questões como mudanças climáticas, segurança alimentar e do alimento e a agenda 2050 sobre abastecimento e aumento populacional. Há que se considerar o quanto novas fontes nutricionais se encaixam nessas demandas. “Temos muitas pessoas para alimentar nos próximos anos, vamos precisar muito de alimentos e que forneçam os nutrientes que precisamos. E qualquer iniciativa que traga mais alimentos pra gente é bem-vinda, temos de apoiar”, diz Bertoldo, diretor do Dipov. Esse debate ainda vai crescer, pois há que se falar sobre “carne cultivada” e o uso de fungos como matéria-prima para proteínas alternativas. PLANT PROJECT Nº27
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O ETANOL NA MOBILIDADE SUSTENTÁVEL DO FUTURO P o r P l i ni o Na s ta ri À medida que conceitos de sustentabilidade ambiental, social e de governança corporativa (ESG) avançam no mundo inteiro, em energia para transporte é crescente a busca por eficiência energética e menores emissões locais e globais. Como terceiro maior consumidor de energia para transporte, atrás apenas dos Estados Unidos e da China e à frente de gigantes populacionais como Índia e Indonésia, e de economias pujantes como Japão, Rússia e todos os países da Europa, o Brasil tem um protagonismo relevante nesta área. Em particular, chama a atenção o fato de que já substitui (em 2020) 48% de sua gasolina automotiva por etanol, através da mistura de 27% de etanol anidro na gasolina e do uso de etanol hidratado pela frota flex que representa mais de 86% da frota total de veículos, e mistura 13% de biodiesel ao diesel fóssil, produtos comercializados numa rede de mais de 41,7 mil postos de revenda distribuídos em um país continental. Portanto, quando muitos países e grandes montadoras de automóveis optam pela eletrificação em mobilidade,
tem sido recorrente a dúvida sobre qual papel o etanol poderá desempenhar na mobilidade sustentável do futuro. A eletrificação é uma tendência, pois o consumo energético de motorizações elétricas é menor, em torno de 0,7 MJ/km, comparado ao dos veículos equipados com motores de combustão interna (MCI), de 1,62 MJ/km. O problema começa quando se confunde eletrificação com uma de suas opções, a do veículo elétrico a bateria (VEB). Existem outras opções de eletrificação, como os híbridos em paralelo e em série, e os veículos equipados com células a combustível, com ou sem reforma a bordo. Os híbridos e as células a combustível com reforma, ou extração do hidrogênio, a bordo operam com combustíveis líquidos, e quanto mais limpos ou renováveis forem esses combustíveis, mais sustentável são essas soluções.
opção a ser adotada vai depender de como a política pública estará medindo o impacto energético e ambiental. Se a política pública estiver interessada em medir apenas emissões de escapamento, o veículo a bateria pode ser considerado uma solução, mesmo utilizando energia elétrica de fonte fóssil. Esse é o conceito “tanque à roda”, reconhecidamente parcial e incompleto. Se a política avaliar emissões relacionadas desde a geração da energia até o seu uso final, teremos uma avaliação mais completa, denominada “poço ou campo à roda”. Se a política avaliar emissões integrais incluindo aquelas relacionadas à construção e descarte dos veículos e dos sistemas de geração de energia, estará seguindo o conceito “berço ao túmulo.”
!"#$%&'()"#!*&"%$$*+,*&#-./",01!#*&)*&2%"*34/& Algumas estratégias de controle de emissões têm & sido )#$,"#56()*&)%&%1%"2#*&)%&5#/-*$$* & %&"%$()6/$ baseadas em motorizações
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A combinação de motorização e energia para transporte a ser utilizada vai depender da geografia e das características de cada país ou região, e a
sem, no entanto, se preocupar com a origem da energia. No conceito poço à roda, na Europa e nos EUA, veículos convencionais movidos a gasolina ou diesel emitem entre 122 e 150 gramas de CO2 equivalente/km. Os VEBs
Plinio Nastari é presidente da Datagro e do Instituto Brasileiro de Bioenergia e Bioeconomia (Ibio). No período de nov/16 a ago/20 foi o representante da sociedade civil no Conselho Nacional de Política Energética (CNPE).
emitem na Europa usando o mix médio de eletricidade fóssil-renovável local em média 92 gCO2e/km. Reduzir emissões de 122 para 92 gCO2e/km é um avanço, apesar do custo elevado do veículo, compensado parcialmente por subsídios que governos concedem aos consumidores, e da nova infraestrutura que precisa ser criada para recarregar baterias. Mas esse nível de emissões ainda está muito acima dos 58 gCO2e/km emitidos pelos MCI a etanol da frota flex no Brasil, e dos 29 gCO2e/km dos híbridos flex a etanol vendidos desde setembro de 2019. Até 2032, é esperado que os VEBs estejam emitindo 74 gCO2/km, que os veículos com MCI a etanol tenham reduzido as emissões a 38 gCO2e/km, e os híbridos a etanol estejam emitindo 27 gCO2e/km, o mesmo nível das células a combustível com etanol, isso tudo no conceito poço à roda. No conceito berço ao túmulo, a vantagem das motorizações a etanol é ainda maior. Vários países têm condições de seguir o exemplo brasileiro, e outros não têm aptidão nem condições de produzir biocombustíveis em volume suficiente por limitações de terra, sol e água. Alguns desses países têm anunciado planos de expandir a geração eólica e solar fotovoltaica, que são fontes intermitentes, armazenando-as na forma de hidrogênio gerado a
partir da eletrólise da água, utilizando essas energias renováveis. Mas é uma fonte de energia cara para ser gerada, armazenada e distribuída. O hidrogênio requer armazenagem em tanques de 500 a 900 bar de pressão, caros e arriscados e, portanto, deverá expandir mais facilmente em unidades estacionarias para a produção de amônia e outras aplicações industriais. Para distribuição em uma geografia dispersa, havendo condição de produção para tal, o etanol e o biogás e biometano, gerados a partir de resíduos agroindustriais, devem ser entendidos como hidrogênio envelopado na forma de combustível líquido, capturado, armazenado e distribuído de forma eficiente, econômica e segura. Estamos, sim, na Era do Hidrogênio, e como declarou a Nissan em junho de 2016 ao anunciar o desenvolvimento de um revolucionário veículo equipado com célula a combustível de óxido sólido (SOFC), que dispensa o uso de metais raros, “com a infraestrutura instalada de distribuição de etanol, o Brasil já resolveu o desafio de distribuição de hidrogênio”. Em tempo, a EPE – Empresa de Pesquisa Energética estimou que o investimento para construção de um smart grid para recarga de baterias no Brasil é de 210 a 300 bilhões de dólares, ou o equivalente a duas reformas da previdência. Portanto, existe um papel a ser desempenhado pelo
etanol na mobilidade sustentável do futuro, não só no Brasil, mas também em vários outros países, especialmente porque a sustentabilidade de sua produção é crescente através de rotas adicionais de aproveitamento da energia integral da cana, e dos resíduos gerados com sua industrialização, o que tende a diminuir ainda mais as emissões nos conceitos mais completos de avaliação de ciclo de vida. No entanto, é fundamental que investimentos em motorizações que utilizam etanol continuem a ser realizados pela indústria automotiva.
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Às vésperas da COP26, em Glasgow, o Brasil tem no etanol e na regulamentação do mercado através de um programa de certificação transparente segundo critérios internacionais de sustentabilidade como o RenovaBio o seu maior trunfo. Os veículos da Tesla comercializados em todo o mundo durante os últimos 11 anos permitiram uma economia estimada de 3,5 milhões de toneladas de CO2 equivalente. Em 2020, no seu primeiro ano de funcionamento, o RenovaBio poupou emissões de mais de 15 milhões de toneladas de CO2e, e em 2021 deverá economizar outros 25 milhões de toneladas. Em dez anos, até 2030, a redução de emissões será de mais de 620 milhões de toneladas de CO2e, o equivalente à emissão total da França, e mais do que a emissão total do Canadá.
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Crescimento. Inovação. Agronegócio. Isso é SAP. Do campo pra sua mesa, a SAP participa de toda a cadeia do agronegócio trazendo inovação e crescimento. Para saber mais, acesse o QR CODE.
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