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Encontro da Scot Consultoria

Crise? Que crise?

Evento virtual da Scot Consultoria ressalta blindagem do setor pecuário ao problema gerado pela Covid-19

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Num ano em que a economia vai ter retração de 6%, a arroba do boi já subiu mais de 40%

Denis Cardoso

Em evento virtual realizado em agosto, o engenheiro agrônomo Alcides Torres, diretor da Scot Consultoria, comparou o atual momento vivido pelo setor agropecuário brasileiro a um album famoso da banda britânica Supertramp, chamado “Crisis? What Crisis?” (Crise? Que Crise?), lançado em 1975. No álbum desse conjunto de rock progressivo, um homem aparece, em um cenário colorido, sentado em uma cadeira de praia tomando sol, ouvindo música, com um drink na mesa ao lado, enquanto ao seu redor, em contraste, se vê um cenário cinzento, de destruição, ilustrado por imagens da cidade, poluída por fábricas.

Pois, em tempos de Covid-19, destacou Torres, o setor agropecuário do Brasil, salvo algumas exceções, segue praticamente blindado dos efeitos negativos ocasionados pela pandemia, assim como o homemda capa do disco do Supertramp. “A cadeia da pecuária de corte está treinada para viver em meio a tiroteios econômicos e atualmente passa ao largo dos principais problemas gerados pelo avanço da doença no Brasil e no mundo”, afirmou o diretor da Scot, durante a abertura do mais tradicional evento da empresa, o “Encontro de Confinadores e Recriadores ECR 2020”, neste ano realizado em formato virtual, mas, ainda assim, com 1.113 inscritos.

Trata-se de público semelhante ao registrado nas edições presenciais anterioires, informou Marco Túlio Habib Silva, diretor de Marketing da Scot. O evento contou com participação de palestrantes de renome do agronegócio, dentre eles a ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), Tereza Cristina; Pedro Parente, presidente do Conselho da BRF; Alexandre Mendonça de Barros, sócio consultor da MB Agro; Moacyr Corsi, professor da Esalq/USP; Fabiano Tito Rosa, diretor de compra de gado da Minerva Foods e Lygia Pimentel, diretora executiva da Agrifatto.

Alcides Torres justificou a comparação com a capa do disco do Supertramp citando os bons números do setor agropecuário brasileiro. Nos últimos 12 meses, a arroba do boi gordo subiu 44%; o preço do frango, 13%; e a arroba do suíno, 12%. Na reposição, o boi magro teve alta de 53%; o garrote, 54%; o bezerro de ano, 62%; e o bezerro desmamado, avanço de 61,5%. “E no segmento de fêmeas?”, indagou Torres. A mesma coisa, ele mesmo respondeu: “a vaca magra subiu 61,5%; a vaca gorda, 50%; a novilha, 49%; a bezerra de ano teve acréscimo de 57%; e a cotação da bezerra desmamada, incremento de 63%. “Num ano de recessão, esses aumentos são extraordinariamente fabulosos”, ressaltou. Apesar disso, lembrou que, nos últimos cinco anos, o setor navegou em meio a crises. “Não existe calmaria. Todos os dias são de bravura e de decisões difíceis”, exultou.

Hedge, ainda menosprezado

Em sua palestra, Lygia Pimentel, da Agrifatto, repetiu a afirmação de Scot, lembrando que a pecuária brasileira passou, recentemente, por alta volatilidade de preços e aumento considerável dos riscos. Uma pesquisa realizada pela consultoria apontou que 47% dos entrevistados consideraram o preço da arroba como principal problema, entre as maiores dificuldades enfrentadas na gestão do negócio pecuário. A solução para isso é o hedge, mas este é desconsiderado por 56% dos entrevistados, enquanto 42% disseram desconhecer os custos de produção de suas fazendas.

“O hedge é para todos ‒ pequenos, médios e grandes ‒, mas não garante preço; apenas ajuda a administrar riscos”, definiu. A diretora da Agrifatto mencionou as diferentes ferramentas disponíveis de hedge (contratos futuros, opções, mercado a termo e CPRs) e ofereceu dicas para a escolha da melhor estratégia para o negócio de cada produtor. “O principal ponto é o planejamento, que tem de ser realizado com base numa análise da empresa e seus elementos de risco. Também é preciso descobrir o perfil do investidor (arrojado ou conservador?)”, afirmou.

De volta ao presente, Alexandre Mendonça de Barros, da MB Agro, atribuiu o forte impulso do agronegócio brasileiro às exportações, estimuladas pela depreciação do real frente ao dólar. “A perda de força da

moeda brasileira fez com que a carne e outros insumos ficassem muito competitivos”. Segundo ele, a redução da taxa básica de juros no País – para 2%, o menor nível na história – fortalece os investimentos na pecuária. “O cenário atual traz grandes oportunidades, mas cabe a cada propriedade, de acordo com sua situação, tomar as decisões necessárias”, afirmou. O aproveitamento de oportunidades ‒ como o déficit de proteína no mercado chinês, principal comprador da carne bovina brasileira ‒ foi o ponto destacado por Fabiano Tito Rosa, da Minerva Foods, para superar dificuldades vividas pela indústria atualmente. Entre elas, a sazonalidade de oferta de gado e a forte necessidade de mão de obra especializada.

Agro vencedor

Primeira oradora do evento virtual, a ministra Tereza Cristina disse que o desempenho do setor agropecuário, diante da pandemia de Covid-19, foi vencedor “do Oiapoque ao Chuí”. Lembrou que, quando assumiu o cargo de Secretária da agricultura e desenvolvimento/ turismo do Mato Grosso do Sul, em 2017, também enfrentou uma adversidade de grande magnitude: o surto de febre aftosa no Estado. “Foi um momento de extremo aprendizado, resiliência e paciência”, disse. Dando sequência às análises de mercado, Hyberville Neto, da Scot Consultoria, salientou que a China continua ditando o ritmo das exportações brasileiras: “A demanda chinesa já faz parte do dia a dia dos negócios das empresas”. A retenção de fêmeas, a baixa oferta de animais engordados a pasto e o menor número de bois confina

Alcides Torres, o Scot: preços na pecuária de corte são “extraordinariamente fabulosos”

dos no segundo giro garantiram a alta de 44% no preço da arroba em 12 meses”, destacou.

Hyberville Neto lembrou ainda que dois concorrentes brasileiros no mercado mundial de carne bovina – Índia e Austrália – enfrentam problemas e perda de competitividade, o que favorece a pecuária brasileira. “A Índia registra aumento significativo nos casos de Covid-19, o que pode afetar a cadeia de produção deles. Por sua vez, a Austrália, que compete com a gente pelo mercado chinês, teve seu rebanho fortemente afetado pela seca”, apontou. Entre as “fraquezas do Brasil”, Neto apontou a crise financeira ocasionada pela pandemia da Covid-19 e seu impacto na demanda interna de carne bovina. No início de 2020, lembra o analista, a expectativa para o PIB brasileiro era de alta de 2,3%, mas a última previsão apontava para uma queda de quase 6%. “Com as exportações firmes, e quebrando recordes, saber como o mercado interno reagirá é o grande desafio para o futuro”, afirmou Neto. n

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