7 minute read
O efeito da nutrição na
Primíparas com taxa de prenhez de multíparas?
Estudo mostra que isso é possível, desde que elas sejam suplementadas.
Advertisement
Melhorar o escore corporal antes do parto é uma das premissas para aumentar a taxa de prenhez em primíparas
Rafaela Angelieri, da Fazenda Mater, quer 78% de prenhez nas primíparas na próxima estação de monta
Moacir José
Com uma nutrição adequada, antes e depois do parto, as primíparas zebuínas podem retornar mais rapidamente ao cio e registrar taxa de prenhez semelhante à das multíparas. Quem garante é o professor Pietro Sampaio Baruselli, do Departamento de Reprodução Animal, da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo. Segundo ele, a tese foi demonstrada, por diversos estudos, em fazendas com manejo adequado de pasto e bom fornecimento de suplementação mineral, elementos fundamentais para garantir um escore de condição corporal (ECC) acima de 3 às primíparas dessa raça (veja gráfico na página ao lado). “Diferentemente do que ocorre com uma fêmea leiteira, a zebuína de corte tem uma exigência nutricional maior depois do parto, pois precisa amamentar a cria, continuar crescendo e voltar ao cio, para uma nova prenhez. Com pouca reserva energética, ela não consegue fazer isso”, explica o professor, informando que essa é a situação de 90% das fazendas do Brasil Central que lidam com gado Nelore. Nas propriedades que conseguem a combinação de rápido retorno ao cio e elevada taxa de prenhez nas primíparas, o escore corporal desejado é conseguido com uma nutrição adequada antes do parto da novilha. O professor explica que a fêmea que chega ao parto em boa condição pode até perder um pouco de peso depois do parto (o que é normal), mas volta ao cio e emprenha com muito mais facilidade. “A que tem ECC ruim perde peso e não emprenha, porque é muito mais difícil ganhar peso depois do parto do que antes”, explica Baruselli.
Ele ressalta que não é por isso que se deve deixar a vaca em pastagens de má qualidade depois do parto. Corre-se o risco de se perder o que se ganhou antes. A estratégia está alinhada com a necessidade de se encurtar cada vez mais a entrada das fêmeas Nelore na reprodução, baixando dos atuais 24 meses (idade aceita como média em fazendas com algum grau de tecnologia) para 14-16 meses (já obtida em fazendas mais tecnificadas).
Encurtar o ciclo
Essa é a meta da Fazenda Mater, de Santa Rita do Pardo, região leste do Mato Grosso do Sul, que faz ciclo completo e detém um rebanho de 5.000 fêmeas Nelore. Desde a estação de monta de 2015/2016, ela vem aplicando protocolos de IATF em todas as matrizes (antes disso, a técnica era empregada apenas nas multíparas). Com isso, tem conseguido aumentar a taxa de prenhez das primíparas, de 66% na estação de monta de 2016/2017 para 76%, na de 2019/2020. Parte desse resultado, seguramente, vem do fornecimento de sal proteinado o ano todo (para todo o rebanho), além de suplemento protéico-energético antes do parto e suplemento protéico mineral no pós-parto. Outra parte, segundo a zootecnista Rafaela Maria Sutiro Angelieri, responsável pelo manejo do gado na Mater, pode ser creditada à ressincronização da IATF, iniciada em 2018/2019.
“Nossa meta é conseguir 78% de taxa de prenhez nas primíparas na próxima estação de monta. A das multíparas, com apenas uma IATF [também com repasse de touro], deve ficar em 86%, um pouco a mais do que conseguimos na estação passada”, informa ela. Outra meta da fazenda, para 2021/2022, é eliminar a categoria de novilhas emprenhando aos 24 meses, que na última estação de monta ainda representou um contingente de 700 a 800 animais. A mesma quantidade já é representada por “precocinhas” emprenhadas aos 14 meses. Para estas últimas, a taxa de prenhez em 2019/2020, com três protocolos de IATF, foi de 70%. Até 2017, diz Rafaela, as novilhas prenhes aos 24 meses eram inseminadas após observação de cio. Somente
a partir de 2018 é que começaram a receber protocolo de IATF (apenas um, com repasse de touro).
Nova opção no cocho
Com a genética sendo bem cuidada, há pelo menos 30 anos, pelo pai de Rafaela, Gerson Angelieri Filho, um dos donos da Fazenda Mater, o desafio passou a ser o manejo dos pastos e a nutrição suplementar. Foi buscando enfrentá-los que a fazenda topou abrigar um experimento para comparar o desempenho reprodutivo das primíparas Nelore após o fornecimento de suplemento mineral, antes e depois do parto, em dois formatos distintos: o de uso tradicional (em pó, preparado na fazenda) e outro em bloco, fabricado pela Minerthal Produtos Agropecuários, que tem unidades em Araçatuba, SP; Goiânia, GO; e Araguaína, TO. A empresa foi parceira da USP na empreitada. O experimento foi realizado entre junho de 2018 e maio de 2019, como parte da dissertação de mestrado da veterinária Bruna Lima Chechin Catussi, sob orientação do professor Pietro Baruselli.
Segundo Bruna, constatou-se vantagem do suplemento em bloco, primeiro porque esse produto continha em sua composição a monensina sódica, aditivo que melhora o desempenho dos animais, mas também devido ao menor custo final (veja tabela) e à maior praticidade, uma vez que os blocos foram colocados no cocho apenas uma vez por semana, ante pelo menos três vezes semanais do sal convencional da fazenda. “O maior custo do produto em si foi compensado pela economia com combustível e mão de obra”, constatou Rafaela Angelieri, que passou a adotar a nova tecnologia para fornecimento antes do parto das primíparas.
O experimento contou com 417 novilhas Nelore de 31 meses de idade, prenhes, com peso médio de 438 kg e escore corporal de 2,94. As fêmeas foram divididas em quatro lotes: “bloco-bloco” (sal em bloco na seca, 90 dias antes do parto, e nas águas, 120 dias depois do parto), “bloco-convencional” (sal em bloco antes do parto e sal com ureia em pó depois do parto), “convencional-bloco” (sal com ureia em pó antes do parto e sal em bloco depois do parto) e “convencional-convencional” (sal com ureia em pó antes e depois do parto). Este último serviu como testemunha do experimento.
O ECC das primíparas foi mensurado em seis momentos distintos. O bloco continha melaço de cana-de-açúcar, milho grão moído, farelo de soja, ureia, núcleo mineral e monensina sódica. Já o suplemento em pó era composto de milho grão moído, farelo de trigo, ureia e núcleo mineral. Os níveis nutricionais de ambos foram semelhantes.
Calibrando o investimento
Uma das conclusões do experimento confirmou que a suplementação das primíparas aumenta a taxa de prenhez na IATF, em função da melhoria do escore corporal das fêmeas. No comparativo dos dois formatos utilizados (bloco e pó), houve vantagem para o bloco (taxa final de 80,9% ante 74,1%), mas, do ponto de vista econômico,
Fertilidade semelhante (Primíparas x multíparas)
46% 47% 44%
a
34%
b a b
3.454 1.229 10.049 3.420 53%
a
50%
a
1.970 348
Primíparas: n = 4.997 Multíparas: n = 15.473
Representa 7% das primíparas das fazendas da região (348/4.997)
< 2,75 Multíparas 2,75 à 3,0 Primíparas >3,0
Fonte: Augusto Felisbino/USP, com animais da região do Araguaia, MT, na EM 2017-2018
Primíparas ECC ≥ 3
Satisfatória reconcepção
não se mostrou vantajoso o uso desse formato nos dois períodos (antes e depois do parto) comparado a seu uso em apenas um deles, pois a taxa de prenhez final foi a mesma: 80,9%. Mas, se for considerado, também, o desempenho dos bezerros, o peso à desmama justifica o investimento nos dois períodos.
A veterinária Bruna Catussi destaca que a vantagem do suplemento oferecido no formato de bloco não se deve apenas à praticidade, mas também à função de limitador de consumo. Mesmo sendo mais saboroso do que o suplemento em pó, por causa do melaço, o bloco impede um consumo rápido, porque o animal tem de lamber o produto. Seria mais difícil controlar a ingestão, se o melaço fosse adicionado ao suplemento em pó, ainda que ambos tenham a ureia como limitador.
“A melhor palatabilidade do bloco facilitou a ingestão da monensina, o que potencializou o resultado dos lotes que receberam o suplemento”, avalia ela. Outra vantagem do bloco é que ele não estraga quando molhado pela chuva. Na Fazenda Mater, isso normalmente não ocorre, pois a maioria dos cochos são cobertos, mas, nas propriedades que não contam com esse tipo de instalação, o suplemento em pó, quando molhado, pode estragar ou ter o sabor pouco agradável da ureia intensificado. n
Bruna Catussi, da USP, conduziu experimento comparando o suplemento em bloco e em pó na Fazenda Mater
Resumo do experimento com primíparas Nelore da Fazenda Mater
Indicadores/suplemento por período (pré e pós-parto)¹
Número de cabeças Taxa ciclicidade pós-parto (%) Taxa de prenhez à 1 IATF (%) Taxa de prenhez à 2 IATF (%) Taxa prenhez final E.M. (%)
Custo suplementação (R$)² Custo transporte (R$) Custo mão de obra (R$) Total despesas (R$) Receita (R$)³
BlocoBlocobloco controle
89 103 22,1 18,6 56,2 49,5 48,7 48,1 80,9 81,6
Avaliação financeira
11.330 9.748 256 549 136 292 11.722 10.589 21.829 14.361
Controlebloco
117 18,8 49,5 47,5 80,3
10.861 476 253 11.591 12.070
Controlecontrole
108 15,9 41,7 46,0 74,1
9.276 769 409 10.455 0
¹Consumo equivalente a 0,05% do peso vivo/animal/dia; ²Considera R$ 2,42/kg para o suplemento em bloco e R$ 1,64/kg para o suplemento controle; ³Considera (em 100 vacas) o ganho de um bezerro mais pesado à desmama (R$ 6/kg); antecipação (1 mês) da prenhez na 1a IATF (bezerros 10 kg mais pesados); mais prenhezes ao final da estação de monta (R$ 1.200/bezerro) e menos ressincronizações (R$ 55/protocolo completo). Fonte: VRA/FMVZ/USP e Minerthal.