Revista Ponto & Vírgula - Ano 8 | Número 11 - Maio de 2016

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Revista Laboratório do Curso de Jornalismo Ano 8 | Número 11 - Maio de 2016

Parto normal e cesariana em debate Página 11

Praia na praça une tribos em Belo Horizonte Página 18

Garotas usam internet para vender prazer Página 38

A agressão é uma grave violação dos direitos humanos. Seu impacto traz consequências físicas, sexuais e mentais às mulheres, mas o problema ainda é tratado com descaso pela sociedade. Página 8



Valéria Said fala sobre o atraso na regulamentação da Mídia Pág. 5 O músico Tiago Iorc mostra seu lado MPB para os fãs brasileiros Pág. 48 Vitor Komura conta sobre seu trabalho na assessoria do Mineirão Pág. 41

Ponto e vírgula Prêmio Délio Rocha

Pág. 04

Código de Ética do Jornalismo

Pág. 07

Venda de celulares roubados

Pág. 17

Centro de Referência do Idoso

Pág. 22

Tratamento alternativo para TDAH

Pág. 24

expediente

Em busca da qualidade de vida

Pág. 34

FUMEC

Mulheres na cobertura esportiva

Pág. 43

Presidente do Conselho Executivo Prof. Tiago Fantini Magalhães Presidente do Cons. de Curadores: Prof. Pedro Arthur Victer

Cobertura internacional

Pág. 46

Comida sobre rodas

Pág. 50

Capital dos espetos

Pág. 52

Fundação Mineira de Educação e Cultura

Reitoria da Universidade Fumec

Reitor: Prof. Fernando de Melo Nogueira Vice-reitor: Prof. Guilherme Guazzi Rodrigues

Faculdade de Ciências Humanas

Diretor-Geral: Prof. Antônio Marcos Nohmi Diretor de Ensino: Prof. João Batista de M. Filho Coordenador do Jornalismo: Prof. Ismar Madeira

Ponto e Vírgula

Editor: Prof. Aurelio José Silva Coordenação Proj. Gráfico: Prof. Aurelio José Silva Técnico e finalização gráfica: Luis Filipe P. B. Andrade Técnico e tratamento gráfico: Daniel Washington S. Martins Revisão de texto: Prof. Dr. Luiz Henrique Barbosa Logotipo: Rômulo Alisson dos Santos Monitores: Camila Quirino Samara Reis Rafael Diniz Gabriel Costa Gráfica: Fumarc Tiragem: 500

Conselho Editorial

Prof. Alexandre Salum Prof. Aurelio José Silva Profª. Dúnya Azevedo Profª. Vanessa Carvalho Prof. Dr. Luiz Henrique Barbosa

Foto da capa Aurélio José Silva Luis Filipe Pena Janderson Silva

Black is beautiful - Ensaio fotográfico da repórter Thaís Costa convida o leitor a descolonizar a mente e olhar a nudez da mulher negra além da exploração sexual e da erotização Pág. 26


editoria - Subeditoria Prêmio

Jornalismo da Fumec ganha mais 2 Prêmios Délio Rocha ma a premiada Jackeline Oliveira. “Foi uma honra estar entre os finalistas e ganhar o segundo lugar em um evento que reúne o melhor do jornalismo de Minas Gerais. Receber este prêmio é uma forma de agradecer aos nossos mestres por toda a dedicação e carinho”, conta Maria Clara Gonçalves. “É uma emoção enorme... Faz toda a correria valer a pena! É um reflexo da qualidade dos mestres e da nossa dedicação”, disse Amanda Magalhães. Clara Barbi, coautora das duas reportagens, não esteve no evento e foi representada pelas colegas universitárias presentes. Leia as reportagens vencedoras em https://goo.gl/mJA9Lh

Jackeline Oliveira, Maria Clara e Amanda Magalhães na premiação

Da Redação Duas reportagens da Revista Laboratório Ponto e Vírgula, edição de setembro de 2015, foram vencedoras no 9º Prêmio Délio Rocha de Jornalismo de Interesse Público, promovido pelo Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Minas Gerais (SJPMG). As reportagens “Mamãe e mamãe” e “Muros Invisíveis” ficaram, respectivamente, em segundo e terceiro lugares na categoria estudante. A premiação foi realizada no dia 30 de abril. Com isso, as publicações laboratoriais do Curso de Jornalismo da Fumec já somam cinco premiações. O primeiro prêmio foi conquistado em 2011, na 5ª edição do concurso. A reportagem “Esperança em

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5ml”, publicada no jornal-laboratório O Ponto, faturou o primeiro lugar. Na edição seguinte, em 2012, a reportagem “Liberdade no Cárcere”, publicada pela revista Ponto e Vírgula, também levou o primeiro lugar. A terceira vitória consecutiva foi no ano seguinte, em 2013, com a reportagem “Infância com sabor amargo”, veiculada no jornal-laboratório O Ponto. As alunas Jackeline Oliveira e Maria Clara Gonçalves, autoras de “Mamãe e Mamãe” (2º lugar), e Amanda Magalhães e Clara Barbi, autoras de “Muros Invisíveis” (3º lugar), receberam prêmios em dinheiro e certificados. “Foi um evento muito bacana. É uma honra ganhar um prêmio e estar junto da nata do jornalismo nesta comemoração”, afir-

Revista Ponto & VírgulaFoto: — Maio Arquivo de 2016 pessoal

Reprodução das reportagens vencedoras do 9º Prêmio Délio Rocha Renata segurando Arthur e Priscilla segurando Theo

Theo e Arthur foram gestados por uma mãe com os óvulos da outra mãe; agentes penitenciárias optaram por fertilização in vitro e obtiveram na Justiça o reconhecimento legal de COMPORTAMENTO dupla maternidade POR CLARA BARBI, JACKELINE OLIVEIRA E MARIA CLARA GONÇALVES

Foto: Lucas Rodrigues

MUROS INVISÍVEIS

Revista Ponto & Vírgula — setembro de 2015

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Preconceito é a base das novas barreiras sociais do séc. 21

Confira: Karoline Marques ao lado do viner Pedro Lucas, que sofreu preconceito nas redes sociais por ser negro

Por Amanda Magalhães e Clara Barbi A internet parece erguer um muro entre nordestinos e o resto do Brasil, entre negros e brancos, entre homossexuais e heterossexuais etc. A geração tecnológica que deveria ser mais tolerante e aberta às diferenças devido à facilidade de debate e vasta diversidade, ao se esconder atrás de um computador, celular, o que seja, acaba por construir um novo muro de Berlim em pleno século 21. O jovem Gustavo Guimarães, de 19 anos, vítima de homofobia nas redes sociais, reconhece que a internet é

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um meio de comunicação extremamente eficaz, que possui inúmeros benefícios. Mas sabe também do lado perigoso. “Um meio tão abrangente e tão acessível reserva perigos ocultos; o conteúdo publicado pode ser acessado por quase todo o mundo, as informações são compartilhadas em alta escala e, portanto, estamos sujeito ao julgamento de outras pessoas de índole desconhecida”, observa. O estudante de engenharia de produção conta que, certa vez, pos-

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tou uma foto em um grupo do Facebook e recebeu comentários preconceituosos em sua foto. Gustavo foi chamado de “frutinha”, “bixa”, “viado”, além de ser comparado ao cantor Justin Bieber com conotação pejorativa. Gustavo Guimarães disse que, naquela época, aqueles comentários o incomodaram, mas que hoje já não o afetam mais. “Me senti mal naquele dia, percebi que a minha foto estava ali aberta a qualquer julgamento possível, vindo de qualquer pessoa, toda essa exposição acabou

Foto: João Góes Ozanan


Subeditoria - editoria opinião

como proceder na hora de disciplinar Por Thiago Drummond Guimarães dos Santos e Joyce Nunes Eu não me lembro de ter recebido palmadas de meus pais, embora algumas vezes eu tenha merecido. O que eu quero dizer é que, se eu apanhei ou não na minha infância, essa experiência não me abalou e não me tornei uma pessoa violenta. A prática de se educar utilizando agressão física é uma herança da colonização portuguesa, uma tática usada na catequizarão dos índios pelos jesuítas que se perdurou até hoje. No ano de 1990, foi criado o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e, em duas décadas e meia de existência, os menores de 18 anos conquistaram muitos direitos e deveres, como o direito de estar matriculado em uma escola, o direito de escolher nossos representantes na política através do voto e políticas públicas foram elaboradas especificamente para os menores de 18 anos. Em 14 de abril de 2014, o corpo de Bernardo Uglione Boldrini (11 anos) foi encontrado em um matagal na área rural da cidade Frederico Westphalen, a aproximadamente 80 quilômetros da cidade de Três Passos, no noroeste do Rio Grande do Sul, onde Bernardo morava com o pai Leandro Boldrini e a madrasta Graciele Ugulini. O pai, a madrasta, a amiga da madrasta Edelvãnia Wirganovicz e seu irmão Evandro Wirganovicz foram acusados de terem participação no assassinato de Bernardo, que foi executado com uma injeção letal, e presos preventi-

vamente. Esse crime horrorizou brasileiros de todas as regiões e apressou a tramitação de uma lei que proibisse a prática de abuso físico contra menores de idade, uma reivindicação dos defensores do ECA, que foi aprovada no dia 26 de julho de 2014 como a lei da palmada ou lei menino Bernardo. Quase dois anos depois da aprovação da lei, ela ainda causa polêmica na sociedade. A voluntária Ana Maria Pinto é uma conselheira tutelar que trabalha na Vara da Infância e da Juventude em Belo Horizonte. Ana enfatiza não admitir o uso da violência contra um menor de idade seja qual for a situação e que procura resolver as frequentes queixas de indisciplina através do diálogo com os pais e com o menor envolvido em delitos. Ana Maria Pinto relata também que não existem estatísticas que medem a quantidade de pais que foram presos após dar uma única palmada no filho e que essa lei existe para proteger as crianças e adolescentes de abusos físicos mais sérios, causados pelo descontrole dos pais que às vezes descontam o stress gerado pelo trabalho, por problemas financeiros e emocionais em seus filhos. Ana também afirmou que nem todas

as pessoas estão preparadas para ser pais. Em entrevista, pais relataram que, na maioria dos casos, tentam resolver questões de indisciplina através do diálogo, castigos como proibição de ir a festas, restrições no uso de tablet e celular, cortar momentos de diversão e, em casos extremos, utilizam uma palmadinha. Já os médicos, psicólogos, advogados e donas de casa que apanharam de cinto, chinelo e vara durante a infância nåo reproduzem o comportamento de seus pais na hora de educar os filhos. Em vez de uma surra, eles preferem resolver casos de indisciplina através do diålogo e de outros castigos

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entrevista

Ética Jornalística e Democratização da Mídia A presidente da Comissão de Ética e Liberdade de Imprensa do Sindicado dos Jornalistas de MG fala do atraso na regulamentação da mídia brasileira Qual a importância de discutir sobre a democratização da mídia brasileira? No Brasil, existe um conceito de mídia relacionado à concentração dos meios de comunicação de massa. Nós estamos 80 anos atrasados em termos da regulamentação da mídia e as grandes democracias. Levando como exemplo, temos os Estados Unidos que desde a década de 1930 possuem um conselho de comunicação. Outros países como a Argentina e a Venezuela possuem também uma preocupação com essa temática de regulamentação. Nossa constituição de 1988, nos artigos 220 a 224, possui abordagens sobre a comunicação social.

E estes artigos abrangem quais temas? Váleria Said é presidente da comissão de ética do Sindicato dos Jornalistas de Minas Gerais

Por Lucas Chalub Valéria Said já trabalhou como editora-chefe do jornal Pampulha e pela TV Manchete. Em 1998 optou por entrar no meio acadêmico como professora de Ética e Deontologia do Jornalismo, Teorias da Comunicação e Teorias do Jornalismo. A jornalista

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é mestranda em Estudos Culturais contemporâneos e tem como objeto de estudo a Cultura Vintage. Nesta entrevista, dada com exclusividade à Ponto e Vírgula, foram abordados os temas Ética Jornalística e Democratização da Mídia.

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Liberdade de expressão, oligopólios e monopólios, direito de resposta e a formação de um conselho social. Porém, é algo que está apenas no papel. É o caso da concentração de meios que continua acontecendo.

Por que a concentração de meios é uma prática que prejudica o jornalismo? Quanto maior a concentração dos meios de comunicação, menor a pluralidade de opinião e menor a diversidade de como os grupos e as minorias serão apresentados.

Foto índice: Guilherme Barros


valéria Said Você acha que o jornal impresso pode vir a acabar? Eu sou defensora do jornal impresso. Ele não tem que acabar. Temos que rediscutir as narrativas do jornal do impresso. Hoje não tem mais a questão do furo de reportagem. As redes sociais já fazem isso muito bem. Qual seria o papel das revistas e dos jornais? Aprofundar os temas. Fazer uma narrativa mais profunda. Agora, isso custa mais caro. É um investimento que, muitas vezes, o empresário não quer fazer, mas é esse, exatamente, o papel de um jornalismo mais profundo.

Os Estados Unidos em tempo de campanha eleitoral assumem um posicionamento em seus meios de comunicação. Você acha que esta prática é possível no Brasil? Todo editorial, em termo de campanha, deveria assumir seu lado oficialmente. O problema é que no Brasil eles fingem que não se assumem e acabam expressando suas opiniões nas entrelinhas. O jornal passa a colocar vestígios da campanha em cadernos de política, economia e até polícia, dependendo do caso. Com direcionamento político, o leitor ficará mais ciente sobre o que é de seu interesse e o que não.

Qual é a forma de punição para profissionais que cometem algum tipo de infração? Conforme prevê o artigo 15 do nosso código: “As transgressões ao presente Código de Ética serão apuradas, apreciadas e julgadas pelas comissões de ética dos sindicatos e, em segunda instância, pela Comissão Nacional de Ética”. Mas, para além de uma função judicante, a Comissão de Ética do Sindicato vai atuar como mecanismo de responsabilização social da categoria. Ou seja, a Comissão pretende ser catalisadora de uma cultura profissional

Foto reportagem: Bruna Miranda

responsável, promovendo os valores do jornalismo de qualidade. Ao invés de trabalharmos com formas de punição, levamos mais em consideração a credibilidade profissional. Um exemplo dessa situação foi o caso da Folha de S. Paulo, que em 2000, após ter lançado uma matéria “errada”, desculpou-se na capa de outro exemplar com os dizeres: “A Folha errou”. O certo é o profissional jornalista entender seu código de ética e possuir credibilidade. A liberdade de imprensa tem como contrapartida a responsabilidade pelas informações divulgadas.

Eu sou defensora do jornal impresso. Ele não tem que acabar. Temos que rediscutir as suas narrativas. Valéria Said Qual é a importância de discutir e debater o código principalmente em relação às condutas morais a serem seguidas? As respostas para os dilemas éticos não serão encontradas de pronto nas regras de conduta, que são limitadas. Todavia, é a partir desses princípios deontológicos, no caso, os artigos do nosso código, que podemos identificar quando desvios profissionais afrontam o perfil ético que a profissão exige. Por isso, é preciso tornar o Código de Ética dos Jornalistas mais conhecido, não só para a categoria, mas para toda a sociedade, tendo em vista que nossa profissão existe para garantir o direito inalienável do cidadão a informações de relevância pública, eticamente bem apuradas e estética e tecnicamente bem apresentadas. Nesse sentido, num claro

- entrevista

movimento de práxis pedagógica e jornalística, nossa Comissão vai se pautar por ações proativas, ao motivar os jornalistas mineiros a refletirem e discutirem seus dilemas éticos, seus limites de atuação e seu próprio campo de trabalho.

Qual é a diferença entre ética profissional e pessoal? Algumas pessoas afirmam que não era necessário um código de ética jornalístico. Mesmo que a pessoa tenha uma boa formação pessoal, ela não pode se basear, dentro de uma profissão, naquilo que outra entendeu como ético. O que é ético pra uma pessoa pode não ser pra outra. Exemplo disso são as diferentes questões culturais e religiosas presentes em alguns países. Essa questão gera discussão em relação ao jornalismo, pois essa profissão tem o princípio do contraditório, ou seja, é dever do profissional não impedir a opinião divergente em fatos de relevância pública. A profissão tem o papel de formar opiniões críticas.

É fato que existe uma divergência entre anunciantes e editores, principalmente a respeito do conteúdo a ser publicado. Para você, como é a relação entre jornalistas e anunciantes? Existe toda uma negociação entre a empresa e o jornal. O complicado é quando se mistura a publicidade com a matéria. É errado a publicidade não ser identificada, e entrar no jornal como forma de reportagem. Na maioria das vezes, o leitor não consegue distinguir a diferença entre uma publicidade e uma matéria. Outra situação muito complicada é quando o jornalista é obrigado a diminuir ou até retirar sua noticia/reportagem para que dê espaço para anúncios e propagandas. Deve haver um bom senso, mostrando o lugar da publicidade e o lugar do jornalismo

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rePortagem

quando o interesse conFronta a ética Falta de precisão do Código de Ética do Jornalismo faz profissionais da área terem opiniões divergentes em relação ao uso da câmera oculta Enquete: o código de ética é confuso?

sim

não

Enquete feita com 20 estudantes de jornalismo da universidade FUMEC

Por Sara Lacerda Há hoje uma polêmica que envolve diversas opiniões entre a imprensa, e principalmente os jornalistas: “O uso de câmera oculta é correto?” A discussão é ampla, e as argumentações são divesas. O código de ética não é preciso quanto a utilização da câmera, causando uma confusão por não determinar exatamente quando se deve usar, e se é ou não permitido o uso. Tal fato acaba interferindo no

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exercício da profissão. No código é feita uma ressalva no capítulo III, afirmando que o jornalista não pode divulgar as informações que foram obtidas de maneira inadequada, como por exemplo, o uso de identidades falsas, câmeras escondidas ou microfones ocultos. Entretanto, é colocada a exceção para casos de incontestável interesse público e quando esgotadas todas as outras

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possibilidades de apuração. O jornalista Diego Bertozzi, formado há 13 anos, conta, em entrevista já ter feito o uso da câmera e afirma: “Uma denúncia depende de provas, os flagrantes derrubam os argumentos. E as reportagens que fiz jamais teriam o mesmo peso sem este recurso”. Diego ainda reafirma sua opinião ao dizer que, se necessário, faria novamente o uso desse mé-

Infográfico: Sara Lacerda


reportagem todo, uma vez que sejam seguidas as recomendações que o código de ética estabelece. Por outro lado, o jornalista e atual professor Hugo Márcio Lemos Teixeira demonstra ter uma opinião contrária a de seu colega de profissão, Diego. Ao ser questionado em uma entrevista, afirmou que nunca faria o uso desse recurso, porque por ser jornalista e não um agente judiciário, não se sente no direito de violar a privacidade e os direitos legais sem a ordem da justiça. Em função da entrevista, a divergência de opiniões ficou notória, e

Foto: Leon Elias

sendo assim, uma enquete foi realizada com 20 estudantes de jornalismo, mostrando que 80% destes afirmam que o código de ética é confuso em relação ao uso de determinados meios, enquanto apenas outros 20% dizem entender com clareza. De acordo com o resultado da enquete, é possível perceber a confusão causada pelo código de ética nos profissionais da área, uma vez que esse não expressa com exatidão a orientação para a melhor utilização do recurso disponível. É necessário ainda que a consciência do jornalista faça parte do

processo, tendo ele em vista que, quando esse recurso é utilizado sem que as outras formas de adquirir a informação tenham sido esgotadas, pode haver consequências, já que o objeto de apuração não tem conhecimento de que está sendo registrado. Por se tratar de um código, não de uma lei, o código de ética serve como orientação para que, a partir de seus artigos e incisos, o jornalista possa basear suas atitudes, porém, a conduta do profissional depende única e exclusivamente de si próprio, de sua avaliação em cada situação e de sua ética pessoal e profissional

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matéria de capa

de olhos fechados

As agressões não são apenas físicas

A crua realidade dos abusos, da violência e do descaso em relação às mulheres ainda é uma marca em nossa sociedade Carolina Mercadante, Júlia Alves e Mariana Chacon “Nossa! Que delícia!”, “E aí, gostosa?”, “Dá um sorriso, coisa linda!”, “Doeu quando você caiu do céu, meu anjo?”. Em algum momento da vida adulta, ou nem tão adulta assim, todas as mulheres já ouviram essas palavras sendo gritadas a elas na rua. Você já ouviu, eu já ouvi, sua irmã e mãe já ouviram. Muitas outras continuarão a ouvir. Afinal, o que é uma ofensa para as mulheres, é um grande elogio para

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alguns homens. A questão é que a sociedade vê esses atos como algo comum, inofensivo. Mas os números não mentem. Um terço das mulheres já foi vítima de algum tipo de violência no mundo. Desse número, 20% estão na África subsaariana, sofrendo estupros diários. Uma em cada quatro universitárias americanas foi abusada sem que as reitorias e responsáveis pelas universidades providen-

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ciassem qualquer tipo de apoio ou justiça às vítimas. No Brasil, mais de 2 milhões de mulheres já sofreram violência doméstica. Em sua maioria, as denúncias não mantêm o agressor atrás das grades. Esses dados foram levantados pela Organização Mundial de Saúde, IBGE, e Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Instituições respeitadas, credenciadas e confiáveis. Então por que esses números continuam aumentando?

Fotos: Carolina Mercadante


matéria de capa A “objetificação” da mulher A resposta é simples. Essa questão tem um cunho social muito grave, já que a violência de gênero é constantemente ignorada. Para a psicóloga Juliana Prates de Melo, tudo se resume à hierarquia que impusemos entre as mulheres e os homens. “Estamos dentro de uma sociedade patriarcal, uma sociedade que é machista, e, nela, o homem é mais valorizado e a mulher é vista como seu objeto”. Quando uma mulher recebe uma cantada na rua, é apalpada no metrô ou é alvo de olhares indesejados no supermercado, isso já é um tipo de violência que muitas vezes é relegado ao fato de que homens são dessa forma, é da natureza deles. E quanto às mulheres? Bem, será dito que é a culpa delas e serem objetificadas é quase sempre o resultado final. “Como constituímos essa relação de dono e propriedade, muitos homens se sentem no direito de agredir, cantar, violentar as mulheres. Afinal, em seus ideários, elas são inferiores e pertencem a eles, perpetuando a violência”, Juliana completa. É o caso da estudante de Direito da PUC Minas, Gabriella Nicholls. Voltando de seu trabalho no Lourdes, em Belo Horizonte, ela caminhou até o ponto de ônibus de sempre, então notou que um homem a seguia. Um pouco assustada, tentou andar mais rápido, mas no ponto ele se sentou ao seu lado e começou a assediá-la verbalmente e tentar agarrá-la. “Ele parecia uma pessoa normal, mas acho que isso não importa muito, não é? Quando há uma disputa de poder não importa a aparência. Porque é isso que o assédio e o estupro são, alguém exercendo poder sobre outro, por acreditar que ele tem esse direito”. No caso de Gabriella, nada mais grave aconteceu, um senhor apareceu e a ajudou, espantando o homem. Mas em quantos casos isso

Fotos: Carolina Mercadante

não é unanimidade? Cerca de 50 mil casos em todo o Brasil, segundo o Ministério da Justiça. Esse número é muito maior em todo o mundo. “Eu tive sorte, mas, quantas mulheres não têm? Esse crime deve ser levado a sério, mas acima de tudo, a sociedade deve começar a respeitar a mulher”, conclui a estudante.

É importante falar Por isso, é importante falar sobre o abuso. É preciso colocar sob a luz dos holofotes a cultura do estupro e, como ela torna a mulher um objeto, hipersexualiza e ofende. Essa realidade não pode ser descartada como uma brincadeira, uma inocente cantada, ou uma inofensiva propaganda machista. Para Juliana, essas atitudes podem levar a algo muito maior e perigoso. “Estamos dentro de uma cultura do estupro muito forte, em

que a mulher é culpada pela própria violência sofrida, em que sexualizar meninas é comum, em que o abuso é banalizado e isso eterniza esse ciclo de violência contra a mulher”. E é isso que tem ocorrido ao redor do mundo, mulheres engajadas têm falado em nome das que não podem contra a violência de gênero. Segundo Leslee Udwin, consultora da ONU em direitos humanos em entrevista para o El País Brasil, a educação é a principal arma contra esse crime. Leslee é diretora do filme India’s Daughter (Filha da Índia) e, como sua personagem principal, também foi vítima de estupro. Seu filme conta a história de Jyoti Singh, uma indiana estudante de medicina que voltava para casa e foi encurralada no ônibus por seis homens, estuprada, violentada e ferida com várias facadas na barriga antes de

Todos os dias as mulheres enfrentam abusos nas ruas

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matéria de capa - de olhos fechados ser deixada na estrada para morrer. Esse crime foi visto pelo motorista do ônibus que afirmou que ela “merecia ser estuprada, já que estava andando sozinha a essa hora”. Os protestos que se seguiram no país após o caso, em 2012, levaram o governo a condenar cinco dos homens à morte e o outro, um menor, foi detido por três anos. Essa história que se repete diariamente, poderia ter ocorrido em qualquer parte do mundo. É o que acontece com as mulheres curdas que formam um grupo rebelde que luta contra o Estado Islâmico e quando capturadas, sofrem estupros e torturas constantes, na tentativa de diminui-las como combatentes. É o que acontece no Iraque onde o estupro matrimonial está no processo de ser legalizado. É o que acontece nos Estados Unidos, onde o candidato republicano à presidência Jeb Bush fomentou uma lei, quando governador da Florida, que estabelece que mulheres estupradas deveriam ser subjugadas a terem seus históricos sexuais divulgados em jornais para “justificar” seus abusos e prevenir que garotas se “comportem mal”.

mau atendimento, as inúmeras acusações de que os responsáveis perpetuam a violência contra as mulheres e o fato de que a Revista Ponto e Vírgula tentou inúmeras vezes entrar em contato com a Delegacia de Belo Horizonte, sem su-

cesso, demonstram que o problema ainda está longe de ser resolvido. As mulheres permanecem a mercê de uma sociedade insensível ao estupro e que mantem os olhos fechados para essa realidade

A revolução das mulheres Recentemente foi aprovada na Câmara a PL. 5069, um projeto de lei que prevê a restrição da venda de pílulas do dia seguinte, inclusive para casos de estupro. A lei ainda não foi aprovada no Congresso, mas demonstra o descaso dos políticos brasileiros em relação aos direitos das mulheres. Porém, milhares estão se unindo e protestando contra essa medida. Em uma revolução contra as tentativas do governo de mais uma vez controlar o corpo das mulheres, no facebook e twitter uma nova hashtag tem visado alertar e conscientizar as pessoas em relação ao abuso contra a mulher. O primeiro abuso foi a forma que várias mulheres, famosas ou anônimas, encontraram de relatar suas histórias de sobrevivência, contando os abusos que sofreram e trazendo força para outras vítimas. A união das mulheres tem feito a diferença na luta contra o machismo e o abuso, mostrando que a revolução delas veio para ficar.

As dificuldades no Brasil No Brasil, atualmente o estupro é um crime hediondo e tem pena de 6 a 10 anos de reclusão para o criminoso, aumentando para 8 a 12 anos se há lesão corporal da vítima ou se ela possui de 14 a 18 anos de idade, e para 12 a 30 anos, se a conduta resulta em morte. Porém, muitas vezes ela não é cumprida e o criminoso sai impune e a vítima é constrangida durante todo o processo de investigação. A Delegacia da Mulher é uma tentativa de melhorar esse tratamento. Mas as constantes reclamações de Os números de assassinatos de mulheres são alarmantes em todo o mundo

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Fotos: http://blogs.diariodepernambuco.com.br


reportagem

O parto que deixou de ser normal

A blogueira Ana Luísa deu a luz sua terceira filha em um parto domiciliar

Por Carolina Mercadante, Julia Alves e Mariana Chacon Ana entrou em trabalho de parto, sentiu dor, seu filho nasceu e foi direto para o seu colo. Ela foi para casa no mesmo dia. Já Maria teve uma cesárea eletiva, viu seu filho por alguns minutos, ficou mais de uma hora na sala de recuperação separada do bebê e ficou por dois dias no hospital. Ambas tiveram seus filhos e eles vieram ao mundo com saúde. Mas só isso basta? O nascimento de um filho é um marco na vida de uma mulher e por muito tempo, quando as gestantes eram questionadas sobre qual parto elas escolheriam, a resposta era

Fotos: Arquivo pessoal

sempre a mesma: o importante é vir com saúde. Mas essa fala começou a ser questionada quando mães, que tinham tudo para conseguir ter seus filhos por parto normal, começaram a ser encaminhadas para uma cesárea sem justificativa certa. Assim, o parto normal perdeu o “normal” e se tornou cada vez mais difícil. Mas se as mulheres estão biologicamente prontas para parir, por que elas não estavam conseguindo? As razões médicas alegadas eram das mais variadas: seu quadril é muito estreito, o neném é muito grande, você não vai aguentar a dor, sua vagina vai fi-

car deformada, só podemos esperar até 40 semanas. Mas as pesquisas indicavam exatamente o contrário: o parto normal é a forma mais segura de se ter um bebê e, segundo a Organização Mundial de Saúde, o Brasil passa por uma “epidemia” de cesáreas. O número considerado razoável para essa pratica é de até 15%. Entretanto, o nosso país ultrapassa e muito esse número. Aproximadamente metade dos brasileiros vem ao mundo através deste método. Segundo a enfermeira obstetra Nelci Muller, 80% das mulheres têm capacidade de ter um parto normal,

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reportagem - parto humanizado vaginal sem nenhuma complicação. é pautado no respeito às vontades e As redes sociais auxiliando “O corpo da mulher é biologica- à natureza da mulher, tornando-a a mente preparado para parir”, com- principal protagonista do parto. Esse Através das redes sociais, as grápletou a enfermeira. método prioriza as vontades e os de- vidas começaram a trocar experiênA cesárea, que surgiu como uma sejos da gestante, que pode querer ter cias e informações sobre seus partos forma de salvar mulheres e bebês e um parto totalmente natural, sentada e médicos e descobriram que podeajudar em uma gravidez considerada ou deitada, dentro da banheira ou na riam ter uma experiência diferente. de risco, se tornou algo Laura Electo e Ana Luicorriqueiro e também sa Masi são duas perconveniente para os mésonagens importantes dicos e instituições de nessa luta. Primeiro por saúde marcarem em suas serem “gente como a agendas o melhor dia e gente” e segundo, porhorário para que aquela que compartilharam mulher ganhe seu filho. seus relatos de parto Conseguir ter um parto em seus blogs e páginas normal passou a ser uma do facebook, abrindo luta e já não bastava queum contato enorme rer ou entrar em trabalho com outras mães que, de parto, era necessário por diversos motivos, também encontrar uma se sentiam inseguras boa equipe, que pudesem relação a essa exse dar toda a assistência periência. A blogueira necessária e respeitar a e empresaria Ana Luivontade da paciente. Foi sa Masi, mãe de Bruna questionando esses fatos (5), Clara (2) e Alice (2 que as mulheres começameses), teve a experiênram a pesquisar e percecia completa. Em seu beram que podiam mais. primeiro parto, ela teve A experiência poderia ser uma cesárea eletiva; prazerosa, bonita e apeno segundo, um parto sar da dor, uma boa renormal hospitalar sem cordação. Esse foi o caso analgesia e foi no terceide Laura Electo, 23 anos, ro que ela fechou com mãe do Enzo, de 1 ano, chave de ouro, em um que pensava exatamente parto humanizado, na como a maioria das fubanheira em sua próturas mamães, “vir com pria casa. “Vi que nossaúde é o que importa”. so corpo sabe parir e os Ela mudou completabebês sabem nascer, na mente sua percepção grande maioria dos caapós assistir ao vídeo Laura Electo em seu parto no Hospital Sofia Feldman sos. Ele não precisa ser da cesárea de uma amiretirado, esfregado, ter ga. Na procura por mais opções de banqueta. O principal é a mulher se o cordão cortado imediatamente”, parto, de forma segura e acolhedora sentir à vontade naquele momento disse ela completando ainda que o para a mãe e o bebê, muitas mulheres e ter os seus desejos respeitados. As principal foi o respeito ao nascimense depararam com o parto humani- mulheres tem também o auxílio de to. Além disso, segundo ela, realmenzado. Apesar de muitos pensarem se doulas, consideradas anjos pelas par- te existe um protagonismo em que a tratar de um método radical e que se turientes. Elas não desempenham as mulher é a principal personagem duresume em um parto na banheira e funções de médicos nem enfermeiras, rante o parto e a equipe médica está sem nenhum tipo de analgesia, o mé- têm o papel de auxiliar, incentivar e lá para assisti-la e ampará-la, desde todo humanizado vai além disso, ele tranquilizar as futuras mães. que se faça necessário. Essa opinião é

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Foto: Arquivo pssoal


parto humanizado compartilhada por Laura que acrescentou ainda que “a única pessoa que sabe a hora de nascer é o seu bebê e tem tudo para ser uma experiência maravilhosa”.

Belo Horizonte As maternidades privadas da capital são as mais procuradas pelas gestantes e nenhuma delas tem um índice de cesáreas inferior a 64,1%. O hospital Vila da Serra, por exemplo, tem uma taxa de 86,2% de partos cesáreas realizados no local. Os hospitais Mater Dei e Sanda Fé, bastante tradicionais e procurados, possuem ambos mais de 70% de partos cesáreas feitos. Se a gestante belo-horizontina tem interesse em um parto humanizado, deve fugir desses lugares. E um dos hospitais referência nesse tipo de parto é o SUS Sofia Feldman. Com suítes de parto com todos os equipamentos necessários, como banheira, bola e banqueta de parto, ele conta ainda com doulas voluntárias e é referência como hospital.

gundo a Fundação, pode-se considerar violência desde a impaciência do obstetra e equipe médica, a procedimentos médicos desnecessários. “Nós combinamos com um bebê que ele vai nascer na sexta-feira, às quatro horas da tarde? E se combinamos, ele respondeu pra gente que tem condição de nascer?” O que vai ser do nosso sistema de produção dos hormônios do amor se eles deixam de ser utilizados, eles passarem as ser inúteis?” Essas foram algumas

- reportagem

frases ditas no documentário O Renascimento do Parto, assistido por mais um milhão de brasileiros, e que vem despertando as mulheres para como elas realmente querem que seus filhos venham ao mundo. O sucesso do primeiro documentário foi tanto, que os produtores arrecadaram R$127.211,00 para a produção de o “O Renascimento do Parto 2”, que será lançado em 2016. Já é possível assistir ao trailer no youtube

Porque é tão grave? A realidade é que a cesárea é uma cirurgia e por esse motivo implica diversos riscos para a vida da mãe e do bebê, como possíveis complicações pós-cirúrgicas. É difícil calcular a data correta da concepção e, por isso, muitas vezes o parto é agendado antes de o bebê estar de fato pronto para nascer, causando muitas vezes uma prematuridade desnecessária. Além disso, pode ocorrer de a mulher ter o rompimento da cicatrização no útero ou uma possibilidade maior de abortar em uma próxima gravidez. Além de sentir medo da dor, a maioria das mulheres ficam com receio em relação à violência obstétrica. Segundo a Fundação Perseu Abramo, uma, a cada quatro mulheres, passa por esse tipo de violência no processo de parto, e muitas nem sabem disso. Ainda se-

Foto: Arquivo Pessoal

Laura Electo em uma contração durante o parto humanizado

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reportagem

O prazer e A dor nos vícios Conheça histórias de pessoas que convivem com diversos tipos de dependência, desde drogas ilícitas à compulsão cibernética Eduardo Pensute

Caro leitor, todos os nomes usados nesta reportagem são fictícios para proteger a identidade dos personagens.

V

itor faz curso de Fotografia e é usuário de maconha. Como estuda muito e convive diariamente com problemas familiares graves, Vitor fuma a erva frequentemente no intervalo das aulas para relaxar e tentar fugir por alguns minutos das adversidades que a vida lhe impõe. Dizer que a maconha não causa dependência e que não prejudica a saúde por se tratar de uma planta natural é um engano, pois Vitor fuma maconha como se fosse cigarro e afirma ter os mesmos problemas de um fumante ativo, como bronquite, redução da capacidade de aprendizado e memorização. Além disso, ele diz ser viciado sim e que a erva nunca o deixou 100% relaxado.

Influências do alcóol Ainda no ensino médio, quando tinha 17 anos, Maísa foi numa festa da prima de uma amiga que tinha fama de ser “piriguete”. Ela pensou que tais boatos eram apenas inveja

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das pessoas, mas, quando entrou no local da festa, de fato ela parecia uma festa inapropriada, pois as pessoas faziam orgias em todos os locais da casa. O pensamento da estudante foi querer sair desse ambiente, mas, como era muito imatura, acabou ficando. No decorrer da festa, dois homens se aproximaram de Maísa e ofereceram uma bebida. Ela nunca havia consumido álcool, mas mesmo assim experimentou. Após tomar várias doses, ela ficou completamente bêbada. Hoje a universitária não sabe qual o seu limite e convive com o vício do alcool no seu cotidiano.

Obsessão pelo corpo perfeito O vício de Fred pode ser encontrado na farmácia e tem nome e sobrenome. Trata-se do Hormônio do Crescimento, ou GH (Growth Hormone). Ele é produzido pela glândula hipófise, localizada na parte inferior do cérebro, e está presente em todas as pessoas. Fred queria ganhar massa muscular magra, mas tinha muita dificuldade, por isso seu médico endocrinologista indicou o uso do anabolizante. Fred não pensou que a utilização do remédio pudesse causar vício, além do mais, muitas pessoas de sua academia comentavam os benefícios do GH. Só para ter uma ideia, Fred pesava 55 qui-

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los quando começou a usar a droga. Hoje o universitário pesa cerca de 90 quilos e tem um percentual de gordura entre 7 a 8%. Fred percebeu que se tornou um indivíduo narcisista, e sente os efeitos colaterais, como dor nos músculos e nas articulações. O universitário diz estar limpo há dois meses e que deseja parar definitivamente de tomar o anabolizante.

A maníaca do sexo Marjorie teve sua primeira experiência sexual quando ela tinha apenas 9 anos. A primeira relação foi com seu primo de 17 anos, que na época se rendeu aos pedidos da morena de olhos azuis. Ela também é conhecida pelos amigos mais íntimos de BH como a Barbie do estelionato. Hoje, loira deslumbrante, quando passa pelo campus, ofusca outras garotas da Universidade. Marjorie foi expulsa de casa pela mãe aos 18 anos por ser muito polêmica, fato que lhe causou mais prazer do que mágoa. Em Belo Horizonte, a compulsão por sexo da paulistinha de Araraquara foi ficando cada vez maior e ela resolveu se tornar acompanhante de luxo. A universitária já está quase terminando a faculdade, mora em um luxuoso flat na região centro-sul de Belo Horizonte e, com dinheiro do seu trabalho, consegue manter um alto padrão de vida.

Foto: www.flickr.com/photos/zund


Subeditoria

- editoria

De aluno exemplar a usuário de droga Bernardo sempre foi um aluno exemplar, tirava notas boas no colégio e era o xodó da família. Entrou na universidade e, no quarto período do curso, um rapaz, prestes a se formar em direito, faz uma disciplina em sua sala e logo se tornaram amigos. Pedro andava com pessoas erradas, mas tinha ideias de projetos filosóficos diferentes, quando a maioria dos outros alunos mal conseguiam formular uma boa ideia. Na última calorada da universidade, os dois saíram para beber e começaram a conversar com duas garotas. Levaram-nas para a casa de Bernardo, pois seus pais viajam todas as sextas-feiras. Na casa de Bernardo, no bairro Sion, seu novo amigo tirou cocaína do bolso, esticou umas carreiras e começou a cheirar. As meninas aceitaram e também cheiraram sem titubear. Bernardo achou uma cena muito forte, mas mesmo assim acabou experimentando e não se lembra mais nada daquele dia. No dia seguinte, ele queria mais daquilo e logo tudo na sua vida começa a dar errado. De queridinho da família e aluno exemplar, começou a passar mais tempo nas ruas em busca dos prazeres que a droga lhe proporcionava, e hoje só dá trabalho para a sua família. Seu pai descobriu que, quando ele está sem dinheiro, vende algumas peças de roupas para comprar a droga. O pai de Bernardo vive ameaçando internálo em uma clínica, pois sua vida está indo ladeira abaixo.

A viciada cibernética A internet facilita a vida de muitas pessoas, mas transformou a vida de Julia em uma catástrofe. Antes da internet, Julia lia livros, saía para dançar, namorava, viajava. A partir das novas interações por meio de seu smartphone, as coisas começaram a desandar. O que era apenas uma breve olhada nos posts das redes sociais, como Facebook, Twitter, Instagram, hoje se tornou um caos, pois ela não sai de casa sem levar um aparelho eletrônico, sem conferir seus diversos perfis nas redes sociais ou, até mesmo, sem trocar mensagens com seus amigos, mesmo que um deles esteja ao seu lado no intervalo. Mesmo em casa, Julia não larga seu vício. Praticamente abandonou sua família, não conversa com seus pais e com seu irmão como antes e passa a maior parte do seu tempo dentro do quarto. A situação se agravou quando, um dia, ao voltar de viagem, sua mãe percebeu que Julia estava chorando no quarto. A garota, distraída com a internet, havia passado muitas horas sem comer. Sua mãe ficou furiosa e teve de levá-la ao médico para evitar maiores complicações na sua saúde. Hoje, Julia é depressiva, faz sexo pelo computador, é bipolar e começa a surtar quando, por algum motivo, a conexão do provedor cai.

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reportagem

Comércio ao ar livre dos celulares roubados Debaixo dos olhos da polícia, os aparelhos celulares são comercializados em plena luz do dia na Praça 7 Por Gerson Melo e Ricardo Bastos

Negociação de celular ao ar livre na Praça 7

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Um celular roubado a cada meia hora. Cinquenta e três celulares roubados diariamente. Segundo a Secretaria de Defesa ≠≠Pessoal do Estado, de janeiro a julho de 2015, 11.351 celulares foram roubados, mais de 30% de aumento em relação ao mesmo período do ano passado (cerca de 8.700). Se os números assustam, também levam a pensar: para onde vão esses celulares roubados? A partir dessa inquietação, a equipe de reportagem da revista Ponto e Vírgula foi às ruas tentar descobrir o paradeiro desses aparelhos. Na Praça 7, centro da capital mineira, a equipe de reportagem da revista Ponto e Vírgula conversou com vendedores de celulares, procurando aparelhos que nas lojas possuem um preço elevado. Procuramos smartphones de última geração. Durante a conversa, o vendedor nos levou em um local de um prédio onde tinha uma banca com vários aparelhos com o preço bem reduzido do que nas lojas. Um dos vendedores ligou para outra pessoa à procura de um aparelho. Celulares na faixa de 2 mil reais, foram oferecidos pelo vendedor no valor de 700 reais e com garantia.

Foto: Ricardo Bastos


reportagem Ele também disse “Ô mano, se você quiser, posso ligar nele e te levar na banca dele, lá ele deve ter mais de 70 tipos de aparelhos, com whatsapp, facebook e tudo que você precisar”. Outro vendedor abordado pela equipe da revista, com a mesma proposta de buscar aparelhos com o preço reduzido, nos garantiu que conseguiria qualquer tipo de celular com preços abaixo dos encontrados no mercado. Durante a conversa, ele citou vários aparelhos que ele tinha a disposição para venda e esses aparelhos estariam em uma loja numa galeria perto dali. Se fechássemos o negócio, ele nos levaria até o local para fechar o negócio. Depois de muita conversa decidimos ir para outro local para apurar e conseguir mais personagens para a matéria. O rapaz afirmou que tinha uma variedade de marcas e que conseguiria o aparelho que buscávamos muito rápido. A equipe insistiu em um aparelho que ele não tinha em mãos naquele momento. Nos pediu um minuto, afastou uns 10 metros e

conversou com um dos seus contatos durante 3 minutos .“Ô zé, aqui não vou ter esse aparelho, mas posso ligar nos contatos que os meninos lá de cima devem ter”. A equipe de reportagem da revista entrevistou pessoas que tiveram o celular roubados no centro de Belo Horizonte. Ana Clara Caldeira, 18, faz cursinho no centro de Belo Horizonte e já teve seu celular roubado uma vez. “Fui abordada na Rua São Paulo em frente ao Shopping Cidade. O assaltante colocou um canivete na minha costela e disse para não gritar ou ter qualquer tipo de reação senão ele iria enfiar o canivete.” Distraída com o aparelho celular na mão, iria fazer uma ligação quando foi abordada. “No calor da situação, um segurança me ajudou depois que o pivete levou meu celular, me emprestou o telefone e liguei para minha mãe me buscar. Fiquei assustada que nem fiz o boletim de ocorrência, só bloqueei o telefone quando cheguei em casa.” A estudante Eloá Magalhães, 20,

também foi vítima dos assaltos a celulares no hipercentro de Belo Horizonte. “Eu estava andando distraída no centro, fui atravessar num sinal da Praça 7, quando fui ver, minha bolsa estava aberta e meu celular não estava lá dentro mais.” Os aparelhos são objetos com um valor financeiro considerável, tendo smartphones mais básicos com preços entre 300 a 500 reais, e os mais completos chegando a custar até 4 mil reais, tornando alvo fácil dos ladrões. No hipercentro da capital mineira, o roubo ou furto de celular é frequente. A Polícia Militar cedeu uma entrevista coletiva no dia 25 de agosto. O major Eugênio Valadares, do 1° Batalhão da PM, disse que mais de 3% dos roubos de celular acontecem no hipercentro, que não tem mais de um quilômetro quadrado. Ainda na coletiva da PM, eles comemoraram a queda de ocorrências de diferentes situações, porém os roubos de celulares ainda é uma preocupação

Número de celulares roubados de janeiro a julho Fonte: Secretaria de Defesa Pessoal do Estado Revista Ponto & Vírgula — Maio de 2016

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reportagem

Por Duda Ramos O termômetro marca 34 graus na Praça Diogo de Vasconcelos, coração da Savassi, região nobre da capital mineira. É lá o endereço do evento Praia da Estação, que assim foi batizado por acontecer tradicionalmente na Praça da Estação, localizada no hipercentro de Belo Horizonte. No primeiro sábado de outubro (03/10/2015), no entanto, o refresco dos banhistas – que confirmaram presença no evento pelo Facebook – veio das águas que jorram de outras fontes, devido ao desligamento dos equipamentos no

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“Mistura sua laia Ou foge da raia Sai da tocaia Pula na baia Agora nós vamos invadir sua praia” logradouro central. Em novembro de 2015 iria completar dois anos que a Praça da Estação estava seca, graças a uma manutenção nas fontes, feita pela Prefeitura de Belo Horizonte. Cansados de esperar, os or-

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ganizadores do movimento da Praia, que tem na sua raiz a crítica à atual administração municipal, se mobilizaram para buscar água em outras paragens da cidade. A PBH, por sua vez, se apressou e, na semana que antecedeu à festa, anunciou o reestabelecimento das fontes no endereço central, o que não convenceu os banhistas belo-horizontinos.“Vinha muita gente pra cá e isso seria complicado, porque na cabeça deles esse espaço [a Savassi] é privado...não é das pessoas da cidade. Esse evento aqui devia ter umas mil pessoas confirmadas. De repente, a fonte da Praça da Estação voltou a funcionar


reportagem

milagrosamente. Aí não deu, né? O evento bombou meio que por causa disso também, porque é um absurdo a fonte estragar em 2013, e assim que a gente marca a praia... um dia antes, o negócio volta a funcionar?”, questiona o economista Rodrigo Castriota.Deitado nos gramados da Praça Diogo de Vasconcelos, Rodrigo, que também é regente de diversos blocos carnavalescos de Beagá, passa o dinheiro da vaquinha para o caminhão pipa a um amigo. São 15h e as fontes atrás dele e de outras 150 pessoas aproximadamente (de acordo com a Polícia Militar) acabam de ser desligadas.

“Só parei para observar a movimentação. Eu acho muito bom porque com essa batucada já é preparatório para o carnaval, e os locais que eles têm para se reunir são as praças”.

“É um evento que tem importância principalmente aqui na zona sul, onde a gente vê que a Praia conseguiu unir todas as classes sociais e tipos de pessoas”

João Paulo Coelho, 73, professor

Barbara Bianca, 17, estudante

A assessoria de comunicação da prefeitura foi contatada para saber

dos bares, Belo Horizonte explora essa fama e conta até com um jargão: “Se Beagá não tem mar, vamos pro bar”. Com uma frase similar, a página oficial da Prefeitura de BH no Facebook fez um post, na sextafeira anterior à Praia na Savassi , o que foi visto com olhares críticos por alguns banhistas. “Independentemente desse clichê, se BH não tem mar... a gente deve se abrir para outras formas de diversão e ocupar a cidade. Lazer nos espaços públicos é uma dessas formas”, reflete a professora Luciana Gehard.Desde que a notícia da ocorrência da Praia na Savassi ganhou a mídia, a Câmara

Se Beagá não tem mar... o motivo da interrupção no funcionamento das fontes, mas ninguém atendeu Os vendedores ambulantes também aproveitam a descontração dos banhistas para inovar nos drinks e aumentar os lucros: caipirinha, caipisaquê e catuçaí (uma mistura de catuaba com açaí) desfilam em copos com muito gelo, desafiando o calor inclemente da tarde na Savassi.Conhecida como a capital

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reportagem - praia da estação de Dirigentes Lojistas (CDL BH) se reuniu com representantes da segurança pública municipal e da regional centro-sul para discutir os impactos no comércio e nos equipamentos públicos. Há 50 metros das fontes da Praça Diogo de Vasconcelos fica o restaurante Status Cultura e Gastronomia, onde vários frequentadores não adeptos da Praia da Estação aproveitam a tarde nas mesas do quarteirão fechado da rua Pernambuco. “Pelo o que conversei com algumas pessoas isso (praia da estação) incomoda a alguns. Na minha opinião é até um movimento interessante, principalmente por ser na Savassi, e por diversificar as tribos que passam por aqui”, comenta o engenheiro civil Pedro Rosa. Já o gerente do estabelecimento, Charles Santana diz que a Status não foi afetada de nenhuma forma, mas expressa preocupação com a demanda por estrutura. “A casa tem 41 anos e sua clientela consolidada, portanto, nossa única apreensão é com os banheiros químicos e policiamento, já que em relação aos banheiros não temos como atender a esse número de pessoas”, afirma Santana. Faltam oito minutos para as 17h e os esguichos das fontes dão indícios de que a água vai voltar,para alegria da galera que agora já está em um número bem maior do que há duas horas. Assim como nas areias das praias mais badaladas do Rio de Janeiro, não se vê mais nenhum pedaço de grama ou concreto livre para estirar uma canga. Em poucos instantes, o que era uma suspeita se concretiza e a água dá o ar da graça, levando os banhistas ao delírio.

A praça é nossa Representando a Zona Norte de Belo Horizonte, meninas como Barbara Bianca de 17 anos caminham pela praça da Savassi empoderadas

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de seus corpos em biquinis e do espaço público em festa: “É um movimento que além de trazer diversão é político. Isso tem importância principalmente aqui na zona sul, onde a gente vê que a Praia conseguiu unir todas as classes sociais e tipos de pessoas”.Se o movimento Praia da Estação hoje existe e leva jovens, famílias, pessoas de todas as classes sociais, cores e ideologias aos espaços públicos de Belo Horizonte para curtir tardes ensolaradas, imaginando que Beagá tem mar, todos devem agradecer a um episódio e seus atores. Em 2009, o então prefeito e ainda hoje em exercício Márcio Lacerda publicou um decreto que proibia eventos na Praça da Estação. A reação veio quando algumas pessoas começaram a ocupar o local no verão de 2010 como se ali fosse o balneário da capital. “Assim como essa festa política de Belo Horizonte, o evento foi crescendo e cada vez mais pessoas foram aderindo à Praia. Depois de algum tempo que aquele espaço vem sendo ocupado, a gente vê que essa praia da Estação já é algo autônomo, que não depende mais de alguém puxar...tanto é que o evento é criado no Facebook aleatoriamente – um usuário cria, as pessoas vão curtindo e assim acontece”, conta Castriota.

dinheiro da vaquinha feita quando as fontes foram desligadas. Agora embalados pela percussão dos músicos da Roda de Tibau, da Juventude Bronzeada e do Então Brilha os banhistas entoam hinos do carnaval e a praia vira bloco. “Na hora que a gente paga caminhão pipa pra vir até aqui e fazer a festa acontecer a gente tá mostrando pra uma política conservadora e opressora, como é o caso da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, que a gente está querendo ocupar a cidade de uma maneira mais livre. Coloca aí também a questão de classe nessa hora, porque o religamento das fontes da Praça da Estação não é somente para a festa voltar a acontecer, já que tem moradores de rua que fazem uso delas pra se banhar e se refrescar durante o verão extremamente quente. Essa questão do caminhão pipa por conta de vivermos uma crise hídrica não significa um desperdício de água, porque esse está mais concentrado no setor industrial e comercial. Já nós que temos o abastecimento doméstico e de diversão isso é uma parcela insignificante no sentido do volume de água”, opina a banhista e engenheira ativista Sara Cura.

Tem onda em beagá, muleke!!!

Faltam cinco minutos para as 18h e a maré começa a baixar com a saída do caminhão pipa, que devolve a calmaria para o mar das quatro fontes da Praça Diogo de Vasconcelos que continuam ligadas. Mesmo sem os jatos do caminhão, a festa e o batuque continuam. Do canteiro central da Avenida Getúlio Vargas, um grupo de seis policiais militares observa os banhistas. De acordo com eles, até aquele momento, não houve nenhuma ocorrência ou anormalidade. São 18h26, o samba e a praia prosperam em Beagá

Às 17h o caminhão Pipa que estava estacionado na Avenida Getúlio Vargas lança seu primeiro jato d’água nos veranistas que agora já ocupam o outro lado da Praça da Savassi. A mangueira que sai do tanque e é manuseada pelo próprio motorista vira objeto de disputa da garotada que quer sentir a sensação de molhar centenas de pessoas em plena praça pública. São dez mil litros cúbicos comprados com

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O sol se despede no mar de concreto


comportamento

Para vencer os desafios da terceira idade Centro de Referência da Pessoa Idosa oferece serviços e programas para quem busca qualidade de vida

Diversas atividades são oferecidas no Centro de Referência, a ginástica para homens e mulheres é uma delas

Por Adrielle Moreira e Iara Fernandes “Meu nome é Guilherme Oliveira Pereira, tenho 83 anos, tive várias doenças na minha vida; quatro infartos, duas peritonites, câncer na bexiga, que inclusive ainda estou tratando, e frequento aqui há três anos”. Essas são algumas vitórias narradas por Pereira, com certo orgulho e um sorriso estampado no rosto. Ele é um dos frequentadores do Centro de Referência da Pessoa Idosa, no bairro Caiçara, em Belo Horizonte. O centro é um projeto da Coordenadoria do Direito da Pessoa Idosa

Fotos: Adriele Moreira

(CDPI) que oferece serviços e programas voltados para a promoção e defesa das pessoas a partir dos 60 anos. Um espaço público que tem como objetivo contribuir para a melhoria da qualidade de vida e oferece diversas atividades gratuitas como aulas de dança, ginástica, violão, artesanato, teatro e informática que preenchem o tempo dos idosos e que melhoram a condição física, ajudando na luta contra a depressão, além de elevar a autoestima. Um lugar onde se vê alegria, diversão e sorrisos, mas

que esconde histórias de sofrimento e abandono. Na sala onde acontecem as aulas de violão, é possível sentir a vibração dos alunos ao descobrirem mais uma nota de um acorde que parecia impossível. Já na quadra, outros alunos dançam seguindo o ritmo do professor que tem um repertório bem animado e que, com a ajuda da música e dos movimentos, leva os idosos ao delírio. E lá está Guilherme, ajeitando suas pequenas árvores de material reciclado, que, segundo ele, significam

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comportamento - terceira idade esperança. Árvores que ele aprendeu a fazer no centro e hoje ensina a 56 alunos, todas as quartas-feiras. Entre seus alunos está Maria Aparecida de Gouveia, que, aos 79 anos, luta contra os danos causados pelo AVC que teve há seis anos. Na época, ela ouviu dos médicos que nunca mais poderia se movimentar. No entanto, hoje Maria tem apenas dificuldades de mover o braço e a perna esquerda. Guilherme garante que sua aluna e amiga chegou ao centro sem a menor vontade de continuar a viver, mas que, por causa do projeto, sua recuperação vem acontecendo, “mesmo com sequelas, isso não impediu que ela fizesse uma árvore”. Nos olhos de Guilherme é possível enxergar a vontade de superar todo sofrimento. Tantas doenças não causaram tanta dor quanto o abandono da família e dos amigos. Foi no centro que ele encontrou pessoas que o acolheram mesmo com tantos problemas, e hoje, ele diz repetidamente que ali está sua família e sua felicidade. “Aqui é um hospital que não usa remédio. É paz, amor e carinho.” Graças ao centro, Guilherme reduziu a quantidade de remédios que toma e, segundo Gislayne, responsável pela avaliação dos idosos no Centro, o fato contribuiu para a melhor qualidade de vida de Guilherme que, além de dar aulas de artesanato, faz parte da turma de teatro, violão, coral e ainda pratica ginástica. Guilherme sabe que ainda tem uma barreira para derrubar, o câncer na bexiga tem tentado destruir suas esperanças e sua fé, mas ele acredita que, com sorriso no rosto, tudo fica mais leve, mais fácil e principalmente menor do que ter o presente que é estar vivo. No Brasil, segundo estimativas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2014, o país tinha 20,6 milhões de idosos. Esse número corresponde a 10,8%

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da população total. A expectativa é que, em 2060, o país tenha 58,4 milhões de pessoas idosas, 26,7% do total.

“Aqui é um hospital que não usa remédio. É paz, amor e carinho” Guilherme Oliveira Devido a isso, o governo federal vem tomando medidas e estabelecendo políticas que ajudam a melhorar a qualidade de vida da pessoa idosa, como o estatuto do idoso, criado em 2003, que assegura direitos básicos às pessoas maiores de 60 anos. Em 2013, o Brasil alcançou a 31ª posição no ranking dos países que oferecem melhor qualidade de vida e bem-estar a pessoas com mais de 60 anos de acordo com o Global AgeWatch Index 2013 da organização não-governamental Help Age International, que luta pelos direitos dos idosos.

Segundo Ísis Canuto, enfermeira especializada em geriatria, o Brasil está passando por um processo de envelhecimento populacional rápido e intenso e as implicações socais e concernentes à saúde continuam basicamente orientadas pelo controle de doenças infecciosas e cuidado materno infantil. Ela afirma que, para que o idoso receba um atendimento que promova uma prevenção, diagnóstico precoce e tratamento das doenças crônicas e das incapacidades associadas, seria necessário que se instituísse uma porta de entrada para o idoso no sistema de saúde com profissionais treinados para tal. “O idoso que recebe um acolhimento orientado e participa de atividades físicas leves e moderadas pode retardar os declínios funcionais da idade. Assim, uma vida ativa melhora a saúde mental e contribui na gerência de desordens como a depressão e a demência. Existe evidência de que idosos fisicamente ativos apresentam menor prevalência de doenças mentais do que os não ativos.”

O artesanato é uma alternativa de atividade laboral para Guilherme Oliveira

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comportamento

Eles precisam de ajuda Distúrbio com grande incidência em crianças e adolescentes, o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) tem tratamentos alternativos à opção medicamentosa Júlia Almeida e Luiza Picchioni

“Sua filha não é doente, ela é uma dançarina. Leve-a para uma escola de dança”, disse o médico à mãe de Gillian Lynne, de oito anos.Em meio à década de 1930, os pais da menina foram parar no consultório à procura de um especialista que pudesse explicar a dificuldade de aprendizado da filha. Eles haviam recebido bilhetes da escola, reclamando que Gillian não prestava atenção nas aulas, era inquieta, desanimada e não se relacionava bem com outros alunos. Após ouvir a mãe relatar os fatos e observar a menina triste ao Reprodução da pintura The Thinker fundo da sala, o médico se levantou e disse a ela que sairia tória, como O Fantasma da Ópera. por alguns minutos para conversar Nos dias de hoje, Gillian teria sido a sós com a senhora. Lynne. Ao sair, diagnosticada com Transtorno de ele ligou o rádio e pediu para que a Déficit de Atenção e Hiperatividade mãe a observasse. Enquanto Gillian (TDAH), atividade motora excessise movia ao som da música, a meni- va (inquietação física) e dificuldade na, desanimada se transformava na de controlar impulsos. Nos últimos solista do Royal Ballet, bailarina que dez anos, o TDA/H ganhou maior hoje é responsável por alguns dos atenção de médicos, psicólogos e pemusicais mais bem sucedidos da his- dagogos, principalmente porque se

Foto: wholesaleartmall.com

passou a creditar ao distúrbio boa parte dos casos de mau desempenho escolar. Utilizado por pessoas que sofrem com o Déficit de Atenção, o metilfenidato, comercialmente conhecido como Ritalina, melhora a concentração e diminui a ansiedade. Muitas vezes, o medicamento é obtido sem a intermediação do médico – via internet ou mesmo por meio de amigos. Só em 2009, foram consumidos quase 2 milhões de caixas de Ritalina no Brasil, tornando o país seu segundo maior consumidor mundial. Especialistas, entre eles, Psicólogos e Fonoaudiólogos, alegam que o abuso desses estimulantes pode levar à mudança repentina de humor (decorrentes da privação de sono), depressão e, durante a abstinência, pode causar psicose. Nos EUA, os metilfenidatos são classificados pelo DEA (Drug Enforcement Administration), órgão responsável pela repressão e controle de drogas como

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comPortamento - eleS preciSam de aJuda substâncias controladas de “Classe 2” – a mesma da cocaína e da morfina, que, apesar da utilização médica, provocam dependência. Hoje, cerca de 5% das crianças e adolescentes são diagnosticados com o transtorno. Contudo, estudos indicam que 75% dos diagnósticos no país foram incorretos. Esses números apontam o fato de que diversas crianças têm feito o uso do medicamento sem necessidade. A psicopedagoga Renata Almeida,47, explica que parte desse aumento se deve ao diagnóstico negligente. “O correto é que a criança passe,primeiramente, por um neurologista e, só depois, por um psiquiatra. Essa ordem, muitas vezes, não é obedecida”, explica. Ela destaca que não houve um aumento no número de crianças portadoras da doença, mas mudanças em torno do diagnóstico que, atualmente, é mais acessível. “Além disso, hoje temos um enorme acesso à informação. Para a mãe aflita, basta di-

gitar algumas palavras no Google e a agitação do filho passa a ter nome: TDA/H”. Renata conta que muitos pais buscam pessoas pouco qualificadas para diagnosticar a criança e prescrever a Ritalina. Para a psicopedagoga, o uso do medicamento só deve ser feito quando esgotadas as outras possibilidades de tratamento. “Existem crianças que respondem a um tratamento à base de esporte, de luta ou de contato com cavalos – a equoterapia. Nesses casos, medicá-las seria expô-las a riscos e efeitos colaterais sem necessidade”, esclarece. Foi o que aconteceu com o publicitário João Gilberto, 23, que, quando criança, foi diagnosticado com TDA/H. “Eu sempre fui absurdamente agitado, e um dia minha psicóloga levantou essa possibilidade para os meus pais. Na época, eles nem conheciam o transtorno, mas levaram para fazer o teste”, conta. “Eu estudava em escola construti-

vista, por isso tive como desenvolver meu lado forte, a criatividade. Meus pais sempre foram contra uso de remédios , então minha mãe me colocou na aula de bateria para gastar energias”. Hoje, João agradece a atitude dos pais. “A Ritalina te faz ficar concentrado e você perde a capacidade de abstração. Sem abstração e criatividade eu não teria, hoje, montado minha própria agência de publicidade”. Renata destaca que nem sempre a atitude dos pais é parecida com a história de Gillian e João. “Às vezes, a mãe tem um menino muito ativo e ela quer ficar ‘livre’ daquilo. Aí, a saída é arrumar qualquer diagnóstico vindo de qualquer pessoa”. Ela ainda arrisca um palpite “É como se, atualmente, as pessoas quisessem acabar com a diversidade, sabe? Criança tem personalidade, algumas são mais inquietas, outras podem passar horas colorindo quietinhas”

Pintura La Rose por Guan Zeju

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Foto: maherartgallery.blogspot.com.br


Soul PRETA

Fotos Thaís Costa

Elisa de Sena A nudez é sincera e democrática em sua essência. Para a nudez, não há padrão mais belo do que a verdade. Cada reta, linha, curva, espiral, cacho, manchas e cores de um corpo nu dizem mais do que quaisquer palavras. Nada mais perfeito que a imperfeição, tão natural quanto uma mulher nua. Deixamos o padrão para as mentes massificadas, chapadas, manipuladas. Como mentem essas mentes... Aqui estamos sinceras! Mulheres negras, nuas, reais, realeza. Te convidamos a descolonizar a sua mente que por tantos anos nos sexualizou de maneira perversa, que nos viu como objeto de exploração e não de erotização. Aqui estamos inteiras com as nossas almas e corpos libertos, para lembrar o que já foi dito muitas vezes, que a nudez é livre, linda e digna. Liberte sua mente!


Bárbara Santos Nascida em 1991, família bem estruturada, teve uma educação brilhante dentro de casa e frequentou boas escolas públicas. Formada em Relações Públicas, especializada em Branding, apaixonada por Pesquisa de Tendência. Passou quase uma vida inteira com a facilidade do cabelo liso. Em nov/2014 fez sua última progressiva e sete meses depois assumiu seus crespos. Descobriu em out/2015 sua descendência paterna. Por parte do seu avô, dos Ovimbundus de Angola e dos Djolah da Guiné Bissau por parte da sua avó. Não acredita que a textura do cabelo, orientação sexual, cor da pele ou a beleza estética imposta como ideal pela sociedade definam alguém e sim a humanidade, a educação e o amor.


Sulamita Theodoro Meu corpo, minhas regras. Empoderese, a cada dia, para que outras mulheres sejam encorajadas a a empoderar-se tambĂŠm. Tire seus preconceitos, seu machismo, seus abusos. NĂŁo somos objetos. Seguiremos em luta atĂŠ que todas sejamos livres.


Pabline Santana Mulher negra da diáspora, produtora cultural e de vídeo, estudante de Cinema e Audiovisual. Desenvolve ações conjuntas de resistência e empoderamento nas favelas e ocupações urbanas de BH e RMBH, junto aos coletivos Negras Ativas, Na Raça e CACU. Trançadeira desde 2010. Atualmente busca difundir a cultura e identidade afro a partir de sua marca Irun didi cujo significado vem do Yoruba (tranças).


Zaika dos Santos Negra, mulher, ativista e artista independente. Compositora, cantora e produtora. A palavra que mais a representa ĂŠ Adinkra. Formada em Audiovisual ( Primeira turma da Oi Kabum Escola de Arte e Tecnologia), Radio e TV (Newton Paiva) e Webdesigner. Tem o trabalho artĂ­stico focado nas temĂĄticas do feminismo negro, feminismo intersecional, no negro e na cultura urbana.


Walkiria Gabrielle Sou mulher negra, feminista negra, ativista na cultura hip hop, poetiza, integrante da produção Oficina Feminina de Rap, idealizadora do projeto Cachos da Negra e militante do movimento negro. O corpo nu e sua realeza pelo grito da melanina que vai alÊm da beleza.


Mikaela Gabrielle Mulher. Negra. Filha de Dalva. Aos 22 anos é componente de um projeto de resistência em Contagem. Vê o corpo como um verbo leve, belo e absoluto. Tenta desviar diariamente o fardo do padrão de beleza. O corpo é a porta da alma. Ninguém lhe rouba a poesia, pois o corpo pra ela é liberdade.


As irmĂŁs Walkiria e Mikaela


reportagem

Vida simples, Pensamento Elevado Qualidade de vida em vez de grandes fortunas é a nova busca da sociedade atual

Por Júlia Braga

Se antigamente o mais comum era que as pessoas buscassem uma qualidade de vida ao sair do campo para a cidade, hoje o caminho é inverso. Muitas pessoas, cansadas do caos e da violência de uma cidade grande, acabam caminhando para o outro lado. São pessoas que estão buscando muito mais que um trabalho para pagar as contas no final do mês, o que elas querem mesmo é serem felizes todos os dias! E com a leveza de um lugar tranquilo, sem aquela pressão de cidade grande e principalmente um trabalho que as faça sorrir. Antônio Carlos, na janela da fazenda Antônio Carlos, 65 anos, poderia ter sido médico ou advogado. Ele nasceu em uma família da classe média alta. Com uma mãe preocupada e carinhosa, ele poderia ter estudado e se tornado um grande empresário. Mas ele tinha outros planos, e dentro deles não estava fazer grandes fortunas. Para ele, a maior fortuna era seu caráter e sua lealdade. queria somente viver. “Sempre estiEle começou a perceber que não ve em paz comigo mesmo, eu faço o desejava aquilo que todos queriam, que acho que eu devo fazer! E nunca ele não queria trabalhar em uma fui de imitar os outros pra nada.” grande empresa, ele não queria Com 21 anos, resolveu “se enconcomprar uma casa enorme, ele não trar com ele mesmo” e sua vida muqueria comprar um carrão, ele não dou radicalmente quando ele deciqueria comprar roupas novas, ele diu sair de BH e ir morar na fazenda

“Julgar as pessoas pelo que elas tem é um absurdo, é o fim da humanidade.’’

Antônio Carlos

Fotos: Tiago Pereira

da família. O lugar, como a sua mãe uma vez disse, o “paraíso de todos,” era chamado de fazendinha, e lá ele resolveu fazer o que ele mais gostava na época – trabalhar com cavalos. Apaixonado pela natureza e pelos animais, cada vez mais ele via naquele lugar o seu lar. Percebeu que, quando ia para a cidade, não se identificava com as pessoas e seus desejos; na verdade ele nunca foi de julgar ninguém, mas ele se perguntava o motivo de as pessoas quererem tanto as coisas e esquecerem o mais importante – as pessoas e seus sentimentos. Para Antônio, não deveria haver

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reportagem - vida simples essa desigualdade social, mas ela existe, e ele fica triste de saber que na cidade vale muito o que você tem em vez de valer o que você é. “Julgar as pessoas pelo que elas têm é um absurdo, é o fim da humanidade. Não é mais do que a nossa obrigação tratar todo mundo de forma igual e carinhosa”. Ele não se interessa pelo que as pessoas tem e sim pelo seu caráter, se são honestas, se são verdadeiras. Passado alguns anos, ele se apaixonou e acabou se casando. Comprou um apartamento na cidade e teve 3 filhos. Mas a história não termina por aí. Depois de 15 anos morando sozinho na fazenda, ele não conseguiu simplesmente mudar e ter uma vida com uma rotina na cidade. Com problemas de adaptação, ele resolveu então aceitar que não seria feliz vivendo na cidade. Acabou voltando para a fazenda e depois de alguns anos se separou. Hoje, passados 44 anos desde que ele deu aquele passo, ele lembra a única vez em que morou na cidade, e ele não gosta nem um pouco, até sua cor mudou; “virei branco de novo”, ele, que todos os dias vai cavalgar nas montanhas e não se preocupa com protetor. Com 65 anos, ele acorda às 5h30 da manhã todos os dias –“A vida ajuda quem cedo madruga” – e vai fazer seu trabalho feliz. Perguntado sobre a solidão, ele já logo responde: “Nunca estou sozinho, estou sempre com Deus” e completa: “Não preciso de muito para ser feliz. Tendo um lugar para morar e amor no coração, não há nada que eu deseje mais do que estar em paz com Deus e comigo mesmo.” Flavia Braga também trocou a vida da cidade para viver em Lavras Novas, cidade situada a 120km de Belo Horizonte e com população de pouco mais de 1.500 habitantes. Ela é paraplégica e atuava como promoter em Belo Horizonte, e mes-

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mo com a dificuldade de locomoção, não resistiu aos encantos de viver em uma cidade pequena. Casada com Paulo Cesar, que é chefe de cozinha, eles tinham um restaurante em Belo Horizonte, mas um problema entre os sócios fez com que ele fosse fechado. Depois disso, juraram que nunca mais iriam trabalhar com bar. Se foi o destino ou não, nós nunca vamos saber, mas uma vizinha do marido acabou propondo uma sociedade de um ...... restaurante! E lá se foram para conhecer onde o novo empreendimento seria aberto, em Lavras Novas. Flavia conta que foi paixão à primeira vista, e ela se imaginou morando naquele lugar: “lembrei do meu sonho de infância, moraria em um lugar verde e tranquilo, com uma casa simples.” A vizinha acabou desfazendo da sociedade antes mesmo de ela começar, e os dois resolveram fazer daquilo uma nova oportunidade. Juntaram as economias e alugaram uma casa, onde passavam os dias de semana produzindo, para

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no final de semana, a sala dar lugar a uma petisqueria, onde vendiam empadas e petiscos. O começo não foi fácil, mas ela brinca – “ Eu sabia que não podia dar um passo maior que a perna, então resolvi ter paciência.” O sucesso das empadas veio e foi grande, acabaram abrindo outro estabelecimento, já este, com estilo de restaurante e bar. Passados 10 anos morando lá, ela não se arrepende nem um pouco e diz que nunca conseguiria voltar a

“Lembrei do meu sonho de infância, moraria em um lugar verde e tranquilo, com uma casa simples.” Flávia Braga

Flávia Braga, ao lado de sua mãe, em frente a sua petisqueria

Fotos: Reprodução Facebook


vida simples viver em cidade grande. Sobre a locomoção, ela conta: “A dificuldade é a mesma, se em BH eu tinha que entrar no carro para ir para qualquer lugar, aqui eu faço o mesmo, só que sem trânsito e com uma vista muito melhor!”. Só tem uma coisa de que ela sente falta, e talvez nunca vá parar de sentir – da família. Mas não consegue se imaginar nunca mais trabalhando na noite de BH. Marcelo Lomar sempre teve uma curiosidade fora do normal, o que o levou a querer conhecer mais sobre povos diferentes, seus ensinamentos e o que muitos consideravam segredos da humanidade. Estudou os povos maias, incas, astecas, a cidade perdida da Atlântida, as doutrinas gnose (gnosticismo), rosa-cruz e maçonaria; além de profecias, símbolos e teorias antigas. Mesmo com toda essa inquietação interna à procura de outros ensinamentos, ele sempre estudou em ótimos colégios e acabou arru-

mando um trabalho “normal”, no buffet da mãe. Considerado pelos amigos um empreendedor, acabou trabalhando simultaneamente em varias áreas até descobrir que o que ele realmente desejava era uma vida tranquila, longe do caos da cidade, onde ele pudesse plantar e colher seus próprios alimentos. Acabou escolhendo Milho Verde, interior de Minas Gerais, e está muito feliz com a decisão. “O principal motivo para eu ter mudado foi gostar de estar próximo da natureza, a atmosfera da cidade já não estava me fazendo bem, antigamente era mais onda, sentia calor e ia para algum mirante ou para algum mato, mas hoje meu organismo realmente não consegue ficar mais de 2 horas em Belo Horizonte, eu começo a passar mal, aí eu penso nas pessoas que moram na cidade, que ficam acumulando essas coisas sem perceber, o corpo aguenta quase tudo, ele chega no limite, e acho que

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essas pessoas estão no limite. E também tem a competividade de correr atrás de um dinheiro, que você acaba gastando com coisas que você não precisa, e isso é terrível.” Ele finaliza dizendo que no campo, mesmo o dinheiro não sendo tão recorrente, você acaba ganhando o que precisa para sobreviver, sem se preocupar tanto com segurança e outras coisas que ele considera artificial. Marcelo explica que no princípio não foi fácil, começou morando de aluguel e fez vários bicos até conseguir se estabilizar. Quase voltou a Belo Horizonte para poder tentar captar mais recursos, mas viu que ia ser ilusão. Agora fala com orgulho da sua lanchonete. Mesmo sem grandes lucros, ela é sua. Além de vender lotes, também está voltando com uma empresa de produtos orgânicos. “Essa empresa já funcionou bem no passado, produzimos para grandes sacolões, mas infelizmente fomos engolidos pelos grandes pro-

Paisagem noturna de Milho Verde

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reportagem - VIDA SIMPLES dutores, esses que usam pesticidas e nutrientes artificiais e garantem uma fruta grande e linda, e bem mais barata que as nossas.” Acreditando na qualidade e no potencial do seu produto, ele está pensando em estratégias para conseguir fazer as pessoas entenderem que as frutas e vegetais sem agrotóxicos podem até serem consideradas “feias” mas que na realidade são muito mais saudáveis. “Hoje estamos estudando uma forma de agregar valor ao produto sem que a gente perca em venda.” Ele fica feliz de receber os amigos em sua casa, mas confessa: “Eu reparo que, quando o pessoal vem me visitar, eles estão meio doentes, meio pálidos e estão sempre reclamando de alguma coisa, seja de alguma dor, do trabalho, ou da falta de tempo, mas que dinheiro eles tem sim.” Mas, saúde que é bom, ele já não tem tanta certeza. E é nessa hora que sente que fez a escolha certa. Melhor do que o dinheiro é a qualidade de vida, a sua saúde, o tempo que você tem para fazer o que quiser. Coisas que cada vez mais ficam difíceis de alcançar na cidade. Ele ainda espera ser 100% sustentável e não precisar depender de nenhuma grande empresa. Acredita que em alguns anos conseguirá

E também tem a competividade de correr atrás de um dinheiro, que você acaba gastando com coisas que você não precisa, e isso é terrível.” Marcelo Lomar 38

Vista da casa de Marcelo Lomar

essa proeza. Em casa, 60% de tudo que come é tirado de sua horta e de seus vizinhos. Ele explica, por exemplo, que frutas, somente as da época. E claro, tudo sem desperdícios. Como ele consegue? Simples, planta tudo que pode, e come tudo que dá! Wilson Soares, psicólogo, acredita que ainda não existem muitos estudos sobre essa mudança de comportamento, mas que considera uma questão interessante e pronta a ser estudada. Ele observa que essa nova geração não esta tão ligada em acumular fortunas como as gerações passadas, e cita o autor Anthony Giddens e seu livro, Transformações da Intimidade, que fala da evolução das relações humanas. Wilson explica que “A chamada pós-modernidade foi produzindo um vazio existencial na sociedade, a vida esta perdendo o significado, o dinheiro não pode ser aquele a

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dar sentido a sua vida.” Ele lembra de uma entrevista do fundador da Apple, Steve Jobs, quando foi perguntado sobre sua riqueza: “Ser o homem mais rico do cemitério não me importa… Ir para cama à noite dizendo que nós fizemos algo maravilhoso… Isso é o que importa para mim.” Wilson acredita que essas pessoas que estão se mudando estão percebendo o alto custo, tanto material quanto existencial, para continuar vivendo nessa sociedade que acaba te forçando a consumir cada vez mais. Vale o autoquestionamento: Eu preciso mesmo disso? Já sabemos a resposta na maioria das vezes. “As pessoas estão percebendo que a vida é curta e não vale a pena você se matar por uma coisa que não é tão relevante, claro que é bom ter dinheiro, mas fazer sua vida centrada nisso é muito vazio.” Finaliza o psicólogo


reportagem

COMO ANTIGAMENTE... No mundo do corte e costura, Lara Rogedo se destaca por apresentar, por meio de ferramentas atuais, técnicas tradicionais

Por Luiza Picchioni

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e engana quem pensa que modelagem, corte e costura são atividades simples de serem executadas. A microempresária e designer de moda Lara Rogedo, de 25 anos, explora a complexidade de tal universo e vem se destacando no mundo dos ateliês de roupas sob medida. Lara ministra aulas de modelagem, corte e costura presenciais em seu ateliê, além de aulas online em seu canal do Youtube, e mantém o blog “Algodão Cru”, onde exibe tutoriais e fala sobre empreendedorismo relacionado ao segmento fashion.À princípio, a microempresária não pensava em lecionar. Ela imaginava que sua carreira seria na área de criação, para conseguir ter uma coleção própria. Mas, o sucesso alcançado com apenas poucos anos de vida influenciou Lara a querer

Fotos: Ana Paula Couto

seguir com o que faz atualmente, expandindo seus horizontes. Ela deseja atingir pessoas de todo o Brasil com suas aulas online e ajudar seus alunos a crescer como empreendedores, unindo criatividade e marketing para ter sucesso ao fazer o que se ama. Sua história começou quando entrou na faculdade de Design de Moda e passou a ter aulas de modelagem e costura. A designer se encantou pelo mundo dos ateliês sob medida e resolveu começar a fazer peças de roupas para suas amigas. A primeira peça que Lara fez foi um vestido de noiva para sua professora de italiano, “Eu levei muitos meses para fazê-lo e contei com a ajuda da minha então professora de moulage, Júnia Melo. Consegui terminá-lo mas foi um desafio muito grande.Sonhei várias vezes que não

tinha conseguido entregar e a tensão era grande. Até chorei quando a vi entrar na igreja de tanta emoção. Eu fiz de graça o vestido e pedi para ela colocar as fotos nas redes sociais. A partir dai, várias pessoas começaram a me encomendar peças” disse ela. O reconhecimento de seu trabalho foi chegando aos poucos, após o sucesso da sua primeira criação para vender.Ainda segundo Lara, o seu trabalho exige um relacionamento próximo com a cliente para assegurar que o resultado final seja satisfatório. Por isso, a estilista precisa entender o universo da cliente, que muitas vezes vira amiga e confidente. Lara é a prova viva de que mais idade não significa obrigatoriamente mais conhecimento. O esforço pessoal a colocou na posição de destaque que ocupa atualmente no mundo da moda

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reportagem

Foto: Documentário Cam Girlz/Sean Dunne - 2014

Camgirls Por Marcela Xavier e Nádia Schmidt

As trabalhadoras remotas do ramo do sexo Camgirls são trabalhadoras remotas do ramo do sexo, que gozam do privilégio de prestarem seus serviços diretamente de casa, de dentro de seus próprios quartos. Ao contrário das tradicionais prostitutas, que colocam seus corpos em risco nas ruas, à mercê de clientes desconhecidos, as camgirls não frequentam os ambientes periclitantes das zonas de prostituição, e não atuam diante da necessidade de enfrentar, face a face, corpo a corpo com homens e mulheres que procuram profissionais para satisfazerem suas necessidades carnais em troca de dinheiro. Sabemos que as camgirls existem porque pop-ups nos oferecem conversas com elas o tempo todo, com frases chamativas pouco críveis como “Fale com garotas lindas na sua área”, e “Fulana, 18, muito tesão, clique aqui para abrir o chat”, mas se aproximar delas na vida real é uma tarefa quase impossível. Em fevereiro desse ano, o diretor Sean Dunne, baseado no Brooklyn, em Nova Iorque, lançou o documentário Cam Girlz, muito bem recebi-

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do pela crítica e que hoje está disponível para streaming ou aluguel no Vimeo. O filme retrata, de forma pura e singela, a rotina das garotas que trabalham fazendo shows direto de seus quartos para milhares de espectadores espalhados pelo mundo. Cam Girlz mostra um total de 38 garotas de diferentes nacionalidades, e de variadas faixas etárias. Cada uma conta um pouco do seu dia a dia, das suas experiências com seus clientes, da exposição online e da vida antes e depois do trabalho como camgirl.

“O trabalho de camgirl é como um trabalho qualquer” Alguns usuários dos chats também foram entrevistados, e disseram que procuram os serviços dessas garotas porque querem companhia para conversar ou para se mastur-

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bar. Os chats eróticos são algo que transcendem a pornografia, já que suprem uma carência social e sexual que afeta a maioria das pessoas, seja por falta de tempo ou de traquejo. As garotas ditam as suas próprias regras, cada chat mostra a personalidade de cada uma, e o ambiente de onde é feita a transmissão dos shows e chats de vídeo diz muito sobre seus interesses e gostos pessoais. Isso acaba sendo um atrativo para certos públicos-alvo. Quanto aos clientes, cabe a eles monitorarem o tempo e dinheiro que gastam nesse tipo de serviço e também o investimento emocional que colocam nos relacionamentos com elas. Um dos homens no documentário falou que, nesse meio, é muito fácil ficar obcecado, e que manter contato com a realidade é essencial. Uma figura que chamou bastante atenção para esse mercado e as pessoas que atuam nele no Brasil foi a ex-BBB Clara, que começou sua carreira se exibindo em chats. Logo viu que tinha jeito para a coisa, e passou a comercializar os seus vídeos em


reportagem seu próprio site. Hoje, Clara é dona de sua própria marca e site, e contrata garotas que trabalham para ela de forma freelancer. Elas se utilizam da plataforma que Clara disponibiliza, recebem pelas horas trabalhadas e repassam uma porcentagem para a dona do espaço. Conseguir fazer contato com a minha entrevistada foi muito difícil. Eu o fiz por intermédio de uma conhecida que circula pelos mesmos ambientes que a ex-BBB e várias outras camgirls e, depois de muita insistência, consegui que essa conhecida repassasse minhas perguntas para Julia, nome fictício, uma jovem de 26 anos que é natural de São Paulo. Julia mora em um apartamento de dois quartos próximo à Avenida Paulista e o trabalho de camgirl é a sua única fonte de renda. Ela não é casada e não tem filhos, então leva um estilo de vida que lhe permi-

te certos luxos como visitas a bons restaurantes, e idas a festas em baladas disputadas, carregando bolsas que trabalhadoras de empregos mais convencionais muitas vezes não dispõem de meios para comprar. Julia é também a namorada do filho de um famoso membro de uma banda de rock nacional, tanto ele quanto sua família sabem do trabalho da moça e não têm um problema com isso, mas ela prefere que as outras pessoas não discutam sobre a forma que ela ganha dinheiro. No e-mail que me mandou, Julia me disse que escolheu o trabalho de camgirl porque lhe permite “conviver com várias pessoas e culturas”. Julia me disse que começou a cursar o ensino superior mas não o concluiu, e viu no trabalho de camgirl uma alternativa não convencional que paga melhor que as outras opções no mercado.

Sobre o primeiro dia de trabalho, ela fala que foi um pouco estranho, e que não sabia muito bem o que fazer, assim como qualquer primeiro dia de trabalho. Descreve como normal, também, o seu dia a dia de trabalho. Ela se maquia, trabalha, toma banho, cuida de seus assuntos pessoais, arruma a casa, e vai dormir. Os clientes são de várias partes do mundo. O servidor que hospeda seu videochat permite que ela oculte uma ou várias partes do globo, como cidades, estados ou países inteiros, a fim de garantir a privacidade dos trabalhadores. Apesar da pouca convencionalidade do mercado, o trabalho de camgirl é como um trabalho qualquer. Assim como qualquer trabalho no mercado do sexo, ele envolve tabus e é acobertado por quem está envolvido e por quem está às margens

O documentário Cam Girlz mostra como funciona este ramo do sexo

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entrevista

em destaque vitor Komura Ex-aluno da Fumec, Vitor Komura, responsável pela operação de mídia no Mineirão, fala sobre a experiência de trabalhar em um dos grandes palcos do futebol mundial

Por Bruno Miranda Willian Borges e Thiago Drummond Vitor Komura, 28 anos. Ex-aluno do curso de jornalismo da FUMEC, hoje trabalha na Minas Arena, empresa que executou as obras de reforma e modernização do Mineirão. Atualmente, é responsável pela operação de mídia no estádio Mineirão. Ajuda tanto na produção de conteúdos jornalísticos, fazendo releases e notas, quanto na produção de materiais internos, como informativos. Antes ele trabalhou com assessoria de imprensa da Federação Mineira de Vôlei e também na assessoria de comunicação do Sebrae. Em entrevista para a Revista Ponto e Vírgula, Komura conta um

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pouco sobre suas experiências profissionais, da importância da FUMEC em sua formação, dos caminhos que trilhou e deu conselhos para os estudantes que querem seguir na mesma área.

Na época de estudante na faculdade, você fez algum estágio na área do jornalismo? Se sim, qual? Como foi? No segundo ano de faculdade, fiz estágio na assessoria de comunicação do Sebrae-MG e fiquei por dois anos. Foi uma experiência ótima, trabalhei com excelentes profissionais que me ensinaram muito. Ter

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iniciado o processo de trabalho logo cedo foi fundamental, pois percebi que não tinha perfil para trabalhar em redação e gostaria de trabalhar com assessoria.

Qual foi o papel/contribuição da Universidade FUMEC na sua vida profissional hoje? Tive excelentes professores que me ajudaram muito na minha formação, mas destaco dois: Aurelio Silva e Hugo Teixeira. Ambos me ajudaram muito não só na parte teórica, mas me passando a vivência deles no mercado de trabalho. O Aurelio me mostrou como uma assessoria pode


vitor komura ser atrativa para o jornalista em redação. E o Hugo com sua experiência em assessoria foi fundamental para que eu tomasse certas decisões no início da minha carreira.

No seu projeto de conclusão de curso, você participou da criação de uma assessoria experimental para o vôlei. Como foi o projeto e as parcerias feitas na época? Montamos uma assessoria de imprensa para a Federação Mineira de Vôlei (FMV), com o conceito de agência de notícias. Então criamos do zero um plano comunicacional para a empresa, desde a parte de branding até o contato diário com as redações, além de criar conteúdo para os principais produtos (Campeonato Mineiro) deles. Então, gerávamos, em tempo real, fotos, vídeos e releases sobre os jogos in loco. Já que os veículos de comunicação não tinham equipes para acompanhar os jogos, cedíamos o conteúdo, dando visibilidade à competição. Na época, o vôlei em Minas Gerais era muito pouco divulgado nos jornais. Conseguimos emplacar cerca de 800 matérias em todo o estado em apenas 6 meses de trabalho. Foi um case de sucesso, sem dúvida!

Durante a faculdade, você tinha preferência por atuar em uma área específica? Entrei na faculdade de jornalismo porque o pai de um amigo, também jornalista, disse que tinha perfil para a profissão. Tinha escolhido a publicidade para seguir carreira e até fiz um ano do curso, mas não gostei. Fiz jornalismo porque gostava de escrever histórias e por gostar de trabalhar com esporte. Desde menino, fazia resenhas dos jogos de futebol, tinha um caderno com resultados e minhas impressões. Juntei o útil ao agradável.

Após se formar, já estava atuando na área? Conte um pouco sobre sua trajetória de recém-formado. Quais foram suas principais dificuldades? Quando me formei, demos continuidade em nosso projeto de conclusão de curso. A Havar Comunicação tinha sido contratada pela FMV, com um contrato muito bom. Então continuamos com a empresa. Outros clientes surgiram, mas não eram ligados ao esporte, então esse foi o maior desafio para mim. É grande a dificuldade de gerar pautas para clientes diversos, como, no nosso caso, empresas de tecnologia, varejo e finanças. Tínhamos que sempre ser criativos para emplacar algo, mas, na época, existia uma troca de linha editorial dos principais veículos de comunicação em Minas Gerais.

Como conseguiu o emprego no Mineirão? A empresa Minas Arena estava começando a formar a equipe. A coordenadora precisava de alguém para trabalhar na comunicação e pediu a alguns coordenadores de cursos de jornalismo. O Ismar Madeira sabia do meu perfil e me indicou.

- entrevista

tura do evento nas redes e como suporte, em caso de algum problema. Folgamos conforme demanda. Caso tenhamos poucos jogos e eventos na semana, folgo dois dias ou chego mais tarde para compensação.

Quais os conselhos você daria aos estudantes de jornalismo? Vejo muitos alunos de jornalismo nas redes sociais e fico muito assustado com o novo perfil que está surgindo. Isenção, imparcialidade, checar fontes, ouvir todos os lados são regras básicas que muitos estão deixando de lado. Mas um conselho que realmente dou é: jamais deixem de ler e buscar conhecimento! Jornalista que não evolui, não está atento às novas tendências e se acomoda não tem lugar nesse mercado de trabalho que é escasso. Em uma aula do professor Alexandre Salum, ele me disse algo que me recordo perfeitamente: “jornalista não precisa saber tudo, mas ele tem que sempre aprender sobre tudo”.

Como é a sua rotina de trabalho? Em dias de jogos ou eventos, há diferença? Há dias de folga? Eu entrei para trabalhar na assessoria de imprensa, cheguei aqui em 2012, na época da obra. Mas, com o decorrer do tempo, comecei a trabalhar na parte mais operacional do estádio. Hoje sou responsável pela Operação de Imprensa, tenho que pensar da entrada até a saída de cada jornalista. Também assumi a Comunicação Interna e as Redes Sociais. Em dias de jogo, chego seis horas antes e vou embora só quando o último profissional se retira. Em eventos, por muitas vezes ser de um produtor, trabalho fazendo a cober-

Vitor Kamura no local de trabalho

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entrevista

AGORA é que são elas Na contramão do sexismo, elas arrasam e deixam claro que vieram para ficar na cobertura esportiva

Por Maria Antônia e Taynara Cristian Cada vez mais mulheres ocupam lugares e profissões consideradas para homens. E quando o assunto é jornalismo esportivo, não é diferente. Mas, quem achava que futebol e mulher não combinavam se engana. A figura feminina está cada vez mais presente nas redações dos veículos de comunicação (e consequentemente do esporte). Sendo assim, elas informam, analisam, torcem, dão seus palpites e mostram que dão conta do recado.

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Elas estão nos estádios, sendo torcedoras assim como jornalistas; mulheres que dominam o mundo do futebol, do esporte. Nos programas de TV, nas rádios. Na Fórmula 1, no Basquete, no Rali, no Triatlon, no Vôlei. A equipe da P&V conversou com três representantes femininas do gênero Paloma Tocci, Maíra Lemos e Renata Fan, que fazem bonito na cobertura e na apresentação de programas do gênero. Confira.

Fotos: Ilustração


entrevista

Maíra Lemos Querida pelos mineiros, Maíra Lemos já trabalhou em diversos veículos de TV como TV Cultura, SBT e Record. Hoje é repórter da TV Globo em Belo Horizonte e está à frente do Globo Esporte MG como apresentadora.

Sabemos que há muito preconceito em relação a mulheres e futebol, você já sofreu algum preconceito por ser mulher e atuar nessa área? Já. A mulher nasce sofrendo preconceito né... em qualquer área, infelizmente, nessa cultura patriarcal que ainda persiste, acontece. Mas foram poucos episódios. Felizmente.

Já tentaram fazer com que você desistisse de atuar na área esportiva? Não tentaram. Mas eu não teria problema nenhum em trabalhar em outras áreas, como comportamento e entretenimento ou cultura. Já trabalhei com isso antes!

Fotos: Divulgação

Qual a maior dificuldade que as mulheres têm quando entram nessa área? Memória esportiva. Como não nascemos jogando (como os meninos), temos menos tempo de bola, pelo menos a minha geração. Eu descobri o futebol com 11 anos!

Qual foi a maior experiência vivida nessa área e o maior desafio? Cobrir o título do cruzeiro em 2013, na carreata pela cidade, na comemoração. E a viagem para Marrocos com o atlético. Montamos uma redação inteira do outro lado do mundo. Dormimos mal, trabalhamos muito e, no final, com a derrota, tivemos que nos virar para continuar a cobertura.

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entrevista - agora é Que São elaS Por que escolheu fazer Jornalismo? Teve alguma influência da família, amigos, ou essa vontade cresceu com você? Cresceu comigo. Decidi que iria fazer jornalismo na escola, mais precisamente na sétima série! Gostava muito das aulas de português, sempre tive facilidade para me comunicar e falar em público e sempre fui fascinada por televisão.

Como nasceu seu amor pelo futebol? Meu pai ajudou nessa paixão. Ele sempre gostou muito de futebol, automobilismo. Então cresci assistindo a jogos, corridas, tanto na TV como no rádio.

Paloma Tocci

Fez pensando em entrar na área esportiva?

Jornalista de 33 anos. Já passou por diversos programas de rádio e TV. Comandou o RedeTV! Esporte e apresentou o Band Esporte clube. Atuou como repórter nos Jogos Pan-Americanos de 2007 e nas Olimpíadas de Pequim em 2008 e, em 2015, assume definitivamente a bancada do Jornal da Band.

Gostava muito de jornalismo policial, mas o esporte sempre foi minha paixão desde a época da escola. Cresci num colégio que incentivava muito a prática de esporte.

O que você considera a sua maior conquista?

Renata Fan

Gaúcha de 33 anos, começou na rádio Transamérica Santo Ângelo. Teve sua primeira oportunidade na TV em 2003, conquistando o posto de apresentadora dos programas Terceiro Tempo e Debate Bola, ambos na TV Record. Desde 2007 está à frente da apresentação do programa Jogo Aberto, na Band.

Ter sido a primeira mulher no Brasil em TV aberta e ter comandado uma mesa redonda. Para qualquer jornalista seria uma grande conquista, vivemos em um mundo cheio de preconceitos, e uma mulher conseguir comandar uma mesa redonda é um grande passo rumo à conquista de espaço nesse ambiente.

Em que proporção a beleza te ajudou na vida? A estética (para as mulheres) é uma exigência da TV como um todo. Há, sim, uma preferência pelo rosto bonito, mas nenhuma mulher se mantém no ar se não tiver talento e não souber do que está falando. O requisito para os homens, na maioria das vezes, é a experiência.

jogos do Internacional, e eu discutia com os amigos do meu irmão, brigava com eles, eu era bastante furiosa, toda essa combinação fez com que eu interessasse pelo futebol.

Qual a maior dificuldade para as mulheres atuarem na área? O mais difícil é você mostrar que você conhece, que é uma pessoa interessada no assunto, que independentemente de ter ou não jogado, de ter uma experiência prática. Com isso a sua teoria pode ser muito boa, e eu me interesso muito pelo futebol, estudei muito e me dediquei ao máximo para conseguir espaço nesse território dominado pelos homens

Como começou seu interesse pelo futebol? O futebol ainda é dominado pelos homens, a gente tem algumas exceções, algumas mulheres que gostam e trabalham na área, como eu. O interesse começou através do meu pai, que me levava em quase todos os

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Fotos: Ilustração


reportagem

Uma Cobertura Internacional Jornalistas usam Mundial de Vôlei como experiência para as Olimpíadas

Filipe Diniz, Guilherme Antunes e Pedro Maia

A cobertura jornalística resulta do trabalho de equipe e relação entre os profissionais. Quanto maior o interesse público relacionado ao tema, mais importante ele é para a

cobertura. Questões de interesse internacional têm prioridade sobre as nacionais e estas sobre as regionais. Por isso nossa equipe foi ao campeonato Mundial De Vôlei que acon-

Equipe Sada Cruzeiro, responsável pelos jornalistas da competição

Fotos: Instagram: @barbaraalbra

teceu em Betim, durante os dias 27 a 31 de outubro de 2015, para acompanhar como ocorre uma cobertura internacional. Nosso repórteres trabalharam durante os cinco dias no torneio e trouxeram suas experiências para vocês leitores. A organização do campeonato era de responsabilidade da Federação Internacional de Voleyball (FIVB), mas quem foi responsável pelos cerca de duzentos e quarenta jornalistas presentes no evento foi a assessoria da equipe sede, no caso, o Sada Cruzeiro. Todos os tipos de veículos midiáticos transmitiram o evento, a televisão, o rádio e o impresso. Não importava em qual veiculo você estava trabalhando, o primeiro processo era passar pelo credenciamento, desde universitários a jornalistas consagrados na televisão brasileira. Só conseguiam acesso às áreas de impressa as pessoas devidamente identificadas. Várias nacionalidades estavam presentes no local, jornalistas russos, poloneses, argentinos, entre ou-

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reportagem - cobertura internacional

Jornalistas acompanham final entre Cruzeiro e Zenit

tros. Dentre eles existiam estreantes, que tinham o primeiro contato com tal cobertura. Um exemplo é a jornalista Barbara Almeida, que estava num trabalho free lancer para o Sada Cruzeiro. Na sua visão, estava tendo uma oportunidade muito satisfatória para seu currículo.

“Eu acredito que, depois dessa experiência internacional, as portas vão se abrir para outros trabalhos’’

periente da redação, é o caso do repórter do caderno de esportes do jornal O Tempo, Daniel Ottoni, que falou das suas atuações nesse tipo de cobertura. “Certamente é uma das grandes experiências que a gente tem na nossa carreira. Não é todo dia que a gente tem uma oportunidade decobrir um evento dessa magnitude com atletas de alto nível, com equipes de alto nível’’.

Foi sem dúvida um evento que deixou um legado para todos os envolvidos, seja para os clubes que disputaram ou para quem trabalhou na organização e cobertura. Os jornalistas mineiros foram privilegiados por terem mais um evento internacional antes das Olimpíadas deste ano, para a qual Belo Horizonte irá receber, além de delegações, dez jogos das competições de futebol

Barbara Mas, na maioria das ocasiões, os jornais optam por mandar a eventos como esse o jornalista mais ex-

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Assistentes técnicos acompanham partida na parte de trás da quadra

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Fotos: Marcella Souza


entrevista

ABRAÇAR Em nova fase, Tiago Iorc fala da carreira, vida e do amor pelo Brasil Por Ana Clara Rodrigues

T

iago Iorc: você pode ainda não ter ouvido falar desse nome, mas vai ouvir. Hoje com 29 anos e lançando o primeiro disco em português, ele tem se tornado um dos maiores nomes da nova música popular brasileira, com composições tanto em inglês quanto em português, e que alcançam e fazem sentido para todas as gerações. Cidadão do mundo, ele reflete suas experiências de vida na sua forma de fazer música. Em entrevista à revista Ponto e Vírgula, intermediada por sua assessoria de imprensa, ele revela um novo lado, ainda pouco conhecido pelos fãs brasileiros.

Tiago, eu queria começar falando da sua criação. Conta pra gente um pouquinho como foi sua infância? O mini Tiago foi muito feliz. Vivi muita coisa bonita da vida de interior do Rio Grande do Sul. Cresci no meio dos bichos do sítio. Brinquei na rua. Aprendi a tocar violão. Me apaixonei e dei beijinhos durante excursão do colégio. Me meti em briga no pátio sem motivo algum. Zoei professora. Fui zoado. Fugi da aula. Fui mal em prova e também tirei dez. Ganhei medalha jogando basquete. Andei de roller e de bicicleta. Junto com isso, ainda fui presenteado com uns anos vivendo na Inglaterra e nos EUA.

Fotos: Divulgação / Rafael Trindade

De lá, trouxe a língua deles na ponta da língua e um pouco do jeito que eles enxergam as coisas. Se misturar essas coisas e mais umas outras, vira essa vida aqui.

Como esse estilo de vida influenciou suas músicas? Claro que toda a minha bagagem influencia na minha música, porque é o que eu sinto, as escolhas que fiz até aqui.

No seu início de carreira, você acha que compor e cantar a maior parte das suas músicas em inglês alterou alguma coisa? O quê? Era como me expressava melhor.

Mas aos poucos fui encontrando minha expressão em português também.

Agora, nessa nova fase em português, você tem sentido alguma diferença? Um alcance maior? Me interessava encontrar o diálogo mais direto, que pudesse fazer um link do que eu queria dizer com o que pudesse ser relevante para pessoas daqui. É um disco que me aproxima mais do meu lado brasileiro, que sempre existiu. Venho sentindo essa vontade há algum tempo. E esse disco registra minha vontade de abraçar o público aqui no Brasil.

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entrevista - tiago iorc

AGRADECER Como é a sua relação com o público estrangeiro? Existe alguma turnê internacional à vista? Por conta do meu trabalho em inglês, tive boas aberturas em outros países e volta e meia faço shows no exterior. Hoje, estou no Brasil e meu foco agora é trabalhar aqui. Esse disco todo em português é o meu abraço definitivo no público brasileiro que tanto me apoia desde o início.

“Esse disco (Troco Likes) registra minha vontade de abraçar o público aqui no Brasil.”

T

iago acaba de lançar o seu novo CD, Troco Likes, e é o primeiro disco do cantor em português. Este ano, ele fará uma participação no DVD da cantora Sandy, que já se declarou fã do cantor. Sempre discreto em relação à sua vida pessoal, Tiago se mantém a maior parte do tempo longe dos holofotes, mas utiliza as redes sociais ativamente, até mesmo para manter contato com os fãs. A música feita por Tiago, que vem mudando ao longo dos anos – talvez amadurecendo, assim como ele – segue apenas um critério: a qualidade.

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Agora, falando de cantores e compositores, quem são as suas principais influências? Isso tem mudado ao longo do tempo? Dos britânicos, talvez os maiores impactos na minha vida foram John Lennon e Radiohead. Mas gosto de tanta coisa que vem de lá… e de cá também. Foi bom ter crescido no Sul e ter passado minha infância e adolescência me inspirando com Humberto Gessinger, Duca Leindecker… meus mestres até hoje.

No Brasil, existe alguma parceria que você queira fazer e ainda não teve oportunidade? Se sim, com quem seria? As escolhas dessa vida determinaram muitos dos acasos desses encontros. Eu nunca imaginei que um dia estaria escrevendo uma música com o Humberto Gessinger, por exemplo. Por outro lado, sei que os caminhos que escolhi desenharam para que isso um dia acontecesse. O mais legal é que a própria música e os anos dedicados a ela me colocam no caminho de situações e de pessoas cada vez mais interessantes.

Você usa muito a internet como instrumento de trabalho e divulgação. Como você enxerga essa cultura da música virtual? Ela ainda conecta as pessoas da mesma maneira? Muita gente conhece o meu trabalho pela internet, pelo YouTube. Eu gosto muito de me envolver com a produção de videoclipes para as minhas músicas, que são uma das principais formas de se conectar com o público hoje.

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Como você, Tiago, lida com a exposição do meio artístico? Acha normal? Tem algum tipo de problema com isso? Tento sempre estar focado na minha música, nas coisas belas que fazem sentido pra mim. Quero dividir coisas bonitas com as pessoas. Coisas que me inspiram e que possam inspirar os outros também.

Como você se enxerga daqui a 10 anos? Espero estar fazendo o que mais gosto, que é cantar e tocar meu violão. Quero viver de arte, seja criando ou colaborando.

E pra terminar, como é a sua relação com Minas Gerais? Tem muitos amigos por aqui? Adoro Minas Gerais! Talvez sejam as minhas pessoas preferidas desse país.

E

como diriam os Beatles diriam, “here, there or everywhere” (aqui, ali ou em qualquer lugar), em inglês ou português, vale a pena conhecer o trabalho de Tiago Iorc, o brasileiro mais gringo que você vai conhecer.

Fotos: Divulgação / Rafael Trindade


gastronomia

comida sobre rodas Novos empreendedores veem oportunidade de bom negócio e investem no estilo food truck Por Larissa Coelho Na saída de uma festa ou na correria do dia a dia, quem nunca optou por aquela comidinha rápida, seja nos famosos carrinhos de cachorro quente ou trailers de sanduíches? Na entrada das faculdades e saídas de boates, eles sempre estiveram presentes. Pois se engana quem acha que eles foram os pioneiros nas comidas de rua. Em 1872, em Provence, nos Estados Unidos, o comerciante Walter Scott teve a ideia de vender tortas e sanduíches, em uma espécie de carroça, para os trabalhadores locais. A partir de então, esse tipo de comércio ambulante foi ganhando espaço, e, cada vez mais, se modernizando. Em meados de 2008, ainda nos Estados Unidos, surgiram as coloridas e sofisticadas food trucks, que chegaram ao Brasil em 2012. Com isso, a onda da “gourmetização” possibilitou encontrar opções que variam de sanduíches sofisticados a comidas típicas, um verdadeiro intercâmbio gastronômico/ cultural. Coxinhas, churros, paletas mexicanas; opções que atendem aos adeptos à culinária vegana ou aos intolerantes a glúten e lactose. O rótulo de comida barata [e sem qualidade] não existe mais. Devido ser um empreendimento de baixo investimento, é perceptível a presença de jovens por trás dos simpáticos caminhõezinhos de comida. É o pontapé inicial para entrar no ramo, ganhar espaço, visibilidade e independência financeira. Somado a tudo isso, fazer e oferecer

o que gosta: é o caso dos estudantes de gastronomia do Senac Minas, Vinícius Galvão, Jady Soares e Dimitri Morais. Eles contam que, durante o curso, na execução dos trabalhos, sentiram a necessidade de um projeto que emocionasse e desse aquela empolgação na rotina. Resolveram criar um grupo de estudos e, a partir de várias conversas, surgiu a ideia da Beerking – Cervejaria Food Truck, em fase de desenvolvimento. “Sempre nos reunimos com os outros alunos pra tomar aquela boa gelada. Assim, quando o Dimitri cogitou a ideia do empreendimento, sugeri cervejas artesanais e tira-gostos harmonizados com cervejas. Os professores nos incentivaram muito”, conta Vinícius Galvão.

Como diferencial de outras food truck, eles pretendiam elaborar todos os ingredientes para a confecção dos pratos, como pães e queijos, além de utilizarem marcas de cervejas mineiras que agradam ao paladar do consumidor. “As cervejas artesanais são as protagonistas. Queremos apresentar aos nossos clientes cervejas de qualidade feitas em nossa cidade e região. Para acompanhar a cerveja, queríamos comidas bem elaboradas, ricas em sabor, mas também algo não muito sofisticado. Queremos que as pessoas comam com as mãos, mas sem se sentirem “ogras”. A partir de várias pesquisas prévias, o grupo escolheu como foco o público jovem e apreciadores de cervejas artesanais, nicho de mercado que vem ganhando notoriedade e

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gastronomia - food truck espaço. A variedade de locais para a venda com a presença deste públicoalvo, para eles, soa como um bom desafio. Além disso, com o curso de gastronomia, eles têm a possibilidade de elaborar um cardápio com a cara da equipe, além de aprendem a gerir e administrar os negócios distribuindo funções entre eles.

Mercado De acordo com o SEBRAE, hoje, este tipo de comércio, bem como os vendedores ambulantes de comidas, já somam 2% da população do país. Geralmente, este tipo de trabalho garante o sustento da família, além de gerar outros empregos. O mercado alimentício vem crescendo exponencialmente. Dentre os fatores para isso está uma maior dedicação ao trabalho fora de casa; na contramão, pouco tempo para preparo de alimentos, consequências de uma vida corrida. Falta tempo para comer - e wcomer bem. Em uma pesquisa realizada pela MINTEL, 1.500 pessoas responderam como planejavam gastar algum dinheiro extra que recebessem: 28% das pessoas disseram que “comendo fora de casa”, e, em um leque de opções oferecidas dentre restaurantes, bares, padarias, lanchonetes, carrinhos de lanchonetes, os food trucks apareceram como uma forte opção. Para a montagem desse tipo de empreedimento, o investidor pode desembolsar de 50 a 70 mil reais. Alguns modelos podem ser mais caros, dependendo da tecnologia utilizada e modelo de veículo. A abertura desse tipo de comércio deve atender a alguns requisitos e cumprir alguns procedimentos, como licença da Anvisa Municipal e Estadual, Detran e Denatran, Prefeitura e Inmetro; além do registro de empresa e inspeção do corpo de bombeiros, para garantir a segurança dos responsáveis e da clientela. Para quem conta com uma boa

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Vinícius Galvão, Jady Soares e Dimitri Morais, apostam no estilo food tuck

ideia e talento culinário, essa é uma grande oportunidade de ganhar independência e ser dono do seu próprio negócio, uma “comida sobre rodas”.

União: Lazer e Gastronomia A partir da grande aceitação do público pelas food trucks, os eventos vêm sendo criados quase que semanalmente, a fim de espalhar ainda mais essa novidade. Uma praça é escolhida como local. Mesas são colocadas com sombrinhas, para proteger do sol forte. Em alguns deles, áreas de lazer para a criançada poder curtir, sem dar muito trabalho aos pais. Famílias, jovens, idosos, casais de namorados, o público é diversificado e os elogios são enormes. Em um destes eventos, montados no bairro Belvedere, região centrosul da capital, era possível encontrar doces, pipocas “gourmetizadas”, churrascos para os paladares mais nobres e exigentes e a boa e velha coxinha, campeã de vendas na maioria dos eventos. O educador físico Igor Garces, 29 anos, aproveitou o sábado enso-

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larado para levar a mãe e um amigo recém-chegado de São Paulo: “a comida está maravilhosa. São várias as opções, inclusive opções para não escapar da dieta. Mas, no fim de semana, uma escapadinha não faz mal”. Igor saiu com uma “crepioca” (crepe feito com farinha de tapioca), tendência atual para quem opta por uma alimentação mais saudável, e prometeu fazer uma paradinha para a sobremesa, no caminhão de churros. O espaço é tão diversificado, que até apreciadores de vinhos têm seu lugar. “É diferente sair de casa e tomar um vinho ao ar livre. Belo Horizonte precisa explorar mais esse tipo de evento, e a organização está impecável”, relata o engenheiro Alberto Costa, morador do próprio bairro. Hoje, os eventos de food truck apostam na proposta de comer bem fora de casa, sem pagar muito por isso. E variedade é o que não vai faltar se o seu programa de fim de semana for este. Vale arriscar e conferir as delícias da comida de rua. Ou comida sobre rodas


reportagem

Capital dos Espetos Uma opção saborosa e econômica, que tem ocupado cada vez mais espaço em Belo Horizonte

Medalhão de queijo com bacon é um dos mais vendidos em O Rei Espetinhos Prado

Por Renata Maimone Belo Horizote sempre foi conhecida pela grande quantidade de bares. A cada ano, aumenta a clientela destes estabelecimentos. Além dos bares, as espeterias têm tido mais espaço na capital; uma boa opção para quem quer sair da rotina dos bares sem gastar muito, já que nos

Fotos: Divulgação

bares tradicionais se gasta mais com porções individuais. Juntando o útil ao agradável, muitos comerciantes viram uma oportunidade de abrir espetarias com preços acessíveis e em pontos variados da cidade.“Esse tipo de movimento sempre existiu, e agora ele está com-

binando com o momento do Brasil, já que oferecemos uma comida barata e que todo mundo gosta”, conta Ciro Lovaglio, um dos sócios da rede O Rei Espetinhos. “O cliente sempre prestou atenção no produto que está consumindo e no atendimento que é dado a ele, e nós sempre fomos fo-

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reportagem - capital dos espetos

Todas as noites são de constante movimento em O Rei Espetinhos Prado

O Rei Espetinhos Anchieta

cados em qualidade e atendimento, por isso o foco do nosso sucesso”, diz o outro sócio, Júnior Machado. Além das 3 casas no Floresta, Prado e Anchieta, os empresários estão inaugurando mais um no Lourdes, local onde ficava o famoso Oak, um dos restaurantes sofisticados que encerraram suas atividades este ano. Alexei Vallerini, sócio fundador das famosas Choperias Almanaque, também decidiu apostar na onda dos espetinhos. Inaugurou há duas semanas o Vaca Véia, uma espetaria sofisticada na Avenida Alberto Cintra. “Eu decidi diversificar porque os espetos estão muito fortes em BH, e já tenho o jogo de cintura do Comércio”, conta Alexei. Além dos tradicionais espetos, a casa decidiu inovar e

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O Rei Espetinhos Prado

lançar também uma linha de molhos para serem servidos junto a eles. Parece que essa onda chegou para ficar, pois os consumidores estão adorando a diversidade. “Adoro essa onda de espetos, porque tem um em cada canto! Você está na faculdade, ou em casa, indo para a balada, com certeza vai ter um no caminho! Preço bom, churrasquinho mineiro, e cerveja gelada, tudo que a gente curte”, diz Raphael Pina, 21 anos, estudante de engenharia. Thiago Lamego, 25 anos, agente de marcas, conta que até deu uma diminuída nas baladas e restaurantes e passou a frequentar os espetinhos. “É uma opção que a gente não gasta muito, cada um paga o seu, bebe uma e ainda reúne a galera”

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Fotos: Divulgação


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