Revista Ponto & Vírgula - Ano 7 | Número 12 - Março de 2017

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Revista Laboratório do Curso de Jornalismo Ano 9 | Número 12 - Março de 2017

Alice Lavynne luta para registrar seu nome social

Lei garante o direito de amamentar em público

Angela Davis inspira luta contra o preconceito



Por trás do preconceito que envolve os filmes trash Pág. 56 Uiara Freitas dá dicas de como ingressar no ramo empreendedor ainda jovem Pág 45. Ex-aluna de jornalismo da Fumec conquista espaço na TV brasileira Pág. 32

PoNto e VÍRgULa Dadá Maravilha

Pág. 05

Alice no país do preconceito

Pág. 09

Por trás da maquiagem

Pág. 11

Lei Maria da Penha

Pág. 17

Democracia ou Democracídio

Pág. 19

expediente

Ângela Davis

Pág. 21

FUMEC

Respeito à amamentação

Pág. 27

Presidente do Conselho Executivo Prof. Air Rabelo Presidente do Cons. de Curadores: Prof. Antonio Carlos D. Murta

Cíntia Paes

Pág. 30

Dieta para cura do câncer

Pág. 35

Mãos que ajudam

Pág. 43

Pequenas atitudes

Pág. 47

Piercing

Pág. 49

Maconha medicinal

Pág. 51

No poo e low poo

Pág. 53

Noites sem lei

Pág. 60

Fundação Mineira de Educação e Cultura

Reitoria da Universidade Fumec

Reitor: Prof. Fernando de Melo Nogueira Vice-reitor: Prof. Guilherme Guazzi Rodrigues

Faculdade de Ciências Humanas

Diretor-Geral: Prof. Antônio Marcos Nohmi Diretor de Ensino: Prof. João Batista de M. Filho Coordenador do Jornalismo: Prof. Ismar Madeira

Ponto e Vírgula

Editor: Prof. Aurelio José Silva Coordenação Proj. Gráfico: Prof. Aurelio José Silva Técnico e finalização gráfica: Luis Filipe P. B. Andrade Técnico e tratamento gráfico: Daniel Washington S. Martins Revisão de texto: Prof. Dr. Luiz Henrique Barbosa Logotipo: Rômulo Alisson dos Santos Monitores: Ana Júlia Ramos Pietra Pessoa Rachel Silveira Sara Lacerda Gráfica: Formato Tiragem: 1.000

ENSAIO FOTOGRÁFICO

Conselho Editorial

Prof. Alexandre Salum Prof. Aurelio José Silva Profª. Dúnya Azevedo Profª. Vanessa Carvalho Prof. Dr. Luiz Henrique Barbosa

Catherina Dias e Sara Lacerda lançam a sua perspectiva sobre a diversidade facial que há em Belo Horizonte.

Foto da capa Letícia Gontijo

Pág. 37 Fotos: Catherina Dias e Sara Lacerda

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editoriaL

Retroceder jamais! Aurelio José Silva

Nunca se viu um Brasil tão dividido como o da atualidade. Intolerâncias, discursos de ódio e uma profunda crise moral assolam o país. Muitas vezes, a sensação é que estamos em uma espécie de Torre de Babel. Já não compreendemos a linguagem uns dos outros e parece que estamos retrocedendo como sociedade. Mas, em meio ao caos e à balbúrdia, ouve-se o grito daqueles que resistem e reivindicam a manutenção de direitos sociais e respeito conquistados ao longo da história. Fazendo eco a esses grupos de resistência, esta edição da Ponto & Vírgula traz várias pautas que abordam conquistas sociais e direitos humanos. A reportagem sobre a chegada ao Brasil do clássico de Angela Davis, “Mulheres, Raça e Classe”, traça um panorama histórico e crítico da luta feminista, antirracista e antiescravagista, passando pelos dilemas da mulher contemporânea. Outra reportagem aborda a luta da transgênera Alice Lavynne Rodrigues Rocha para registrar oficialmente seu nome social em seus documentos. A reportagem Rotina drag nada queen mostra o dia a dia, nem tão glamouroso, dos homens que se

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travestem e a sua luta contra o preconceito. O direito de se manifestar publicamente, garantido pela Constituição, é tema da reportagem Democracia ou Democracídio. Ainda sobre leis, outras duas reportagens retratam o direito das mães de amamentarem em público seus bebês; e a legalização parcial do uso de maconha para fins medicinais. Nos últimos anos, a nossa jovem Democracia avançou em relação à liberdade de expressão. Entretanto, conservadores incomodados se organizaram para tentar impedir a continuidade dessas conquistas. Mas, parafraseando a afirmação da roqueira baiana Pitty, a mulher não volta para cozinha, nem o negro para a senzala, nem o gay para o armário. Temos hoje um impasse. Há aqueles que querem um país do passado e os que não abrem mão de um país do presente. O Brasil necessita agora, urgentemente, rever seus posicionamentos pessoais, tanto das autoridades quanto do cidadão comum, para que seja possível se instaurar uma nova ordem ética e moral, pautada pelo respeito às diferenças, mas buscando sempre uma organização social mais igualitária. Boa leitura!

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entrevista

70 aNos do Homem qUe PaRaVa No aR Por Breno Galante

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izem que, assim como o beija-flor e o helicóptero, ele também parava no ar. Revolucionou o futebol brasileiro com seu lado carismático. E construiu frases que marcaram o futebol brasileiro. É conhecido como Dario José dos Santos, Dadá Maravilha, Dario Peito de Aço, Rei Dadá ou simplesmente, Dadá. Celebra 70 anos de idade e fala à Ponto e Vírgula sobre os momentos mais marcantes da sua trajetória.

O que é o futebol na sua vida? Futebol é a minha amada. Futebol é meu amigo. Futebol é o meu direito de ser e fazer o que eu gosto que é jogar e falar sobre futebol.

Se Dadá jogasse hoje futebol, teria o mesmo sucesso que anos atrás? Teria até muito mais. Porque, com todo respeito ao futebol brasileiro que eu tenho hoje, nosso futebol não é nem o quinto, nem o sexto do mundo. E na minha época era o melhor futebol do mundo. Tanto que a seleção que eu estive em 1970 é considerada pelo planeta da bola como a melhor seleção de todos os tempos.

Fotos: Portal Todo Futebol

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Falando em seleção brasileira, em 1970 você foi protagonista de um momento que marcou a história não só do futebol, mas da política do país, uma vez que você foi convocado por um pedido do presidente Emílio Garrastazu Médici. Qual é a verdade desse fato? A verdade é que realmente eu fui convocado para a seleção brasileira por um pedido do presidente Médici. Porque eu era disparado o maior artilheiro do mundo. Eu estava fazendo mais gols que o Pelé na época. E no futebol brasileiro era comentado por todos como merecida minha convocação, mas o treinador João Saldanha não gostava do meu futebol e achava que eu não teria condições de ir para a seleção dele. E ele falou que tinha dez centroavantes melhores que Dadá. Eu, que não levo desaforos para casa, falei que melhor que Dadá só Jesus Cristo e que a seleção estava invicta porque não tinha enfrentado Dadá. E aí aconteceu aquela catástrofe do Atlético ganhar da Seleção Brasileira que foi disparada a melhor seleção das eliminatórias na época, quando venceu todos jogos. A seleção era conhecida como as “feras do Salda-

nha”. Porém, quando veio enfrentar o Atlético no Mineirão, o Dadá deitou e rolou.

Esse foi o jogo que levou o Dadá à seleção brasileira? Foi e eu fiz gol nesse jogo. O Amauri fez um a zero para o Atlético, Pelé empatou e eu desempatei. E foi o jogo que eu mais corri na minha vida. E confesso, foi o gol que eu mais vibrei. Vibrei mais nesse gol que no próprio gol que deu o título brasileiro ao Atlético em 1971.

Participando dessa seleção brasileira, você jogou ao lado de grandes jogadores. Deixando Pelé de lado, quais foram os maiores jogadores com quem você jogou? Bem, vou ser sincero, Gérson sou louco, Rivelino fantástico, Edu, para mim, o maior ponta esquerda que vi na minha vida, Jairzinho, o furacão,

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entrevista - DADá MARAVILHA jogou demais na Copa, Clodoaldo, divino, Piazza jogou um futebol maravilhoso; enfim, esses jogadores me encantaram. E Pelé é hours concours, um jogador extraordinário. Se disserem para mim que tem um jogador melhor que o Pelé eu vou na polícia e processo. Agora, se falaram mal do Édson Arantes do Nascimento, eu fico quieto, porque ele não concordou em reconhecer uma filha legítima de acordo com uma sentença da justiça.

Você passou por 16 clubes na sua carreira, em todos os cantos do Brasil, e por incrível que pareça, você é respeitado até hoje por todas as torcidas, independentemente da rivalidade. Como foi conseguir isso? Eu consegui porque eu tinha o lema que futebol é alegria, que o futebol é arte. Apesar de eu não ter sido um artista da bola porque eu era muito ruim para jogar futebol, mas eu fui um artista do gol. E eu acho que o futebol precisa voltar aos anos 70, ou seja, jogar com amor, jogar com ternura, respeitar mais o torcedor. Porque hoje tem muito dinheiro envolvido e a gente vê pouca arte.

Antes dos jogos, você prometia e colocava nome aos gols. De onde surgiu essa ideia? Na realidade essa ideia não foi minha. Eu comprava sempre o jornal dos Sports do Rio de Janeiro lá perto da rodoviária, para saber como estava a minha terra e um advogado chegou perto de mim e disse: “Dadá, futebol está muito chato, ninguém fala nada, todo mundo só fala que futebol é onze contra onze, que vamos vencer se Deus nos ajudar e nós estamos cansados disso, porque você não inventa algo diferente como dar nome aos gols?”. Eu pensei, se eu der nome aos gols, os

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Muito jovem, enfrentou problemas financeiros vivendo no subúrbio carioca

caras vão me matar, me chamar de mascarado. Mas fiquei com aquilo na cabeça, cheguei em casa e conversei na época com a minha esposa e ela me apoiou. Aí comecei a dar nome aos gols. Comecei a fazer os gols, o público começou a ir ao campo. O atleticano ia para me ver e o adversário

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ia para me xingar, mas ia a campo. Então o campo só vivia lotado. E Deus, na sua infinita bondade, me ajudou, porque a maioria dos gols que eu prometi eu cumpri. E eu gostei da brincadeira e levei para o resto da minha carreira.

Você se lembra do nome de

Fotos: Portal Pinterest

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dadá maravilha -

entrevista

alguns desses gols que marcaram você? Eu fiz o gol mirabolante, gol ternura, raiz quadrada, gol do índio, gol da criança e fui agradando a todo mundo e conquistando a todos.

Tem algum tipo de gol que você não fez? Dizem que você nunca fez gol de bicicleta e criou o gol velotrol, é verdade? Não, é um engano. Eu fiz um gol de bicicleta por incrível que pareça num jogo do Atlético contra o Cruzeiro no Mineirão. Recebi um cruzamento, cabeceei na trave e na volta eu fiz o gol de bicicleta no fabuloso, no melhor goleiro que eu vi em Minas Gerais, Raul. Agora o gol velotrol foi no clássico entre Ponte Preta contra Guarani, a bola tinha passado por mim e eu peguei e dei uma bicicleta ao contrário.

Você fez dez gols numa partida. Um recorde muito difícil de ser quebrado num futebol como o de hoje. Você se recorda desse jogo? Eu me recordo e tenho uma história sobre esses gols. Porque, na realidade, quem me motivou a fazer dez gols foi o Pelé. Eu estava no quarto concentrado para um jogo da seleção com ele, e ele me disse: “Dadá, como um cara que não consegue dar uma embaixada como você pode estar na seleção?”. Eu falei para ele: “Eu não sei, é Deus. Mas Pelé, não tem gozação não. Você já fez oito gols numa partida, pois eu vou bater seu recorde e vou marcar nove e você vai fazer um telegrama e vai mandar para mim”. O Sport de Recife, em 1976, fez 14 a 0 no Santo Amaro e eu fiz dez gols. Aí, quando acabou o jogo, eu mandei um recado para o Pelé cobrando o telegrama. E o Pelé mandou o telegrama, eu fiz um livro, coloquei no livro e fiquei muito feliz

Fotos: Portal Extra Online

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Dadá é o quinto maior artilheiro do futebol brasileiro com 926 gols

pela humildade dele de ter me mandado esse telegrama.

Você também criou várias frases emblemáticas, poéticas. Você se recorda de algumas delas e elas realmente são suas?

Tenho muita ternura. E eu achei que estava faltando isso no mundo. Aí pensei, eu não sou poeta, mas eu vou tentar fazer poesia e eu fiz. Agora, as frases são minhas, a ideia também é minha. E eu não falava só com a boca. A boca transmitia o que o meu coração pedia.

Bom, em primeiro lugar, as minhas frases foram feitas porque eu sou um cara muito carismático, amoroso.

Qual a frase mais impactante que você criou?

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entrevista - DADá MARAVILHA A frase consagrada pela revista Veja como a maior frase de todos os tempos, ganhando de Castro Alves e Rui Barbosa. “Não me venham com a problemática que eu tenho a solucionática”.

Na sua história, o que você mudaria? O que poderia ter feito diferente? Bem, o que poderia ter feito diferente era exigir o meu valor. Porque o Atlético tinha o salário teto, todo mundo ganhava igual. E eu podia muito bem ganhar mais que todo mundo. Inclusive os jogadores falavam que eu devia ganhar mais, mas eu nunca fui ao Atlético para pedir um centavo.

Qual treinador mais marcou você? Eu tenho Telê Santana, Yustrich, Gradim que me deu a primeira oportunidade. Eu chutei uma bola pela primeira vez com 19 anos. Com 20 anos fui para o Campo Grande e o Gradim viu que eu era muito ruim mas falou que ia me dar uma chance por causa da minha velocidade incrível e minha impulsão maravilhosa. E me treinou e depois fui parar no Atlético.

Você começou no futebol com 19 anos, mas antes disso você passou por uma adolescência conturbada, e superou isso através do futebol. Vendo hoje essas crianças que passam pela mesma situação que você passou, o que você pode dizer para elas? Bem, em primeiro lugar eu queria dizer a essa juventude que eu era bandido, ladrão, assaltante da Febem. Roubei muitas carteiras, enfiei faca na bunda dos outros. Eu era primo primeiro do capeta. Era um cara revoltado com a vida. Porque aos cinco anos de idade eu vi a minha mãe que era doente mental, queimando na minha frente. Ela passou querosene no corpo, tocou fogo e saiu correndo pela rua. Eu saí correndo atrás dela. A minha mãe no instinto maternal, vendo que eu ia morrer com ela, me jogou na vala e saiu correndo. Então isso me marcou negativamente, mas eu vi o exemplo que minha mãe deu para mim porque ela me salvou. E depois fiquei bandido e me tornei um homem de bem e hoje eu sou um homem de exemplo, um homem super honesto. E virei joga-

dor em última instância porque não tinha estudo, não tinha o que fazer e fui jogar bola. E hoje eu sou o Rei Dadá.

Como você vê o momento político do pais? Em primeiro lugar a gente tem que rezar para os políticos, para que eles possam botar a cabeça no lugar. Eu tenho 70 anos e não tenho mais obrigação de votar, mas vou votar como brasileiro, porque eu ainda acredito num Brasil bom. Eu acredito que o Brasil ainda vai ser o país mais honesto do mundo.

Se pudéssemos resumir seus 70 anos de vida em uma só palavra. Qual seria? Amor. Eu sou um homem de amor. Hoje, se falar que tem um avô melhor que eu, eu brigo. Se falar que tem um pai melhor do que eu, eu brigo. Se falar que tem um amigo melhor do que eu, eu brigo. Porque eu sou um avô nota dez, um pai nota dez e um amigo nota dez. Porque eu sei que ser honesto é tudo que Deus quer e eu agrado a Deus. E eu me sinto muito honrado de ser um exemplo de vida

Portal

NOTÍCIAS - BLOG - VÍDEOS 8

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conecta.fumec.br conectafumec

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reportagem

aLice No PaÍs do PRecoNceito Essa história é de uma Alice que diferentemente daquela do clássico literário de Lewis Caroll, que cai numa toca de coelho e é transportada para um lugar fantástico, povoado por criaturas peculiares num mundo dos sonhos, vive um pesadelo no mundo real. Por Camilla Quirino e Samara Reis Alice, cujo nome de batismo é Iago Rodrigues Rocha, tem hoje 21 anos e seu maior desejo é se encaixar ao grupo ao qual pertence. Ela tem traços bem femininos e afirma nunca ter feito procedimentos cirúrgicos ou intervenções hormonais para transformar seu corpo, mas enfrenta uma luta diária pelo fato de seu nome não condizer com a imagem que ela passa para as pessoas. Para pôr um fim a esse sofrimento, nossa heroína da vida real iniciou

Fotos: Bruno Senna

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sua grande batalha. Ela não terá de enfrentar o perigoso monstro Jaguadarte, como sua homônima da ficção, mas travará uma batalha na Justiça em busca da mudança de nome para Alice Lavynne Rodrigues Rocha em seus documentos, que mantêm seu nome de batismo. Alice já venceu várias outras batalhas ao longo de sua vida. Embora seus amigos nunca a tenham questionado sobre sua sexualidade, sua família demorou um pouco

para aceitá-la. “Hoje já se acostumaram”, diz. Trabalhando atualmente como cabeleireira, ela conta que, em sua época de escola, nunca sofreu preconceito das pessoas com quem convivia. Deparou-se com o monstro da “rejeição” quando fez 18 anos e tentou ingressar no mercado de trabalho. “Eu me candidatei a uma vaga para ser recepcionista em um hotel e uma pessoa me disse que eu não iria conseguir emprego na área, nem

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reportagem - MUDANÇA DE NoME como recepcionista nem como vendedora, pelo fato de ter um nome masculino e uma imagem feminina. Antes, trabalhei como menor aprendiz no Ministério Público, tentei vagas em escritórios de advocacia e não deu certo. As portas vão se fechando no mercado de trabalho”, conta. A experiência adquirida trabalhando em salões de beleza, desde os 14 anos, facilitaram seu ingresso neste ramo de atuação. “Mas, mesmo assim, nem todos aceitam”, afirma. “Queria ser comissária de bordo. Pensei até em fazer o curso, mas também me falaram que, por causa do nome masculino, não seria contratada”, desabafa. Perguntada sobre como seria caso conseguisse a mudança de nome em seus documentos, Alice foi breve e contundente: “Seria perfeito!”. Quando se assumiu para sua mãe, Alice foi levada ao psicólogo, e ao psiquiatra. “Eles falaram que isso não era doença, que não existe uma cura, e que a solução é compreender e aceitar”, disse. “Todos falam que é doença e, de tanto ouvir, às vezes, a gente chega a pensar que pode ser mesmo, mas não é”, afirmou. Quanto ao procedimento para mudança de sexo, ela diz não ter vontade no momento. Entretanto, não nega que já pensou sobre isso algumas vezes. “Antes eu queria muito. Então, busquei me informar e ainda estou analisando a possibilidade. É um passo bem grande e hoje não vejo tanta necessidade. Antes, eu achava que precisava disso para me autoafirmar, achei inclusive que a cirurgia poderia facilitar a troca do nome e não precisa disso.”

Através do espelho Para Alice, o procedimento cirúrgico seria apenas uma questão de satisfação pessoal, de se autoafirmar diante do espelho como mulher, mas o importante, garante, é se sentir como uma, sem precisar

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que isso seja provado à sociedade. “Quando era mais nova, olhava para a minha irmã e via sua imagem como se fosse a minha, sempre me senti muito mais confortável com as meninas do que com os meninos, então, nunca vi as mulheres com outros olhos. Eu achava que elas eram iguais a mim.”

“Quando era mais nova, olhava para a minha irmã e via sua imagem como se fosse a minha” Alice Lavynne Quanto aos relacionamentos amorosos, explica que nem sempre é fácil. Por se ver como uma mulher, conta que se relaciona com homens e isso, muitas vezes, é problemático porque muitos homens não assumem se interessar por transexuais por medo de serem julgados pela sociedade, que ainda é bastante conservadora. “Em uma festa, por exemplo, quando estou em uma conversa com algum homem e surge um possível interesse eu já deixo a situação bem clara.” Para Alice, as pessoas têm muita curiosidade sobre o tema, mas nunca perguntam ou falam diretamente sobre o assunto com ela. “As pessoas me olham e tem curiosidade de perguntar, de conversar, mas ninguém chega para falar abertamente”. Sobre os seus sonhos, além de mudar seu nome, Alice deseja ter filhos, mas que optaria pela adoção ou barriga solidária. Quando perguntada sobre casamento, ela responde aos risos que tem vontade, mas enfatiza que não agora.

Alice x Iago Para o processo de mudança de nome, Alice procurou o Escritório

Modelo da Universidade Fumec, que tem como objetivo prestar assistência jurídica à comunidade de baixa renda para as causas cíveis, criminais e trabalhistas, fazendo o acompanhamento desde o atendimento, às defesas ou petições necessárias e o acompanhamento às audiências. O procedimento judicial foi instaurado para que fosse possível a alteração do prenome e o gênero na carteira de identidade, portanto, em vez de Iago ela passaria a se chamar Alice Lavignne. Foi feito um laudo inicial pela Clínica Escola, do departamento de psicologia da Fumec, para atestar que a Alice não está cometendo um ato impulsivo. No andamento do processo, o juiz solicitou recentemente um laudo psicológico mais específico sobre Alice. A Clínica Escola realizou um novo teste com ela e seus resultados foram comparados com o grupo feminino e o grupo masculino, sendo assim observado que Alice se identifca mais com o universo e os sentimentos femininos. Portanto, no início de fevereiro, foi enviado novamente o relatório para o juiz com o acréssimo da análise mais detalhada sobre Alice. O Escritório Modelo segue com o processo para a mudança do nome de registro, para que o sonho da cabeleireira seja realizado.

Serviço O Escritório realiza os atendimentos na Rua Cobre, 200, no prédio da Faculdade de Ciências Humanas, Sociais e da Saúde – FCH, de segunda a quinta, das 8 às 12 horas e das 13 às 17 horas

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Reportagem

A rotina nada glamurosa de homens que se travestem e enfrentam o preconceito Fotos: Bruno Senna

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reportagem - DRAG QUEEN

Drag queen, segundo o Manual de Comunicação LGBT da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Travestis e Transexuais (ABGLT), corresponde a um “homem que se veste com roupas femininas de forma satírica e extravagante para o exercício da profissão em shows e outros eventos. Uma drag queen não deixa de ser um tipo de transformista (consulte glossário na página 16), pois o uso das roupas está ligado a questões artísticas”. O texto do manual desmistifica outro ponto: uma drag queen não é necessariamente homossexual. O que observamos hoje é uma hibridização das identidades de gênero (glossário pág. 16), em que o conceito de “masculino” e “feminino” são postos à prova. Temos imposta uma condição heteronormatizada da sociedade de maneira que o uso

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de acessórios tidos como femininos por homens, por exemplo, ainda gera grande desconforto em grande parte da população. E como estão as drags queens nisso? Além da discriminação e do preconceito, as drags têm que lidar ainda com aqueles que imaginam suas vidas glamurosas e exclusivamente caricatas. Mas o que tem por trás disso? Esta reportagem te convida leitor, a conhecer um pouco mais e, principalmente, o que está por trás do universo drag além da peruca, dos cílios, das unhas postiças, do glamour. No quarto do Heyder Henrique, 22 anos, que interpreta Claire Micarla, fica tudo escondido numa caixa dentro do guarda-roupas. Ele afirma que se contasse para a família que é drag queen eles entenderiam que seu filho queria virar mulher e surtariam.

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Com Israel Assis, 21 anos, que é Sara Nicks há um ano, foi pior: seu pai não sabia, e os membros de um grupo no qual os dois fazem parte resolveram expor suas fotos de drag na frente do pai e dizer que o filho era uma decepção. No caso do Felipe Chaves, 24 anos, que é Safira Dandelion, a mãe, um tio e uma tia sabem, mas o pai não. Na maioria dos casos, as mães são quem sabem da família. Quando perguntados sobre por que não contar, todos afirmam que seria para evitar brigas, constrangimentos e problemas. João Flávio, de 19 anos, que se transforma em Jaddy Stone, não contaria a seus pais, mas um “amigo de infância” resolveu imprimir suas fotos montada (glossário pág. 16) e entregar na sua casa. O resultado disso: às 6 da manhã João recebe uma ligação do pai dizendo

Fotos: Bruno Senna

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dRAG QUEEN -

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Reportagem

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reportagem - DRAG QUEEN que não pagaria faculdade para um filho que não estudava e gastava tempo sendo travesti (glossário pág. 16). Não são só as relações familiares que têm complicações para este grupo de drags. Muitos delas já tiveram alguma experiência amorosa que foi influenciada pela montação (glossário pág. 16). João Marcelo, 24 anos, estudante de direito, que é Jall Goldmine, já terminou um relacionamento porque o namorado achava que ele dedicava tempo demais para se montar. Porém, hoje, João conta com o apoio de Pedro, seu namorado, que incentiva e inclusive ajuda durante o processo. Lucas Taborda, 23 anos, ou Lua Ty, conta que todos os seus amigos sabem e apoiam, mas que, no momento das relações amorosas, quando ele conhece alguém e se interessa, é muito difícil contar, pela dúvida da aceitação ou não. No trabalho e na faculdade, eles afirmam ter apoio. Felipe acabou de ser demitido, mas seus colegas pediram pra continuar acompanhando sua rotina como Safira. O primeiro salto alto que o Heyder comprou foi entregue na agência de turismo em que ele trabalha. Quem recebeu a caixa foi sua chefe que se mostrou super à vontade com a situação, e brincou ao calçar o sapato, descobrindo que Heyder andava de salto bem melhor que ela. Falando em salto alto, uma reclamação constante foi em relação ao preconceito, é o momento em que os boys (glossário pág. 16) vão comprar suas maquiagens e suas roupas para se montar. A grande maioria já abriu mão de ir as lojas por serem hostilizadas pelas vendedoras e por não encontrarem seus tamanhos. “Perguntei sobre a pigmentação de um produto de maquiagem para a vendedora, ela perguntou para quem era e quando disse que eu o usaria, ela respondeu que não existia pigmentação ideal para minha pele porque eu era homem, e homem

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“A drag queen é um personagem artístico, eu sou uma artista, fao performances e não me sinto na vontade de ser mulher.” Safira Dandelion não usava aquilo”, nos contou Israel. Bruno Folli, 24 anos, estudante de Ciências biológicas, que é a drag Palloma North, foi expulso de um provador de uma loja de departamentos porque queria experimentar um roupão feminino. “Super entendo a política da loja, mas me expulsaram de lá com falta de educação e por puro preconceito”, ele afirma. Além desse incômodo, uma das reclamações mais recorrentes foram o preconceito e o assédio. Uma delas já foi expulsa do Mc Donalds às 3 da manhã. O gerente afirmou que ali era um “ambiente de família, e que as crianças poderiam ter algum estranhamento”, mas naquela madrugada, assim como na maioria delas, não

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havia nenhuma criança lanchando naquele restaurante. Todas as entrevistadas reclamam do fato de não poderem andar a pé enquanto montadas, e ficam incomodadas com a associaão que certos homens fazem entre ser drag queen e a prostituição. “Se andarmos na Afonso Pena pela noite, ou em qualquer rua movimentada em BH, os carros param e o que mais tem é gente convidando para programa. Isso é muito incômodo!”, desabafou Heyder. Outra confusão feita é entre a denominação drag queen e travesti. “No dia a dia as pessoas duvidam da minha masculinidade, eu não sou drag todos os dias”, conta Lucas. “A drag queen é um personagem artístico, eu sou uma artista, faço performances e não me sinto na vontade de ser mulher”, foi o que relatou Safira. O cenário de Belo Horizonte para as drag queens começa a despontar agora. Grande parte delas não ganham cachê pelas suas performances. “O máximo que ganhamos é um off para entrar nas casas noturnas e consumação, quando ganhamos algum dinheiro é nas festas que nós mesmas organizamos e dividimos”, conta João Marcelo. E a montação não sai barata. Durante as entrevistas, era impressionante a quantidade de produtos de maquiagem neces-

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Reportagem

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reportagem - DRAG QUEEN sários para o contorno do rosto. As perucas precisam dar segurança que não vão sair durante a performance, uma boa peruca não custa menos que R$300. Uma montação de Jaddy não sai a menos que R$200 e o máximo que a maioria das entrevistadas já gastou foi mil reais. “Desde a primeira vez que vesti, senti que aquele era o meu mundo, olho no espelho e sinto que a Ja-

ddy é a forma artística do que quero ser”, é a motivação de João Flávio. “Se eu, o Lucas, pudesse dizer algo a Lua, eu diria obrigado por me fazer viver o lúdico de uma forma única e me fazer tão feliz”, afirama Lucas Taborda. Já Israel e João Marcelo têm em suas drags uma mecanimos de cura de algumas de suas crises depressivas. Com toda essa felicidade diante

da escolha, o sonho deles é que o mercado drag brasileiro cresça. E o recado que elas deixam é de que: “A heteronormatividade precisa acabar. Não somos radicalistas, nem queremos enfiar goela abaixo nossa realidade, só queremos que entendam que por de trás das drag queens existe um lado político, uma defesa das minorias e um interesse de gerar evolução.”

gLossáRio aNdRogiNia: Termo genérico usado para descrever qualquer indivíduo que as- suma postura social, especialmente a relacionada à vestimenta, comum a ambos os gêneros.

HeteRoNoRmatiVidade: Expressão utilizada para descrever ou identificar uma suposta norma social relacionada ao comportamento padronizado he- terossexual.

boYs/RotiNa de boY: É o “todo dia”de quem é drag queen. Momentos antes do glamour, a rotina como filhos, funcionários, e sem maquiagem.

moNtada/moNtaÇão: É o termo criado

dRag qUeeN: Homem que se veste com roupas femininas de forma satírica e extravagante para o exercício da profissão em shows e outros eventos ideNtidade de gÊNeRo: Identidade de gênero é a percepção que uma pessoa tem de si como sendo do gênero masculino, feminino ou de alguma com- binação dos dois, independente de sexo biológico. Trata-se da convicção íntima de uma pessoa de ser do gênero masculino (homem) ou do gênero feminino (mulher).

para nomear o processso de transformação, o momento em que se produzem, colam as unhas, a peruca e demais acessórios.

tRaNsFoRmista: Indivíduo que se veste com roupas do gênero oposto movido por questões artísticas. tRaNsseXUaL: Pessoa que nasce do sexo masculino ou feminino, mas que tem sua identidade de gênero oposta ao seu sexo biológico, assumindo papéis de gênero diferentes daquele imposto pela sociedade. Fonte: Manual de Comunicação LGBT (ABGLT)

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LEI MARIA DA PENHA: AVANÇOS E LACUNAS Dez anos após ser sancionada, ainda se pode encontrar algumas falhas na lei Por Lucas Pires, Marcella Teles e Ruan Nataniel Considerada pela Organização das Nações Unidas (ONU) como uma das três melhores legislações do mundo para o enfrentamento à violência contra as mulheres, a lei Maria da Penha, responsável por, na teoria, evitar milhares de casos de agressões, completou 10 anos em agosto deste ano. Apesar de bem-intencionada, a lei nem sempre atende às expectati-

Fotos: Divulgação

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vas e acaba gerando controvérsias. “Por não oferecer efetiva segurança às vítimas, são comuns relatos de várias denúncias contra o agressor, porém nada é feito efetivamente. As medidas protetivas não produzem a efetividade desejada, as casas de acolhimento não têm capacidade suficiente, sem falar nas dependências econômicas da vítima para com o agressor”, destaca o advogado He-

bert Caetano, especialista em crimes contra a mulher. Já é sabido que a maioria das leis do código penal brasileiro possuem deficiência em sua execução. Com a Lei Maria da Penha não é diferente. O drama vivenciado por V.A, 52 anos, é apenas uma das principais falhas que a lei apresenta. Ela relata que as agressões do ex-marido são recorrentes e ele continua impune. “Eu já o de-

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reportagem - Lei maria da penha nunciei e nada ainda foi feito. Já fui agredida várias vezes e, inclusive, tenho um histórico bem grande de medidas protetivas contra ele”. Na teoria, as medidas protetivas deveriam evitar a reincidência das agressões. No entanto, a falta de uma fiscalização efetiva faz com que o agressor não se intimide e volte a cometer o mesmo crime. “Na prática não existem medidas que vão impedir uma nova agressão. A mulher fica amparada apenas legalmente e o seu agressor sob uma ameaça de prisão. Portanto, as medidas protetivas só vão surtir efeito quando o homem se sentir atemorizado por elas”, diz o advogado criminal, Guilherme Orlando. Ainda segundo o advogado, a principal falha está em punir o agressor somente depois que o “leite for derramado”. O que leva o homem à agressão? Segundo a psicóloga Priscilla Gomes Rodrigues, especialista em psicologia comportamental, vários fatores podem levar um homem a se tornar violento e agredir frequente-

A cada 4 minutos, uma mulher é agredida no país. Por dia são 405 mulheres e no ano 147.691. Fonte: SUS mente sua parceira. A violência pode ser influenciada por fatores externos, influência cultural ou vivências familiares. Infelizmente não existe um perfil típico do agressor. Os fatores citados talvez possam explicar a violência contra a mulher praticada pelo parceiro, porém não as justifi-

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cam”, conclui a psicóloga. Apesar de toda controvérsia gerada pela lei, ela tem seus pontos positivos. O gráfico abaixo mostra que o número de denúncias vem crescendo desde sua implementação em 2006, mostrando que a lei está incentivando as mulheres a quebrarem o silêncio e denunciarem o seu agressor. Hoje as mulheres estão muito mais cientes de seus direitos e certas de que não precisam omitir uma violência doméstica. Em nota oficial veiculada ao site ONU Mulheres, o Consórcio de Organizações Não-Governamentais Feministas pela Lei Maria da Penha, juntamente com o Instituto Maria da Penha e a ONU Mulheres Brasil, afirma que “a Lei Maria da Penha é um legado feminista para o Brasil. A transformação profunda nas políticas do Estado brasileiro conduziu o direito de as mulheres viverem sem violência à centralidade do ordenamento jurídico nacional”.

Do ponto de vista jurídico, uma das maiores evoluções da lei tem sido sua atualização em relação a sua aplicação. “Antes, demorava até 48 horas para o juiz decidir sobre a necessidade de aplicação de medidas protetivas para com a vítima, o que desestimulava as mulheres de denunciarem seus agressores. Hoje um delegado pode aplicá-la”, conclui Hebert. Dez anos depois, o que se vê é uma lei bem-intencionada, mas que carece de mais alguns avanços para se tornar ideal

O que os homens pensam sobre a lei? Uma pesquisa realizada pelo Instituto Avon em 2013, sobre a funcionalidade da Lei Maria da Penha, mostrou que os homens conhecem tudo o que já foi conquistado pela lei, sendo que 86% deles acreditam que ela ajudou a reduzir a violência contra a mulher. Outros 37% acreditam que, por causa da Lei Maria da Penha, as mulheres os desrespeitam mais. Além disso, 81% dos homens são a favor de que a lei também seja usada para proteger homens que são agredidos por mulheres. A partir destes dados, podemos concluir que a maioria das pessoas não entendem o verdadeiro sentido da lei e tem uma visão distorcida dela. Grande parte dos homens não entendem que a Lei Maria da Penha veio para reduzir as diferenças de gênero.

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Subeditoria

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? o i d í c a r c o dem Por Amanda Magalhães Clara Barbi Jackeline Oliveira

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REPORTAGEM - DEMOCRACIA Um panorama da inconstitucionalidade das manifestações durante eventos internacionais; Olimpíadas Rio 2016 A Polícia, silenciosa, abordava os torcedores que estavam se manifestando, com gritos e dizeres nas camisas. Em meio a discussões, eram retirados, um por um, os mais “exaltados”. Por incrível que pareça, não estamos falando da década de 1960. Os gritos de “Fora Temer”, que antes ecoavam no enorme Mineirão, aos poucos se calavam. Intervalo do jogo de futebol feminino das delegações dos Estados Unidos e da França. Os gritos voltaram e, dessa vez, não havia camisas e faixas indicando onde começaram. Era geral. Por onde a proibição começaria? “Pela Constituição, nós temos a garantia de liberdade de expressão e manifestação política. (...). Porém, jogaram para nós leis estabelecidas pelo Comitê Olímpico Internacional em todos os países que recebem os jogos, o que é complexo. ” As leis citadas pela Prof. Dra. Regina Helena Alves da Silva, mestre em Ciência Política, estabelecidas pelo COI, proíbem quaisquer manifestações racistas, xenofóbicas, entre outras, durante os jogos olímpicos, inclusive manifestações políticas de qualquer tipo. As legislações específicas de grandes eventos, como Olimpíadas e Copa do Mundo, que se sobrepõe à Carta Magna, trouxeram esse embate direto com a liberdade de manifestação que nos é permitida. A Copa do Mundo 2014 e as Olímpiadas Rio 2016 tiveram regras e repressões diferentes, o que gerou ainda mais confusão na cabeça do brasileiro. A severa abordagem durante as partidas ocorridas durante os jogos olímpicos gerou enorme comoção social. A Prof. Regina Helena ainda destaca que “teve mais movimento contra a proibição do que

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efetivamente atos contra o governo nesses espaços. ” e estas repercutiram mais, mas, de certa forma, isto ajudou a fortalecer o movimento contra o atual governo. “Confesso que fui ao estádio mais para me manifestar do que por causa do jogo, se não fosse a repressão talvez eu não tivesse ido”. O discurso da manifestante com quem conversamos endossou ainda mais o ‘tiro no pé’ que foi a proibição dos protestos, como destacou a Prof. Regina Helena. Revistas. Todos deveriam passar por uma rigorosa revista antes de entrar nos espaços olímpicos. Ali eram retirados todos e quaisquer objetos, que poderiam ser utilizados para manifestar. Mochilas e blusas de frio. Era tudo revistado. Os torcedores apelaram, então, para a criatividade. Uma manifestante, que não quis se identificar, contou que ela e os filhos quiseram reforçar o coro “Fora Temer” durante a partida de futebol feminino, entre Brasil e França, no Mineirão. Anteriormente, souberam de episódios em que amigos foram barrados de entrar nos jogos, por causa de camisas com dizeres contra o atual governo, então tiveram que bolar estratégias para conseguir entrar. “Pintamos uma faixa e conseguimos camisas silkadas e adesivos. Comprei um pedaço de malha e pintamos os dizeres ‘Fora Temer’.” Segundo a moça, para não ter o material apreendido, ela entrou com a faixa enrolada no pescoço, como se fosse um cachecol, seu filho com camisa de time por cima da camisa silkada e a filha escondeu os adesivos que tínhamos conseguido no short. Outros torcedores chegaram a utilizar cartazes com dizeres de

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“Fora aquele quem o nome não deve ser dito”, fazendo referência à saga Harry Potter e seu vilão Valdemort, ou “Fora Coiso”. A criatividade extrapolava na hora de burlar a restrição e utilizar os direitos constitucionais. A manifestante entrevistada disse, ainda, que achou um absurdo ter que fazer isso, entrar com materiais na ilegalidade, mas que tiveram que proceder dessa forma para manifestar. “Achei descabida e autoritária a proibição”, ela conta. A moça estava indignada, disse que não teve medo de se manifestar, mas que pensava na segurança dos filhos, de 13 e 14 anos. “Para eles, criados com liberdade e num país democrático, era meio ridículo e surreal se submeter aos cuidados que eu estava tendo (esconder os materiais). Meu filho queria ir com a camisa e pronto. Minha filha queria colocar os adesivos. Eles viveram pela primeira vez o que é a repressão”, mas em nenhum momento tiveram medo. Durante o avanço do evento, o juiz federal João Augusto Carneiro de Araújo concedeu liminar proibindo a repressão de manifestações pacíficas nos jogos. Dessa maneira, liberava-se o uso de camisetas e faixas em aversão ao governo Temer, porém garantia o cumprimento da lei que proíbe as manifestações com mensagens ofensivas, de caráter racista ou xenófobo ou que estimulem outras formas de discriminação. A Prof. Regina Helena Alves da Silva admitiu que a liberação não amplificou nem diminuiu as manifestações, pois não era um movimento grande, eram grupos isolados que se organizavam, e estes não viam na proibição uma barreira

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reportagem

Uma história, um livro, várias vidas e anos de luta em busca da igualdade Por Ingrid Vieira

Angela Davis nasceu no estado do Alabama, em 1944 e desde pequena se interessou por todas as causas que envolviam a militância contra a discriminação racial. Cercada pelo preconceito, ela foi

Fotos: Divulgação

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estudar no colégio de Greenwich Village, Estados Unidos. A partir de então as causas, que na mente de uma criança eram pequenas, passaram a tomar proporções maiores e Angela percebeu que

precisava mudar a história de outras crianças e adolescentes negras. Em 1960 se torna militante no Partido Comunista e nos Panteras Negras. Os Panteras Negras eram um grupo revolucionário dos Estados

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reportagem - ANGELA DAVIS ganhou força com a música Sweet Black Angel (Doce Anjo Negro, em tradução literal) que a banda Rolling Stones compôs em homenagem à ativista. Angela Davis escreveu sua autobiografia durante os dezoito meses de prisão. Após a liberdade de Angela Davis, a luta do movimento Panteras Negras ganhou mais força e isso vem refletindo na vida de muitos até hoje. Como conta a fotógrafa Andrezza Cajá, de 20 anos, ativista das causas feministas e raciais. “A nossa luta é diária, quebrando preconceitos, estereótipos, ocupando posições de poder no mercado de trabalho e dentro das universidades. Angela nos deu essa oportunidade de debate”, afirma. Grandes histórias foram contadas durante sua vida e um de seus maiores livros, Mulheres, raça e classes chegou ao Brasil, no final de setembro pela editora Boitempo, como a primeira obra traduzida da autora.

“A nossa luta é diária. Ângela nos deu essa oportunidade de debate. ” Unidos que surgiu na década de 60 e lutava em busca da igualdade racial e protegia os direitos dos negros por todo o país. Davis entrou para o movimento que a principio era pequeno, mas logo tomou proporções enormes e conquistou mais adeptos da causa. Na década de 70, Angela já tinha feito muita história e passou a ser a terceira mulher procurada pelo FBI,

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a polícia federal norte-americada. Foi acusada de sequestro, homicídio e conspirações contra o governo. Sua prisão de dezoito meses aconteceu em Nova York em meados de outubro. Sua liberdade veio por meio de inúmeras manifestações, que resultaram na campanha intitulada “Free Angela Davis”, (em português, Liberte Angela Davis.) A campanha

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Mulheres, raças e classe foi publicado em 1981, nos EUA. Tratando de assuntos como escravidão, opressão das mulheres e combates raciais, traz uma reflexão mais aprofundada sobre as lutas de gênero e classe. Para a fotógrafa Andrezza, o livro é fundamental para tratar das lutas feministas e negras. “As análises dela sobre escravidão, prisão em massa da população negra, estupro e aborto contribuem muito para o

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ANGELA DAVIS

a discussão do debate racial.” O livro chegou ao Brasil pela editora Boitempo no final de setembro e visa mostrar os problemas enfrentados pela segregação racial. A obra serviu de exemplo e estudo bem antes de chegar ao Brasil. Sheila Botelho, 43 anos, administradora dos Agentes de Pastoral Negros (APN) diz ter trabalhado com o livro. “Em nossas formações das temáticas gênero e raça, os trabalhos da autora Angela Davis são sempre citados e dão base para ações argumentativas. O APN foi fundado com o propósito de impulsionar as lutas das comunidades e propor a conscientização dos direitos dos negros. A organização começou em 1983 e, desde então, leva

Fotos: Arquivo Pessoal

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esperança e luta para um país mais justo, em que a cor da pele, o cabelo e o gênero sexual não faça segregação. “O APN já tem 33 anos na luta pela promoção da igualdade racial e de gênero. Para mim é um orgulho pertencer a esta família. Temos mocambos em vários estados brasileiros e desenvolvemos trabalhos de informação, formação e amparo nas questões legais de racismo”, conta Sheila. Já Sarah Santos de 30 anos, assistente administrativa do APN conta com orgulho o quanto Davis foi e continua sendo sua inspiração. “Angela vem com toda sua força feminina mostrando o poder que temos para mudar nossa realidade. Ela me faz acreditar no futuro”, conta.

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Anos de luta em busca da igualdade A luta pelo negro vem de muitas décadas, passou por grandes transformações e atingiu lugares nunca imaginados, mas isso ainda é pouco comparado a tudo que enfrentam. O assédio moral ainda se faz presente e tem força na sociedade. Andrezza Cajá sofre abuso moral pelo seu cabelo e cor, mas, todas as vezes que isso ocorreu, ela continuou lutando, pegou todos esses momentos e usou para ajudar outras pessoas que sofrem com a opressão racial. “Já sofri discriminação em lojas consideradas de grife e em alguns lugares já fui mal vista por ter cabelo blackpower. Mas isso me serviu de incentivo para dar mais

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Foto: Léo Ruas

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força e valor à luta da mulher negra na sociedade.” Para Sarah, essa discriminação não foi diferente. Ela viveu com o preconceito durante toda sua vida, foi privada de participar de festas escolares e hoje conta com

Fotos: Arquivo Pessoal

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orgulho como entrou para a luta. “Quando criança sofria com o assédio moral. Eu, minhas irmãs e primas não podíamos participar de eventos como festa junina, desfile de sete setembro e raramente participávamos das aulas de educação física. Entrei na luta pelo DNA, é a herança de meus bisavôs, venho de família de congadeiros e, através do culto religioso, sempre praticamos a militância”. Sheila Botelho conta sobre o assédio que as mulheres negras sofrem por sua cor ser considerada mais forte e um atrativo sexual. “A mulher branca é pra casar e negra é para dar, isso é fato histórico. Mulher negra não tem sentimentos, não sofre, chora, ou ama! Esse direito foi negado a nós. Esse preconceito vem desde o tempo da escravidão.” As lutas são constantes e antigas,

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foram estabelecidas no Brasil desde a época dos quilombos. Com o tempo ganharam mais força e, em meio a tantas manifestações, foi criado o dia da Consciência Negra. Esse dia foi adicionado em 2003 no calendário brasileiro e passou a ser comemorado no dia 20 de novembro. A data foi escolhida por marcar o dia da morte de Zumbi dos Palmares em 1695. O dia procura trazer à tona a resistência do negro contra a escravidão. Mesmo com um dia dedicado à sociedade negra, ainda falta um longo caminho a percorrer; a luta é constante e diária. A sociedade negra continua sendo discriminada e alvo de forte preconceito por todo o mundo. É necessário que a população abra os olhos e se conscientize não apenas no dia 20 de novembro, mas durante os 365 dias do ano

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Foto: Arquivo pessoal

“Irmã de cor, não se culpe pelos assédios e opressões, ao invés disso, use como incentivo e força para se valorizar e lutar contra essa sociedade machista, racista e patriarcal. Alimente reportagem - CULtURA seu intelecto, quebre preconceitos. Procure desconstruir e reconstruir sempre. Respeite, admire e dê força a outras irmãs de cor. Lembre-se sempre: Ubuntu admire e dê força a outras irmãs de cor. Eu sou o que sou pelo o que nós somos. Seguiremos juntas.”

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reportagem

Respeitem-me: estou amamentando

Belo Horizonte tem lei que multa quem constranger ou proibir mulheres que amamenta em lugares públicos ou privados Por Bruna Lima e Pollyana Gradisse

Luciana Morais amamentando sua filha

Muitas pessoas, principalmente as mulheres, ainda não sabem que, desde 2015, uma lei multa aqueles que constrangem ou proibem as mães de amamentar em lugares públicos ou privados. Essa lei foi aprovada primeiramente na cidade de São Paulo, depois que uma mãe foi proibida de amamentar seu filho em público no Sesc Belenzinho, em 2013. A lei 10.940, de autoria do vereador

Fotos: Jessica Nerr

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Gilson Reis, do partido PCdoB, foi aprovada em Belo Horizonte e prevê multa de R$ 500 para quem desrespeitá-la. Desde o ocorrido em São Paulo, várias mães se reuniram em cidades do Brasil para realizar o movimento “A hora do Mamaço”, que tem como objetivo trazer a reflexão e a discussão à sociedade sobre a importância e os benefícios do ato de amamen-

tar seus bebês. Gabrielle Faria, de 29 anos, mãe da Ísis e do Hugo, de 9 e 3 anos de idade, facilitadora do movimento em Belo Horizonte, disse que já percebeu olhares vindos de homens enquanto amamentava dentro de ônibus e que também, há pouco tempo, foi constrangida por uma enfermeira enquanto estava com seu filho no hospital. A profissional de saúde afirmou que seu filho estava

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reportagem - comportamento

Gabrielle Faria e seu filho

internado porque estava sendo amamentado até os três anos de idade e que o leite não o sustentava mais. A pediatra Maria Elizabeth de Castro Bahia Alvarenga Soares afirma que é importante a amamentação, porque além de criar um vínculo afetivo entre mãe e filho, a mãe transfere os anticorpos que ela possui para o bebê. Além disso, explica que o leite materno é o alimento adequado para o bebê e não há outra fórmula que supra ou que o substitua, pois no leite tem tudo que o bebê precisa para se desenvolver. “Não há horário para o bebê se amamentar. Isso é determinado pelo bebê e é em livre demanda. Ele é quem faz seu horário. Nos primeiros três meses, ele mama com uma frequência muito grande, principalmente à noite e de madrugada”, ressalta a doutora. Gabrielle ainda disse que foi depois

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que sua filha mais velha, a Ísis, parou de amamentar, que ela teve problemas de saúde como rinite, sinusite e bronquite. Em uma pesquisa feita pelas participantes do movimento “A hora do Mamaço”, foi comprovado que a maioria de mulheres abordadas indevidamente por estar amamentando foi por outras mulheres, e não por homens. “Nunca fui assediada amamentando por nenhum homem, há olhares, mas eles ficam receosos e viram o rosto na hora. Nunca tive a preocupação de algum homem me procurar, dar uma cantada ou fazer algum assédio sobre meu seio por eu estar amamentando, muito pelo contrário, eles respeitam muito mais que as mulheres. O índice de preconceito, de machismo feminino, é muito alto, questão de cultura, como foram criadas. Infelizmente isso acontece demais”, declarou Gabrielle.

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Com a aprovação da lei e a penalidade de multa para quem importunar as mães amamentando, Gabrielle acredita que haverá uma significativa mudança no comportamento dos constrangedores. “Quando se mexe no bolso acabamos mexendo no comportamento da sociedade e claro que a mulher se sentindo mais segura ela consegue fazer com que um ato tão natural seja feito como deve ser feito, naturalmente”. Mas, a facilitadora do movimento “A hora do Mamaço”, junto com outras mães, não se dão por satisfeitas, querem ir além com as conquistas. Segundo ela, o grupo irá se empenhar para que a lei se torne estadual. Por intermédio de seu assessor de imprensa, o vereador Gilson Reis, autor do projeto, disse como foi seu contato com as mães do movimento

Fotos: Jéssica Nerr

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comportamento

QUEM ERA A PESSOA QUE TE ABORDOU?

Homem

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0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100% “A hora do Mamaço”. “O “Mamaço” surgiu em minha agenda depois que conheci e comecei a acompanhar a realidade de várias mães que militam em grupos e movimentos que lutam pelos direitos das mulheres na cidade. Li relatos de mães que foram constrangidas por amamentarem seus bebês em locais públicos. Sou pai há pouco mais de um ano, então essa situação atinge todas as mulheres que conheço, inclusive minha filha. Tivemos até uma situação absurda em BH, em que uma servidora em greve foi impedida de amamentar seu bebê. Todos esses conjuntos de questões me levaram a elaborar o projeto, pois assim rege diversos documentos internacionais de direitos humanos, entre eles a “Declaração de Innocenti” criado em 1990, em um encontro organizado pela OMS e UNICEF que protege a mulher que amamenta no trabalho”. O Vereador também falou que durante o processo de aprovação da lei, tiveram que batalhar para que ela entrasse em pauta e que fosse votada pelos vereadores. Além disso, foi necessária intensa mobilização

Fotos: Jéssica Nerr

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de mulheres, que foram à Câmara Municipal com seus bebês para reivindicar esse direito. “A minha expectativa é que nenhuma mãe seja proibida de amamentar seu filho e que essa cultura machista que dita o lugar que a mulher deve ocupar na cidade suma totalmente para que tenhamos um mundo de fato melhor para todas as belo-horizontinas”.  O movimento “A hora do Mamaço”contribuiu muito para que essa conquista fosse alcançada. Se-

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gundo a representante, o movimento se realizará normalmente, mesmo após a aprovação da lei, pois há muitas coisas a serem feitas, há outros objetivos a serem alcançados. “A aprovação da lei é uma conquista de um movimento feito em 2014.”Além disso, o movimento influenciou bastante em sua vida pessoal. “O movimento Mamaço e o grupo Gestar mudaram minha vida em 360° graus porque eu aprendi a ter mais capacidade de ser mãe, de entender outras mulheres a serem mulheres, a serem mães. Aprendi que nem todo mundo tem as mesmas respostas para seus desejos porque eu posso querer uma coisa, mas, no final, não alcançar aquele objetivo. Não porque eu não tentei ou não quis, mas porque era aquele destino. Trabalhar com outras mulheres, ajudá-las voluntariamente mudou muito minha relação comigo mesma, comigo Gabrielle mulher”, conclui. A lei foi sancionada pelo prefeito Márcio Lacerda em junho de 2015 e, segundo o vereador Gilson, se alguma mãe for constrangida ou proibida de amamentar, ela deverá chamar a polícia e registrar ocorrência em qualquer delegacia, assim o constrangedor será multado pela Prefeitura de Belo Horizonte

Paty Chaves integrante do movimento amamentando em público

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“SEMPRE TENHAM EMPATIA PELAS PESSOAS” Ex-aluna da Fumec e coordenadora do G1/MG, Cintia Paes revela experiências profissioanis e orienta alunos sobre a profissão jornalística Por Pietra Pessoa Ex-aluna da Fumec, Cíntia Paes Oliveira, 34 anos, ocupa o cargo de coordenadora do G1 MG, em Belo Horizonte, desde 2010, quando foi promovida. No entanto, sua carreira na TV Globo começou há quase 14 anos, antes mesmo de se formar em Jornalismo. Em setembro de 2016, Cíntia Paes esteve na FUMEC para uma palestra em que contou um pouco de sua história na Rede Globo, relatando algumas experiências, quando teve que tomar decisões difíceis e delicadas que, segundo ela, afetavam a vida do próximo. Com isso, acabou dando conselhos para os alunos em relação a suas futuras atitudes como profissionais que formam opiniões e possuem influência sobre a sociedade. Em entrevista com a equipe da Ponto e Vírgula, a jornalista falou um pouco sobre seu trabalho, da importância da FUMEC em sua formação, dos caminhos que trilhou até chegar onde está hoje e ainda deu dicas para alunos que, assim como ela, querem seguir com a profissão de jornalista. Confira.

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Cíntia Paes, coordenadora do portal do G1 em Minas Gerais.

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Fotos: Reprodução/Arquivo Pessoal

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cíntia paes

- entrevista

Cintia Paes participa do lançamento do “Conecta” e palestra sobre comportamento e ética jornalística

Como é a sua rotina no G1? A rotina do G1 é bem corrida. Acordo cedo para acompanhar as notícias da manhã e organizar a pauta do dia com a equipe que começa às 6h. Depois, durante o dia, acompanhamos as notícias factuais mais importantes até as 23h, além de publicar os vídeos dos telejornais da TV Globo Minas. Além disso, fazemos reportagens especiais.

Em que a formação em jornalismo, mais precisamente na Fumec, ajuda a executar suas tarefas no trabalho? O início do meu estágio, na TV Globo Minas, e o fim do curso na Fumec se confundem. Pude, na Fumec, experimentar e conseguir experiência para começar a trabalhar com internet na TV Globo Minas. Ser monitora do laboratório de jornalismo digital da faculdade foi de extrema importância para o meu co-

Fotos: Bruno Costa

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nhecimento e para a minha carreira.

Quais caminhos você percorreu até chegar onde está? Antes de ser estagiária da TV, fui estagiária e assessora do IETEC (Instituto de Educação Tecnológica). Na TV trabalhei, com o jornalismo digital, para a Globonews Online e também no plantão de notícias do Globo Online. Depois, fui responsável pelos dois sites da Globo Minas até ser promovida a supervisora do G1.

Você tinha alguma perspectiva de contratação desde o início? Tinha a expectativa, mas não acreditava muito. Trabalhei sem pensar na contratação. Quis aproveitar ao máximo o estágio.

Você sempre almejou a área

voltada para jornalismo virtual, ou esse desejo foi construído pela experiência? Esse desejo foi construído pela experiência. Eu sempre quis trabalhar com rádio.

Como você vê a profissão de jornalismo em relação as mudanças atuais? Vejo o jornalista cada vez mais forte e mais responsável pelo que publica. Mesmo com a extensão da internet, em que todos são produtores de conteúdo, a responsabilidade do jornalista vai além, e é cada vez mais importante para a sociedade.

Quais dicas você poderia dar para os alunos sobre a profissão jornalística? Leiam, leiam de tudo, até bula de remédio. Tenham empatia pelas pessoas. Sempre

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eNTREVISTA

Nadica de

Nádia

Em entrevista, a digital influencer conta sobre suas experiências além curso e as novas opotunidades, como a participação no programa Super Bonita, do GNT Por Joana Spadinger e Rodrigo Oliveira

Nádia Schmidt, 24 anos, é dona do canal Nadica de Nadia, no YouTube. Seu vídeo mais visto passa dos 400 mil views. Ex-aluna da Universidade FUMEC, Nadia hoje,

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além de administrar seu canal, cria conteúdos para outros sites e parceiros. Recentemente fez uma participação no programa Super Bonita do canal GNT. Sua personalidade transita entre a meiguice de seus cabelos curtos aos temas polêmicos em que dá opiniões bem estruturadas sobre assuntos caros ao funcionamento da sociedade. Ela fala de moda, cabelo, beleza, lifestyle, feminismo, emponderamento. No final do curso idealizou e executou a construção da revista Bia, um produto à la Nádia: escrita leve para assuntos complexos. Uma excessiva preocupação com seu conteúdo; suas abordagens e a escolha a dedo de seus protagonistas. Um produto de personalidade. Interesses pessoais à parte, Nádia conta em entrevista a Ponto e Vírgula sobre suas experiências além curso, os caminhos que anda trilhando e os desafios que a esperam na consolidação de seu canal no YouTube – um exemplo necessário para quem quer conhecer

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mais sobre este universo do home office digital.

Quando você ainda estava na faculdade, você trabalhava, fazia estágio. Como era sua vida acadêmica? Eu já iniciei o curso de jornalismo sabendo que o que eu queria era focar na área da moda. Como conhecia pessoas que trabalhavam neste ramo em Belo Horizonte, fui construindo uma rede de contatos que sempre me ajudaram a conseguir trabalhos, além de estágios, fiz muitos freelancers. Durante meus quatro anos de curso, fui muito ativa e consegui colocar em prática o que aprendia nas aulas. Todas as minhas experiências foram bastante enriquecedoras, eu me esforçava para aprender o máximo que podia com os profissionais que convivia. Nos primeiros dias de aula do primeiro semestre, procurei o coordenador Ismar Madeira, me apresentei e mostrei para ele quais eram meus objetivos profissionais

Fotos: Reprodução/Arquivo Pessoal

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NáDIA SCHmIDT e acadêmicos, ele foi um alicerce, inclusive me indicou para trabalhos dentro da Rede Globo Minas, durante dois meses trabalhei como figurinista para a emissora. Uma outra porta incrível que se abriu para mim foi ter conhecido a escritora e blogueira mineira Cris Guerra. Durante dois anos trabalhei para ela, uma mulher que me apresentou muitas pessoas da área da moda no Brasil e que me fez aprender muito sobre este meio. Nunca deixei minha faculdade de lado, mas meu foco sempre foi colocar em prática, me dedicava à faculdade, mas meu foco principal era acumular experiências.

sionais e trajetórias, pegar dicas, etc. Ter feito contato com professores, coordenadores, alunos, mostrando às pessoas quais são seus objetivos e sonhos foi muito importante. Foi assim que criei laços que me fizeram ser uma pessoa e profissional melhor. Por meio de feedbacks, percebi e aprendi uma série de trabalhos que não teria alcançado sozinha. Esta é uma lição que eu percebo que os alunos em geral não dão a devida importância, e deveriam.

“Adoro escrever, e, quando escolhi ser jornalista, decidi focar na moda”.

A faculdade acabou e agora você esta inserida no mercado. O que mudou para você?

- eNTREVISTA

Você administra um blog e um canal no YouTube bem acessados. Dá para tirar uma grana ou não? Na realidade, atualmente eu trabalho apenas com o Youtube, desativei meu blog porque precisei focar em apenas um para fazê-lo bem feito, e optei por este tipo de mídia. Sou muito grata e orgulhosa do meu trabalho, meu canal é bastante acessado e eu ganho dinheiro através dele. Meu foco principal é que em 2017 ele seja minha principal fonte de renda. O processo é um pouco lento, já faz dois anos que tenho meu canal e só por agora estou conseguindo tirar um bom dinheiro. Tem que ter paciência e principalmente tem que trabalhar muito! É necessário criar

Agora que estou formada penso e me preocupo mais do que nunca com meu futuro. Estou formada, sobra tempo total para eu poder me dedicar com afinco aos meus objetivos. Trabalho em casa, sou minha chefe, faço criação de conteúdo para a internet, para alguns clientes e tenho maior disponibilidade para me dedicar ao meu canal no Youtube, Nadica de Nadia. Quero muito levar o canal para frente, que me trouxe muitas oportunidades e que eu amo fazer. Mas acho que a principal mudança é encarar que estou no mercado de trabalho e que preciso focar na minha vida adulta.

O que você aprendeu na faculdade e que está aplicando agora ? O que eu aprendi de mais importante na faculdade é que tudo na vida é network, fazer suas redes de contato é fundamental. Conhecer pessoas, conversar, ter interesse sobre qual são as histórias de vida delas, entender seus planos profis-

Em seu canal, Nádia fala sobre cabelo, moda, autoestima e liberdade: tudo voltado para o universo feminino de maneira leve e bem-humorada

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eNTREVISTA - NÁDIA SCHmIDT foco e insistir nele. A internet é muito 8 ou 80, ou você explode instantaneamente ou vai colhendo os frutos e conquistando seu espaço devagar, que é o meu caso.

Como foi pra você aparecer participar do Super Bonita no canal GNT? Ter feito parte de um programa no GNT foi uma das coisas mais bacanas que me aconteceram em 2016. Além de me dar uma confiança maior no meu trabalho, vi que as pessoas estão me dando credibilidade, que estou crescendo e me senti muito alegre por perceber que o que eu estou criando na internet está sendo reconhecido. Gosto sempre de pensar como vai ser o futuro e como posso aproveitar o máximo das situações. Neste caso, por exemplo, em como vou utilizar minha aparição em um dos canais mais influentes e bem produzidos do Brasil. Desejo um pouco mais para frente fazer mestrado relacionado ao tema comportamento feminino e aparição das mulheres na mídia, que é o que eu estou fazendo; apareci em um programa de televisão cujo assunto principal foram mulheres.

é ver a profissão de fora da Universidade?

O que podemos esperar da Nádia para o próximo ano?

Eu acredito que o jornalismo é uma área que é muito aberta e muito fechada ao mesmo tempo. Às vezes você não vai ter as oportunidades que você quer; então você terá que criá-las. Não sei se me encaixo nos formatos do jornalismo tradicional, redação, assessoria de imprensa etc. Sou muito criativa, queria trabalhar com algo que me permitisse criar novas possibilidades e que me desse liberdade de expressão. Acho que é muito importante que já na faculdade você decida por qual área seu coração bate mais forte, assim, a partir deste momento, vai ser mais fácil para procurar um emprego.

Vou produzir muito contéudo! Estou apenas começando. Meu objetivo é criar conteúdos de relevância que tenha a minha cara, sejam diferenciados, levem informações reais, verdadeiras, mais gente-como-a-gente. Focado em mulheres, feminismo, autoestima, beleza. Não quero parar de estudar; parada não vou ficar. Penso seriamente em levar meu projeto de TCC à frente, não como produto revista, mas como um projeto acadêmico, penso em transformá-lo em um mestrado e aprofundar meus conhecimentos no assunto mulher na mídia. Estou com todo gás!

Seu trabalho de conclusão de curso foi um produto. Você elaborou uma revista. Qual o motivo dessa escolha? Eu sempre amei revistas, desde bem nova! Durante toda a minha vida foi a minha fonte principal de informação. Na Fumec eu participei da monitoria, graças a ela e ao professor Aurélio Silva, aprendi muito sobre como se produz uma revista, a enxergar qual é o público-alvo, a diagramar etc. Tudo isso me fez não precisar pensar duas vezes sobre o que seria meu TCC.

Quais agora são seus desafios como jornalista? Como

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Em 2017, Nádia promete rechear seu canal Nadica de Nadia com muita coisa boa

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reportagem

DIETA para CURA DO Câncer é pouco divulgada O protocolo de Budwig foi desenvolvido pela bioquímica alemã Johanna Budwig na década de 50, por sete vezes foi indicada ao Prêmio Nobel de Medicina, mas suas contribuições para combater a doença não são reconhecidas oficialmente Por Bruno Riccelli e Caio Oliveira Moraes A gordura da semente de linhaça é a chave deste protocolo simples e natural, mas, para aplicá-lo, é preciso entender como o câncer se inicia. O corpo do ser humano é composto por células que crescem, depois se multiplicam e em sequência morrem. Ao longo da vida, essa multiplicação diminui sua velocidade e a maioria das células passa a ter uma função de substituição daquelas consideradas mortas ou em estado de depreciação. Quando as células de um órgão ou tecido crescem de maneira desordenada, isto é, sem nenhum tipo de controle, inicia-se o câncer. Com o dano no DNA, as células se

tornam cancerosas. Johanna Budwig percebeu que os pacientes com câncer possuíam baixa presença de Ômega 3 e Ômega 6, além de baixa imunidade. Com isso, o protocolo de Budwig sustenta o uso de vegetais frescos para a recuperação destes nutrientes, mas não é somente isso, é necessário que haja ingestão do óleo da linhaça com o queijo cottage, dessa maneira vai haver o fortalecimento da respiração celular, enfraquecendo o câncer. Também é recomendável a prática de exercícios leves e a exposição ao sol de maneira consciente por duas vezes ao dia, de 10 a 20 minutos;

também é importante a limpeza intestinal. O protocolo orienta que o consumo de produto animal é permitido desde que seja orgânico. A designer de interiores Leila Florentina, 47, teve câncer e utilizou o protocolo para o tratamento da doença. “Minha cura levou aproximadamente um ano, uma pessoa a quem passei as mesmas dicas, curou-se em 40 dias”, afirmou a designer. Hoje, Leila ajuda pacientes diagnosticados com a doença, dando dicas no tratamento com o protocolo de Budwig. Como foi o caso da mãe do designer gráfico Márcio Coutinho. “Perguntei sobre a situação da

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reportagem - CÅNCER minha mãe e o oncologista disse que ela teria de 3 a 6 meses de vida”, disse Márcio. Com esse diagnóstico, Márcio começou a pesquisar sobre outras formas de tratamento e em um fórum de discussão encontrou Leila. A mãe de Márcio seguiu a dieta do protocolo de forma disciplinada e depois fez a ressonância. Para a surpresa do médico, não havia nada. Hoje, ela faz o procedimento de 4 em 4 meses e segue a dieta, mesmo já tendo o controle. Uma médica que não pôde se identificar por medo de perseguição da indústria farmacêutica defende a medicina funcional e disse que utiliza e recomenda o protocolo de Budwig. Ela afirmou que pode fazer o tratamento do protocolo em conjunto com as tradicionais quimioterapia e radioterapias. A médica argumentou que a medicina brasileira age com ignorância ao desprezar os métodos que não vem da indústria farmacêutica.“A medicina brasileira é complicadíssima, tudo é recomendado pela indústria, rejeitando a alimentação correta, penso que seja um ato de ignorância. A medicina tradicional é maldosa, quando ela chega no limite, tira a esperança”. A médica disse ainda que a medicina funcional é perseguida. Há pouca divulgação e os especialistas preferem não falar sobre o assunto com o receio de sofrer represálias ou por falta de interesse. Desta maneira, o tratamento proposto pela bioquímica Johanna Budwig segue pouco conhecido e assim dificulta a chance de a sociedade alcançar o controle dessa doença. A ANVISA foi procurada, mas ninguém respondeu sobre o protocolo de Budwig, assim como a Sociedade Mineira de Medicina, ambos contatados via e-mail e telefone. O protocolo também pode ser utilizado para tratamento de artrite, artrose, esclerose múltipla e hipertensão arterial

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QUEM FOI JOHANA BUDWIG?

Johanna Budwig nasceu no dia 30 de setembro de 1908, e morreu no dia 19 de maio de 2003. Foi uma bioquímica alemã, fisicista e com doutorado em Física; por 7 vezes indicada ao Prêmio Nobel de Medicina. Concentrou seus estudos fortemente nos óleos e gorduras, chegando ao controle de doenças degenerativas através de elementos naturais. Johanna Budwig publicou livros e artigos sobre os seus estudos. Ela queria que todos soubessem das conclusões que chegou, mas só apareciam interessados que desejavam o lucro; sendo assim, recusou estas propostas. A doutora também sofria com a indústria farmacêutica. Era silenciada, pois seus estudos não se alinhavam aos interesses médicos. Entre os livros que a Dra. Johanna Budwig publicou está Câncer - O Problema e a Solução. A alemã teve uma queda em casa e depois teve seu quadro piorado até que chegou ao óbito em 19 de Maio de 2003.

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ensaio

Por Catherina Dias e Sara Lacerda Com quantos rostos você se depara diariamente ao sair às ruas? Incontáveis, imaginamos. A diversidade existente em uma cidade como Belo Horizonte, que tem milhões de habitantes,

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é admirável. Cada rosto tem em si algo incomum, algo único que a singulariza. Sua história você carrega em seus traços, está escrita em seus olhos, explícita em seu rosto.

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reportagem

Mãos que ajudam Dupla de amigas idealizam um projeto que recebe doações em troca de massagens para diversas instituições Por Camila Madeira e Rafael Passos

Equipe de massoterapeutas do projeto Massagem Solidária após a realização da terceira edição do evento

Sabemos que no mundo há sempre alguém que precisa da nossa ajuda, vemos diariamente projetos e ações solidárias que beneficiam o próximo. Inspiradas num projeto que arrecadava alimentos em troca de massagens, as amigas massoterapeutas Wysla Mesquita, 29 e Raquel Lima, 31, idealizaram o “Massagem

Solidária”. O projeto nasceu em 2015, ano em que Belo Horizonte passou por um inverno rigoroso. Sabendo disso e pensando nos moradores de rua que necessitam de agasalhos e cobertores, elas decidiram recolher doações em troca de massagens. Imaginando que a demanda seria grande, elas resolveram

Fotos: Reprodução Facebook Massagem Solidária

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ampliar a ideia reunindo um grupo de massoterapeutas voluntários para a realização de um evento que atendesse um público maior. Sem renda ou patrocínio, o objetivo era apenas promover o bem, mas não sabiam como começar; precisavam de voluntários, material, estrutura, divulgação e local para promover o

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reportagem - PROJETO SOCIAL evento. O primeiro passo foi reunir amigos para ter a mão de obra definida. Eles cederam alguns materiais necessários, mas ainda faltava o local, que inicialmente seria em uma praça pública. No entanto, elas se depararam com a burocracia para conseguir um alvará da prefeitura e então buscaram um local privado. A Clínica Espaço Semente onde Wysla trabalha, localizada no bairro Sion, apoiou a iniciativa desde a sua primeira edição e se tornou a sede oficial do Massagem Solidária. O evento já teve quatro edições, tendo a última sido realizada no dia 07 de agosto, das dez da manhã às três horas da tarde e beneficiou o trabalho autônomo de Elizângela Geo, que protege e cuida de animais abandonados. Foram arrecadados vermífugos e ração para cães e gatos. Em entrevista à Ponto e Vírgula, Wysla relatou que os eventos foram um sucesso e que a ação alcançou o objetivo proposto. No evento de agosto, elas puderam contribuir ainda mais: “De acordo com o tema abordado, procuramos ampliar a ajuda e conciliamos o projeto a uma feirinha de adoção. Mas, em regra, nosso objetivo é realmente arrecadar itens para doar”. As outras três edições ajudaram moradores de rua e famílias carentes, o Grupo de Apoio a Pacientes Oncológicos de Passos e Região (GAPOP – R), e também o Abrigo Lar Cristão. Hoje o projeto possui uma equipe fixa para sua realização, e graças as redes sociais outros profissionais conheceram a iniciativa e se disponibilizaram para integrar a equipe. Atualmente são trinta massoterapeutas e cada edição conta com treze deles, além de voluntários que dão suporte na preparação, na realização e no pós evento. Um evento deste porte é mais trabalhoso do que aparenta, pois requer, além do comprometimento dos responsáveis, recursos indispensáveis para sua execução, tais como

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material de divulgação gráfica, material descartável, cadeiras e macas de massagem, produtos de higienização e lanches para a equipe. Nem sempre é possível conseguir tudo isso através de empréstimos e doações, alguns itens as massoterapeu-

Massagem com pedras quentes

tas arcam com o próprio dinheiro. As instituições ajudadas pelo projeto são escolhidas oportunamente. Wysla e Raquel procuram se informar, conhecer e visitar as entidades que pretendem amparar e, na hora de escolher as datas para realização, consideram sua disponibilidade e o fato de não coincidir com nenhum feriado ou data festiva. As idealizadoras contaram que geralmente se programam com cerca de três meses de antecedência e pretendiam realizar duas edições por ano, mas, devido ao sucesso que tiveram até então, o objetivo agora é passar para três edições anuais. Incialmente só um tipo de massagem era oferecido, a Quick Massage que é “uma massagem rápida própria para se fazer em eventos e que mesmo em pouco tempo é capaz de proporcionar bem-estar”, como explicou Wysla, mas, com a integração de

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novos massoterapeutas, vem surgindo a oferta de outras técnicas como pedras quentes, aurícula acupuntura e relaxamento da face e dos pés. As massagens podem ser feitas em pessoas de todas as idades, mas Wysla atenta para algumas restrições: “Basicamente a massagem é contraindicada para hipertensos sem controle e grávidas nos três primeiros meses de gestação. Já a aurícula acupuntura não é indicada somente em casos de alergia ao material utilizado”. A divulgação do Massagem Solidária é feita, segundo as organizadoras, principalmente pelas redes sociais (Facebook e Instagram) devido ao seu maior alcance, e também com outras mídias, como uma delas explica: “Já mais próximo da edição acontecer também recorremos à panfletagem na região do local do evento, colocamos um banner na clínica e enviamos mensagens pelo whatsapp no grupo de pessoas cadastradas e contamos com o apoio de algumas mídias como SouBH, BhAZ e Rádio América 750AM”. O público pode se inteirar sobre o projeto e sobre as próximas edições através do Facebook e do Instagram

Wysla Mesquita e Raquel Lima, criadoras do projeto

Fotos: Reprodução Facebook Massagem Solidária

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reportagem

eSPERAR não é mais uma opção Com o país em crise, empreender se tornou uma saída para jovens que desejam crescer profissionalmente. Cria-se mais, em vez de esperar que as oportunidades apareçam. Por Sara Lacerda e Rachel Silveira Quem deseja ter sucesso nos dias de hoje precisa se aventurar. É necessário não ter medo de buscar uma alternativa para as vagas de emprego escassas e a falta de opção no mercado de trabalho. Por mais difícil que seja abrir um negócio, a possibilidade de um retorno a longo prazo é o que motiva seguir este caminho. A quantidade de jovens que têm empreendido cresceu ao longo dos últimos anos, já que muitos destes não podem esperar as oportunidades e optam por criálas. Para se tornar um empreendedor, depende-se do momento ideal e não da idade certa. Uiara Freitas tem 21 anos, é estudante de Direito e decidiu se tornar empreendedora aos 18 anos. A escolha de não esperar até estar formada para concretizar um sonho antigo é o que tem a deixado realizada por estar investindo em algo por que é completamente apaixonada: moda íntima. Criou uma marca chamada “Uiara Intimates” e afirma que seu plano é compartilhar com todas as mulheres um pouco do que elas são através de cada peça: “lindas, românticas, delicadas, divertidas e sexy”. Para Uiara, entrar no ramo de empreendedorismo foi algo repentino e que ocorreu sem que tivesse experiência nesta área de atuação. Segundo ela, o principal motivo da concretização de sua própria marca diz respeito ao desejo de transformar sua paixão em algo que lhe trouxesse independência financeira. “Eu poderia vender roupas ou joias, mas acredito que nada veste melhor uma mulher que a lingerie certa. E após alguns anos de trabalho com diversas marcas excelentes, tive a ideia de criar minha própria marca.” Hoje, além de uma loja online, Uiara possui uma equipe de revendedoras e pretende, em breve, expandir seu negócio abrindo lojas físicas e consolidando sua marca. Segundo o administrador de empresas

Fotos: Arquivo Pessoal

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Uiara Freitas em evento promovido por sua empresa

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reportagem - jovens empreendedores Glaycon Oliveira, o jovem deve buscar um preparo antes de se tornar um empreendedor e ainda mais, ter conhecimento sobre a área na qual deseja exercer; “seja através de cursos, palestras ou visitas a empresas, o empreendedor deve buscar o máximo de informações no ramo que deseja atuar. A elaboração de um plano é essencial antes de colocar o negócio para funcionar”, conclui. Em 2001, William Lacerda, com apenas 24 anos, decidiu se arriscar no mundo dos negócios, montando sua própria barbearia para um público restrito e de boa condição financeira. A Barbearia Shalom se encontra na Rua Barbosa de Rezende, 89, no Bairro Grajau. Atualmente, ele acredita que se facilitou a imersão dos jovens no mercado de trabalho, já que agora há programas especializados para auxílio na hora de começar a empreender. Prova disto é o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE), que possui cursos de educação empreendedora para todos os níveis de ensino, programas voltados para startup e empreendedorismo digital com o intuito de instruir quem deseja abrir sua própria empresa. Uiara, que fez o uso do serviço, afirma: “Eu escutei muitas pessoas sábias, busquei informações sobre como legalizar e administrar minha empresa

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no SEBRAE-MG, e fui adaptando as minhas ideias no que acreditava ser o melhor caminho”. A necessidade de um programa como esse, de acordo com Glaycon, “geraria um impacto positivo se os novos empreendedores estivessem preparados para abrir e manter o negócio aberto visto que haveria geração de diversas vagas de emprego. Por outro lado, quanto mais empreendedores despreparados, mais empresas são fechadas, e consequentemente mais pessoas ficam desempregadas” Segundo o analista de educação e empreendedorismo do SEBRAEMG, Claúdio Afrânio, o número de jovens empreendedores e que procuram os serviços do SEBRAE aumentou consideravelmente. Para ele, “o empreendedor jovem tem características peculiares. Como cresceram na internet, geralmente são pessoas conectadas, que têm facilidade para colaborar e atuar em rede. São autodidatas, com grande capacidade de executar e transformar ideias em produtos e serviços em ciclos curtos. O empreendedor jovem tem mais possibilidades de correr riscos e experimentar. Uma estratégia interessante é usar empreendedores maduros como mentores para quem está iniciando”. Em um momento como o atual, para empreender é preciso ter em mente o ramo que pretende

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atuar. Abrir um negócio pode ser uma forma de fugir do desemprego, ou de ganhar um salário melhor. Empreendedores que se dão bem em momentos como esse são aqueles que enxergam as oportunidades nas limitações, que não se deixam abalar e que possuem uma capacidade de adaptação. Os jovens no mundo do empreendedorismo é algo fantástico. Se você é jovem e tem um desejo como esse, não tenha medo de arriscar! Mesmo tendo acontecido há pouco tempo e de forma repentina para Uiara, ela considera que essa aventura é responsável por sua realização pessoal “A nossa geração é muito limitada. Não abre seus pensamentos e muita das vezes não luta pelos seus próprios sonhos. Às vezes é limitada pelos próprios pais, porque estes acreditam que realizar-se no filho é um caminho bom. Mas existe um mundo bem amplo quando acreditamos em nós mesmos. Existe algo além de cursar uma faculdade, curtir com os amigos em baladas, ter um carro, um apartamento e posteriormente, quem sabe, constituir uma família. O momento de investir em nossos projetos é agora! Isso pode mudar nossa vida de uma forma muito positiva. A saída é utilizar o que temos para trilhar um caminho de muito sucesso. Eu tenho minha juventude!”

Fotos: Arquivo Pessoal

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REPORTAGEM

Por Ayllana Ferreira Em uma época em que ser empreendedor é o diferencial dos profissionais, pesquisadores e empresas unem criatividade e sustentabilidade na elaboração de produtos, com a possibilidade de melhorias ambientais. Conforme a definição do dicionário-online Significados, “Sustentabilidade quer dizer o bom uso dos recursos da terra, dar suporte a alguma condição, a algo ou alguém em alguma tarefa”, sendo a grande aposta para o século XXI. Empresa dinamarquesa e pesquisadores da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) associam empreendedorismo e sustentabilidade no desenvolvimento de produtos ecológicos visando a mudanças ambientais, tais como um lápis com sementes, e a substituição de cana-de-açúcar por óleo de pequi na produção de Biodiesel. O primeiro fabrico é uma criação dinamarquesa. O lápis SPROUT promete produzir ervas, vegetais ou

flores ao ser inserido em um ambiente com umidade, e posteriormente germinado. Imagina se a cada lápis perdido ou jogado fora, uma planta nascesse no seu lugar? “O produto é uma excelente ilustração do princípio de sustentabilidade. Ele representa a forma com que utilizamos um objeto que não possui mais utilidade, sendo reaproveitado ao invés de descartado. No caso, você o planta e literalmente está dando uma nova vida”. Afirma Michael Stausholm, empreendedor responsável pela descoberta do protótipo desenvolvido por três alunos da Massachusetts Institute of Technology (MIT). De acordo com os representantes da empresa, ao criar tal iniciativa, o principal objetivo era associar um item corriqueiro a um ideal sustentável. Reduzir os danos da produção de eucalipto é sempre um bom investimento, porém, enquanto alternativas que solucionem totalmente esse

problema não são criadas, apostar nessa iniciativa é uma forma de dar um significado e uma função a algo que só se tornaria lixo. Os lápis ecológicos possuem quatro sementes distribuídas na sua forma, sendo possíveis 11 espécies distintas de plantas. Em até 28 dias as sementes podem germinar, iniciando o seu processo de crescimento. No site Coctulachannel há uma entrevista feita com um dos representantes da empresa. Este afirma que o invento é um grande sucesso, tendo vendido mais de 800 mil artigos em 6 meses, além de sua adesão em 40 países. Já o segundo fabrico é um biocombustível derivado de óleo de pequi que ainda está sendo testado. A pesquisadora do programa de PósGraduação em Biocombustíveis da UFVJM, nível Doutorado, Juliana Rocha de Meira, concedeu uma entrevista explicando os benefícios da substituição do composto pelo biodiesel tradicional.

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REPORTAGEM - SuSTENTABILIDADE “A parte comestível do fruto do pequi é a polpa, enquanto o caroço, rico em óleo, é descartado. O programa de Pós- Graduação em Biocombustíveis da UFVJM possui a linha de pesquisa Coprodutos da linha de produção dos biocombustíveis que visa buscar o potencial dos resíduos gerados nessa cadeia produtiva de alimentos, cosméticos, de biocombustíveis de terceira geração (produzidos com resíduos), além de outros produtos. O uso de combustíveis fósseis, como gasolina e óleo diesel, está entre os fatores que mais contribuem para a poluição do ar, uma vez que a combustão ocorrida em tal procedimento propicia a liberação de CO2, toxina que agrava o Efeito Estufa. Dessa maneira, estudos envolvendo a produção de combustível por meio de fontes alternativas de energia tornam-se um importante campo de inves-

timento, visto que a utilização de componentes naturais acarreta na redução da emissão desses gases. “De acordo com as pesquisas já realizadas no Brasil, o óleo de pequi, misturado ao diesel, reduziu em 30% a emissão de poluentes. Além disso, enquanto é possível se obter até 3200 l/ha de biodiesel de pequi, apenas 400 l/ha são possíveis a partir da soja, que é um dos produtos mais utilizados. Em torno de 60% do fruto é óleo e as características deste óleo estão de acordo com o padrão exigido pela Agência Nacional de Petróleo (ANP). Mesmo o subproduto da produção de biodiesel pode ser reaproveitado para a produção do bioetanol, sendo possível obter 53 litros de etanol por tonelada de restos de caroço de pequi,” afirma Juliana Meira O pequi é um fruto selvagem, que não necessita de um solo fértil para desenvolver. Encontrado

principalmente na região norte, em solos com baixa reserva mineral, torna-se uma alternativa para a produção de biodiesel devido a 60% de seu fruto ser óleo, além de possibilitar que uma camada da população, que não é constituída apenas por grandes latifundiários e produtores, consiga participar de sua fabricação, já que pode ser encontrado no cerrado brasileiro. O lápis Sprout e a produção de biodiesel derivado de pequi são estratégias inovadoras capazes de provocar mudanças ambientais. Em um momento em que a poluição é responsável não apenas por problemas ambientais, mas doenças respiratórias, o empreendedorismo sustentável torna-se uma aposta criativa que pode gerar frutos positivos para a vida no planeta. Agora resta saber quais serão os próximos passos nessa nova modalidade de empreender

As marcas mais sustentáveis De acordo com a pesquisa Best Global Green Brands, as seguintes marcas já foram ou são consideradas como as mais sustentáveis do mundo:

FORD

NISSAN

TOYOTA JOHNSON & JOHNSON

PANASSONIC ADDIDAS

DANNONE DELL NOKIA SONY

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DISNEY

NIKE

CISCO FORD

NESTLE

PHILIPS WOLKSWAGEN

SAMSUNG CANON

HONDA

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reportagem

PieRciNg: como Não eNtRaR NUma FURada Confiar em um body piercer ou procurar orientação médica: profissionais discutem como proceder na hora da perfuração Por Pietra Pessoa Se você está pensando em colocar um piercin, a quem recorrer? A um body piercer ou a um dermatologista? Há controvérsias entre os próprios profissionais. Não há dados precisos sobre o comportamento das pessoas que colocam piercing, mas, segundo alguns profissionais, sobretudo os jovens não procuram os dermatologistas antes da perfuração. Alguns deles nem se preocupam em se certificar sobre as qualificações profissionais do body piercer e é aí que mora o risco da infecção. Foi o que ocorreu com Endelis Henrique do Amparo Silveira, 17 anos, que furou a orelha com uma mulher que se disse profissional, mas não era. A perfuração feita atingiu uma veia e o rapaz teve que escolher entre a retirada de uma parte da orelha ou o risco de a infecção passar para seu sangue e atingir outros órgãos. Para o dermatologista Jaime Machado Morais, a busca por um profissional certificado para a colocação do piercing não exclui a necessidade de uma consulta a um

Fotos: Pietra Pessoa

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profissional especializado conforme a região onde será feita a inserção. “Caso opte pela inserção, deve-se consultar um profissional especializado conforme a região. Se for furar a língua, consultar um dentista. Os genitais, ginecologista. As pálpebras, oftalmologista. E assim por diante. Assim, a pessoa certifica-se de não ter nenhum empecilho para a sua perfuração”, alerta o especialista. Embora o dermatologista argumente desta forma, os body piercers excluem a importância dele. O body piercer Arthur Gomes Rodrigues, 26 anos, diz que “não é necessário ir antes a um especialista, porque quando vejo algo que pode ser uma barreira para não ter o piercing, eu pergunto o cliente se ele vai ao dermatologista. Estas barreiras são, por exemplo: casquinhas ou manchas na pele. Existem também cirurgias de nariz, orelhas e próteses mamárias que seriam também uma barreira para não ter a perfuração sem a permissão do médico.” Acredita ainda que as escolhas do piercing e de seu material é que

influenciam a probabilidade de uma inflamação, e como os body piercers sabem informar o material ideal, não é necessário um médico para aconselhar. “Antigamente, era usado cateter. Hoje em dia, já tem uma questão mais consciente, direcionada para a galera que faz piercing, para adotar a agulha americana em vez do cateter. É orientado ao cliente sempre escolher titânio ou nióbio, em vez de aço cirúrgico, pela questão da composição do material, pois existe uma transferência quase nula de metal para o corpo no caso do titânio e do Nióbio, que não tem no aço cirúrgico”, constata Michel Franckevicius, profissionalmente no mercado há pouco mais de um ano. Catherina Dias Rodrigues, 19 anos, possui três piercings, sendo um no nariz e dois na orelha. Ela não consultou um médico antes de suas perfurações, porém as realizou com um profissional e obteve sucesso. Além disso, diz ter tido uma boa higiene, limpeza periódica no local, mas desobedeceu o profissional em um ponto: tentar trocar a peça antes

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REPORTAGEM - PIERCING do tempo recomendado. “O piercing do nariz, com uma semana que havia furado, tive a ‘genial’ ideia de trocar a peça. Eu machuquei o furo, mas não saiu do controle, pois usei pomadas e não deixei fechar o furo,” assume. Por mais que antes de suas perfurações, a garota não tenha ido a um dermatologista, hoje sua opinião é de que quem deseja furar precisa de tal consulta. “É necessário, mas creio que ninguém pense nisto antes das possíveis inflamações provenientes dos piercings,” afirma. Tanto os usuários quanto o dermatologista disseram acreditar na necessidade de um profissional especializado; “Lembrando que nunca pode ser realizado por uma pessoa sem treinamento, que não conheça anatomia e fisiologia; lembrando que as complicações podem ocorrer com o profissional especializado também”, ressalta Morais. Mas o que torna um body piercer profissional? Michel Franckevicius informa que “nos workshops espe-

cíficos para isso, que no caso é o workshop básico (primeiro contato que você tem com essa área), o mínimo que se espera é uma orientação acerca da biologia que acompanha nossa epiderme, então tem toda uma técnica para ser feita sem causar dano ao tecido que envolve a região. Dependendo do local, tem toda uma instrução por trás pra que não haja nenhum tipo de problema... Então o workshop tem essa parte mais biológica mesmo.” Por isso, correm um risco enorme aquelas pessoas que tentam realizar quaisquer perfurações sozinhas, sem nenhuma assepsia. “A pessoa que queira fazer sozinha não sabe qual o melhor material, não sabe as marcações para realizar a perfuração e há também as correntes sanguíneas. Realizar um ‘furo’ sozinho ou por meio de um amigo que ‘diz que sabe fazer’ pode gerar complicações”, alega Rodrigues. Silveira reforça esta alegação ao dizer que “não dá certo. Tem que ter experiência para furar mesmo.”

Segundo o dermatologista Jaime Machado, “O uso de piercing em nossa sociedade se tornou nada mais que um modismo de risco. Não existe um local do corpo que seja totalmente isento de efeito colateral. Todos estão sujeitos a infecções e complicações graves decorrentes da inserção de piercing. Mas, o grande risco está nas partes do corpo com maior presença de flora bacteriana, como cavidade oral e os genitais. O risco de infecções graves é altíssimo.” Apesar de Franckevicius concordar, em certo ponto, na questão da moda, não define a inserção de nenhum local como perigosa. “Os mais procurados variam de acordo com a moda. Uma época foi língua, outra época foi nariz, varia. Agora está sendo septo e hélix, que é a parte de cima da orelha, a parte da cartilagem. É relativo. Não diria perigosos, diria mais delicados, que requer uma destreza e atenção maior. Seriam os genitais, mamilos femininos que requerem mais cuidados, e tragus (pequena saliência na entrada do ouvido externo)”.

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Sempre procure profissionais

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CANNABIS MEDICINAL E SUA ACEITAÇÃO Anvisa aprovou regra que permite registro, venda e produção de medicamentos que possuem em sua base a maconha, dando luz a um debate polêmico Por Ana Júlia Ramos e Maitê Alverne Holanda O abuso das drogas é um problema social comum tanto no Brasil como no restante do mundo, o que preocupa vários governantes e convoca-os esporadicamente para discutir sobre os impactos causados pelas drogas. No entanto, outro assunto que deriva do tópico é a utilização de medicamentos que possuem maconha em sua composição para o auxílio no tratamento de doenças graves. No ano de 2016 foram aprovados critérios que abrem espaço para o registro do primeiro medicamento que tem como sua base a maconha (Cannabis sativa). O remédio em questão é o Mevatyl e seu uso é indicado para o tratamento da espasticidade, alteração que envolve a combinação da hipertonia muscular, paralisia e aumento da atividade reflexa dos tendões musculares. Ele possui em sua composição a concentração de dois princípios ativos derivados dela - sendo eles o canabidiol e o tetraidrocanabinol. A venda será liberada apenas para maiores de 18 anos. Além do registro, as regras que envolvem a importação de produto estão sendo flexibilizadas. Atualmente o processo é extremamente lento e burocrático, prejudicando seriamen-

te pacientes que têm como única esperança o uso de tais medicamentos. O plano é reduzir o tempo naqueles pedidos que são solicitados com maior frequência, ou seja, aqueles mais conhecidos pela Anvisa.

Legalidade e rigidez lado a lado A avaliação do Ministério de Saúde para a liberação da droga é extremamente criteriosa e leva em conta os efeitos colaterais do uso da maconha como remédio que são: sensação de bem-estar, acessos de riso às vezes acompanhados de acessos de euforia, relaxamento muscular e sonolência, cabeça leve demais, redução da capacidade de seguir objetos rápidos demais. O usuário ganha uma hipersensibilidade, mas perde a noção de tempo e tem falhas de memória. Por fim, pode ocorrer também a dilatação das pupilas e boca seca, assim como um pouco de taquicardia. Em nota, a Anvisa afirma que já está antecipando o maior número de informações possíveis para esclarecer as pessoas que solicitarem o uso do canabidiol. André Vilela Lomar, infectologista do Hospital Albert Einstein de

São Paulo, afirma, em entrevista à revista Super Interessante, que apesar de saber do sucesso dos cigarros de maconha entre os pacientes com AIDS e o auxílio deles no aumento do apetite, ele não recomenda “porque a maconha é ilícita e não se pode ter controle sobre sua procedência, saber se está misturada a um mato, ou se contém algum fungo.” Em contrapartida, o ato representa grande avanço para aqueles que sofrem da doença e se encontravam sem esperança alguma de cura. A Cannabis Sativa contém cerca de sessenta scanabinóides que são os elementos responsáveis pelos efeitos da planta no corpo humano. Descobriu-se, então, que as células do cérebro têm uma substância, ainda sem nome, cuja função é reagir quimicamente com os canabinóides. A receptora dos canabinóides foi descoberta em 1991 por duas equipes de cientistas nos Estados Unidos. O mapa dos receptores já revelou pistas interessantes, e a maconha realmente afeta a memória, os sentidos, o equilíbrio e o aprendizado. Na prática, porém, ainda há muito que aprender; os próprios efeitos da maconha ainda são incertos. Como separar a maconha que deve curar da-

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reportagem - CANNAbIS MEDICINAL quela que está misturada à loucura social do vício e do tráfico? Quando tivermos a resposta para esta questão, o estudo de seus efeitos pode de fato se consolidar.

Contexto histórico, preconceito e lucro Desde os anos de 1990, os estudos voltados para o uso medicinal da erva avançaram muito, apesar dos contratempos com a política antidroga norte-americana de 1992 que cortava todo o suporte financeiro dedicado às pesquisas medicinais da cannabis e suspendia as autorizações especiais de alguns pacientes que já utilizavam a maconha como tratamento de diversas doenças. As autorizações contornavam, de certa maneira, o problema da ilegalidade. Foi revelado em 2011 que as grandes empresas farmacêuticas dos EUA gastam centenas de milhões de dólares por ano em pagamentos a médicos que promovam os seus medicamentos. Para complementar, Richard J. Roberts, bioquímico e biólogo molecular britânico, afirma, em sua tese principal sobre a Máfia

cápsulas Tem THC e canabidiol em sua formulação. O produto está aprovado para esclerose múltipla e em estudos para dores do câncer e neuropáticas.

Farmacêutica nas sociedades capitalistas, que os medicamentos que curam não são rentáveis. Portanto, não são desenvolvidos por empresas farmacêuticas. A psiquiatra Cristina Contigli, que é a favor da legalização do tratamento natural, explica a importância da erva na evolução do quadro de pacientes com crises de ansiedade e ataques de pânico e afirma também: “Já ouvi casos de médicos mancomunados com as indústrias de remédios, e o que posso afirmar é que nesse país tudo é manipulado por dinheiro. O conselho que dou é que as pessoas escutem sempre a opinião de mais de um profissional e tentem auxílio internacional no caso de remédios não legalizados dentro do país. Não é justo que as pessoas percam o direito ao bem-estar.” O oncologista brasileiro, Dr. Amancio, expõe sua visão sobre o tratamento à base de THC (Tetraidrocanabinol): “Há estudos suficientes que comprovam a eficácia do tratamento, principalmente em crianças e idosos, que são os pacientes que lidam pior com as dores e os

efeitos da quimioradioterapia. É da Bíblia que o homem tem por direito o uso de toda a planta e todo o fruto que nela cresce. O Brasil é o país da heresia (risos).” Os dois médicos entrevistados disseram que, com a legalização, iriam aderir ao tratamento. Mas será que a população brasileira seria adepta a ele? Em uma conversa com Júlia Nascimento, 59, dona de casa, ela diz: “Durante toda a minha vida ouvi dizer que maconha só fazia mal e a proibição é severa para quem faz uso e, no meu caso, sendo portadora de câncer, acho que seria justo o uso; aliviando nossa dor ou nos curando. É uma ajuda e eu usaria, com certeza.” Outro jovem, de 26 anos, que não quis o nome revelado, conta que é portador de AIDS e que fuma maconha desde que a descobriu, pois ajuda a acalmá-lo quando tem crises. “Me ajuda a sentir fome e controlar meu peso e me encaixa em algum grupo na sociedade. Por Belo Horizonte ser uma cidade pequena, sofri muito com o preconceito das pessoas que descobriram minha doença.”

SPRAY

canabidiol

Trata-se do dronabidiol, o THC sintético. Tem sido utilizado para perda de apetite associada à perda de peso em pacientes com aids.

O canabidiol é normalmente vendido como um óleo, em pequenas bisnagas. Tem sido utilizado no tratamento de epilepsias graves, principalmente em crianças.

Fonte: arreganho.com.br e revistavivasaude.uol.com.br

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“Minha voz continua a mesma, mas os meus cabelos...” Técnica capilar, que viralizaralizou na internet, tem o intuito de limpar os cabelos sem danificar os fios

Por Marcella Souza e Maria Clara Gonçalves

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Fotos: Arquivo Pessoal

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reportagem - cABELOS Lisos, cacheados, crespos, vermelhos, brancos ou coloridos, a cada dia homens e mulheres estão à procura dos produtos ideais para o seus cabelos. O mercado de cosméticos não para. Segundo a Associação Brasileira de Industria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos, Abihpec, o Brasil ocupa o quarto lugar na venda de produtos da área. Na busca pelo cabelo perfeito, surgiram o low poo (com shampoo) e no poo (sem shampoo). As técnicas que se consagraram na internet, vêm ganhando seguidores no mundo inteiro e abusam de produtos menos agressivos para o cabelo, ou até mesmo não usa nenhum.

“Notei a diferença em poucas semanas. Consegui controlar a oleosidade do meu couro cabeludo”. Mariana Cordeiro As práticas do no poo e low poo iniciaram- se nos Estados Unidos quando a linha de produtos para o cabelo Deva Cult lançou os dois cosméticos, um condicionador que além de hidratar promete limpar os fios, o que anularia a utilidade do shampoo, e um shampoo natural, livre de petrolados e derivados de sulfato, menos agressivo para o cabelo. Quando a estudante Mariana Cordeiro lava os cabelos, segue um ritual que pode parecer estranho para algumas pessoas, praticantes da técnica do no poo, o shampoo passa longe dos fios, que são cuidados apenas com condicionador. Tudo começou há dois anos, quando ela decidiu procurar novas ma-

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neiras de cuidar dos cachos. “Notei a diferença em poucas semanas. Consegui controlar a oleosidade do meu couro cabeludo”, conta. Olivia Binotto, 22, usa as técnicas há 4 anos, quando decidiu parar de usar produtos químicos no cabelo e deixar os cachos voltarem. Diferentemente da Mariana, a estudante de publicidade optou por usar o shampoo, mas toma todo cuidado para que sejam os produtos ideais usados no método low poo. “No começo baixava várias listas de componentes que deveriam ter no produto, tive que aprender na marra a ler rótulos.” Segundo as duas garotas, os cabelos rapidamente deram resultados positivos, ficaram com mais brilho, mais macios, mais hidratados e menos oleosos. “Aprendi a cuidar melhor do meu cabelo e entender o que ele realmente precisa. Hoje consigo fazer tratamentos direcionados e precisos aos fios”, explica Mariana. Segundo ela, a parte mais importante no processo são os cuidados para lavar o cabelo sem o uso do shampoo. “Tem que pegar o jeito de fazer o co-wash direitinho, conseguindo limpar bem o cabelo”, completa falando da importância de persistir nos métodos, pois cada cabelo tem um tempo diferente de adaptação.

Co-wash: É uma prática de lavagem capilar que dispensa o uso de shampoos e utilizase apenas d o condicionador

PH: Potencial Hidrogênico - um índice que mostra a neutralidade, a alcalinidade ou a acidez dos fios capilares

Benefícios e malefícios Para o tricologista e cosmetólogo Valeiro Benjamin, as práticas não são bem recomendadas. Segundo o profissional, nos anos 70 e 80 os cabelos cacheados estavam em alta, e para que eles dessem mais volume e cachos firmes, muitas pessoas pararam de usar o shampoo, o que causou uma grande queda e afinamento do cabelo. Benjamin alerta para a importância de fazer uma higienização correta no cabelo. “O cabelo, assim como nossa pele, deve passar por uma limpeza.

Manto Hidrolipídico: É uma camada protetora que se forma para a hidratação natural gerado pelo corpo humano

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cABELOS

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“O objetivo é ter o cabelo mais saudável, mais hidratado, mais livre dessas químicas, dessas coisas que a gente nem percebe que está colocando nos fios” Olivia Binotto

Quando vai ao salão, Olivia leva seus produtos para não prejudicar a prática

Promover a higienização pode evitar vários problemas como a proliferação de fungos e bactérias.” Os métodos do low poo buscam produtos que sejam mais naturais, e que não tenham alguns compostos, como o sulfato. Para o especialista, os sulfatos e persulfatos são componentes que retiram os resíduos, promovem a limpeza do cabelo e preparam o cabelo para o tratamento, essa é a importância dos componentes para o cuidado dos fios. Já os petrolados não são indicados em nenhuma composição dos produtos, e são usados apenas para baratear o custo dos cosméticos deixando-o mais atrativo financeiramente no mercado. Valerio Benjamin ressalta a importância dos componentes serem balanceados para que não danifi-

Fotos: Arquivo Pessoal

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quem o cabelo e o couro cabeludo. O PH dos fios variam entre 4,5 a 5,8, e por isso os shampoos devem ser equilibrados em um PH em torno de 5. “Neste PH o manto hidrolipídico é higienizado sem danos à haste capilar nem ao couro cabeludo”, explica. Segundo o cosmetológo, já existem alguns produtos alternativos com formulas anfóteras, composto que atua como um ácido, e promove uma leve limpeza ao cabelo. O especialista ainda ressalta que pessoas que aderem às práticas deveriam fazer um acompanhamento profissional. “Com o tempo essa pessoa pode ter queda de cabelo. A falta de higienização causa o entupimento folicular e a morte das papilas dermais, onde são produzidos os fios de cabelo.” Além disso, Valerio explica que os cabelos encaracola-

dos precisam de um maior cuidado, por se tratar de um cabelo com baixa produção de lipídios.

O Mercado Apesar das contraindicações, o mercado vem aderindo aos métodos de produtos menos agressivos e condicionadores. Segundo Olívia, as marcas estão mais atentas à procura das pessoas por esses produtos e estão criando linhas especiais para as técnicas. Os valores dos produtos são variados, e você pode encontralos em qualquer loja de cosméticos. “São marcas que, quando lançadas, podem ter um preço mais caro, mas ,se você for olhar a composição do cosmético, consegue encontrar produtos mais baratos. O investimento depende das suas necessidades”, explica o cosmetólogo

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“O preconceito existe e nasce da ignorância e da arrogância daqueles que não se interessam em estudar”. Por Ayllana da Cunha Ferreira e Pietra de Souza Pessoa

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Arte: Rachel Silveira

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FILMES Sinopse 1: Lixo radioativo foi despejado em uma represa, causando mutação em todos os castores da região. Eles se transformam em perigosos castores zumbis, com uma enorme sede de sangue, dispostos a perseguir suas vítimas a fim de se alimentar; Sinopse 2: Um grande tornado surge no litoral da Califórnia, destruindo tudo ao seu alcance, e o pior de tudo, sugando milhares de tubarões para dentro dele, formando um mortífero tornado de tubarões, levando as criaturas pela água, terra e mar, causando enorme destruição e muitas mortes; E, por fim, Sinopse 3: Pessoas mutiladas e feridas começam a aparecer em um hospital de uma cidade local, dentre elas, Cherry, uma ex-dançarina que foi atacada por um grupo de pessoas canibais infectadas, tendo sua perna arrancada. Com uma metralhadora no lugar do membro perdido, esta lidera um grupo de sobreviventes. As três situações citadas acima correspondem a resumos de três produções famosas do subgênero Trash – Zombeavers, Sharknado e Planeta Terror. Em uma pesquisa realizada com 164 pessoas de diferentes idades, 43,6 % dos entrevistados não sabiam o que era um filme Trash. Quando perguntados o que achavam do estilo, 28% das pessoas apresentaram críticas ruins, 26,8% apresentavam críticas positivas e 45% das pessoas não possuíam uma opinião. Se é um subgênero relativamente conhecido, por que tão poucas pessoas sabem o que é um Trash, ou possuem opiniões tão negativas? Categorizar os filmes Trash é algo difícil, visto que constituem um subgênero, e possuem várias características semelhantes a outros estilos. Apesar de a maioria das associações serem feitas com o gênero Terror, não é bem assim. Inquestionavelmente, um Trash possui uma baixa produção, elenco pouco reconhecido, roteiros excêntricos, estereotipa-

ção e sexualização dos personagens, e, principalmente, a forte presença de humor negro. Ou seja, essas produções podem ir desde filmes como Todo Mundo em Pânico à Morte do Demônio. Um erro comum ao analisar um filme Trash é pensar que este deve ser limitado como uma obra comum. Um filme desses possui características próprias, já que tem um público específico e um objetivo diferenciado. O escritor Pablo Villaça afirma que “as pessoas não sabem que existem características indissociáveis de um filme trash, como produção de orçamento nulo, temas rasos, investida superficial em gêneros, etc.”

“prefiro enxergar a malandragem criativa como uma qualidade, especialmente por entregar exatamente o que o público deles procura.” Octaviano Caruso O que um filme Trash tem a dizer Constantemente, os Trash são vítimas de preconceito por possuírem histórias excêntricas e fora dos padrões. No entanto, até mesmo as produções mais surreais possuem um objetivo. Carolina Rodrigues, estudante de Bacharelado Interdisciplinar em Artes e Design na UFJF, diz que “existem filmes que são propositalmente malfeitos e surreais, como Evil Dead 2 e Sharknado, e filmes que são feitos com o objetivo de assustar e acabam sendo cômi-

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cos, como a refilmagem de Godzilla e a adaptação Christine. Existe uma linha que separa os filmes trash entre bons e ruins, e essa linha parece levar em conta se o filme se leva a sério demais ou não, influenciando a visão do público sobre ele. Portanto, o trash, sendo uma expressão do cinema como qualquer outra, pode ser usado de maneira criativa e única e também de maneira desnecessária; tudo depende de como a equipe de produção irá usar os recursos disponíveis.” Na pesquisa feita com 164 pessoas, das 56,4% que sabiam o que era um filme Trash, 49,6% destas acreditam que são produções desnecessárias e/ou lixo cinematográfico. Para Octaviano Caruso, membro da Associação de Críticos de Cinema do Rio de Janeira (ACCRJ), um Trash é muito mais que isso. “Como apaixonado por essa arte, sou incapaz de enxergar como “lixo” o trabalho de meses da equipe de um filme, por mais despretensioso que o projeto seja. Sei que existem cineastas e produtoras pequenas que encontraram nesse “estilo” um nicho de mercado, como a Asylum, de obras como Sharknado, mas eu prefiro enxergar a malandragem criativa como uma qualidade, especialmente por entregar exatamente o que o público deles procura”, declara ele. Ou seja, para a real compreensão dos filmes Trash, é necessária uma visão livre de padrões e preconceitos, é preciso achar beleza, ou até mesmo feiura, na inovação e na excentricidade. Caruso enfatiza isso dizendo que “É mais confortável para alguém que seja inseguro intelectualmente cochilar durante as 3 horas de uma árvore balançando ao vento em um daqueles filmes umbilicais modorrentos, fazendo questão de dizer que “não é pra qualquer um”, do que efetivamente sentar e ler toda a obra dos filósofos que citam usualmente frases descontex-

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reportagem - FILMES tualizadas pinçadas do Wikipédia e daqueles sites tipo “Frases de Pensadores”. Entende a analogia? A maioria das pessoas, especialmente no Brasil, busca “parecer ser”, ao invés de “ser”. Então, filmes com essa pegada mais despretensiosa, mais divertida, são rejeitados, porque não oferecem “base” para ilusões que essas pessoas defendem diariamente. É como a jovem que passa por uma livraria reclamando do preço alto dos livros, mas entra na joalheria chique ao lado e gasta o triplo daquele valor em um brinquinho minúsculo. O preconceito existe e nasce da ignorância e da arrogância daqueles que não se interessam em estudar.”

Como surge a ideia de um filme desses? Algumas vezes, as ideias de produções Trash surgem como alternativas para diretores que estão começando carreira. Renato da Silva Pastor, criador da página do Facebook “Humor Trash”, explica que “o primeiro filme que James Cameron dirigiu foi Piranhas 2. Peter Jackson dirigiu vários clássicos do Trash, como Fome Animal e Bad Taste em início de carreira. Existe um lugar nos filmes Trash para artistas que não teriam a oportunidade de ser vistos de outra maneira. Há um espaço e liberdade para experimentação que pode ser como uma escola para quem quer aprender cinema.”

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Apesar de todos os pontos que tornam o sub-gênero tão excêntrico, o principal objetivo ainda é oferecer lucro aos produtores. Em outras palavras, a ideia para uma produção dessas ainda surge no desejo de obter um bom rendimento. Villaça reafirma isso ao dizer que “O filme Trash é simplesmente sintoma de um contexto econômico de produção”. Por possuir um baixo investimento, a grande maioria dos filmes desse subgênero é estreada diretamente nos canais pagos. A Syfy é uma das principais emissoras destinadas a esse fim, sendo a pioneira no lançamento da franquia Sharknado no Brasil.

A importância dos Trash para a Sociedade Filmes Trash são como obras tradicionais, capazes de provocar lágrimas, angústias e desespero no seu telespectador. Caruso enfatiza que “Cinema é entretenimento. É ótimo quando ele é executado com eficiência. Se esse entretenimento vem com um interessante estímulo intelectual, isso é um bônus. O discurso que segrega as obras, o equivocado conceito de “filme de arte”, como se não houvesse arte em todas as expressões artísticas, nunca é positivo. O que é chamado de Trash, quando bem executado, proporciona divertimento e pode também fazer pensar... Eu te dou o exemplo de A Mosca, de Cronenberg. Já li textos que afirmam

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que é Trash. Escrevi recentemente uma análise de três longos parágrafos abordando a riqueza de questionamentos existencialistas que ele me provoca”. Segundo a pesquisa, poucas pessoas sabem que a importância dos filmes Trash é muito maior do que apenas chocar. Novamente, Octaviano Caruso explica que “O Cinema começou como atração simplória de parque de diversões, os chamados Nickelodeons, salinhas que exibiam curtas em grande parte cômicos, abraçando vários gêneros, como o suspense, o faroeste, ou simplesmente mostrando cenas do cotidiano. Essas manifestações são o embrião do que é hoje em dia chamado de Trash. Tem gente que diz que filmes de artes marciais são Trash. O respeitado cineasta Werner Herzog uma vez disse: “Intelectualmente, alguém como Jean-Luc Godard é dinheiro falso quando comparado a um bom filme de Kung-Fu”. Quem estuda o gênero, mestres como Hideo Gosha, Chang Cheh e Sammo Hung, sabe que Godard (só pra citar um dentre os cineastas mais mimados pelos pseudointelectuais) não teria capacidade de montar um gaveteiro, enquanto esses profissionais faziam diariamente o impossível com extrema desenvoltura. Portanto, o que é equivocadamente chamado de “lixo” não é somente importante, foi também o responsável por existir essa indústria artística”

Arte: Luis Filipe Pena

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CIDADES -

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Festas itinerantes regadas a drogas, sexo e muito barulho são convocadas pelas redes sociais Por Silvania Capanema Nove horas da noite, sábado de lua cheia no mirante do Comiteco, um dos pontos mais altos de Belo Horizonte. Pelos mais de setenta carros e motos estacionados pelos arredores, a polícia calcula haver cerca de duzentos jovens espalhados pelo terreno de vegetação baixa. O som em altíssimo volume vindo de potentes caixas de som, colocadas no porta-malas de carros adaptados, confunde-se em uma miscelânea de ritmos de funk. Há muito lixo malcheiroso espalhado: embalagens vazias de comida, garrafas e latas de cerveja, tocos de maconha e seringas, camisinhas e papel higiênico usado. Apesar dos gritos e gargalhadas es-

tridentes, a noite ainda está calma e sob controle, no parecer da polícia. O trânsito congestionado subindo a ladeira que dá acesso ao local mostra que a festa está só começando. Após uma pacífica visita de quinze minutos, o veículo da Guarda Municipal, chamada ao local pela vizinhança, desce o morro de volta à Avenida das Agulhas Negras. Seja verão ou inverno, a menos que chova, centenas de jovens deixam suas casas e atravessam Belo Horizonte para alcançar um ponto pré-determinado no extremo oposto da cidade. O chamado é feito pelas redes sociais e o objetivo é passar a noite festejando. A curtição é regada

Fotos: Luis Filipe Pena Borges de Andrade

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a muita bebida e drogas. Funk em alto volume e sexo livre também fazem parte do cardápio. O público que ocupa o mirante é o mesmo que frequentava a Praça do Papa, situada a cinco minutos de distância no alto do Bairro das Mangabeiras, no extremo sul da cidade. A migração ocorreu após a fatídica madrugada do dia 2 de fevereiro de 2016. Nessa noite, aconteceu mais uma edição da chamada Segunda sem Lei, festa organizada de forma espontânea através das redes sociais. No evento, que reuniu mais de cinco mil pessoas pelos cálculos da Polícia Militar, Victor Almeida de Oliveira, de 23 anos, e a namorada, Lara Fer-

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REPORTAGEM - CIDADES raz Medina, de 16, foram espancados e linchados, levando-os à morte. O motivo teria sido uma simples provocação. Até hoje o crime não foi elucidado e não se sabe quem teriam sido os responsáveis pela morte do casal.

em flagrante à delegacia – tem dado apoio logístico às ações da Polícia Militar na região.

Sexo, drogas e Funk-n’-roll

Repercussão do crime Após breve noticiário na imprensa e em alguns canais de comunicação na internet sobre o crime de 2 de fevereiro, moradores do bairro Mangabeiras direcionaram um requerimento ao deputado estadual Fred Costa para serem tomadas providências de segurança e impedir a realização de festas populares espontâneas na Praça do Papa. A pedido do deputado, no dia 11 de fevereiro, foi realizada uma audiência na Assembleia Legislativa de Minas Gerais com representantes das polícias Militar e Civil e da Secretaria de Defesa Social. No ato, Costa sugeriu a tomada de medidas por parte da prefeitura, como dotar a praça de iluminação mais eficiente, podar as árvores e instalar câmaras do Olho Vivo. À polícia, pediu-se policiamento efetivo, inclusive a criação de um posto policial fixo. Efetivamente, a partir de 22 de fevereiro até meados de abril, a Polícia Militar montou operações (blitzes) eventuais em dias e horários diversos, com ênfase de sexta a segundafeira, na av. das Agulhas Negras, no intuito de melhorar a segurança da Praça do Papa. Com experiência em detectar suspeitos, a polícia foca sua ação na procura de usuários e traficantes de droga, embora aproveite a interferência no livre trânsito da avenida para deter eventuais motoristas que tenham consumido qualquer quantidade de álcool, conforme determina a Lei Seca. No acordo feito entre a Polícia Militar e a Prefeitura de Belo Horizonte, a Guarda Municipal - agora armada e com poder de prender e conduzir infratores pegos

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vizinhanças da praça há placas nos muros com os dizeres “Rede de vizinhos vigilantes - Polícia Militar de Minas Gerais.”

Rotina Desde fevereiro, pelo menos uma viatura da Guarda Municipal ou da Polícia Militar vigia o movimento da praça diariamente após as 19 horas. Conforme depoimento do guarda municipal Ribeiro Silva, é ao cair da tarde que a situação se complica, pois há uma mudança radical no tipo de frequentadores da praça. Saem as famílias com suas crianças e cachorros, casais de namorados e turistas e começa a chegar gente de toda parte. Vêm de carro, moto, ônibus ou mesmo a pé. São jovens na faixa de 15 a 30 anos, quase sempre moradores de bairros de periferia, como Tupi, Guarani, Ribeiro de Abreu, Contagem e Vespasiano que chegam à praça em grupos numerosos e dispostos a “bagunçar.” Nesses casos, o infrator pode ser preso e conduzido à delegacia do 22º Batalhão da Rua Trifana, na Serra. O foco da polícia é chegar aos traficantes, geralmente provenientes do Aglomerado da Serra. Quando a praça está tranquila, as viaturas costumam dar uma volta pelo bairro das Mangabeiras, pois há um convênio firmado com a Associação de Bairro de auxílio à vigilância. Em muitas casas nas

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Segunda-feira, 23 horas. Cerca de trezentas pessoas apreciam a vista da cidade no mirante, turmas de jovens e casais, alguns isolados nos pontos mais escuros. Um grupo maior, de aproximadamente oitenta jovens com idade entre quinze e, no máximo, vinte e poucos anos, distrai-se com uma brincadeira, tipo um karaokê de música funk misturado com capoeira e outros passos incertos. O cheiro forte de maconha impregna o ar da noite clara de lua cheia e céu estrelado. Marlon de Oliveira, 19 anos, veio da Pedreira Prado Lopes com a namorada e amigos. Indagado do porquê de sua visita a um dos pontos turísticos mais bonitos da cidade, ele diz, com gestos largos e nariz empinado: “Ô véia, num sô turista não, mas essa aqui é nossa praia. Somo dono disso aqui tudo igual ôces, a rua é pública e a gente vem pra cá curtir de boa.” A polícia só os aborda quando percebe que há venda de droga ou em caso de tumulto, no mais são vigiados a distância. Outro problema, sem gravidade para a polícia mas constrangedor para quem visita a praça, inclusive turistas vindos de outras cidades, é o fato de o logradouro ser um conhecido território do sexo livre. Há mais de vinte anos, segundo moradores da região, a praça é conhecida como o “ motel das estrelas”. Um vendedor confirma que o sexo rola livre e que muitas vezes são grupais, nos escurinhos da praça e no playground. Ele prefere servir aos casais que fazem sexo dentro dos carros, pois “essa turma curte um sexo tranquilo, toma umas e outras e vai embora sem perturbar ninguém.” O vendedor conta ainda que as melhores noites de venda são

Fotos: Luis Filipe Pena Borges de Andrade

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CIDADES sexta, sábado e domingo, quando o movimento de carros parados “para ver as estrelas” vai até o dia amanhecer e que costuma ser tão intenso que ocupa não só a praça como também as ruas vizinhas. Moradora há mais de 20 anos de uma das ruas próximas à Praça do Papa, Maria Clara Santiago conta que já teve sua casa assaltada quatro vezes. “Tive sorte”, disse, “perdi bens materiais, mas pelo menos não tentaram me matar, como já aconteceu em duas casas vizinhas e tem acontecido com certa frequência por aqui. Há cerca de treze anos, a situação ficou tão crítica, que formamos um condomínio aqui na rua, compramos uma guarita e implantamos um sistema de vigilância 24 horas. Fica caro, nos custa perto de mil reais por mês pra cada morador, mas é o jeito. Antes, a qualquer hora do dia as pessoas ficavam com medo de entrar em casa – tinha sempre algum carro parado na porta. E não é só gente fazendo sexo não. Fingem que estão transando, pois nisso a polícia não interfere e na verdade é tráfico de drogas. A gente vê as motos e outros carros emparelhando e eles trocando pacotinhos por dinheiro”. Indagada sobre se esta situação continua a ocorrer se tem vigilância na rua e a polícia fazendo ronda, ela responde: “É um mistério, o vigia nunca vê nada e a polícia nunca passa por aqui na hora que precisa. Sábado passado o carro da minha vizinha sofreu uma forte batida na traseira às 3h10 da madrugada - sabemos disto porque ficou registrado nas câmaras de segurança da rua. Mas o vigia não viu nada.” . Sobre como está a situação depois do crime na praça, Maria Clara conta que pelo menos agora pode dormir à noite. Antes, segundo ela, não só nas festas da Segunda sem Lei como às sextas e sábados o barulho de música e arruaça durante a madrugada inteira era tão alto que ela só con-

seguia pegar no sono pela manhã. Mesmo tomando conhecimento do sistema implantado pela polícia de vigilância constante na praça para impedir tumultos, ela diz: “Isto é por enquanto. Sei que estão encantoados lá no mirante do Comiteco. Agora são os vizinhos do outro lado do bairro que não dormem. Mas é só a polícia sair que voltam sempre. Foi assim e continuará sendo, infelizmente.” Seu filho Roberto, que estuda à noite, relata q u e , antes de março, quando retornava da faculdade por volta das 23h30 e percebia movimento de festa na praça, ele tinha que passar por dentro do bairro Comiteco para chegar em casa, em vez de passar pela praça, pois tinha receio de seu carro ser cercado e assaltado. Maria Clara acrescenta que, mesmo agora, prefere não sair de casa em dias que percebe tumulto na praça e que em um certo sábado de novembro, quando receberia amigos para um jantar, tinha tanta gente no local e a desordem era tão grande que preferiu ligar cancelando a correr o risco de os amigos sofrerem alguma violência ao saírem de sua casa tarde da noite. Paulo dos Santos, um vigia noturno da mesma rua, conta que supervisiona os dois quarteirões e que tem que bater ponto nos dois extremos de hora em hora. “Estou acostumado, sempre trabalhei à noite como vigia, nem pisco o olho. O que acontece é que vejo os carros parados, de vidro fechado, e fico de longe vigiando. Não posso bater no vidro e pedir pra sair, né? A rua é pública e posso levar um tiro na cara. Se desconfio de atitude suspeita, ligo pra ronda da polícia no bairro, mas é pouco carro pra muita rua, nunca eles chegam com menos de quinze minutos. Ai, já viu, né? Se fosse assalto o cara já estava morto.” Sobre

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reportagem

o assunto de festas do gênero da Segunda sem Lei, diz: “Isso aqui vira um inferno, é neguinho dando rolé, subindo e descendo a rua a mil por hora com aqueles carros rebaixados com o som na maior altura a noite inteira. Graças a Deus foram pra outros lados agora.” E resolve dar a solução: “a prefeitura devia proibir essas festas e, se preciso fosse, fechar a praça com grades, como fizeram no Parque Municipal.”

O que diz a Lei De acordo com a Lei nº. 10.277, publicada em 27 de setembro de 2011, no seu artigo 1º, a realização de atividades artísticas e culturais em praça pública do Município de Belo Horizonte independe de prévia comunicação ou autorização de órgão público municipal desde que observados, cumulativamente, os seguintes requisitos: não haja utilização de som mecânico ou montagem de palco; a atividade tenha encerramento até as 22 horas; a concentração de artistas e de público no local da atividade não obstrua a circulação de pedestres ou veículos. O artigo 6º. esclarece que são consideradas atividades artísticas e culturais, para fins desta lei, toda as manifestações, shows, performances, saraus e recitais, nas mais diferentes linguagens, como teatro, dança, circo, mímica, artes visuais e plásticas, literatura e poesia.

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REPORTAGEM - CIDADES Na Gerência Regional de Licenciamento de Obras, Eventos, Atividades e Mobiliário Urbano da PBH, a fiscal Denise Agulhô disse que nunca houve qualquer pedido de licenciamento para este tipo de festas populares na Praça do Papa e que, conforme a lei, não é necessário fazê-lo. Indagada sobre a punição com multas ou outros recursos legais sobre eventos realizados em descumprimento da lei, Denise afirma que a punição recai sobre os responsáveis, mas que no caso de festas espontâneas organizadas por meio de redes sociais não existe um responsável. Neste caso, a prefeitura não tem o que fazer, uma vez que nem é comunicada de tais eventos. Na Fiscalização de Eventos da Regional Centro-Sul, responsável pela região das Mangabeiras, o fiscal Felipe Freitas confirmou as informações de Denise e recomendou o telefone 156, que funciona 24 horas, para comunicar ao setor algum evento fora da lei. Neste caso, o fiscal iria até o local constataria o fato e acionaria a polícia, a quem compete a segurança. No gabinete do deputado Fred Costa, seu assessor para assuntos legislativos, o advogado Frederico de Sá, disse que a Lei 10.277/2011 vai contra a norma geral do Código de Postura 8616/2003 e que esse código por si só já regula o tema amplamente ao tratar da utilização do logradouro público. De fato, o artigo 46 dispõe que, exceto os usos de que trata o Capítulo II (manifestações e passeatas – o que não é o caso), o uso do logradouro público depende de prévio licenciamento. Frederico acrescenta que cabe à PBH a possibilidade de baixar um decreto regulamentando a lei 10.227 em consonância com o código de postura ou cabe a hipótese de revogar por intermédio de um novo projeto de lei a ser encaminhado à Câmara Municipal. O deputado Fred Costa afirmou que o caso será estudado. So-

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bre a emenda parlamentar, proposta por ele na ALMG e que versa sobre o assentamento de uma Base Militar Comunitária na Praça do Papa, Fred Costa esclareceu que, como a praça é tombada, não há possibilidade de uma construção dentro da área dela – e nem seria adequado do ponto de vista do paisagismo - mas que está sendo estudada a viabilidade de se montar uma base em local próximo.

Eu faço o que eu quero Da guarita situada na Rua João Ceschiatti, o vigia particular Welesley Ramos acompanha, a cada dois dias, entre as 19 horas e as 7 da manhã, o movimento dos carros e motos subindo e descendo a Rua Alcides Pereira Lima, que dá acesso ao mirante do Comiteco (ou Mangabeiras II). Relata que o mirante tem movimento todos os dias da semana, mas que de quinta a domingo calcula que mais de mil pessoas frequentem o lugar. “Tem gente que vem para cá ver a vista e fazer outras coisas, sabe, né? E acaba sendo assaltado pelos marginais da favelinha aí de trás, aquela que fica no fundão da praça JK. Mas acho que o problema maior é o tráfico mesmo. Às vezes sai briga de gangue, qualquer hora vai ter morte.” O rapaz ainda conta, com bastante detalhes,

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a cena que presenciou na noite da sexta-feira, 13 de maio. Em resumo, uma garota brigou com o namorado e foi abandonada no local. Tendo descido a ladeira com bastante dificuldade, tal o estado de embriaguez ou consumo de drogas, procurou a ajuda do vigia solicitando o empréstimo de seu celular para chamar um amigo. Cerca de meia hora depois, chegou o irmão da garota, furioso e agredindo-a verbalmente. Segundo Welesley, a moça deu um verdadeiro ataque, recusando-se a voltar para casa com o irmão, dizia palavrões e repetia: “você não tem nada com isto, eu gosto dessa vida e faço o que eu quero.” As duas associações de bairro locais (a dos moradores da vizinhança da Praça do Papa/ Parque das Mangabeiras e a dos moradores do Comiteco), o 22º. Batalhão da Polícia Militar e a Guarda Municipal e ainda eventuais lideranças regionais, vereadores e deputados e candidatos a cargos eletivos municipais têm agido em conjunto para preservar a segurança e uma relativa tranquilidade para o bairro. Por serem espaços públicos destinados ao lazer de todo e qualquer cidadão, tanto a Praça do Papa quanto os parques das Mangabeiras e do Paredão da Serra do Curral exercem enorme atração aos visitantes de outros bairros e de outros municípios e, principalmente, como espaços abertos para a realização de eventos de todo porte, sejam de iniciativa popular, comercial ou municipal. A ausência de legislação adequada, a falta de vigilância e o flagrante desrespeito ao bem público e privado mostram que a situação atualmente sob controle pode ser rompida a qualquer momento. A aparente ausência de legislação adequada e o desrespeito ao bem público e privado mostram que há a possibilidade de a atual situação ser alterada

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